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Primeiras linhas para os princípios da filosofia do Direito Processual Civil

Primeiras linhas para os princípios da filosofia do Direito Processual Civil

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O presente trabalho pretende discutir os princípios da Filosofia do Direito Processual Civil a partir do projeto de reforma do CPC em tramitação no Congresso Nacional.

Resumo: O presente trabalho pretende discutir os princípios da Filosofia do Direito Processual Civil a partir do projeto de reforma do codex em tramitação no Congresso Nacional. Para além da reforma no diploma processualístico, a emergência de uma concepção pós-positivista urge por se destacada, justamente por representar os novos horizontes do Direito, sobretudo no seu entendimento principiológico e hermenêutico que, para tanto, considera a multiplicidade de mundos sociopolíticos apostos às relações intersubjetivas na contemporaneidade. Compõe-se reflexivamente quanto à unidade principiológica em termos de direitos humanos, garantias e deveres fundamentais, combinados  dialógica, recíproca e simultaneamente, de acordo com um pressuposto pós-moderno de complexidade e, mormente, por intermédio dos corolários superiores da dignidade, da responsabilidade e da razoabilidade.

Palavras-chave: Filosofia; Direito; Processo Civil; Hermenêutica; Principiologia.

Sumário: 1. Propedêutica – 2. O processo complexo – 2.1. Do conceito formal de justiça ao conceito ético-político incompleto de justiça – 2.2. Jurisdição-soberania à jurisdição-participativa a partir do agir comunicativo de Jürgen Habermas – 3. Da racionalidade retórico-dialética à hermenêutica filosófica – 3.1. Breves considerações acerca da filosofia moderna – 3.2.  Racionalidade retórico-dialética em Aristóteles – 3.3.  A virada linguistica no 2º Wittgenstein – 3.4. A virada hermenêutica em Heidegger e Gadamer – 4. Processo civil enquanto campo de experiência satisfativa do direito e a hermenêutica filosófica da pós-modernidade – 4.1. Sobre a lide – 4.2. Fronteiras da instrumentalidade  –  5. A reforma nos horizontes de um pós-positivismo crítico, porém moderado – 6. Considerações Finais.


1. Propedêutica

Não passa de um erro considerar a reforma no Código de Processo Civil como exclusividade no plano jurídico-positivo. As conquistas, com efeito, vão além de qualquer pretensão legiferante. Tendem, outrossim, à constituição de um pensamento processual complexo, sobretudo, diante das evidências principiológicas desenvolvidas herculeamente por aqueles cuja preocupação reside, mormente, na inteligência global do Direito, enquanto experiência e eficácia. 

Procederemos à atualização do CPC, porém, dado certo ângulo de análise, sua longevidade tão-logo restará inepta caso não traga consigo a oportunidade de se pensar o processo civil segundo perspectivas inovadoras, as quais o ataquem amiúde, da técnica à teoria que se lhe sustenta como esqueleto. Em razão dessas carências, uma reforma diz-se conjetural, universal, longitudinal, à medida que não reduz a ciência do processo ao estudo de seus instrumentos, pelo contrário, amplia-se o horizonte de seu entendimento, problematizando, debatendo e resolvendo as intempéries cediças e inesperadas da vida social pós-moderna.

Sendo assim, o presente trabalho tem o condão de exercitar reflexões ligadas à teoria do processo civil. Demonstraremos, de modo objetivo e conciso, sem, por outro lado, perder a qualidade da argumentação e da fundamentação teórica, como a reforma do CPC indica um movimento para além de sua própria intenção reformista. Utilizamos de conceitos e linhas de pensamento de autores e fontes diversas, a fim de criar o que doravante elegemos de princípios da filosofia do direito processual civil.

Há que se reconhecer que apesar da multiplicidade conceitual não abandonamos o foco principal do nosso empenho, qual seja uma visão construtivista, dialética e hermenêutica da atual processualística civil. Sobremaneira, torna-se lícito a conjugação da diversidade conceitual, de tal sorte que não pensamos as contribuições enquanto sistemas estanques e absolutos a cada área respectiva, como, inversamente, elaboramos uma filosofia de diferenciação, segundo um procedimento autêntico, para formar uma tese plausível e ao mesmo tempo razoável do que julgamos sadio para a ciência do processo civil nos moldes ora aduzidos.

Dissertaremos acerca do processo complexo, seus componentes e estruturas fundamentais de compreensão. Logo, percorreremos o caminho a partir da filosofia moderna com Descartes para chegar à virada linguística do 2º Wittgenstein, consequentemente, à retomada do pensamento aristotélico para, enfim, embrenharmos nas contribuições de Heidegger e Gadamer, a fim de sustentar e assimilar, precipuamente, o papel da linguagem no processo civil como experiência ontológica. 

Seguidamente, realizaremos a conjugação entre aquilo que fora descoberto pela hermenêutica filosófica – a experiência – com o influxo principiológico do Direito, juntos na proposta complexa do processo civil. Enfim, discutiremos a sentença e sua conceituação e o motivo de considerarmos a reforma do CPC como um avanço do pós-positivismo, crítico – sem dúvida – inobstante, moderado.

Finalmente, tenderemos às finais considerações, onde será possível perceber a intenção desta nossa filosofia que se encontra lastreada em ideias as quais, por natureza mesma, aceitam e, até pedem, questionam por outros apontamentos, tornando os princípios da filosofia do direito processual civil um campo aberto às mais variadas contribuições e perquirições.


2.  O processo complexo

Na fonte mesma de um Direito aposto à eficácia dos princípios, há que residir uma corrente afirmadora das virtudes e valores humanos,[1] de tal sorte que esta signifique o epíteto de uma teoria cuja envergadura seja evidentemente complexa, malgrado tenda-se à refratária tese legalista e deveras positivista da ciência jurídica. Os caminhos percorridos pela pesquisa e, sobretudo, pela reflexão filosófica do Direito, certificam o influxo teórico lastreado no diálogo racional entre os campos; desta maneira, vive-se a unidade da ciência em prol dos bens essenciais – para além do próprio Direito – no desbravamento de horizontes outros, concretamente dispostos à realização perpétua da existência sadia do homem em sociedade.

A persistência de uma teoria jurídica que alberga os princípios e diretrizes gerais do porventura estabelecido num dado Estado democrático representa apenas um dos caracteres de um arcabouço claramente plástico, responsável pela regulação da vida em comunidade, que é o Direito. Isto não impede a evolução direcional das disciplinas específicas que, devido às relevantes peculiaridades de ordem prático-incidental, hão por estabelecer os próprios caminhos, sem, por outro lado, mitigar a dignidade do texto constitucional pátrio, [2] tampouco toda a ordem de princípios que garantem o uso e a fruição cívica dos direitos e garantias provenientes das relações intersubjetivas da vida prática, já nomeados de internacionais e humanos.[3]

O desenvolvimento do conhecimento científico é poderoso meio de detecção dos erros e de luta contra as ilusões. Entretanto, os paradigmas que controlam a ciência podem desenvolver ilusões, e nenhuma teoria científica está imune para sempre contra o erro. Além disso, o conhecimento científico não pode tratar sozinho dos problemas epistemológicos, filosóficos e éticos. [4]

Por este motivo, uma primeira característica da processualística pós-moderna, no nosso caso a civil, é a complexidade.[5] Complexidade no sentido de visualização e comunicação dos fatores incidentes e acidentes que se conectam e se interligam na multiplicidade de aspectos e conotações da vida prática contemporânea, estatizada pelo Direito. A complexidade é uma teoria de feitio desafiador para o jurista e o pensador do processo, de tal sorte que não vem para trazer respostas imediatas e contundentes, pelo contrário, vem para trazer novos questionamentos, “como motivação para pensar”.[6] O todo no processo é um resultado aliado ao que se diz efetivo; tão-logo, efetivo será a justeza do tratamento à concretude final (resultados) e à cognição de suas causas primeiras.

“Sendo todas as coisas causadas e causadoras, ajudadas ou ajudantes, mediatas e imediatas, e sustentando-se todas por um elo natural e insensível que une as mais distantes e as mais diferentes, considero ser impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, tampouco conhecer o todo sem conhecer particularmente as partes.” [7]

As nuances do convívio intersubjetivo, a popularização dos mercados, a globalização do comércio e das finanças tornaram a sociedade hodierna enlaçada em intrincados processos contratuais para além do que poderia ser previsto nas legislações positivas.

A paisagem é complexa e fragmentada. No plano internacional, vive-se a decadência do conceito tradicional de soberania. As fronteiras rígidas cederam à formação de grandes blocos políticos e econômicos, à intensificação do movimento de pessoas e mercadorias e, mais recentemente, ao fetiche da circulação de capitais. A globalização, como conceito e como símbolo, é a manchete que anuncia a chegada do novo século. A desigualdade ofusca as conquistas da civilização e é potencializada por uma ordem mundial fundada no desequilíbrio das relações de poder político e econômico e no controle absoluto, pelos países ricos, dos órgãos multilaterais de finanças e comércio. [8]

Exige-se um rompimento paradigmático em relação ao modelo teórico apregoado no processo, enquanto mecanismo de feitura e concretização de um substrato material. Com efeito, o processo não é mais o problema do processo; o processo tornou-se um problema amplo, dialético, retórico, hermenêutico e virtuosamente ontológico do Direito como um todo e da filosofia. O campo do processo é o campo da experiência jurídica dos fatos, sendo, pois, os fatos complexos, tal deverá ser o corolário metodológico daquilo que dá forma e eficiência à solução das litigiosidades ocorrentes.

Suprime-se um ideal viciosamente formal acerca do processo, como na posição de Chiovenda (teoria dualista do ordenamento jurídico),[9] para um ideal pluralista, envolvido com questões transversais, longitudinais, reciprocamente vinculadas e vinculantes. Situamos esse preceito em proximidade com a teoria unitária do ordenamento jurídico como, v.g., o ensinamento de Carnelutti para quem “o processo participa da criação de direitos subjetivos e obrigações, os quais só nascem efetivamente quando existe uma sentença”. [10] Por outro lado, é somente uma aproximação prima facie, porque, apropriadamente, esse suposto nascimento criativo do direito, aposto à subjetividade, encontra fulcro na realidade intrínseca da norma-princípio e, daí, a sentença somenos constitui o meio pelo qual é dito aquilo que o princípio aprioristicamente não pôde outrora dizer por uma questão relevante de economia.  

O fato do processo não se separar vertiginosamente do direito material é um dado nítido de unidade, por outro lado, a questão do processo complexo pede que mesmo o direito material positivado seja re-discutido em função da prevalência superior de princípios fundamentais, que tanto podem ser justificados na Carta constitucional e em tratados internacionais, como a partir da composição incidental correspondente ao fato sub judice.[11] Não se trata de uma subordinação do Direito aos fatos sociais, mas uma subordinação razoável aos princípios, ainda que não estejam positivados, mas que, julgados através da razoabilidade, encontrem lócus na satisfação da dignidade dos participantes da contenda. Diríamos, pois, ser o processo complexo uma condição cognitiva (daí epistemológica), transcendental aos mecanismos procedimentais que lhos são próprios, aliás, como sabido pela doutrina.

Do ponto de vista de sua função jurídica, o processo “é um instrumento a serviço do direito material” [12], todavia, há que se relevar sua função principiológica indicada alhures, a qual sustenta um campo aberto para o debate racional, edificando a prevalência do princípio e do bom-senso contra o absurdo e contra arbitrariedades e irracionalidades porventura surgidas com as leis. Por isso o processo não faz somente injunções pelas sentenças, como diria Carnelutti, ou até reparos a propósito de demandas não reguladas – vai adiante, funcionando como a experiência concreta ou o local propício para se dizer o princípio e sua consequente validade. Seu objeto, portanto, não equivale apenas ao estudo dos institutos básicos (jurisdição, ação, exceção etc.), porém, à forma pela qual poderemos transformar a justiça em práxis de um conceito ético, retórico-dialético, hermenêutico-principiológico e ontológico de processo enquanto direito e garantia substantivos. 

A assunção do Estado constitucional deu novo conteúdo ao princípio da legalidade. Esse princípio agregou o qualificativo ‘substancial’ para evidenciar que exige a conformação da lei com a Constituição e, especialmente, com os direitos fundamentais.[13]

Emerge, nesta esteira, um processo civil aberto às circunstâncias da vida sensível. Com a reforma, alargar-se-ão os horizontes do debate, da dúvida e da racionalidade do discurso. Malgrado as questões pontuais feitas à ligeireza operada para a mudança do codex, mister compreender que o movimento empreendido peregrina inelutavelmente à satisfação imediata de misérias evidentes, mormente quanto à celeridade da prestação jurisdicional.[14] Parece-nos que a relativa pressa em ajustar o novo código de processo civil não deve ser transmitida à tutela diante do caso concreto.

