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Os canais de parametrização de fiscalização aduaneira e o lançamento tributário

Os canais de parametrização de fiscalização aduaneira e o lançamento tributário

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Analisa-se o lançamento tributário na realidade do Direito Aduaneiro, especialmente nas operações de importação rotineiras. Analisa-se o momento da caracterização do lançamento tributário nos diversos canais de parametrização de desembaraço de mercadorias.

1 INTRODUÇÃO

Os institutos de Direito Tributário muitas vezes são aplicados às normas de Direito Aduaneiro de forma indistinta, sem se considerar as peculiaridades das normas aduaneiras.

Entende-se que isto ocorre pelo fato de que muitas vezes esses dois ramos do Direito se confundem e apresentam muitas características, princípios e valores semelhantes.

Por outro lado, muitos de seus objetivos e valores são bem distintos.

Neste artigo procura-se trazer o instituto do lançamento tributário para a realidade do Direito Aduaneiro, fazendo-se uma análise sobre a modalidade de lançamento que ocorre nas operações de importação rotineiras e também uma análise sobre o momento da caracterização do lançamento tributário nos diversos canais de parametrização de desembaraço de mercadorias.

Desta forma, para se atingir este objetivo, é fundamental começar com uma explanação da sistemática do comércio exterior.


2 SISTEMÁTICA DO COMÉRCIO EXTERIOR

Inicialmentefaz-se mister estabelecer a diferenciação conceitual entre comércio internacional e comércio exterior.

A expressão comércio internacional tem caráter mais amplo e genérico e é usualmente utilizada para definir “o conjunto de operações realizadas entre países onde há intercâmbio de bens e serviços ou movimento de capitais” (CORTIÑA LOPEZ e GAMA, 2007, p. 193) sendo ele regido por regras provenientes de acordos internacionais adotados pelos governos dos países signatários.

Assim, o comércio internacional pressupõe a existência de dois ou mais países; o intercâmbio de bens, serviços e/ou movimento de capitais; e a existência de normas internacionais que disciplinam esse intercâmbio.

Por sua vez, a expressão comércio exterior

representa a relação comercial de um país específico com os demais, expressa em termos, regras e normas internas (legislação), em função de interesses, prioridades, limitações e exigências, visando resguardar os interesses do país, preferencialmente sem colidir com as normas do comércio internacional. (CORTIÑA LOPEZ e GAMA, 2007, p. 193).

Portanto, a expressão comércio exterior possui caráter mais específico, restringindo-se aos termos, regras e normas internas relativas à relação comercial de um país específico com os demais.

Essas normas de comércio exterior, conforme conceito de Cortiña Lopez e Gama, refletem os interesses, prioridades, limitações e exigências de determinado país, segundo sua política econômica e de desenvolvimento.

O comércio exterior brasileiro, tendo em vista a complexidade de suas normas e as diversas vertentes de controle governamental, além dos vários Ministérios intervenientes e respectivas multas administrativas, pode ser encarado como um comércio bastante restritivo e protecionista, que realmente dificulta a entrada de produtos estrangeiros e privilegia a exportação de produtos nacionais.

Todavia não se pode desconsiderar a política de incentivo à aquisição de bens de capital e tecnologia importados visando ao desenvolvimento da indústria nacional e à capacitação tecnológica do mercado interno, através de alíquotas diferenciadas, isenções, possibilidade de se pleitear exceções tarifárias, entre outros.

Assim, no comércio exterior brasileiro, o controle governamental, segundo Luz (2010), é exercido em três vertentes: administrativa, aduaneira e cambial.

A vertente administrativa é aquela que trata do controle exercido sobre o que pode ou não pode entrar no país, assim como aquilo que pode ou não sair do país. Esse controle é feito por meio do licenciamento das importações e é exercido por diversos órgãos anuentes, tais como a SECEX – Secretaria de Comércio Exterior – do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; Ministério da Saúde/ANVISA; IBAMA; e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, dentre inúmeros outros.

Portanto, caso se queira importar ou exportar determinada mercadoria, dependendo do tipo, material ou interesses comerciais do Brasil, o interessado deverá pedir autorização para determinado órgão governamental para que este emita uma licença de importação ou exportação para esta mercadoria.

A vertente aduaneira diz respeito ao controle exercido pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e consiste na verificação dos documentos, da mercadoria e dos tributos incidentes no comércio exterior.

Finalmente, a vertente cambial consiste no controle exercido pelo Banco Central sobre as remessas ou recebimentos dos valores decorrentes dos pagamentos das transações internacionais. Esse controle é exercido através de elaboração de diversas normas sobre o funcionamento do mercado cambial, contratos de câmbio e fiscalização de seu cumprimento.

Poder-se-ia incluir ainda nestes controles, o controle exercido anteriormente à realização das operações comerciais internacionais que se reflete na habilitação do interessado no RADAR, também conhecida como habilitação para utilizar o SISCOMEX, que é o Sistema Integrado de Comércio Exterior da Receita Federal.

Toda pessoa física ou jurídica que pretenda realizar operações de comércio exterior deve requerer sua habilitação no Radar perante a Receita Federal do Brasil, na qual deverá apresentar um conjunto de documentos e informações para que a Receita Federal possa analisar sua capacidade operacional, econômica e financeira, de forma a evitar que empresas inidôneas realizem operações de comércio internacional.

Este estudo analisará o lançamento tributário em cada uma das hipóteses de canais de parametrização, canais estes que dizem respeito à segunda vertente, o controle aduaneiro.

Assim, para um melhor entendimento do assunto, faz-se necessária a análise do procedimento comum para a realização de uma importação.

1.1 Importação de mercadorias

O procedimento geral de uma importação, segundo Luz (2010, p. 1 a 5), inicia-se pela escolha da mercadoria e seu fornecedor, prazo e forma de pagamento e prazo de entrega.

Escolhida a mercadoria, prazo e forma de pagamento, e prazo de entrega, o exportador no exterior emite um documento denominado fatura pró-forma para o importador no Brasil.

A fatura pró-forma é um documento que contém informações básicas sobre o provável negócio a ser concluído, tais como: a) partes, dados completos do exportador e importador; b) produto, especificação da mercadoria; c) preço, valores e condições de venda.

A fatura pró-forma equivale a uma proposta comercial e o aceite do importador brasileiro e devolução ao exportador vincula o exportador ao cumprimento da proposta feita.

Assim, uma vez aceita a proposta por parte do importador, antes de embarcar a mercadoria, o importador deve verificar se existe exigência de licença ou de autorização de importação e, havendo exigência ou autorização, deve providenciá-las para poder então, dar seguimento à importação.

Se não houver as exigências, ou havendo, tão logo sejam deferidas pelo órgão responsável, o importador deverá comunicar ao exportador estrangeiro que a mercadoria poderá ser embarcada para o Brasil.

O exportador encaminhará a mercadoria para uma empresa de transporte aéreo, marítimo ou de outra modalidade e efetuará o chamado contrato de frete.

O contrato de frete, conhecido como conhecimento de carga, é um título de crédito que prova quem é o possuidor ou o proprietário da mercadoria e contém todas as informações relativas às partes; ao local de origem e entrega da mercadoria; ao transportador; às características da mercadoria e embalagens; ao valor da mercadoria; ao prazo de entrega; ao número de vias; e aos documentos entregues ao transportador para acompanhar a mercadoria.

Emitido o contrato de frete, a mercadoria poderá ser embarcada para o Brasil, onde só poderá adentrar no território nacional nas chamadas Zonas Primárias, que compreendem os portos, aeroportos e pontos de fronteira alfandegados, locais onde é possível a fiscalização das mercadorias.

