Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/22581
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

A transação como ato de disponibilidade de direitos transindividuais?

A transação como ato de disponibilidade de direitos transindividuais?

Publicado em . Elaborado em .

Quando a disposição de parcela dos direitos transindividuais se mostra inevitável, deveria haver celebração de ajustamentos de conduta, pois, ao final, caso exista processo judicial, a sentença irá se deparar com idêntico problema: concessão de direito disponível na imposição das obrigações.

Sumário: I – Objetivo do presente trabalho. II – Evolução histórica dos Acordos Extrajudiciais. III – A natureza jurídica do instituto no âmbito dos direitos transindividuais. IV – O debate sobre a indisponibilidade dos direitos transindividuais. V – Condições e restrições para a transação de direitos transindividuais. V.I. Hipóteses de vedação. VI – Discricionariedade, realidade e conveniência. VII – Conclusão: A busca da efetividade. VIII – Referências Bibliográficas


I – Objetivo do Presente Trabalho

O presente trabalho visa a abordar a natureza jurídica da transação no âmbito dos direito transindividuais para verificar a possibilidade de disposição desses interesses. Nessa perspectiva, busca-se averiguar as alterações legislativas, os limites materiais e processuais disponíveis, e, ao final, analisar a viabilidade e conveniência de aplicação do instituto.


II – Evolução histórica dos Acordos Extrajudiciais

A realização de acordos extrajudiciais para a resolução de conflitos já ocorria muito antes da previsão legal do instituto em nosso ordenamento. Os representantes do Ministério Público, em seus atendimentos ao público, sugeriam aos particulares a composição como meio de solucionar seus conflitos.

Assim, expõe Hugo Nigro Mazzili que “nas décadas que antecederam a edição dessas leis, principalmente nas comarcas do interior, já vinha o Ministério Público brasileiro mantendo a saudável experiência do atendimento ao público. Questões criminais, de família, de menores, de trabalhadores, de vizinhos, entre outras, sempre lhe eram trazidas à sua presença, não raro até mesmo informalmente, para uma orientação, um conselho, uma admoestação ou até mesmo uma providência policial ou judicial”.[1]

Fernando Grella Vieira afirma ainda que, mesmo ausente previsão legal específica, a transação era aceita até mesmo quando já havia ação civil pública em andamento.[2]

Diante dessa praxe do Ministério Público, duas questões centrais eram levadas ao debate. Em primeiro lugar, perguntava-se a respeito do poder do Ministério Público, como ente legitimado a homologar acordos celebrados fora do âmbito judicial. Por outro lado, havia uma preocupação quanto à força executiva de tais composições.

A dúvida sobre a legitimidade de atuação do promotor frente aos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos perdura até os dias de hoje, o que, pelo corte metodológico, não será objeto do presente trabalho, pois merece uma ampla explanação sobre o assunto.

Entretanto, o reconhecimento e corriqueira aplicação da transação, antes tidos como inconstitucionais, foram aos poucos introduzidos na legislação e na prática jurídica. Esse movimento surgiu do Ministério Público paulista, na década de 1980, que pretendeu incluir, no projeto de lei que versava sobre o Juizado Especial de Pequenas Causas, o caráter de título executivo extrajudicial às transações entre maiores e capazes homologadas pelo órgão ministerial.

É importante notar que as discussões surgidas nos grupos de estudos do Ministério Público, que depois se converteram no parágrafo único do art. 55 da Lei Federal 7.244/1984, tratavam tão-somente da execução forçada de acordos escritos, cujos transigentes fossem capazes e cuja matéria versasse sobre objeto disponível. Assim dispunha o art. 55:

O acordo extrajudicial, de qualquer natureza ou valor, poderá ser homologado no juízo competente, independente de termo, valendo a sentença como título executivo judicial. Parágrafo único. Valerá como título executivo extrajudicial o acordo celebrado pelas partes, por instrumento escrito, referendado pelo órgão competente do Ministério Público.[3]

O reconhecimento legal da auto-execução de acordos homologados pelo Ministério Público trouxe uma primeira alteração de mentalidade do Poder Judiciário, acostumado a enxergar em sua própria estrutura toda a responsabilidade para uma resposta aos conflitos sociais, nessa perspectiva resolúveis somente pela prestação jurisdicional “efetivada por magistrados”. A alteração na perspectiva dos julgadores ancorou-se no intuito de buscar uma pacificação social menos impositiva e prolongada, quiçá mais célere e eficaz, fruto do comum acordo entre as partes.

Diante do êxito do instituto na esfera patrimonial individual, na década de 1990, houve a intenção de expandir a experiência para o âmbito da tutela coletiva, dos interesses transindividuais. Houve a necessidade de tratamento legal específico à transação em tema de interesses difusos e coletivos, de modo a garantir-lhe plena eficácia jurídica

Embora a alteração tenha ocorrido na Lei de Ação Civil Pública (Lei 7.347/85), a temática, na realidade, surgira na elaboração do anteprojeto do Estatuto de Criança e do Adolescente e foi, na seqüência, reiterada pelo Código de Defesa do Consumidor.

Particularmente no campo da tutela de direitos coletivos, a tônica da possibilidade de celebração de transação envolvendo direitos difusos desenvolveu-se consideravelmente após a introdução do parágrafo sexto ao art. 5º, na Lei de Ação Civil Pública pela Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), a qual instituiu a possibilidade de celebração de Termo de Ajustamento de Conduta, nos seguintes termos:

§ 6º. Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial.

O suposto veto ao §3º, do art. 82 do Código de Defesa do Consumidor, que previa compromisso de ajustamento em matéria de interesses transindividuais de consumidores foi, ao final, reintroduzido pelo art. 113, não vetado, que insculpiu o mesmo compromisso de ajustamento na Lei de Ação Civil Pública, com aplicação subsidiária até mesmo em matéria de defesa do consumidor (art. 21 da LACP, introduzido pelo art. 117 do CDC).[4]

Essas legislações, além de inserirem a transação no debate transindividual, trouxeram também inovações quanto à aptidão de todos os órgãos públicos legitimados à ação civil pública ou coletiva de tomar os compromissos de ajustamento e, o mais importante, quanto à viabilidade da imposição de obrigações de fazer e de não fazer pelo título executivo extrajudicial, que antes era limitado às características de liquidez, com obrigações de pagar quantia líquida e certa.