Confundir celeridade processual com agilidade será um equívoco daqueles operadores e atores processuais que, incorrendo em tamanho erro, vislumbrarão a ilusória compatibilidade entre justiça e curto tempo. No entanto, esta será uma armadilha da reforma, à medida que o conceito de celeridade precisa conformar-se à complexidade inerente da sociedade e, justamente a utopia de uma rápida prestação, sobretudo em casos difíceis, prenderá o curso do processo à imperativa, necessária e real articulação multilateral das questões submetidas a juízo.

Não devemos nos iludir – a celeridade é conceito meramente parcial de uma articulação bem feita, essencialmente principiológica e dialógica dos fatos e fundamentos jurídicos aplicáveis, cujo marco temporal é impreciso e relativo às circunstâncias de operação, manejo e seguimento dos feitos cognitivos, probatórios e executivos durante o procedimento. Falar em celeridade, enquanto conceito a priori, é mais um discurso político que leva ao regozijo do clamor público, crescido numa liturgia legalista, do que, efetivamente, uma correspondência ao que de fato acontece.

O processo é, portanto, materialmente complexo, haja vista que é conectado aos problemas práticos da vida com que o Direito deve lidar e resolver. Busca a identidade de todos os elementos que compõem as relações humanas – não simplifica, engloba; não se abstém, problematiza. Sendo assim, a processualística precisa estudar o modo pelo qual haverá satisfação da justiça e da ordem de princípios consagrados como fundamentais, restando aberta à urgência de inéditos debates, situações, posições e pedidos proporcionais ao dinamismo sócio-cultural tão marcante na sociedade do século XXI.

Ora, nossa situação é profundamente diferente: não há em nossas sociedades pluralistas, fruto da modernidade, nenhum consenso substantivo sobre valores, isto é, sobre a melhor forma de vida para o ser humano, como ocorria nas sociedades tradicionais, por meio dos sistemas éticos vinculados às religiões. Ao contrário, hoje há uma multiplicidade de formas de auto-realização humana que se apresentam como incomensuráveis, e a democratização crescente supõe o caráter não-confessional da vida social e a maioridade das pessoas e dos grupos, o que significa dizer que nenhuma visão única e totalizadora da realidade se impõe dogmaticamente como excludente de outras visões da realidade enquanto cosmovisão, no seio da qual se estabelece uma concepção determinada dos fins últimos da existência humana. [15]

Em sede desta complexidade, os fundamentos até então apregoados como metajurídicos, como a moral, a sociologia, a antropologia e a filosofia, serão convidados à querela. A presença destes elementos comporá o sistema processual responsável e atento aos princípios convergentes à ideia primeira de dignidade. Isto porque o processo deve ser mais ético e, o ser ético do processo, é ver e antever os desdobramentos das decisões que, quando eivados de razoabilidade através do discurso amplo, plural e substantivo, chamar-se-ão exemplares, mas, esquecidos os pressupostos, chamar-se-ão ignóbeis, senão completamente absurdos. [16]

2.1. Do conceito formal de justiça ao conceito ético-político incompleto de justiça

Repensar a teoria do processo implica em transformar o conceito de justiça que se lhe é pertinente. O positivismo jurídico, seguido pela tradição ocidental do Direito, sempre aceitou bem um conceito formal de justiça, o que significa dizer a aplicação de mesmas regras e normas para pessoas de grupos culturais a princípio diferentes.

Inicialmente, teorias de justiça que utilizam como premissa a dicotomia igualdade-desigualdade, partem do pressuposto aristotélico de que ser justo implica em tratar os iguais igualmente e os desiguais desigualmente. Com efeito, o mesmo não pode ser interpretado equivocadamente, deslocado de seu sentido original, o qual faz sentido.[17] “Aristóteles jamais acreditou que duas pessoas pudessem ser exatamente iguais”. [18]

Na realidade, a consideração dicotômica igualdade-desigualdade se insere no tratamento equânime que é conferido a uma ou outra pessoa.

O tratamento para os iguais deve ser equânime, já para os desiguais, segundo essa perspectiva, não equânime. Nisto há uma diferença fundamental, à medida que o conceito não alude a alguma diferença ontológica entre as pessoas, todavia, afirma que, dada uma situação, aquela pessoa pode se inserir numa necessidade ou aspecto diferente de outra pessoa. Simplesmente verifica-se um contexto de pessoas em aspectos não semelhantes. Ora, toda pessoa é única, logo, não há razão para tratá-las igualmente – leia-se, equaninemente ou não-equanimemente em relação a um dado aspecto particular. 

Disso poderemos tirar algumas conclusões e, em seguida, transportá-las para nossas reflexões para dentro do processo: a) esse tal conceito formal de justiça aplica-se, sobretudo, ao procedimento,[19] in casu, à formalidade processual, quer dizer, as mesmas normas e regras processuais são admitidas aos atores processuais sem se cogitar, a priori, de igualdade, visto que tratamos aqui da estrutura do processo (partes, deveres, direitos primeiros como petição e contestação, e diretos segundos como recorribilidade das decisões); b) não subsiste o conceito formal enquanto substância, ou matéria, do trâmite do processo, pois como já vimos este será plástico e, acima disto, complexo – isso porque, aceitar mesmas normas e regras sem entender a complexidade tratar-se-ia de imperativo moral e – mais adiante veremos – a mesma moral escolhida pode não ser a melhor moral para todos;[20] c) não há inteira e perpétua certeza sobre essas normas e regras, pois “as normas e regras que constituem um grupo social podem ser declaradas injustas, ou o seu procedimento ser declarado injusto”.[21]

Parece-nos, sobremaneira, que precisamos ir além à busca de um conceito de justiça mais adaptável ao nosso processo nuclearmente complexo, dentro da sociedade multicultural pós-moderna.

Sem maiores problema, escolhemos o conceito ético-político incompleto de justiça como principal referencial teórico apto a ser perfeito no processo complexo, como substância e práxis de justiça. O corolário deste conceito é justamente a multiplicidade. Multiplicidade aqui aposta ao processo formado por pessoas diferentes (enquanto aspectos), de acordo com um corpo estruturado de normas e regras procedimentais basilares iguais a priori (esse é o ponto teórico preservado do conceito formal de justiça). Porém, que “não pretende moldar modos de vida em um único padrão ‘ideal’. Nem recomenda uma única ética intrínseca para tal padrão ideal. Ele posiciona a existência simultânea de modos de vida [diferentes] ligando uns aos outros por laços de reciprocidade simétrica.” [22]

O conceito ético-político incompleto de justiça apenas estabelece uma base normativa para cuidar da multiplicidade; e essa base normativa é a própria pluralidade de modos de vida ou multiplicidade ética[23] – daí ser incompleto, modulável, plástico, complexo. Existência simultânea de modos de vida ligados por laços de reciprocidade simétrica pode ser de duas formas, como nos indica Agnes Heller: “a) se eles têm certas normas em comum, e b) se são ‘igualados’ por normas comuns”. [24]

No caso do processo as pessoas (atores, partes) são “igualadas” por regras procedimentais comuns (reciprocidade simétrica), como vimos no caso de aplicação do conceito de justiça formal ao procedimento, inobstante, não necessariamente essas mesmas pessoas terão normas em comum (assimetria ética). Nesta lacuna, a incompletude do conceito ético-político de justiça, como base material da práxis de justiça no processo complexo, é preenchida com o que será próprio à pessoa.

O conceito “não é capaz de delinear o melhor modo de vida possível”,[25] ele, simplesmente aceita as possibilidades. No entanto, reside nele outra importantíssima base normativa que é a circunstância sociopolítica. [26] Essa circunstância formula premissas axiológicas a partir de normas já selecionadas e interpretadas na visão de um “modelo ideal alegadamente conjeturado”.[27]

Quer dizer, um consenso pode ser gerado em relação a alguma teoria filosófica que contemple o melhor modo de vida possível, servindo como baliza, como dado de razoabilidade, mas não algo que precisa ser operado por todos – basta que uma pessoa possua essa capacidade reflexiva. A estrutura de um modelo sociopolítico tem somente uma “base empírica”, [28] ou seja, não devendo ser provado e refletido por todos, já que pelo menos uma delas estará comprometida com os verdadeiros valores do “melhor mundo sociopolítico possível”. [29]

No processo, quem desempenha o papel de comprometimento, diante da maior carga de poderes conferidas pela reforma, é o juiz – ao mesmo tempo em que significa um comprometimento com o melhor mundo sociopolítico possível é, também, a pura prática do princípio da razoabilidade e dignidade. Se os demais atores processuais puderam não olvidar de sua participação no processo o mesmo comprometimento, caminhar-se-á, enfim, à completa abertura principiológica do Direito. Até lá, entendemos ser do juiz a principal incumbência de manejar um consenso que deveras sequer precisa ser amplo, sob a perspectiva de universalidade do melhor mundo sociopolítico possível, mas amplo e efetivo ao micro sistema formado com o litígio jurisdicionado. Nessa caminhada, a eticidade mencionada haverá de ser cultivada popularmente e no cotidiano forense, devido a inserção de conceitos os quais remetem ao uso racional da argumentação – lugar onde a retórica prevalecerá consoante o estabelecimento de regras bem definidas de discurso.

2.2.  Jurisdição-soberania à jurisdição-participativa a partir do agir comunicativo de Jürgen Habermas

Esta conquista teórica acerca da justiça mantém importantes implicações na forma de encarar a jurisdição. Tomada em diversos sentidos: a) como poder – “manifestação do poder estatal, conceituado como capacidade de decidir imperativamente e impor decisões”;[30] b) como função, “expressa o encargo que têm os órgãos estatais de promover a pacificação de conflitos interindividuais”;[31] c) como atividade, no “complexo de atos do juiz no processo, exercendo o poder e cumprindo a função que a lei lhe comete”.[32] Os sentidos se agrupam “legitimamente através do processo devidamente estruturado (devido processo legal).” [33]

Em contrapartida, num mundo onde as instabilidades relativas à segurança, à corrupção e à efetividade do Direito “há um clamor generalizado pela aplicação de leis ao mesmo tempo em que aumenta a sensação de que a força da jurisdição estatal não é suficiente para trazer a pacificação social”. [34]

Malgrado a pertinência dos sentidos iniciais destacados pela clássica doutrina brasileira, precisamos ir além, pois que ainda há outro sentido que é o de participação – a jurisdição participativa. Diz respeito a uma dedução feita da teoria da ação comunicativa de Habermas, em substituição à razão prática de Kant – presa à filosofia do sujeito –, no caminho de uma argumentação coletiva em prol do consenso formado, portanto, democraticamente.

Articula-se principalmente através da linguagem, do debate e da ação argumentativa entre sujeitos e, por conseguinte, do diálogo entre o campo dos fatos, como teoria de sociedade, e teoria do Direito conexo às conquistas da pesquisa moral e hermenêutica. Insere-se, no contexto da jurisdição, o agir comunicativo de uma dimensão macro estrutural ao micro cosmos do processo civil, à medida que o estudo pragmático da linguagem de Habermas permite focalizar novas diretrizes de solubilidade para incúrias jurídicas concretas. 

Essa democracia é que permite, pela lógica, a implicação do conceito de participação, do exercício multilateral, linguístico, comunicativo, pelo e para o consenso da comunidade jurídica e política. É antes de tudo uma teoria de sociedade,[35] contudo aplicável ao processo porque representa mais um referencial prático de obtenção da justiça, desta vez, no real and substantive due process of law (devido processo legal substantivo e real)[36] onde haverá a participação no sentido de influência das partes, assim como no sentido de cooperação e colaboração direta e indireta, como co-protagonistas numa dimensão pública e cívica (public and civic dimension) para a consecução dos fins da jurisdição – não mais uma autarquia exclusiva do Estado: da jurisdição-soberania à jurisdição-participação.[37]

No micro cosmos do processo civil destaca-se o uso conjunto da linguagem para se chegar à solução do problema, à medida que os atores comungam da mesma ideia quanto à satisfação do litígio. Isso requer um conjunto bem ordenado de normas e regras, como já vimos pela aplicação do conceito formal de justiça, inobstante não se olvida o fato de que os atores, por impulso volitivo próprio, devem visar à colaboração tanto para com a justiça, como para a jurisdição e não apenas com a arte de gozar estratégias linguísticas e retóricas cujo escopo é o convencimento, mas buscar a integração do nível universal do social ao nível micro, porém complexo, da experiência do processo civil.[38]

Neste sentido, Habermas obtempera sobre “se a linguagem natural é utilizada apenas como meio para a transmissão de informações ou também como fonte de integração social”.[39] E continua:

No primeiro caso, no meu entender, trata-se de agir estratégico; no segundo de agir comunicativo. No segundo caso a força consensual do entendimento linguístico, isto é, as energias de ligação da própria linguagem, tornam-se efetivas para a coordenação das ações, ao passo que no primeiro caso o efeito das coordenações depende da influência dos atores uns sobre os outros e sobre a situação da ação a qual é vinculada através de atividades não-linguísticas. [40]

Porém:

Uma vez que o agir comunicativo depende do uso da linguagem dirigida ao entendimento, ele deve preencher condições mais rigorosas. Os atores participantes tentam definir cooperativamente os seus planos de ação, levando em conta uns aos outros, no horizonte de um mundo da vida compartilhado, na base de interpretações comuns da situação. [41]

No nosso caso almejamos a jurisdição participação na seara do processo civil, algo que parece ser deveras complicado à medida que o direito material que se lhe acompanha no âmago é preenchido, sobretudo, por ideais negociais, financeiros e mercadológicos. Inobstante, não é impossível, visto que discutida no âmbito da experiência principiológica do Direito (o processo), o Direito Civil estará apto a dar funcionalidade à tese da jurisdição-participação, em razão dos dogmas acertados da função social do contrato, da boa-fé objetiva e da eticidade.[42] Princípios como estes ajudam o Direito a remar contra toda a maré, cuja característica, é a refratária submissão do Direito ao sistema econômico vigente. Vemos, inclusive, uma ampliação da teoria do diálogo das fontes, reunindo as contribuições de todos os campos nos quais se resume uma racionalidade essencialmente principiológica.[43]


3. Da racionalidade retórico-dialética à hermenêutica filosófica

A razão moderna resignou-se em nítida crise. A submissão de parte significativa do pensamento moderno ao modelo fechado de racionalidade instrumental e ao método próprio das ciências naturais, inatos à filosofia da reflexão, é alvo de arguto debate nos dias de hoje, motivo pelo qual se questiona a falta de unidade relacional entre ciência, ética, política, metafísica e direito.