Assim, uma vez que a mercadoria chega a um porto, aeroporto ou ponto de fronteira alfandegado, ela é descarregada e custodiada pela INFRAERO – Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária, no caso das mercadorias aéreas; e pelos terminais portuários mantidos pelo Poder Público ou por empresas concessionárias, no caso das cargas marítimas ou transportadas por outros modais.

A unidade de armazenamento manterá a mercadoria sob sua guarda até que o importador registre uma Declaração de Importação (DI) e apresente os documentos para a fiscalização da Receita Federal e de outros órgãos intervenientes, para que estas possam exercer seus controles aduaneiros e administrativos, fiscalizando a correição das informações e correição do valor a ser recolhidoa título de tributos, que serão debitados automaticamente da conta bancária do importador.

Como este trabalho pretende abordar essencialmente a parte tributária, ater-se-á apenas às normas relativas à fiscalização por parte da Receita Federal.  Assim, os documentos a serem apresentados pelo importador à Receita Federal, como regra, são aqueles expressos no artigo 18 da Instrução Normativa 680 de 2006, da Secretaria da Receita Federal do Brasil:

Art. 18. A DI será instruída com os seguintes documentos:

I - via original do conhecimento de carga ou documento equivalente;

II - via original da fatura comercial, assinada pelo exportador;

III - romaneio de carga (packinglist), quando aplicável; e

IV - outros, exigidos exclusivamente em decorrência de Acordos Internacionais ou de legislação específica.(BRASIL, IN SRFB 680/2006)

Desta forma, enquanto a mercadoria viaja para ser entregue no Brasil, a documentação do artigo 18 da mencionada Instrução Normativa deverá chegar às mãos do importador, para que ele possa apresentá-la no momento do desembaraço aduaneiro.

Esses documentos poderão chegar às mãos do importador através do envio direto por parte do exportador, o que normalmente ocorre; através do envio dos documentos junto à mercadoria pelo próprio transportador; ou através do envio dos documentos mediante rede bancária, situação em que normalmente se vincula a entrega dos documentos pelo banco ao pagamento das mercadorias importadas.

Finalmente, registrada a Declaração de Importação e apresentados os documentos para a Receita Federal do Brasil, esta confere a regularidade da importação e recolhimento dos tributos.

Se a Receita Federal do Brasil confirmar que as informações prestadas estão corretas e que os tributos foram devidamente recolhidos, o despacho aduaneiro é encerrado e as mercadorias são desembaraçadas ficando à disposição para a retirada pelo importador, sem prejuízo da cobrança dos períodos de armazenagem por parte da INFRAERO.

Paralelamente, o pagamento da mercadoria ocorrerá da forma acordada entre o importador e o exportador estrangeiro, podendo ser antecipado, à vista ou a prazo, mediante interveniência do Banco Central, que fará as conversões de moedas segundo contrato de câmbio.

Assim, demonstrou-se em linhas gerais o funcionamento de uma importação feita por uma empresa brasileira. Entretanto, a etapa da fiscalização da mercadoria, dos documentos e dos recolhimentos de tributos por parte da Receita Federal do Brasil, quando a mercadoria chega ao país, deve ser aprofundado para uma melhor compreensão, necessária para se atingir os objetivos deste estudo.

1.2 Canais de parametrização

A declaração de importação, instruída com os documentos relacionados no artigo 18 da Instrução Normativa 680 da Secretaria da Receita Federal do Brasil e com outrospossíveis documentos que venham a ser exigidos, conforme visto, deve ser registrada no Siscomex.

Uma vez registrada a declaração de importação é procedida a seleção e distribuição das mercadorias para os canais de parametrização de conferência aduaneira.

O termo "canais de parametrização" é justificado em razão de o grau de profundidade da conferência das mercadorias no Brasil ocorrer em razão de parâmetros traçados pela Receita Federal, que, segundo seu entendimento, ensejam uma verificação mais rigorosa ou não das mercadorias que entram no Brasil.

Assim, segundo Luz,

Várias situações podem direcionar a DI para uma conferência mais rigorosa: por exemplo, se a DI está sendo registrada por uma pessoa jurídica que tem um histórico de fraudes, se a mercadoria é muito suscetível ao uso de classificação fiscal errada, se o bem provém de um país que, costumeiramente, exporta mercadorias com subfaturamento, se o brinquedo está sendo declarado como originário de um país que não cumpre normas técnicas, se o importador não é habitual, enfim, inúmeras são as verificações que o SISCOMEX faz para decidir o canal de conferência. (LUZ, 2010, p. 78)

Percebe-se então que esses parâmetros levam em conta a proteção do mercado interno e concorrência leal, a proteção da população contra a nocividade de alguns produtos, a possibilidade de fraudes e a possibilidade de fraudes contra o fisco, tomando como base as características do importador, da mercadoria, o tratamento tributário utilizado, os volumes e valores a serem importados.

Entretanto, obviamente, a Receita Federal não fornece todos os parâmetros e verificações que serão observados para determinar o canal de parametrização a que será destinada determinada mercadoria, sob pena de importadores de má-fé utilizarem de falsas declarações para maquiar informações que poderiam ensejar diferente canal de parametrização a que a mercadoria seria submetida.

Todavia a Receita Federal fornece algumas diretrizes que servem também para fomentar as boas condutas das empresas que realizam regularmente operações de comércio exterior, para que, após adquirirem a confiança da fiscalização pela prática dessas condutas e transparência perante o Fisco, fiquem sujeitas a controles menos rigorosos de suas mercadorias.

Essas diretrizes estão expressas no § 1o do artigo 21 da Instrução Normativa 680 de 2006, da Secretaria da Receita Federal do Brasil:

Art. 21 - Após o registro, a DI será submetida a análise fiscal e selecionada para um dos seguintes canais de conferência aduaneira:

[...]

§ 1º - A seleção de que trata este artigo será efetuada por intermédio do Siscomex, com base em análise fiscal que levará em consideração, entre outros, os seguintes elementos:

I - regularidade fiscal do importador;

II - habitualidade do importador;

III - natureza, volume ou valor da importação;

IV - valor dos impostos incidentes ou que incidiriam na importação;

V - origem, procedência e destinação da mercadoria;

VI - tratamento tributário;

VII - características da mercadoria;

VIII - capacidade operacional e econômico-financeira do importador; e

IX - ocorrências verificadas em outras operações realizadas pelo importador. (Brasil, IN SRFB 680/2006)

A análise destas diretrizes permite concluir que, quanto mais transparente e segura a operação, menor rigor haverá na fiscalização.

Traçadas as diretrizes que determinam o canal a ser observado para a conferência da mercadoria importada, cumpre esclarecer quais são e quais procedimentos serão adotados em cada um dos canais de parametrização.

O mesmo artigo 21 da Instrução Normativa 680 de 2006, da Secretaria da Receita Federal do Brasil, que em seu §1o estabeleceu as diretrizes de parametrização, nos incisos de seu caput determina quais são os canais de parametrização:

Art. 21. Após o registro, a DI será submetida a análise fiscal e selecionada para um dos seguintes canais de conferência aduaneira:

I - verde, pelo qual o sistema registrará o desembaraço automático da mercadoria, dispensados o exame documental e a verificação da mercadoria;

II - amarelo, pelo qual será realizado o exame documental, e, não sendo constatada irregularidade, efetuado o desembaraço aduaneiro, dispensada a verificação da mercadoria;

III - vermelho, pelo qual a mercadoria somente será desembaraçada após a realização do exame documental e da verificação da mercadoria; e

IV - cinza, pelo qual será realizado o exame documental, a verificação da mercadoria e a aplicação de procedimento especial de controle aduaneiro, para verificar elementos indiciários de fraude, inclusive no que se refere ao preço declarado da mercadoria, conforme estabelecido em norma específica.

