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Os efeitos da globalização nas relações trabalhistas - dumping social

Os efeitos da globalização nas relações trabalhistas - dumping social

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Apenas a previsão legal de condenação de empresas pela prática de dumping social seria capaz de amenizar as discordâncias doutrinárias e jurisprudenciais. Enquanto forem ignorados os malefícios do dumping, os trabalhadores brasileiros permanecerão sendo explorados e submetidos a condições degradantes de trabalho.

Resumo: Este trabalho monográfico aborda as alterações ocorridas nas condições de trabalho com o advento do capitalismo e do processo de globalização, entre eles, o surgimento da flexibilização das normas de trabalho e do dumping social, que pode ser conceituado como o desrespeito reiterado às normas de direito do trabalho. A expressão dumping surgiu, inicialmente, no direito econômico e referia-se a prática ilícita de venda de mercadorias com preço abaixo do custo com o intuito de eliminar a concorrência. No Brasil, não há nenhuma previsão legal específica que preveja a condenação por dumping social na esfera trabalhista, no entanto, a ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho) aprovou o enunciado nº 4 que prevê a possibilidade de condenação pela prática de dumping social. Apesar da grande divergência jurisprudencial, houve um grande avanço na sensibilização dos juristas brasileiros e já é possível visualizar decisões judiciais reconhecendo o dano social decorrente dessa prática, bem como a imposição de pagamento de multa pelos danos causados à sociedade.

Palavras-chave: Globalização. Flexibilização. Dumping social. Dano social. Condenação.

Sumário: 1. Introdução. 2. Os impactos da globalização nas relações laborais. 2.1 Esboço histórico do trabalho humano . 2.2 Revolução industrial. 2.3 Conceito de globalização. 2.4 Globalização como precarização das condições de trabalho. 3 Dumping social na esfera trabalhista brasileira. 3.1 Conceito. 3.2 Flexibilização das normas trabalhistas. 3.3 Como identificar a prática do dumping social. 4. Entendimento jurisprudencial e doutrinário acerca da responsabilidade por dano social. 4.1 O Estado-Juiz diante do reconhecimento do dano social. 4.2 O dano social decorrente da prática do dumping. 4.3 Posicionamento da Justiça do Trabalho no reconhecimento do dano social. 4.3.1 Concorrência desleal. 4.3.2 Descumprimento da função social do contrato. 4.4 Posicionamento da Justiça do Trabalho na condenação por dumping social. 5. Conclusão. 6. Referências


1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo fazer uma análise sobre os efeitos que a globalização, os avanços tecnológicos e a acelerada internacionalização da economia vêm causando nas relações trabalhistas, dando enfoque para a prática do dumping social.

No primeiro capítulo, são abordadas as características dos processos de globalização e da revolução Industrial, bem os efeitos nocivos que causaram nas condições de trabalho. A revolução industrial caracteriza-se pelo surgimento da máquina a vapor, que provocou a substituição da mão de obra operária. Essa mudança no sistema de produção trouxe benefícios aos donos de fábrica, que economizavam no pagamento de salário e a produção era realizada de forma muito mais rápida. Toda essa mudança contribuiu para aumentar a margem de lucro da indústria, fortalecendo o sistema capitalista de produção.

A globalização corresponde ao internacionalismo do sistema capitalista, sendo caracterizada pela expansão da indústria, ultrapassando as fronteiras econômicas dos Estados. O crescimento da economia internacional provocou o aumento da concorrência entre as empresas, e a saída que muitos empresários utilizaram para garantir a estabilidade de sua empresa diante de tantas outras multinacionais, foi reduzir os custos com a mão de obra operária através da redução e até mesmo da exclusão dos direitos fundamentais dos trabalhadores.

Já no segundo capítulo, analisa-se a possibilidade de flexibilização das normas trabalhistas e as principais características que identificam a prática do dumping social, cuja definição e aspectos jurídicos também estão definidos neste capítulo.

No último capítulo analisa-se a possibilidade de concessão de indenização por dano social provocado pelo dumping. A esse respeito, não existe no ordenamento jurídico brasileiro nenhum dispositivo legal que preveja a possibilidade de indenização pela prática do dumping na esfera trabalhista, motivo pelo qual muitos juízes e desembargadores negam o reconhecimento do dano causado, por entender que pela inexistência de regulamentação própria, não há possibilidade de acatar o pedido de indenização.

Mesmo diante dessa ausência, muitos juízes têm se demonstrado sensibilizado com o dano provocado pelo dumping, fazendo uma análise sistemática de outros dispositivos do nosso ordenamento jurídico e aplicado condenações para as empresas que insistem em desrespeitar, de forma reiterada, o direito trabalhista.

No entanto, entre a jurisprudência que concorda com a aplicação da indenização, existem várias divergências de entendimento como a legitimidade para propor a ação, o destino do valor da condenação e a possibilidade de concessão da indenização ex ofício. A exposição e explanação de toda essa divergência jurisprudencial serão abordadas nesse último capítulo que tem como objetivo demonstrar a problemática que cerca o reconhecimento do dumping social.


Que proveito tem o homem, de todo o seu trabalho, com que se afadiga debaixo do sol?”

(Eclesiastes 1:2-3)


2. OS IMPACTOS DA GLOBALIZAÇÃO NAS RELAÇÕES LABORAIS

2.1 Esboço histórico do trabalho humano

As relações de trabalho em muito se modificaram até chegar às condições atuais. A palavra trabalho vem do latim tripalium, espécie de instrumento de tortura composto por três paus. Durante muito tempo o trabalho realmente foi visto como um castigo, a bíblia no livro de Gênesis capítulo 3, versículo 19 relata que Adão teve que trabalhar para comer pelo fato de ter comido o fruto proibido.

Além disso, uma das primeiras formas de trabalho foi a escravidão, onde o escravo era considerado apenas como uma mercadoria possuidora de força física para desempenhar as atividades braçais, não sendo considerado sujeito de direito, muito menos de direito trabalhista.

Superada a época da escravidão, surge o feudalismo, onde os senhores feudais davam proteção aos servos e cediam parte de suas terras para que estes plantassem mas, em troca do uso da terra, deveriam entregar parte de sua produção para os senhores feudais. Ainda durante o feudalismo, o trabalho continuava sendo visto como castigo, já que os nobres, possuidores de terras, não trabalhavam.

Ao longo do tempo surgiu uma nova classe econômica, a burguesia que passou a dominar o comércio e, com isso, tirou o poder dos senhores feudais, provocando o enfraquecimento do feudalismo, e o surgimento de um novo sistema: O capitalismo.

O sistema capitalista caracteriza-se pela busca incessante de lucro e do aumento de capital. No capitalismo, o sistema de produção passou a ter duas partes figurantes: de um lado os donos de empresas e fábricas e de outro, a classe do proletariado que são as pessoas que trocam a sua força de trabalho por dinheiro.

Outra característica desse sistema é o liberalismo econômico, que corresponde à descentralização do poder Estatal na economia, devendo o Estado intervir apenas em situações delicadas, que justificassem a necessidade dessa intervenção.

O capitalismo provocou o aumento do comércio urbano e o meio de produção que antes era o plantio rural passou a se desenvolver nas indústrias dos centros das cidades, o que provocou a mudança dos trabalhadores da zona rural para a zona urbana. Dessa forma, pode-se afirmar que o trabalho agrário foi sendo substituído pelo trabalho industrial.

Com o desenvolvimento da indústria e a consequente expansão do capitalismo surgiu o fenômeno da globalização que corresponde ao processo de interação entre países, principalmente com a internacionalização da indústria e da economia. O desenvolvimento industrial causou grandes impactos nas relações de trabalho, pois, o trabalho que antes era desempenhado de forma manual e artesanal, passou a ser feito pelas máquinas, substituindo a mão de obra operária e causando grande desigualdade social.

2.2 Revolução industrial

A Revolução Industrial teve início na Inglaterra durante o século XVIII e é considerada como um conjunto de transformações sociais e na atividade econômica, tendo como marco inicial o surgimento das máquinas a vapor. A Inglaterra foi pioneira no movimento de revolução industrial porque além de possuir grandes reservas de carvão mineral, que era a fonte de energia das máquinas a vapor, também tinha uma grande quantidade de trabalhadores disponíveis nas cidades.

Sobre o surgimento da Revolução Industrial, Sérgio Pinto Martins dispõe:

A principal causa econômica da Revolução Industrial foi o aparecimento da máquina a vapor como fonte energética. A máquina de fiar foi patenteada por John Watt em 1738, sendo que o trabalho era feito de forma muito mais rápida com o referido equipamento. O tear mecânico foi inventado por Edmund Cartwrigt, em 1784. James Watt aperfeiçoou a máquina a vapor. A máquina de fiar de Hargreaves e os teares mecânicos de Cartwrigt também acabaram substituindo a força humana pela máquina. (MARTINS, 2010, p. 5-6).

Antes da Revolução Industrial, a fabricação era realizada de forma manual, sendo chamada de manufatura, mas nesse método de trabalho além de despender muito tempo, a quantidade produzida era pequena. Já a maquina a vapor produzia em alta velocidade, grande quantidade e com menor custo e, em virtude disso, a força de trabalho humana foi sendo substituída pelo uso das máquinas. Essa substituição causou revolta entre os trabalhadores, conforme demonstra Sérgio Pinto:

Os ludistas organizavam-se para destruir as máquinas, pois entendiam que eram elas as causadoras da crise do trabalho. [...] Daí nasce uma causa jurídica, pois os trabalhadores começaram a reunir-se, a associar-se, para reivindicar melhores condições de trabalho e de salários, diminuição das jornadas excessivas (os trabalhadores prestavam serviços por 12, 14 ou 16 horas diárias) e contra a exploração de menores e mulheres. (MARTINS, 2010, p. 6).

Como o carvão era a principal fonte de energia das máquinas, as indústrias passaram a se instalar em locais onde houvesse abundância de carvão, como na Inglaterra, por exemplo. Os trabalhadores saíram das fábricas e foram prestar serviços nas minas de carvão, onde eram submetidos à condições que colocavam em risco à saúde e a segurança dos trabalhadores, que estavam sujeitos à explosões, incêndios e desmoronamentos. Nos trabalhos realizados em minas, era comum ocorrer vários acidentes de trabalho, bem como o surgimento de diversas doenças ocasionadas pela exposição contínua aos gases e a poeira, tais como: Asma, pneumonia e tuberculose.

Diante dos abusos praticados pelos empregadores na exposição do trabalhador à condições desumanas de trabalho, fez-se necessária a intervenção do Estado na proteção jurídica do trabalhador. É como afirma Galart Folch: “A legislação do trabalho deve assegurar superioridade jurídica ao empregado em razão de sua inferioridade econômica”. (Folch, 1936, p. 16 apud Martins, 2010, p. 6).

A partir dessas crises nas relações de trabalho, o Estado passou a reconhecer e estabelecer direito mínimos sobre as condições de trabalho, que deveriam ser respeitadas pelos empregadores. Por isso, afirma-se que a Revolução Industrial é o marco do surgimento do Direito do Trabalho.

Ao passar do tempo, novas tecnologias foram implantadas, inclusive com o surgimento da indústria automobilística, surgindo os sistemas de produção Fordista e Toyotista.

Visando amenizar os problemas que ocorriam no processo de fabricação, o norte-americano Henry Ford criou um sistema de produção de veículos chamado “Linha de produção”, que consistia em uma esteira rolante que movimentava as peças e, em cada movimentado, um trabalhador fazia uma pequena etapa da montagem do veículo. Através desse método de produção, o trabalhador passava longas horas repetindo a mesma atividade e como o trabalho era repetitivo, não havia necessidade da mão de obra ser capacitada, o que reduzia o valor do salário.

O modelo de produção Fordista foi muito positivo para os empresários, pois este proporcionou uma produção em massa. Devido ao sucesso de produção e redução de custos, esse modelo de produção foi adotado por várias outras empresas.

Esse sistema de produção é muito bem abordado no filme de Charles Chaplin, chamado de “Tempos Modernos”, que faz muitas críticas ao sistema de produção em série, com imagens de trabalhadores que passam longas jornadas fazendo a mesma função: Apertando parafusos, até ser “engolido” pela máquina.