III – A natureza jurídica do instituto no âmbito dos direitos transindividuais

Se, por um lado, o acordo entre particulares possui natureza jurídica de transação, haja vista as concessões mútuas realizadas e disposição de direitos patrimoniais de caráter privado, conforme disposto nos artigos 840[5] e 841[6] do Novo Código Civil (NCC), a natureza jurídica dos acordos realizados na seara dos direitos transindividuais permanece incerta.

Embora muitos autores considerem equivocado o tratamento do instituto como transação, o Instituto Brasileiro de Direito Processual, em sua mais recente manifestação sobre processos coletivos, reitera, no art. 21, §3º do anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos, entregue em janeiro de 2007 ao Congresso Nacional, que “o termo de ajustamento de conduta terá natureza jurídica de transação, com eficácia de título executivo extrajudicial, sem prejuízo da possibilidade de homologação judicial do compromisso, hipótese em que sua eficácia será de título executivo judicial” (grifos nossos).

Esta taxatividade quanto ao caráter do termo de ajustamento pode gerar polêmica. Geisa de Assis Rodrigues é enfática ao afirmar que “mesmo que se utilize o rótulo “transação”, transação não há”[7] esclarecendo que, à diferença do termo firmado debatendo direito transindividual, a transação apresenta como características fundamentais a existência de concessões recíprocas, o que pressupõe a possibilidade de alienação do direito e de disponibilidade do mesmo, além de ser possível apenas para direitos patrimoniais de caráter privado.

Diversos autores criticam o termo ”transação”[8], por já haver figura jurídica no ordenamento com o mesmo nomen iuris, mas que trata somente de interesses individuais patrimoniais. À continuação do raciocínio, afirma-se que não há concessão por parte do ente público legitimado, mas somente submissão do responsável pela lesão ao cumprimento de todos os preceitos protetivos estabelecidos, sem possibilidade de contra-argumentação, com o escopo de assegurar os interesses supra-individuais.

A exigência da transação de versar sobre bem disponível leva muito as autores a defenderem, portanto, a existência de um acordo extrajudicial[9] ou ato administrativo negocial[10].

Assim, em defesa da terminologia ‘acordo’, Paulo Affonso Leme Machado defende que “ao contrário do termo transação, parece-me que o termo acordo não conduzirá a equívocos de interpretação, pois retrata a celebração de um ajuste e não induz a despojamento de direitos indisponíveis em questão”.[11]

Neste mesmo sentido,  Hugo Nigro Mazzili expõe que o compromisso firmado na esfera dos interesses transindividuais “não tem natureza contratual, pois os órgãos públicos que o tomaram não têm o poder de disposição. Assim, diversamente do que vem previsto no ACBPC, o compromisso de ajustamento de conduta não pode ser considerado uma verdadeira e própria transação, porque a transação importa poder de disponibilidade, e os órgãos públicos legitimados à ação civil pública ou coletiva, posto tenham disponibilidade do conteúdo processual da lide (como de resto é comum aos legitimados de ofício, como substitutos processuais que são), não detêm disponibilidade sobre o próprio direito material controvertido”[12].

Ainda que pareça um mero equívoco, foi intencional a previsão da natureza de transação para o termo de ajustamento de conduta. Em parecer concedido por Ada Pellegrini Grinover à Sucocítrico Cutrule Ltda, a professora novamente reitera, de forma expressa, que a natureza jurídica é de transação. Partindo do compromisso de cessação de prática da esfera econômica e fazendo referência a diversos autores[13], a professora esclarece que são aplicadas ao termo de ajustamento de conduta as mesmas normas referentes à transação, inclusive aquelas referentes aos contratos, pois assim se constitui frente a sua bilateralidade. As cláusulas e condições são avençadas entre as partes, ficando superadas quaisquer possibilidades de discussão de seus termos, o que gera efeitos de coisa julgada entre os envolvidos.

Como possui o escopo de obrigar o infrator ao cumprimento da lei, o termo de ajustamento resolve o litígio abdicando do instrumento processual de conhecimento ou da homologação do órgão jurisdicional. Por essa razão, enquadra-se no nível extrajudicial e preventivo, equivalente à transação.

As concessões recíprocas são inegáveis para Ada Pellegrini Grinover, para quem “o caráter contratual e bilateral do referido compromisso – inspirado no “consent decree” do direito norte-americano – foi também destacado por César Mattos, ao assinalar que ‘o CCP deve ser amplamente negociado entre o CADE, a(s) parte(s) acusada(s) e a(s) parte(s) que alega(m) estar sendo prejudicada(s)’. Fazendo alusão à manifestação da Conselheira Neide Mallard, ‘em seu voto no processo de fertilizantes (1994), o procedimento ‘tem por objetivo a imediata restauração da concorrência, sem as delongas do processo administrativo, poupadas as démarches das ações judiciais, evitando ainda os altos custos financeiros normalmente infligidos a todas as partes envolvidas. É inequívoca a desejável redução da incerteza no processo’.”[14] (grifos do original).

Geisa de Assis Rodrigues, antes contrária à natureza transacional do termo de ajustamento, admite a negociação na esfera econômica, já que o “compromisso de cessação de prática é um meio alternativo de solução de conflitos envolvendo direitos transindividuais em risco diante de determinadas práticas econômicas. Exatamente porque o compromisso de cessação é um instrumento de tutela de direitos transindividuais, não deve ser celebrado sob a perspectiva do compromissário ou segundo o seu exclusivo interesse. Conforme tivemos a oportunidade de abordar, as novas formas de solução extrajudicial de conflito devem ser regidas pelos princípios do acesso à justiça, da tutela preventiva, da tutela específica, da aplicação negociada da norma jurídica e do princípio democrático”[15].

