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As organizações assistenciais do terceiro setor na região fronteira noroeste do Rio Grande do Sul: paralelidade ou complementaridade à ação estatal?

As organizações assistenciais do terceiro setor na região fronteira noroeste do Rio Grande do Sul: paralelidade ou complementaridade à ação estatal?

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O modo mais comum de parceria entre o Estado e as organizações assistenciais e beneficentes pesquisadas é a subvenção mensal da Prefeitura Municipal, e por vezes, a terceirização de serviços.

Resumo: Este artigo representa a sistematização da pesquisa bibliográfica, documental e de campo desenvolvida inicialmente, com a finalidade de dar suporte ao Trabalho de Conclusão de Curso em Serviço Social, no segundo semestre de 2009. Nesta pesquisa, procurou-se acentuar a discussão em torno dos diferentes modelos de Estado e suas distintas formas de conceber as políticas sociais, traçando um fio condutor entre o Estado Liberal, o Welfare State e recentemente, o Estado Neoliberal. O Terceiro Setor, seguindo por esse ponto de vista, pode ser considerado parte integrante do chamado Projeto Neoliberal de Reestruturação Capitalista, cujo foco é a redução do Estado interventor, e conseqüentemente, os gastos sociais. Por essa linha de raciocínio, as organizações sem fins lucrativos e outras com terminologias semelhantes, viriam para substituir o Estado em sua responsabilidade pelas respostas às refrações da Questão Social. No entanto, procurou-se traçar um perfil das organizações assistenciais da Região Fronteira Noroeste, qualificadas como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público ou com Título de Utilidade Pública Federal, a fim de identificar fatores que pudessem confirmar ou negar esse pressuposto, na compreensão sobre a relação destas organizações com as esferas estatais, paralelas ou complementares. Expõe-se assim, os resultados da pesquisa realizada usando-se do método dialético, com base na análise qualitativa, procurando assim abarcar a totalidade deste fenômeno nessa região em especial.

Palavras-chave: Estado, Terceiro Setor, Organizações Assistenciais, Serviço Social.


Introdução

A Região Fronteira Noroeste[1] do estado do Rio Grande do Sul compreende vinte municípios – Alecrim, Alegria, Boa Vista do Buricá, Campina das Missões, Cândido Godói, Doutor Maurício Cardoso, Horizontina, Independência, Nova Candelária, Novo Machado, Porto Lucena, Porto Mauá, Porto Vera Cruz, Santa Rosa, Santo Cristo São José do Inhacorá, Senador Salgado Filho, Três de Maio, Tucunduva e Tuparendi - em uma área total de 4.689 Km², compreendendo uma população de 200.752 habitantes, sendo que destes, 39.93% estão localizados na área rural e 61,06% no perímetro urbano. Está situada na Macrorregião Noroeste, mais especificamente na fronteira com a República Argentina (ROTTA, 2008).

Este espaço territorial serviu de referência para a pesquisa, que procurou compreender a relação entre Estado e Organizações Assistenciais do Terceiro Setor, identificando as possíveis posturas de paralelidade ou complementaridade com relação a estes personagens. Há que se considerar que a definição de Terceiro Setor abrange um universo enorme de diferentes organizações, indo desde as associações de moradores, as produtivas, sindicatos, organizações sem fins lucrativos, não governamentais, com finalidades também diversificadas, como ambientais, culturais, educacionais, hospitalares, pró-desenvolvimento, beneficentes, assistenciais, etc. (NAVES, 2003), sendo por esse motivo necessário adotar a utilização de uma amostra. As organizações a serem pesquisadas foram escolhidas com base na finalidade assistencial e no critério de qualificação legal, ou seja, aquelas que estão qualificadas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIPs ou então, Título de Utilidade Pública Federal – UPF[2], conforme dados disponíveis na página do Ministério da Justiça na Internet[3].

Para uma aprofundada compreensão do tema em questão, optou-se por desenvolver uma revisão bibliográfica sobre os diferentes modelos de Estado, considerando o Estado Liberal, o Welfare State e o Neoliberal, e o tratamento que cada um deles dispensava às refrações da Questão Social, através de políticas sociais, chegando então ao atual debate, recente porém polêmico, acerca das determinações e intenções do Terceiro Setor.

O conceito de Terceiro Setor, embora ainda não seja um consenso, e divida em campos distintos vários atores sociais do meio intelectual, acadêmico e político, tornando-se instigante para várias áreas de conhecimento, a exemplo do Serviço Social. Em primeiro lugar pela relevância que este fenômeno atinge na contemporaneidade, especialmente após a expansão quantitativa das ONGs no cenário internacional, por volta do final da década de 70, e nacional, no início dos anos 90 (MONTAÑO, 2002). Em segundo lugar, pela transformação que ocasiona na forma de elaboração e execução de políticas sociais, afetando não só a noção da garantia dos direitos sociais como dever do Estado, como também impacta diretamente no espaço sócio-ocupacional do Serviço Social.

Sendo assim, procurando englobar todas essas questões, este artigo estrutura-se em quatro itens, sendo que no último explana-se sobre os resultados da pesquisa sobre as Organizações Assistenciais do Terceiro Setor na Região Fronteira Noroeste, num esforço de compreender os reflexos deste fenômeno enquanto imbricado nas peculiaridades locais, especialmente no que tange a relação com o Estado.


1. Visitando o debate sobre os modelos de Estado e suas respectivas políticas sociais

O capitalismo está presente em qualquer processo histórico, desde que este sistema tornou-se o dominante. O surgimento e desaparecimento de modelos diferentes de Estado e de governo se devem, majoritariamente, a fase na qual o capitalismo se encontrava. Não é diferente no momento atual, e para entender profundamente como isso acontece, a revisão do passado se faz necessária. Por isso, neste primeiro item, a reflexão se destina aos antecedentes do chamado modelo neoliberal, e junto com ele o “Terceiro Setor”, mas que tem uma ligação intrínseca com as transformações e posturas adotadas nos dias de hoje.

A intenção aqui não é realizar uma longa trajetória histórica detalhada acerca de todas as particularidades que assumiu o Estado nas diferentes fases do capitalismo, mas sim, brevemente, traçar uma linha de tempo até chegar na compreensão dos fatores que levam ao crescimento do Terceiro Setor atualmente. Inicia-se a reflexão, de um ponto de partida considerado aqui um divisor de águas entre a Idade Média e a Modernidade: a Revolução Francesa de 1789. É interessante lembrar esse episódio, na medida em que representa a tomada de poder econômico, e conseqüentemente político, da burguesia revolucionária, significando a ruptura definitiva com o Sistema Feudal e o berço da hegemonia capitalista.

