Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/22585
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Os limites jurídicos da publicidade nas relações de consumo brasileiras: as manipulações de desejo nas relações pré-contratuais consumeristas.

Os limites jurídicos da publicidade nas relações de consumo brasileiras: as manipulações de desejo nas relações pré-contratuais consumeristas.

Publicado em . Elaborado em .

Analisa-se a responsabilidade civil quando da utilização das técnicas publicitárias na manipulação do desejo do consumidor, fazendo com que este adquira produtos ou serviços que, muitas das vezes, não necessita de fato, afetando sua dignidade e sua consciente autonomia da vontade.

Resumo: A presente pesquisa sócio-jurídica analisa a responsabilidade civil, o dano moral e os direitos consumeristas ante a prática de publicidade. Seguramente são explorados artigos do Código de Defesa do Consumidor (CDC) para averiguar a existência e quais os limites de tal responsabilidade. Nisto, tivemos a oportunidade de estudar áreas múltiplas do Direito, principalmente de Civil (Responsabilidade Civil, Contratos, Consumidor), Direito Constitucional e, assim, viabilizar soluções éticas e legais para os problemas formulados. E na área das ciências sociais aplicadas, a Comunicação Social e da Sociologia. Deste modo, esperamos que, com a utilização do material pesquisado, demonstremos que cabe ao Direito (ordem jurídica) conter o avanço do consumo e da publicidade (ordem social) em respeito à autonomia da vontade do consumidor.

Palavras-chave: consumo, publicidade, responsabilidade civil, autonomia da vontade, dano moral.

Sumário: INTRODUÇÃO. 1. A PUBLICIDADE. 1.1 Aspectos gerais. 1.2 A psicologia e as técnicas de persuasão. 1.3 O estímulo para o consumo. 1.4 Duas técnicas de vendas. 2 O CÓDIGO DE DEFESA E PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR. 2.1 Prelúdio. 2.2 Da sua origem nos direitos fundamentais. 2.3 Dos direitos básicos dos consumidores. 2.4 A relação jurídica de consumo. 2.5 A publicidade no Código de Direito do Consumidor. 2.6 A vulnerabilidade do consumidor. 3 A PUBLICIDADE NOCIVA. 3.1 Publicidade nociva na Lei nº 8.078/90. 3.2 Publicidade abusiva. 3.3 Publicidade enganosa. 4. RESPONSABILIDADE CIVIL NA PUBLICIDADE. 4.1 Noções gerais da responsabilidade jurídica civil. 4.2 A publicidade atual na ótica da responsabilidade civil. 4.3 Dano moral decorrente de publicidade nociva. CONCLUSÃO. Referências Bibliográficas


INTRODUÇÃO

A publicidade a cada ano tem se munido de táticas psicológicas para vender as marcas e produtos de seus clientes como se fossem intrínsecos à necessidade humana ou mesmo tragam algum benefício imaterial, tais como beleza, segurança, status. Tal atividade humana que, inicialmente surgiu para informar a existência de um produto ou serviço para o mercado, transformou o consumo em um conceito de vida. Todos, independentemente de idade, escolaridade, classe social e/ou econômica, estamos sujeitos a esta indução.

Para tanto, este tema interdisciplinar investiga, no direito, a responsabilidade civil por parte da publicidade (tendo como principal executor a agência publicitária) quando da utilização das técnicas publicitárias na manipulação do desejo do consumidor, fazendo com que este adquira produtos ou serviços que, muitas das vezes, não necessita de fato, afetando sua dignidade e sua consciente autonomia da vontade.

Com o intuito de unir duas formações acadêmicas (a primeira em Comunicação Social com habilitação em publicidade e propaganda, e a segunda em Direito), a autora almeja acrescentar à pesquisa acadêmica esta análise crítica da publicidade frente ao direito do consumidor. Deste modo, o conhecimento em ambas as áreas do conhecimento trazem familiaridade suficiente com o tema proposto.

Este estudo teve início com a tese “A Publicidade e a dignidade do consumidor”, trabalho selecionado e aprovado no Seminário de Teses Independentes, realizado na ocasião do IX CONGRESSO BRASILEIRO DE DIREITO DO CONSUMIDOR (2008). O professor e jurista português Mário Frota, um dos convidados do evento e componente da Mesa Examinadora, publicou o livro “A publicidade infanto-juvenil: perversões e perspectivas” (2007). Houve uma enriquecedora discussão sobre o poder persuasivo da publicidade. E é exultante com a receptividade da proposta exposta que, nessa temática, o presente trabalho analisa a possibilidade de responsabilização civil na publicidade.

Para contextualizar, vejamos o caso hipotético: um consumidor médio adquire um produto que realmente não necessitava achando que o mesmo o traria status. Ao se conscientizar (por intermédio da educação para o consumo) que isso não passa de uma estratégia de marketing, pode ele requerer dano moral em juízo? Mas há dano moral? Há de fato autonomia da vontade com tantas técnicas de persuasão? Enquadraria em publicidade enganosa ou abusiva? E quais seriam as consequências jurídicas para as situações pré-contratuais? Um delas certamente é que iriam surgir muitas outras pessoas requerendo uma indenização, alegando terem sidas ludibriadas pela publicidade, criando um intricado caos no mercado econômico.

Até o ano de 1990 não havia regramento jurídico específico para regular os agentes publicitários e o mercado de consumo no Brasil. Os próprios órgãos corporativos limitavam com exclusividade a atuação da classe. O CONAR, Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária, é uma entidade privada, cujo Código define os limites da publicidade, no intuito de evitar abusos do mercado. Mas não tem coercividade, consistindo tão somente no controle interno da publicidade. Portanto, foi após a publicação do Código de Defesa e Proteção do Consumidor (CDC, Lei nº 8.078/90), que se tem início o controle jurídico das relações de consumo especificadas.[1]

Ademais, o Código de Defesa do Consumidor se ocupa também da publicidade, pois é esta que traz ao público produtos e serviços, incentivando o consumo.

Importante frisar que a figura jurídica em destaque desse regramento é o consumidor, sujeito do dever de proteção do Código de Defesa do Consumidor, que é sempre suscetível às táticas das mensagens publicitárias cada vez mais capciosas. E o consumidor brasileiro, além de suscetível, é inerte. E pelo fato dessa passividade, não exige apenas a proteção, mas, sobretudo, a tutela de seus direitos por intermédio do Estado. Vale ressaltar que tutela e proteção não são termos sinônimos. Proteção é a solução que substitui o interesse e resguarda o indivíduo a partir da incapacidade do tutelado em se manifestar, enquanto tutela abrange apenas as medidas necessárias para o freio das vontades ou atos volitivos. E os dois devidamente foram recepcionados pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei Nº 8.078/90).

Conforme já explanado, a publicidade, com sua finalidade de vender, cria ilusões de que produtos ou serviços irão satisfazer todas as necessidades dos consumidores, manipulando assim seus desejos de consumo. A incutir a idéia do “ter” em detrimento do “ser”, desenvolve pessoas sempre insatisfeitas, que buscam no consumo a realização pessoal.

Interessante citar o comentário do juiz federal William Douglas, em um de seus populares livros, a respeito da sociedade de consumo atual:

Parece que somos educados para não nos amarmos, para acharmos que devíamos ou podíamos ser mais inteligentes, mais bonitos, mais amados, mais simpáticos ou mais ricos do que realmente somos. Existe todo um arsenal de frases feitas, chavões e preconceitos que nos forçam a querer mais, esperar mais, etc. Ao lado disso, as propagandas de rádio, TV, impressas etc, sempre procuram nos vender a imagem de que algo está faltando, algo precisa ser feito, admirado ou adquirido para que a vida seja perfeita. Além disso, vivemos em uma sociedade que de cristã tem apenas o nome, pois é, no âmago, materialista, frívola e consumista, valendo para ela as pessoas pelo o que têm e não pelo o que são.[2] (grifo nosso)

Não obstante, esse consumo desenfreado para a satisfação das necessidades pessoais, estas que nunca serão completamente atendidas, traz à tona uma espécie de publicidade abusiva, na medida em que induz a compra como solução para problemas de valores morais e sociais. Seu consumo promete preencher desejos, faltas, vazios, gerando uma sociedade superficial e, pior, sem responsabilidade de consumo. Uma sociedade composta de consumidores expostos às práticas abusivas que, no Código de Defesa e Proteção do Consumidor, podem muito bem serem definidos como consumidores por equiparação.[3]

Para desenvolver esta pesquisa, as fontes foram bibliográficas e documentais, desde livros e jurisprudências, a periódicos e páginas na internet. Dentre os livros jurídicos utilizados, foram estudados doutrinadores consagrados como Antônio Herman V. Benjamin, Rizzardo Nunes, Paulo Roberto Roque Khouri, Hector Valverde Santana, Sérgio Cavalieri Filho. A obra “Publicidade abusiva”, de Suzana M. Pimenta Catta Preta Federigui, contribuiu como referência básica para a análise do tema aqui proposto. Os fichamentos de diversas obras apresentaram os conceitos e questionamentos necessários para a monografia. Não há obrigação de se conhecer os pormenores de toda a estrutura publicitária ou mesmo a estratégia de marketing; não é oportuno tornar isto uma pesquisa de comunicação. Contudo, faz-se necessário discutir aspectos da atuação das campanhas publicitárias.

De tal modo, este trabalho foi dividido em quatro capítulos. No primeiro, conheceremos em sucinto texto aspectos gerais da publicidade e seus mecanismos de persuasão para o consumo no primeiro capítulo. O segundo abrange o próprio Código de Defesa do Consumidor (CDC), tratando de sua existência, a influência dos direitos fundamentais, quais os direitos básicos dos consumidores, a relação jurídica, qual o foco é dado à publicidade, e à temática da vulnerabilidade.

Os dois últimos são mais específicos. O terceiro analisa a publicidade nociva, que é dividida primariamente em abusiva e enganosa. E o quarto, a incidência da responsabilidade civil na publicidade, as noções gerais, o tratamento dado nos casos de relações de consumo pré-contratuais, e a aplicação do dano moral.

Enfim, a finalidade deste trabalho é social, analisando os aspectos subjetivos do consumo e, em seguida, trazer soluções para tutelar os cidadãos e também torná-los consumidores mais conscientes. Estes últimos são a resposta para uma sociedade equilibrada. Consumidores conscientes e bem informados são aqueles que não se deixam influenciar por produtos ou serviços que, para a manutenção do mercado econômico, devem ser vendidos. O intento é proporcionar à publicidade um controle mais estatal e jurídico que limite sua atividade, sem prejudicar os consumidores e nem o mercado econômico.

Destarte, esperamos que, com a utilização do material pesquisado, possamos estimular o estudo sobre os limites para o avanço da publicidade em respeito à dignidade do consumidor. E se for o caso, responsabilizar quem os violar.


1. A PUBLICIDADE

1.1 Aspectos gerais

Segundo Sant’Anna, “comunicar bem é um dos grandes segredos do êxito em nossa sociedade. E a propaganda é, por excelência, a técnica de comunicar”.[4]

O Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (CBAP), redigido pelo CONAR, não faz distinção entre publicidade e propaganda, definindo ambos termos como “toda atividade destinada e estimular o consumo de bens e serviços, bem como promover instituições, conceitos e idéias”.[5] Os meios utilizados são os mesmos, o que as diferencia é somente o objeto. Ensina Antônio Herman Benjamin que a diferença reside no que diz respeito ao lucro: este é o objetivo da publicidade; na propaganda, isso não é obrigatório.[6]

A concepção jurídico-doutrinária segue esta linha, não se ocupando da diferenciação léxica, mas do objeto. Assim, publicidade – ou propaganda[7]- nos dizeres do professor Eugênio Malanga, além de comunicar, “é a arte de despertar, no público, o desejo de compra, levando-o à ação”. Portanto, ela é um poderoso instrumento de venda, posto que “através de sua técnica e da arte de bem anunciar que se aumenta, vertiginosamente, o consumo de milhares de produtos”.[8] Em resumo, a publicidade torna conhecido um produto, serviço ou uma marca, com o objetivo de despertar o desejo de consumo, destacando qualidades e diferenciando-o dos demais concorrentes.

Seu desenvolvimento ao que hoje conhecemos como publicidade comercial deve-se ao crescimento industrial do século retrasado. As primeiras fábricas limitavam-se a produzir o que o consumidor necessitava e o que este tinha condições de adquirir. O avanço da tecnologia trouxe a produção em massa. Nisso, os industriais precisavam escoar o excesso de produção, surgindo assim a publicidade. A partir dela, o mercado o consumidor não consumia apenas o que necessitava: a publicidade contribuiria para promover novos hábitos de consumo além das necessidades básicas (cite-se vestuário, alimentação, moradia, saúde). Como parte integrante do processo de desenvolvimento econômico, é por ela disseminada a ideia de status ao se adquirir objetos ligados ao conforto e lazer.[9]

As empresas anunciantes simplesmente justificam seus gastos publicitários em campanhas e ações bem elaboradas devido ao aumento da concorrência.[10] Porém, mais do que a produção, hoje é o consumo o objetivo mais importante nas ações de comunicação, levando o consumidor ao produto:

A criação de uma massa de consumidores por meio da incessante e avassaladora indução ao consumo acarreta a necessidade de um maior controle por parte das legislações especiais, notadamente no que se refere à oferta, uma vez essa aparente “democratização” do consumo significou, em última análise, que passaram a ser potenciais consumidores todas as pessoas, estejam elas capacitadas, ou não, para agir com discernimento no mercado, bastando que, para isso, liguem a TV, o rádio, leiam um jornal ou revista, observem um outdoor, recebam a visita de um representante etc.[11] [grifo nosso]

Seguindo o raciocínio de Sant’Anna, uma das principais características da sociedade contemporânea é o hedonismo. O professor Francisco Gracioso a cita em um de seus artigos como “a busca frenética pelo prazer que leva à obsessão pelo espetáculo”.[12] Soma-se a isso o surgimento de tribos urbanas, que na necessidade de se diferenciarem do restante da sociedade, acabam por consumir produtos criados exclusivos para elas. Desta forma, e no geral, as campanhas publicitárias de hoje vão além de vender um produto ou serviço: vendem uma ideia a todos de que é possível ser alguém bastando ter algo. O que conta é a experiência, é o ser alguma coisa por intermédio do objeto adquirido.