Invocando o magistério do professor e ex-Conselheiro do CADE João Bosco Leopoldino da Fonseca, Carla Lobão lembrou que “o CCP se insere no instituto jurídico da transação, previsto nos artigos 1.025 a 1.036 do Código Civil, cujas características se evidenciam como um acordo, que se manifesta com o propósito de extinguir um litígio, em que existe uma reciprocidade de concessões e em que permanece inequívoca a incerteza quanto ao direito das partes. Com esse acordo, prossegue a autora, a autoridade não investiga mais e o representado paralisa a prática de atos que geraram suspeitas de infração contra a ordem econômica” (grifos no original).[16]

Com o fim de restabelecer o funcionamento regular do mercado, o Compromisso de Cessação de Prática é um instrumento de composição de conflitos de concorrência, havendo suspensão do processo durante o cumprimento do compromisso e arquivamento do processo, sem julgamento de mérito e sem aplicação de qualquer outra penalidade, se, ao término do prazo fixado, verificar-se o atendimento de todas as exigências do termo em questão.

Por fim, Ada Pellegrini Grinover, de forma categórica, afirma que tanto o CCP como o TAC são modalidades de transação, ambos sujeitos à condição resolutiva, que se consubstancia na necessidade de realização do compromisso assumido pelo transator para que tenha eficácia e evite a retomada do curso do processo administrativo.

Seja sob a óptica de mero acordo extrajudicial, seja sob a perspectiva de uma transação, o ponto central de discussão evocado por esses institutos é a questão da indisponibilidade dos direitos transindividuais.


IV – O debate sobre a indisponibilidade dos direitos transindividuais

O cerne da discussão sobre a natureza e a possibilidade de se transacionar, para além dos interesses individuais, envolve questão referente ao grau de disponibilidade desses interesses.

Bem destaca Geisa de Assis Rodrigues que “o direito é indisponível quando seu titular não pode dele renunciar nem realizar concessão que represente redução de seu conteúdo. A nota de indisponibilidade sempre está ligada ao interesse público, aquele reputado como de interesse geral em um momento historio específico de uma dada sociedade, de modo a se evitar o risco de prejuízos a bens relevantes para o sistema jurídico”.[17] Quanto aos direitos transindividuais, a marca da indisponibilidade é vislumbrada pela indeterminação da titularidade, indivisibilidade com relação ao objeto.

Direitos indisponíveis, assevera Antonio Carlos da Costa Machado, “são aqueles direitos cuja realização interessa à própria sobrevivência e manutenção da sociedade, à própria existência do Estado, embora seus titulares sejam particulares (direito de família, direitos da personalidade, etc). Os direitos públicos, como regra geral, são indisponíveis (direitos administrativo, penal, previdenciário). Direitos indisponíveis, tecnicamente, são os que encontram regramento jurídico nas chamadas leis de ordem pública e cujas características básicas são as seguintes: inalienabilidade, instransigibilidade, irrenunciabilidade, impenhorabilidade, não sujeição a reconhecimento jurídico no processo e à confissão e realizabilidade obrigatória em muitos casos”[18].

O Código de Defesa do Consumidor conceitua três categorias de interesses transindividuais: os difusos, os coletivos e os individuais homogêneos.

Os direitos difusos possuem natureza indivisível e seus titulares são pessoas indeterminadas ligadas por circunstância de fato. Não é permitida a divisão de seu objeto para cada pessoa individualmente.

Ainda que não haja menção expressa à indisponibilidade dos interesses difusos, ela decorre do interesse público que orienta a sua implementação, uma vez que tais interesses materializam a realização de objetivos sociais e de valores previstos constitucionalmente. É inegável, portanto, sua indisponibilidade em vista do interesse social na obrigatoriedade de sua efetiva defesa, sem a possibilidade de dispensa de qualquer exigência legal.

À parte dessa consideração, há de se ressaltar também que, porque os interesses difusos jungem-se a grupo de pessoas indeterminadas, sua representação ocorre pelas figuras do órgão ministerial e demais agentes mencionados em lei, o que gera um descompasso entre a legitimidade e titularidade dos interesses[19]. Por esse motivo, a natureza indisponível é realçada, já que o representante não possuiria plena capacidade para negociar ou abdicar de direitos que não lhe pertencem.

Os direitos coletivos guardam semelhança com os direitos difusos quanto à indivisibilidade e transindividualidade, diferenciando-se no que toca à determinabilidade dos titulares, que pertencem a grupo, categoria ou classe de pessoas, ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base.

A indisponibilidade do direito coletivo e dos direitos individuais homogêneos também deriva da impossibilidade do legitimado extraordinário de dispor de direitos e interesses pertencentes a um grupo. Haveria uma possibilidade de desistência individual, mas impossibilidade de disposição quando a matéria fosse tratada de forma coletiva, ou seja, uma vez “exercitada a defesa de modo coletivo pela entidade legitimada ou mesmo pelo Ministério Público, restará gravado o objeto da demanda pela indisponibilidade”[20]. Neste aspecto, entende-se que o representante não estaria legitimado para abdicar de direito que não é seu.


V - Condições e restrições para a transação de direitos transindividuais

Mostra-se inquestionável a natureza indisponível dos direitos transindividuais. Entretanto tal assertiva não deve, obrigatoriamente, levar à conclusão de que tais direitos seriam insuscetíveis de serem transacionados.

Os autores, em sua maioria, efetuam uma distinção entre direito indisponível absoluto e relativo para justificar o acordo extrajudicial. O próprio bem, conteúdo do direito possui indisponibilidade absoluta. Por outro lado, há indisponibilidade relativa quanto à forma de observância da obrigação e aos critérios de inadimplemento a serem cumpridos e, por essa razão, tais elementos podem ser objetos de transação.

O ordenamento jurídico aponta que a indisponibilidade do direito e a possibilidade de transação não se excluem prima facie[21]. Admite-se, mesmo que em um âmbito de atuação consideravelmente limitado, o acordo entre os legitimados sobre direitos indisponíveis.

A própria Constituição Federal contempla a possibilidade de transação em matéria de direito penal no âmbito dos Juizados Especiais. Considerada como verdade consensuada, o ordenamento jurídico regula a aplicação do instituto de transação nos art. 74, 76 e 89 da Lei 9.099/95. Ademais, diversos diplomas normativos prevêem a possibilidade de utilização de mecanismos extrajudiciais de solução de controvérsias, inclusive da arbitragem, para a resolução de contratos em matéria administrativa.[22]

Como forma de resguardar a indisponibilidade do interesse tutelado, limita-se o espaço transacional disponível, sem incluir a parte substantiva da obrigação cominada pelo infrator. A discricionariedade existiria apenas quanto aos pontos tangenciais ou periféricos, ou seja, aos aspectos formais de determinação das condições de tempo, lugar e modo de cumprimento da obrigação do responsável. Deste modo, a disponibilidade é processual e não material.