A burguesia, tendo derrubado o Estado Absolutista, o seu opressor até então, necessitava de um Estado equivalente às suas aspirações. Assim, não se pode ignorar que o Estado Moderno é uma criação da burguesia para consolidar o seu poder dominante, sendo então, conforme Montaño (1999), “do” capitalismo e “para” os capitalistas. Assim como em toda a história, cada modelo econômico teve seu respectivo modelo de regulação, ou seja, sua forma de organizar o Estado para dar sustentação ao sistema, o liberalismo foi o mais adequado para atender às necessidades do capitalismo naquela fase de desenvolvimento.

No primeiro período, o do capitalismo liberal, pondera o princípio de mercado de forma quase absoluta, a economia deveria se auto-regular pela “mão invisível” do próprio mercado (SMITH, 1981), e a função do Estado é proteger direitos naturais, ou seja, o direito à vida, à liberdade e à propriedade (LOCKE, 2001), assegurar o direito à propriedade e proteger a livre acumulação capitalista (SOUZA SANTOS, 1985), e ainda, segundo Montaño (1999), criar mecanismos para manter a legitimidade da ordem hegemônica.

Para Marx e Engels, no Manifesto do Partido Comunista, encontramos uma noção bastante ilustrativa do que era o Estado no modelo liberal: para eles, o Estado era “um comitê para gerir negócios comuns a toda a classe burguesa” ou ainda, era “o poder organizado de uma classe para a opressão de outra” (MARX e ENGELS, apud MONTAÑO, 1999).

No modelo liberal de Estado predominava a ideologia do mérito e do trabalho. Para Behring (2006), o tratamento dado à pobreza era mais de vigilância e punição do que de proteção, pois pensava-se que não era necessário dispensar recursos com os pobres, pois a condição de cada um era única e exclusivamente sua responsabilidade, e não fruto de um sistema excludente. Nesse modelo de Estado, havia portanto, a total negação da política social, e conseqüentemente, à Assistência Social.

Porém, esse modelo de Estado se esgotou, e acabou sendo substituído por outro a partir do início do século XIX. Segundo Pereira (1998), isso ocorreu por conta do acirramento da questão social, crise econômica de 1929 e especialmente o colapso mundial vivido no pós-guerra. De um lado, a formação de uma classe de assalariados com consciência de classe e protagonizando movimentos reivindicatórios faz surgir um conjunto de leis e medidas de proteção social. Por outro, a falência iminente do capitalismo diante da “Grande Depressão” provocou mudanças na forma de conceber o Estado, “abrindo espaços para uma efetiva intervenção do Estado na economia e na sociedade” (PEREIRA, 1998, p. 61). A teoria adotada nesse momento é o keynesianismo – termo originado do nome de John M. Keynes – cujos argumentos resumidamente incluíam a forte intervenção estatal na economia, assumindo a responsabilidade pela regulação da sociedade, já que ao que parecia, o capital não era capaz de se livrar das crises e muito menos o mercado auto regular-se pela dita “mão invisível”.

Essa fundamentação teórica deu origem ao Estado de Bem Estar Social, ou Welfare State. Assim, entre os anos 40 e 70, os pilares deste modelo de Estado foram as “políticas de pleno emprego, serviços sociais universais, extensão da cidadania e o estabelecimento de um umbral sócio-econômico, considerado condigno pela sociedade, abaixo do qual a ninguém seria permitido viver” (PEREIRA, 1998, p. 61). No plano social o intervencionismo estatal entra em cena na organização de sistemas de seguridade pública como “direito do cidadão e obrigação do Estado” (Idem).

Evidentemente, reconhece-se a importância do Estado de Bem Estar Social para a consolidação dos direitos sociais através de legislação protetiva e políticas sociais para materializá-las. Também não é possível ignorar que, de acordo com Moraes (2002, p. 38), este modelo de Estado e os benefícios que trouxe para a classe trabalhadora não teria acontecido jamais sem a luta dos movimentos operários, que formularam reivindicações do tipo em decorrência do acirramento da questão social naquele período. Assim, o Estado de Bem Estar Social também é fruto de conquistas históricas dos movimentos trabalhistas, e qualquer estudioso seria reducionista se minimizasse esses ganhos para as classes exploradas pelo capital.

Mas também não se pode deixar de observar que as políticas sociais adotadas pelo Estado neste período estão também ligadas às artimanhas do capitalismo para manter os trabalhadores mais ou menos contentes com sua condição e resignados a aceitar a lei de acumulação capitalista, que a eles se traduz como a lei de exploração capitalista.

Segundo Martinelli (1997), conforme o capital se desenvolve, mais a questão social se torna latente, e chega a um patamar inegável. Os trabalhadores, explorados ao limite, adquirem consciência de classe, passam a reivindicar melhores condições de vida e de trabalho, e se tornam uma ameaça em potencial à hegemonia do capital, já que esse processo está vinculado também à expansão das ideologias comunistas pelo mundo. O amedrontamento do capital em relação às manifestações da Questão Social e da organização dos Trabalhadores é compreensível, já que num passado nem tão distante, a própria burguesia era a classe oprimida que, em revolução, tomou o poder. Ou seja, um sistema em crise, não legitimado, contra uma classe subalterna revoltada e disposta a lutar, é igual a derrocada do sistema dominante. Embora a probabilidade disso acontecer fosse grande, como queria Marx, a tendência à repetição não se concretizou.

O capital em apuros, atravessando uma crise e ameaçado pelo amadurecimento da classe trabalhadora e do acirramento da luta de classes, gera uma reação imediata do Estado, que prontamente vem em socorro do seu criador. O socorro necessário ao capital, nesse momento, consistia em dar um jeito de acalmar os trabalhadores, atenuar o conflito entre capital e trabalho, sufocar seus movimentos e calar a boca dos “rebeldes” ao sistema, os proletários (MARTINELLI, 1997).

De início, o Estado até que tentou controlar os trabalhadores adotando a repressão pela violência como tática para proteger o capital de um possível colapso. Mas essa opção era por demais agressiva, não sendo a mais conveniente, pois colocava em risco a legitimação popular do Estado e principalmente do sistema capitalista perante a população (MONTAÑO, 1999).