Ao decorrer do tempo, constatou-se que o modelo de produção em massa estava causando grandes prejuízos, já que o consumo não acompanhou o ritmo da produção. A partir daí, surgiu na fábrica da Toyota o modelo de produção chamado de Toyotista, que foi criado pelo japonês Taiichi Ohno.

Acerca das características desse modelo de produção, o site Mundo e educação informa que:

O toyotismo tinha como elemento principal a flexibilização da produção. Ao contrário do modelo fordista, que produzia muito e estocava essa produção, no toyotismo só se produzia o necessário, reduzindo ao máximo os estoques. Essa flexibilização tinha como objetivo a produção de um bem exatamente no momento em que ele fosse demandado, no chamado Just in Time. Dessa forma, ao trabalhar com pequenos lotes, pretende-se que a qualidade dos produtos seja a máxima possível.

As relações de trabalho foram modificadas com o surgimento do modelo Toyotista, já que nesse sistema de produção a preocupação principal não era com a quantidade produzida e sim, com a qualidade do produto. Para manter esse controle de qualidade era necessário que os trabalhadores fossem mais qualificados, já que estes desempenhavam diversas funções.

Com o surgimento de novas tecnologias e os avanços na área de telecomunicações e transporte, a indústria expandiu-se pelo mundo, ocasionando um aumento significativo na concorrência, momento em que deflagrou o processo de globalização.

2.3 Conceito de globalização

O início da globalização gera discordância quanto ao momento histórico de seu surgimento, porém, a datação mais aceita é que esse processo tenha se culminado com a Revolução Industrial, durante os séculos XVIII e XIX, onde as constantes inovações na área de telecomunicações e transportes foram capazes de diminuir a distância entre os países, facilitando a interação entre as nações.

O próprio Marx previu o movimento de globalização do capitalismo ao escrever no manifesto comunista: “trabalhadores do mundo, uní-vos”. A expressão demonstra que o doutrinador já entendia que a luta do capital contra o trabalho deveria se dar na esfera global, uma vez que o capital se expandia para além das fronteiras dos estados.

Para Otávio Ianni (2009), a globalização representaria uma última etapa do capitalismo, caracterizada por uma expansão dos meios de telecomunicações e informática, principalmente com o surgimento da internet, uma vez que essas tecnologias facilitavam o acesso entre países, possibilitando a expansão dos negócios que antes estavam restritos apenas à esfera nacional.

Arion Sayão Romita leciona que:

A globalização é um processo irreversível que permite o deslocamento rápido, barato e maciço de mercadorias, serviços capitais e trabalhadores, podendo-se pensar no surgimento de um único mercado planetário de bens e trabalho. Sendo então, conceituada, como um conjunto de fatores que determinam a mudança dos patrões de produção, criando uma nova divisão internacional do trabalho. Já que a economia passa a se desenvolver numa escala mundial, tornando obsoleta a clássica noção de fronteira geográfica. (ROMITA, 1997, p. 28-29).

Entende-se por globalização, o mecanismo de interação entre os países, proporcionada pela transformação no âmbito político e econômico mundial decorrente, principalmente, do abandono das barreiras tarifárias e da abertura do comércio internacional.

Com o desenvolvimento do fenômeno da globalização, houve uma reorganização do espaço mundial, fazendo nascerem mudanças de ordem estrutural em diversos aspectos como o cultural, político, social, jurídico, e principalmente econômico.

Com o acelerado crescimento da indústria, a facilidade de transporte entre as nações e a implantação do livre comércio, diversos países passaram a exportar seus produtos para outros parceiros comerciais e importar insumos de outras localidades, dando início ao processo de globalização.

A globalização pode ser considerada como um fenômeno decorrente da expansão do capitalismo, que também está intimamente ligado a revolução industrial, que será explanado a seguir.

2.4 Globalização como precarização das condições de trabalho

Pode-se afirmar que a sociedade capitalista é dividida em duas classes: De um lado, o trabalhador que vende a sua força de trabalho em troca do salário para garantir a sua subsistência. Do outro, o empregador que é o dono de capital.

O sistema capitalista tem como característica a busca pelo acúmulo de riquezas, onde o empregador explora a mão de obra operária, pagando baixos salários e, através disso, consegue reduzir a despesa de produção e aumentar a margem de lucro. É o que Marx denominou de “mais valia”.

A globalização é derivada da necessidade de expansão do sistema capitalista e, para se adquirir essa expansão foi necessário conquistar novos mercados para obter maiores lucros e acumular riquezas.

Amauri Mascaro Nascimento (2007, p. 59) entende que entre os efeitos gerados pela globalização econômica no mundo do trabalho, estão: A migração de indústrias dos países desenvolvidos para os emergentes, a descentralização das atividades da empresa (terceirização) por meio de subcontratações e a informalização do trabalho.

Para os empresários que buscam mecanismos para reduzir o custo de produção, uma das alternativas encontradas é transferir a sua produção para países subdesenvolvidos, onde a mão de obra é farta e barata. Com a queda de fronteiras entre os países, as empresas buscam implantar seus escritórios em países subdesenvolvidos, onde haja pouca proteção trabalhista, pois isso viabiliza a exploração da mão de obra e o pagamento de salários ínfimos, caracterizando-se a prática do dumping social. Um dos locais mais escolhidos para implantação de empresas multinacionais é a China, que abriga duas gigantes: A Nikke e a Apple.

Em notícia veiculada no site “AMIRT” (Associação Mineira de Rádio e Televisão), a Jornalista Nayara Fragão explica os motivos da maior parte de produção da Apple ser realizada na china:

Um deles é o fato de a maioria dos fornecedores da empresa de Steve Jobs estar localizada na China. Trazer a produção dos aparelhos da Apple para os Estados Unidos criaria grandes desafios na logística — como tornar viável a fabricação de aparelhos em uma cidade americana se quase todos os seus componentes estão a meio mundo de distância? Isso seria também um empecilho para a troca de fornecedores chineses, o que a empresa hoje faz com certa flexibilidade na China. O porte das fábricas chinesas, hoje maiores e bem mais ágeis que as americanas, é outro motivo para continuar a produção fora de casa. Um ex-executivo da Apple conta que, poucas semanas antes de o dispositivo ir para as prateleiras, a companhia redesenhou a tela do iPhone, forçando a revisão da montagem do aparelho, segundo o NYT. Assim, na China, o chefe dos operários teria acordado 8 mil deles, que dormiam em seus quartos dentro da fábrica. “Cada empregado recebeu um biscoito e uma xícara de chá, foi conduzido à estação de trabalho e, em menos de 30 minutos, eles começaram um turno de 12 horas, encaixando as telas de vidro no aparelho”, relata o jornal. Em 96 horas, a planta produziu no ritmo de 10 mil iPhones por dia. O movimento da produção em direção ao exterior preocupa os Estados Unidos, segundo economistas ouvidos pelo NYT. Afinal, essa seria uma causa da dificuldade que o país enfrenta para criar postos de trabalho para a classe média. Em relação ao custo, fabricar um iPhone nos Estados Unidos custaria US$ 65 a mais que na China, onde a estimativa de custo de produção é de US$ 8. Isso minimizaria o lucro da Apple, apesar de não eliminá-lo. (O preço médio de venda do iPhone é de US$ 600, o que rende margem bruta de cerca de 40% à Apple, calcula o Business Insider. Assim, o lucro bruto da Apple com cada iPhone é de aproximadamente US$ 250, segundo o site.

Conforme se vê na reportagem acima, os trabalhadores vivem em alojamentos, dentro da própria fábrica e mesmo durante o horário de repouso são chamados de volta ao trabalho, recebendo como pagamento das horas extras apenas um biscoito e uma xícara de chá.

As condições de trabalho nas empresas que fornecem produtos à Apple- especialmente a Foxconn, são tão precárias e degradantes que provocou uma onda de suicídios no ano de 2010. Segundo informações do site “Estadão”, apenas no ano de 2010 foram registrados 14 suicídios nas instalações da Apple.

Outra medida, apontada por Amauri Mascaro Nascimento, que também ajuda a reduzir os custos e é utilizada de forma muito comum, é a terceirização de mão de obra.

Maurício Godinho Delgado define a terceirização como:

É o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente. Por tal fenômeno o trabalhador insere-se no processo produtivo da empresa tomadora sem que aquele possa ser considerado como empregado desta, portanto, não se estendendo a ambos as normas trabalhistas. Estas serão aplicáveis apenas entre o trabalhador e a empresa prestadora de serviço. (DELGADO, 2007, p. 430).

Segundo Alice Monteiro de Barros (2005, p. 424) “o fenômeno da terceirização consiste em transferir para outrem atividades consideradas secundárias, ou seja, de suporte, atendo-se a empresa à sua atividade principal”.

Como se pode ver, o fenômeno da revolução industrial aliado ao processo de globalização e ao desenvolvimento tecnológico iniciado no século passado provocaram intensas mudanças nas relações laborais, principalmente no que tange à qualidade de vida do trabalhador, pois o que se vivencia é a precarização das condições de trabalho através da exploração da mão de obra operária e dos constantes desrespeitos à legislação trabalhista, configurando-se o dumping social.


3. DUMPING SOCIAL NA ESFERA TRABALHISTA BRASILEIRA

3.1 Conceito

A expressão das práticas de Dumping surgiu, inicialmente, no Direito Comercial e é utilizada para definir a prática injustificada de comercialização de produtos e serviços abaixo do preço de custo com objetivo de eliminar a concorrência e conquistar o mercado.

Para o Direito Comercial, Dumping é uma prática comercial injusta considerada como infração econômica tipificada no art. 36, § 3º , XV da Lei nº 12.529/2011 que diz:

Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados:

[...]§ 3º As seguintes condutas, além de outras, na medida em que configurem hipótese prevista no caput deste artigo e seus incisos, caracterizam infração da ordem econômica:

[...]XV - vender mercadoria ou prestar serviços injustificadamente abaixo do preço de custo;

[...] (BRASIL, 2011).

A comercialização de produtos ou serviços pelo preço abaixo de custo é considerada como crime contra a ordem econômica por desrespeitar o princípio da livre concorrência, que tem como objetivo impedir a concentração capitalista.

No entanto, urge ressaltar que não são todas as vendas realizadas por um preço abaixo do mercado que podem ser consideradas como Dumping, pois se faz necessário que o empresário tenha a intenção de conquistar o mercado através da eliminação da concorrência.

Se determinada empresa, por exemplo, faz liquidações e vende os produtos com preços abaixo do custo com o intuito de esvaziar os estoques antigos e adquirir novas mercadorias, não podemos classificar essas ações promocionais temporárias como dumping.

Através dessa prática comercial ilícita, as empresas buscam meios de reduzir o custo de produção para que a comercialização seja realizada por um preço muito inferior ao praticado por outras empresas que cumprem as suas obrigações legais.

O meio mais comum para se conquistar essa redução de custos é explorar os trabalhadores, submetendo-os à condições precárias de trabalho, com o pagamento de baixos salários e descumprimento dos direitos fundamentais do trabalhador. Essa exploração de mão de obra decorrente do dumping comercial configura-se como grave violação aos direitos sociais e, em virtude disso, surgiu a expressão dumping social.

Sobre o tema, Amauri Mascaro Nascimento (2011) entende que:

A figura do dumping social caracteriza-se pela prática da concorrência desleal, podendo causar prejuízos de ordem patrimonial ou imaterial à coletividade como um todo. No campo laboral, o dumping social caracteriza-se pela ocorrência de transgressão deliberada, consciente e reiterada dos direitos sociais dos trabalhadores, provocando danos não só aos interesses individuais, como também aos interesses metaindividuais, isto é, aqueles pertencentes a toda a sociedade, pois tais práticas visam favorecer as empresas que delas lançam mão, em acintoso desrespeito à ordem jurídica trabalhista, afrontando os princípios da livre concorrência e da busca do pleno emprego, em detrimento das empresas cumpridoras da lei. (NASCIMENTO, 2011).