A análise dos diversos canais de parametrização da fiscalização das mercadorias permite o entendimento de que essa parametrização fez-se necessária em razão do caos que uma fiscalização minuciosa de todas as mercadorias que entram no país provocaria tanto nos órgãos de fiscalização quanto no próprio comércio exterior.

A fiscalização nos moldes do canal vermelho de todas as mercadorias que entram no país, ainda mais se considerada a grande expansão do comércio exterior brasileiro a partir do início dos anos 90 do século passado, demandaria a necessidade de dezenas, centenas ou até milhares de fiscais e mesmo assim, a liberação das mercadorias seria um procedimento extremamente moroso, o que iria inviabilizar o próprio comércio exterior brasileiro.

Desta forma, o Estado brasileiro, em nome da viabilidade do comércio internacional entre o Brasil e o restante do mundo, absteve-se de fiscalizar minuciosamente todas as mercadorias que entram no país, concentrando seus esforços naquelas mercadorias e operações que considera mais importantes ou com um grau maior de risco para o mercado nacional.

Assim, foi criado o canal verde, que é o canal por onde passa o maior volume de mercadorias importadas,com a finalidade de facilitar os procedimentos de desembaraço aduaneiro, pois nesse canal é dispensada qualquer conferência da mercadoria ou da documentação, estando a mercadoria automaticamente desembaraçada quando parametrizada nele.

A conferência aduaneira, de fato, ocorrerá nos canais de parametrização amarelo, vermelho ou cinza, podendo-se daí extrair que ela possui três etapas, conforme entendimento de Luz (2010, p. 79), sendo essas etapas a do exame documental; verificação da mercadoria; e aplicação de procedimento especial de controle aduaneiro.

Entretanto, para se entender exatamente no que consiste a conferência aduaneira, leia-se seu conceito no artigo 564 do Regulamento Aduaneiro, positivado através do Decreto 6759 de 2009:

Art. 564 - A conferência aduaneira na importação tem por finalidade identificar o importador, verificar a mercadoria e a correção das informações relativas a sua natureza, classificação fiscal, quantificação e valor, e confirmar o cumprimento de todas as obrigações, fiscais e outras, exigíveis em razão da importação. (Brasil, Regulamento Aduaneiro, Decreto 6759/2009)

Assim, conforme afirmado, a conferência aduaneira ocorrerá de fato somente nos canais amarelo, vermelho e cinza de parametrização, pois somente nesses canais será possível verificar todas as informações descritas no artigo 564 do Regulamento Aduaneiro.

O canal cinza é o canal de parametrização onde haverá a mais rigorosa fiscalização da mercadoria em razão da declaração de importação apresentar indícios de fraude.

Neste canal a Receita Federal fará, de forma minuciosa, o exame documental, a verificação da mercadoria e a aplicação do procedimento especial de controle aduaneiro, onde levantará diversos dados da empresa importadora, assim como de importações pretéritas e relacionamento com o Fisco, podendo a mercadoria ficar retida por até 180 dias para que o indício de fraude seja esclarecido.

Desta forma, nesse canal, a Receita Federal terá à sua disposição todas as informações a respeito da mercadoria, assim como verificará pessoalmente através de seus fiscais a mercadoria e todas as suas características.

O canal vermelho apresenta características semelhantes às do canal cinza, porém sem a necessidade de procedimento especial de controle aduaneiro em razão de não haver indícios de fraude, mas apenas a necessidade de conferência física da mercadoria.

O canal vermelho demandará então, além do exame dos documentos de importação, a verificação física da mercadoria. Nesse canal não haverá necessidade de uma investigação minuciosa sobre a empresa e as mercadorias importadas. O fiscal da Receita Federal verificará a documentação apresentada e avaliará, além da correição dos dados dos documentos, se as mercadorias correspondem ao que consta da documentação, conforme artigo 29 da Instrução Normativa 680 de 2006 da Secretaria da Receita Federal:

Art. 29 - A verificação física é o procedimento fiscal destinado a identificar e quantificar a mercadoria submetida a despacho aduaneiro, a obter elementos para confirmar sua classificação fiscal, origem e seu estado de novo ou usado, bem assim para verificar sua adequação às normas técnicas aplicáveis.

§ 1º - O importador prestará à fiscalização aduaneira as informações e a assistência necessárias à identificação da mercadoria.

§ 2º - A fiscalização aduaneira, caso entenda necessário, poderá solicitar a assistência de técnico credenciado para proceder à identificação da mercadoria. (BRAZIL, IN SRFB 680/2009).

A Receita Federal teráà sua disposição, também no canal vermelho de parametrização, todas as informações a respeito da mercadoria, assim como verificará pessoalmente através de seus fiscais a mercadoria e todas as suas características.

Por sua via, no canal amarelo de parametrização, será realizado o exame documental da mercadoria, onde estarão descritas todas as características da mercadoria, classificação fiscal, tributos recolhidos, características do importador, exportador, fabricante, local de origem,entre outras características, que permitirão ao fiscal da Receita Federal a perfeita identificação do produto.

Art. 25 - O exame documental das declarações selecionadas para conferência nos termos do art. 21 consiste no procedimento fiscal destinado a verificar:

I - a integridade dos documentos apresentados;

II - a exatidão e correspondência das informações prestadas na declaração em relação àquelas constantes dos documentos que a instruem, inclusive no que se refere à origem e ao valor aduaneiro da mercadoria;

III - o cumprimento dos requisitos de ordem legal ou regulamentar correspondentes aos regimes aduaneiros e de tributação solicitados;

IV - o mérito de benefício fiscal pleiteado; e

V - a descrição da mercadoria na declaração, com vistas a verificar se estão presentes os elementos necessários à confirmação de sua correta classificação fiscal.

Parágrafo único. Na hipótese de descrição incompleta da mercadoria na DI, que exija verificação física para sua perfeita identificação, com vistas a confirmar a correção da classificação fiscal ou da origem declarada, o AFRF responsável pelo exame poderá condicionar a conclusão da etapa à verificação da mercadoria. (Brasil, IN SRFB 680/2009)

Se a documentação apresentada for suficiente para sanar todas as dúvidas da fiscalização e não for constatada nenhuma irregularidade, será efetuado o desembaraço aduaneiro sem a necessidade de verificação da mercadoria.

Por outro lado, se ainda restar alguma dúvida à respeito da mercadoria ou se houver dúvida a respeito de algum dado informado nos documentos apresentados, é facultado ao fiscal mudar o canal amarelo para vermelho com a finalidade de se promover a verificação física da mercadoria.

Dessa forma, assim como nas modalidades anteriores de canais de parametrização, a Receita Federal teráà sua disposição todas as informações a respeito da mercadoria, sendo possível apurar qualquer irregularidade desde que a mercadoria tenha sido descrita de forma correta e satisfatória, ou, em caso contrário, sendo facultado ao fiscal converter o canal amarelo em vermelho caso ainda restem dúvidas que demandem a verificação física da mercadoria.

Assim, ocorrendo a liberação da mercadoria após a sua verificação documental, conclui-se que os dados constantes desses documentos foram satisfatórios e suficientes para a verificação da regularidade da importação.

Finalmente, o canal verde de parametrização, é o canal dos sonhos do importador, como explica Rodrigo Luz:

O canal verde é o canal dos sonhos de todo importador. Se a DI for direcionada para este canal, automaticamente a mercadoria está desembaraçada, sem haver, em princípio, nenhuma etapa de conferência aduaneira. No entanto, mesmo neste canal, se houver alguma desconfiança por parte da Receita Federal, a mercadoria pode ser submetida a conferência, como se depreende da leitura do § 2º do art. 21, antes transcrito. (LUZ, 2010, p. 80).

Observe-se que o canal verde demanda apenas a análise da Declaração de Importação, via sistema, no qual não há, a princípio, qualquer conferência ou análise humana.