Nessa ótica, conforme se encontra registrado em Coutinho (1987), o Estado obriga-se a desenvolver uma segunda lógica dentro do espaço estatal: a da democracia. Assim, incorporam-se algumas reivindicações populares e, devolvidas em forma de benefícios e serviços, atenuando a revolta dos trabalhadores e dando a impressão que o Estado realmente se importava com o seu sofrimento (IAMAMOTO e CARVALHO, 2003).

Cabe lembrar ainda que o Estado de Bem Estar Social com a característica interventiva “não beneficiou unicamente as classes trabalhadoras” (MORAES, 2002, p. 35). Sendo assim, muitas intervenções visaram investimentos no setor privado, tendo este Estado uma face duplicada, em que por um lado a intervenção refletia as reivindicações dos movimentos sociais, e por outro lado, dava condições de desenvolvimento para o capital, através de financiamentos e investimentos em infra-estrutura.

Nesse aspecto, usando-se das palavras de Montaño (1999), o Estado teria funcionado e por enquanto ainda funciona em alguns aspectos como o “oxigênio” do capitalismo, em suas diversas fases de desenvolvimento. Inclusive, em suas crises cíclicas, conforme Martinelli (1997) denomina os sucessivos altos e baixos do capitalismo, o Estado foi o sustentáculo para que este pudesse se reerguer, se recuperar e não perder a sua hegemonia. Como relaciona Montaño (1999), o Estado foi a base de socorro para que o capital sempre ressurgisse das cinzas, como uma espécie de Fênix.

A partir dos anos 70, o Estado de Bem Estar Social passa a ser questionado e criticado por uma vertente de pensamento econômico que, por assim dizer, resgatou e reciclou o liberalismo colocando nele um novo rótulo: neoliberalismo. O principal interlocutor desse liberalismo “reciclado” é Friederich Von Hayek, para quem a vida sob a égide do Estado é o caminho da servidão (HAYEK, 1944).

As críticas ao Estado aparecem principalmente no que tange aos seus investimentos supostamente demasiados nas questões sociais, que desencadearia, no modo de ver dos neoliberais, uma crise fiscal do Estado, e também no seu intervencionismo na economia, regulamentando o mercado e exercendo pressões tributárias.

Nas palavras de Anderson (1995), o neoliberalismo nasceu logo depois da Segunda Guerra Mundial, nas regiões européias e norte-americanas onde imperava o capitalismo, sendo uma contraposição teórica e política enérgica versus o Estado de Bem Estar Social. No entanto, ele só venceu o padrão de desenvolvimento capitalista baseado no Welfare State na década de 70, por conta de uma nova crise mundial, desencadeada principalmente pela crise do petróleo.

Explicando melhor, o modelo de desenvolvimento neoliberal que vigorou a partir desse momento histórico, foi alicerçado em premissas completamente opostas ao modelo de Estado de Bem Estar Social: enquanto neste o governo agia como mediador das tendências de mercado, e ainda, intervindo na defesa de empregos, salários e garantias sociais, no modelo neoliberal o Estado deve desobrigar-se desse tipo de interseção (ANDERSON, 1995).

O termo neoliberalismo aparece nessa conjuntura para demonstrar que as teorias em moda de "livre jogo do mercado" e "completa liberdade da lei da oferta e da procura" estavam imperfeitas. A partir da década de 70 passou a denotar a doutrina econômica que defende a incondicional liberdade de mercado e uma reserva à intervenção estatal sobre a economia, só devendo esta incidir em setores indispensáveis e ainda assim num grau mínimo, em outras palavras, a minarquia (ANDERSON, 1995).

Esse processo é concomitante, segundo Netto (1996), ao surgimento de transformações societárias que alteram todo o padrão de sociabilidade humana. Basicamente, essas transformações decorrem da adoção do modelo neoliberal de desenvolvimento, a troca do sistema rígido (fordista) de produção para um modelo flexível, aliados ainda à globalização intensificada, a financeirização do capital e aquilo que autores como Schaff (1993) apud Netto (1996) chama de Terceira revolução industrial, ou seja, os avanços tecnológicos sem precedentes.

As transformações são contundentes no plano do trabalho: segundo Netto (1996), a própria troca dos padrões produtivos já altera as relações de trabalho, modificadas ainda pela adoção de novas tecnologias que reduzem a necessidade de trabalho vivo e aumentam a necessidade de qualificação dos trabalhadores, e por outro lado, precarizadas pela quase anulação das leis de proteção ao trabalhador.

No plano social, Netto (1996) aponta as seguintes transformações: a transformação na estrutura de classes, a mudança do perfil da própria classe que vive do trabalho, e ainda, modificações no perfil demográfico[4], expansão da urbanização, crescimento do setor terciário, a difusão da educação formal e os novos circuitos de comunicação social. Para Netto (1996) temos ainda, a emergência de novos atores sociais, as mulheres e os jovens, que são protagonistas nas relações de trabalho, e como não poderia deixar de ser, a emergência de cada vez mais segmentos excluídos, marginalizados e completamente desprotegidos.

No plano cultural, a mudança mais relevante apontada por Netto (1996) trata da lógica de mercado que transbordou para todos os outros segmentos da vida social, ou seja, a ideologia da mercadoria invade inclusive a vida intima das pessoas. A cultura adquire traços de mercadoria[5], inclusive pela elaboração de formas culturais socializáveis pelos meios eletrônicos.

No plano político: sofrendo os impactos da nova “ordem tardo-burguesa” ( NETTO, 1996, p. 98), Estado e Sociedade Civil se modificam completamente em esferas, funções e relações. Ainda, de acordo com o autor, há uma crise das tradicionais expressões de classes subalternas (sindicatos, partidos políticos, movimentos sociais), emergência de novos movimentos sociais em busca de novos direitos.

O estado mantém o seu caráter de classe (Netto, 1992, p. 22), ou seja, continua sendo do e para o capitalismo, mas experimenta um redimensionamento: “A mudança mais imediata é a diminuição da sua ação reguladora (...), encolhimento de suas funções legitimadoras”. Quando o capital rompe com o pacto keynesiano, que dava suporte ao Welfare State, acontece a retirada das coberturas sociais públicas, o corte nos direitos sociais. Em outras palavras, a redução do estado na sua ação para com as classes subalternas.