Sobre o assunto, os profissionais do Direito do Trabalho do Brasil aprovaram o enunciado n. 4 da 1ª Jornada de Direito Material e Processual da Justiça do Trabalho, organizada pela ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho),realizada nos dias 21 a 23 de novembro de 2007, no Tribunal Superior do Trabalho, em Brasília, com o seguinte teor:

DUMPING SOCIAL. DANO À SOCIEDADE. INDENIZAÇÃO SUPLEMENTAR. As agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas geram um dano à sociedade, pois como tal prática desconsidera-se, propositalmente, a estrutura do Estado Social e do próprio modelo capitalista com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência. A prática, portanto, reflete o conhecido “dumping social”, motivando a necessária reação do Judiciário trabalhista para corrigi-la. O dano à sociedade configura ato ilícito, por exercício abusivo do direito, já que extrapola limites econômicos e sociais, nos exatos termos dos arts. 186, 187 e 927do Código Civil. Encontra-se no art. 404, parágrafo único do Código Civil, o fundamento de ordem positiva para impingir ao agressor contumaz uma indenização suplementar, como, aliás, já previam os arts. 652,d, e 832, § 1º, da CLT.

Como acima exposto, o dumping social pode ser conceituado como as constantes agressões ao Direito do Trabalho pela inobservância dos direitos mínimos dos trabalhadores com o intuito de obter vantagem econômica indevida. Trata-se de um tema que surgiu nas relações comerciais ou de consumo e que tem estreita relação com as características do capitalismo de produção.

Vive-se em uma sociedade capitalista, caracterizada pela busca incessante de diminuição dos custos de produção. Para isso, inúmeras empresas privam os trabalhadores dos seus direitos básicos, previstos na CLT e na constituição Federal, causando uma precarização nas condições de trabalho. O que mais assusta os doutrinadores é saber que o próprio Estado que, a priori, seria o agente responsável para evitar essas práticas ilegais, contribui com o desrespeito à legislação trabalhista, conduta essa bastante criticada por Jorge Luiz Solto Maior em sua obra “Dumping Social nas Relações de trabalho”:

Em muitas situações, assiste-se a participação do próprio Estado nesta exploração, utilizando-se de táticas de redução de custo: Contratação de pessoas sem concurso público, utilização da “terceirização” para prestação de serviços e licitações pelo menor custo para construção de obras. Com resultado, o Estado reduz seu custo, as empresas ganhadoras das licitações adquirem seus ganhos e os trabalhadores executam os seus serviços, mas não recebem, integralmente, seus direitos. As pontes, as ruas, as estradas, os túneis, são construídos à custa do sacrifício dos Direitos Sociais (MAIOR, 2012, p.23).

Os Direitos Sociais, no entanto, não podem ser reduzidos por uma questão de custo, uma vez que os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, no entendimento de Maurício Godinho Delgado (2012), são considerados como “normas de indisponibilidade absoluta”.

Compartilhando do mesmo entendimento, Jorge Luiz afirma que:

Não é por razão diversa que a Constituição de 1998 inicia seus artigos estabelecendo os fundamentos da República e, dentre eles, faz constar “os valores sociais de trabalho” e da livre iniciativa. [...] Os valores do trabalho são sociais na ordem constitucional vigente porque não interessam apenas a quem trabalha, importando a toda a sociedade, que se pretende saudável e justa. (Maior, 2012, p. 21).

Os direitos fundamentais são essenciais para garantir a dignidade do trabalhador, portanto, os mesmos não podem ser excluídos. O que pode ser estipulado, como forma de incentivo para as empresas contratarem mão de obra, é a flexibilização de algumas normas trabalhista, que será tratada a seguir.

3.2 Flexibilização das normas trabalhistas

Com o avanço da tecnologia, a mecanização foi um instrumento utilizado para a substituição da mão de obra operária e no auxílio da produção. Ocorre que a mecanização do trabalho humano causou um aumento significativo no número de desemprego, causando prejuízos para toda a sociedade. A internacionalização da economia também contribuiu para o aumento do desemprego, tendo-se em vista que muitas empresas mudaram a sua produção para países que oferecessem mão de obra farta e mais barata.

Diante do aumento da concorrência acirrada e da facilidade de adquirir mão de obra com menor custo em países onde há pouca proteção trabalhista, tornou-se necessário que muitos países flexibilizassem as suas normas trabalhistas como forma de garantir a permanência das empresas em seu território e garantir a empregabilidade da população.

Segundo Sergio Pinto Martins, diversas são as causas motivadoras da flexibilização, a saber:

As causas da flexibilização compreendem vários fatores: (a) desenvolvimento econômico; (b) globalização; (c) crises econômicas; (d) mudanças tecnológicas; (e) encargos sociais; (f) aumento do desemprego; (g) aspectos culturais; (h) economia informal; (i) aspectos sociológicos. (MARTINS, 2009, p.35).

A globalização enseja uma forma de amoldar o Direito do Trabalho às exigências do sistema econômico capitalista, considerando que a empresa é a principal fonte de criação de emprego. Dessa forma, alguns doutrinadores como Amauri Mascaro e Eneida Melo entendem que se faz necessária a implantação de um mecanismo de adaptação do direito à realidade econômica, a esse mecanismo dá-se o nome de flexibilização das normas trabalhistas. Os defensores dessa flexibilização aduzem que as normas de proteção ao trabalhador são economicamente consideradas “pesadas”, sendo considerada um dos fatores que mais encarecem o custo final de produção e que a negociação entre as partes contratantes, sem a intervenção do Estado, tornaria a relação trabalhista menos burocrática e, dessa forma, facilitaria a abertura de novos postos de trabalho e o aumento da contratação de mão de obra.

Sobre o assunto, Amauri Mascaro Nascimento entende que:

“Flexibilização do Direito do Trabalho” é uma expressão que corresponde à corrente de pensamento segundo a qual as necessidades de natureza econômica justificariam o abandono dos tradicionais direitos dos trabalhadores estruturados no bojo do ordenamento jurídico positivo. (NASCIMENTO, 2012 p.120).

No entanto, urge ressaltar que não são todas as normas de Direito que podem ser flexibilizadas, pois, por pior que seja a situação econômica de uma determinada região, há garantias sociais que não podem ser desconsideradas pelo fato dessas garantias terem sido constituídas aos longos dos anos e ter como objetivo garantir a dignidade mínima do trabalhador.

Nesse mesmo entendimento, Eneida Melo Correia de Araújo dispõe que:

Existe um conjunto de princípios, envolvidos por uma forte carga histórica, intangível, portanto, decorrente de luta dos povos pela liberdade e pela igualdade. Esses postulados ensejaram a construção de um sistema jurídico trabalhista dotado de normas com razoável caráter universal. A proteção à vida, à saúde, à integridade física, moral e psicológica do trabalhador; o direito ao trabalho e a um salário em patamares dignos; a garantia aos descansos semanal e anual; a proteção à maternidade e ao trabalho dos menores; o incentivo à qualificação profissional, entre outros direitos, revelam-se bens fundamentais, que não devem ser afastados da ordem jurídica positiva (ARAÚJO, 2003, p.125).

Após as explanações acima, verifica-se que existem dois tipos de normas trabalhistas: Uma de indisponibilidade absoluta e outra de indisponibilidade relativa. As normas de indisponibilidade absoluta são aquelas de interesse público, que visam garantir um patamar mínimo de dignidade do trabalhador e em virtude da sua essencialidade, não podem ser objeto de acordo entre empregado e empregador. Dentre as normas de indisponibilidade absoluta, pode-se citar a assinatura da CTPS e a medicina e segurança do trabalho.

Já as normas de indisponibilidade relativa são aquelas que não possuem caráter de essencialidade e, por isso, podem ser flexibilizadas. A própria Constituição Federal Brasileira, mais precisamente no art. 7º, admite algumas medidas de flexibilização das normas trabalhistas como a redução dos salários por convenção ou acordo coletivo do trabalho (inciso VI), compensação ou redução da jornada de trabalho mediante acordo ou convenção coletiva (inciso XIII), aumento da jornada de trabalho nos turnos ininterruptos de revezamento para mais de 6 horas diárias, através da negociação coletiva (inciso XIV).

Impende salientar que a flexibilização não se confunde com a desregulamentação das normas jurídicas trabalhistas. Partindo dessa premissa, Sergio Pinto Martins assinala que:

Desregulamentar significa desprover de normas heterônomas as relações de trabalho. Na desregulamentação o Estado deixa de intervir na área trabalhista, não havendo limites na lei para questões trabalhistas, que ficam a cargo da negociação individual ou coletiva. Na desregulamentação a lei simplesmente deixa de existir. Na flexibilização, são alteradas as regras existentes, diminuindo a intervenção do Estado, porém garantindo um mínimo indispensável de proteção ao empregado, para que este possa sobreviver, sendo a proteção mínima necessária. A flexibilização é feita com a participação do sindicato. Em certos casos, porém, é permitida a negociação coletiva para modificar alguns direitos, como reduzir salários, reduzir e compensar jornada de trabalho, como ocorre nas crises econômicas (MARTINS, 2010, p.14).

Sabe-se que o trabalhador é a parte hipossuficiente da relação empregador X empregado, portanto merece atenção e proteção para que os seus direitos fundamentais não sejam excluídos. Por isso, uma eventual flexibilização das normas trabalhistas deve ser feita de forma muito criteriosa, com o auxílio e vigilância dos Sindicatos e do Poder Judiciário, de forma a evitar que essa medida seja utilizada pelo empregador de má-fé com o intuito de reduzir os direitos trabalhistas conquistados sem que haja nenhum benefício compensatório para o empregado.

Eneida Melo (2003) entende que diante da concorrência acirrada e dos desafios oriundos do processo de globalização, é necessário a aplicação do princípio da flexibilização das normas trabalhistas, desde que se garanta a eficácia dos direitos mínimos dos trabalhadores, os quais são intangíveis, não podendo sofrer nenhum tipo de supressão.

Ainda sobre o assunto, Eneida Melo afirma que:

Podemos, assim, afirmar que o aspecto da globalização, que enseja a flexibilização do direito, principalmente do Direito do Trabalho, não pode ser conciliado com a quebra dos direitos sociais, com o afastamento dos princípios construtores desse ramo e o desprezo ao conjunto de prescrições jurídicas de natureza protetora contidas no sistema. (ARAÚJO, 2003, p.129).

Os defensores desse método entendem que com a flexibilização das normas trabalhistas através dos acordos ou convenções coletivas é possível adaptar as normas trabalhistas à realidade econômica, facilitando a contratação de mão de obra. Esse método é importante principalmente durante as crises econômicas, onde os ajustes das condições trabalhistas são capazes de conter os problemas financeiros, evitando maiores prejuízos à economia interna como o fechamento de empresas e o aumento do desemprego.

No entanto, essa flexibilização só deve ser exercida de modo excepcional, diante de situações que justifiquem a diminuição dos direitos trabalhistas, como nos casos de crises econômicas, por exemplo, pois não faz sentido quando a empresa empregadora estiver bem estruturada, economicamente falando, se utilize desse benefício para diminuir os direitos trabalhistas apenas como forma de diminuir os seus custos e aumentar os seus lucros, pois, nesse caso, identifica-se a prática de dumping social.

Mas será que a flexibilização dos direitos trabalhistas realmente é capaz de conter a crise econômica e manter os trabalhadores em seus postos de trabalho? É justo que o proletariado “pague a conta” da crise financeira mundial? Sabe-se que no Brasil a carga tributária e para-fiscal é altíssima, o que muitas vezes contribui para o fechamento das empresas, principalmente as de pequeno porte. A legislação trabalhista tem como intuito garantir a proteção mínima do trabalhador, flexibilizar esse direito seria reduzir o que já é mínimo, chocando-se com o princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas.

A atitude mais correta para conter a crise econômica seria a redução dos impostos, que possuem uma carga tributária muito alta, e não reduzir os direitos, que já são mínimos, dos trabalhadores. O incentivo fiscal seria, de fato, o método mais correto para estabilizar a crise e menos prejudicial ao trabalhador.

3.3 Como identificar a prática do Dumping Social

Não é toda e qualquer agressão aos direitos trabalhistas que deve ser considerada dumping social.

Na prática, não é muito difícil identificar as empresas praticantes do dumping social, uma vez que no dia-a-dia das varas trabalhistas é muito comum que o nome de determinadas empresas sempre esteja estampado nas pautas diárias de audiências devido à grande quantidade de reclamações trabalhistas que as mesmas possuem.