Nesse canal o sistema cruza as informações fornecidas pelos diversos agentes envolvidos na importação da mercadoria com os parâmetros definidos pela Receita Federal e, caso não ocorra nenhuma divergência ou informação suspeita, a mercadoria será automaticamente desembaraçada.

Verificadas as peculiaridades dos diversos canais de parametrização, constata-se que a qualidade da informação e a transparência da relação entre o importador e o Fisco são determinantes para a maior facilidade de realização do desembaraço aduaneiro.

Por outro lado, estando as informações apresentadas insuficientes para a formação da convicção do Auditor Fiscal da Receita Federal ou indicativas de fraudes contra o comércio exterior brasileiro, o mesmo deverá alterar o canal de fiscalização para um canal cuja verificação seja mais minuciosa, de acordo com a situação. 


2 O LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO NO DIREITO ADUANEIRO

O lançamento tributário é conceituado pelo Código Tributário Nacional brasileiro, em seu artigo 142, como o

[...] procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. (Brasil, CTN, artigo 142).

Note-se que não há referência alguma ao termo homologação, referindo-se o ato do lançamento à atividades de verificação, determinação, cálculo, identificação e aplicação de penalidades.

Fábio Fanucchi trabalha o conceito de lançamento tributário buscando sua origem no conceito de lançamento contábil, afirmando que o lançamento tem a função de dar os contornos exatos da obrigação tributária:

O lançamento do direito tributário tem a mesma origem e o mesmo significado do lançamento contábil, isto é, representa um ato de escrever, de registrar por escrito uma determinada situação. Assim como a operação econômica da empresa é lançada em seus livros de contabilidade; o nome do culpado é lançado no rol de criminosos; a obrigação tributária nascida é qualitativa e quantitativamente acertada no lançamento, servindo este para dar os contornos exatos dentro dos quais a obrigação estará delimitada. Cremos que é esse o significado exato do termo e, de passagem nesta explicação, fomos obrigados a recorrer à expressão italiana com o mesmo significado, desde que ela é capaz de aclarar devidamente o pensamento que externamos. (FANUCCHI, 1983, p. 271).

Paulo de Barros Carvalho explica bem a diferença existente entre o ato de lançamento e ato homologatório, facilmente confundida pelo intérprete mais desatento:

A conhecida figura do lançamento por homologação é um ato jurídico administrativo de natureza confirmatória, em que o agente público, verificado o exato implemento das prestações tributárias de determinado contribuinte, declara, de modo expresso, que obrigações houve, mas que se encontram devidamente quitadas até aquela data, na estrita consonância dos termos da lei. Não é preciso despender muita energia mental para notar que a natureza do ato homologatório difere da do lançamento tributário. Enquanto aquele primeiro anuncia a extinção da obrigação, liberando o sujeito passivo, estoutro declara o nascimento do vínculo, em virtude da ocorrência do fato jurídico. Um certifica a quitação, outro certifica a dívida. Transportando a dualidade para outro setor, no bojo de uma analogia, poderíamos dizer que lançamento é a certidão de nascimento de uma obrigação tributária, ao passo que a homologação é a certidão de óbito. (CARVALHO, 1993, p. 282-283)

Assim sendo, o ato do lançamento e o ato da homologação não correspondem ao mesmo ato e não ocorrem no mesmo momento.

É importante considerar que este conceito de lançamento é bem aceito na doutrina nacional, tendo Baleeiro afirmado que

Na doutrina, o lançamento tem sido definido como o ato, ou a série de atos, de competência vinculada, praticado por agente do Fisco, para verificar a realização do fato gerador em relação a determinado contribuinte, apurando qualitativa e quantitativamente o valor da matéria tributável; segundo a base de cálculo, e, em consequência, liquidando o quantum do tributo a ser cobrado. (BALEEIRO, 2006, p.782)

Esse conceito pode ser melhor entendido nas palavras de Sacha Calmon Navarro Coêlho ao explicar que

O lançamento, como ato administrativo de aplicação da lei genérica e abstrata aos casos concretos, deve reportar-se à lei que vigia ao tempo do fato gerador, aplicando-a. Consequentemente, a sua função não é, absolutamente, criadora do crédito, senão que declaratória do seu prévio existir nos exatos termos da lei contemporânea ao seu nascimento. O fato gerador, ao acontecer, instaura a obrigação e o crédito tributário, como prescreve o CTN. (COÊLHO, 2010, p. 661)

Pode-se extrair então a importante conclusão de que o lançamento é ato administrativo de aplicação da lei genérica e abstrata aos casos concretos, instaurando a obrigação e o crédito tributário.

Diante disso, ocorrendo a verificaçãoda realização do fato gerador em relação a determinado contribuinte, apurando-se qualitativa e quantitativamente o valor da matéria tributável e recolhendo-se o valor devido poder-se-ía concluir que houve o lançamento tributário e a constituição do crédito tributário decorrente.

Porém, o lançamento somente será considerado ocorrido, daí resultando a exigência do crédito tributário, se esse ato do lançamento for praticado por agente do Fisco, conforme determinado pelo artigo 142 do Código Tributário Nacional.

Uma vez realizado o ato administrativo do lançamento, este terá, entre seus efeitos relevantes, dois que se destacam:

Primus - O de traduzir a lei e especificar a existência concreta de obrigação tributária entre o sujeito ativo e o passivo, bem como o seu conteúdo, de conformidade com a legislação existente ao tempo em que ocorreu o fato jurígeno. Ato jurídico administrativo de efeitos declaratórios: o conceito calha muito bem ao lançamento fiscal.

Secundus - O de conferir exigibilidade - quando a sua prática se faz necessária - ao crédito tributário, acrescentando densidade ao direito subjetivo da Fazenda Pública. Sabe-se que a ação de execução (processo de execução do direito, e não cognição), para ser aforada, requisita direito líquido, certo e exigível. O lançamento tem esta virtude, na medida em que certifica e torna líquido o quantum debeaturda obrigação tributária (certidões de dívida ativa). (COÊLHO, 210, p.667).

Entretanto, ressalte-se que esse segundo efeito, o de conferir exigibilidade, quando se tratar de impostos sujeitos à homologação, é prescindível:

Tiremos conclusões:

[...] D) o lançamento somente confere a exigibilidade necessária ao crédito tributário do sujeito ativo nos casos dos tributos que exigem lançamentos diretos (IPTU, IPVA) ou que pedem lançamentos após declaração do contribuinte (ITR, ITBI). Nos impostos sujeitos à homologação do pagamento, é ele prescindível. A própria lei torna obrigatório o recolhimento: o contribuinte paga sem que haja a mínima interferência do Estado-Administração. (COÊLHO, 2010, p.662).

Essa diferença relativa a questão da exigibilidade é de extrema importância para se compreender o tipo de lançamento que ocorre com imposto de importação e o momento em que se pode concluir pela ocorrência do lançamento, quando se tomar como base os canais de parametrização.

Entretanto faz-se mister analisar primeiramente as modalidades de lançamento para que seja possível entender o que ocorre com o lançamento nos diversos canais de parametrização.

O artigo 147 do CTN estabelece a modalidade de lançamento denominada Lançamento com Base em Declaração.

Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato indispensáveis à sua efetivação.

§1º A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a reduzir ou a excluir tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o lançamento.

§2o Os erros contidos na declaração e apuráveis pelo seu exame serão retificados de ofício pela autoridade administrativa a que competir a revisão daquela. (BRASIL, CTN, art. 147)

Nessa modalidade de lançamento tem-se como característica essencial a prestação de informações por parte do sujeito passivo ou de terceiro sobre a matéria de fato indispensável ao lançamento.