Essa flexibilidade estaria limitada pelo princípio da razoabilidade, exigindo-se condições necessárias, adequadas e suficientes para a superação da ofensa.

Rodolfo de Camargo Mancuso, em defesa dessa tese, expõe que “a ‘transação’ possível é aquela feita ao pressuposto de que o interesse metaindividual venha resguardado em sua parte nuclear e substancial, ou seja, que o resultado prático alcançado coincida ou fique o mais próximo possível daquele que seria obtido com a execução forçada do julgado” [23]

Em análise sobre os efeitos da revelia nos processos coletivos, Luiz Antônio de Souza trabalha a questão da indivisibilidade do bem jurídico difuso propriamente dito, defendendo, por outra via, que os pedidos da demanda têm, direta ou indiretamente, caráter patrimonial e, portanto, são disponíveis. Assim defende: “É bem verdade que o Ministério Público, ou outro legitimado, quer em transação efetivada extrajudicialmente, quer em transação efetivada durante o transcorrer de uma ação civil pública ajuizada, não poderá, em nenhuma hipótese, dispor do direito material versado (direito ao meio ambiente equilibrado, por exemplo). Por parte do réu, todavia, em que se busca, essencialmente, sua condenação em obrigação que redundará em reflexos de natureza patrimonial, tudo se lhe deve permitir, ou seja, poderá o réu formalizar termo de compromisso de ajustamento, reconhecendo o dano causado e obrigando-se a repará-lo, poderá inclusive deixar de vir em juízo contestar a ação, sem que isso acarrete em disposição de direito indisponível”[24] (grifos nossos).

Na posição de Kazuo Watanabe, exposta em matéria da pós-graduação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, há a prática de disposição do bem transindividual quando a parte requer diretamente indenização, ainda que possível uma reparação in natura, eis que o objetivo principal é a reparação do dano causado.

A redução do conflito de natureza transindividual à solução consensual deve se orientar pela necessidade de se conferir aos direitos difusos a máxima efetividade, privilegiando-se, sempre que possível, a prevenção do ilícito e a recomposição in natura dos prejuízos causados.[25] Não se admite a compensação do dano se é possível efetuar a conduta principal.

Nessa construção doutrinária, o interesse transindividual, por ser o núcleo essencial indisponível, deve prever a integral reparação do dano causado e, para isso, “a exigência comum a qualquer das formas é a de que a transação compreenda todas as obrigações cabíveis e necessárias para a composição da ofensa”.[26]

Os termos constantes no ajustamento de conduta equivaleriam, portanto, às condições do pedido da ação civil pública, em sua plenitude. “A mesma pretensão que seria objeto do pedido de ação civil pública deverá estar contemplada no compromisso, não podendo, em nada, ser restringida. O responsável há de se sujeitar ao ressarcimento completo do dano, ou à realização da atividade necessária para fazer cessar a lesão, ou à abstenção, também necessária, para por fim à afetação do interesse coletivo ou difuso”[27].

Para tanto, antes da fixação das obrigações a serem cumpridas, o legitimado para tomar o termo de ajustamento de conduta necessita da apuração da situação, mediante a colheita de elementos idôneos, de natureza técnica, como perícias, documento ou depoimentos, para conhecer a natureza e a extensão do dano causado, para assim definir o grau de indisponibilidade material em questão.

Há de se reconhecer que, diante de tais considerações, por ser tão reduzida a margem de negociação, o acusado pelo dano muitas vezes se sente pouco atraído pela negociação, eis que, independente de processo, arcará com todas as obrigações finais da ação, inclusive e primordialmente com as obrigações de fazer e não fazer.


V.I. Hipóteses de vedação

Independente da discussão sobre a admissão ou não da transação no âmbito difuso, a vedação é incontroversa quando se trata de tutela do patrimônio público e moralidade administrativa.

Nessa hipótese, a ação civil pública disciplinada na Lei 8.429/92, que dispõe “sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego, função na Administração pública direta, indireta e fundacional”, não permite transação na parte referente à punição ao ato de improbidade administrativa.

Nada impede de que haja negociação em relação ao ressarcimento do dano, pois “no que se refere ao ressarcimento do dano e a perda da vantagem ilícita auferida pelo agente (enriquecimento ilícito), não há óbice ao termo de ajustamento. É que não se pode negar ao agente responsável a iniciativa de reparar, espontaneamente, o prejuízo causado ao erário, e de proceder a entrega, a título de perda em favor do Poder Público do produto ilicitamente obtido”.

Por outro lado, a vedação é expressa no art. 17, §1º do dispositivo legal acima mencionado, quanto à ausência de ambiente propício para atos de disposição processual ou material em matéria de cunho fortemente repressivo (perda do cargo público, suspensão de direitos políticos, seqüestro ou perdimento de bens). Essa atividade é privativa da jurisdição e só pode ser imposta por meio de processo judicial.


VI – Discricionariedade, realidade e conveniência

Na realidade, a discricionariedade quanto à disponibilidade do interesse transindividual fica a cargo do Ministério Público, ou do órgão legitimado para firmar o termo de ajustamento de conduta. Embora consciente da limitação material, o órgão ministerial não possui, de fato, aptidão para apurar exatamente a quantidade e extensão da lesão, a fim de impor as condições necessárias para a indisponibilidade do bem.

Apesar de inexistir doutrina que afirme expressamente a disposição de parte substancial dos direitos transindividuais, no meu entender, essa abdicação é, em certa medida, inevitável.

Um pensamento ortodoxo, de que todas as exigências necessárias para voltar ao status quo ante devem ser acordadas com o infrator, retrata uma utopia. Tanto pela impossibilidade de conhecimento de todos os requisitos necessários para a tutela do interesse transindividuais, quanto pela dificuldade de aceitação do particular à obrigações muito rígidas, que não valorizam a instrumentalidade do instituto, nem justificam a isenção do processo propriamente dito, em que se pode contra-argumentar e, eventualmente, ser absolvido.