Ao notar a grande quantidade de demandas judiciais contra a mesma empresa e sempre em razão do desrespeito reiterado à determinados direitos do trabalhador como a ausência de registro na Carteira de trabalho e previdência social, falta de pagamento de salários, horas extras, férias e gratificações natalinas, alguns doutrinadores entendem que configura-se a prática do dumping social, uma vez que, nesses casos, as reclamações trabalhistas não são eventuais e sim, rotineiras, conforme demonstra Jorge Luiz Solto Maior:

A Justiça do trabalho é pródiga em manter “clientes especiais”, que estão praticamente todos os dias nas salas de audiências, representadas por “prepostos oficiais”, contratados para a exclusiva tarefa de “montar” e acompanhar processos trabalhistas. São empresas que optam pelo não pagamento de horas extras, pelo pagamento de salário “por fora”, pela contratação de trabalhadores sem reconhecimento de vínculo de emprego ou mesmo por tolerar e incentivar condutas de flagrante assédio moral no ambiente de trabalho. (Maior, 2012, p. 9).

Com o notório intuito de obter vantagem econômica, as empresas praticantes do dumping social burlam a legislação trabalhista e eliminam os direitos fundamentais dos empregados. Não resta dúvida que o pagamento da mão-de-obra é um dos fatores que mais encarecem o custo final de produção e é justamente por isso que os empregadores aproveitam-se da hipossuficiência dos empregados para ditar as suas próprias normas.

A supressão desses direitos faz com que o custo de produção seja diminuído de uma forma bastante considerável, facilitando a introdução do produto no mercado de consumo com um preço mais atrativo se comparado com o preço das empresas que zelam a legislação trabalhista. Com o preço baixo fica mais fácil eliminar a concorrência e, consequentemente liderar o mercado. Acerca dessa concorrência desleal, Jorge Luiz Souto Maior dispõe que:

Constituem uma minoria dentre os empregadores e, por isso mesmo, perpetram uma concorrência desleal que não prejudica apenas os trabalhadores que contratam, mas também as empresas com as quais concorrem no mercado. Além disso, passam a funcionar como indesejável paradigma de impunidade, influenciando negativamente todos aqueles que respeitam ou pretendem respeitar a legislação trabalhista (Maior, 2012, p. 9).

Diariamente, inúmeros trabalhadores são lesados por empresas que praticam, de forma reiterada, condutas ilegais com o objetivo de auferir lucros cada vez maiores. Essas empresas utilizam-se dessas práticas abusivas aproveitando-se da lentidão processual e pela possibilidade de interposição de inúmeros recursos para se eximir de suas responsabilidades. Em virtude da morosidade processual e da impunidade do sistema jurídico brasileiro, diversos empregadores entendem como vantajoso suprimir os direitos trabalhistas já que essa é uma forma de obter lucro e uma eventual demanda processual levaria muito tempo para ser concluída.

Também se configura como Dumping Social, o fato das empresas transferirem a sua produção para localidades onde a proteção jurídica do trabalhador seja escassa. Visando a diminuição dos custos e o aumento dos lucros, inúmeras empresas transferem a sua produção para países onde há pouca proteção às relações trabalhistas.

Essa atitude ilícita é bastante eficaz na redução de despesas através da exploração da mão de obra operária, através de longas jornadas de trabalho ininterruptas, pagando baixos salários, sem efetuar o pagamento de horas extras, folgas remuneradas, férias, dentre outros direitos fundamentais do trabalhador.

O processo de globalização gerou grandes mudanças na esfera econômica e social, ocorre que nem todos os países evoluíram do mesmo modo e ao mesmo tempo, pois alguns países foram capazes de se desenvolver mais que outros. Diante disso, os países foram classificados em desenvolvidos e subdesenvolvidos, cada um com suas características econômicas, suas leis e modos de produção.

Nos países desenvolvidos, as pessoas geralmente possuem uma melhor capacidade financeira e mais estudos, portanto, a mão de obra por ser mais qualificada, torna-se, também, mais cara. Já nos países subdesenvolvidos a mão de obra, em sua grande maioria, é desqualificada, o que contribui para o seu baixo custo.

Com a internacionalização da economia, inúmeras empresas passaram a transferir as suas produções para os países subdesenvolvidos pelo fato dos mesmos ofertarem condições mais atrativas para que as empresas lá se instalem.

Diante da concorrência acirrada, grandes empresas, conhecidas mundialmente, transferiram suas produções para países de extrema pobreza, onde há, inclusive, exploração da mão de obra infantil. A respeito disso, Jorge Luiz Souto Maior, exemplifica:

A Nike vende tênis produzidos em países asiáticos, explorando mão de obra aviltada. Um levantamento feito junto a 4 mil trabalhadores de uma fábrica que serve a empresa na Indonésia, revelou que 56% queixaram-se de receber insultos verbais, 15,7% das mulheres reclamam de bolinas e 13,7% contam que sofrem coerção física em serviço. Outro levantamento feito no Vietnã mostrou que os trabalhadores ganham U$ 1,60 por dia e teriam que gastar U$ 2,10 para fazer três refeições diárias. Só podem usar o banheiro uma vez por dia e tomar água apenas duas vezes. Contam ainda que o descumprimento de normas, como o uso de uniforme, é púnico com corridas compulsórias. Em outros casos o trabalhador é obrigado a ficar de castigo ajoelhado.

[...] A mesma Nike, no ano de 2011 pagou ao atleta Michael Jordan a importância de U$ 30.000.000,00 ( trinta milhões de dólares) para participação em uma campanha publicitária, valor idêntico ao que gastou durante o ano todo com os seus 30.000 empregados no Vietnã, numa demonstração inequívoca da utilização do trabalho escrevo escravo. Tudo isso com as bênçãos do mercado (MAIOR, 2012, p. 31).

Muitas empresas alegam a dificuldade financeira para justificar o descumprimento da legislação trabalhista. No entanto, Como se pôde ver, não são apenas as pequenas empresas que se utilizam desses artifícios para burlar a lei e aumentar os seus lucros. A empresa acima citada, por exemplo, faturou US$ 549 milhões no trimestre de março a maio de 2012, batendo recorde de receita, segundo informações disponíveis no site UOL. Diante dessas informações, não há como justificar a necessidade que empresas de grande porte, que a cada ano batem recorde de faturamento, continuem desrespeitando, de forma deliberada, os direitos trabalhistas.

No dia 02.08.2012, vários sites, entre eles o site Globo, noticiaram que a empresa Magazine Luiza foi condenada pela Justiça do Trabalho da cidade de Franca- SP ao pagamento de indenização no valor de R$ 1,5 milhão por dano moral coletivo causado pela prática do dumping social.

A indenização deu-se porque a empresa já tinha recebido 87 autuações por desrespeitar os direitos trabalhistas, principalmente por submeter os funcionários ao cumprimento de carga horária excessiva. O Ministério Público do Trabalho já havia firmado dois TACs (Termo de Ajustamento de Conduta) em 1999 e 2003, onde a empresa ficou obrigada a registrar o ponto dos funcionários e não exigir o cumprimento de horas extras além do limite permitido em lei.

Ocorre que, mesmo após as 87 atuações, a empresa varejista insistiu em permanecer descumprindo a legislação trabalhista e, ainda assim, há 14 anos consecutivos é eleita como uma das melhores empresas do país para se trabalhar, segundo a avaliação do Instituto Great Place to work.

Como se pôde ver, apesar de não haver punição jurídica específica para esse fim, o Poder Judiciário tem se preocupado com essa exploração de mão de obra e, em muitas decisões já é possível verificar a condenação de empresas pela prática do dumping social.


4. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL E DOUTRINÁRIO ACERCA DA RESPONSABILIDADE POR DANO SOCIAL

Os doutrinadores e juízes vêm demonstrando uma preocupação crescente com a proteção dos direitos sociais e a adoção de medidas que visem coibir a prática de dumping social, apesar de não haver nenhuma previsão legal específica para esse fim.

A consolidação das leis do trabalho (CLT) foi criada no ano de 1.943, ocorre que, ao longo desses anos, o processo de globalização, a implantação de tecnologia e de novos modelos de produção foram capazes de provocar intensas mudanças nas relações laborais, motivos pelos quais muitas vezes não se encontra proteção legal para determinados conflitos trabalhistas, considerando que as condições de trabalho do ano de 1.943 em muito se transformou até chegar às condições atuais.

Mesmo diante de tantas modificações nas relações laborais, a lei trabalhista não foi alterada de modo a acompanhar e se adequar às alterações ocorridas nessa seara. Nesse caso, cabe aos operadores do direito fazer uma interpretação sistemática a outros dispositivos legais presentes no nosso ordenamento jurídico visando pacificar o litígio existente.

Um grande avanço nesse quesito foi a aprovação do enunciado n. 4 da Jornada de Direito Material e Processual da Justiça do Trabalho, organizada pela ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), que prevê a possibilidade de concessão de indenização suplementar pelo dano social advindo do dumping.

Diante dessa nova realidade laboral, muitos doutrinadores e juristas, em especial o juiz Jorge Luiz Solto Maior, vêm atentando para a necessidade do efetivo reconhecimento e proteção do direito social nas relações trabalhistas. Mas, ainda assim, existem juízes que enfrentam o dumping como “modismo” e, mesmo diante do dano social inegável decorrente dessa prática ilícita, preferem ignorar a situação em vez de buscar uma solução que vise desestimular as empresas a permanecer desvirtuando a legislação trabalhista.

O Desembargador Manuel Cândido Rodrigues do TRT 3ª Região, por exemplo, é um dos juristas que insistem em negar proteção legal para a prática do dumping social, conforme teor decisão do Recurso Ordinário 2756/2008-063-03-00.5, abaixo transcrito:

DUMPING SOCIAL. INDENIZAÇÃO. Entende-se inaplicável a indenização por dumping social, por ausência de amparo legal. Aliás, reza o disposto no artigo 5º, inciso II, da Constituição do Brasil, que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de Lei." (BRASIL, TRT 3ª Região, 2009)

Diante do exposto, nota-se que a jurisprudência ainda não é uníssona quanto à possibilidade de reconhecimento do dumping e o dano social dele proveniente. Nas sentenças de 1º grau, pode-se visualizar alguns avanços nesse sentido, com a condenação e imposição de pagamento de indenização para as empresas que praticam o dumping social, ocorre que, na maioria das vezes essas decisões são reformadas pelos tribunais superiores que insistem em “fechar os olhos” para a dimensão dos danos causados aos trabalhadores.

Toda essa discordância jurisprudencial contribui para que as empresas continuem lesando o direito trabalhista, pois já que a sua irresponsabilidade social permanece impune perante os tribunais, será um bom negócio não observar os direitos laborais. Dessa forma, faz-se necessária uma atuação mais incisiva do Poder Judiciário no sentido de reconhecer o dano inegável causado à sociedade, bem como a aplicação de penalidades para coibir essa prática ilícita.

4.1 O Estado-juiz diante do reconhecimento do dano social

O Liberalismo teve seu início no século XVII em virtude da influência das idéias dos filósofos John Locke e Adam Smith, que ficou conhecido como pai do liberalismo econômico. Smith, em seu livro intitulado “Riqueza das nações” (1776) chega a afirmar que não há necessidade de intervenção do Estado na economia, uma vez que esta era guiada por uma “mão invisível”, ou seja, pelas próprias leis naturais de mercado. Essas leis naturais correspondiam à livre concorrência, onde a competição de preço entre os produtores seriam capazes de eliminar os ineficientes. Entendia, ainda, que o próprio mercado era capaz de regulamentar a economia, trazendo a harmonia social, sem a intervenção do Estado.

No entanto, toda essa liberdade dada pelo Estado não foi bem aproveitada e os produtores exploraram a mão de obra trabalhista como instrumento capaz de aumentar a sua produção e majorar os lucros, o que contribuiu para se alastrar uma profunda crise de desigualdade social. Em virtude desse cenário de exploração, tornou-se necessária a intervenção do Estado nas relações entre particulares com o intuito de proteger os mais fracos, estipulando uma série de direitos e garantias fundamentais.

A respeito dos direitos sociais, Alexandre de Moraes leciona que:

Sociais são os direitos fundamentais do homem, caracterizando-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria de condições de vida dos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social, e são consagrados como fundamentos do Estado Democrático, pelo art. 1º, IV, da Constituição Federal (MORAIS, 2012, p. 202).