A evolução emerge da crise com a hermenêutica filosófica, cujo ápice é Hans-Georg Gadamer. Em vistas à retomada das discussões aristotélicas entre pensamento apodíctico (analítico) e o dialético-retórico, a partir do limiar da razão moderna com Descartes, Leibniz e Espinosa – preocupados com a certeza a nível lógico-matemático dos raciocínios – passando após por Kant, Hegel e, mais a frente, o 1º Wittgenstein (analítico), para só então chegarmos ao 2º Wittgenstein (o da virada linguística) e à ontologia de Heidegger e à hermenêutica filosófica de Gadamer, procuraremos demonstrar objetivamente os principais pontos desta trajetória, a fim de, como resultado, colher uma argumentação plausível que funcione ao mesmo tempo como: (i) estrutura material do processo complexo, enquanto produção jurídica e (ii) o processo como campo de experiência para a hermenêutica principiológica (fenomenológica e ontológica) do Direito pós-moderno.

3.1.  Breves considerações acerca da filosofia moderna

A história costuma delimitar o início da filosofia moderna com René Descartes,[44] sendo seu momento contemporâneo a obra filosófica do 1º Wittgenstein (que iremos discutir em momento futuro).[45] Descartes julgava que para que uma racionalidade tivesse sentido e poder de justificação, ela deveria articular-se em sinais e regras que pudessem ser utilizados de modo a configurarem-se formalmente corretos. “Tratava-se de levar a cabo o ideal da mathesis universalis, a construção do objeto através da linguagem matematicamente organizada”. [46] Considerava falsas as coisas verossímeis, já que não haveria certeza em como prová-las; não há espaço para metáforas ou ambigüidades, somente para as proposições necessárias que fossem evidentes e claramente demonstradas “e sobre as quais haveria um acordo inevitável”.[47]

Trata-se nada menos do que lançar um olhar sobre todas as coisas, torná-las aptas a ser tratadas segundo método, e tais que a respeito se possa racionar tão segura e desassombradamente quanto o possa fazer um geômetra, uma vez bem terminadas suas definições, bem enunciados e isolados seus axiomas e postulados e, portanto, os caminhos duma verdade pré-estabelecida abertos diante dele. [48]

Espinosa seguiu a mesma tendência,[49] procurando provar as teses com fundamento explicativo exclusivamente matemático. Leibniz, contemporâneo de Espinosa, procurou seguir o mesmo meio com sua filosofia impregnada de matemática e pela devoção às explicações do mundo segundo seus ditames estritamente lógicos.[50]

Já Kant[51] tinha certa preocupação com um projeto filosófico constituído e representado pela ciência físico-matemática, censurando a metafísica dogmática de Descartes, para fazer prevalecer um entendimento esclarecido e puro como modelo único de todo o pensar.

Dissemos, pois, que o ponto culminante do racionalismo moderno foi o 1º Wittgenstein, pertencente à escola Analítica de Cambridge, discípulo e aluno de Bertrand Russel então professor de lógica. Seu empreendimento foi grandioso, a ponto de reduzir tudo o que há à lógica puramente analítica.

Proferia Wittgenstein que o “pensamento é a figuração lógica dos fatos” [52] e, por isso, “não podemos pensar nada ilógico, porquanto, do contrário, deveríamos pensar ilogicamente” [53] e, encerrando seu Tractatus, “o que não se pode falar, deve-se calar” [54] – falar.  Aqui, num sentido próprio, a despeito de que possa parecer uma antevisão em relação a um projeto já sabido acerca da virada linguística em suas Investigações Filosóficas, quer dizer, ao contrário, a prova analítica, portanto, lógica de tudo o que se obstina propor.

Por conseguinte, no eixo central do Tractatus existe o desdobramento de duas ideias: primeiro a de que a lógica rege o mundo, segundo que a linguagem é uma figuração dos estados de coisas presentes no mundo e que “haveria um isomorfismo lógico entre este estado de coisas e a própria estrutura da linguagem”.[55] Na mesma linha, Frege, Russel, Carnap e outros sustentam a “possibilidade de elaborar uma linguagem filosófica sem referência aos fatos, formalmente correta, capaz de solucionar os problemas que normalmente são causa de disputa entre filósofos”. [56] É o descaminho da razão, ou, para Morin, a “desracionalização da razão”,[57] precisamente porque esta deixou de considerar outros tantos aspectos indispensáveis ao conhecimento e à vida. Atinge-se um ponto onde o separatismo científico mutila a própria razão, desqualificando-a ou rebaixando-a a logicidade.

No Direito, o influxo da teoria pura de Kelsen, no movimento positivista de Comte, seguido por Spencer e Durkheim, fazendo-o atentar, sobretudo, às normas jurídico-positivas, sobre a influência neokantiana da escola de Marburgo, e do Círculo de Viena, e com contato com a Escola Analítica de Cambridge, onde Kelsen, lendo o Tractatus de Wittgenstein, dentre outros, harmonizou sua teoria do Direito conforme sua adoração e fixação matemáticas, agora transpostas à ciência jurídica. O Direito havia se transformado, em sua essência, numa fatia única de estudo: a regra positiva.

Somente no século XX, especialmente depois das grandes conquistas teóricas e políticas dos Direitos Humanos, insurgem propostas visando a romper com tais limitações, como raso exemplo: Dworkin, Alexy, Hesse, Radbruch;[58] no campo político, porém aposto ao Direito, Rawls, Habermas, Apel; na axiologia Hartmann; Perelman com a nova retórica; no Brasil, principalmente, Miguel Reale com sua teoria tridimensional. Todos tentam, de várias maneiras e por meios epistemológicos e metodológicos diversos, trazer, no geral e às últimas conseqüências, o elemento humano de volta à perspectiva do Direito.

Passa-se então ao século XXI com inúmeros desafios, malgrado o primeiro e prejudicial deles seja a (re) discussão do modus operandi da razão e, por conseguinte, da racionalidade. Agora, voltar à análise aristotélica significa mais do que uma necessidade, mas uma valorosa contribuição do estagirita, cujas proposições são tão atuais como sua essência viva de pensador contemporâneo, ou como Nietzsche, um homem extemporâneo, para que possamos, em linhas pontuais, discernir sobre o caminho filosófico da hermenêutica até que possamos, quando satisfeitos, aplicá-la no processo civil, objeto do nosso esforço.

3.2. Racionalidade retórico-dialética em Aristóteles

No projeto de Aristóteles, encontramos dois tipos principais de raciocínio, o apodíctico (analítico e empírico), que pode ser provado, e o retórico-analítico envolvido com a argumentação e para raciocínios dotados de verossimilhança e com potência de probabilidade.

“A razão moderna considerou a verdade filosófica com a validade (certeza) científica”, [59] identificando a lógica não com a dialética, mas com os raciocínios analíticos de Aristóteles. Retomar os conceitos do estagirita representa alternativa complementar ao reducionismo da razão na modernidade, permitindo que se faça uma trajetória influente no pensamento hermenêutico vindouro.

Isto porque, Aristóteles já falava que “a exatidão matemática não se deve exigir em todos os casos”.[60] Retoma a premissa na sua obra Ética a Nicômaco, onde a pesquisa “será adequada se tiver tanta clareza quanto comporta o assunto, pois não se deve exigir a precisão em todos os raciocínios por igual.” [61]Em outras palavras o edifício dialético, ou melhor, retórico-dialético, opera-se em conformidade com o que é verossímil, ou contingente, tendo o mesmo caráter e dignidade do que a prova mediante o raciocínio apodíctico.

A oportunidade de cada ciência verifica-se de acordo com sua proposta nuclear, tão-logo a metafísica não se funda em mera especulação como na seriedade de um planejamento racional aposto à busca de uma verdade verossímil. Tanto para as ciências naturais, acreditamos ser inapropriado argumentar a favor do alcance da verdade absoluta, porque “o homem, ministro e intérprete da natureza, opera e entende apenas pelo que, com a prática ou com a teoria, tiver aprendido da ordem da natureza: além disso nada sabe nem pode”. [62]

A racionalidade apodíctica parte de princípios verdadeiros, necessários e evidentes, ao ponto que na dialética, de verossímeis, prováveis, plausíveis.[63] Existe o reconhecimento de que uma completa a outra. Esse argumento encontra perfeita adequação em nossa proposta, à medida que no processo civil as mesmas normas e regras que se aplicam, igualmente, às partes, segundo um conceito formal de justiça, representam uma logicidade clara, de tal sorte que para o curso procedimental, devem as partes se submeter ao ordenamento pré-constituído de normas e regras que integram o codex processualístico.

Por outro lado, o conceito ético-político incompleto de justiça, enquanto práxis desenvolve-se através dos raciocínios dialéticos, pois visarão provar verdades relativas ao convencimento do juiz – e de si mesmas – acerca de fatos ocorridos no mundo sensível, inobstante tenham o condão de ser apenas plausíveis, por conseguinte não experienciáveis na atualidade do processo, mas premissas racionais demonstradas de que se valem o julgador para a prolação da sentença. Racionalidade apodíctica e racionalidade retórico-dialética são co-originárias no e para o processo.

O emprego da retórica e da dialética é cotidiano, pois “sempre que atacamos ou defendemos uma opinião, fazemos dialética; sempre que acusamos ou defendemos e sempre que damos um conselho, que censuramos ou louvamos, fazemos retórica”. [64]

A utilidade da racionalidade retórica consiste em evitar que uma coisa reprovável, uma causa injusta, seja vitoriosa num discurso. Tanto ela quanto a racionalidade dialética são úteis para trabalhar nos campos que não comportam constringências e precisam de interpretação a fim de alargar os horizontes de sua compreensão, como, por exemplo, o campo da ética, da política, da metafísica. [65]

No processo, nada é mais óbvio do que a constatação supra. Todavia, utiliza-se uma racionalidade retórico-dialética que se apõe aos princípios fundamentais ligados ontologicamente aos atores do processo. Não é só provar ou não provar algo mediante uma elaborada argumentação, sobretudo, é identificar a co-protagonização no processo como colaboração com a justiça seja quanto à tutela jurídica que se pretenda, seja quanto à resposta dada quando se é demandado – numa ou noutra hipótese, há que se respeitar a ética dos princípios que, além de significar o respeito ao próprio processo e aos fatos, significa a prática da razoabilidade em todos os níveis, fazendo da actio procedendi a causa plena de dignidade e da alteridade humanas.

A despeito da relevância da proposta aristotélica, resta parcialmente insuficiente seu projeto para nossos desígnios. Primeiro porque, apesar de haver entre racionalidade analítica e retórico-dialética certa interdependência e certamente uma cooriginariedade para o processo, o caráter da filosofia de Aristóteles é analítico-epistemológico, pois, é ausente o valor e a referência à subjetividade e à historicidade.[66]

Tais dados (axiológico, subjetivo e histórico) a teoria da complexidade não se abstém de clarificar, até porque justamente pela multiplicidade é que se teve a iniciativa de criar um arcabouço científico suficiente para a compreensão da universalidade a partir da particularidade, e vice-versa, sem, no entanto, perder a visão de mundo unitária e ampla perseguida, neste caso em especial, ao processo civil. Até aí a racionalidade retórico-dialética estabelece a prevalência do convencimento do que da participação, da cooperação. Os dois últimos conceitos estão aptos para ser trabalhados num contexto onde as discussões em torno do processo não se resumem ao convencimento de sua causa, em contrapartida a uma apreensão de caráter ontológico, isto é, das pessoas no processo.