Ainda na dinâmica de realidade prática, o Supremo Tribunal de Justiça, em Recurso Extraordinário nº 253885, de Minas Gerais, com a relatoria da Ministra Ellen Gracie, decidiu, em 04 de abril de 2002, que “em regra, os bens e o interesse público são indisponíveis, porque pertencem à coletividade. É, por isso, o Administrador, mero gestor da coisa pública, não tem disponibilidade sobre os interesses confiados à sua guarda e realização. Todavia, há casos em que o princípio da indisponibilidade do interesse público deve ser atenuado, mormente quando se tem em vista que a solução adotada pela Administração é a que melhor atenderá à ultimação deste interesse”.[28]

Obviamente, não se trata de discricionariedade ilimitada e irresponsável do tomador do ajustamento de conduta. Refere-se à disposição mínima necessária para que seja apresentada uma proposta plausível ao particular.

Tampouco deve haver práticas e maquinações ardilosas, cujo escopo visem a burlar a lei. Tal prática poderia até mesmo ser um conluio entre o órgão ministerial e a parte interessada que preferem a indenização à reparação efetiva do dano. Nesta medida, não se pode tolerar que qualquer legitimado possa celebrar transação extrajudicial[29] ou que algum órgão público possa firmar Termo de Ajustamento de Conduta que implique, ainda que indiretamente, violação à lei.[30]

Para essas situações, “quanto ao risco de que um acordo nesse tipo de ação possa porventura mascarar eventual colusão entre as partes, ou aninhar algum interesse subalterno”[31] (grifos do original), Rodolfo de Camargo Mancuso adverte para possibilidade de o juiz coibir tais maquinações, com base nos art. 125, III e 129, ambos do Código de Processo Civil e, ainda, a necessária atuação do Ministério Público como fiscal da lei, como meio de assegurar a legalidade e legitimidade do ato.

Em São Paulo, existe ainda a exigência de homologação pelo Conselho Superior do Ministério Público, que funciona como controle da atuação funcional do órgão ministerial.


VII – Conclusão: A busca da efetividade

Ainda que existam controvérsias sobre a viabilidade de utilização de mecanismos alternativos de solução de controvérsias no âmbito dos direitos transindividuais, o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos prevê, ao longo de toda sua redação, a aplicação desses institutos.

Com respeito aos atos de disponibilidade, destaca-se o art. 21:

Art. 21. Do termo de ajustamento de conduta. Preservada a indisponibilidade do bem jurídico protegido, o Ministério Público e os órgãos públicos legitimados, agindo com critérios de equilíbrio e imparcialidade, poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de conduta à lei, mediante fixação de modalidades e prazos para o cumprimento das obrigações assumidas e de multas por seu descumprimento.

§ 1º. Em caso de necessidade de outras diligências, os órgãos públicos legitimados poderão firmar compromisso preliminar de ajustamento de conduta.

§ 2º Quando a cominação for pecuniária, seu valor deverá ser suficiente e necessário para coibir o descumprimento da medida pactuada e poderá ser executada imediatamente, sem prejuízo da execução específica.

§ 3º. O termo de ajustamento de conduta terá natureza jurídica de transação, com eficácia de título executivo extrajudicial, sem prejuízo da possibilidade de homologação judicial do compromisso, hipótese em que sua eficácia será de título executivo judicial.”

A preocupação com a manutenção deste instituto nas novas formulações legislativas, ainda que controvertido, demonstra que o objetivo primordial é assegurar a efetiva tutela do interesse protegido, sem render homenagem estrita à forma em detrimento do conteúdo (instrumentalidade-efetividade), porque “no âmbito da ação civil pública, deve sempre prevalecer o interesse na efetiva tutela dos valores maiores da sociedade civil (...) e se o objeto colimado – proteção ou reparação ao interesse metaindividual ameaçado ou lesado – puder ser alcançado pela via negociada, com economia de tempo e de custos, não há motivo plausível para se negar legitimidade a essa solução consensual”. Ainda acrescenta Rodolfo de Camargo Mancuso que “a recusa ao acordo não se justifica, porque nas ações coletivas o interesse reside menos em “vencer” a causa do que em obter, de modo menos oneroso, ou menos impactante, a melhor tutela para o conflito judicializado”[32].

A preservação da indisponibilidade dos bens jurídicos coletivos permanece, limitando a transação à “fixação de modalidades e prazos para o cumprimento das obrigações assumidas”, em confirmação à orientação doutrinária e jurisprudencial que vigora atualmente, à luz da previsão contida no art. 5º, § 6º, da Lei de Ação Civil Pública.

A indisponibilidade do direito não será afetada em sua totalidade porque o objeto da transação versará principalmente sobre a maneira da implementação mais rápida do interesse tutelado e ficará prestigiada a instrumentalidade do processo. Assim, faz-se prevalecer o critério finalísco, sendo preferível uma solução negociada, que se apresente idônea e eficaz para resolver o conflito gerado, a uma perseguição obstinada pela via judicial, que pode ser morosa e imprevisível quanto ao seu resultado final.

Se a opção política do Estado direciona-se para a manutenção do instituto no ordenamento pátrio, seja no âmbito da ação civil pública, seja anteriormente, na fase de inquérito civil, a celebração de acordos sobre direitos transindividuais, em meu entender, deve aceitar explicitamente maior grau de amplitude de negociação, para garantia de sua efetividade.

Por versar sobre direitos cujo interesse é fundamentalmente social, qualquer negociação sobre condições procedimentais de obrigações resvala nos contornos materiais da controvérsia e, por esse motivo, faz-se necessária uma regulamentação clara quanto à preponderância do interesse público.