Com tudo isso, o que se percebe atualmente é certo destrato com o consumidor quando, no intuito de fazer vender, o mercado publicitário utiliza imagens de crianças, adolescentes, velhos, mulheres. Aliás, crianças e adolescentes também são as principais “vítimas” dos anúncios publicitários. Na faixa etária em que encontram, estes têm a necessidade de se adequar em seus grupos sociais. Nisso, sobejam mensagens publicitárias de que o biscoito tal é o melhor porque “traz energia”, ou a roupa ou o produto tal “torna-o mais bonito, interessante”. O jurista português Mário Frota aborda essas questões em seu livro, explicando a fragilidade do público infantil.[13]

Mas adultos também são influenciados com essa abordagem. No mais, a publicidade deveria se ater a mostrar o produto, divulgar sua marca, mas nunca apresentá-lo como solução abstrata de problemas. É racional saber que usar o xampu ‘x’ não trará felicidade, ou comprar o perfume “y” não tornará alguém atraente. Contudo, o emocional, ou o “leão” dos consumidores os levam a consumir por motivos de carência emocional. Augusto Cury, famoso psiquiatra e autor de livros de auto-ajuda, explica muito bem essa situação:

Esse sistema não tem por objetivo produzir pessoas resolvidas, saudáveis e felizes; a ele interessa as insatisfeitas consigo mesmas, pois quanto mais ansiosas, mais consumistas se tornam. [grifo nosso] [14]

Todavia, a publicidade também não deve ser encarada como um “monstro social”, visto que bem utilizada, é uma fonte de economia para os produtores e de também de benefícios para os consumidores. No primeiro caso, por estimular o mercado e, no segundo, por informar. A publicidade voltada para a venda de produtos ou serviços proporciona os seguintes efeitos na economia das empresas: cria e amplia mercados, regula o consumo, reduz custos industriais (por intermédio de uma produção em série de itens padronizados aos consumidores), age sobre os preços, regula os estoques, e melhora a qualidade do que é oferecido (para não comprometer o fabricante e o prestígio da empresa com produtos de má qualidade), entre outros, o que também favorece os consumidores.[15]

Por todas essas peculiaridades, Sant´Anna ainda instiga com os seguintes questionamentos:

A publicidade é uma das maiores forças da atualidade. Para seus defensores, a propaganda vende, educa e estimula o progresso; para muitos dos críticos, induz as pessoas a consumirem o que não necessitam. E para nós? E para a nossa realidade brasileira? E para a sua realidade regional? Como a propaganda pode realmente desempenhar a sua vocação de desenvolvimento social e econômico? Essas são as perguntas que todo profissional consciente sempre se faz cotidianamente para atuar com coerência e ética.[16]

Há um meio termo a ser encontrado para manter uma atividade publicitária ética. No meio publicitário é comum sustentar o dogma do princípio da liberdade de expressão. Também conhecido como manifestação do pensamento, é elencado no artigo 5º, “dos Direitos e Deveres Fundamentais”, na Constituição Federal brasileira. Contido, não existe direito ou garantia ilimitados, mesmo que amparados pela Carta Magna. Quando em conflito, baliza-se pelo princípio da dignidade humana, que veremos adiante.[17]

No mais, é imprescindível lembrar que existem outros princípios, e o que nos interessa é o que mais preserva o direito a uma vida com qualidade, e respeita tanto a integridade física quanto psíquica do indivíduo. E a prática publicitária deve se adequar a essa visão.

1.2 A psicologia e as técnicas de persuasão

Por trás da mensagem publicitária, há a psicologia. Quem estuda Publicidade certamente teve aulas de psicologia. A importância é precisamente entender o consumidor e torná-lo suscetível às mensagens.[18] Afinal, como as pessoas não são máquinas programáveis, são necessários estudos ininterruptos de psicologia, e também de sociologia, para garantir o impacto da publicidade no público alvo.[19]

Como bem orienta o pioneiro publicitário Hopkins:

o publicitário competente deve entender de psicologia. Quanto mais conhecer sobre ela, melhor. Deve aprender que determinados efeitos levam a determinadas reações e, usar tal conhecimento para melhorar resultados e evitar erros. [20]

Segundo os estudos psicológicos de Weil e Tompakow, os seres humanos são comparados à Esfinge egípcia: corpo de boi, tórax de leão, asas de água e cabeça de homem. Qual a importância dessa alegoria? O boi representa a vida instintiva e vegetariana. O leão, a vida emocional. A águia, a vida mental (intelectual e espiritual). O arremate é que o homem é o conjunto desses três animais. A parte “águia” é a única que detém conscientemente o controle do corpo sobre a mente, enquanto o “boi” e o “leão” são claramente as partes humanas as quais a publicidade atua, a fim de que o consumidor ceda aos apelos persuasivos e subliminares.[21] Conforme Malanga, há ainda a publicidade subliminar, que embora seja proibido seu uso, é “um tipo da publicidade que consiste em influenciar o subconsciente, evidentemente sem a percepção consciente”.[22]

Em suas pesquisas, W. J. Thomaz estabeleceu quatro desejos humanos fundamentais, quais sejam, o desejo de atividade, segurança, reciprocidade e aprovação. Esses desejos são constantemente inseridos nas campanhas publicitárias.[23] E são cinco os fundamentos psicológicos, conforme cita Malanga, utilizados para acionar tais desejos: chamar a atenção (visual ou auditiva) do consumidor, provocar seu interesse, desencadear emoções para estimular o desejo de compra, criar a convicção de que tal artigo anunciado (produto, serviço ou marca) é o ideal e, por último, impor sugestivamente a necessidade de comprá-lo, transformando então o desejo vago em ação.[24]

Nesse sentido, explana a socióloga Vera Aldrighi que o consumidor tem necessidades, crenças, sentimentos. E é por meio dos estímulos da publicidade (visuais, emotivos, persuasivos etc), a promessa de benefícios de um produto o faz gerar expectativas de desempenho. Essas despertam o desejo e o interesse em usar o produto, comprando-o. Tudo com base em pesquisas de comportamento e de mercado.[25] E a comunicação de massa, em especial a eletrônica (televisão, rádio, internet) tem enorme apelo e penetração na sociedade, criando um estilo de vida, aproveitando da vulnerabilidade do consumidor.[26]

O objetivo da ação publicitária, seja ela qual for, é intrinsecamente difundir hábitos de consumo, atitudes e valores na sociedade, utilizando-se da linguagem conativa para alterar os padrões do mercado, mesmo os antigos.[27]

Quanto à redação das campanhas, o livro de Carrascoza que trata do texto publicitário demonstra bem a mudança na forma apelativa (função conativa da linguagem) da publicidade ao longo dos anos.[28] Sua função de linguagem sempre será a conativa. Contudo, até meados dos anos 70, os textos publicitários continham expressões diretas como “compre”, “adquira”, sempre focalizados em apresentar as qualidades extrínsecas dos produtos e serviços. Atualmente está, em geral, mais discreta. Ainda conforme Carrascoza, para se construir um texto persuasivo, há cuidadosa escolha lexical como recurso expressivo.[29] Discursos persuasivos “aconselham” o destinatário a comprar, ou seja, discursos deliberativos, direcionando a mensagem aos benefícios intrínsecos que o produto oferece para a satisfação pessoal do consumidor. É um jogo de palavras que cria uma imagem atraente na mente do consumidor.

No mais, fatores de ordem física, fisiológica e psicológica influem no comportamento de compra.[30] Por exemplo, além do texto especialmente elaborado, o uso de determinada cor ou um ritmo musical pode impactar o consumidor, aumentando o poder da mensagem publicitária. Se esta mensagem é a ideia a ser propagada pela publicidade, as cores e sons são como molduras, preparadas com o intuito de reforçar tal mensagem.

Ressalte-se, ainda, o uso das propagandas ou mensagens subliminares. Embora vedadas em diversos países (no Brasil, o artigo 36 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor proíbe implicitamente seu uso), são divulgadas regularmente, seja na forma de anúncios, odores (por exemplo, o “perfume de carro novo”), sons. Afinal, como se trata de mensagem sutil, abaixo no limiar de percepção, é complexo detectá-la. São estímulos que passam despercebidos pelo consciente das pessoas.[31]

As ditas propagandas subliminares são mensagens subconscientes elaboradas para envolver os consumidores, e é uma das técnicas de persuasão mais predominante do que se imagina.

Nisso tudo, percebe-se que a publicidade não é simplesmente um texto com uma imagem e/ou música agradável, mas um elaborado processo de comunicação, permeado por pesquisas de comportamento, carências humanas, ligações emocionais com produtos e serviços, persuasão psicológica, estímulos sensitivos etc. Tudo para gerar o consumo.

1.3 O estímulo para o consumo

Compreende-se que a função da publicidade é mista: por um lado, é disseminar ideias e informações sobre produtos e serviços existentes, e de outro, aumentar os negócios dos anunciantes com a conquista de mais consumidores. Mas seu objetivo é claro e único: gerar consumo:[32]

[...] o mercado da oferta parece-nos comandar o da procura em certa medida, uma vez que, sendo detentor dos meios de comunicação, das informações e de mecanismos cada vez mais modernos de propaganda e publicidade, faz chegar ao público a idéia da necessidade e da conveniência da aquisição de produtos e serviços postos à disposição no mercado de consumo.[33]

Roberto Corrêa remata que a publicidade se apóia em três necessidades. A primeira é difundir produtor, marca ou serviço, associando-o a uma imagem positiva. A segunda é persuadir, convencendo o consumidor de que é que está sendo oferecido é a melhor opção para suas necessidades. E por fim, motivar o consumidor, levando-o à ação de compra.[34]

As pessoas tendem a comprar (ou usar) os produtos (e serviços) que mais conhecem, nos quais acreditam mais e sobre os quais estão mais bem informadas. Ademais, com o intuito de se identificarem em um grupo social desejado, o comportamento de outras pessoas afeta a experiência de compra.

Este é mote do fenômeno do “neurônio-espelho”, citado por Lindstrom. O cérebro, movido por hormônios, em especial a dopamina (hormônio do prazer) é um dos motivos pelos quais se imita o comportamento alheio, subjugando o pensamento racional, e finalmente, comprando.[35] Assim, em síntese, o consumidor vê uma imagem, se identifica com ela e com o que ela transmite. Ao adquirir o produto oferecido, é como se estivesse comprando uma imagem que gostaria de ser, uma atitude que almeja ter. Ele acredita que se tornou aquilo que viu, se espelhando em algo que aprova.

Essa imitação regida pelo subconsciente - e muito utilizada pela publicidade como um dos recursos de vendas - é responsável também pelo que se chama “moda” ou “modismo”. Quando se vê um produto repetidamente em uso por muitas pessoas, esse se torna mais desejável, um objeto de inclusão social. É uma técnica associativa muito aplicada pela publicidade, em conjunto com as mensagens subliminares.

Destarte, uma característica positiva de nosso cérebro, que é a responsável pela empatia humana, tem sido empregada para despertar o desejo no consumidor e a motivação para a compra.

Infelizmente, é também por intermédio dessa conexão cerebral que muitos jovens ainda fumam, mesmo sabendo dos perigos do cigarro à saúde, e muitas mulheres (jovens ou adultas) estão com anorexia e bulimia, na conquista de corpos magérrimos e pouco saudáveis. Estes são exemplos extremamente negativos da força do fenômeno da imitação, ou dos “neurônios-espelho”. Nessa análise, Lindstrom finaliza o capítulo alertando que o futuro da publicidade não é necessariamente a propaganda enganosa, mas justamente o uso dos “neurônios-espelho” de forma indevida.[36]

1.4 Duas técnicas de vendas

Importa exemplificar as duas técnicas de apresentação de produtos e serviços que são bastante utilizadas nas veiculações publicitárias e que podem, e muito, induzir o consumidor a desejar algo além do objeto em si: o testemunho e o merchandising.

Entre inúmeras outras eficientes técnicas de vendas, a testemunhal é uma das que mais induzem o consumidor (pois os “neurônios-espelho” são bem estimulados). Nesta, utiliza-se do depoimento de pessoas conhecidas do público consumidor (ou então técnicos, peritos, profissionais ou consumidores comuns) para vender, enaltecer as qualidades, fazer acreditar nos resultados.