Assim, o lançamento vai ocorrer quando a autoridade administrativa tomar conhecimento da matéria de fato informada na declaração do sujeito ativo ou de terceiro, conforme seja o caso.

Esse tipo de lançamento também é conhecido como lançamento misto por parte da doutrina, pelo fato de contar com a colaboração do contribuinte, conforme visto.

Entretanto, esclareça-se que o lançamento é um ato, singular, privativo da autoridade administrativa. Por sua via, para que se efetive esse ato, são necessários diversos procedimentos anteriores, preparatórios. Nesses procedimentos anteriores, preparatórios, é que entra a contribuição do sujeito passivo, entregando a declaração e fornecendo informações, o que não se permite dizer que o ato do lançamento é um ato misto, uma vez que ele é realizado exclusivamente pelo agente público, em momento singular, após a análise da declaração e informações fornecidas pelo contribuinte.

MisabelDerzi em nota de atualização na obra de Aliomar Baleeiro (2006, p. 817) faz uma advertência sobre a utilização dessa denominação de lançamento misto, afirmando que o ato do lançamento é um ato privativo da autoridade administrativa e as informações e declarações prestadas pelo contribuinte apenas servem de suporte para a prática deste ato de lançamento. Afirma que as informações e declarações "integram o procedimento para lançar, mas não o lançamento em si, como ato."

Por sua vez, o Lançamento de Ofício está previsto no artigo 149 do CTN:

Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:

I - quando a lei assim o determine;

II - quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária;

III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade;

IV - quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;

V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;

VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária;

VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;

VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior;

IX - quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade especial.

Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública. (BRASIL, CTN, art. 149)

Esses casos do artigo 149 do CTN são taxativos e estabelecem as possibilidades de lançamento por iniciativa da autoridade pública, assim como estabelecem as hipóteses de revisão de lançamento.

É importante observar que apenas nesses casos é possível o lançamento e a revisão do lançamento de ofício por parte do agente público, apesar de o inciso I abrir o leque de opções, desde que essas observem a limitação de ser exigíveis em razão de lei.

Por outro lado esse artigo ganha fundamental importância com a delimitação das hipóteses de revisão do lançamento, o que traz certa segurança jurídica e confiança ao contribuinte que terá a garantia de que o ente Estatal não ficará revendo seus lançamentos e recolhimentos ao bel prazer.

Ainda sobre o lançamento de ofício, vale citar importante lição de Sacha Calmon Navarro Coêlho:

Em rigor, os tipos de lançamento configurados no CTN (lançamento de ofício, por declaração e por homologação) estão destituídos de fundamentação científica. Em verdade, são narrativas dos eventos preparatórios ao ato do lançamento. Questões relativas à correção de erros ou à verdade dos elementos informativos não dependem, de forma alguma, dos tipos de lançamento; são resolvidas noutras instâncias. Por definição, o lançamento tributário é ofício privativo da Administração. Ao contribuinte, ao juiz, ao legislador, é vedado lançar. Quem aplica a lei tributária, mediante atos de lançamento, é a Administração, privativamente. Todo lançamento é de ofício. Não há escapatória. (COÊLHO, 2010, p. 682)

Assim, literalmente, todo lançamento é de ofício em razão de ser ato privativo do agente público. Desta afirmação fica claro que, para que se possa considerar que houve o lançamento tributário, é essencial que um agente público realize um ato que consista na aplicação da lei tributária.

Noutras palavras, poder-se-ía dizer que, ausente o ato da autoridade administrativa, ausente o lançamento.

Essa afirmativa corrobora com as conclusões de Sacha Calmon Navarro Coêlho, que diverge de MisabelDerzi e Estevão Horvath, ao afirmar que não existe homologação tácita, e sim preclusão do prazo para fazê-la:

Retenham-se, de passagem, três lições.

A) Inexiste direito de lançar; o que há é o dever de fazê-lo (ato administrativo simples, obrigatório, vinculado e sujeito a preclusão);

B) O prazo para praticar o ato de lançamento preclui, não caduca; somente direitos caducam;

C) A preclusão dos prazos para lançar tributo a ser pago ou homologar pagamento de tributo acarreta a caducidade do direito de crédito da Fazenda, que já nascera com a obrigação. Extinto o crédito, ipso facto, extingue-se a obrigação. Não há obrigação sem objeto. (COÊLHO, 2010, p. 683).

Finalmente, na modalidade de Lançamento por Homologação, prevista no art. 150, temos:

Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.

§ 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao lançamento.

§ 2º Não influem sobre a obrigação tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito.

§ 3º Os atos a que se refere o parágrafo anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação.

§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. (BRASIL, CTN, art. 150)

O lançamento por homologação é então aquele no qual o contribuinte calcula e paga os valores dos tributos, sem uma análise prévia da autoridade administrativa.

Nesta modalidade de lançamento, conforme observado anteriormente, só haverá de fato o lançamento se houver a homologação por parte do agente público, conforme determina o artigo 142 do CTN e conforme observações já mencionadas  de Sacha Calmon Navarro Coêlho.

O lançamento por homologação, que é a modalidade de maior ocorrência no Brasil, segundo Ruy Barbosa Nogueira é aplicado preferencialmente aos impostos indiretos e instantâneos, "cujo fato gerador se realiza em cada ato, fato ou situação, pois seria na prática impossível que, a cada momento, a repartição efetuasse diretamente ou mesmo com base em declaração do contribuinte, um lançamento." (NOGUEIRA, 1973, ps. 51 e 52).

A partir desse conceito de impostos indiretos e instantâneos, os tributos pagos por ocasião do registro da declaração de importação (imposto de importação, imposto sobre produtos industrializados, ICMS e as contribuições PIS e COFINS na importação) poderiam ser considerados apropriados à essa modalidade de lançamento.

Entretanto, o documento que registra o recolhimento desses tributos, declaração de importação, poderia levar ao entendimento de que esses tributos se enquadrariam na hipótese de lançamento com base em declaração.

MisabelDerzi, em nota explicativa no livro de Aliomar Baleeiro, distingue essas duas modalidades de lançamento, evitando-se o equívoco comum na classificação do lançamento destes tributos incidentes na importação:

Distinguem-se um do outro, o lançamento com base em declaração e o lançamento por homologação, pois:

·                    o lançamento com base em declaração não gera efeitos confirmatórios-extintivos, uma vez que o pagamento somente se dá após notificação regular do ato feita ao sujeito passivo, o qual poderá optar pelo pagamento ou não;

·                    não obstante, o lançamento por homologação desencadeia efeitos confirmatórios-extintivos, porque somente se aperfeiçoa com o pagamento seguido da confirmação-extinção do crédito por meio do ato homologatório, expresso ou tácito. (BALEEIRO, 2006, P. 817)

Assim, desta distinção extrai-se como conclusão que o lançamento com base em declaração pressupõe a notificação ao sujeito passivo para que este efetue pagamento. Por outro lado, o lançamento por homologação pressupõe o prévio pagamento dos tributos por parte do sujeito passivo, os quais deverão ter a confirmação da regularidade feita pelo agente administrativo.

Essa observação também pode ser verificada em Fanucchi, quando este afirma que

...no lançamento por homologação, que também se consuma por escrito, o sujeito ativo deve expressar a quitação do tributo pelo pagamento antecipado ou declarar que este último não foi suficiente para satisfazer o valor total da obrigação de dar, surgida com o fato gerador. (FANUCCHI, 1983, p. 273)

Neste contexto verifica-se que a forma como ocorre o lançamento dos tributos na operação de importação é por homologação, exceto quando for verificado o não recolhimento ou recolhimento incorreto dos tributos, hipótese em que o lançamento por homologação se converterá em lançamento de ofício;

175. Formas de lançamento - Dois tipos de lançamento são adotados na legislação ordinária do tributo: direto e por homologação.