Bem elucida Geisa de Assis Rodrigues, que “a tutela, judicial ou extrajudicial, dos interesses transindividuais quase sempre implica realizações de ‘escolhas políticas’, ante a conflituosidade peculiar a estes direitos. Assim, uma solução técnico-jurídica de proteger em um dado momento um ecossistema pode implicar a erradicação de várias modalidades de atividades econômicas, com repercussões sociais enormes. Em outra situação, preservar um importante patrimônio histórico poder ser incompatível com um novo traçado urbano proposto para soluções de problemas de trânsito. A manutenção de um determinado patrimônio público pode colidir com a concepção de novos modelos de gestão, quiçá mais produtivos. Esses exemplos ilustram o quão tormentoso pode ser a definição do interesse transindividual que deva prevalecer, quando não há uma demonstração normativa clara de qual o interesse que deva ser resguardado.”[33]

Para as situações em que a disposição, ainda que mínima, de parcela dos direitos transindividuais mostra-se inevitável, deveria haver admissão da celebração de ajustamentos de conduta, pois, ao final, caso exista processo judicial, da mesma forma, a sentença condenatória, legitimada pela atuação do magistrado, irá se deparar com idêntica problemática: a concessão de parte do direito disponível na imposição das obrigações viáveis.

No lugar de retardar o mesmo resultado, prezando pela lógica legislativa de celeridade e eficácia, ainda que em sede extrajudicial, a hipótese de amplitude de negociação deveria ser considerada.

A exigência de fundamentação e a prévia disposição legal[34] que autorizasse o órgão ministerial e demais legitimados a efetuar sacrifício, em casos específicos, de direitos transindividuais em detrimento de outros interesses igualmente relevantes, seriam garantias para justificar a resolução consensual no caso concreto.

Exemplo dessa hipótese é a ocupação de população carente ribeirinha que possui seus únicos imóveis em região marginal de área de proteção permanente. O órgão ministerial deveria dispor de aparato que legitimasse eventual necessidade de manutenção desses indivíduos, em respeito ao direito à habitação, sem que houvesse a rígida imposição de indisponibilidade de direito ambiental.

Sem o intuito de burocratizar a transação, apenas para limitar o grau de discricionariedade e garantir maior segurança jurídica, a legislação pátria deveria prever a exigência de homologação judicial e controle pelo Conselho Superior do Ministério Público. Com o devido registro em bases de dados de livre acesso aos órgãos legitimados, a fim de evitar duplicidade de compromissos de ajustamento que versem sobre o mesmo objeto e ainda resguardar a eficácia e legitimidade do acordo realizado.


VIII – Referências Bibliográficas

ABELHA, Marcelo, Ação Civil Pública e Meio Ambiente. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.

AKAOUI, Fernando Reverendo Vidal, Compromisso de Ajustamento de Conduta Ambiental, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2003.

CALMON, Petrônio. Fundamentos da Mediação e da Conciliação. São Paulo: Forense, 2007.

CARNEIRO, Paulo Cesar Pinheiro Carneiro “A proteção dos Direitos Difusos Através do Compromisso de Ajustamento de Conduta Previsto na Lei que Disciplina a Ação Civil Pública (Lei n.º 7.347/85 – artigo 5º, § 6º)”, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, n. 1, jan-dez 1993, p. 263-272.

FINK, Daniel Roberto, “Alternativas à ação civil pública ambiental (reflexões sobre as vantagens do termo de ajustamento de conduta)”, in Édis Milaré (coord.), Ação civil pública – lei 7.347/1985 – 15 anos, 2ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2002.

GRINOVER, Ada Pellegrini, parecer fornecido aos caso da Sucocítrico Cutrale Ltda, em processo administrativo instaurado pela SDE.

­­­____________ “Os Fundamentos da Justiça Conciliativa”. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; KATANABE, Kazuo; LAGRASTA NETO, Caetano. Mediação e Gerenciamento do Processo: Revolução na Prestação Jurisdicional. São Paulo: Atlas, 2008, p. 1-5.

LENZA, Pedro, Teoria Geral da Ação Civil Pública, 2ª. ed. São Paulo: RT, 2005.

LOBÃO, Carla, “Compromisso de cessação de prática – uma abordagem crítica sobre o instituto”, in Revista do IBRAC, vol. VIII, nº VIII, 2001.

LÓPEZ CALERA, Nícolas. Hay derechos colectivos? Individualidad y socialidad en la teoría de los derechos. Barcelona: Ariel, 2000.

MACHADO, Antonio Carlos da Costa, Código de Processo Civil Interpretado, 2ª ed., São Paulo, Saraiva, 1996.

MACHADO, Paulo Affonso Leme, Direito Ambiental brasileiro, 13ª Ed., 2005.

Mancuso, Rodolfo. Ação civil pública: em defesa do meio ambiente, patrimônio cultural e dos consumidores. 7ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996, pp. 225/238.

MATTOS, César, “O compromisso de cessação de práticas anticompetitivas no CADE: uma abordagem de teoria dos jogos”, in Revista do IBRAC, vol. IV, nº IV, abril de 1997.

MAZILLI, Hugo Nigro, “Compromisso de Ajustamento de Conduta – Análise à luz do Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos” in GRINOVER, Ada Pellegrini [et all.], Direito Processual Coletivo e o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2007, pp. 231/243.

MAZZILLI, A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, 20ªed., São Paulo, Saraiva, 2007.

ORZARI, Octavio Augusto da Silva, Compromisso de ajustamento de conduta: eficácia na proteção de interesses transindividuais, tese de láurea defendida em 2004 perante a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

RODRIGUES, Geisa de Assis, “Breves considerações sobre o compromisso de cessação de prática”, in ROCHA, João Carlos de Carvalho (coord.), Lei antitruste – 10 anos de combate ao abuso de poder econômico, Belo Horizonte, Del Rey, 2005.

RODRIGUES, Geisa de Assis, Ação Civil Pública e Termo de Ajustamento de Conduta: Teoria e Prática, Rio de Janeiro: Forense, 2002.

____________, Ação Civil Pública e Termo de Ajustamento de Conduta: Teoria e Prática, Rio de Janeiro: Forense, 2002.

SOUZA, Luiz Antônio, “O efeito da revelia nas ações coletivas”, in Milaré, Edis, Ação Civil Pública: Lei 7.347/1985 – 15 anos, São Paulo, Revista dos Tribunais.

Vieira, Fernando Grella. A transação na esfera da tutela dos interesses difusos e coletivos: compromisso de ajustamento de conduta. In MILARÉ, Ação Civil Pública: Lei 7.347/1985 – 15 anos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, pp. 221/249.