A redução do Estado em parte decorre do processo de globalização pela quebra das fronteiras nacionais onde está circunscrito o controle estatal e pela impossibilidade do estado em intervir na articulação global do grande capital; Para Netto (1996, p. 100), “é evidente que o capitalismo tardio não liquidou com o Estado Nacional, mas é também claro que vem operando no sentido de erodir a sua soberania”.

A ideologia neoliberal defende o Estado Mínimo para os trabalhadores, mas o Estado Máximo para o capital (Netto, 1993, p. 81). Este projeto da ordem burguesa conquistou hegemonia pela satanização, a desqualificação do Estado.

“As corporações transnacionais, o grande capital, implementam a erosão das regulações estatais visando claramente à liquidação de direitos sociais, ao assalto ao patrimônio e ao fundo público, com a desregulação sendo apresentada como ‘modernização’ que valoriza a sociedade civil, liberando-a da tutela do Estado protetor – e há lugar, nessa construção ideológica, para a defesa da ‘liberdade’, da ‘cidadania’ e da ‘democracia’” (NETTO, 1996, p. 100).

Segundo Netto (1996) há uma cultura política anti-Estado. E o pior de tudo é que forças da esquerda também incorporaram a idéia da priorização da sociedade civil. A desqualificação do estado é a chave da ideologia neoliberal para liberar a acumulação capitalista das amarras regulatórias impostas pela lógica democrática no seio do Estado (Montaño, 1999).

Para Netto (1996, p. 102), “(...) a flexibilização do capitalismo tardio, levando a classe-que-vive-do-trabalho à defensiva e penalizando duramente a esmagadora maioria da sociedade, não resolveu nenhum dos problemas fundamentais postos pela ordem do capital”. Ainda, ampliou a magnitude desses problemas, como o abismo existente entre ricos e pobres, possuidores e despossuídos, aumentando o racismo e a xenofobia, ampliando a crise ecológica.

Em síntese, as transformações societárias configuram uma série de vitórias do grande capital, mas essas vitórias capitalistas não trouxeram absolutamente nada de positivo para a classe trabalhadora, e pelo contrário, contribuíram para conter as lutas sociais e reverter direitos sociais historicamente conquistados (NETTO, 1996). Essas vitórias do capital custaram aos trabalhadores, primeiramente, o seu emprego, pois como sabemos, o desemprego estrutural vem aumentando significativamente nas últimas décadas, e ainda, para aqueles que conseguiram manter o seu emprego, custaram um ataque aos sistemas públicos de seguridade social.

Aqui, chega-se ao ponto onde o Projeto Neoliberal de Reestruturação Capitalista afeta, dentre os vários segmentos dentro da estrutura estatal, o Sistema de Seguridade Social. A compreensão de todo este esquema de modelos de desenvolvimento capitalista e o papel do Estado em cada um deles é fundamental para que se chegue a totalidade acerca do fenômeno do aparecimento das organizações não governamentais e do chamado “Terceiro Setor”. Sendo assim, busca-se fazer esta reflexão nos itens que se seguem.


2. Decifrando o fenômeno do Terceiro Setor: as características brasileiras

Como nos traz Coelho (2000) apud Montaño (2002), em seu estudo comparativo entre o terceiro setor no Brasil e nos Estados Unidos, não há como dizer que temos um modelo idêntico ao dos americanos, dadas as particularidades do nosso país. Em outras palavras, o Projeto Neoliberal consolidou-se nos países centrais um bom tempo antes e de forma bem mais aberta do que aqui nos países periféricos latino-americanos. E como uma das facetas da nossa umbilical dependência externa, o Brasil importou e copiou os postulados neoliberais, com certo tempo de atraso em relação aos países do centro, e de uma forma encoberta por um discurso mascarado, distorcendo as verdadeiras intenções de favorecimento do capital (MONTAÑO, 2002).

Evidentemente, as coisas não podem ser vistas com tanta superficialidade, como trazem os autores citados acima. O Brasil não “exportou” e “copiou”, casualmente a idéia do terceiro setor, por uma questão de um novo “modismo” ou uma natural tendência a reproduzir e adotar as práticas realizadas nos países hegemônicos. A questão, na verdade, é bem mais complexa, e não pode ser compreendida sem que se tivesse realizado uma viagem histórica, identificando ao longo da trajetória do capitalismo os fatores determinantes para o atual contexto que desemboca no surgimento do chamado terceiro setor.

O Brasil, segundo Montaño (2002), tentou ajustar-se às recomendações do grande capital internacional, deglutindo os postulados do Consenso de Washington[6], no qual mandou um representante ilustre: Luis Carlos Bresser Pereira, que mais tarde, se tornaria ministro do governo FHC, no comando do Ministério da Administração e Reforma do Estado – MARE. Essa reforma começa com o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, em 1995, classificado por Montaño (2002) como um ajuste aos mandamentos do grande capital, especialmente elaborados para as economias latino-americanas.

As diferenças entre os modelos de Estado e suas fundamentações teóricas residem não só no plano econômico: enquanto Keynes propunha o “pacto social”, a intervenção do chamado Estado de Bem-Estar Social na questão social, reduzindo a níveis toleráveis as suas refrações, diminuindo os conflitos e a luta de classes, estas deixando de serem uma ameaça ao capital, e assim, reproduzindo-o, Hayek, por sua vez, saiu por um caminho radicalmente oposto, propondo a desregulação total, o Estado mínimo, e a transferência das responsabilidades do Estado no trato a questão social para o âmbito da própria sociedade civil (NAVES, 2003).

Em síntese, como explica Naves (2003), seria um desmonte literal do Estado, sua insignificância, a retirada de suas atribuições econômicas e sociais, enquanto agente regulador do mercado e das relações sociais, a modificação nas bases de suas funções na garantia de certo equilíbrio social. Estas funções todas seriam passadas para o mercado, e, segundo Naves (2003) no caso das responsabilidades sociais, para a sociedade civil, já que para os neoliberais o mercado seria um agente regulador quase que “metafísico”, capaz de controlar tudo (inclusive os próprios interesses individuais e relações entre os indivíduos), aplicando a tudo e a todos a lógica da concorrência.