3.3. A virada linguistica no 2º Wittgenstein

Veremos mais a frente que Gadamer retomara o conceito de racionalidade retórico-dialética de Aristóteles, no entanto com o intuito de superá-lo, assim como se procedeu no desenvolvimento da hermenêutica e da filosofia da linguagem do 2º Wittgenstein. Com Frege, viu-se o primeiro “descolamento entre sentido e referência e consequente independência entre o sentido de uma expressão e o raciocínio interior da mente de um sujeito,” [67] tornando distante o compromisso com o idealismo transcendental kantiano e o idealismo absoluto de matriz hegeliana – isso inclusive fora percebido já por Habermas.[68]

Todavia, excetua-se Wittgenstein (o 2º) que, distanciando-se da primazia assertórica da proposição e dos enunciados, como que Russel e Frege, viu no horizonte a pesquisa de um modo alternativo de investigar a linguagem e sua consequente filosofia.

O estudo desta realidade, especificamente a realidade da linguagem, toma um dos principais eixos da filosofia pragmática, podendo-se falar numa virada pragmática, isto é, uma volta à experiência e sua utilidade para a vida, cujo marco inicial poder-se-ia classificar através de dois meios: o primeiro já acentuado com Frege, deslocando o foco da subjetividade para os enunciados linguísticos; o segundo com Wilhem Von Humboldt que, indo além, viu a possibilidade dialógica e intersubjetiva da linguagem, não apenas, portanto, enunciativa do mundo da vida, como meio frutífero de conquista da comunicação racional a nível social, sendo amplamente aceito e desenvolvido por Habermas (agir comunicativo) e o 2º Wittgenstein como a seguir explicado.

Se, pois, no Tractatus havia o primado pela lógica, agora nas Investigações Filosóficas[69] Wittgenstein adentra em empresa completamente diversa, visando descrever os usos que fazemos das expressões de nossa linguagem para, através destes, compreender seu significado real. Com isso a lógica não é “única capaz de reger a linguagem, no sentido de determinar sua significação”.[70] O problema aqui é que costumamos não fazer um uso adequado das expressões e palavras aos seus reais sentidos em termos puramente gramaticais.

O fundamento da lógica é superado pela primazia da linguagem e, um ponto interessante de se verificar o rompimento, é na noção de proposição. Enquanto que no Tractatus, a proposição é a figuração de um estado de coisas, isto é, um verdadeiro retrato, nas Investigações Filosóficas, surge a tese dos Jogos de Linguagem, onde não se encontra mais o ensino ostensivo de palavras e expressões por meio de proposições diretas sobre o mundo, mas  tais expressões e palavras, modificando-se com o tempo, permitem a elaboração de elos semânticos entre linguagem e realidade, nome e objeto. 

Precisamos esclarecer que tomamos o caminho de explicitação da virada linguística através do 2º Wittgenstein porque almejamos encontrar Gadamer em sua hermenêutica filosófica que, deveras, vai além da filosofia linguístico-pragmática exposta nas linhas iniciais deste tópico. É preciso estudar as estruturas ontológicas com Heidegger para chegarmos a um conceito de experiência processual da linguagem jurídica, que, não pode submeter-se, ainda que sejam atraentes em demasia, os postulados de viés analítico e pragmático extremo, sendo, em espécie, a limitação mais notória da empresa de Wittgenstein.

A despeito, também, do projeto habermasiano do agir comunicativo, já utilizado quando argumentamos acerca da jurisdição participação em âmbito processual, acreditamos que é com Gadamer que, com efeito, o Direito pode ver-se numa medida diferenciadora da tradição positivista, de tal sorte que, à contento, é possível verificar um Direito aposto às questões fundamentais dos princípios, independentemente dos postulados da tradição pragmática da filosofia da linguagem.

Aprendemos que é na arte dialógica do discurso que se estabelece um consenso, e é, sem dúvida, na hermenêutica filosófica de Gadamer, passando rapidamente pela fenomenologia de Husserl até a ontologia, filosofia hermenêutica ou hermenêutica da facticidade de Heidegger, que encontraremos os conceitos essenciais para o estabelecimento de um processo que, malgrado complexo, preserva a visão particular no ser-parte como preocupação e atenção ao outro, o ser-com, o ser-aí disposto a solucionar o imbróglio em atualidade jurisdicionada.

3.4. A virada hermenêutica em Heidegger e Gadamer

A virada hermenêutica (hermeneutic turn) possui um significado próprio e mais revolucionário do que a virada linguística. Enquanto esta apenas caminhou da abstração filosófica da linguagem para a análise pragmática do seu uso, aquela visou o rompimento da epistemologia característica da modernidade em prol de uma nova ontologia, visto que “retrata e fundamenta a impossibilidade de reduzir a linguagem à perspectiva científico-moderna”.[71]

Pode-se dizer que, com Heidegger, localiza-se o primeiro protagonista desta virada, tanto hermenêutica e ontológica, como uma retomada aos gregos pré-socráticos e Aristóteles.[72] No 2º Wittgenstein a extrema preocupação com os diferentes usos que fazemos da linguagem colocou de lado os sujeitos que a utilizam tanto como pressuposto do conhecimento, quanto compreensão de si, do outro e da vida, a qual afeta e é afetado pela comunicação.

 Com Husserl, a fenomenologia rompeu com o conceito de experiência limitada às ciências, fazendo do mundo da vida um campo de experiências para a vida como um todo, elevando, desta monta, o tema da reflexão filosófica.[73] Dele viu-se a semente para a virada hermenêutica, cuja elaboração metódica adviria com o jovem Heidegger então insatisfeito com a tentativa idealista husserliana, a partir da intencionalidade racional para encontrar um fundamento irrecusável para o conhecimento, desejo “próprio da pretensão da metafísica tradicional e da filosofia moderna, inclusive da hermenêutica moderna”. [74]

Heidegger procurou elaborar uma filosofia que preservasse sua centralidade na autoconsciência, dizendo que não existe a coisa em si como queria Husserl, devido ao fato de que tudo se encontra em perpétuo dinamismo, tudo se encontra situado e relacionado.[75] Daí em diante, Heidegger marcou sua trajetória com a hermenêutica da facticidade, profundamente inspirado pelo problema do historicismo, a partir do conceito de “consciência histórica” desenvolvido por Dilthey. Em contraposição à tentativa dos gregos em situar um saber absoluto sobre o ser e, tomando o historicismo, foi preciso vislumbrar um novo método para a hermenêutica, a qual deveria colocar-se na finitude do ser-no-mundo. Essa finitude é um dado importante, pois o ser não é mais o máximo ou mínimo que basta a si mesmo, também não é o nada (no-thing), porém é um projeto que se lança para além de si mesmo, “o do ser como tempo”. Especificamente, Heidegger coloca no primeiro plano um corolário, Dasein, que significa o ser-aí, o estar-no-mundo-da-vida, isto é, plenamente jogado num projeto de possibilidades. É, portanto, a existência precedendo à essência, tornando o movimento temporal do ser a tomada de atitudes com as quais se compromete e se responsabiliza, a partir da noção existencial do ente privilegiado no reconhecimento primitivo da sua finitude. Esse ente que deveras existe¸ encontra-se completamente imerso num mundo habitado por coisas, meramente, e por outros entes privilegiados, o que ocasiona uma situação inevitável de intersubjetividade de conflitos nos quais haverá o estabelecimento convergente ou divergente de vontades, escolhas e determinações.

 Diante do paradoxo realizado numa suposta dicotomia entre subjetividade/intersubjetividade, urgem posicionamentos quase sempre diversos, os quais demandam, por sua vez, valorações com aptidão de consenso a partir do resultado dos acordos de vontades, ora legitimados e postos à normatividade. Precisa-se, pois, compreender o projeto do ente em seu ser e, não bastando, o projeto do ente em seu ser no diálogo inevitável das outridades. A situação coloca dois problemas unidos por um laço de complementaridade: o primeiro é a compreensão em si, de si mesmo nesse projeto, a segunda a compreensão no seio da inserção na intersubjetividade. Ambas, incluem-se na facticidade e, por meio delas, é feito o exercício contínuo de interpretação, contudo não num sentido singelo de interpretar como dizer, prolatar, enunciar, traduzir ou transmitir, mas no que tange à participação do ente a partir do processo formativo, performativo de si no mundo da vida, algo que exige da sua presença a responsabilidade pelo comprometimento nas ações e atos ilocucionários.

Não havendo, por outro lado, apenas observações positivas sobre o ente em seu ser e sendo-com-o-outro-ente¸ as dimensões obscuras, enevoadas ou indeterminadas devem, pois, motivar suas respectivas investigações, haja vista que esse suposto “nada” não simboliza quaisquer aspecto “nadificador”, porém as portas para horizontes inéditos nos quais resultam novas possibilidades projetiva para o ente privilegiado. Aliás, esse raciocínio configura-se importante para a interpretação ontológica dos princípios a partir do ente em seu ser multifacetado, tornando tal atividade não propriamente a expressão de plasticidade da norma-princípio, todavia a pertinência de seus conteúdos incompreendidos, demandantes exegéticos de intra-positividade, meta-positividade ou positividade transcendental.

“A hermenêutica alude e concentra-se também sobre o incompreensível, ou seja, o não-dito-(ainda), que por este é provocado ou pelo incompreendido e levado ao caminho do perguntar e do compreender.” [76] Trata-se de um desafio interpretativo que sempre se renova. Essa hermenêutica da facticidade alude justamente a uma nova maneira de compreender aquilo que a vida mesma oferece, em seus pontos mais claros e também mais obscuros. É uma lógica não-apodíctica, mas de verossimilhança, “do histórico tecido com o metafísico”, já que o fato de ser metafísico não significa dizer impossibilidade de experiência – é uma própria experiência.

Cada ser se compreende a partir do mundo que o circunda, levantando-se, erguendo-se, outrossim, através da e pela linguagem, que é, deveras, uma experiência hermenêutica. “Percebemos a experiência hermenêutica em nossas vidas quando procuramos compreender o outro, pois nela precisamos quebrar em nós uma resistência ao ouvir o outro como outro”. [77] Essa retomada da linguagem foi trabalhada amiúde por Gadamer, por conseguinte, inaugurando a hermenêutica filosófica nos moldes hoje conhecidos.

Para Gadamer a linguagem se insere no “aí” do nosso ser-aí, o ser-no-mundo, o ser que projeta e é projetado para o mundo aí. Disso decorre que a linguagem não pode ser um objeto, mas a perfeita realização do “aí” que nos acompanha à integralidade, enquanto experiência ontológica mesma.

“A linguagem é o meio em que se realiza o acordo entre os interlocutores e o entendimento sobre a coisa”.[78] Sobremaneira, é possível encontrar correspondência com nossas proposições acerca do processo civil.

O processo civil é um “aí” do Direito, no sentido de representar uma das formas pelas quais regras, normas e, sobretudo, princípios são aplicados em casos concretos, cuja materialidade é vivida pelo direito civil contemporâneo, claro em consonância aos ditames da constitucionalidade e convencionalidade.[79]

Cabe discernir, pois, duas experiências fundamentais: (i) o processo civil como campo de experiência do Direito mesmo e (ii) a linguagem como meio de experiência do próprio processo civil, por conseguinte, do Direito. Vemos que a linguagem integra a microestrutura do Direito e, assim sendo, razoável dizer que tal percepção é inequívoca na discussão judicial. Mas não se trata de uma mera possibilidade de exercício linguístico no processo civil, como na oportunidade de, pela linguagem, arquitetar-se um meio sólido onde além da busca pela satisfação do problema, visa-se uma busca em prol da integração social e pela perfeição prática dos princípios pro omne, os quais ganham relevo a partir do momento em que a linguagem lato sensu utilizada pela e para as pessoas (partes, juiz etc.,) não se restringe à manutenção instrumental da lide, em contrapartida, à proeminência do ser, do humano, do ético, do que é atribuído valor irrevogável de dignidade, responsabilidade e justiça.

Linguagem, experiência, Direito e processo formam uma unidade conglobante, à medida que se inter-relacionam recíproca e simultaneamente nos seus modos peculiares de aparecimento, o que, no nosso caso, ganha maior destaque a aplicabilidade ao processo civil.

Razoavelmente colocamos um pensamento do processo civil para além da reforma, pois identifica mais do que uma tendência legislativa, mais do que tornar o processo célere ao mesmo tempo em que substantivo, significa dizer, por outro lado, que a necessidade de encarar o Direito sob uma perspectiva diferenciada certifica a ruptura com qualquer dogmática estrita, dando lugar a um tempo onde a ponderação responsável é outro termo correlato à ideia de satisfação.