Por ser uma técnica tão influenciadora, o CONAR reservou um capítulo exclusivo para em seu Código Brasileiro de Autoorregulamentação Publicitária (CBAP). Esta norma extrajudicial permite às agências publicitárias o uso de testemunhas em seus anúncios, desde que tais depoimentos sejam ligados à experiência passada ou presente do depoente e seja passível de comprovação (art. 27, § 9º, alínea a, CBAP) dentre outras regras para o sistema publicitário:

Parágrafo 9.º - Testemunhais

a) O anúncio abrigara apenas depoimentos personalizados e genuínos, ligados a experiência passada ou presente de quem presta o depoimento, ou daquele a quem o depoente personificar;

b) O testemunho utilizado deve ser sempre comprovável;

c) Quando se usam modelos sem personalização, permite-se o depoimento como "licença Publicitária" que, em nenhuma hipótese, se procurará confundir com um testemunhal;

d) O uso de modelos trajados com uniformes, fardas ou vestimentas características de uma profissão não deverá induzir o Consumidor a erro e será sempre limitado pelas normas éticas da profissão retratada;

e) O uso de sósias depende de autorização da pessoa retratada ou imitada e não deverá induzir a confusão.

Evidente que “a autorregulamentação reconhece no testemunho, em qualquer de suas modalidades, técnica capaz de conferir maior força de comunicação, persuasão e credibilidade à mensagem publicitária”.[37]

Outra técnica que merece destaque é o merchandising. Define-se como “a técnica utilizada para veicular produtos e serviços de forma indireta por meio de inserções em programas e filmes”.[38] Os produtos são anunciados discretamente e os consumidores muitas vezes não percebem esta artifício, consubstanciando uma potencial publicidade enganosa Ora, o merchandising passa despercebido, contrariando a norma do CDC, para a qual a publicidade deve ser de fácil identificação, ostensiva.

A alegação do meio publicitário é que os filmes, os programas e as novelas refletem o cotidiano do consumidor. No entanto, ao mesmo tempo, “passam informações sobre comportamento que podem ou não servir de inspiração ao telespectador-consumidor”.[39]

O problema com esse tipo de merchandising está relacionado a sua própria natureza: ele se traduz numa técnica de ocultação que não permite a avaliação crítica do consumidor.

Pelo uso desta técnica o consumidor é levado a acreditar em situações que em princípio não corresponderiam à realidade. Por exemplo: uma personagem na novela das 8 torna-se famosíssima e muito querida dos telespectadores-consumidores. Isso faz com que estes passem a olhar para ela, para seu comportamento, com muito carinho e a acreditar em muitas das coisas que ela diz e faz. Prova disso é o inevitável lançamento de “modas” por esses personagens das novelas. Pois bem, aprisionada a crença do consumidor pela personagem que se tornou querida, há a possibilidade inevitável de esse personagem vender o que anuncia.

Quando esse personagem é incorporado num anúncio publicitário, sua influência é atenuada, pois o consumidor está assistindo a uma publicidade e sabe disso, podendo atuar criticamente. Contudo, quando a personagem “dentro” da novela, isto é, enquanto ainda é personagem e, portanto, fazendo parte da ficção, utiliza-se de um produto, o consumidor não percebe o “detalhe” e é induzido a gostar desse produto. Em outras palavras, toma a ficção por realidade, perde o senso crítico e a capacidade de escolha.[40]

É por intermédio da influência inicial na admiração da personagem que o consumidor se identifica e quer se tranformar no seu ícone, adquirindo o que for necessário.

Uma solução plausível para que o merchadising não seja uma publicidade clandestina tem sido a inclusão, no início do programa, de um aviso de que será usado tal técnica. Até assim, o público consumidor ainda é atingido por seus efeitos.[41]


2 O CÓDIGO DE DEFESA E PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR

2.1 Prelúdio

Como se interpreta do seu art. 1º, “o Código de Defesa do Consumidor é uma lei de função social, traz normas de direito privado, mas de ordem pública (direito privado indisponível), e normas de direito público”.[42] Por conseguinte, a hierarquia de suas normas é indisponível como se de direito público fosse, pois trata das relações entre as pessoas (relações civis), mas têm coercividade semelhante às relações do Estado com seus regidos (ordem pública):

Às relações de consumo aplicam-se os princípios gerais do contrato, porém sob a perspectiva de sua função social, já que os interesses socialmente relevantes prevalecem sobre os interesses nitidamente privados, que são, por sua vez, disponíveis, salvo os direitos irrenunciáveis por natureza ou por força de lei (os direitos de personalidade, por exemplo).[43]

O ideal de justiça é a aplicação da igualdade. Para isso, em certos casos, o direito privado tem a intervenção do Estado, visando igualizar os direitos humanos e, assim, limitar a liberdade de uns e assegurar direitos aos mais fracos.[44] É nivelando os pólos de uma relação jurídica a priori desigual que se alcança a igualdade:

Era necessário valorizar as desigualdades, as diferenças de poder, de informação, de especialização e de posição entre os sujeitos livres do mercado de consumo, e aplicar normas e princípios, como a boa-fé e a função social da propriedade e dos contratos, que ajudassem a reequilibrar com equidade as situações diferenciadas, como as de consumo.[45]

Claudia Lima Marques destaca que a boa-fé é o princípio máximo orientador do CDC, já que proíbe abusos, e abrange qualquer momento da negociação, seja a pré-contratual, na formação, ou na execução dos contratos de consumo.[46] Além disso, as partes envolvidas para iniciar um contrato têm, desde o primeiro momento, “a obrigação de agir conforme a equidade comercial e a boa-fé”.[47]

Desta feita, a Política Nacional de Relações de Consumo (art. 4º, CDC) é dirigida para atender os consumidores à respeito de sua dignidade, saúde e segurança, qualidade de vida, e harmonia nas relações de consumo:

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

II - ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor:

a) por iniciativa direta;

b) por incentivos à criação e desenvolvimento de associações representativas;

c) pela presença do Estado no mercado de consumo;

d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho.

III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

IV - educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;

V - incentivo à criação pelos fornecedores de meios eficientes de controle de qualidade e segurança de produtos e serviços, assim como de mecanismos alternativos de solução de conflitos de consumo;

VI - coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores;

VII - racionalização e melhoria dos serviços públicos;

VIII - estudo constante das modificações do mercado de consumo. [grifos nossos]

Nisto, podem ser extraídos diversos princípios consumeristas, com destaque para o princípio da boa-fé objetiva (inc. III), o princípio da harmonização de interesses (inc. III), e o princípio da vulnerabilidade (inc. I).

A igualdade perante a lei e a igualdade na lei só podem realizar-se hoje, no direito privado brasileiro, se existir a distinção entre fracos e fortes, entre consumidor e fornecedor, e se for efetivo um direito tutelar do consumidor, daí a importância desta nova visão tripartite do direito privado, que é centrada na dignidade da pessoa humana e na idéia de proteção do vulnerável, o consumidor.[48] [grifo nosso]

Logo, a presença do Estado nas relações de consumo (art. 4º, inc. III, letra ‘c’) é o que evidencia a força da ordem pública dentro de um direito inicialmente tido como privado.

2.2 Da sua origem nos direitos fundamentais

No ordenamento jurídico brasileiro, a própria Constituição reservou um capítulo[49] para normatizar as atividades da Comunicação Social, que deve ser interpretado a partir dos direitos e garantias fundamentais. Nisso há a necessidade de conhecer o princípio básico constitucional da dignidade para estudar o processo comunicativo, no qual será útil a interpretação de Ingo Sarlet[50].

Lembremos que todo homem, pelo fato de ser humano, é considerado pessoa (ou sujeito) de direito[51]. De certa forma, o direito positivo carrega essa noção em toda sua estrutura jurídica. A expressão “dignidade humana” incide do entendimento de que todo ser humano tem um lugar na sociedade e por isso deve ser respeitado. Héctor Valverde Santana afirma que:

A dignidade é um valor interno e absoluto que não admite substituição por outro valor equivalente. Não há preço para a dignidade. Trata-se de um atributo inerente ao ser humano, superior a todos os outros e que se confunde com a natureza do ser racional, que existe como um fim e não apenas como um meio.[52]

Sobrevém da religião, mesmo sem um conceito expresso de dignidade, a concepção de que o ser humano é dotado de um valor próprio e que lhe é intrínseco, não podendo ser transformado em mero objeto ou instrumento.[53] Coube, pois, à Immanuel Kant a secularização desta noção de dignidade, conforme ensina Ingo Sarlet:

[...] concepção de dignidade parte da autonomia ética do ser humano, considerando esta (a autonomia) como fundamento da dignidade do homem, além de sustentar que o ser humano (o indivíduo) não pode ser tratado – nem por ele próprio – como objeto.[54]

Nossa Carta Magna, em seu artigo 1º, inciso III, logo de início, refere-se aos princípios fundamentais do Estado brasileiro. Nele, proclama, com destaque, como um dos seus fundamentos, a dignidade humana, in verbis:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[...]

III – a dignidade da pessoa humana. [grifo nosso]

De tal modo, consagra o direito fundamental da dignidade humana no Estado democrático brasileiro como princípio consagrador, conferindo ao mesmo a  base de todo o ordenamento jurídico nacional. Conforme Tereza Rodrigues Vieira e Érika Silvana Saquetti Martins, a norma do artigo 1º da Constituição “assegura o direito à integridade moral e ao mínimo ético a todas as pessoas apenas por sua existência no mundo”.[55] As autoras arrematam que “a Constituição, ao assegurar a inviolabilidade do direito à vida, não quis proteger somente a integridade física do ser, mas também o aspecto espiritual de que se reveste a vida humana”.[56] A Carta Magna, no § 4º do artigo 220, no intuito de proteger a saúde, claramente aplica restrições quanto à propaganda de tabaco, bebidas alcoólicas e outros itens nocivos à saúde.

Ressalte-se que os direitos fundamentais podem e devem permear também as relações privadas com total eficácia, ponderando as prováveis colisões. A diferença recai somente no fato de que numa relação pública “Estado x cidadão”, o segundo é titular de direitos fundamentais; em uma relação privada “cidadão x cidadão”, ambos são titulares. Nesse caso, então, a autonomia privada é restringida em parte pela aplicação dos direitos fundamentais. Papel assumido pelo CDC.[57]

Assim, é a dignidade o primeiro fundamento do sistema constitucional, podendo ser designada sem erro como um superprincípio.[58] É evidente, então, que deve a Comunicação Social também respeitá-lo. Impõe à Comunicação, nas palavras de Guilherme Fernandes Neto:

o dever de seguir a decência, respeitar o decoro, não expondo ou explorando sensacionalisticamente as mazelas do ser humano, conspurcando qualidade morais de indivíduos. A dignidade da pessoa humana impede, no âmbito da publicidade, a exploração do ser humano, transformando-o em protagonista da publicidade em razão de suas enfermidades, deformações, desgraças. A dignidade da pessoa humana coíbe humilhações, enquanto sua utilização na Comunicação Social evita que estas sejam veiculadas ou exploradas pela mídia.[59]

Entretanto, maioria dos consumidores não percebe que as mensagens publicitárias estão cada vez mais sagazes, atingindo e influenciando seus sentimentos. Extrajudicialmente existe o Código de Autorregulamentação Publicitária, com a finalidade de proteger os valores éticos e sociais da pessoa e da família (art. 221, IV, da CF), tendo suspendido várias propagandas de mau gosto e que ferem a dignidade.

Ademais, a maioria da população também desconhece que a Constituição Federal, em decorrência do cumprimento dos princípios constitucionais, exige dos meios de comunicação o respeito ao consumidor por intermédio do acesso à informação, que possibilita a apuração de atos ilícitos que possam ocorrer, concedendo proteção ao consumidor.

Assim:

A função social da comunicação de massa ergue-se da Constituição Federal, quando esta, pelo inciso IV do art. 221, exige respeito aos valores sociais da pessoa e família, que defluem da cidadania e da dignidade da pessoa humana.[60]

Para tanto, a própria Carta Magna, no art. 5º, inciso XXXII, estabelece que, como direito fundamental e garantia individual expressos, cabe ao Estado promover a proteção do consumidor.  No art. 170, sobre a Ordem Econômica, também impôs o constituinte a importância de diversos princípios, entre eles, o da defesa do consumidor. Os Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) igualmente tratam deste tema, exigindo a publicação da lei. E se tratando de direito fundamental, Claudia Lima Marques assevera que esse deve ser respeitado, nos conformes tanto da lei infraconstitucional (CDC) quanto nas exigências para assegurar a dignidade da pessoa humana.[61] Conclui que:

Efetivamente, no Brasil de hoje, a proteção do consumidor é um valor constitucionalmente fundamental (Wertsystem), é um direito fundamental e é um princípio da ordem econômica da constituição Federal (art. 170, V), princípio limitador da autonomia da vontade dos fortes em relação aos fracos ou vulneráveis (debilis), construindo um novo direito privado mais consciente de sua função social (expressão de Gierke).[62]

Para rematar, o CDC é lei principiológica, pois concretiza princípios e garantias constitucionais em uma norma infraconstitucional.[63]

Sergio Cavalieri Filho assinala que:

Em virtude da origem constitucional do mandamento de defesa do consumidor, o art. 1º desse diploma legal autodefine em suas normas como sendo de ordem pública e de interesse social, vale dizer, de aplicação necessária e observância obrigatória,pois, como de todos sabido, as normas de ordem pública são aquelas que positivam os valores básicos de uma sociedade”.[64]

Assim, os direitos dos consumidores têm procedência nos direitos fundamentais da Constituição Federal, com o primor de seguir o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana.