Notas

[1] MAZZILLI, Hugo Nigro, “Compromisso de Ajustamento de Conduta – Análise à luz do Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos”, in GRINOVER, Ada Pellegrini, MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro e WATANABE, Kazuo (org.), Direito Processual Coletivo e o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2007, p. 232.

[2] VIEIRA, Fernando Grella, “A transação na esfera da Tutela dos Interesses Difusos e Coletivos: Compromisso de Ajustamento de Conduta”, in MILARÉ, Edis, Ação Civil Pública: Lei 7.347/1985 – 15 anos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001, p. 227.

[3] Este artigo foi posteriormente substituído pelo art. 57 de Lei 9.099/95, que regula os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, mantendo-se a possibilidade de o Ministério Público referendar acordos executivos extrajudiciais.

[4] MAZZILLI, A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, 20ªed., São Paulo, Saraiva, 2007, p. 380

[5] Art. 840 NCC: É lícito aos interessados prevenirem, ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas”

[6] O art. 841 é expresso ao afastar a possibilidade de transação a direitos indisponíveis, ao versar que “só quanto a direitos patrimoniais de caráter privado se permite a transação”.

[7] RODRIGUES, Geisa de Assis, Ação Civil Pública e Termo de Ajustamento de Conduta: Teoria e Prática, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 52.

[8] Confira-se, nessa esteira, a orientação de Paulo Cesar Pinheiro Carneiro: “Na realidade, o conteúdo do compromisso de ajustamento de conduta está mais próximo do reconhecimento de uma obrigação legal a cumprir, de um dever jurídico. Não existe tecnicamente uma transação, até porque este pressupõe concessões mútuas (art. 1.025, do Código Civil), situação que seria impossível em sede de direitos difusos e coletivos, indisponíveis que são. O ajustamento de conduta, como a sua própria expressão gramatical revela, pressupõe, necessariamente, que terceiro não esteja cumprindo as exigências legais relativas à sua própria conduta (‘lato sensu’) e, portanto, se comprometa a fazê-lo dentro de determinado prazo, sob pena de incidência de uma cominação. Portanto, o compromisso de ajustamento de conduta não pode implicar em qualquer tipo de renúncia de direitos, ou mesmo de outras concessões que possam implicar na aceitação de uma conduta, por parte de terceiro, que não espelhe o total atendimento, de acordo com a lei, à proteção do direito difuso em discussão. Assim, não poderiam os órgãos públicos legitimados firmar e aceitar o compromisso com terceiros concordar com uma conduta ou atividade que redundasse, exemplificativamente, somente na diminuição da poluição de um determinado rio; na veiculação de uma propaganda menos enganosa; na distribuição de um produto alimentar, revisto, que fizesse menos mal à saúde; na preservação de parte de um monumento histórico, etc...” em “A proteção dos Direitos Difusos Através do Compromisso de Ajustamento de Conduta Previsto na Lei que Disciplina a Ação Civil Pública (Lei n.º 7.347/85 – artigo 5º, § 6º”, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, n. 1, jan-dez 1993, p. 265.

[9] AKAOUI, Fernando Reverendo Vidal, Compromisso de Ajustamento de Conduta Ambiental, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2003, p. 71.

[10] MAZILLI, Hugo Nigro, “Compromisso de Ajustamento de Conduta – Análise à luz do Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos” in GRINOVER, Ada Pellegrini [et all.], Direito Processual Coletivo e o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2007, p. 238.

[11] MACHADO, Paulo Affonso Leme, Direito Ambiental brasileiro, 13ª Ed., 2005, p. 363.

[12] MAZZILLI, Hugo Nigro, “Compromisso de Ajustamento de Conduta – Análise à luz do Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos”, in GRINOVER, Ada Pellegrini, MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro e WATANABE, Kazuo (org.), Direito Processual Coletivo e o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2007, p. 238.

[13] A professora Ada Pellegrini Grinover, entre outros, cita os seguintes autores: FINK, Daniel Roberto, “Alternativas à ação civil pública ambiental (reflexões sobre as vantagens do termo de ajustamento de conduta)”, in Édis Milaré (coord.), Ação civil pública – lei 7.347/1985 – 15 anos, 2ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2002, pp. 119/120; ORZARI, Octavio Augusto da Silva, Compromisso de ajustamento de conduta: eficácia na proteção de interesses transindividuais, tese de láurea defendida em 2004 perante a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, p. 40; MATTOS, César, “O compromisso de cessação de práticas anticompetitivas no CADE: uma abordagem de teoria dos jogos”, in Revista do IBRAC, vol. IV, nº IV, abril de 1997, pp. 44/45.

[14] Trecho extraído do parecer fornecido aos caso da Sucocítrico Cutrale Ltda, em processo administrativo instaurado pela SDE.

[15] RODRIGUES, Geisa de Assis, “Breves considerações sobre o compromisso de cessação de prática”, in ROCHA, João Carlos de Carvalho (coord.), Lei antitruste – 10 anos de combate ao abuso de poder econômico, Belo Horizonte, Del Rey, 2005, pp. 122/123.

[16] LOBÃO, Carla, “Compromisso de cessação de prática – uma abordagem crítica sobre o instituto”, in Revista do IBRAC, vol. VIII, nº VIII, 2001, pp. 87/88.

[17] RODRIGUES, Geisa de Assis, Ação Civil Pública e Termo de Ajustamento de Conduta: Teoria e Prática, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 51.

[18] MACHADO, Antonio Carlos da Costa, Código de Processo Civil Interpretado, 2ª ed., São Paulo, Saraiva, 1996, p. 324.

[19] VIEIRA, Fernando Grella, “A transação na esfera da Tutela dos Interesses Difusos e Coletivos: Compromisso de Ajustamento de Conduta”, in MILARÉ, Edis, Ação Civil Pública: Lei 7.347/1985 – 15 anos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001, p. 225.