O normalmente efetuado é o lançamento por homologação, calculando o sujeito passivo o tributo devido e recolhendo o seu montante por antecipação. Os agentes fiscais examinarão, posteriormente, a exatidão do procedimento e o homologarão, ou não.

Verificado que o sujeito passivo não atuou no sentido de antecipar o pagamento do tributo, ou, tendo feito a antecipação, procedeu com insuficiência, o fisco procederá ao lançamento direto, de ofício. (FANUCCHI, 1980, p.28)

Ou quando se tratar de alguns regimes aduaneiros especiais:

Resta examinar o lançamento característico dos regimes aduaneiros especiais de natureza suspensiva.

A apresentação da declaração relativa ao regime aduaneiro especial, com a sua natural complexidade, eis que, regra geral, são exigidas informações relativas a preço da mercadoria, valor do seguro e frete, identificação do país de origem e de procedência, individualização da mercadoria, especificando-se peso, medida, marca de fabricação, indicação do exportador e muitas outras, está a indicar que a modalidade de lançamento é por declaração, consoante a definição do art. 147 do CTN, pois, sem esses dados, é quase impossível a sua efetivação. (LOPES FILHO, 1983, p. 75-76).

Assim, como regra para a maioria das operações de importação, em que há a nacionalização definitiva da mercadoria, a modalidade de lançamento dos tributos é o lançamento por homologação, uma vez que o recolhimento dos tributos é feito antes mesmo da ocorrência de seu fato gerador, o desembaraço aduaneiro.

Em regra, há a antecipação do recolhimento do tributo por parte do sujeito passivo, no momento do registro da declaração da importação no Sistema Integrado de Comércio Exterior - Siscomex (art. 123, I, a, Regulamento do Imposto sobre Produtos Industrializados), sendo o pagamento processado através de débito eletrônico em conta corrente (darf-eletrônico), de modo que o lançamento é por homologação. A quitação é feita antes mesmo da ocorrência do seu fato gerador, que é o desembaraço aduaneiro. (FARIA, p.2007, 65-66)

Essa conclusão tem relevante importância quando analisa-se a atuação do agente público na fiscalização dos diversos canais de parametrização. Assim, na hipótese de fiscalização do canal verde, tem-se que não é possível afirmar que a fiscalização verificou "a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente", determinou "a matéria tributável", calculou "o montante do tributo devido", identificou "o sujeito passivo" e propôs a "aplicação da penalidade cabível" se fosse o caso, conforme determina o artigo 142 do CTN.

Portanto, no canal verde de parametrização entende-se que não houve o lançamento, pois não há como se falar que houve a realização dos atos de verificação mencionados no artigo 142 do CTN que levariam ao ato do lançamento caracterizado pela homologação dos atos praticados pelo contribuinte.

O canal verde caracteriza, portanto, a prestação das informações relativas à operação de importação e o pagamento dos tributos por parte do contribuinte, que, para serem consideradas lançadas, dependerão do ato de homologação das informações e dos valores recolhidos antecipadamente a título de tributos, por parte do agente público.

A hipótese comum de não ocorrer a homologação dentro dos cinco anos posteriores ao desembaraço aduaneiro levará à caducidade do direito de crédito da Fazenda, conforme entendimento de Sacha Calmon Navarro Coêlho, já demonstrado anteriormente.

Observe também que os parágrafos do artigo 150 do CTN permitem a prática de atos "anteriores à homologação", que serão "considerados na apuração do saldo porventura devido":

Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.

[...]

§ 2º Não influem sobre a obrigação tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito.

§ 3º Os atos a que se refere o parágrafo anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação.(BRASIL, CTN, art. 150)

A prática destes atos antes da homologação, que é quando ocorre o lançamento é possível justamente pelo fato de não ter havido o lançamento ainda, principalmente em relação aos atos que dizem respeito ao agente fiscal, pois, após a homologação, o agente fiscal somente poderia alterar alguma coisa no lançamento, através das hipóteses restritivas do artigo 149 do CTN, que preveem a possibilidade de revisão do lançamento.

Outra não é a lição de Sacho Calmon Navarro Coêlho quando explica a natureza jurídica do lançamento:

O lançamento, para começar, não pode ser - por impossibilidade lógica - procedimento (sucessão encadeada de atos). É ato. Em segundo lugar, não existe lançamento inicial, este provisório, e lançamento final, este definitivo. O lançamento é ato singular que se faz preceder de procedimentos preparatórios e que se faz suceder de procedimentos revisionais, podendo ser declarado, ao cabo, subsistente ou insubsistente, no todo ou em parte, em decorrência do controle do ato administrativo pela própria Administração, o que não constitui nenhuma novidade, muito pelo contrário. Por lançamento definitivo se deve entender o ato do lançamento contra o qual não caiba recurso do contribuinte nem recurso exofficio(por faltar previsão, por ter faltado o seu exercício ou por consumação dos recursos cabíveis). (COÊLHO, 2010, p. 666)

Assim, a alteração das informações que levarão ao lançamento, após o lançamento, somente poderá ser feita através de procedimentos revisionais. Até mesmo porque não se estará mais modificando uma informação relevante para o lançamento, mas sim, revisando aquela informação que já foi utilizada para a efetivação do ato do lançamento, que fora realizado.

Essa singela diferença reafirma o entendimento dos diferentes momentos em que ocorrerá o lançamento na operação de importação, levando em conta os canais de parametrização e a modalidade lançamento por homologação.

A possibilidade de retificações dos atos que culminam no lançamento, antes de efetuado o lançamento é reforçada também pelo parágrafo primeiro do artigo 147 do CTN, que trata do lançamento por declaração, quando afirma que é possível a retificação por iniciativa do próprio declarante  mediante a comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o lançamento.

O sujeito passivo pode retificar a declaração, ou porque se engane ou omita de boa-fé algum elemento, ou porque se arrependa da sonegação premeditada (CTN, art. 138), ou ainda porque tenha cometido erro material em detrimento próprio.

Ocorrendo essa última hipótese, só será admitido e acolhido se provar o erro, antes de notificado do lançamento. Nos casos de erro contra o Fisco ou tentativa de sonegação seguida de arrependimento oportuno, fica escusado das penalidades (CTN, art. 138), mediante confissão espontânea.

O erro grosseiro do declarante, como o de operações aritméticas, engano na classificação de rendimento etc., pode ser considerado e corrigido exofficio pela autoridade, ainda que o sujeito passivo não se apresse a pedir-lhe isso. (BALEEIRO, 2006, p. 816)

Conclui-se então que, antes do lançamento, podem e ocorrem procedimentos preparatórios. Por outro lado, após o lançamento, os procedimentos são revisionais. Assim, retificações para alterações de dados e informações prestadas somente podem ocorrer antes de finalizado o ato do lançamento, pois possuem a finalidade de corrigir, tornar exatas essas informações.

Por outro lado, os procedimentos que ocorrem após o lançamento, terão caráter revisional, uma vez que consistirão em visar de novo, ter novamente sob os olhos aquilo que, no caso específico, já foi visto, conferido, pela Receita Federal.

Sendo assim, a possibilidade de alteração dos dados e informações através de retificações por parte do contribuinte, após o desembaraço efetuado no canal verde de parametrização, mais uma vez confirma a hipótese de que ainda não ocorreu o lançamento.

É importante a análise dos artigos 44 e 45 da Instrução Normativa 680 de 2006 da Secretaria da Receita Federal do Brasil, que tratam especificamente das possibilidades de retificação na importação, uma vez que o artigo 45 contradiz o entendimento exposto.