2.3 Dos direitos básicos dos consumidores

Com o CDC finalmente vigente, em seu artigo 6º são descritos os direitos básicos dos consumidores:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

 I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

IX - (Vetado);

X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral. [grifos nossos]

Destarte, no rol desses direitos básicos, ressalvemos os direitos básicos de proteção à vida e à saúde, educação para o consumo, escolha de produtos e serviços; informação, proteção contra publicidade enganosa e abusiva, indenização, acesso à justiça, e a facilitação de defesa de seus direitos com a inversão do ônus da prova por hipossuficiência (vulnerabilidade do consumidor).

O inciso I do art. 1º protege a vida, a saúde e a segurança do consumidor. De fato, a sociedade, o mercado e suas práticas comerciais podem ser nocivos e perigosos para os consumidores.[65] No inciso VI, os consumidores têm assegurados direito à prevenção e reparação de danos, tanto patrimoniais quanto morais, individuais e coletivos.[66]

Já o art. 31 do CDC trata especificamente do dever de informar do inciso III (art. 1º), incluindo a informação pré-contratual, preparando “o consumidor para um ato de consumo verdadeiramente consentido, livre, porque fundamentado em informações adequadas”.[67] A política geral do CDC é que quem divulga seus produtos ou serviços tem obrigação legal, intransferível, de informar devidamente o consumidor.[68] Afinal, “a informação inadequada ou insuficiente pode causar dano por defeito na mensagem independentemente do produto ou serviço adquirido em seguida”.[69]

Deve a divulgação do produto (ou serviço) ser clara e adequada ao entendimento do destinatário; este é o direito básico de informação do consumidor. Quando o consumidor é vítima de uma propaganda abusiva que manipula soluções abstratas, ele provavelmente não estava devidamente informado. Ou mesmo, não estava consciente em se questionar: “será que eu preciso disso?”, “qual a sua utilidade?”, “isso realmente vai me acrescentar algo?”

O Código de Defesa do Consumidor foi publicado com a intenção de proteger o consumidor brasileiro que, sem educação específica devida, é tutelado pelo Estado. Assim ensina Benjamin:

Os dados objeto do dever de informar são os mais variados, dependendo sempre do produto ou serviço oferecido. De qualquer modo, o Código fixa, de plano, algumas informações que, necessariamente, devem constar de produtos e serviços: características (produtos e serviços), qualidades (produtos e serviços), quantidade (em regra, só produto), composição (mais para produto do que para serviços), preço (produtos e serviços), garantia (produtos e serviços), prazos de validade (produtos e serviços), origem (mais para produtos) e riscos (produtos e serviços). E, recorde-se, qualquer referência ao produto ou serviço deve estar coberta pela correção, clareza, precisão e ostensividade.[70] [grifo nosso]

Ao estar informado sobre seus direitos, o consumidor sabe o que fazer ao comprar um produto estragado ou reclamar quando um serviço foi mal executado, por exemplo. O conceito de informação engloba itens, dentre os quais o dever dos fornecedores de produtos ou serviços de desempenhar seu trabalho com o mais amplo e profundo espírito público, e o direito dos consumidores de exigir essa mentalidade. Mas na prática, nem sempre o sistema funciona:

O consumidor bem informado é um ser apto a ocupar seu espaço na sociedade de consumo. Só que essas informações não estão à sua disposição. Por outro lado, por melhor que seja a sua escolaridade, não tem ele condições, por si mesmo, de apreender toda a complexidade do mercado.[71] [grifo nosso]

Também relevante, o direito básico à liberdade de escolha (art. 6º, inc. II, CDC) refere-se à autonomia da vontade do consumidor:

O Código de Defesa do Consumidor reconhece a importância das novas técnicas de vendas, muitas delas agressivas, do marketing e do contrato como forma de informação do consumidor, protegendo seu direito de escolha e sua autonomia racional, através do reconhecimento de um direito mais forte de informação (arts. 30, 31, 34, 46, 48 e 54) e um direito de reflexão (art. 49).[72]

Paralelamente aos direitos, têm-se os deveres do consumidor, quais sejam: consciência crítica, preocupação social, reclamação, solidariedade, pesquisa, consciência do meio ambiente, boicote, e honestidade. Todos permeados pelos princípios que norteiam as relações de consumo: vulnerabilidade do consumidor, da norma mais favorável, das presunções mais favoráveis ao consumidor, da irrenunciabilidade dos direitos do consumidor, da boa-fé, da identificação e da transparência.[73]

2.4 A relação jurídica de consumo

Para se estabelecer a relação jurídica de consumo bastam as figuras do consumidor e do fornecedor, tendo por objeto a negociação de produtos e/ou serviços.

Nos conformes do art. 3º, caput, do CDC, tem-se a conceituação do fornecedor como:

toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

A figura do consumidor, nos termos do art. 2º, “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.” Pela doutrina, o CDC apresenta quatro definições[74] para “consumidor”: em sentido estrito (caput do art. 2º), em sentido coletivo (ou equiparado, descrito no parágrafo único do art. 2º: “equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo”), “bystander” (descrito no art. 17 como as vítimas do evento, mesmo não tendo participação na relação consumerista), e em sentido amplo (ou virtual, mencionado no art. 29: “equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas”). É por esta última definição doutrinária que o efeito da publicidade é aqui aventado. Na inteligência de Paulo R. Roque A. Khouri:

No art. 29 do CDC, justamente por ser equiparada a consumidor, não é exigida a efetiva aquisição de bens e serviços. O simples fato de poder vir a contratar, estando exposto a uma prática abusiva, é suficiente para merecer proteção até mesmo por meio das chamadas ações coletivas, de que trata o art. 81 do CDC. [grifo nosso][75]

Héctor Valverde Santana corrobora esse entendimento, ao ensinar que o consumidor potencial (art. 29, CDC) dispensa o prévio ajuste contratual. A simples exposição das práticas comerciais às pessoas sejam estas físicas ou jurídicas, enseja a prevenção contra danos aos direitos transindividuais: “o operador do direito deve manifestar-se com antecedência à materialização do dano”.[76]

Do mesmo modo, o Capítulo V do CDC cuida da fase pré-contratual (oferta e publicidade). O intuito do legislador é evitar a coletividade da exposição às práticas abusivas. Ao tratar como consumidor quem não consumiu, mas que seja um potencial consumidor, oferece a esta figura a mesma proteção que, pela doutrina clássica, beneficia o consumidor strictu senso do caput do art. 2º.[77] Pode o consumidor ter sua relação de consumo protegida antes mesmo de concretizado o contrato, no início da fase pré-contratual (negociação preliminar), a partir da veiculação da oferta (proposta).

Assim, essas várias definições de consumidor facilitam a aplicação do código consumerista aos vários casos concretos que surgem na prática.[78] A intenção do CDC é também proteger “dos atos ilícitos pré-contratuais, como a publicidade enganosa, e das práticas abusivas, sejam ou não compradores, sejam ou não destinatários finais”.[79] Portanto, em outras palavras, define as relações de consumo tanto as contratuais quanto as extracontratuais.

Sintetiza Nehemias Domingos de Melo que “basta que a relação seja de consumo para que a proteção consumerista se estenda a qualquer pessoa, independentemente da conceituação legal de consumidor.” [80]

Ressalte-se que, para a previsão de consumidor em potencial, há certas características principais que deve ser atestadas: “[...] a) abstração; b) pretensão de amplitude, pois visa abarcar um maior número de casos; c) finalidade preventiva; d) tutela de direitos transindividuais“.[81]

Entretanto, a proposta não pode ser qualquer oferta dirigida ao público. Nas ofertas de compra e venda, “só será considerada uma proposta tecnicamente perfeita se for possível identificar, além do seu proponente, o objeto e o preço da coisa”. Arremata Khouri que “é impossível a formação do contrato simplesmente com base na mensagem”.[82] Só que a mensagem publicitária não precisa ter todos os elementos da proposta (preço, condições, objeto etc) para ser veiculada e convencer o público sobre as qualidades do objeto para uma potencial contratação.[83]

Os objetos dessa relação igualmente são descritos pelo CDC. O produto “é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial” (art. 3º, § 1º), e serviço é apontado como “qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista” (art. 3º, § 2º).

Ademais, Rizzatto Nunes não se prende à diferenciação estrita entre fins de consumo (destinatário final) e fins de produção (uso por fornecedor):

Quer se use o produto (ou o serviço) para fins de consumo (a caneta do aluno), quer para fins de produção (a caneta idêntica do professor), a relação estabelecida na compra foi de consumo, aplicando-se integralmente ao caso as regras do CDC. Desta maneira, repita-se, toda vez que o produto e/ou serviço puderem ser utilizados como bem de consumo, incide na relação as regras do CDC.[84] [grifo nosso]

Por isso, de acordo com o caput do art. 2º, o CDC define a pessoa jurídica também como consumidora. Para tanto, esta deve consumir produtos e serviços que lhe sirvam simultaneamente como bens de produção e bens de consumo. O importante é que ao adquirir ou usar, o intuito seja de fruição própria (consumo).[85]

Por esses fatores, a relação jurídica de consumo compreende tão somente um consumidor, não necessariamente final, nem rigorosamente deva ser pessoa física (contanto que use o produto como bem de consumo será um destinatário final), e o fornecedor, que oferece produtos e serviços por intermédio de uma oferta (veiculação).

2.5 A publicidade no Código de Direito do Consumidor

A publicidade faz parte da fase pré-contratual, e também está inserida no controle do direito consumerista. É a mensagem publicitária que leva ao consumidor as informações sobre produtos e serviços antes da formação do contrato.[86]

Nesta fase pré-contratual (veiculação do anúncio, oferta), existe a figura do consumidor potencial (art. 29, CDC). Basta estar exposto a toda e qualquer prática comercial:

O que a lei diz é que, uma vez existindo qualquer prática comercial, toda a coletividade de pessoas já está exposta a ela, ainda que em nenhum momento possa se identificar um único consumidor real que pretenda insurgir-se contra tal prática.[87]

De fato, o CDC não obriga o fornecedor a anunciar, mas uma vez que ele fizer uso da publicidade, estará vinculado à lei no que se refere ao direito da informação, boa-fé e transparência na divulgação de seus produtos e serviços.[88]

Nisto, dois pontos são cruciais. Primeiramente, deve-se analisar se a publicidade é uma oferta que vincula o anunciante. E em seguida, qual o grau desta provável vinculação.[89]

Ao anúncio, por nem sempre trazer todos esses requisitos (em particular, por não ser, ordinariamente, nem completo, nem inequívoco nem, muito menos, dirigido a destinatários identificados), negava-se o caráter de oferta e, a partir daí, a possibilidade de vinculação contratual, sendo sempre apontado como pura (e contratualmente inofensiva) invitatio ad offerendum ou “convite a contratar”, com seus exageros equiparados a dolus bonus. A perspectiva da publicidade como simples convite à apresentação de ofertas era – e ainda o é – largamente aceita no contexto do direito contratual tradicional, apesar da evolução doutrinária já referida.[90]

O que vincula é a declaração publicitária, o anúncio em si. Com efeito, “para que uma propaganda seja considerada falsa a ponto de caracterizar a publicidade enganosa, a informação deve ser recebida como verdadeira pelo consumidor”.[91]

Deste modo, enquanto a doutrina civilista tradicional não reconhece a publicidade em si como fase pré-contratual; para o direito consumerista, ela tem sido aceita, porque integra a própria sociedade de consumo (consumidores), titulares da proteção do CDC:

Não há sociedade de consumo sem publicidade. Como decorrência de sua importância no mercado, surge a necessidade de que o fenômeno publicitário seja regrado pelo direito, notadamente pela perspectiva da proteção do consumidor, o ente vulnerável da relação jurídica de consumo.[92]

De acordo com Rizzatto Nunes, a publicidade não pode violar os vários princípios garantidos na Carta Magna:

O anúncio publicitário não pode falta com a verdade daquilo que anuncia, de forma alguma, quer seja por afirmação quer por omissão. Nem mesmo manipulando frases, sons e imagens para, de maneira confusa ou ambígua, iludir o destinatário do anúncio.[93]

Uma vez que, no exame dos elementos da oferta, esta seja precisa, completa, com informações sobre seu objeto e dirigida ao consumidor, é admitida a vinculação do fornecedor. Conceituado como princípio da vinculação contratual da mensagem publicitária, este se encontra implícito em dois dispositivos no Código de Defesa do Consumidor[94], quais sejam, os arts. 30 e 35:

Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.

(...)

Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha:

I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade;

II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;

III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.