[20] VIEIRA, Fernando Grella, “A transação na esfera da Tutela dos Interesses Difusos e Coletivos: Compromisso de Ajustamento de Conduta”, in MILARÉ, Edis, Ação Civil Pública: Lei 7.347/1985 – 15 anos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001, pp. 225 e 26: “Assim, não obstante a natureza do direito coletivo possa comportar, eventualmente, a disponibilidade do ponto de vista da pessoa individualmente afetada não desfrutará da mesma característica em sede de tutela coletiva”.

[21] “Algumas considerações tem sido levantadas, para afirmar que nem todo direito indisponível é intransigível. Todavia, essa afirmação vai de encontro às definições clássicas sobre a transação. Certo é, então, assumir o debate sobre a disponibilidade dos bens, revisitando este instituto à luz do pensamento moderno dominante.” (CALMON, Petrônio. Fundamentos da Mediação e da Conciliação. São Paulo, Forense, 2007, p. 10); “Inexistindo expressa vedação legal (vide, por exemplo, o § 1º do art. 17 da Lei de Improbidade Administrativa – Lei 8.429/92), em tese, orienta-se pela permissibilidade da transação, desde que é claro, a concessão que deva ser feita seja mais eficiente para a manutenção e proteção dos bens difusos que a continuidade da demanda judicial. Observa-se que a concessão (aspecto material inerente à transação) não significa abrir mão do direito material, mas, em realidade, limita-se à forma e termo do ajuste, a fim de se garantir uma maior proteção do bem difuso em litígio.” (LENZA, Pedro, Teoria Geral da Ação Civil Pública, 2ª. ed. São Paulo, RT, 2005, p. 79).

[22] Veja-se, a propósito, o art. 23, XV da Lei n.º 8.987/95, que versa sobre normas gerais para concessão e permissão de serviços públicos; a Lei n.º 9.472/97, em seu art. 93, XV, que dispões que os contratos de concessão celebrados pela ANATEL disporão o modo extrajudicial de divergências contratuais; a Lei n.º 9.478, art. 43, X, que determina que os contratos de concessão firmados pela Agência Nacional do Petróleo incluirão regras sobre solução de controvérsias relacionadas ao contrato e sua execução.

[23] MANCUSO, Rodolfo, Ação Civil Pública: em Defesa do Meio Ambiente, Patrimônio Cultural e dos Consumidores, 7ªed., São Paulo, Revista dos Tribuanais, 1996, p. 246.

[24] SOUZA, Luiz Antônio, “O efeito da revelia nas ações coletivas”, in Milaré, Edis, Ação Civil Pública: Lei 7.347/1985 – 15 anos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001 p. 523.

[25] “Fazendo um paralelo com o princípio da maior coincidência possível, o objetivo do CACEL deve ser tal qual que o resultado que persegue deveria corresponder àquilo que se teria caso houvesse o comportamento espontâneo do compromissário no cumprimento da norma concreta. Apenas o modo de cumprimento, o prazo, as regras dessa adequação é que podem variar” em ABELHA, Marcelo, Ação Civil Pública e Meio Ambiente. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 95.

[26] VIEIRA, Fernando Grella, “A transação na esfera da Tutela dos Interesses Difusos e Coletivos: Compromisso de Ajustamento de Conduta”, in MILARÉ, Edis, Ação Civil Pública: Lei 7.347/1985 – 15 anos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001, p. 229.

[27] VIEIRA, Fernando Grella, “A transação na esfera da Tutela dos Interesses Difusos e Coletivos: Compromisso de Ajustamento de Conduta”, in MILARÉ, Edis, Ação Civil Pública: Lei 7.347/1985 – 15 anos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001, p. 238.

[28] http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp, acessado em 24 de novembro de 2008.

[29] Analisando a situação pelo prisma do réu em potencial, parece interessante as negociações sejam promovidas com a participação de todos os legitimados, ou ao menos de todos conhecidos, face à legitimidade concorrente e disjuntiva que orienta a sistemática brasileira de tutela dos direitos coletivos. Desta forma, o infrator se resguarda da possibilidade de ver as bases da composição questionada na justiça por outro ente legitimado.

[30] Nessa esteira, o Regimento Interno do Conselho Superior do Ministério Público Paulista dispõe, em seu art. 234, parágrafo único I, que “[...] vedada a dispensa, total ou parcial, das obrigações reclamadas para a efetiva satisfação do interesse lesado, devendo restringir-se às condições de cumprimento das obrigações, como modo, tempo, lugar ou outras semelhantes.” Confira-se também o enunciado das Súmulas n.º 4 e 9: “Tendo havido compromisso de ajustamento que atenda integralmente à defesa dos interesses difusos objetivados no inquérito civil, é caso de homologação do arquivamento do inquérito.” E “Só será homologada a promoção de arquivamento de inquérito civil, em decorrência do compromisso de ajustamento, se deste constar que seu não cumprimento sujeitará o infrator a suportar a execução do título executivo extrajudicial ali formado, devendo a obrigação ser certa quanto à sua existência, e determinada, quanto ao seu objeto”,' respectivamente.

[31] MANCUSO, Rodolfo, Ação Civil Pública: em Defesa do Meio Ambiente, Patrimônio Cultural e dos Consumidores, 7ªed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1996, p. 238.

[32] MANCUSO, Rodolfo, Ação Civil Pública: em Defesa do Meio Ambiente, Patrimônio Cultural e dos Consumidores, 7ªed., São Paulo, Revista dos Tribuanais, 1996, pp. 236 e 237.

[33] RODRIGUES, Geisa de Assis, Ação Civil Pública e Termo de Ajustamento de Conduta: Teoria e Prática, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 135/136.

[34] Como se fez na Lei n.º 8.8884/94, em que se permite que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE autorize atos que, em tese, poderiam prejudicar o direito transindividual da livre concorrência, desde que atendidas algumas condições específicas que demonstrem que a conduta empresarial possa ensejar um benefício maior para o sistema que o eventual comprometimento deste valor. A norma expressamente supõe a ponderação de bens e valores de relevo para o ordenamento jurídico, em RODRIGUES, Geisa de Assis, Ação Civil Pública e Termo de Ajustamento de Conduta: Teoria e Prática, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 113.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

YOKAICHIYA, Cristina Emy. A transação como ato de disponibilidade de direitos transindividuais?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3358, 10 set. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22581. Acesso em: 28 mar. 2024.