Assim, não há dúvida que neste Projeto Neoliberal, o Estado em sua configuração “de bem estar social”, não encontraria lugar. Isso não significa de forma alguma que termina o casamento entre o capital e o Estado, pois o segundo, sempre tão submisso e servil nessa relação, não perde totalmente a sua funcionalidade para o primeiro: ele continua sendo a fonte mais certa de socorro perante uma crise.

No Brasil o modelo de Estado de Bem Estar Social está longe de poder ser equiparado ao Welfare State desenvolvido na Europa ou ao New Deal dos Estados Unidos. É apenas com a expansão do capitalismo industrial e o acirramento da questão social, que fica posta e inegável no contexto nacional, que o governo Vargas passa a adotar as primeiras formas de políticas sociais no Brasil.

É a partir daí que se impulsiona por exemplo, a criação das instituições assistenciais estatais, a começar com as previdenciárias – Institutos de Caixas e Pensões – perpassando a Legião Brasileira de Assistência – LBA, o Serviço de Aprendizagem Industrial – SENAI, o Serviço Social da Indústria – SESI, etc. (IAMAMOTO, 2003). Todas essas formas primitivas de políticas sociais acabaram por dar origem, num longo e lento processo, aos direitos sociais expressos em legislação – a Constituição Federal de 1988 – operacionalizados através de um Sistema de Garantia de Direitos e materializados por políticas sociais e assistenciais governamentais (MONTAÑO, 1999).

O contexto de enfraquecimento dos movimentos sociais, o fracasso do Estado em cumprir com seu projeto e ainda, a desconfiança da população a tudo que se refira ao poder público, decorrente do desencanto pela política e a crença na corrupção generalizada, acabam por abrir espaço para implantação das ideologias neoliberais, legitimadas pela população como solução ao inoperante, burocrático, lerdo e dispendioso Estado. No entanto, essas ideologias trazem conseqüências significativas para o conjunto de direitos e para as políticas sociais. Conforme Yasbek (1995) apud Montaño (2002), nos anos 90, a política social brasileira, recém consolidada, já sofria abalos decorrentes da opção do governo em adotar as idéias neoliberais no Brasil, que ocasionaram implícitas, mas claras transformações em favorecimento ao capital.

A previdência, o direito do cidadão se aposentar depois de ter trabalhado por um número determinado de anos, foi considerada pelo Plano Diretor, a grande vilã da crise fiscal do Estado, e ao lado da assistência social e da saúde, foram alvo de minimizações significativas.

Ainda de acordo com Yasbek (1995) apud Montaño (2002), a questão social a partir desse período é re-filantropizada, ou seja, retira-se a responsabilidade do Estado nas respostas à manifestações da questão social, e passa-se essa atribuição para as organizações da sociedade civil, ou para o terceiro setor, usando-se do termo mais utilizado nas obras consultadas. Para a autora, um claro retorno às idéias de caridade, à noção de filantropia. Em síntese, no modelo neoliberal de Estado, este último deve apenas subsidiar aquela assistência estritamente necessária, deixando as demandas menos contundentes sobre a responsabilidade de outro ator social, ou seja, o chamado Terceiro Setor.

Quanto aos conceitos, existe um grande uso da separação entre primeiro, segundo e terceiro setor. O primeiro é o Estado, o segundo é o Mercado, e o Terceiro Setor representa a Sociedade Civil organizada (BRESSER PEREIRA, 1998). O termo Terceiro Setor, é usado para designar o conjunto de organizações da sociedade civil de direito privado[7], mas com fins públicos, cujos programas visam atender direitos sociais básicos, combater a exclusão social e mais recentemente, proteger o patrimônio ecológico, e que não tenham fins lucrativos (FERNANDES, 1994, p. 21).

Nas palavras de Fernandes (1994, p. 127), o Terceiro Setor seria uma espécie de intersecção entre os outros dois setores, ou seja, “privado, porém público”. A explanação feita por Tenório (2004, p. 32) é bastante ilustrativa a essa concepção:

“O Terceiro Setor diferencia-se do primeiro setor e do segundo setor, à medida em que desenvolve atividades públicas através de associações profissionais, associações voluntárias, entidades de classe, fundações privadas, instituições filantrópicas, movimentos sociais organizados, organizações não-governamentais e demais organizações assistenciais ou caritativas da sociedade civil” (TENÓRIO, 2004, p. 32).

Outras leituras em bibliografias escolhidas[8], inclusive em páginas da Internet[9], exceto pela utilização de outras terminologias em substituição ao Terceiro Setor não destoam da concepção apresentada acima. Paes (2001, p. 68), por exemplo, entende o Terceiro Setor como sendo “o conjunto de organismos, organizações ou instituições dotados de autonomia ou administração própria, que apresentam como função e objetivo principal atuar voluntariamente junto à sociedade civil visando ao seu aperfeiçoamento”.

Percebe-se claramente que esta concepção evidenciada acima é tida como hegemônica, mas existe contraposição, um viés contrário, como por exemplo, para Montaño (2002), para o qual o Terceiro Setor não passa de um instrumento neoliberal para consolidação de seu novo projeto hegemônico cujas diretrizes, no plano político, atacam a função reguladora e interventiva do Estado, desresponsabilizando-o – e desonerando o capital – de suas atribuições no trato às refrações da questão social. Levando em consideração os limites deste trabalho, não é possível entrar em questões contraditórias existentes no conceito de terceiro setor. Sabe-se que há defensores e há opositores, e que os conceitos aplicados variam muito do ponto de vista em que os autores analisam o tema[10].

Em relação à legislação no Brasil, a lei 9.790/99 é considerada como o Marco Legal do Terceiro Setor (NAVES, 2003), especialmente pela sua função de regulamentar as relações entre Estado e Sociedade Civil, instituindo o Termo de Parceria, através do qual ambos podem celebrar convênios, em outras palavras, as entidades qualificadas podem acessar recursos públicos diretamente. Segundo Gomes (1999, p. 103), essa legislação “tenciona fortalecer esse setor, a partir da instituição de um novo sistema classificatório e da criação de um instrumento jurídico específico para formalizar sua relação com o Estado”.

Vale lembrar por exemplo, com base em Ferrarezi e Resende (2002), que o titulo de Utilidade Pública Federal[11], fornecido pelo Ministério da Justiça e mesmo o Certificado de Fins Filantrópicos (que mais tarde mudou de denominação e virou “Entidades Beneficentes de Assistência Social[12]) continuam vigorando assim como as suas legislações correspondentes. No entanto, uma mesma entidade não pode acumular dois ou mais títulos, tendo que optar por um deles.