O instituto jurídico da oferta é regulado nos arts. 30 e 31 do CDC, num rol de características meramente exemplificativas[95]. O interessante é que o art. 30 abrange quaisquer formas de manifestação mercadológica. Nisto, inclui toda manifestação do fornecedor que não somente a oferta, mas tudo que tenha o propósito de induzir a decisão do consumidor. Vejamos:

A vinculação do fornecedor que veiculou publicidade suficientemente precisa é matéria pacífica no Judiciário, que vem condenando o fornecedor ao cumprimento da oferta publicitária nos termos em que foi veiculada.[96]

Para tanto, bastam dois pressupostos básicos: veiculação e precisão da informação. Tome-se veiculação como a ação de informar, de chegar ao conhecimento do consumidor. E por precisão, dados completos, “com um mínimo de concisão”.[97] Benjamin afirma ainda que o princípio da vinculação da mensagem publicitária “é a resposta que o direito dá ao relevantíssimo papel que este fenômeno assume na sociedade de consumo. O princípio encontra sua justificativa, pois, no potencial persuasivo das técnicas de marketing”.[98]

(...) visando a acomodar as prementes e irresistíveis necessidades sociais criadas pela publicidade, os requisitos essenciais da policitação tornam-se menos exigentes, enquanto o caráter vinculante da promessa fica mais rígido.[99]

Por derradeiro, o consumidor é vulnerável às mensagens. Daí a acuidade em se priorizar esta diferença entre o fornecedor e o consumidor nas relações de consumo.

2.6 A vulnerabilidade do consumidor

A princípio, se acreditava que o consumidor tinha plena consciência na escolha de produtos e serviços oferecidos no mercado:

A economia criou também a figura ilusória de que este ser livre e racional, que seria o consumidor, o “rei” do mercado, aquele cuja vontade decidiria soberanamente a compra ou a recusa de um produto (...). No Brasil, a tendência é também radicalizar esta visão econômica do homem, como sujeito de mercado livre, sem sequer considerar o marketing, os efeitos da publicidade e da moda, dos métodos agressivos e sentimentais de comercialização e da contratação, e chega-se mesmo a usar esta expressão, que não deixa de ser uma falácia, de “rei do mercado” para os consumidores.[100]

A vulnerabilidade do consumidor é requisito obrigatório para a caracterização do consumidor. Ela pode ser técnica (desconhecimento técnico do objeto), econômica (desigualdade econômica entre o fornecedor e o consumidor final) ou jurídica (falta de conhecimento jurídico sobre as normas que envolvem a relação de consumo).[101] Claudia Lima Marques inclui uma quarta espécie de vulnerabilidade, a informacional:

[...] a vulnerabilidade informacional, que é a vulnerabilidade básica do consumidor, intrínseca e característica deste papel na sociedade. Hoje ela merece uma menção especial, pois na sociedade atual são de grande importância a aparência, a confiança, a comunicação e a informação. Nosso mundo de consumo é cada vez mais visual, rápido e de risco, daí a importância da informação.[102]

Na mesma obra, Antônio Herman V. Benjamin afirma que “o consumidor, em todo o processo publicitário, é a parte vulnerável e contratualmente alheia ao anúncio”.[103]

Essa vulnerabilidade tem presunção absoluta, dentro do mercado de consumo:

A vulnerabilidade, conforme consta do Código de Defesa do Consumidor, não se submete ao critério da razoabilidade para ser identificada no caso concreto, uma vez que o legislador presumiu iuris et de iure a sua existência em uma relação de consumo, fixando-se que o destinatário final de produtos e serviços é a parte que necessita ser amparada de forma mais favorável pela legislação (art. 4º, I, da Lei 8.078, de 1990).[104]

Logo representa “o reconhecimento da ordem jurídica de que existe desigualdade real entre os protagonistas da relação de consumo que se desenvolve necessariamente no mercado”.[105]

De tal modo, a inversão do ônus da prova, previsto no inciso VIII do art. 6º do CDC é decorrente do princípio da vulnerabilidade do consumidor. Todavia, nem sempre essa inversão no direito consumerista é ato discricionário:

A inversão estabelecida no § 3º dos arts. 12 e 14 do Código de Defesa do Consumidor, específica para a responsabilidade civil do fornecedor, é ope legis, vale dizer, não está na esfera da discricionariedade do juiz. É obrigatória, por força de lei.[106]

Importa notificar que hipossuficiência e vulnerabilidade não são termos sinônimos. Pode assim dizer que todo consumidor e vulnerável, mas nem sempre é hipossuficiente. Enquanto a vulnerabilidade decorre de ordem técnica, econômica ou jurídica, a hipossuficiência não envolve a ordem econômica. Esta deriva tão somente do fato de o consumidor não ter conhecimento técnico sobre os produtos e serviços oferecidos no mercado.[107] Portanto, é exclusivamente a hipossuciência que motivará o juiz se o caso concreto permite a inversão do ônus da prova em favor do consumidor.


3 A PUBLICIDADE NOCIVA

3.1 Publicidade nociva na Lei nº 8.078/90

Para o direito consumerista, não se trata de analisar sobre a natureza artística da publicidade, mas de seu poder persuasivo embutido nas mensagens, o que movimenta o mercado e estimula o consumo, muitas vezes em detrimento da saúde, das integridades física e psíquicas, e do meio ambiente.[108]

No texto do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), a publicidade possui uma seção normativa exclusiva, na qual é definida, nos dizeres do artigo 36, como atividade de dar conhecimento ao público da oferta de produtos e serviços, facilmente identificada como anúncio publicitário pelo homem médio.

O art. 37 traz as definições do que seja oferta viciada, publicidade enganosa e publicidade abusiva:

 Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

§ 1° É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.

§ 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.

§ 3° Para os efeitos deste código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço.

De acordo com Federigui, o Código de Defesa do Consumidor inovou ao criar as categorias de publicidade nociva: a enganosa e a abusiva. Enquanto a enganosa é a que induz o consumidor a erro, a abusiva está relacionada à forma de abordagem do consumidor. 

“O consumidor recebe a informação, mas não a avalia como apelo de vendas”, afirma Rizzatto Nunes.[109] Então a avaliação crítica do consumidor e sua autonomia da vontade muitas vezes são deturpadas pelas técnicas publicitárias. É o que ocorre no merchandising.

Como discorre Fernanda Nunes Barbosa sobre a acuidade da análise da publicidade na ciência do direito:

A importância da repercussão das técnicas publicitárias no direito tem em vista o seu caráter persuasivo, que busca entorpecer ou mesmo suprimir a vontade real do consumidor, que é o elemento nuclear da autonomia privada.[110]

E é na lógica da abordagem abusiva que constata-se uma possível nocividade nas estratégias publicitárias atuais:

Se aceitarmos que a publicidade pode induzir alguém a algo além de consumir, isto já é um nocivo de per si, porque estará servindo de instrumento à criação de uma necessidade extra, além daquela à qual está social e juridicamente autorizada. Não fosse por esse raciocínio, a publicidade, em si seria uma violência, por inverter o processo de necessidade no mercado de consumo, e não somente criá-la, mas por inserir um comportamento padrão ainda não existente.[111]

A publicidade é, tecnicamente, perigosa, pois cria necessidades extras, afetando os indivíduos e a coletividade, gerando novos comportamentos sociais. Contudo, ainda não há norma positivada explícita a respeito da relação entre publicidade nociva e o comportamento do consumidor, com exceção de restrições à publicidade de produtos fumígenos (tabaco), bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e as voltadas ao público infantil.

3.2 Publicidade abusiva

No que pese rever a conceituação de publicidade, o enquadramento social e o jurídico divergem. Embora ambos concordem que a publicidade consista numa manifestação unilateral da vontade, juridicamente, incide em um ato unilateral do fornecedor que depende da aceitação do contratante para concretizar o negócio. Para o campo da comunicação, “é difusa e agregada a um apelo marginal, que pode ser um conjunto de valores (que conotam alegria, felicidade, saúde, sucesso, status social, força física e juventude) que integram o contrato”.[112]

Conforme conceituado anteriormente, a publicidade nociva pode ser enganosa ou abusiva, no que diz respeito à informação ou à mensagem que veicula. Desta forma, pode-se deduzir que a indução do consumidor a comprar produtos ou serviços a fim de “adquirir qualidades” embutidas num conjunto de valores aquém que os próprios itens podem oferecer é uma publicidade abusiva. E a publicidade abusiva é, na doutrina, objetiva:

As chamadas “práticas abusivas” são ações e/ou condutas que, uma vez existentes, caracterizam-se como ilícitas, independentemente de se encontrar ou não algum consumidor lesado ou que se sinta lesado. São ilícitas em si, apenas por existirem de fato no mundo fenomênico.[113]

Então, a abusiva é aquela publicidade que, através da sua veiculação, pode induzir o consumidor utilizando de argumentos que atingem sua integridade moral e pessoal.[114] Esta está explicitada no artigo 37, parágrafo 2º, do CDC Vejamos:

§ 2º É abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança. [grifos nossos]

Vê-se que a manipulação dos desejos do consumidor pode ser considerada uma forma de prática abusiva[115], pois se aproveita de suas fraquezas e pode induzi-lo a agir de forma prejudicial. A publicidade discretamente adequa o produto ou serviço a um estilo de vida almejado. Essa “adequação” pode estar influenciando para o aumento da depressão, da criminalidade, de atitudes permissivas, de endividamento, destruição ambiental etc.[116]

No entanto, não se deve confundir a publicidade abusiva do trabalho publicitário lato senso, pois a abusiva, embora eivada de ilicitude, é uma espécie do gênero publicidade. Assim, não é que a publicidade seja completamente nociva, mas que há dois lados, um positivo, outro negativo.

Nesse entendimento, Paulo Roque Khouri adverte que o ato de induzir o consumo é abusivo, propiciando vantagens tendo em vista a vulnerabilidade natural do consumidor.[117] Todavia, o mesmo autor argumenta que a prática da publicidade é justamente o convencimento dos consumidores, viabilizando a atividade econômica.

A limitação da publicidade abusiva está inserida no texto constitucional, em seu art. 220, § 3º, quando estabelece a criação de meios legais que impeçam a divulgação de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde (bem jurídico relevante) e ao meio ambiente.

Desta forma, é preciso averiguar até que ponto a publicidade age sem ferir a autonomia do consumidor. A oferta pública é um mecanismo pré-contratual; neste momento, pode-se transformar uma desnecessidade em necessidade de consumo. Em outras palavras, a divulgação de produtos e serviços utilizando as técnicas publicitárias de persuasão e convencimento para suscitar necessidades, embora uma situação pré-contratual,é regulada pelo CDC, com vista a evitar abusos do mercado, independente da fase de negociação que estejam.[118] A proteção do consumidor abrange todos os momentos da tratativa. Por conseguinte, pode haver prática abusiva pré-contratual.

Por ser um mecanismo pré-contratual, a publicidade atinge inicialmente um público indeterminado. Daí a proteção dos interesses difusos, dos valores coletivos e das metas transindividuais, como aponta Fiorillo.[119] Afinal, defender os direitos difusos é garantir o cumprimento dos princípios norteadores da Constituição Federal, e preservar valores e condições essenciais à vida (saúde, segurança, qualidade). Nisto, o Código de Defesa do Consumidor de fato reconhece a hipossuficiência jurídica (vulnerabilidade) dos consumidores.

3.3 Publicidade enganosa

Com criatividade, impacto visual e frases de efeito, qualquer um é passível de se deixar levar pela mensagem publicitária. Também “a publicidade será enganosa se o consumidor pudesse não ter adquirido o produto ou o serviço se este tivesse sido anunciado corretamente”.[120] As formas para enganar são muitas.

Novamente incumbe a leitura do art. 37, caput e parágrafos 1º e 3º, do CDC:

Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

§ 1° É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.

(...)

§ 3° Para os efeitos deste código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço.

Nota-se que a enganosidade está ligada à informação errada sobre o produto ou serviço. Não importa se o consumidor ainda não o adquiriu ou contratou:

É de anotar que para a aferição da enganosidade não é necessário que o consumidor seja aquele real, concretamente considerado; basta que seja potencial, abstrato. Isto é, para saber da enganação é suficiente que se leve em consideração o consumidor real. É ele que deve servir de parâmetro para a avaliação.

O anúncio é enganoso antes mesmo de atingir qualquer consumidor em concreto; basta ter sido veiculado.[121]

O CONAR instituiu em sua norma autorregulamentadora (CBAP) que:

Para fins de aferição da enganosidade (e qualquer outro componente) será observado o anúncio como um todo, incluindo seu conteúdo e forma, testemunhas, declarações ou apresentações visuais, ainda que tenham origem em outras fontes (art. 47, CBAP).[122]

Deste modo, enquanto a abusiva se refere a uma agressão (moral) à essência (emoções) do consumidor, pode-se considerar que a enganosa envolve uma informação incorreta ou omissa sobre o produto ou serviço (material):

Logo, o efeito da publicidade enganosa é induzir o consumidor a acreditar em alguma coisa que não corresponda à realidade do produto ou serviço em si, ou relativamente a seu preço e forma de pagamento, ou ainda, a sua garantia etc.[123] [grifo nosso]

Vejamos duas decisões do CONAR abaixo transcritas que envolvem publicidade enganosa:

DECISÕES SOBRE VERACIDADE

“Activia funciona para você”, “Crianças”, “Idosos” e “Barriga inchada”

Representação nº. 067/08, em recurso extraordinário

Autora: Dairy Partners

Anunciante: Danone

Relatores: conselheiros Rogério Salgado, Rogério Levorin Neto e Afonso Champi Jr.

Primeira Câmara, Câmara Especial de Recursos e Plenário do Conselho de Ética

Decisão: Sustação

Fundamento: Artigos 1º, 3º, 4º, 23, 27, parágrafos 1º e 2º, 33, letras “b” e “e”, e 50, letra “c” do Código

A Dairy Partners questiona os anúncios da campanha da Danone que, segundo a queixa, deixa de mencionar as características do Activia na forma autorizada pela Anvisa, induzindo, assim, o consumidor a engano.