Art. 44. A retificação de informações prestadas na declaração, ou a inclusão de outras, no curso do despacho aduaneiro, ainda que por exigência da fiscalização aduaneira, será feita, pelo importador, no Siscomex.

§ 1º A retificação da declaração somente será efetivada após a sua aceitação, no Siscomex, pela fiscalização aduaneira, exceto no que se refere aos dados relativos à operação cambial.

§ 2º Quando da retificação resultar importação sujeita a licenciamento, o despacho ficará interrompido até a sua obtenção, pelo importador.

§ 3º Em qualquer caso, a retificação da declaração não elide a aplicação das penalidades fiscais e sanções administrativas cabíveis. (BRASIL, IN SRFB 680/2006)

Esse primeiro caso demonstra que, no curso do desembaraço aduaneiro, ou seja, enquanto ainda não houve o lançamento em qualquer das hipóteses de canal de parametrização, é possível a retificação da declaração.

Por sua vez, o artigo 45 da mencionada instrução normativa prevê:

Art. 45. A retificação da declaração após o desembaraço aduaneiro, qualquer que tenha sido o canal de conferência aduaneira ou o regime tributário pleiteado, será realizada:

I - de ofício, na unidade da SRF onde for apurada, em ato de procedimento fiscal, a incorreção; ou

II - mediante solicitação do importador, formalizada em processo e instruída com provas de suas alegações e, se for o caso, do pagamento dos tributos, direitos comerciais, acréscimos moratórios e multas, inclusive as relativas a infrações administrativas ao controle das importações, devidos, e do atendimento de eventuais controles específicos sobre a mercadoria, de competência de outros órgãos ou agências da administração pública federal.

[...]

§ 7º A retificação a que se refere o caput independe do procedimento de revisão aduaneira de toda a declaração de importação que, caso necessário, poderá ser proposta à unidade da SRF com jurisdição para fins de fiscalização dos tributos incidentes no comércio exterior, sobre o domicílio do importador. [...] (BRASIL, IN SRFB 680/2006)

Entende-se que houve uma impropriedade na elaboração deste artigo desta instrução normativa quando se utilizou a expressão "qualquer que tenha sido o canal de conferência aduaneira", uma vez que, considerar as hipóteses dos diversos canais além do verde, consistiria num esvaziamento da função dos institutos da denúncia espontânea e da revisão aduaneira, em que pese o parágrafo sétimo afirmar que a retificação independe deste procedimento revisional.

Esclareça-se este posicionamento.

A ocorrência da retificação de ofício sob a ótica da situação do canal de parametrização verde, na qual se considera que não houve o lançamento, mesmo após o desembaraço, corrobora bem com o entendimento de que é possível retificações nas informações prestadas, antes de efetivado o ato do lançamento.

Por sua vez, sob a ótica dos canais amarelo, vermelho e cinza de parametrização, na qual se considera que houve o lançamento no momento em que houve o desembaraço aduaneiro da mercadoria, considerar que é possível a retificação esvaziaria o instituto da revisão aduaneira, pois revisão aduaneira, prevista nos artigos 54 do DL 37/66 e 638 do Regulamento Aduaneiro (Decreto 6759/2009), consiste exatamente na mesma situação prevista no artigo 45 da IN 680 de 2006, quando realizada de ofício:

Art.54 - A apuração da regularidade do pagamento do imposto e demais gravames devidos à Fazenda Nacional ou do benefício fiscal aplicado, e da exatidão das informações prestadas pelo importador será realizada na forma que estabelecer o regulamento e processada no prazo de 5 (cinco) anos, contado do registro da declaração de que trata o art.44 deste Decreto-Lei. (BRASIL, DL 37/66, art. 54)

Art. 638.  Revisão aduaneira é o ato pelo qual é apurada, após o desembaraço aduaneiro, a regularidade do pagamento dos impostos e dos demais gravames devidos à Fazenda Nacional, da aplicação de benefício fiscal e da exatidão das informações prestadas pelo importador na declaração de importação, ou pelo exportador na declaração de exportação. (BRASIL, Regulamento Aduaneiro, Dec. 6759/2009, art. 638)

Assim, para que o inciso I do artigo 45 fosse compatível com a revisão aduaneira, o artigo 45 deveria especificar que essa retificação da declaração, após o desembaraço, somente poderia ocorrer quando este último tivesse sido realizado através do canal verde.

Os demais canais de parametrização não seriam passíveis de retificação após o desembaraço, mas sim de revisão aduaneira, ou revisão do lançamento, quando por iniciativa da própria Receita Federal.

Por outro lado, o inciso II, que é a retificação por iniciativa do próprio contribuinte, somente poderia ocorrer também na situação do canal verde de parametrização, conforme exposto.

Nas demais hipóteses, assim como ocorreu no caso do inciso I, a retificação após o desembaraço e o consequente lançamento, entraria em conflito com o instituto da denúncia espontânea, prevista no CTN no artigo 138 e no DL 37/66, em seu artigo 102:

Art.102 - A denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do imposto e dos acréscimos, excluirá a imposição da correspondente penalidade. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01/09/1988)

§ 1º - Não se considera espontânea a denúncia apresentada:

a) no curso do despacho aduaneiro, até o desembaraço da mercadoria;

b) após o início de qualquer outro procedimento fiscal, mediante ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, tendente a apurar a infração.

§ 2º A denúncia espontânea exclui a aplicação de penalidades de natureza tributária ou administrativa, com exceção das penalidades aplicáveis na hipótese de mercadoria sujeita a pena de perdimento. (BRASIL, DL 37/66, art. 102)

Assim, entende-se que a Receita Federal equivocou-se ao redigir o artigo 45 de sua Instrução Normativa 680 de 2006, pois a retificação das informações somente poderiam ocorrer após o desembaraço nas importações que tivessem sido desembaraçadas através do canal verde, em razão de não ter havido o lançamento tributário.

Desta forma, para conviver em harmonia com o sistema normativo aduaneiro, as hipóteses de retificação das informações e recolhimento de tributos após o desembaraço, somente poderiam ocorrer nas situações de desembaraço pelo canal verde.

Por outro lado, para os demais canais de parametrização, as alternativas para a alteração dos dados se dariam entre a revisão aduaneira e/ou revisão do lançamento; e denúncia espontânea.

Assim, uma vez analisada a questão do momento em que ocorre o lançamento por homologação para o canal verde de parametrização, faz-se necessária a análise do momento em que ocorre o lançamento por homologação para os demais canais de parametrização.

No canal amarelo de parametrização, conforme exposto, será realizado o exame documental da mercadoria, onde estarão descritas todas as características da mercadoria, classificação fiscal, tributos recolhidos, características do importador, exportador, fabricante, local de origem, entre outras características, que permitirão ao fiscal da Receita Federal a perfeita identificação do produto.

Se a documentação apresentada for suficiente para sanar todas as dúvidas da fiscalização e não for constatada nenhuma irregularidade, será efetuado o desembaraço aduaneiro sem a necessidade de verificação da mercadoria.

Constatada alguma irregularidade através da verificação documental, o fiscal exigirá as retificações, assim como aplicará as penalidades cabíveis.

Por outro lado, havendo constatado ou não qualquer irregularidade, se ainda restar alguma dúvida à respeito da mercadoria ou se houver dúvida a respeito de algum dado informado nos documentos apresentados, é facultado ao fiscal mudar o canal amarelo para vermelho com a finalidade de se promover a verificação física da mercadoria e, da mesma forma, constatada alguma irregularidade, aplicar as penalidades previstas.

Assim, ao analisar-se o conceito de lançamento do artigo 142 do CTN, verifica-se que todos os atos preparatórios do lançamento foram realizados e o ato do desembaraço aduaneiro caracteriza a realização do lançamento, ou, melhor dizendo, a homologação do lançamento.