Os direitos sociais surgiram após os horrores causados pela 2ª Guerra Mundial como tentativa de resolver o grande problema da desigualdade social provocada pela guerra.

Em nosso ordenamento jurídico, a primeira constituição Federal que tratou do tema foi a de 1934. No entanto, foi na constituição de 1988 onde se privilegiou os direitos sociais do trabalhador, os quais estão previstos no art. 6º ao 11º.

O art. 6º da Constituição Federal/88 dispõe que:

Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (grifo nosso). (BRASIL, 1988).

Como se pode ver, a Constituição Federal de 1988 incluiu o trabalho como um dos direitos sociais, estando incluso no rol dos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana.

Acerca da positivação dos direitos sociais, Jorge Luiz Solto Maior entende que:

O reconhecimento de que os denominados direitos sociais constituem fundamento do Estado decorre, pois, da imposição das condições geradas pelo próprio sistema capitalista de produção. Tais direitos são fixados como fruto de um compromisso do Estado e da Sociedade, que “divide” os âmbitos de atuação, em prol da criação de uma comunidade mais inclusiva, com condições mínimas de vida digna para todos. Forma-se uma espécie de compromisso em torno da eficácia dos direitos sociais, denominados de direitos fundamentais de segunda divisão. [...] (MAIOR, 2012 p.15-16).

O juiz do Tribunal Regional da 15ª Região, Jorge Luiz Souto Maior já reconheceu, em decisões judiciais, o dano social causado pelo dumping, conforme decisão prolatada nos autos de número 0049300-51-2009-5-15-0137, abaixo transcrita.

DANO SOCIAL (“DUMPING SOCIAL”). IDENTIFICAÇÃO: DESRESPEITO DELIBERADO E REITERADO DA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. REPARAÇÃO: INDENIZAÇÃO “EX OFFICIO” EM RECLAMAÇÕES INDIVIDUAIS. Importa compreender que os direitos sociais são o fruto do compromisso firmado pela humanidade para que se pudesse produzir, concretamente, justiça social dentro de uma sociedade capitalista. Esse compromisso, fixado em torno da eficácia dos Direitos Sociais, se institucionalizou em diversos documentos internacionais nos períodos pós-guerra, representando, também, um pacto para a preservação da paz mundial. Esse capitalismo socialmente responsável perfaz-se tanto na perspectiva da produção de bens e oferecimento de serviços quanto na ótica do consumo, como faces da mesma moeda. Deve pautar-se, também, por um sentido ético, na medida em que o desrespeito às normas de caráter social traz para o agressor uma vantagem econômica frente aos seus concorrentes, mas que, ao final, conduz todos ao grande risco da instabilidade social. As agressões ao Direito do Trabalho acabam atingindo uma grande quantidade de pessoas, sendo que destas agressões o empregador muitas vezes se vale para obter vantagem na concorrência econômica com relação a vários outros empregadores. Isto implica dano a outros empregadores não identificados que, inadvertidamente, cumprem a legislação trabalhista, ou que, de certo modo, se vêem forçados a agir da mesma forma. Resultado: precarização completa das relações sociais, que se baseiam na lógica do capitalismo de produção. O desrespeito deliberado, inescusável e reiterado da ordem jurídica trabalhista, portanto, representa inegável dano à sociedade. Óbvio que esta prática traduz-se como “dumping social”, que prejudica a toda a sociedade e óbvio, igualmente, que o aparato Judiciário não será nunca suficiente para dar vazão às inúmeras demandas em que se busca, meramente, a recomposição da ordem jurídica na perspectiva individual, o que representa um desestímulo para o acesso à justiça e um incentivo ao descumprimento da ordem jurídica. Assim, nas reclamações trabalhistas em que tais condutas forem constatadas (agressões reincidentes ou ação deliberada, consciente e economicamente inescusável de não respeitar a ordem jurídica trabalhista), tais como: salários em atraso; salários “por fora”; trabalho em horas extras de forma habitual, sem anotação de cartão de ponto de forma fidedigna e o pagamento correspondente; não recolhimento de FGTS; não pagamento das verbas rescisórias; ausência de anotação da CTPS (muitas vezes com utilização fraudulenta de terceirização, cooperativas de trabalho, estagiários, temporários, pejotização etc.); não concessão de férias; não concessão de intervalo para refeição e descanso; trabalho em condições insalubres ou perigosas, sem eliminação concreta dos riscos à saúde etc., deve-se proferir condenação que vise a reparação específica pertinente ao dano social perpetrado, fixada “ex officio” pelo juiz da causa, pois a perspectiva não é a da mera proteção do patrimônio individual, sendo inegável, na sistemática processual ligada à eficácia dos Direitos Sociais, a extensão dos poderes do juiz, mesmo nas lides individuais, para punir o dano social identificado. (BRASIL, TRT 18ª Região, 2012).

É justamente pelo fato dos direitos sociais serem considerados como fundamentais para assegurar a todos uma existência digna, que os mesmos são indisponíveis. Portanto, qualquer conduta que venha a ofender os direitos ali elencados, como a prática do dumping social, por exemplo, pode ser considerada como ato ilícito, conforme entendimento do art. 186 do código civil:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. (BRASIL, 2002).

O dumping social também é considerado como ato ilícito pelo exercício abusivo de direito, por extrapolar os limites sociais e econômicos.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. (BRASIL, 2002).

O dumping social configura-se pelo desrespeito reiterado aos direitos fundamentais do trabalhador, causando um prejuízo não apenas ao empregado, mas sim a toda coletividade, conforme será demonstrado a seguir.

4.2 O dano social decorrente da prática do dumping

Conforme acima explanado, o dumping social é uma forma de agressão aos direitos sociais que foram incorporados à constituição como forma de proteção essencial dos direitos básicos de toda a coletividade.

Diante da essencialidade desses direitos para garantir existência digna, as atitudes que se demonstrarem contrárias ao que está disposto na lei podem ser consideradas como atos ilícitos capazes de causar danos à toda a sociedade, e não apenas aos empregados diretamente envolvidos. Nesse sentido, Jorge Luiz entende que:

O desrespeito deliberado e inescusável da ordem jurídica trabalhista, portanto, representa inegável dano à sociedade, inclusive no que tange aos custos públicos para a manutenção do Judiciário Trabalhista que se vê obrigado a decidir dezenas e até centenas de vezes sobre as mesmas violações sobre as mesmas empresas (MAIOR, 2012, p.23).

Como exemplo de dano social, podemos citar a ausência de depósitos de FGTS. O FGTS é utilizado para o custeio da construção da habitação popular, melhorar o saneamento básico e a infraestrutura urbana. Portanto, a ausência de depósitos prejudica não apenas o trabalhador que teve descontos em seu salário e cujo valor não foi destinado ao fundo de garantia. Nesse caso, o dano é mais extenso, pois a ausência dos depósitos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço influi negativamente na construção de habitação popular e no saneamento básico, prejudicando toda a sociedade. Acerca desse prejuízo, Jorge Luiz alega que:

É fácil, ademais, perceber o prejuízo gerado à sociedade em geral pelas condutas reiteradas de desrespeito à ordem jurídica trabalhista. Lembre-se, a propósito, que é a partir do custo social do FGTS que várias iniciativas de políticas públicas são adotadas, incluindo a própria concessão do benefício do seguro-desemprego. Além disso, os recolhimentos previdenciários servem igualmente ao custeio da Seguridade Social, que inclui a prestação de serviços de saúde pública. Ora, se vários empregadores, por estratégias fraudulentas, deixam de cumprir com as obrigações trabalhistas das quais esses custos decorrem, é mais evidente que vai faltar dinheiro para a realização desses projetos do Estado Social e todos, não apenas o trabalhador diretamente atingido, serão prejudicados (MAIOR, 2012, p. 55).

Ainda sobre o dano social, Jorge Luiz dispõe que:

As agressões ao Direito do Trabalho acabam atingindo uma grande quantidade de pessoas. Dessas agressões, o empregador muitas vezes se vale para obter vantagem na concorrência econômica com relação a vários outros empregadores. Isto implica, portanto, dano a outros empregadores não identificados que, inadvertidamente, cumprem a legislação trabalhista, ou que, de certo modo, se vêem forçados a agir da mesma forma. O resultado é a precarização completa das relações sociais, que se baseiam na lógica do capitalismo de produção (MAIOR, 2012, p. 55).

Como se pode ver, o dumping social causa dano social em virtude do descumprimento dos direitos fundamentais do trabalhador previstos na Constituição Federal, prejudicando, de forma reflexa, toda a coletividade.

Compartilhando desse entendimento, o Juiz Ranúlio Mendes Moreira em sentença prolatada nos autos nº 00495.2009.191.18.00-5 da Vara do Trabalho de Mineiros- GO condenou a empresa Marfrig alimentos S/A pela prática de dumping, utilizando fartos argumentos para comprovar a configuração do dano social decorrente da prática do dumping social. Vejamos a decisão abaixo:

DA RESPONSABILIDADE SOCIAL – “DUMPING SOCIAL”. Este magistrado ficou impressionado com o número de ações em face da mesma reclamada ao longo de um ano na Vara do Trabalho de Mineiros. O MM. Juiz Ari Pedro Lorenzetti, por exemplo, prolatou 200 sentenças em um só dia em face da ré, além de muitas outras em outros dias. A MM. Juíza Camila Baião Vigilato, de igual forma, já se pronunciou centenas de vezes acerca da inobservância da reclamada quanto ao que determina o art. 253 da CLT. De igual forma, também já se pronunciaram inúmeras vezes os MM.Juizes Cleber Sales, Ana Edith Pereira e Fernanda Ferreira, entre outros. Mesmo assim, diante de centenas de pronunciamentos no sentido de condenar a reclamada ao pagamento das horas extras pela supressão do intervalo de descanso térmico, a reclamada permanece desrespeitando a legislação, como se não existisse Lei, fiscalização do trabalho, Ministério Público do Trabalho e Justiça do Trabalho, abarrotando a pauta da Vara do Trabalho de Mineiros e obrigando o Estado a desembolsar muito dinheiro e tempo para lotar um juiz extra para a Vara do Trabalho de Mineiros, agravando a situação de milhares de jurisdicionados, que se vêem prejudicados em virtude de o Estado ter que colocar à disposição da reclamada toda uma infraestrutura para dizer, redizer, confirmar e reiterar que a ré deve pagar pelo intervalo intrajornada não concedido. É como se a reclamada tivesse um juiz e meia Secretaria só para ela. [...]O Judiciário não pode ficar inerte diante de tal situação, pois o simples desrespeito a preceito legal de ordem pública, gera descontentamento e prejuízo social, uma vez que o Estado passa a despender longo tempo, esforço e numerário para decidir centenas de ações idênticas, pela violação dos mesmos preceitos legais, por uma mesma empresa, e, às vezes, em face do mesmo trabalhador, fazendo cair em descrédito várias instituições do Estado, inclusive o Estado-Juiz.[...] No entanto, o prejuízo social da atitude desrespeitosa à lei perpetrada pela reclamada, não atinge apenas ao bolso dos trabalhadores afetados, mas toda a sociedade, pois o intervalo de descanso térmico é norma cogente de medicina, higiene e segurança do trabalho e o seu descumprimento causa danos à saúde do trabalhador e, por conseqüência, afeta a toda a comunidade, pois a Previdência Social que assiste aos trabalhadores enfermos e acidentados é custeada por todos e não apenas pela empresa reclamada.[...] Assim, não só os trabalhadores e o Poder Judiciário são prejudicados pela atitude da ré, e, por isso somente uma punição de caráter social e pedagógico poderá servir de lenitivo à coletividade afetada e funcionar como aviso à reclamada de que a legislação trabalhista e a dignidade da pessoa humana não podem ser menosprezadas.[...]Havendo pois, ofensa ao patrimônio jurídico da comunidade,condeno a reclamada ao pagamento de reparação por danos sociais, no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), reversíveis a entidades filantrópicas [...]. (BRASIL, TRT 18ª Região, 2010).

Diante do exposto, torna-se evidente a necessidade de intervenção do Estado no sentido de impedir que as empresas continuem insistindo em desrespeitar a legislação trabalhista, pois essa é a única forma de evitar que a sociedade seja prejudicada pela ilicitude da prática do dumping.