Não só, portanto, incumbe maiores poderes ao juiz, pois o processo, mesmo dando-se maior poder, não pertence ao juiz, mas à capacidade dos atores processuais interagirem para a promoção do melhor processo possível, atendendo aos direitos humanos, à constituição etc. O membro do ministério público na defesa coletiva ou individual de assuntos indisponíveis, o defensor público, os serventuários, todos contribuem para que o processo civil. v.g., não seja apenas uma experiência de Direito, mas uma experiência de humanidade, de atenção, respeito, fazendo do modus operandi um auto-retrato da preocupação do Estado para com seus cidadãos.

Forma-se uma racionalidade prática no processo civil, no paradigma da intersubjetividade, que fundamenta o discurso jurídico. Essa intersubjetividade se dá na experiência do processo e na experiência da linguagem propriamente dita, indo, inclusive, além do positivo e do natural, pós-positivo e pós-natural, ao pós-metafísico que significa dizer que, por exemplo, os princípios são percebidos pelo ser que se manifesta linguisticamente.[80]

Enfim, chegamos à experiência como momento de abertura aos modos de vida diferentes; isso porque até os direitos humanos podem ser categóricos a tal ponto de sufocar um argumento, a priori, minoritário e, se queremos um processo civil complexo, linguisticamente experienciável, ontologicamente empírico, quer dizer que não existem ou subsistem minorias ou maiorias, contudo particularidades, falibilidades, diversidades.

Por isso é linguagem – é a vida que se torna experiência para e através do Direito processual civil. Uma ciência, sem dúvida, que não carece por gozar de quaisquer outros argumentos potencialmente apodícticos, sobretudo, por aqueles que, pela verossimilhança mesma, podem alcançar a essência da finitude existencial que nos faz ser breves como um sopro neste suposto mundo da vida. [81]


4. Processo civil enquanto campo de experiência satisfativa do direito e a hermenêutica filosófica da pós-modernidade

É preciso aparar algumas arestas logo de início. Não podemos mais falar em existência de relação entre processo e direito material, por assim entendido no sentido clássico. Se procurarmos abandonar a tese da racionalidade reduzida à lógica, às algemas do pensamento cartesiano que visa secundar as partes para melhor compreender seus dinamismos em confronto com a totalidade, não subsiste tanto na dogmática jurídica, quanto em sua filosofia, o processo de um lado e o direito material de outro.[82]

O movimento que se empreende pela hermenêutica, mas não apenas pelo seu viés filosófico, como pelo desenvolvimento que traz à teoria do Direito, desde a virada linguística, pragmática ou ontológica, que permite argumentar em sede de um pós-positivismo, não pode, com efeito, alocar para o escanteio a importância axiológica da moral, da jurisdição participativa, da formação racional da comunicação para o consenso, como temas desprovidos de eficácia longitudinal, transversal, plural. É possível que tais elementos irradiem-se para todos os lados, motivo pelo qual o pós-positivismo não é apenas jurídico, mas sociológico, político e antropológico. Não existe relação de circularidade entre processo e direito material, pois o Direito é em-si uma unidade perpétua a favor da humanidade.

O paradigma inscrito, tão profundamente, nessa dogmática, refratária na pós-modernidade, reside no modelo epistemológico da razão subjetiva, da consciência individual ante a comunidade que discute, fala e consente. A regra de processo é tão-somente uma parte de segurança do Direito material mesmo, e, afora esse modelo, tanto há intersubjetividade na composição do litígio sob o mando da justiça, quanto há comunicação inevitável perante as estruturas formadoras do ordenamento pós-positivista substantivo.

Os que permanecem impérvios dessa tese assente em pressupostos clássicos, porém certamente ultrapassados e insuficientes, tendem, como já fora previsto pelos teóricos da pós-modernidade, com Nietzsche, Marx, Derrida, Lévinas, Adorno, Bauman, Morin, dentre outros, à hiperespecialização da técnica,[83] formando os processualistas habituados às discussões que, de tão secas, sequer frutificam uma pesquisa autêntica nos moldes inovadores da ciência complexa contemporânea. Validar qualquer separação, ainda que para fins didáticos, é destruir as conquistas alcançadas com tanto esforço, à medida que o fantasma cartesiano-kelseniano continuará presente no pano de fundo de um discurso demagógico que preze, em nítida contradição, pelos princípios fundamentais que hão de ser legitimados e postos em eficácia pela democracia consentida.

Além disto, tende a co-habitação do fantasma hermenêutico, ora de raiz filológica, ora teológica, ora ambos, culminando em tentativas unificadoras da hermenêutica, enquanto universalidade, sistema filosófico e logicidade, especialmente com Scheleirmacher e Dilthey. Antes destes, porém, no exclusivo campo jurídico, prevaleciam monismos interpretativos, mormente na tradição empírico-exegética francesa, pandectista alemã e mecânico-silogística inglesa do século XIX, desencadeando, a partir de então, em diversos outros movimentos, como o utilitarismo de Bentham, escola histórica de Savigny, Hugo e Puchta, o teleologismo de Ihering, livre investigação de Geny, no direito livre de Kantorowics, jurisprudência dos interesses de Heck, Rümelin, Oertmann, dentre outros, a jurisprudência sociológica norte-americana de Pound, lógica experimental de Dewey, realismo de Hart, dentre outras tantas correntes de pensamento, até o conhecido realismo dogmático, normativista de Hans Kelsen. [84] Mesmo após o culturalismo, o tridimensionalismo e outros, parece inevitável reconhecer a necessidade de (re) discussão do Direito, malgrado agora, encontramos fundamentos precisos e bem avançados na atual hermenêutica.

Há que se detestar toda doutrina que não conferir ao pós-positivismo uma oportunidade viável de alargar os horizontes principiológicos do Direito. Ou rompemos de vez, ou nos acostumemos à (re) construção fragmentada do Direito, o que, no fim, restará na já hodierna malha normativa destroçada, em frangalhos, apenas porque não soubemos aplicar os devidos conceitos e praticar as devidas ações contra o nosso rígido cepticismo.

O processo é o campo de experiência de satisfação do Direito, mas não o único. É onde, como lugar e tempo, se diz o não-dito pelo Direito. O processo determina, ou melhor, pode determinar, o Direito em suas propriedades essenciais, as quais a positividade das normas sequer logrou alcançar. Processo é um exercício, doravante desafiador de construção.

O Direito por si só representa o arcabouço de normas e regras que garantem que determinada comunidade política possa organizar-se mediante uma democracia, seja através dos direitos individuais, seja pelos deveres cívicos, concedidos e requisitados respectivamente; por outro lado, não há um Direito que é organizado pela comunidade política, que não esteja, antes de tudo, num contexto de democracia, baseado no discurso travado convergente num ponto de comunidade – isto é, como já percebera Habermas, apesar de parecer tender à preferência democrática, sobretudo, Direito e democracia são cooriginários, para usarmos o conceito, ou, como disse, intuição kantiana.[85]

Da mesma forma, já no ambiente performático da teoria do Direito, o processo, no caso o processo civil, está em relação genealógica de cooriginariedade com o Direito, pretensamente material, pois é impossível ao Direito mesmo, na positividade normativa, dizer tudo a respeito de si, sobre todas as suas possibilidades, alternativas e horizontes.

Se considerarmos o processo enquanto campo de experiência do Direito, não é algo que se lhe coloca à externalidade, isto é, não está de fora como mero procedimento, é o próprio e único Direito.[86] Sendo assim, o processo é o “aí” do Direito que é ser-aí, ou seja, que se coloca no e para o mundo da vida; é um fenômeno ao mesmo tempo aparente à sociedade, pois no que toca à litigiosidade das pretensões resistidas é o marco interpretativo vulgar e hodierno, enquanto é presença (práxis) do corpo de normas, regras e, sobretudo, de princípios legitimados.

É o Direito em conexão relacional com o mundo da vida, sem torná-lo absoluto, intocável, pois permite a interação complexa linguística das nuances tantas que caracterizam a ação humana. Estudar o processo em apartado tão-somente afigura-se necessário à medida do desenvolvimento da técnica direta do Direito à resolução de litígios, o que denota uma categoria integrante e lógica.

De certo, para o discurso popular é no processo que se resolvem os problemas da vida prática – o que é um dogma cediço; por conseguinte, há naturalidade no pensamento que julga o processo como instrumento ou companheiro do Direito mesmo. No entanto, científica e filosoficamente, o processo é desdobramento lógico, à medida que é a aparência percebida da potência de eficácia do Direito positivo. Anote-se bem que a potência é somenos quanto à eficácia judicial-resolutiva do litígio.

Nesse diapasão, há uma percepção dúbia acerca do processo: (i) aos que estão de fora, o instrumento ou companheiro que pode dar eficácia ao Direito aposto ao fato; (ii) aos que estão de dentro, a expectativa de satisfação do que se busca, pelo mesmo princípio – o que existe de comum em ambas as visões é que o processo é a aparência fenomênica do Direito, inobstante, como bem se percebe da evolução do pensamento filosófico, especialmente fenomenológico, ontológico e hermenêutico, é que a aparência é a própria essência do que se antes pensou ser mera imagem desdobrada. Assim, descobre-se o processo como o verdadeiro Direito, sendo sua experiência linguística e jusfilosófica fundamental, porém não exclusiva. No processo conhece-se o ser pela linguagem, objetiva-se a eficácia primeira dos princípios na oportunidade a estes conferida de serem levantados em dúvida e em facticidade.

Decorre, ainda, para clarificar, que, mesmo sendo da mesma essência, é legítimo para o processo desenhar seu próprio caminho metodológico, o que não implica na perda de unidade de sua essência para com o Direito, porém certifica-o como um quadrante (ou aspecto apenas mais prático e evidente) do Direito, tido como geral, o qual é responsável por denunciar à justiça aquilo que solapa a comunidade política, nas intersubjetividades.

 Por isso, o processo deve ser complexo, plástico, retórico-dialético, linguístico, principiológico e hermenêutico – já que o corpo positivo de normas, regras e até princípios já nasce atrasado no momento mesmo de sua confecção, tornando-se inapto para a multiplicidade de fatores atuantes no problema concreto que o fazem ser, justificadamente, complexo e, portanto, além do Direito positivo.

Com efeito, o momento, e não o lugar, de dialética principiológica do ordenamento jurídico-positivo com as carências fáticas é o processo e não o ordenamento em si, pois nesse caso, haveria nítida afronta à divisão funcional do poder em sede da conjuntura democrática e equilibrada da Constituição da República.

Quanto às súmulas vinculantes, os precedentes judiciais e a jurisprudência enquanto conjunto decisório pré-existente e norteador do juízo singular, cumpre reavaliar seus conceitos para não se esgotar, em questão hermética, um possível julgamento de índole complexa, com fatores além dos previstos nessa orientação, sob pena de mitigação do conceito ético-político incompleto de justiça, deveras alongado aos mais altos graus de jurisdição.

Excetuam-se os casos cuja homogeneidade seja evidente, decorrente de relação das quais grandes massas simultaneamente façam parte e, ainda, de querelas jurídicas, cujo fundamento possa ser o mesmo, ainda que para pessoas diferentes. Mas qualquer dúvida sanear-se-á nos poderes inequívocos do magistrado de primeiro grau – um dever de zelo para lá de específico rondá-lo-á durante o procedimento em apreciação.

Para a favor ou contra a jurisprudência formada, a esperança do tribunal perceber as nuances do caso em concordância aos princípios é o principal argumento contra as indiretas arbitrariedades e forças ocultas das súmulas e dos precedentes então consolidados, momento em que pesará de um lado a caneta do magistrado singular em prol de sua livre convicção motivada e a possível morte do direito adquirido pelo “vencedor” em virtude de recurso interposto pelo sucumbente, obviamente lastreado no fundamento pedregoso do excelso 2º grau.

Isso já fora, inclusive, comentado por Pontes de Miranda, quando de seus estudos ao CPC, in verbis: “A súmula concorre, como sempre, para a uniformização da jurisprudência. [...] Não se pode atribuir a qualquer órgão fazer leis, como seria o caso da súmula-lei.” [87]

Mais uma vez, não se submete o Direito aos fatos, mas, sua parcela de metodologia agora tem substância conforme a complexidade do mundo da vida – o que não é submissão, todavia um recurso necessário para se dar dinamismo e eficácia ao que por hora está posto. Na caminhada desse desenvolvimento, surge o pós-positivismo que, não destrói o positivismo jurídico, no sentido do Direito posto, mormente, pelo contrário, redefini-o, estruturando-o como corpo de diretrizes hermenêutico-princiológicas, donde caberá, a seu método (o processo), o debate de sua persistência, cabimento, cognição, provação e exequibilidade, consoante a si (direito), para dentro do problema.