Em primeira instância, o relator concordou com os termos da denúncia, recomendando a alteração da locução dos comerciais, cujo texto diferia do lettering. No caso específico do filme “Crianças”, foi recomendada a inclusão de lettering com frase de advertência para que gestantes, nutrizes e crianças sigam orientação de nutricionista e médico. Para o comercial “Barriga inchada” foi recomendada a sustação, uma vez que contraria as regras da Anvisa, citando sintomas característicos de constipação.

A Danone recorreu da decisão, pleiteando que fosse analisado, especificamente, o caso do comercial “Barriga inchada”. Alega que o filme limita-se a retratar situação em que uma jovem mulher, de aparência saudável, sorridente, relata que tinha intestino preso e, por isso, barriga inchada, e que tomou Activia e o inchaço desapareceu.

A empresa contestou, também, a decisão de alterar o comercial “Criança”. Alega que o produto está licenciado como alimento funcional seguro para consumo por crianças, mulheres e idosos, independente de orientação e supervisão médica, o que desobriga a Danone de fazer este tipo de ressalva em sua publicidade.

Na análise do recurso ordinário, os conselheiros acordaram em recomendar o arquivamento da representação para o anúncio “Criança”, concordando com os argumentos da defesa; e mantiveram a decisão de sustar a veiculação do comercial “Barriga inchada”.

Inconformada, a Danone recorreu novamente, argumentando que o comercial em questão não alude a sintoma característico de constipação ou de qualquer outra patologia.

A afirmação foi contestada pela Dairy Partners, reafirmando que as expressões contrariam decisões da Anvisa, que entende haver sugestão de tratamento para funcionamento irregular do intestino, entre elas a constipação.

O relator do recurso extraordinário confirmou as decisões anteriores pela sustação do comercial “Barriga inchada” e seu parecer foi acatado por maioria de votos pelo Plenário do Conselho de Ética.

“Mat Inset – Passe de mágica”

Representação nº 428/08

Autora: Reckitt Benckiser

Anunciante: Grupo Hypermarcas

Relator: conselheiro Rubens da Costa Santos

Quinta, Sexta e Sétima Câmaras, reunidas em sessão conjunta

Decisão: Alteração

Fundamento: Artigos 1º, 3º, 6º, 37 e 50, letra “b” do Código e seu Anexo “I”

Reckitt Benckiser questiona descumprimento de recomendação do Conar no processo ético nº 220/07, pela utilização de expressões que, conforme a autora, contêm enganosidades, exagerando os atributos do produto Mat Inset, produzido pelo Grupo Hypermarcas, tais como “agora vou mostrar pra vocês como se livrar dos mosquitos, pernilongos e muriçocas num passe de mágica” e “com Mat Inset você não vê mais nenhum inseto em sua casa”. Segundo a denúncia, o produto repele os insetos mas não os mata.

A defesa nega razão à denúncia, já que, de fato, livra o consumidor dos insetos. Em seu voto, o relator concorda que há exagero no filme. Por isso, recomendou a alteração, voto aceito por unanimidade.

Em ambos os casos, as denúncias dirigidas ao CONAR foram feitas por anunciantes concorrentes. No entanto, o órgão de defesa do consumidor (PROCON), com legitimidade conferida no art. 81 do CDC, tem a capacidade de adotar qualquer medida judicial para impedir a transmissão do anúncio enganoso e punir o responsável (no caso, o anunciante). Isso independe da denúncia de um consumidor real.[124]


4. RESPONSABILIDADE CIVIL NA PUBLICIDADE

4.1 Noções gerais da responsabilidade jurídica civil

O ato humano traz em si, seja culposo ou doloso, a questão da responsabilidade nas relações sociais. Tem-se a responsabilidade moral e a jurídica. A que de fato interessa é a segunda, pois na primeira não há a coercitividade do Estado para se exigir cumprimento de uma reparação, ficando aquela apenas no campo da consciência do indivíduo. Nas palavras de Gagliano e Pamplona:

A noção jurídica de responsabilidade pressupõe a atividade danosa de alguém que, atuando a priori ilicitamente, viola uma norma jurídica preexistente (legal ou contratual), subordinando-se, dessa forma, às conseqüências do seu ato (obrigação de reparar). [125]

Desta forma, para se constatar a necessidade de reparação, é indispensável que haja um dano (ou prejuízo). Além disso, a conduta do indivíduo, que pode ser tanto positiva (ativa) quanto negativa (omissiva). E por fim, o nexo de causalidade entre o dano produzido e o ato ilícito. Estes são os três elementos essenciais (dano, conduta e nexo causal) para se configurar a responsabilidade civil, que é fenômeno jurídico.

Deste raciocínio, conclui-se que “a violação do direito subjetivo do consumidor, mediante práticas comerciais abusivas ou contratos de consumo ilegais, afeta as órbitas individual e coletiva”.[126]

Há também duas as teorias, ou correntes: a objetiva e a subjetiva. Na primeira, só haverá o reconhecimento da responsabilidade jurídica civil provando-se a culpa do agente. Nesta, a culpa é o principal pressuposto. Na segunda, basta

Ademais, importa mencionar que a natureza da responsabilidade civil é sancionadora e decorre da existência dos elementos supracitados que caracterizam a violação a uma norma jurídica (civil ou penal), enquanto o termo reparação civil é o ato de indenizar (reparar o dano que fora causado), com intuito de compensar a vítima, punir o ofensor e desmotivar condutas lesivas.[127]

4.2 A publicidade atual na ótica da responsabilidade civil

A publicidade é o instrumento de apresentação da produção realizada pela agência publicitária, mas tem seus limites devidamente estabelecidos na Constituição Federal, para harmonizá-la com os direitos fundamentais.[128] Enfatize-se que a publicidade clandestina também é proibida pelo CDC, já que uma das características da publicidade lícita é ser ostensiva, de fácil identificação como tal.[129]

Visto os elementos da responsabilidade civil, a publicidade atual pode ter violado direitos jurídicos a que possam compor a responsabilização civil e a uma razoável reparação.

Em tempo, dois setores são primordiais a serem diferenciados: o anunciante e a agência. O anunciante, ou cliente, é a empresa, pessoa ou instituição que faz uso da publicidade. Ele é o principal responsável pela realização da publicidade. A agência é a empresa especializada na técnica e na arte da publicidade, desenvolvendo as campanhas e assessorando o anunciante.[130]

“Toda publicidade veicula alguma (algum tipo de) informação, mas nem toda informação é publicidade”.[131] Logo, a publicidade, em conceituação estrita, abrange os anúncios, os rótulos, folhetos, enquanto a informação é mais ampla, sendo “qualquer informação oferecido por todo e qualquer meio de comunicação escrita, verbal, gestual, etc que chegue ao consumidor”.[132]

Em capítulo anterior, foram descritas algumas das atuais práticas de persuasão da publicidade e sua repercussão para manter uma sociedade direcionada a um consumo exagerado:

O induzir já não é convencer licitamente. É de alguma forma a utilização de algum elemento capcioso, ardil, capaz de influenciar a decisão do consumidor, que acaba comportando-se contra seus próprios interesses. (...) Evidente que toda a publicidade busca convencer os consumidores a adquirir os produtos e serviços anunciados. Se não fosse para convencer os consumidores, ela não teria sentido enquanto elemento estimulador da atividade econômica. Entretanto, o convencimento deve ser buscado dentro de limites éticos, que impeçam a abusividade da mensagem publicitária, que está em um patamar superior à simples publicidade enganosa.[133]

O CDC não impede a publicidade, no entanto impõe dois limites: que não seja enganosa nem abusiva. Ao anúncio publicitário é exigido o respeito à dignidade da pessoa humana, a intimidade, à intimidade, à propriedade privada, à família, às instituições e símbolos nacionais.[134] Novamente refletimos sobre as fronteiras da publicidade:

A publicidade deixa de ser uma atividade lícita e passa a ser ilícita quando, ao invés de convencer, ela induz; o induzir é que é prejudicial ao consumidor. Este, induzido, acaba se comportando de maneira prejudicial a si mesmo. Aqui não haverá mais o legítimo direito do fornecedor de divulgar os seus produtos e serviços, mas um verdadeiro abuso desse direito, tendo em vista que, ao invés de convencer licitamente o consumidor, ele o induz. Tal lhe propicia vantagens tendo em vista a vulnerabilidade natural do consumidor.[135]

É mister esclarecer que o simples exagero (puffing), em geral, não obriga o fornecedor, pois são expressões meramente exageradas, sem possibilidade de uma verificação objetiva, mas que o consumidor pode identificar como engodo publicitário.[136]

A doutrina entende que o puffing não está proibido enquanto apresentado como publicidade espalhafatosa, cujo caráter subjetivo ou jocoso não permite que seja objetivamente encarada como vinculante. É o anúncio em que se diz ser “o melhor produto do mercado”, por exemplo.[137]

Todavia, havendo potencial persuasivo, descaracteriza-se o exagero e é imposta a vinculação do fornecedor ao que oferece na mensagem publicitária:

O direito evolui no sentido de eliminar, por inteiro, os exageros – sem fundamentação material ou científica – da comunicação mercadológica. São eles, inegavelmente, elementos perturbadores das relações de consumo e aumentam, sem qualquer benefício em contrapartida, os riscos e a insegurança do consumidor como destinatário do marketing[138].

Vale ressaltar que os abusos do marketing ensejam providências não somente no campo cível, como também no âmbito penal e administrativo.[139]

(...) há uma necessidade urgente de informar às pessoas, em todos os setores (econômico, social, cultural e político), com processos mais claros e concretos de informação e formação, em que todos tenham espaço para se tornar a cada dia mais conscientes de seus papéis como cidadãos e como consumidores. E a comunicação irá receber – progressivamente – novos desafios e responsabilidades na promoção de um desenvolvimento mais democrático.[140]

O próprio Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária estabelece que “(...) as regras de autodisciplina da atividade publicitária são também destinadas a ser usadas como parâmetro pelo Poder Judiciário no exame das causas envolvendo publicidade, sendo fonte subsidiária da legislação existente”.[141] Exemplo desta subsidiariedade consta na seguinte ementa:

PROCESSO CIVIL. AÇÃO COMINATÓRIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DEFERIDA. PROIBIÇÃO DE VEICULAÇÃO DE PUBLICIDADE. ALEGAÇÃO DE CONCORRÊNCIA DESLEAL. EXPRESSÃO DE USO COMUM. VEROSSIMILHANÇA DO DIREITO ALEGADO E FUNDADO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO AFASTADOS. 1. As decisões do CONAR - Conselho Nacional de Auto Regulamentação Publicitária, apesar de não vincularem o Judiciário, indicam a presença ou não de verossimilhança do direito alegado.

2. Inexistem elementos caracterizadores da ocorrência de publicidade irregular apta a ensejar a concorrência desleal, ante a impossibilidade de confusão entre as empresas ou de captação ilegal de clientela.

3. Restam afastados os requisitos necessários à concessão da tutela antecipada, quais sejam a verossimilhança do direito alegado e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, tudo nos termos dos artigos 273 do CPC e 209, § 1º, da Lei n. 9.279/96.

4. Agravo conhecido e provido.(20050020099815AGI, Relator NÍDIA CORRÊA LIMA, 3ª Turma Cível, julgado em 12/12/2005, DJ 23/02/2006 p. 77). [grifo nosso]

No acórdão abaixo transcrito, o efeito das decisões do CONAR também é aceito na decisão jurídica:

VOTO N° 18102

APELAÇÃO N° 994.06.127958-8 - São Paulo

APELANTES e APELADAS Companhia de Bebidas das Américas - AMBEV, Primo Schincariol Indústria de Cervejas e Refrigerantes S/A e Fischer América Comunicação Total Ltda.

RECURSO - Agravo retido - Decisão que rejeitou a preliminar de ilegitimidade ativa - Autora que é controladora das empresas que fabricam as cervejas Skol, Antarctica e Brahma - Legitimidade ativa configurada - Autora que busca tutelar os interesses das empresas controladas - Recurso desprovido.

OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER - Ilegitimidade passiva da empresa publicitária - Inocorrência - Hipótese em que é de sua incumbência a criação e divulgação da campanha publicitária - Necessidade de respeito aos limites éticos estabelecidos no Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária - Alegação de nulidade da citação da outra ré - Descabimento - Hipótese em que seu comparecimento espontâneo prestou-se a suprir eventual falha - Sentença mantida - Inteligência do art. 252, RITJSP/2009 - Manutenção da disciplina da sucumbência -

Recursos desprovidos. [grifo nosso]

Questionamo-nos qual o dano que a publicidade atual gera na sociedade, se é ativo ou omissivo, se há nexo causal entre o dano e ato ilícito. O direito do consumidor, inclusive em matéria de publicidade, trata a responsabilidade civil de forma objetiva, e não subjetiva, como nas demais normas. É visível que a responsabilidade dos arts. 30 e 35 é a objetiva.