4.3 Posicionamento da justiça do trabalho no reconhecimento do dano social

Apesar da divergência doutrinária e jurisprudencial, muitos juízes trabalhistas têm se posicionado a favor do reconhecimento do dano social causado pelo dumping e aplicado condenações para as empresas que insistem em desrespeitar, de forma reiterada, os direitos trabalhistas, embora boa parte das decisões seja reformada pelos Tribunais Regionais.

O fato que contribui para essas divergências é a ausência de previsão legal específica para esse fim, pois tanto na Constituição Federal, quanto na Consolidação das Leis Trabalhistas (CTL), não existe dispositivo legal que preveja, de forma direta, a condenação por dumping social.

Mesmo diante dessa ausência, alguns juízes entendem que é necessária a atuação firme e motivada do Poder judiciário para coibir as condutas danosas aos trabalhadores e contrárias a legislação brasileira. O juiz Jorge Luiz de Souto Maior (2012), que é um dos principais defensores da aplicação de multas para as empresas praticantes do dumping, entende que, mesmo diante da ausência de previsão de condenação por dumping na Consolidação das Leis do Trabalho, há a possibilidade de se realizar uma análise sistemática de outros mecanismos disponíveis no sistema jurídico brasileiro, como na Constituição Federal e no Código civil, como forma de justificar a condenação imposta.

Procedendo a análise sistemática sugerida pelo autor e por outros juízes que entendem pelo cabimento da condenação por dumping social, encontra-se em nosso ordenamento jurídico os seguintes argumentos defendidos por eles, que passarão a ser analisados a seguir:

4.3.1. Concorrência desleal

A livre concorrência é um dos princípios da atividade econômica, com previsão legal no art. 170 da Constituição Federal, conforme se vê a seguir:

Art. 170 - A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

[...] IV – livre concorrência (grifo nosso). [...] (BRASIL, 1988).

Celso Ribeiro Bastos conceitua o princípio da livre concorrência como:

A livre concorrência é indispensável para o funcionamento do sistema capitalista. Ela consiste essencialmente na existência de diversos produtores ou prestadores de serviços. É pela livre concorrência que se melhoram as condições de competitividade das empresas, forçando-as a um constante aprimoramento dos seus métodos tecnológicos, dos seus custos, enfim, da procura constante de criação de condições mais favoráveis ao consumidor. Traduz-se portanto, numa das vigas mestras do êxito da economia de mercado. O contrário da livre concorrência significa o monopólio e o oligopólio, ambos situações privilegiadora do produtor, incompatíveis com o regime de livre concorrência". (BASTOS, 2002, p. 25)

A livre concorrência é um mecanismo decorrente do princípio da livre iniciativa, podendo ser considerada como uma das bases do liberalismo econômico e tem como objetivo permitir que todos tenham oportunidade de participar da organização econômica e concorrer em forma de igualdade e licitude.

Acerca da relação entre a livre concorrência e a livre iniciativa, José Afonso da Silva leciona que:

Os dois dispositivos se complementam no mesmo objetivo. Visam tutelar o sistema de mercado e, especialmente, proteger a livre concorrência, contra a tendência açambarcadora da concentração capitalista. A Constituição reconhece a existência do poder econômico. Este não é, pois, condenado pelo regime constitucional. Não raro esse poder econômico é exercido de maneira anti-social. Cabe, então, ao Estado intervir para coibir o abuso" (grifo nosso).(SILVA,2012.p.876).

Corroborando com tal assertiva, Fábio Ulhoa Coelho assim se posiciona:

No sistema capitalista, a liberdade de iniciativa e a de competição se relacionam com aspectos fundamentais da estrutura econômica. O direito, no contexto, deve coibir as infrações contra a ordem econômica, com vistas a garantir o funcionamento do livre mercado. Claro que, ao zelar pelas estruturas fundamentais do sistema econômico de liberdade de mercado, o direito de concorrência acaba refletindo não apenas sobre os interesses dos empresários vitimados pelas práticas lesivas à constituição econômica, como também sobre os consumidores, trabalhadores e, através da geração de riqueza e aumento dos tributos, os interesses da própria sociedade em geral. (COELHO, 2012, p.5).

Complementando as informações acima expostas, o artigo 173 da Constituição Federal/88 dispõe que:

Art.173- Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

[...]§ 4º - A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros (grifo nosso).

§ 5º - A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular. (BRASIL, 1988).

Ao analisar os efeitos do dumping no âmbito econômico, pode-se afirmar que as empresas praticantes do dumping, ao desprezarem os direitos mínimos do trabalhador, reduzem, de forma considerável, o custo efetivo da mão de obra, o que contribui para que o produto ou serviço seja lançado no mercado por um preço muito menor que o das empresas que cumprem a legislação trabalhista. Dessa forma, a empresa está praticando concorrência desleal, uma vez que a mesma não está concorrendo em igualdade de condições com as demais empresas que zelam pelos direitos do trabalhador.

Ao praticar concorrência desleal como forma de eliminar a concorrência, as empresas estão praticando infração contra a ordem econômica, conforme previsão legal do art. 36, I, da Lei nº 12.529/2011 que dispõe:

Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados:

I - limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa [...].(BRASIL, 2011).

Acerca da aplicação da penalidade para a infração de concorrência desleal, o art. 37 dessa mesma lei estipula que:

Art. 37. A prática de infração da ordem econômica sujeita os responsáveis às seguintes penas:

I - no caso de empresa, multa de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do valor do faturamento bruto da empresa, grupo ou conglomerado obtido, no último exercício anterior à instauração do processo administrativo, no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação;

[...] 1º - Em caso de reincidência, as multas cominadas serão aplicadas em dobro. (BRASIL, 2011).

Compartilhando desse entendimento, a Desembargadora do TRT 18ª região, Elza Cândida da Silva proferiu, nos autos de nº 00539-2009-191-18-00-7, a seguinte decisão:

DUMPING SOCIAL. INDENIZAÇÃO. DANO SOCIAL. A contumácia da Reclamada em descumprir a ordem jurídica trabalhista atinge uma grande quantidade de pessoas, disso se valendo o empregador para obter vantagem na concorrência econômica com outros empregadores, o que implica dano àqueles que cumprem a legislação. Esta prática, denominada 'dumping social', prejudica toda a sociedade e configura ato ilícito, por tratar-se de exercício abusivo do direito, já que extrapola os limites econômicos e sociais, nos termos dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil. A punição do agressor contumaz com uma indenização suplementar, revertida a um fundo público, encontra guarida no art. 404, § único, do Código Civil e tem caráter pedagógico, com o intuito de evitar-se a reincidência na prática lesiva e surgimento de novos casos.(BRASIL, TRT 18ª Região, 2009)

É com base na disposição dos artigos acima citados que os magistrados fundamentam suas decisões ao aplicar multas para as empresas que, através do dumping, praticam concorrência desleal, por entenderem que essa prática ilícita é também uma infração contra a ordem econômica por desrespeitar os limites econômicos previstos em lei. A importância da aplicação da indenização dá-se pelo fato da ordem econômica ter a finalidade de garantir a dignidade de existência, bem como reduzir as desigualdades sociais.

4.3.2. Descumprimento da função social do contrato

Um dos principais princípios contratuais dispostos do Código Civil Brasileiro é o da liberdade contratual ou autonomia da vontade, que corresponde à liberdade que as partes têm de disciplinar e estipular, entre si, os seus interesses, mediante declaração de vontade formalizada em instrumento de contrato.

Para Maria Helena Diniz:

O principio da autonomia da vontade se funda na liberdade contratual dos contratantes, consistindo no poder de estipular livremente, como melhor convier, mediante acordo de vontades, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica. Além da liberdade de criação do contrato, abrange a liberdade de contratar e não contratar, liberdade de escolher outro contratante, liberdade de fixar o conteúdo do contrato, escolhendo quaisquer modalidades contratuais reguladas por lei, devendo observar que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. (DINIZ, 2008, p. 23 e 24).

Pelo princípio da liberdade contratual, as partes têm a liberdade de contratar, escolher a pessoa com quem quer fazer o contrato, qual o negócio a ser contratado, bem com fixar o conteúdo do contrato através das cláusulas pactuadas.

No entanto, impende salientar que essa liberdade contratual não é absoluta, uma vez que os contratos estão condicionados ao atendimento da função social. Essa limitação justifica-se porque o contrato não é um instrumento que interessa apenas as partes contratantes, mas sim, à toda sociedade, conforme prevê o art. 421 do Código Civil Brasileiro:

Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. (BRASIL, 2002).

A função social do contrato trás a idéia de que o contrato não deve ser bom apenas para as partes contratantes ou apenas para uma das partes, o contrato deve ser bom para ambas as partes e também para toda a coletividade. A função social do contrato apresenta uma vertente interna e outra externa. Na vertente interna, ela impõe uma observância de direitos e garantias fundamentais da pessoa humana. Na vertente externa, não basta que o contrato seja bom para ambas partes contratantes, ele tem que ser bom para a sociedade.

A respeito da função social do contrato, Miguel Reale entende que:

O que o imperativo da função social do contrato estatui é que não há razão alguma para se sustentar que o contrato deva atender tão somente aos interesses das partes que o estipulam, porque ele, por sua própria finalidade, exerce uma função social inerente ao poder negocial que é uma das fontes do direito, ao lado da legal, da jurisprudencial e da consuetudinária. O ato de contratar corresponde ao valor da livre iniciativa, erigida pela Constituição de 1988 a um dos fundamentos do Estado Democrático do Direito, logo no Inciso IV do Art. 1º, de caráter manifestamente preambular. Assim sendo, é natural que se atribua ao contrato uma função social, a fim de que ele seja concluído em benefício dos contratantes sem conflito com o interesse público.

No âmbito trabalhista o empregado e o empregador têm a liberdade de contratar, no entanto, essa liberdade sofre limitações uma vez que o princípio da função social também tem aplicação no direito do trabalho. Na Constituição Federal e na CLT existem direitos que, devido a sua essencialidade para garantir a dignidade humana são considerados como direitos fundamentais de indisponibilidade absoluta, não podendo, nesses casos, as partes utilizarem a liberdade contratual como fundamento para excluir os direitos trabalhistas, pois, nesse caso, estaria prejudicando não apenas as partes contratantes, mas sim, à sociedade em geral.

Ao se utilizar da liberdade contratual como meio para se eximir da responsabilidade no cumprimento das normas trabalhistas e praticar o dumping social, as empresas estão agindo de forma ilícita pelo exercício abusivo do poder de liberdade, conforme previsão legal do art. 187 do Código Civil:

Art. 187- Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. (BRASIL, 2002).

Acerca da importância do cumprimento dos direitos sociais, Jorge Luis Souto Maior entende que:

Os direitos sociais são o fruto do compromisso firmado pela humanidade para que se pudesse produzir, concretamente, justiça social dentro de uma sociedade capitalista. Esse compromisso em torno da eficácia dos Direitos Sociais se institucionalizou em diversos documentos internacionais nos períodos pós-guerra, representando também, portanto, um pacto para a preservação da paz mundial. Sem justiça social não há paz, preconiza o preâmbulo da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Quebrar esse pacto significa, por conseguinte, um erro histórico, uma traição a nossos antepassados e também assumir uma atitude de descompromisso com relação às gerações futuras. (MAIOR, 2012, p. 69).

A violação dos direitos sociais no contrato de trabalho provoca o descumprimento da função social, configurando-se, portanto, como ato ilícito passível de indenização, conforme prevê o art. 927 do Código Civil:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. (BRASIL, 2002).

Dessa forma, o exercício do direito de liberdade contratual é limitado como forma de garantir a função social do contrato trabalho pois, este tem uma grande importância para toda a coletividade e o descumprimento dos preceitos de ordem pública podem causar grandes danos de natureza social.

4.4 Posicionamento da Justiça do trabalho na condenação por dumping social

Conforme acima exposto, o ordenamento jurídico brasileiro não possui regulamentação própria para a condenação por dumping social. No entanto, há a possibilidade de se proceder com uma interpretação sistemática dos dispositivos previstos em outros ramos do direito e aplicá-los aos casos em que se fique configurada a prática de dumping social.