Logo, o processo civil é ligeiramente método, enquanto parte imperativa do Direito, mas não o único método, pois vimos que o Direito por si só cria o ambiente de discussão democrática que, verdadeiramente, afeta todos os campos, seja das ciências da natureza, seja das ciências do espírito, por exemplo, a regulação socioambiental e a educação substantiva respectivamente.

Não mera incógnita na equação que diz respeito ao Direito. Portanto, unidos em unidade simbiótica, Direito e processo são o que são, simplesmente assim; ser a aparência apenas mais visível ao nosso olhar legalista e utilitarista não implica reconhecer a não cooriginariedade nuclear de ambos. A célula, por exemplo, não é menos célula porque dedicamos o estudo à mitocôndria e sua função na respiração celular – para todos os efeitos é organismo da célula, dela não se desvencilhando. O processo não é menos Direito que o próprio Direito, por outro lado, é especial, visto que o posto não é dialógico, senão no campo experienciável do processo. 

4.1. Sobre a lide

Uma dúvida a qual nos afigura é a questão do litígio, isto é, da pretensão resistida. De um lado, rompemos com a dogmática reducionista do processo o que implica, nesse campo, a considerar a lide não como sua única e exclusiva objetividade. Agora, tanto há que se meditar da integração entre as pessoas do processo, para o fim salutar da problemática levantada, como se atribuirá dimensão de integração social ao mesmo, na condição de um republicanismo inato, embora moderado, em oposição a um liberalismo forte.

Não haverá diferença no conceito de pretensão resistida, porque a pessoa ainda quererá satisfazer seu pleito, inobstante, o processo servirá como o lugar onde acontece a correção ética das condutas, quer dizer, a conduta positiva que dá andamento ao procedimento interno do processo reside lastreada nos pressupostos da boa-fé e da cooperação[88] – conceitos facilmente substituídos pela noção de alteridade.

A finalidade da tutela continua a ser buscada, no entanto o caminho travado pela pessoa para tanto não é mais adentrar na locução sofista da retórica argutamente arquitetada, mas na abertura que confere à possibilidade de, pela alteridade, construir um debate que vise a concretude da verdade, ainda que verossímil apenas. Na ausência desta premissa, caberá ao juiz a precisa observância, motivo pelo qual sustentamos que a reforma do CPC não atribui mais poder ao juiz do que ele já poderia dispor em sede de sua inata criatividade, malgrado, agora, positivado seu poderio imperativo, deve-se saber que com tanta margem de atividade, aumenta-se, em projeção geométrica, sua carga de responsabilidade; por conseguinte, maneja o processo, a conduta das partes, pois ainda não se presumirá a perfeição do princípio da alteridade, enquanto profere decisões.

Mais do que uma reforma do CPC, além do Direito e, obviamente do processo civil, é preciso uma reforma na magistratura, no sentido de que não se requer do juiz apenas o conhecimento inescusável da lei, mas a capacidade reflexiva e hermenêutica para lidar com a complexidade urgente e emergente do mundo da vida. Hoje, com efeito, não se ensina isso nos curso de Direito, pelo menos, quando submetido à exclusividade do pensamento lógico-sistemático-jurídico, epistemologicamente subtraído das demais áreas correlatas, complementares e até fundamentais como a filosofia, a sociológica, a política, a economia e a educação.  

Procede-se a um debate entre os princípios legitimadores dos direitos controversamente arguidos pelos integrantes da lide, de modo que não se sustenta do afastamento de um em benefício de outro, por outro lado, pesa a maior densidade que norteia, pois, a sentença de mérito pela prevalência, anote-se, porém, sem exclusão do outro derradeiro sucumbido, segundo a tese de Ronald Dworkin. [89] Robert Alexy, por outro lado, vai além, professando que por si só os princípios, dados como arquétipos fundamentais postos, são incapazes de, sozinhos, delimitar a zona exata de prevalência – o que deixa inequívoco o raciocínio de que, a priori, são, os princípios estruturas formais –, daí que subsiste para cada caso a especificidade criativa de regras de prevalência em cuja competência reside dizer se este ou aquele se aplica.[90]

Contudo, subsiste sempre uma cláusula de reserva que implicará no constante questionamento sobre se aquele princípio antes visto como prevalecente (a partir da regra formada) ainda está em condições de permanecer nesta posição; tal dúvida pode emergir a partir da constatação de outro princípio que tome maior peso para o caso discutido.[91] Sopesar ambas as posições[92] é, sem dúvida, de grande valia, de tal sorte a indiscutível importância para o instituto da coisa julgada, por exemplo, no postulado do rebus sic stantibus.

4.2. Fronteiras da instrumentalidade

É um princípio conhecido o que trata da instrumentalidade das formas dos atos processuais, consagrado, agora, no artigo 163 da reforma do CPC. De acordo com uma nova maneira de compreendê-lo, julga-se pertinente dizer que sua valência, até então direcionada aos atos propriamente ditos, resulta para todo o procedimento. As fases e atos processuais sob certa ordem obedecem ao critério da eficácia substantiva, o que significa dizer que não há mais que se falar em fases e etapas estanques, mas na possibilidade de alternância entre estas quando necessário.

A necessidade é quando, especialmente, surgir nova questão capaz de gerar, modificar ou extinguir a situação de fato ou de direito, haja vista que, como visto outrora, o processo cria inéditas relações e não somente faz valer os sonhos de plenitude empenhados pelo direito material para as situações sequer imaginadas, inobstante, sua própria concretude é a valorização do direito que procede ao princípio do ser que pede a resolução de problema ligado à obrigação, propriedade, responsabilidade etc. Se preciso for, as fases cognitiva, saneadora, probatória, decisória e executiva devem ser refeitas, pois que atendem ao ser que pode ser percebido diferentemente, porém de modo relevante, mesmo num momento adiantado do procedimento.

“A pessoa, para existir como Ideia, deve ter um domínio exterior à sua liberdade. [...] o que pode constituir o domínio de sua liberdade é algo distinto dela, e determina-se como o que é imediatamente diferente e separável de si.”  [93] O patrimônio é a externalidade do ser, de sua personalidade – daí sua proteção – pois é manifestação objetivadora de sua liberdade para si.

Na sociedade capitalista tardia,[94] é cogente a proteção patrimonial pelo direito civil; sendo cediço esse paradigma, constata-se a validade do direito civil à medida que visa conformar a propriedade como manifestação equilibrada da pessoa em si, excluindo, por outro lado, arbitrariedades e excessos – dados pelos quais o processo civil apropria-se para descobrir a razoabilidade nas intenções e a proporcionalidade nas prestações, justamente compostas pelo juiz e pelas partes, mediante a cooperação (art. 5º da reforma: “As partes têm direito de participar ativamente do processo, cooperando com o juiz e fornecendo-lhe subsídios para que profira decisões, realize atos executivos ou determine a prática de medidas de urgência”).   


5. A reforma nos horizontes de um pós-positivismo crítico, porém moderado

Em diversos momentos já foi dito que o fato da reforma é apenas um dado positivo acerca da evolução do pensamento conceitual jusfilosófico do direito processual civil. Nesta esteira, urge salientar que se trata, sobretudo, do influxo da teoria pós-positivista do Direito que, no terreno do processo civil, encontra campo amplamente fértil.

É costume discernir o pós-positivismo como um movimento filosófico, o que deveras está correto. Especialmente a tendência de pensar princípios antes mesmo de regras confirma tal hipótese. Todavia, cada autor faz uso de um referencial teórico distinto, faltando, pois, necessária unidade focal. Ainda, atribui-se à virada linguístico-pragmática de Habermas, principalmente, o encargo de fundamentar a corrente alhures. Segundo esta perspectiva, a teoria do agir comunicativo seria responsável por desvelar um âmbito discursivo no Direito que resgatasse o aspecto dialógico da linguagem como uma expressão de realidade justificável, espácio-temporalmente, com aptidão para a verdade e não como indicativo de um mero estado de coisas.

A linguagem passa a configurar o meio e o pressuposto pelo qual se dá o consenso intersubjetivo. Certo é que Habermas visa um projeto de rompimento com a filosofia de tradição kantiana, quanto ao seu paradigma da subjetividade, tanto para o estabelecimento desta dialógica intersubjetiva, como para desenvolver a oportunidade de debate da razão prática a partir do eu-com-o-outro. Sua razão comunicativa engendra comunicar o Direito com a Moral e a Política, isto é, não fundamenta, mas integra os usos linguísticos, dotando-os de criticidade.[95] Para ele o Direito é baseado em princípios deontológicos e, por este motivo, permite o embate de diferentes mundos culturais, aceitando-os no debate que objetiva o consenso, são diálogos interculturais – aliás como vimos no conceito ético-político incompleto de justiça que aceita os vários mundos sociopolíticos sem impô-los regras, contudo, sendo-o legítimo arquitetar diretrizes das melhores possíveis.

“Parece que, através do discurso jurídico, a incomensurabilidade dos mundos culturais podem se comunicar e, mesmo que minimamente, aspirar por consenso.” [96] Por outro lado, o discurso jurídico é institucional e lastreado, segundo Habermas, em princípios deontológicos que não podem ser prescindidos, visto que transcendem qualquer comunidade, devido à incondicionalidade – justamente por isso o juiz não fica livre para valorar os casos aleatoriamente, pois que está ligado institucionalmente à norma jurídica, guardando sua especificidade discursiva; em contrapartida seu discurso também é corretivo à medida que aceita os vários mundos ético-políticos apresentados. Julga-se racionalmente com base em princípios que, com efeito, não tem o condão de serem valorados, sob pena de eventual mitigação – são transcendentes às comunidades políticas, incondicionais, cogentes. Julga-se em princípios, por princípios e não valores como na metafísica jusnaturalista clássica. 

Apesar da grande relevância da proposta habermasiana em sua pragmática, não se credita totalmente viável submetê-la como corolário unitário do pós-positivismo. O modelo integracionista entre Direito e Moral que visa convergir num universalismo consensual deixa à mostra a essência político-democrática de sua proposta.

Utilizamos Habermas para falar principalmente acerca da jurisdição-participativa o que já nos é por hora, importantíssimo – afinal negar esse caráter político e ético da jurisdição é negar que o Direito tem relação com o Estado e com a democracia.

O descobrimento linguístico do ser-aí constitui importante questão, de sorte que compõem o diálogo da razão prática em moldes intersubjetivos sem olvidar a questão ontológica que lho é íntima. Daí termos escolhido Gadamer, e outros da linha, como referencial teórico fundamental.

O fato mesmo de se atribuir à linguagem esse papel descobridor do ontológico, confere à principiologia um destaque interessante. Se a pragmática foi interrompida em seu interesse pelo consenso e pela argumentação justificadora da verdade aduzida,[97] além dela a hermenêutica filosófica, a qual não deixa de ser também ontológica nesse caso em específico, vai à busca da realização de outros princípios superiores. Em si é a própria superioridade dos princípios – que é desvelar no ser, com a linguagem, sua dignidade nuclear.

Sobremaneira, não estaria o pós-positivismo condicionado ou mesmo ligado à virada linguístico-pragmática, sobretudo, é mais relacionado à hermenêutica filosófica que, sem abandonar o viés pragmático, racional, discursivo e intersubjetivo, avança na principiologia do ser-que-se-mostra, do ser-que-aparece, que percebe e é percebido. A reforma do processo civil deve ter em mente, além do posto, que o pensamento é do direito ao princípio do ser percebido, ou a perceber mediante o debate argumentativo processual.

Enquanto universalidade abre-se um novo campo de estudo que é o da sociologia do processo civil. Com a dimensão principiológica e com o descobrimento do ser é possível identificar precisa e conjunturalmente as carências pessoais no mundo dos negócios, inclusive retratando a medida com que o mercado influi na sociedade como aspecto de eticidade imposta e no próprio funcionamento do Direito. Conquista-se a prevalência máxima, o escopo fundamental e clássico do Direito que constrói para frente, para a razão essencial do ser humano, para a humanidade, para o princípio.

Diz-se um pós-positivismo crítico justamente por transcender o Direito positivo, sem, no entanto, esquecê-lo. Antes de sermos pós-positivistas somos positivistas e, sobretudo, não podemos negligenciar uma visão complexa tanto das ciências do espírito como das da natureza que compõem o mundo da vida.

Moderado, porque a reforma do CPC é uma prova da necessidade legalista da cultura cediça, inobstante ultrapassa-a para dizer um movimento hermenêutico do que não pode ser visto enquanto positividade, mas enquanto capacidade discursiva e reflexiva acerca do ser em comunidade, sensível às nuances falíveis e imprecisas da concretude existencial interconectada.