Tendo discorrido sobre o fenômeno do Terceiro Setor no Brasil, passa-se a discussão dos resultados da pesquisa realizada na Região Fronteira Noroeste, a fim de captar os principais aspectos da relação entre Estado e Organizações Assistenciais.


3.Resultados da pesquisa desenvolvida na Região Fronteira Noroeste

Este item se destina à exposição dos resultados da pesquisa de campo[13] nas organizações assistenciais e beneficentes da Região Fronteira Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, que possuem Titulo de Utilidade Pública Federal, aqui tratada como UPF e qualificação enquanto Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, aqui tratadas pela abreviação OSCIP. Como já referido estas organizações foram selecionadas a fim de comporem a amostra a partir dos dados encontrados no site do Ministério da Justiça, com base nos seguintes critérios: organizações com UPF ou OSCIP, localizadas neste território delimitado, finalidade estabelecida estivesse entre assistencial ou beneficente.

Cabe ressaltar que estão presentes nesse espaço territorial, muitas outras organizações com UPF na região, entretanto, possuem outras caracterizações, dentre elas: culturais, educacionais, comunitárias, religiosas, ambientais, hospitalares, etc., as quais, não se enquadrariam no tema definido para a pesquisa. Da mesma forma, na Região Fronteira Noroeste atualmente existem oito (8) entidades qualificadas como OSCIP, mas apenas duas são caracterizadas como assistenciais.[14]

As organizações pesquisadas, apesar de serem de finalidades assistenciais ou beneficentes, indicadas pelo Ministério da Justiça, com base em suas missões, disposições estatutárias e áreas de atuação, as atividades das mesmas na prática diferem muito. Visualiza-se, portanto, que a heterogeneidade demonstrada pelo Terceiro Setor, já referida e explicada nos capítulos anteriores do trabalho, se apresenta também nessa pesquisa, mesmo quando a amostra foi cuidadosamente delimitada a fim de englobar organizações com a maior proximidade e semelhança possível. No entanto, mesmo com o firme propósito de abranger apenas as organizações assistenciais, encontram-se no mesmo patamar de qualificação, entidades muito diferentes em suas práticas sociais e em suas denominações.

A espelho daquilo que já havia dito Cabral (2006), nas missões citadas pelas organizações pesquisadas sempre há a iminência de um problema e a entidade expressa a vontade de transformar essa realidade. Nas organizações pesquisadas, são bastante freqüentes as citações de missões, contendo a expressão de uma situação que demanda solução, uma mazela social preocupante, sendo que esta é pretendida e perseguida pelas ações realizadas. Melo (2009) realizou um estudo especificamente sobre a missão das ONGs, e dentre suas principais conclusões, é que aquelas organizações mais competitivas que buscam recursos através de projetos, e para isso precisam ser melhores que as concorrentes, a missão acaba virando uma coisa secundária, deixada de lado, pois a prioridade centra na captação de recursos como condição para a própria manutenção da entidade. Não é o caso das organizações assistenciais da Região Fronteira Noroeste, pois com base nas afirmações coletadas, as missões e objetivos previstos em regimentos internos e disposições estatutárias, são levadas extremamente a sério. Mas sabe-se que há muitas organizações que em nome da busca desenfreada por recursos externos, acaba descaracterizando a sua missão.

Outra observação pertinente, é que não há iniciativas de organização do Terceiro Setor na Região Fronteira Noroeste, a fim de que as mesmas pudessem montar um esquema de assessoria conjunta, parcerias, convênios na elaboração, encaminhamento e execução de projetos, ou que tomasse para si a responsabilidade de monitorar as oportunidades de captação de recursos, como por exemplo, as agencias financiadoras de Organizações da Sociedade Civil que abrem editais, e que muitas vezes nem chegam ao conhecimento das entidades da base.

As organizações pesquisadas, e supõe-se, as demais que não puderam ser incluídas na coleta de dados, não conseguem vislumbrar vantagens significativas na possibilidade de associação a organismos nacionais, como por exemplo, a Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais – ABONG. Essas organizações pesquisadas, unanimemente, afirmam que esse tipo de órgão de abrangência nacional, não supre as necessidades de assessoramento locais, e por essa razão, a filiação das organizações ao mesmo acaba não fazendo sentido.

As entidades normalmente referem às parcerias entre duas ou mais organizações, dentro de um mesmo município ou não, para potencialização das chances de sucesso na elaboração, envio e execução de projetos sociais a agências financiadoras, fundações, empresas, institutos, onde possam captar recursos para o sustento de suas atividades. São poucas as organizações que têm um profissional especialmente contratado para a captação de recursos, mas essa situação foi detectada na pesquisa. É comum que algumas entidades sem qualificação como OSCIP realizarem convênios e parcerias com organizações que já possuem essa qualificação a mais de dois anos, conforme exigência da Lei 9790/99, não necessariamente assistenciais, mas também ambientais, educacionais e pró-desenvolvimento microrregional. Dessa forma, as entidades UPF e mesmo aquelas que não tem nenhuma espécie de título, somente a inscrição nos Conselhos Municipais correspondentes, conseguem acessar também recursos públicos presentes nos ministérios, secretarias nacionais e estaduais.

No entanto, a esse respeito, há que se fazer uma exceção em relação às APAEs pesquisadas. Estas, em sua maioria, estão ligadas a Federação das APAEs do Estado do Rio Grande do Sul, e também a Federação Nacional das APAEs. Inclusive, esses dois órgãos possuem um projeto denominado “Apae em Rede”, que possibilita as APAEs municipais terem uma página na Internet. Nesse ponto, possuem uma organização bastante expressiva, inclusive com a realização de encontros estaduais e nacionais, conferências, seminários, etc., a respeito da questão do atendimento à pessoa portadora de deficiência.

Apesar da reclamação explicitada, da ausência de organização das entidades do Terceiro Setor na Região, como por exemplo uma Associação Regional, para potencializar as chances de captação de recursos, percebeu-se que nenhuma das entidades está cadastrada no Portal Social, uma importante ferramenta, de iniciativa da Fundação Mauricio Sirotski Sobrinho no papel de intermediar a relação entre potenciais doadores de recursos, e organizações da sociedade civil que necessitam recebê-las.