Além dos dispositivos acima elencados, como a ordem econômica, descumprimento da função social do contrato, exercício abusivo de direito e dano social, os juízes e doutrinadores que defendem a aplicação de indenização pela prática do dumping social também utilizam outros fundamentos para justificar a condenação, como o art. 652 “d” da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) que diz:

Art. 652 - Compete às Juntas de Conciliação e Julgamento:

[...] d) impor multas e demais penalidades relativas aos atos de sua competência". (BRASIL, 1943).

Tal artigo foi incluso no tão afamado enunciado n. 4 da ANAMATRA que é um dos principais dispositivos utilizados pelos juízes como fundamento na condenação pela pratica do dumping social:

"DUMPING SOCIAL". DANO À SOCIEDADE. INDENIZAÇÃO SUPLEMENTAR. As agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas geram um dano à sociedade, pois com tal prática desconsidera-se, propositalmente, a estrutura do Estado social e do próprio modelo capitalista com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência. A prática, portanto, reflete o conhecido "dumping social", motivando a necessária reação do Judiciário trabalhista para corrigi-la. O dano à sociedade configura ato ilícito, por exercício abusivo do direito, já que extrapola limites econômicos e sociais, nos exatos termos dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil. Encontra-se no art. 404, parágrafo único do Código Civil, o fundamento de ordem positiva para impingir ao agressor contumaz uma indenização suplementar, como, aliás, já previam os artigos 652, "d", e 832, § 1º, da CLT.

Outro artigo utilizado na fundamentação é o art. 8º da CLT que dispõe:

Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

Apesar do dano social inegável causado pela prática do dumping, ainda é grande o número de juízes que se negam a dar provimento aos pedidos de indenização, alegando falta de previsão legal, mesmo havendo possibilidade de fazer uma analise sistemática e aplicar outras disposições legais, conforme já foi acima explanado.

Para os que discordam da aplicação de indenização suplementar pelo dano decorrente da prática do dumping, utilizam o art. 5º,II, da Constituição Federal/88, que dispõe: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Esse é o entendimento do Desembargador Manuel Cândido do TRT 3ª Região, que foi utilizado no julgamento do Recurso Ordinário 2756/2008-063-03-00.5:

DUMPING SOCIAL. INDENIZAÇÃO. Entende-se inaplicável a indenização por dumping social, por ausência de amparo legal. Aliás, reza o disposto no artigo 5º, inciso II, da Constituição do Brasil, que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de Lei." (BRASIL, TRT 3ª Região, 2009).

No entanto, a divergência não ocorre apenas a respeito da possibilidade de condenação por dumping social, mas também acerca das seguintes problemáticas:

Quem tem legitimidade para propor a ação requerendo a reparação do dano decorrente do dumping, o trabalhador ou o Ministério Público do Trabalho?

Acerca da extensão do dano, o entendimento majoritário é no sentido de que o dano causado pela prática do dumping social é de natureza coletiva, no entanto, há decisões onde os juízes entendem que o dano causado pelo dumping é individual, uma vez que o trabalhador foi quem teve os seus direitos lesados.

Para essa problemática, existem duas correntes: Uma entende que o Ministério Público do Trabalho e os Sindicatos são os possuidores da legitimidade para propor a ação requerendo a reparação do dano social, a outra, entende que o trabalhador é a parte legítima para propor a ação.

O renomado autor Italiano, Mauro Cappelletti (1977) é adepto da primeira corrente e esclarece que:

O indivíduo ‘pessoalmente lesado’, legitimado a agir exclusivamente para a reparação do dano a ele advindo, não está em posição de assegurar nem a si mesmo nem à coletividade uma adequada tutela contra violações de interesses coletivos.(CAPPELLETTI, 1977, p.136).

O autor afirma, ainda, que a legitimidade estrita ao lesado, individualmente considerado, é insuficiente, fazendo-se necessário o reconhecimento da legitimidade coletiva, conferida ao Ministério Público do Trabalho e aos Sindicatos.

Os adeptos desse entendimento argumentam que o dumping social causa danos sociais de natureza coletiva e, portanto, o meio hábil de se requerer a reparação desse dano é através da interposição de ação civil Pública, cujo rol de legitimados para propor a presente ação encontra-se previsto no art. 5º da Lei nº 7.347/1985, abaixo transcrito:

Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

I - o Ministério Público;

II - a Defensoria Pública;

III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;

V - a associação que, concomitantemente:

a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;

b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. (BRASIL, 1985).

Entre os adeptos dessa corrente, encontramos o desembargador Gentil Pio de Oliveira, da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região que recentemente reformou sentença de primeiro grau prolatada dos autos de nº 0000283-89.2012.5.18.0191, para excluir a condenação por dumping social contra a Marfrig Alimentos, por entender que o trabalhador não era parte legítima para pleitear a indenização, conforme se vê no acórdão abaixo:

DUMPING SOCIAL. INDENIZAÇÃO. NECESSIDADE DE REQUERIMENTO ESPECÍFICO. LEGITIMIDADE. Compete aos legitimados que compõem o rol previsto no artigo 5º da Lei 7.347/1985, por meio da Ação Civil Pública, pleitear indenização decorrente de dumping social, dando-lhe a destinação prevista na legislação pertinente, pois o dano repercute socialmente, gerando prejuízos à coletividade, não podendo ser deferida de ofício, por ausência de previsão legal. (BRASIL, TRT 18ª Região, 2012).

A legitimidade do Ministério Público do Trabalho está prevista no art. 83 da Lei Complementar 75/93 que diz:

Art. 83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho:

[...]III - promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos; (grifo nosso). (BRASIL, 1993).

Corroborando com esse entendimento, o desembargador Vulmar de Araújo Côelho Junior da 1ª Turma do TRT 18ª Região emitiu a seguinte decisão no processo 0087600-43.2008.5.14.0041 :

DANO SOCIAL. LEGITIMIDADE PARA PLEITEAR A INDENIZAÇÃO RESPECTIVA. Considerando que a doutrina conceitua o dano social como sendo aquele que repercute em toda sociedade, podendo gerar prejuízos de ordem patrimonial ou imaterial aos membros da coletividade, somente esta, por meio do Ministério Público, tem legitimidade para pleitear a indenização por dano social, nos termos do que dispõe a Carta Magna (art. 129, III). (BRASIL, TRT 18ª Região, 2008).

Em sentido contrário, há quem entenda que o próprio reclamante pode requerer a indenização por dumping social, compartilhando desse entendimento, a Desembargadora Ida Selene Duarte Sirotheau Corrêa Braga do TRT 8ª Região, no dia 09/10/2012 reconheceu o pedido de indenização por dumping social requerido pela reclamante, como se vê a seguir:

indenização por dano moral em razão de dumping social- Não tenho dúvida em afirmar que a terceirização ilícita da atividade-fim do 2º reclamado, com precarização do contrato de trabalho, caracteriza dumping social, conceituado doutrinariamente como a prática de violação a direitos trabalhistas, com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência, gerando um dano social. Diante disso, julgo procedente o pedido de indenização por dano moral decorrente do dumping social, que arbitro em R$10.000,00, considerando o potencial ofensivo do ato e a capacidade econômica da ofensora. (BRASIL, TRT 8ª Região, 2012).

Compartilhando do mesmo entendimento, o Desembargador Ricardo Carvalho Fraga, registra que:

A legitimidade do juiz, para deferir o pagamento de multa por dumping social, se justifica pela necessidade de coibir as práticas reiteradas de agressões aos direitos trabalhistas, por meio do reconhecimento da expansão dos poderes do julgador no momento prestação jurisdicional, nas reclamatórias trabalhistas em que se verifica a ocorrência do referido dano. (BRASIL, TRT 4ª região, 2011).

A segunda divergência jurisprudencial é:

Há a possibilidade de o juiz conceder a indenização ex officio?

O enunciado nº 4 da ANAMATRA dispõe que é necessária a reação do judiciário trabalhista para corrigir a prática do dumping social, entendendo que não há necessidade de pedido específico de condenação na petição inicial, cabendo ao próprio magistrado aplicar a penalidade e conceder a indenização quando se deparar com essa prática ilícita. Esse enunciado veio trazer mais segurança aos magistrados para que estes condenem, ex ofício, as empresas que praticam o dumping. Como fundamento para essa decisão ex ofício, os adeptos dessa teoria utilizam as seguintes previsões legais disponíveis na CLT:

Art. 652. Compete às Juntas de Conciliação e Julgamento:

[...]d) impor multas e demais penalidades relativas aos atos de sua competência. (BRASIL, 1943).

Art. 765 - Os juízos e Tribunais do Trabalho terão ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas. (BRASIL, 1943).

Complementando os artigos acima citados, verifica-se outro argumento legal disposto no Código Civil, o art. 404 in verbis:

Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.

Parágrafo único. Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar. (grifo nosso). (BRASIL, 2002).

Nesse sentido, a juíza Ana Júlia Fazenda Nunes, da 4ª Vara do Trabalho de Caxias do sul, prolatou a seguinte decisão:

DUMPING SOCIAL. INDENIZAÇÃO POR DANO SOCIAL COLETIVO. Restando comprovada a ocorrência reiterada de acidentes do trabalho nas dependências da reclamada, em virtude da insegurança do meio ambiente de trabalho, não há óbice para que o Juízo imponha penalidade sobre a empresa demandada, ainda que não haja pedido específico, em virtude de seu compromisso ético com a proteção da dignidade da pessoa humana e do trabalho. (BRASIL, TRT 4ª Região, 2012).

Acerca da condenação ex ofício, assevera Jorge Luiz Souto Maior que:

A esta necessária ação do juiz, em defesa da autoridade da ordem jurídica, sequer se poderia opor com o argumento de que não há lei que o permita agir desse modo, pois seria o mesmo que dizer que o direito nega-se a si mesmo, na medida em que o juiz, responsável pela sua defesa, não tem poderes para fazê-lo. Os poderes do juiz neste sentido, portanto, são os pressupostos da razão de sua própria existência. (MAIOR, 2012, p. 9-10).

Ocorre que mesmo com essa disposição do enunciado nº 4 da ANAMATRA, os tribunais regionais tendem a reformar as decisões de 1º grau que concedem a indenização ex ofício, conforme se vê abaixo:

DUMPING SOCIAL. JULGAMENTO EXTRA PETITA. Segundo o que dispõem os arts. 128 e 460 do Código de Processo Civil, configura julgamento extra petita a decisão, por meio da qual a empresa é condenada ao pagamento de indenização pela constatação de um dano moral coletivo, em sede de reclamação trabalhista individual,quando ausente pedido nesse sentido. O fato de o Exmº. Julgador de origem ter constatado a ocorrência de dano social não lhe autoriza a agir de ofício, já que lhe é defeso proferir sentença de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado. Com efeito, compete aos legitimados que compõem o rol previsto no artigo 5º da Lei 7.347/1985, por meio da Ação Civil Pública, pleitear indenização decorrente de dumping social, dando-lhe a destinação prevista no diploma legal pertinente. (BRASIL, TRT 18ª Região, 2012).

Sabe-se que o papel do Poder Judiciário não é apenas fazer a aplicação da lei ao caso concreto, compete aos juízes atuar na busca da justiça social, devendo garantir a todos o acesso efetivo aos direitos fundamentais previstos em lei e o bem estar da sociedade. Diante desse compromisso social, o juiz não pode deixar de proteger os direitos sociais, ainda que estes não tenham sido solicitados na petição inicial, pois cabe ao Poder Judiciário garantir a justiça social através da eficácia dos direitos fundamentais e da proteção da parte hipossuficiente. Negar proteção jurídica à um direito social pela ausência de pedido na petição inicial, é deixar de observar o papel social que deve ser desempenhado pelo Judiciário.

Mas as divergências jurisprudenciais não param por aí, ainda visualiza-se a seguinte discordância:

O valor da indenização interposta pelo dano causado pela prática do dumping social deve ser destinado ao próprio trabalhador, ao Fundo de Amparo ao trabalhador, ou à instituições de caridade?