Por isso não é o pós-positivismo uma revolução destruidora. Melhor do que isso, paulatinamente, faz germinar no interior do pensamento jusfilosófico a semente de uma sensibilidade que, deveras, só se aprende com o tempo, numa espécie de amadurecimento sóbrio, diligente e persistente.  


6. Considerações Finais

Partimos de uma argumentação essencialmente filosófica ao tratar do processo civil em conformidade com a inevitável reforma de sua ordenação positiva. Se o objetivo antes colimado esteve em discernir a respeito do que poderia ser esperado enquanto pensamento processualístico com e a partir da reforma, certamente fomos além para dizer que a empresa filosófica aposta ao Direito, e aqui ao processo civil, já vinha se enredando largamente ao longo do século XX e neste início do XXI.

No âmago proposicional, alocamos o conhecimento do processo civil enquanto complexo. O processo civil complexo é um sistema de interações entre elementos heterogêneos, na sua substancialidade.  Tal heterogeneidade nos permitiu partir de um ponto inicial escolhido que é a complexidade, da mesma forma como pudemos intervir teórica e praticamente em tópicos importantes como a justiça e a jurisdição.

Um procedimento que nos afigurou como adequado foi o pensamento e a construção filosófica por diferenciação, quer dizer, apesar dos fundamentos serem retirados de autores de zonas e períodos histórico-culturais e científico-conceituais distintos, conferimos a cada um deles o seu tom de historicidade, à medida que os colocava a serviço de um processo civil ontológico, dialético e hermenêutico-principiológico. Fazer convergir um arcabouço inicialmente diverso para uma teoria ímpar constitui autêntica contribuição do pensamento filosófico, aliás, da própria filosofia como já percebera o francês Deleuze, inclusive.[98]

Sendo complexo o processo, comporta, portanto, a multiplicidade, a pluralidade, as características próprias dos seres humanos envolvidos nas tensões sociais pós-modernas. É um ambiente onde se discute em favor do consenso sobre o litígio, buscando além de uma integração privada, uma integração social, corretiva para as pessoas que ora pleiteiam. Todas as peculiaridades naturalmente surgidas são debatidas num tom baseadamente principiológico, de modo a estruturar o consenso racional em torno do objeto em apreço.

Aplicam-se mesmas regras e normas aos demandantes segundo um conceito de justiça formal, visto que é, a priori, o procedimento igualador. No entanto, quanto ao manejo substantivo do processo legal, há que se observar um conceito ético-político incompleto de justiça – um dado por si modulável e que aceita a diversidade de vidas socioculturais sem fazer nenhuma imposição, malgrado possa, através do juiz e até do próprio Direito, elaborar, como diretriz, o melhor mundo sociopolítico possível, algo que irá influir diretamente no caso concreto e na resolução do litígio.

No plano da jurisdição, da jurisdição-soberania (impositiva, regrativa) para a jurisdição-participação, onde a dialeticidade linguística no processo encontra respaldo jurídico e político na oportunidade que o Estado oferece, através do Direito, de promover a ação cooperativa e, assim sendo, desenvolver o processo de modo com que o objetivo final da satisfação seja implementado participativamente, conjuntamente, solidaria e eticamente.

O processo civil descobre o ser pela linguagem racionalmente elaborada. Interpreta, por isso, o mundo da vida e traça o melhor Direito possível. Os princípios da filosofia do Direito processual civil preocupam-se com a conjugação sustentável entre razão discursiva e percepção ontológica, mediante o uso da linguagem, tornando as pessoas objeto do juízo (personarum sunt iudicci obiectum), fazendo do Direito a visão do princípio do ser percebido ou a perceber (novatio iures ad principium et esse percipi), desvelando os preceitos humanos singulares (dae praeceptis omnia singularibus), concretos, a partir da diretriz mestra daqueles que, devido a superioridade, são incondicionais e perpétuos – a dignidade, a vida e a liberdade.


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Notas

[1] No contexto de reaproximação entre Direito e Ética, discutida na filosofia política, cf. RAWLS, John. Justiça e Democracia. São Paulo: Martins Fontes, 2002; na teoria jurídica, sobretudo na crítica e tentativa de rompimento com o positivismo, cf. DWORKIN, Ronald. Taking Righs Seriously. 6. imp. Londres, Duckworth, 1991 e ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica. São Paulo: Landy, 2001.

[2] Exemplo no Código de Processo Civil, já emendado e aprovado pelo Senado Federal, à espera de aprovação pela Câmara, são os artigos 1º, in verbis: “O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e os princípios fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código” e, ainda, o artigo 3º, “Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito, ressalvados os litígios voluntariamente submetidos à solução arbitral, na forma da lei”, em conformidade com o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição da República de 1988, com o acréscimo a respeito do avençado em juízo arbitral.

[3] A cooperação internacional proclamada no entorno dos artigos 25 a 41 da reforma representa importante inovação frente à globalização do Direito, ou internacionalização do Direito, o que significa além de um avanço proporcional às conquistas constitucionais positivas (art. 5º, §3º da CF/88), e às tendências pós-positivistas de acordo com o novíssimo Estado Internacional de Direitos Humanos, uma vez que a cooperação presente na reforma independe unicamente da existência de tratado do qual o Estado brasileiro seja signatário, tanto em relação aos Direitos Humanos, que acreditamos ter status supranacional, como quanto aos demais relativos a direitos e garantias comerciais e que tratam de outras questões entre diferentes Estados.

[4] MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à Educação do Futuro. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2000, p. 19.

[5] A complexidade aqui referida diz respeito à grandiosa conquista teórica pelo sociólogo e filósofo francês Edgar Morin, especialmente na obra Ciência com Consciência. 13.ª ed. Trad. Maria D. Alexandre e Maria Alice Sampaio Dória. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010. Todavia, o insigne pensador credita o primeiro grande texto sobre complexidade a Warren Weaver “que dizia que o século 19, século da complexidade desorganizada (naturalmente, ele pensava no segundo princípio da termodinâmica), ia dar lugar ao século 20, que seria o da complexidade organizada” (p. 176) – malgrado seja esta construção digna dos estudos precipuamente de engenharia e mecatrônica, dedicamos a Morin o delinear de uma teoria complexa anexa à racionalidade aberta da pós-modernidade.

[6] Idem, ibidem, p. 176.

[7] PASCAL, Blaise. Pensamentos. São Paulo: Martin Claret, 2008, p. 36.

[8] BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009,      p. 306. 

[9] CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. Vol. 1. 2ª ed. Campinas: Bookseller, 1998,

[10] CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 25ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 45, apud CARNELUTTI, Francesco. Istituzioni del nuevo processo civile italiano. Roma: Foro it., 1956, p. 17.

[11] “Nas últimas décadas o estudo do processo civil desviou nitidamente sua atenção para os resultados a serem concretamente alcançados pela prestação jurisdicional. Muito mais do que com os clássicos conceitos tidos como fundamentais ao direito processual, a doutrina tem-se ocupado com remédios e medidas que possam redundar em melhorias dos serviços forenses. [...] Esse intenso movimento reformador não fenômeno isolado do processo brasileiro. Todo o mundo ocidental de raízes romanísticas tem procurado modernizar o ordenamento positivo processual seguindo orientação mais ou menos similar, cuja preocupação dominante é a de superar a visão liberal herdada do século XIX, excessivamente individualista e pouco atenta ao resultado prático da resposta jurisdicional. A nova orientação, dominada pelos ares do Estado Social de Direito, assume compromisso, a um só tempo, com a celeridade processual e com uma justiça mais humana a ser proporcionada àqueles que clamam pela tutela jurídica.” THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I. 50ª ed. Rio de Janeiro: 2009, p. 4-7.  Além do dito pelo autor, a doutrina caminha para o Estado Constitucional e Humanista de Direito, que não deixa de ser, também, um Estado Internacional de Direito.

[12] CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel, op. cit., p. 46.

[13] MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. Vol. 1. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p.23.

[14] No novel código a questão da razoabilidade da prestação em conformidade com a celeridade está prevista no artigo 4º: “As partes têm direito de obter em prazo razoável a solução integral da lide, incluída a atividade satisfativa”, adequado ao inciso LXXVIII do artigo 5º da CF/88.

[15] OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Moral, Direito e Democracia: o debate Apel versus Habermas no contexto de uma concepção procedimental da filosofia prática. In: MOREIRA, Luiz (Org.). Com Habermas, Contra Habermas. São Paulo: Landy, 2004, p. 146.

[16] Prega-se, em especial, uma ruptura integral com o modelo de Hans Kelsen, para quem o Direito deve se preocupar apenas e exclusivamente com as normas positivas, efetuando o chamado corte epistemológico para as demais ciências, segundo o autor, com interesses próprios e não conciliáveis com o propósito do ordenamento jurídico-positivo. Cf. KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Trad. João Baptista Machado. 6ª ed. Coimbra: Armenio Amado, 1984.

[17] Cf. HELLER, Agnes. Além da Justiça. Trad. Savannah Hartmann. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998, p. 16-17.

[18] Idem, ibidem, p. 16.

[19] HELLER, Agnes, op. cit., p. 23.

[20] Agnes Heller, op. cit., p. 23 explica-nos que: “A aplicação das mesmas normas e regras a cada um dos membros de um grupo ao qual tais normas e regras se aplicam é um imperativo moral junto com a consistência na aplicação, mesmo não sendo elas próprias de natureza moral”, grifamos. O simples ato de coação de mesmas normas e regras substancialmente consideradas funciona para a autora como imperativo moral, em função do modo como são impostas e não pela natureza mesma. Concordamos com essa tese.

[21] HELLER, Agnes, op. cit., 1998, p. 23.

[22] HELLER, Agnes, op. cit., 1998, p. 301, grifamos.

[23] Isso porque “os princípios tendem a tiranizar, justificar, honrar, injuriar ou esconder os hábitos. Dois homens com princípios iguais querem, verdadeiramente, atingir algo de fundamentalmente diferente, como base nestes princípios.” NIETZSCHE, Friedrich. Para Além do Bem e do Mal. 3ª ed. Trad. Alex Marins. São Paulo: Martin Claret, 2008, p. 89, grifamos.

[24] HELLER, Agnes, op. cit., 1998, p. 301.

[25] Idem, ibidem, p. 310.

[26] HELLER, Agnes, op. cit., 1998, p. 313.

[27] Idem, ibidem, p. 313.

[28] Idem, ibidem, p. 314.

[29] Idem, ibidem, p. 314.

[30] CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel, op. cit., p. 147.

[31] Idem, ibidem, p. 147.

[32] Idem, ibidem, p. 147.

[33] Idem, Ibidem, p. 147.

[34] ALBERTON, Genacéia da Silva. Ação Comunicativa e Jurisdição: uma contribuição habermasiana. Juris Plenum Ouro, São Paulo, n. 14, [s.p.], jul. 2010. “No plano da jurisdição no Estado, o foco se desloca da jurisdição centrada no juiz para a jurisdição realizada por outros sujeitos que poderão encontrar num espaço público condições adequadas à realização do entendimento. Por isso são bem-vindos os projetos legislativos que visam normatizar as possibilidades de conciliação/mediação. Há de se desenvolver uma cultura de menor beligerância” [s.p.].

[35] ALBERTON, Genacéia da Silva, op. cit., [s.p.].

[36] Cf. DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1. Salvador: Juspodium, p. 41-77, que fala das dimensões formal e substantiva do devido processo legal (formal and substantive due process of law).

[37] Para que não haja dúvidas, a participação deve ser efetiva e integral e sua faculdade é relativa, à medida que, para nós, trata-se de um dever público de civilidade e colaboração para com a justiça.

[38] Cf. BRAGA, Luiz Felipe Nobre.

[39] HABERMAS, Jürgen. Pensamento pós-metafísico. 2ª ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2002, p. 71.

[40] Idem, ibidem, p. 71, grifamos.

[41] Idem, ibidem, p. 72, grifamos.

[42] Cf. TARTUCE, Flávio. Direito Civil. Teoria Geral dos Contratos e Contratos em Espécie. Vol. 3. 3ª ed. São Paulo: Método, 2008, p. 71-127; GOMES, Orlando. Contratos. 26ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 25-51; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Contratos. Vol. III. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 5-56; GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Contratos e Atos Unilaterais. Vol. III. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, p. 20-36.

[43] Cf. MARQUES, Cláudia Lima; BENJAMIN, Antônio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 26-57.

[44] Cf. DESCARTES, René. Discurso do Método. Trad. João Cruz Costa. São Paulo: Edições de Ouro, 1596-1650, p. 85-86; REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia: do humanismo a Descartes. Vol. 3. São Paulo: Paulus, 2004, p. 283-303.

[45] Cf. ROHDEN, Luiz. Hermenêutica Filosófica: entre a linguagem da experiência e a experiência da linguagem. São Leopoldo-RS: UNISINOS, 2002, p. 28.

[46] Idem, ibidem, p. 29.