Uma característica comum a todas as organizações pesquisadas é a participação enquanto membro dos Conselhos Municipais correspondentes à sua área de atuação, como por exemplo, os Conselhos Municipais de Assistência Social (CMAS) e dos Direitos da Criança e Adolescente (COMDICA). Isso é evidente, devido a obrigatoriedade disposta tanto no Art. 9º da LOAS, como no Art.91 do Estatuto da Criança e Adolescente, que ratificam que nenhuma entidade assistencial ou de defesa e atendimento de crianças e adolescentes podem funcionar sem prévia autorização dos conselhos, sendo também submetidas à fiscalização por parte destes. Algumas não só tem a autorização para funcionar e são fiscalizadas, como também participam dos processos de deliberação e controle social[15] exercido pelos conselhos municipais. Raichelis (1998) salienta:

No caso da representação da sociedade civil, subdividida pela presença das entidades prestadoras de serviços assistenciais e de assessoria, organizações dos usuários e dos trabalhadores, a multiplicação e heterogeneidade dos atores sociais no cenário da Assistência Social aumentou a complexidade da interlocução pública (RAICHELIS, 1998, p. 88).

Nas entidades ligadas aos direitos da criança e adolescente, o COMDICA também utiliza as verbas do Fundo Municipal da Criança e Adolescente (FMDCA), em sua maior parte proveniente da dedução do imposto de renda de pessoas físicas (6%) e jurídicas (1%), para contrapartidas em projetos enviados pelas organizações assistenciais e beneficentes regularizadas perante o conselho. No entanto, são poucas as que recebem repasse direto do FMDCA. Nesse quesito, as organizações estão de acordo com a LOAS, que não exclui a importância das ONGs e entidades com outras denominações, possibilitando inclusive sua participação em Conselhos Municipais, Estaduais e Federal, conforme as constatações de Raichelis (1998). A autora salienta que a participação dessas organizações nos conselhos “traz a presença de um leque diversificado de experiências com segmentos populares e vem contribuindo para a ampliação do arco de alianças plurais dentro do chamado campo progressista” (RAICHELIS, 1998, p. 92).

Não são todas as organizações que trabalham nos moldes de execução de projetos com começo, meio e fim, ou seja, com data de início e de término, e ainda, com orçamento pré-definido, prestação de contas, e alcance dos resultados esperados pelas agências financiadoras. A maioria sustenta-se através de doações locais e subvenção da Prefeitura Municipal, sendo esta última quase irrisória em algumas situações, usando como atividade secundária a elaboração de projetos, pois como não é garantida a seleção e aprovação do mesmo, esse método é entendido pelas organizações como uma “loteria”, que tem chances de dar certo, assim como não dar, nas mesmas proporções.

O modo mais comum de parceria entre a esfera estatal e as organizações assistenciais e beneficentes pesquisadas é a subvenção mensal da Prefeitura Municipal dos seus municípios, e por vezes, a terceirização de serviços. Isso ocorre quando o poder público terceiriza algum serviço de sua responsabilidade, e o repassa às organizações assistenciais, pagando por isso um valor previamente determinado. Isso acontece nas instituições que abrigam, por exemplo, crianças e idosos.

As parcerias, propriamente ditas, com o Estado, não apenas em sua esfera municipal, mas também na estadual e federal, nos termos do marco legal do Terceiro Setor, são ainda muito frágeis, especialmente pelo número inexpressivo de organizações que possuem a qualificação como OSCIP e estão habilitadas a acessar recursos estatais. De acordo com os dados verificados no site do Ministério da Justiça, as OSCIPs do Rio Grande do Sul estão concentradas em cidades maiores, nas regiões metropolitanas, predominantemente urbanas, que evidentemente, ostentam níveis mais elevados de pobreza e exclusão social, onde o Estado não consegue dar a devida cobertura a toda as demandas existentes, necessitando muito mais da complementaridade do Terceiro Setor.

Algumas organizações recebem incentivos da esfera municipal, mas não em termos financeiros, e sim, através do repasse de materiais didáticos, merenda, etc. Um aspecto negativo salientado por algumas entidades, especialmente as que não têm relações mais substanciais com o poder público, é que não sabem como ter acesso às verbas estatais. Existe por parte de algumas das organizações assistenciais pesquisadas um desconhecimento quanto à legislação, as normas, os meios para acessar recursos, especialmente, não tem a devida informação sobre os títulos que credenciam a entidade para as parcerias.

Conforme Nascimento (2004) apud Santos (2007, p. 127) as organizações ainda não se libertaram da marca do assistencialismo, tendo “administração informal, praticamente amadora”. Hoje, em outras regiões e já em algumas organizações locais, há o engajamento de empresários e até executivos na gestão de entidades do Terceiro Setor, mas não é a situação da maioria dos casos na Região Fronteira Noroeste. Muitas são as instituições, que embora não intencionalmente, ainda não superaram as amarras do assistencialismo, da caridade, da benemerência, inclusive no nome da organização, ostentando por vezes palavras como “caridade”, “criança necessitada”, etc. Observa-se, por outro lado, uma inserção maior da noção de direito, e não de “dádiva”, nas organizações que tem equipes multidisciplinares, compostas por profissionais de diferentes áreas, inclusive o Assistente Social.

Há que se considerar que na região, exceto nas cidades maiores, como Santa Rosa, por exemplo, são poucos os industriários, comerciários e empresários em geral que ostentam capacidade de efetuar volumosas doações a organizações assistenciais. A despeito disso, todas as organizações pesquisadas afirmaram receber doações mensais, algumas eventuais outras fixas, do setor privado instalado na região. Mesmo que esses valores não sejam extravagantes, as organizações afirmam que possivelmente não sobreviveriam sem elas, pois somadas, constituem na maior fonte de renda de algumas entidades.

Groppo (2007), autor que discorre sobre a responsabilidade social empresarial[16] na ótica da mercantilização da sociedade faz importantes observações no que tange essa nova modalidade de doação. O autor aponta que embora o envio de verbas de indústrias e empresas para as organizações assistenciais possam ter muitas segundas intenções, como a questão do marketing, existe uma grande parcela que efetua as doações esperando retorno em termos de gratificação pessoal por estar colaborando com uma causa nobre, “fazendo a sua parte”.