Acrescente a isso que a publicação do CDC dividiu, positivamente, a responsabilidade civil em duas: a tradicional (Código Civil) e a das relações de consumo. E a partir desta separação, a responsabilidade objetiva, que era exceção, tornou-se mais aplicada que a subjetiva.[142]

Portanto, até mesmo os casos de “equívoco inocente” do fornecedor não excluem a responsabilidade civil. O anúncio, como “integra a corrente de produção e comercialização de bens”, também se ajusta à responsabilidade civil objetiva.[143]

4.3 Dano moral decorrente de publicidade nociva

Assevera Rizzatto Nunes que a oferta e a publicidade, enquanto são elementos da apresentação do serviço, podem ser geradoras de dano ao consumidor, da mesma forma que o produto em si.[144]

Não obstante a publicidade possa ser nociva e que sua responsabilização seja a objetiva, “só se indeniza dano efetivamente experimentado”[145], ou seja, o consumidor tem que sentir realmente lesado, mencionando estritamente qual direito da personalidade foi atingido, para que haja dano até mesmo na fase pré-contratual. Assim, “o estabelecimento da responsabilidade de indenizar nasce do nexo de causalidade existente entre o consumidor (lesado), o produto e/ou serviço e o dano efetivamente ocorrente”.[146]

São dois tipos de danos, o material (patrimonial) e o moral (extra patrimonial):

O dano moral revela-se na ofensa a qualquer dos direitos da personalidade, direitos como a vida, a liberdade, a integridade física, a honra, a imagem, o respeito das pessoas, é natural que a sanção civil pecuniária contra essas violações seja um desejo da sociedade.[147]

Apesar disso, não se pode banalizar o dano moral a qualquer aborrecimento da convivência social.

O dano material, por ser averiguado nos danos emergentes e nos lucros cessantes, é objetivo. Portanto, não é cabível dano material na publicidade (fase pré-contratual), pois ainda não houve contrato. Nessa fase, é admissível tão somente o dano moral, pois a configuração deste dano exige que haja ofensa aos direitos da personalidade em qualquer relação, pré-contratual ou contratual. Assim, o consumidor em potencial pode sofrer dano moral.[148]

Quanto à reparação, cabe a integral, como completa Benjamin:

(...) a tendência no direito do consumidor é pela adoção do princípio da reparação integral (art. 6º, VI e VII, do CDC). Não seria a publicidade – exceto se o legislador assim o dissesse expressamente – uma exceção à regra geral. A norma, pois, em matéria publicitária é a mesma aplicável ao sistema geral protetório do consumidor: causado gravame, cabe o dever de reparar in totum, inclusive pelos danos morais sofridos (art. 6º, VII).[149] [grifo nosso]

No art. 81, parágrafo único, os incisos I, II e IV prevêem a defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas de consumo. Esta poderá ser exercida em juízo tanto individualmente quanto a título coletivo (nos casos de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos):

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

Interessa citar que fica a cargo do anunciante a responsabilidade civil decorrente da aplicação do princípio da vinculação publicitária. A ele também é restrito o direito de regresso. Mas nada impede que, em circunstâncias especiais, o consumidor tem legitimidade para acionar a agência e o veículo. É ilícito ao anunciante recusar o cumprimento da oferta publicitária; a oferta publicitária é irretratável, justamente em respeito à vinculação da oferta com o fornecedor.[150]

O precedente do E. Superior Tribunal de Justiça (REsp 604.172-SP – 3ª Turma. Rei. Min.HUMBERTO GOMES DE BARROS - J. 27.3.2007), em seu teor, afirma:

"(...) As empresas de comunicação não respondem por publicidade de propostas abusivas ou enganosas. Tal responsabilidade toca aos fornecedor es-anunciantes, que a patrocinaram (...) O CDC, quando trata de publicidade, impõe deveres ao anunciante - não às empresas de comunicação (...) O art. 38 do Código protecionista diz que "os ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina". Portanto, o Art. 38 exclui a responsabilidade dos veículos de comunicação por eventual publicidade enganosa ou abusiva, pois o ônus de provar a veracidade e correção (ausência de abusividade) é do fornecedor-anunciante, que patrocina a propaganda ou anúncio, tanto que o Art. 36 impõe que mantenham, em próprio poder, os dados fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem para informação dos legítimos interessados (...) Não é dever dos veículos de comunicação apurar, em princípio, veracidade ou abusividiade do anúncio contratado, pois esse ônus é do fornecedor-anunciante, que poderá responder pelo patrocínio da eventual publicidade enganosa ou abusiva, na forma do art. 38 do CDC. Em suma: os veículos de comunicação não respondem por eventual publicidade abusiva ou enganosa. Tal responsabilidade toca aos fornecedores-anunciantes, que a patrocinaram (CDC, Arts. 3°e38) " (verbis).

Em conformidade com o texto do art. 38 do CDC: “o ônus da prova da veracidade e da correção da informação ou da comunicação publicitária cabe a quem as patrocina".

VOTO Nº 4845

APELAÇÃO  CÍVEL Nº 994.05.081591-3

COMARCA DE SANTOS

APELANTE(S): Elaine Nascimento da Cunha e outros

APELADO(S): Editora Novo Continente S/A e outro

M M. JUIZ CLÁUDIO TEIXEIRA VILLAR

INDENIZAÇÃO. Dano moral causado por propaganda publicitária, sugerindo que a leitura da revista da apelada tornaria a pessoa mais inteligente, à medida que a mulher da enquête, enquanto foliava a revista, deixava de ser "loira" e tornava-se "morena". Estereótipo da "loira burra". Ausência de demonstração do dano. Sentença de improcedência confirmada.

RECURSO DESPROVIDO.

As apelantes mantiveram a argumentação de que se sentiram lesadas pela publicidade veiculada, consoante a aplicação do art. 37 § 2º do CDC, requerendo, como consumidoras em potencial, a indenização por danos morais. Entretanto, o entendimento do douto Juiz foi de desconsiderar tais alegações, posto que o anúncio não seria capaz de gerar desconforto ou lesão moral, como afirma em seu relatório:

Afinal, as apelantes, ao que parece, morenas nasceram, mas por opção, loiras ou louras tornaram-se. Sabe-se lá porque, diferentemente da maioria, ofendidas ficaram com a propaganda veiculada pela ré, a qual, com grande criatividade, conseguiu reproduzir a idéia preconcebida sobre alguém, resultante de hábitos culturais, ainda que desagradáveis. O esclarecimento abaixo não deixa dúvida a respeito de que o raciocínio desenvolvido pelas apelantes é fruto de exacerbada sensibilidade, a qual não merece consideração ante a ausência de provas de que elas foram atingidas, pessoalmente, em sua honra e dignidade.

A doutrina e a jurisprudência majoritárias atestam que a função preventiva da reparação do dano moral é tão somente inibir práticas futuras que ataquem os direitos de personalidade:

O caráter preventivo da reparação do dano moral está indissociavelmente vinculado à necessidade de adoção de medidas que evitem a eclosão de conflitos no cenário social, com reflexos no subsistema das relações de consumo.[151]

Este julgado, embora não represente um caso concreto da análise em questão, vem a ser uma forma de demonstrar o quanto a doutrina e a jurisprudência ainda não amadureceram uma idéia palpável sobre o dano moral coletivo e sua repercussão:

O dano moral coletivo ainda não mereceu da doutrina nacional ou estrangeira uma apurada investigação científica, não obstante cuidar-se de assunto extremamente relevante. Igualmente, a jurisprudência tem pouquíssimos exemplos, apesar da constatação de várias situações fáticas que ocorrem atualmente, especialmente nas relações de consumo, evidenciando que os operadores do direito ainda tratam o assunto com certas reservas.[152]

O paradigma é que a doutrina tradicional sempre tratou desta temática no plano individual. As mudanças estão sendo gradativas, lentas, e o primeiro passo foi a receptividade para a tutela da honra objetiva da pessoa jurídica. Afinal, se um ente criado por lei é protegido, pode-se estender esse benefício a um ente despersonalizado (a coletividade, formado por pessoas físicas), e também detentor de direitos (transindividuais). Ou seja, os direitos difusos e coletivos já reconhecidos pela Constituição Federal, agora expressos no CDC:[153]

O Código de Defesa do Consumidor também não deixa dúvida quanto ao reconhecimento da tutela dos direitos imateriais da coletividade, pois estabelece no art. 6º, VI, a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos.[154]

Não obstante a lei, a doutrina e a jurisprudência acolherem o dano moral no âmbito do direito do consumidor, aparentemente o dano moral coletivo em relações de consumo pré-contratuais ainda não foi objeto de estudo ou aplicada a algum caso concreto.


CONCLUSÃO

Essa pesquisa sócio-jurídica inspirou-se na constatação de que a publicidade atual emprega exageradamente técnicas persuasivas para induzir o consumidor sem sua plena consciência. E mesmo que ele compreenda que se trate de uma mensagem publicitária, ainda assim ele cobiçará tal produto ou serviço para que se sinta parte da sociedade.

No intuito de sempre estimular o consumo, o método empregado é o de tornar necessidades de segunda linha em necessidades básicas. Ou seja, por exemplo, não é um mero produto destinado a lavar os cabelos e deixá-los limpos, macios ou outro adjetivo para um resultado mensurável por ele. O que se vende é uma fantasia, é o acreditar que estará igual ao que se propõe a mensagem publicitária com a aquisição ou uso do objeto de consumo.

Verificando essa reiterada prática, surgiu a questão se o Direito tem ou não regulado e limitado a ação publicitária que extrapola a dignidade do consumidor. Para tanto, tivemos que sopesar a própria publicidade, e em seguida, o Código de Defesa do Consumidor (CDC). No estudo deste, que é a materialização do direito do consumidor demandado pela Constituição Federal de 1988 no art. 5º, inc. XXXII, alguns pontos foram elucidados.

Descobrimos que a mensagem publicitária em geral (que é a fase pré-contratual de uma relação de consumo) vincula o fornecedor, e que a publicidade pode ter seu lado prejudicial (abusiva ou enganosa). Ademais, aplicando o princípio da dignidade humana em circunstância de direito privado, havendo colisão de direitos, prevalece o dito “superprincípio” do direito fundamental. Não é à toa que o CDC, embora regule prioritariamente as relações civis (ordem privada), tem a mesma força de uma norma de ordem pública.

O CDC em diversos artigos expressa a importância em cuidar da vida, saúde, segurança, liberdade de escolha etc. O intento é proteger o consumidor de práticas que atentem sua dignidade e, por conseguinte, seus direitos.

Uma das definições de consumidor apresentadas pelo direito consumerista é a do potencial. Justamente o tipo que é atraído pela publicidade. O fornecedor pode alegar que ainda não houve contrato, todavia o CDC impõe sua vinculação à oferta pelo fato de ter veiculado o anúncio. Assim, o fato de ser um consumidor em potencial dispensa o prévio ajuste de um contrato para que tenha direitos a serem protegidos.

Ao averiguar que uma relação de consumo envolve também a fase anterior ao do contrato, conclui-se que o cuidado com a publicidade faz parte da proteção estabelecida pelo CDC. Se a mensagem publicitária é nociva, o CDC imporá as devidas sanções.

A nocividade normatizada pode ser de dois tipos: a abusiva e a enganosa. O enfoque de ambas está na informação. Neste ponto surgiu o primeiro problema: como definir que tipo de nocividade pode ser averiguada nas diversas formas de persuasão publicitária.

Deste modo, a princípio poderia ser abusiva, mas, para tanto, precisaria estar clara a mensagem de discriminação, de desrespeito, de prejuízo à saúde, entre outras situações descritas e exemplificadas no art. 37, § 2º, CDC. Contudo, a persuasão advém de técnicas psicológicas, que não vão ser claras nesses aspectos, mas sim enaltecer que adquirindo ou utilizando, o indivíduo será mais apreciado que os demais (podemos deduzir que o consumidor ainda não é apreciado, ou não se sinta apreciado, mas pode ser caso usufrua o objeto de consumo). Pode, então, estar violando a dignidade do consumidor.

No outro lado, para ser considerada enganosa, o entrave situa-se sobre onde está a informação enganosa sobre o produto ou serviço oferecido. A doutrina e a jurisprudência avaliam que a informação - na mensagem publicitária - que induz o consumidor está na incorreção ou omissão acerca das afirmações sobre o produto ou serviço. Mas de certa forma, são exemplificativas as circunstâncias de indução em erro: “natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços” (art. 37, § 1º, CDC).  Afinal, se ao adquirir um produto, e a mensagem deste afirma que o resultado será uma satisfação pessoal, pode também estar infringindo a dignidade humana. E a autonomia da vontade.

Portanto, persuadir o consumidor sugerindo-o um resultado almejado ou status superior configura publicidade nociva, mas é tênue a linha que separa a abusividade e a enganosidade nestes casos. E sem demarcá-las, inerte fica a lei.

Outro ponto categórico foi quanto à responsabilidade civil. É certo que onde há dano, há reparação. O dano moral tem sido recepcionado pelo direito consumerista com o propósito preventivo. A lei em si não impede que um consumidor em potencial (a coletividade está inserida neste contexto) entre com uma ação de dano moral nos casos de relação pré-contratual de consumo. Entretanto, intricado é comprovar o nexo causal. Por ser algo de difícil percepção, a confirmação do dano é quase que impossível.

Por conta disso, não foram encontrados casos concretos que ilustrem este tipo de dano moral. Mas há que se lembrar que as crianças, que têm reconhecidas sua vulnerabilidade especial, já têm sido objeto de estudo e normatização sobre a influência da publicidade. Todavia, cabe advertir que, nesse tipo de abordagem psicológica, os demais consumidores também estão extremamente vulneráveis, porquanto não têm o devido discernimento para decidir.