Se o lançamento é o ato que consiste em verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível (CTN, artigo 142), quando o desembaraço aduaneiro é realizado através do canal de parametrização amarelo, todos esses atos ocorrem pois, no canal amarelo a conferência documental verifica:

Art. 25 - O exame documental das declarações selecionadas para conferência nos termos do art. 21 consiste no procedimento fiscal destinado a verificar:

I - a integridade dos documentos apresentados;

II - a exatidão e correspondência das informações prestadas na declaração em relação àquelas constantes dos documentos que a instruem, inclusive no que se refere à origem e ao valor aduaneiro da mercadoria;

III - o cumprimento dos requisitos de ordem legal ou regulamentar correspondentes aos regimes aduaneiros e de tributação solicitados;

IV - o mérito de benefício fiscal pleiteado; e

V - a descrição da mercadoria na declaração, com vistas a verificar se estão presentes os elementos necessários à confirmação de sua correta classificação fiscal.

Parágrafo único. Na hipótese de descrição incompleta da mercadoria na DI, que exija verificação física para sua perfeita identificação, com vistas a confirmar a correção da classificação fiscal ou da origem declarada, o AFRF responsável pelo exame poderá condicionar a conclusão da etapa à verificação da mercadoria. (BRASIL, IN SRFB 680/2006)

A declaração de importação, documento que será a base para a conferência documental, tem como exigência o preenchimento das seguintes informações:

Art. 551.  A declaração de importação é o documento base do despacho de importação.

§ 1º  A declaração de importação deverá conter:

I - a identificação do importador; e

II - a identificação, a classificação, o valor aduaneiro e a origem da mercadoria.

§ 2º  A Secretaria da Receita Federal do Brasil poderá:

I - exigir, na declaração de importação, outras informações, inclusive as destinadas a estatísticas de comércio exterior; e

II - estabelecer diferentes tipos de apresentação da declaração de importação, apropriados à natureza dos despachos, ou a situações específicas em relação à mercadoria ou a seu tratamento tributário. (BRASIL, Regulamento Aduaneiro, Decreto 6759/2009)

Some-se a estas informações as outras informações que são prestadas com os documentos que instruem a declaração de importação:

Art. 553.  A declaração de importação será instruída com:

I - a via original do conhecimento de carga ou documento de efeito equivalente;

II - a via original da fatura comercial, assinada pelo exportador;

III - o comprovante de pagamento dos tributos, se exigível; e

IV - outros documentos exigidos em decorrência de acordos internacionais ou por força de lei, de regulamento ou de outro ato normativo.(BRASIL, Regulamento Aduaneiro, Decreto 6759/2009, art. 553)

Finalmente, as informações a serem prestadas na declaração de importação estão relacionadas minuciosamente no anexo único da Instrução Normativa 680 de 2006 da Secretaria da Receita Federal do Brasil, sendo que, caso sejam prestadas corretamente, permitirão a perfeita identificação da mercadoria e a perfeita verificação da operação de importação.

Desta forma, a fiscalização realiza todos os atos previstos no artigo 142 do CTN quando realiza a verificação documental no canal de parametrização amarelo. Assim, o desembaraço aduaneiro de mercadoria através do canal de parametrização amarelo caracteriza o ato do lançamento tributário, pois há a conferência e verificação das informações e recolhimento dos tributos, sendo o ato do desembaraço, a homologação destas informações.

Hipótese ainda mais clara de ocorrência do lançamento na importação de mercadorias ocorre quando o desembaraço aduaneiro ocorre pelo canal vermelho de parametrização, pois, além do acesso à todas as informações prestadas documentalmente como ocorre no canal de parametrização amarelo, o auditor fiscal ainda realiza a conferência física da mercadoria.

Desta forma, ao fiscal serão oferecidas todas as informações e recursos para fazer a perfeita verificação da ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, permitindo-lhe determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

Assim, o desembaraço aduaneiro de mercadoria através do canal de parametrização vermelho caracteriza o ato do lançamento tributário, pois há a conferência e verificação das informações, a vistoria da mercadoria e o recolhimento dos tributos, sendo o ato do desembaraço, a homologação destas informações.

Finalmente, na ocorrência do canal cinza de parametrização, além da conferência documental e verificação física da mercadoria, é realizado rigoroso procedimento especial, onde será verificado se existem elementos que indiquem fraude.

Após esse procedimento especial, que pode durar até 180 dias, o contribuinte terá efetivamente todas as informações e muitas outras além daquelas exigidas para a ocorrência do lançamento verificadas, sendo certo que o desembaraço da mercadoria após esse procedimento, com ou sem as penalidades cabíveis, caracterizará indubitavelmente o lançamento tributário.

É desnecessário dizer que a ocorrência da aplicação de penalidades em qualquer um desses canais de parametrização; amarelo, vermelho ou cinza, apenas reforçará o ato do lançamento, uma vez que a última das atividades relacionadas precedentes ao ato do lançamento também poderá ser verificada, apesar de sua ocorrência depender de alguma irregularidade no lançamento dos dados, sendo assim requisito dispensável no caso de correta prestação de informações.

Vale lembrar ainda, conforme exposto, que essa diferenciação da ocorrência ou não do lançamento por ocasião do desembaraço aduaneiro, de acordo com o canal de parametrização, harmoniza-se com a questão da denúncia espontânea e da revisão aduaneira e/ou revisão do lançamento.


3 CONCLUSÃO

Analisada a sistemática do comércio exterior, os canais de parametrização para o desembaraço das mercadorias e as hipóteses de lançamento, é possível chegar a diversas conclusões.

A primeira conclusão é que o lançamento é ato administrativo de aplicação da lei genérica e abstrata aos casos concretos, instaurando a obrigação e o crédito tributário.

O fato de o lançamento ser ato administrativo e assim privativo de agente público implica na conclusão de que todas as modalidades de lançamento, na verdade, são de ofício. Desta forma, ausente o ato da autoridade administrativa, ausente o lançamento.

Por outro lado, diante das modalidades de lançamento do CTN e de acordo com as características de cada uma dessas modalidades, o lançamento nas operações de comércio exterior ocorre, como regra geral, via lançamento por homologação; exceto quando for verificado o não recolhimento ou recolhimento incorreto dos tributos, hipótese em que o lançamento se converterá em lançamento de ofício; ou quando se tratar de alguns regimes aduaneiros especiais, casos em que ocorrerá o lançamento por declaração.

Além disso, pode-se concluir também que no desembaraço da mercadoria através do canal verde de parametrização não é possível falar que houve o lançamento, pois não houve ato administrativo de agente público com a finalidade de verificar a regularidade dos procedimentos que compõem o lançamento.

Finalmente, os canais de parametrização amarelo, vermelho e cinza, por sua via, ensejam atividade ativa do agente fiscal no sentido de verificar a regularidade de todos os procedimentos que ensejam o ato de lançamento, nos moldes do artigo 142 do CTN, que se caracterizará pelo despacho aduaneiro liberando a mercadoria.

Sendo assim, é possível afirmar que nos canais de parametrização amarelo, vermelho e cinza, o lançamento se completa após o desembaraço da mercadoria, gerando assim todos os efeitos do lançamento tributário.


REFERÊNCIAS

BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 11ª ed. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro. Forense, 2006.

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Autor

  • Pedro Delgado de Paula

    Pedro Delgado de Paula

    Advogado, Despachante Aduaneiro, Diretor Jurídico da Atlas Comércio Exterior Ltda., Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/MG, Mestrando em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Milton Campos, Pós-Graduado em Direito de Empresa e da Economia pela FGV.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAULA, Pedro Delgado de. Os canais de parametrização de fiscalização aduaneira e o lançamento tributário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3419, 10 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22991. Acesso em: 7 maio 2024.