[47] ROHDEN, Luiz, op. cit., p. 29.

[48] VALÉRY, Paul. O Pensamento Vivo de Descartes. Trad. Maria de Lourdes Teixeira. São Paulo: Martins Fontes, 1961, p. 29.

[49] Cf. ESPINOSA, Baruch de. Ética demonstrada à maneira dos geômetras. Trad. Marilena Chauí e outros. São Paulo: Abril Cultural, 1983, p. 69-299; REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia: de Espinoza a Kant. Vol. 4. São Paulo: Paulus, 2004, p. 11-32.

[50] Cf. LEIBNIZ, Gottfried Wilhelm. Novos Ensaios Sobre o Entendimento Humano. Trad. Luiz João Baraúna, São Paulo: Nova Cultural, 1999, p. 533-539; REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario, op. cit., p. 37-59.

[51] Cf. KANT, Imannuel. Textos Selecionados. Trad. Tania Maria Bernkopf. São Paulo: Abril Cultural, 1980, p. 15-18; KANT, Imannuel. Crítica da Razão Pura. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 36-57.

[52] WITTGENSTEIN, Ludwig. Tractatus lógico-philosophicus. Trad. José Arthur Giannotti. São Paulo: Nacional, 1968, 3ª premissa, p. 61.

[53] Idem, ibidem, p. 61.

[54] Idem, ibidem, 7ª premissa, p. 129, grifamos.

[55] RIBEIRO, Sandro Henrique. A problemática da linguagem em Ludwig Wittgenstein. In: Revista Semestral da Faculdade de Ciências e Educação de Rubiataba. Vol. 2. Jan./jun. de 2004, p. 110.

[56] ROHDEN, Luiz, op. cit., p. 29.

[57] MORIN, Edgar, op. cit., p. 158-161, grifamos.

[58] A propósito: “Um buen jurista dejaría ser un buen jurista si en todo momento de su vida profesional no fuera enteramente consciente, al mismo tiempo que de la necessidad de su disciplina, de la profunda problematicidad de la misma” RADBRUCH, Gustav. Filosofia del Derecho. 2ª ed. Madrid: Revista de Derecho Privado, 1944, p. 208, grifamos, apud DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à ciência do direito. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995, [s.p.]. 

[59] ROHDEN, Luiz, op. cit., p. 40.

[60] ARISTÓTELES. Metafísica. Trad. V. Garcia. Vol. I. Gredos: Madrid, 1992, 995ª, p.14-16.

[61] ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Trad. M. Araújo. Instituto de Estudios Políticos, Madrid, 1970, 1094b, p.12-14.

[62] BACON, Francis. Novum Organum. 2ª ed. Trad. José Aluysio de Andrade. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 13.

[63] ROHDEN, Luiz, op. cit., p. 49.

[64] THUTOT, C. Études sur Aristote. Trad. Antônio Pinto de Carvalho. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1964, p. 13 apud ROHDEN, Luiz, op. cit., p. 51. 

[65] Ibidem, p. 53.

[66] Ibidem, p. 54.

[67] NIGRO, Rachel. A virada linguístico-pragmática e o pós-positivismo. Direito, Estado e Sociedade. N. 34, p. 170-211, jan/jun 2009.

[68] Cf. HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade. Vol. 1. 2ª ed. Trad. Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2002, p. 17-26.

[69] WITTIGENSTEIN, Ludwig. Investigações Filosóficas. São Paulo: Nova Cultural, 1999, p. 20-40.

[70] RIBEIRO, Sandro Henrique, op. cit., p. 111.

[71] ROHDEN, Luiz, op. cit., p. 65.

[72] Cf. HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Petrópolis: Vozes, 1989.

[73] Ibidem, p. 66.

[74] Idem, ibidem, p. 67.

[75] Cf. ROHDEN, Luiz, op. cit., p. 67.

[76] ROHDEN, Luiz, op. cit., p. 70.

[77] Idem, ibidem, p. 72.

[78] GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método: trações fundamentais de uma hermenêutica filosófica. 4ª ed. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 560.

[79] Remetemos o leitor para o tópico seguinte onde aprofundamos a explicação do fato do processo civil constituir num dos “aí” do Direito. Aqui, basta saber que é um “aí” juridicamente experienciável.

[80] No tópico 5 explicaremos melhor a questão filosófica do pós-positivismo, por acharmos que seria outro o momento mais adequado para tanto, devido a suas peculiaridades conceituais.

[81]“A experiência hermenêutica é a experiência da finitude humana. É experimentado no autêntico sentido da palavra aquele que é consciente desta limitação, aquele que sabe que não é senhor do tempo nem do futuro; pois o homem experimentado reconhece os limites de toda previsão e a insegurança de todo plano. (...) Nela a experiência não tem seu fim, nem se alcança a forma suprema do saber, senão que nela é onde em verdade a experiência está presente por inteiro e no sentido mais autêntico. (...) A experiência ensina a reconhecer o que é real. Conhecer o que é, é assim o autêntico resultado de toda experiência e de todo querer saber em geral.” GADAMER, Hans-Georg, op. cit., p. 363.

[82] Sobre o sentido instrumental do processo cf. PASSOS, José Joaquim Calmon de. Instrumentalidade do processo e devido processo legal. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2001, n. 102 e DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 7 ed. São Paulo: Malheiros, 1999; além, ora pensando pela instrumentalidade, ora por certa complementaridade entre processo e direito objetivo, cf. DIDIER, Fredie Jr. Curso de Direito Processual Civil – teoria geral do processo e processo de conhecimento. Vol. 1. 12ª ed. Salvador: Juspodium, 2010, p. 22-23, que aduz: “Ao processo cabe a realização dos projetos do direito material, em uma relação de complementaridade [...]. O direito material sonha, projeta; ao direito processual cabe a concretização tão perfeita quanto possível desse sonho.” E tudo o mais o que o direito positivo não conseguiu um pensou em projetar! Cabe ressaltar que a nossa postura crítica é tanto para o uso equivocado da terminologia “relação”, quanto à persistência da doutrina em não utilizar dos argumentos e conceitos filosóficos, de elevada densidade teórica, no interior da pesquisa processual civil. É preciso alcançar uma argumentação mais homogênea e concordante com os posicionamentos, de fato, inovadores, sem, por outro lado, deixar para trás as conquistas realizadas pelos clássicos – mas que nos sirvam, principalmente, de trampolim. Ainda, falamos em homogeneidade, porém não em conceitos engessados ou mumificados, algo que seria, em si, contraditório com a proposta ventilada ao longo deste trabalho, portanto, sobretudo, ventila-se uma mudança teórica dos conceitos de “processo”, “instrumento” e “relação”. O fato do fenômeno de caráter prático-evidente estar “aí” para com a essência, não a esconde, tampouco a revela, visto que é a própria.

[83] Bem ressaltado em SCHUMPETER, Joseph A..  História da análise econômica. Trad. Alfredo Moutinho dos Reis e outros. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1964, p. 19-26.

[84] Cf. DINIZ, Maria Helena, op. cit., p. 46-115.

[85] “A tensão entre a perspectiva liberal e democrática presente no pensamento político-jurídico kantiano leva-o [o Kant] a procurar manter a dupla exigência de respeito aos direitos humanos e à soberania popular. É essa dupla exigência que Habermas chama de intuição kantiana da cooriginariedade de soberania popular e direitos humanos e vice-versa, uma não podendo ter o primado sobre a outra.” TERRA, R. Kant e o direito. Rio de Janeiro: Zahar, 2004, p. 58 apud MELO, Rúrion Soares. Habermas e a estrutura “reflexiva” do direito. Revista Direito GV. Vol. 1. N. 1., mai. 2005, p. 60 e ss. 

[86] Cf. SARTRE, Jean-Paul. O ser e o nada – ensaio de ontologia fenomenológica. 17ª ed. Trad. Paulo Perdigão. Petrópolis: Vozes, 2009, p. 15-20.  No entanto, “[...] como se sabe, Hegel diferencia na Ciência da Lógica em primeiro lugar a lógica do ser e, então, a lógica da essência. Nesse caso, a essência é a verdade do ser – e não algo por detrás. E se Hegel estabelece o conceito, a ‘suma conceitual’, acima da essência, então esse conceito é a unidade de ser e essência e, com maior razão, nada por detrás. Sartre também deu esse passo a seu modo, sem reconhecê-lo em Hegel”. GADAMER, Hans-Georg. Hermenêutica em retrospectiva: a virada hermenêutica. Vol. II. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 2007, p. 53.

[87] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Processo Civil. Tomo IV, Arts. 476 a 495. Atualizado por Sérgio Bermudes. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 31.

[88] A esse respeito, DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil – Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. Vol. 1. 12ª ed. Salvador: Juspodium, 2010, p. 77-82.

[89] Cf. DWORKIN, Ronald. Taking Righs Seriously. 6. imp. Londres, Duckworth, 1991, p. 26.

[90] Cf. ALEXY, Robert. Rechtsregeln und Rechtsprinzipien, Archives Rechts und Sozialphilosophie, Beiheft, 25 (1985), p. 21, apud  ÁVILA, Humberto. A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade. Revista de Direito Administrativo, (215): 151-179. Rio de Janeiro: Renovar, jan./mar. 1999, p. 10.

[91] Idem, ibidem, p. 10.

[92] “A distinção entre princípios e regras, segundo ALEXY, não pode ser baseada no modo “tudo ou nada” de aplicação proposto por DWORKIN, mas deve resumir-se, sobretudo, a dois fatores: diferença quanto à colisão, na medida em que os princípios colidentes apenas têm sua realização normativa limitada reciprocamente, ao contrário das regras, cuja colisão é solucionada com a declaração de invalidade de uma delas ou com a abertura de uma exceção que exclua a antinomia; diferença quanto à obrigação que instituem, já que as regras instituem obrigações absolutas, já que não superadas por normas contrapostas, enquanto os princípios instituem obrigações prima-facie, na medida em que podem ser superadas ou derrogadas em função dos outros princípios colidentes.”, ÁVILA, Humberto, op. cit., p. 11.

[93]  HEGEL, G. W. F. Princípios da Filosofia do Direito. 2ª ed. Trad. Norberto de Paula Lima. São Paulo: Ícone, 1997, p. 72.

[94] Cf. MANDEL, Ernest. O Capitalismo Tardio. Trad. Carlos Eduardo Silveira Matos, Regis de Castro Andrade e Dinah de Abreu Azevedo. São Paulo: Abril Cultural, 1982, p. 7-29.

[95] NIGRO, Rachel. A virada linguístico-pragmática e o pós-positivismo, p. 204.

[96] NIGRO, Rachel, op. cit., p. 205.

[97]  HABERMAS, Jürgen. Verdade e Justificação. São Paulo: Edições Loyola, 2004. Não queremos, inobstante, asseverar com toda certeza, até porque seria um flagrante equívoco, além de um desrespeito, porém, para as nossas reflexões atuais cabe parar por aqui.

[98] Cf. MACHADO, Roberto. Deleuze, a arte e a filosofia. Rio de Janeiro: Zahar, 2009, p. 18-29. 


Abstract: This work aims to discuss the principles of the civil processal law philosophy by the reformation of the codex that is in path at the National Congress. Beyond the processal reform, the emergency of a new post-positivism conception claims to be detached, justly by representing inedited horizons of law, particularly in its principles and hermeneutic understanding that, as much, consider the multiplicity of social-political worlds routed to inter-subjective relations at the contemporary time. Sustains itself reflexively as the principle unity in terms of human rights and fundamental duties and warranties, combined dialogical, reciprocal and simultaneously, by the presupposes of post-modernity and complexity and, mainly, by the intermediating of the superior corollaries of dignity, responsibility and proportionality.

Key-words: Philosophy; Law; Civil Process; Hermeneutic; Principiology.


Autor

  • Luiz Felipe Nobre Braga

    Mestre em Direito pela Faculdade de Direito do Sul de Minas; Advogado; Consultor e Parecerista; Professor de Direito Constitucional e Lógica Jurídica na Faculdade Santa Lúcia em Mogi Mirim-SP; Professor convidado da pós-graduação em Direito Processual Civil e no MBA em Gestão Pública, da Faculdade Pitágoras em Poços de Caldas/MG. Autor dos livros: "Ser e Princípio - ontologia fundamental e hermenêutica para a reconstrução do pensamento do Direito", Ed. Lumen Júris, 2018; "Direito Existencial das Famílias", Ed. Lumen Juris-RJ, 2014; "Educar, Viver e Sonhar - Dimensões Jurídicas, sociais e psicopedagógicas da educação pós-moderna", Ed. Publit, 2011; e "Metapoesia", Ed. Protexto, 2013.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRAGA, Luiz Felipe Nobre. Primeiras linhas para os princípios da filosofia do Direito Processual Civil . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3472, 2 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23352. Acesso em: 28 mar. 2024.