Evidentemente, o CDC é um notável avanço para regular a sociedade de consumo. No entanto, ainda há certas lacunas a serem preenchidas e temas para serem discutidos. E, sem dúvida, o controle da publicidade ainda trará muitos objetos de estudo para direito consumerista.


Referências Bibliográficas

BARBOSA, Fernanda Nunes. Informação: direito e dever nas relações de consumo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito do Consumidor. 2.tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

CARRASCOZA, João Anzanello. A evolução do texto publicitário. São Paulo: Futura, 1999.

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8.ed. São Paulo: Atlas, 2009.

CHAISE, Valéria Falcão. A publicidade em face do código de defesa do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2001.

CORRÊA, Roberto. Contato imediato com planejamento de propaganda. São Paulo: Global, 1995.

CURY, Augusto. A ditadura da beleza e a revolução das mulheres. Rio de Janeiro: Sextante, 2005.

FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Publicidade abusiva: incitação à violência. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999

FERNANDES NETO, Guilherme. Direito da Comunicação Social. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004.

FROTA, Mário. A publicidade infanto-juvenil: perversões e perspectivas. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2007.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, Responsabilidade Civil. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.3.

HOPKINS, Claude. A ciência da propaganda. 5.ed. São Paulo: Cultrix, 1993.

KHOURI, Paulo Roberto Roque. Direito do consumidor. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2009.

LAGES, Leandro Cardoso. Consumidor e informação. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/699>. Acesso em: 10 mai. 2008.

LINDSTROM, Martin. A lógica do consumo: verdades e mentiras sobre o que compramos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.

LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade civil nas relações de consumo. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

MALANGA, Eugênio. Publicidade, uma introdução. 4.ed. São Paulo: Edima, 1987.

MELO, Nehemias Domingos de. Dano Moral nas relações de consumo. São Paulo: Saraiva, 2008

NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Curso de direito do consumidor. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

RIBEIRO, Júlio. (org.) Tudo que você queria saber sobre Propaganda e ninguém teve paciência para explicar. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1995.

SAMPAIO, Rafael. Propaganda de a a Z: como usar a propaganda para construir marcas e empresas de sucesso. Rio de Janeiro: Campus, 1995.

SANTANA, Héctor Valverde. Dano moral no direito do consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

SANT'ANNA, Armando; et al. Propaganda:  teoria, técnica e prática. 8 ed. rev.e ampl. São Paulo: Cengage Learning, 2009.

SANTOS, William Douglas Resinente dos. Como passar em provas e concursos: tudo o que você precisa saber e nunca teve a quem perguntar. 25. ed. rev., ampl.  e atual. Rio de Janeiro: Impetus, 2010.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 6. ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.

SILVA, Marcus Vinicius Fernandes Andrade da. Influência da publicidade na relação de consumo. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/4982>. Acesso em: 10 mai. 2008.

VALE, André Rufino do. Eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2004,

VIEIRA, Tereza Rodrigues; MARTINS, Érika Silvana Saquetti. Direito e Bioética: testemunhas de Jeová e a recusa em receber transfusão de sangue. In: Revista Jurídica Consulex, Brasília: Consulex, ano XI, n. 261, 30.11.07.

WEIL, Pierre; TOMPAKOW, Roland. O corpo fala. 42.ed. Petrópolis: Vozes, 1998.


Notas

[1] CHAISE, Valéria Falcão. A publicidade em face do Código de Defesa do Consumidor. P. 25.

[2] SANTOS, William Douglas Resinente dos. Como passar em provas e concursos: tudo o que você precisa saber e nunca teve a quem perguntar. P. 82.  

[3] MELO, Nehemias Domingos de. Dano Moral nas relações de consumo. P. 41.

[4] SANT'ANNA, Armando; et al. Propaganda:  teoria, técnica e prática. P. 21.

[5] FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Publicidade abusiva: incitação à violência. P. 67.

[6] Apud FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. P. 68.

[7] Hoje em dia, e especialmente no Brasil, ambos os termos são usados indistintamente.

[8] MALANGA, Eugênio. Publicidade, uma introdução. P. 43.

[9] SANT'ANNA, Armando; et al. Propaganda:  teoria, técnica e prática. P. 6-7.

[10] FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Ibid., p. 11.

[11] BARBOSA, Fernanda Nunes. Informação: direito e dever nas relações de consumo, p. 67.

[12] Apud SANT'ANNA, Armando; et al. Propaganda:  teoria, técnica e prática. P. 71.

[13] FROTA, Mário. A publicidade infanto-juvenil: perversões e perspectivas. P. 46.

[14] CURY, Augusto. A ditadura da beleza e a revolução das mulheres. P. 7.

[15] SANT'ANNA, Armando; et al. Ibid , p. 68-70.

[16] SANT'ANNA, Armando; et al. Propaganda:  teoria, técnica e prática. Ibid , p. 62.

[17] FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Ibid, p. 75.

[18] MALANGA, Eugênio. Ibid, p. 43.

[19] SANT'ANNA, Armando; et al. Ibid, p. 5.

[20] HOPKINS, Claude. A ciência da propaganda. P. 49.

[21] WEIL, Pierre; TOMPAKOW, Roland. O corpo fala. P. 27-34.

[22] MALANGA, Eugênio. Ibid, p. 9.

[23] Apud MALANGA, Eugênio. Ibid, p. 45.

[24] MALANGA, Eugênio. Ibid, p. 48.

[25] Apud RIBEIRO, Júlio. (org.) Tudo que você queria saber sobre Propaganda e ninguém teve paciência para explicar. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1995, p. 62.

[26] FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Ibid, p. 4.

[27] Id. Ibid, p. 8-9.

[28] CARRASCOZA, João Anzanello. A evolução do texto publicitário. P. 44.

[29] Id. Ibid, p. 40.

[30] SANT'ANNA, Armando; et al. Ibid , p. 66.

[31] LINDSTROM, Martin. A lógica do consumo: verdades e mentiras sobre o que compramos. P. 72.

[32] SAMPAIO, Rafael. Propaganda de a a Z: como usar a propaganda para construir marcas e empresas de sucesso. P. 13. 

[33] BARBOSA, Fernanda Nunes. Ibid, p. 66.

[34] CORRÊA, Roberto. Contato imediato com planejamento de propaganda. P. 56.  

[35] LINDSTROM, Martin. Ibid, p. 56-59.

[36] LINDSTROM, Martin. Ibid, p. 65.

[37] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. P.438.

[38] Id. Ibid, p.461.

[39] Id. Ibid, p.464.

[40] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p. 463.

[41] Id. Ibid, p. 464.

[42] BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. P. 45.

[43] LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade civil nas relações de consumo. P. 85.

[44] BENJAMIN, Antônio Herman V. et al. Ibid, p. 33.

[45] Id. Ibid, p. 33.

[46] Id. Ibid, p. 57.

[47] CHAISE, Valéria Falcão. Ibid., p. 50.

[48] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid. , p. 33.

[49] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, artigos 220 ao 224.

[50] SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. P. 30.

[51] REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. P. 316.

[52] SANTANA, Héctor Valverde. Dano moral no Direito do Consumidor, p.33.

[53] SARLET, Ingo Wolfgang. Ibid, p. 30.

[54] Id. Ibid. p. 33.

[55] VIEIRA, Tereza Rodrigues; Martins, Érika Silvana Saquetti Martins. Direito e Bioética: testemunhas de Jeová e a recusa em receber transfusão de sangue. Revista Jurídica Consulex, Brasília: Consulex, ano XI, n. 261, 30.11.07, p. 15.

[56]  Id. Ibid., p. 17.

[57] VALE, André Rufino do. Eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas, p. 174.

[58] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid, p. 66.

[59] FERNANDES NETO, Guilherme. Direito da Comunicação Social. P. 61.

[60] Id. Ibid., p.79.

[61] BENJAMIN, Antônio Herman V.  et. al. Ibid , p. 26.

[62] Id. Ibid, p. 28.

[63] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid, p.67.

[64] CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil, p. 17.

[65] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid , p. 55-56.

[66] Id. Ibid , p. 59.

[67] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid , p..188.

[68] Id. Ibid. p. 191.

[69] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid.  p.291.

[70] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid , p.190-191.

[71] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid , p. 189.

[72] Id. Ibid, p. 56.

[73] FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Ibid, p. 82.

[74] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p.71-72.

[75] KHOURI, Paulo Roberto Roque. Direito do consumidor. P. 41-42.

[76] SANTANA, Héctor Valverde. Ibid, p. 74.

[77] KHOURI, Paulo Roberto Roque. Ibid, p. 42.

[78] SANTANA, Héctor Valverde. Ibid, p.61.

[79] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p. 67.

[80] MELO, Nehemias Domingos de. Ibid. P. 41.

[81] SANTANA, Héctor Valverde. Ibid, p. 74.

[82] KHOURI, Paulo Roberto Roque. Ibid, p. 43.

[83] Id. Ibid, p. 65.

[84] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p.79.

[85] Id. Ibid. p.80.

[86] BARBOSA, Fernanda Nunes. Ibid, p. 135.

[87] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p.85.

[88] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p.193.

[89] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p.180.

[90] Id. Ibid, p. 180.

[91] BARBOSA, Fernanda Nunes. Informação: direito e dever nas relações de consumo, p. 138.

[92] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p. 192.

[93] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p. 62-63.

[94] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p.181-182.

[95] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p.389.

[96] CHAISE, Valéria Falcão. Ibid, p. 95.

[97] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid , p. 182-183.

[98] Id. Ibid. p. 182.

[99] Id. Ibid. p. 180.

[100] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p. 35.

[101] Id. Ibid, p. 71.

[102] Id. Ibid, p. 75.

[103] Id. Ibid, p. 187.

[104] LISBOA, Roberto Senise. Ibid. p. 97.

[105] SANTANA, Héctor Valverde. Ibid, p. 115.

[106] CAVALIERI FILHO, Sergio. Ibid, p. 493.

[107] MELO, Nehemias Domingos de. Ibid. p. 77-78.

[108]FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Ibid, p. 82.

[109] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p.463.

[110] BARBOSA, Fernanda Nunes. Ibid, p. 66.

[111] FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Ibid, p. 72.

[112] Apud FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Ibid, p. 65.

[113] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p.512.

[114] LAGES, Leandro Cardoso. Consumidor e informação. Disponível em:

   <http://jus.com.br/revista/texto/699>. Acesso em: 10 mai. 2008.

[115] SILVA, Marcus Vinicius Fernandes Andrade da. Influência da publicidade na relação de consumo. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/4982>. Acesso em: 10 mai. 2008.

[116] FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Ibid, p. 74.

[117] KHOURI, Paulo Roberto Roque. Ibid,  p. 70.

[118] FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Ibid, p. 02.

[119] Apud FEDERIGUI, Suzana Maria Pimenta Catta Preta. Ibid, p. 58.

[120] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p.467-468.

[121] Id. Ibid. p.469.

[122] Id. Ibid. p.433.

[123] Id. Ibid. p.467.

[124] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p.85.

[125] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, Responsabilidade Civil. p. 9.

[126] SANTANA, Héctor Valverde. Ibid, p.75.

[127] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Ibid. p. 21.

[128] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p.422-423.

[129] Id. Ibid. p. 463.

[130] Id. Ibid. p. 28.

[131] Id. Ibid. p. 390.

[132] Id. Ibid. p. 390.

[133] KHOURI, Paulo Roberto Roque. Ibid, p. 66

[134] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p.433.

[135] KHOURI, Paulo Roberto Roque. Ibid, p. 70.

[136] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p. 183.

[137] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p.471.

[138] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p. 183.

[139] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p. 182.

[140] SANT'ANNA, Armando; et al. Ibid , p. 22.

[141] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p. 429.

[142] CAVALIERI FILHO, Sergio. Ibid, p. 17.

[143] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p. 186-187.

[144] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p. 289.

[145] KHOURI, Paulo Roberto Roque. Ibid, p. 156.

[146] NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Ibid. p.160.

[147] KHOURI, Paulo Roberto Roque. Ibid, p. 159.

[148] Id. Ibid, p. 157.

[149] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p. 187.

[150] BENJAMIN, Antônio Herman V. et. al. Ibid, p. 187..

[151] SANTANA, Héctor Valverde. Ibid, p. 197.

[152] Id. Ibid, p.167.

[153] Id. Ibid, p.167-168.

[154] Id. Ibid  p.169.


Abstract: This legal and social study examines the civil liability, moral damage and consumers rights against consumerism advertising. Articles from Brazilian´s Code of Consumer Protection (CDC) are explored to ascertain the existence and which ones limits such liability. Herein, we had the opportunity to study multiple areas of law, especially Civil (Civil Liability, Contracts, Consumer), constitucional law. Thus brings us ethical and legal solutions for the problems formulated. And in the area of applied social sciences, The Media and Sociology. Therefore, we hope that with the use of the researched material, we can demonstrate that it is the law (legal system) that can contain the spread of consumption and advertising (social order) in relation tothe autonomy of the will of the consumer.

Keywords: consumption, advertising, civiil liability, freedom of will, moral damage.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BITTENCOURT, Luciana Gomes. Os limites jurídicos da publicidade nas relações de consumo brasileiras: as manipulações de desejo nas relações pré-contratuais consumeristas.. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3360, 12 set. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22585. Acesso em: 28 mar. 2024.