O juiz Jorge Luiz Souto Maior é um dos maiores estudiosos sobre o tema e já proferiu diversas sentenças condenatórias para as empresas praticantes do dumping social. No entendimento dele, a prática do dumping social causa danos à sociedade em geral, portanto, o valor da indenização não deve ser destinado ao trabalhador e sim a um fundo social, como se vê no trecho da sentença prolatada nos autos de nº 0049300-51-2009-5-15-0137- TRT 15ª Região:

Diante do dano social identificado, condeno a reclamada a pagar multa de R$ 100.000,00 (cem mil reais), revertida, conforme manifestação dos demais membros da Turma, ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), nos termos da Lei n. 7.347/85. (BRASIL, TRT 15ª Região, 2012)

Já o juiz Alexandre Chibante Martins, juiz substituto da Vara do Trabalho de Ituiutaba –MG, proferiu sentença condenando a empresa Friboi ao pagamento de R$500,00 a um ex-empregado, a título de indenização por dumping social, conforme decisão abaixo transcrita:

RESPONSABILIDADE SOCIAL- DUMPING SOCIAL– O valor da indenização será fixado tendo em vista os seguintes parâmetros já adotados pela doutrina e jurisprudência pátrias: extensão do dano; culpa do agente; potencial econômico do ofensor;observação do caráter pedagógico da sanção (punição com intuito de evitar-se a reincidência na prática lesiva e surgimento de novos casos, para que ocorra a adequação do ofensor ao comportamento estabelecido no ordenamento jurídico pátrio); uso da eqüidade; indenização com o objetivo de servir de compensação ao reclamante, sem quehaja enriquecimento sem causa deste, levando-se em consideração o caso em tela e a gravidade do dano e a repercussão pessoal e social.[...] Pelo acima exposto, e pelo que dos autos consta (jornada extraordinária além da 10ª hora diária em empresa enquadrada no risco três – INSS - em termos de riscos ergonômicos para os trabalhadores e o risco de acidentes), fixo uma sanção pecuniária, à favor da reclamante, a ser paga pelo reclamado, no importe de R$500,00(quinhentos reais), em parcela única, com espeque nos arts. 186, 187, Parágrafo único do art. 404, 927 e 1553 todos do Código Civil; arts. 8º ‘caput’; 652, ‘d’, 769 e 832, § 1º todos da CLT. (BRASIL, TRT 3ª Região, 2009).

O Juiz Alcir Kenupp Cunha, do Mato Grosso do Sul condenou empresa Perdigão ao pagamento de indenização por dano social, mas esse juiz foi mais ousado em sua condenação, pois além da condenação no pagamento de indenização por dumping social, a empresa também foi condenada a adquirir uma ambulância para o Município e um veículo para uso na fiscalização do trabalho, de acordo com a sentença abaixo :

Condenado a reclamada em depósito , no valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), em favor do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza (inc. VIII do art. 2º da Lei Complementar nº 111/2001); b) aquisição, para o hospital de Urgência e Trauma do Município de Dourados, de uma ambulância tipo UTI, nova e devidamente equipada - valor estimado R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais); c) aquisição, para o órgão de fiscalização do Ministério do Trabalho em Dourados, de um veículo, tipo caminhonete, cabine dupla, tração 4 x 4, para uso na fiscalização do trabalho - valor estimado R$ 100.000,00 (cem mil reais).(BRASIL, TRT 24ª Região, 2008).

Na decisão acima transcrita, pode-se visualizar um maior comprometimento do juiz, que aplica condenação em um valor significativo com o objetivo combater a prática do dumping. A indenização deve atender ao caráter reparatório e sancionatório, ou seja, o valor deve ser suficiente para reparar o dano provocado, sem provocar enriquecimento sem causa e, ao mesmo tempo pedagógico ou sancionatório, no sentido de desestimular que as empresas continuem agindo de forma ilícita, provocando danos não só ao trabalhador, mas a toda coletividade.

Sobre o assunto, o juiz Ranúlio Mendes Moreira do TRT 18ª Região, entende que o valor da indenização deve ser repassado para instituições de caridade:

DA RESPONSABILIDADE SOCIAL – “DUMPING SOCIAL”- Havendo, pois, ofensa ao patrimônio jurídico da comunidade, com fulcro nos artigos supramencionados e nos argumentos acima expendidos, condeno as reclamadas, de forma solidária, ao pagamento de reparação por danos sociais, no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), reversíveis à entidade filantrópica VILA SÃO JOSÉ BENTO COTTOLENGO, que presta serviços relevantes a pessoas doentes e carentes há muitos anos, e, mesmo sem recursos tenta dar dignidade ao ser humano, ao contrário das rés, que apenas buscam o lucro, em detrimento da sacralidade indelével da dignidade humana. (BRASIL, TRT 18ª Região, 2011).

De todas as divergências acima expostas, a discordância quanto o destino do valor da condenação é a mais irrelevante. Independente do destino, o importante é que se aplique a condenação em um montante razoável, capaz de reparar o dano e desestimular as empresas na prática do dumping.

Através das explanações acima delineadas, percebe-se que a divergência jurisprudencial não se limita apenas à possibilidade ou não da concessão de indenização por dumping social, essa divergência se estende em relação à legitimidade do reclamante, a possibilidade de condenação ex ofício, bem como o correto destino da indenização aplicada, conforme foi acima exposto.


5. CONCLUSÃO

A abordagem do presente trabalho de monografia permitiu uma análise sucinta sobre as alterações nas relações de trabalho em virtude do fenômeno da globalização, focando em um estudo mais detalhado sobre prática do dumping social, o qual tem sido matéria de discussão doutrinária e jurisprudencial, não tendo, até o presente momento, nenhuma uniformização de entendimento.

Abordamos, também, a questão da flexibilização das leis trabalhistas, que é um método defendido por muitos doutrinadores renomados, entre eles Sérgio Pinto Martins e Amauri Mascaro Nascimento, como forma de adequação do direito trabalho à realidade econômica e social. No entanto, a flexibilização é apenas um termo “elegante” utilizado para mascarar a precarização das condições de trabalho. A constituição Federal e a Consolidação das Leis Trabalhistas estipulam os direitos e garantias mínimas do trabalhador, portanto, flexibilizar o que já é mínimo significa submeter os trabalhadores à condições de trabalho precárias e degradantes.

Além do mais, não há nenhuma garantia de que a flexibilização das normas trabalhistas seja capaz de conter a crise econômica e o desemprego. A proteção do trabalhador é que deve ser prioridade e não a busca incessante dos empresários pela obtenção de lucros cada vez maiores. Reduzir os direitos trabalhistas como forma de amenizar os impactos da crise econômica com certeza não é a melhor solução, pois, enquanto os direitos do trabalhador são, de fato, mínimos, as cargas tributárias e fiscais são absurdas. Se for necessária alguma flexibilização para conter a crise econômica e o desemprego, que esta se faça em relação às cobranças de impostos, pois os impactos negativos dessa flexibilização tributária seriam bem menores e menos prejudiciais do que a flexibilização das normas trabalhistas.

Diante dessa situação de crise econômica e desemprego, os empresários utilizam esses fatos como argumento para desrespeitar, de forma reiterada, os direitos trabalhistas, praticando o chamado dumping social que foi o principal objeto de estudo do presente trabalho. Porém, empresas de grande porte, como a Nike e a Apple, por exemplo, que não possuem nenhuma dificuldade financeira, também se utilizam dessa prática ilícita. Dessa forma, esse fundamento não é suficientemente capaz de justificar a inobservância dos direitos laborais.

O dumping social é algo que vem acontecendo em todo o mundo, principalmente nos países subdesenvolvidos. Em virtude da importância e da essencialidade do trabalho em toda a sociedade, essa prática causa danos de natureza social, prejudicando não apenas os trabalhadores envolvidos, mas toda a coletividade.

Podemos ver que, no Brasil, muitos juristas têm se sensibilizado para a questão do dano social provocado pelo dumping e têm condenado as empresas que insistem em desrespeitar os direitos trabalhistas. Porém, após consultas realizadas nas jurisprudências de diversos tribunais do trabalho, foi possível observar que a maioria das decisões favoráveis à aplicação de indenização por dumping social foram prolatadas no TRT da 18ª Região, o que demonstra grande empenho dos magistrados ali empossados. No TRT 6ª Região, por exemplo, ainda não foi prolatada nenhuma decisão que reconhecesse o dano social advindo do dumping.

Sendo assim, se faz necessária uma maior colaboração dos juristas de todos os Tribunais Regionais brasileiros no sentido de reconhecer a figura do dumping e aplicar condenações em pecúnia, de caráter punitivo e pedagógico, pois de nada adianta impor multas de pequeno valor para empresas que faturam milhões e até bilhões ao ano.

A indenização deve ser em valor significativo, como forma de evitar a reincidência nessa prática ilegal. Ausência de condenação ou condenações de pequena monta são capazes de incentivar as empresas a agir na ilegalidade, pois desse modo será lucrativo para a empresa não observar os direitos trabalhistas se nenhuma penalidade lhe for imposta.

No entanto, é importante ressaltar que a necessidade de colaboração não é apenas entre os juristas brasileiros, mas sim, uma colaboração internacional, porque de nada adianta o Brasil lutar contra o dumping se os países vizinhos continuarem aceitando essa prática de precarização do direito trabalhista. Esse é um problema de nível mundial, que atinge principalmente os países subdesenvolvidos, por isso merece proteção não apenas dos órgãos nacionais, esse assunto também deve ser melhor abordado por órgãos de proteção internacional.

O fato que mais assusta é saber que justamente as maiores empresas multinacionais são as principais causadoras dessa precarização. As gigantes Nike e Apple, por exemplo, exploram os países de terceiro mundo, onde submetem os trabalhadores à condições desumanas de trabalho, inclusive com o uso de mão de obra infantil e ainda pagam salários baixíssimos. As pequenas empresas utilizam a dificuldade financeira como argumento para a inobservância do direito trabalhista, e para essas gigantes multinacionais que a cada ano batem recorde de faturamento, qual seria a justificativa para tanto desrespeito à dignidade humana do trabalhador? Talvez não tenha nenhuma resposta com justificativa plausível para essa pergunta.

No desenvolvimento da monografia, podemos observar, também, que mesmo diante do dano causado pelo dumping, muitos juristas “fecham os olhos” para a situação, preferem alegar ausência de previsão legal e julgar o processo improcedente, do que fazer analogia e buscar outros dispositivos legais para resolver a lide. Além do mais, a discordância jurisprudencial sobre o dumping social não é apenas sobre a possibilidade de condenação, mas, também, acerca da legitimidade para propor a ação, bem como o destino do valor da condenação, se é para o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), ao próprio trabalhador ou à instituições de caridade. Nesse quesito, entendo que por se tratar de um dano de natureza coletiva, o Fundo de Amparo ao Trabalhador é o órgão mais apropriado para o destino da indenização. Mesmo diante de todas essas divergências jurisprudenciais, o fator principal que requer maior atenção é a necessidade condenação punitiva e pedagógica das empresas praticantes do dumping social, com o intuito de desencorajá-las a permanecer desrespeitando a legislação trabalhista.

Por fim, concluímos que se faz necessária a intervenção do Estado no sentido de reconhecer os danos oriundos do dumping social e implantar medidas de proteção e combate à essa prática ilícita, pois, apenas a previsão legal de condenação seria capaz de amenizar essas discordâncias doutrinárias e jurisprudenciais. Enquanto o Judiciário ignorar os malefícios do dumping, os trabalhadores brasileiros permanecerão sendo explorados e submetidos a condições degradantes de trabalho.


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Abstract: This monograph discusses the changes in working conditions with the advent of capitalism and globalization, among them, the appearance of relaxation of labor standards and social dumping, which can be defined as the repeated disregard the rules of law the work. The expression dumping arose initially in economic law and referring to the illegal practice of selling goods below cost in order to eliminate competition. In Brazil, there is no specific statutory authority providing for the condemnation by social dumping in labor, however, Anamatra (National Association of Judges of the Labour Court) approved the statement nº 4 which provides the possibility of conviction for dumping social. Despite the wide divergence of jurisprudence, there was a major breakthrough in awareness among Brazilian jurists now you can view court decisions recognizing the social harm arising from this practice, as well as the imposition of a fine for damage to society.

Key words: Globalization. Easing. Social dumping. Social damage. Condemnation.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DELGADO, Pamilla Pessoa dos Santos. Os efeitos da globalização nas relações trabalhistas - dumping social. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3549, 20 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24010. Acesso em: 28 mar. 2024.