Na Região Fronteira Noroeste, conforme a pesquisa, daquelas empresas privadas que efetuam doações, são poucas as que visam retorno em publicidade, e inclusive, existem algumas organizações que afirmam receberem contribuições generosas de particulares que fazem questão do anonimato. Conforme Groppo (2007, p. 156) “a solidariedade ou a verdadeira responsabilidade social só pode ser pensada como valor de uso, utilidade em prol das necessidades humanas, não mensurável em quantidades, mas apenas como qualidades avaliáveis, pelo bem estar individual e coletivo que proporcionam”.

As dificuldades apontadas pelas organizações transitaram dentro da esfera material e financeira. A ausência de um orçamento fixo, por exemplo, deixa a organização vulnerável, visto que em um mês as doações podem ser altíssimas, e no outro mês, não haver nenhuma, sendo impossível, portanto, adotar formas eficazes de gestão e planejamento.

A insuficiência dos recursos também merece destaque, pois devido a isso, muitas organizações não conseguem atender um número abrangente de beneficiários, tendo que adotar critérios de exclusão e seletividade, contrariando a sua missão, muitas vezes, de inclusão social, problema esse já citado pela pesquisa de Cabral (2006) como uma das grandes contradições enfrentadas pelas organizações da sociedade civil.

É de origem financeira também a queixa quanto à impossibilidade de proporcionar maior qualidade às ações empreendidas, por insuficiência de recursos humanos, muitas vezes com contratos de trabalho precarizados, ou voluntariado com participação esporádica, de recursos materiais, pois muitos equipamentos são caros e não há excedentes para adquiri-los, sendo este o principal problema encarado pelas Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais, por exemplo, que em suma, gostariam de proporcionar terapias alternativas e diferenciadas aos seus beneficiários portadores de deficiência.

A impossibilidade de ampliar as atividades oferecidas aos beneficiários também recebeu alusões na pesquisa, no entanto, percebe-se que todas essas reclamações relativas às principais dificuldades enfrentadas, são decorrentes direta ou indiretamente, da insuficiência orçamentária e a instabilidade da chegada desses recursos.

A despeito disso, são várias as considerações de otimismo por parte dos respondentes, que a despeito das dificuldades financeiras e materiais enfrentadas pelas organizações, acreditam que as mesmas são de extrema importância para o local onde atuam. Uma das organizações, que realiza trabalho voltado à recuperação de dependentes, expõe enfaticamente que muitos de seus internos não têm condições de pagar pelo tratamento, e por isso, fazem isso gratuitamente, graças à organização que os acolhe. Essa organização salienta que se não existissem comunidades terapêuticas, não havendo lugar para todo mundo nos hospitais públicos e não tendo a maioria condições de tratar-se em clínica privada, a sociedade estaria muito mais vulnerável aos efeitos nocivos da drogadição.

A pesquisa aqui exposta coincide com a de Cabral (2006), quando constata que as organizações assistenciais e beneficentes prestam serviços e destinam bens, mas almejam de alguma forma, uma maior inserção na lista dos repasses do governo, especialmente o municipal. Todas as entidades que responderam a pesquisa, apontaram, no último questionamento, que as dificuldades enfrentadas internamente, poderiam ser superadas se mais recursos estatais fossem destinados às suas organizações, aumentando assim, quantitativa e qualitativamente, o teor dos seus serviços.

Outras soluções foram apontadas, mas em ordem secundária, por exemplo, a organização de um sistema de responsabilidade social único, onde todas as empresas efetuassem as doações, e os projetos fossem contemplados, primeiramente pela viabilidade, mas também respeitando uma espécie de “fila”, a fim de que todas as organizações pudessem ter oportunidade de acessar. A organização que referiu essa sugestão acredita que as entidades que ficam com os valores destinados a projetos comunitários e sociais, são aquelas estruturadas e que tem condições de pagar pelo serviço de assessoria para elaboração de projetos, coisa que essa entidade não teria como fazer.

Há uma alusão, portanto, a uma “hierarquia” de ONGs, surpreendentemente, ou seja, acredita-se que são sempre as mesmas organizações que recebem os valores empenhados para projetos sociais. Um respondente de uma das organizações afirmou que já tentou inúmeras vezes enviar projetos para uma centena de institutos, empresas, fundações, etc., no entanto, jamais foram contemplados, e os projetos selecionados são de organizações localizadas nos grandes centros, ou seja, cidades grandes. Nas palavras do respondente, seria como se as agências financiadoras não acreditassem que em municípios como os da Região Fronteira Noroeste, de pequeno porte, tranqüilos e predominantemente rurais, tivesse realmente situações de pobreza, exclusão social e violação de direitos.

Na verdade, sabe-se que em outras áreas, especialmente na questão do desenvolvimento sócio-econômico, a Região Fronteira Noroeste sofre para se adequar às exigências do mercado, podendo inserir-se nele. O fator da distância dos grandes centros, aliada a um conjunto de outros fatores de desvantagem, se torna entraves para que a região possa se desenvolver. Na presente pesquisa, pode-se fazer uma analogia com essa realidade: as organizações assistenciais e beneficentes aqui presentes, não conseguem “competir” com entidades de igual teor localizadas em áreas cuja questão social é mais visível e latente. São as contradições que se encontram no contexto da pesquisa e do trabalho.

Alguns dos respondentes, evidentemente, não possuíam aprofundamento intelectual no debate sobre o Terceiro Setor, não tendo acesso às produções teóricas acadêmicas e de estudiosos do tema, tendo assim condições de elaborar uma opinião própria sobre o debate protagonizado pelos críticos, especialmente no que tange o caráter “imediatista” das ações das ONGs e semelhantes, atuando na urgência, na focalização, não oferecendo proposições de atuação nas causas do problema, para assim poder erradicá-lo. No entanto, a resposta de conteúdo simples obtida da maioria dos entrevistados, responsáveis pelas organizações assistenciais, é bastante ilustrativa: quem está de fora do trabalho de uma organização desse teor, não tem conhecimento prático para discorrer sobre os problemas e desafios. Grosso modo, é fácil colocar defeito quando se está de fora.

Encontram-se considerações semelhantes no trabalho de Barbosa (2006) que analisa justamente os discursos antagônicos sobre o Terceiro Setor. Ela ressalta que quem fala “de fora” não vislumbra impactos de transformação social abrangente, que realmente tenha repercussões no sistema econômico e social, na própria questão social, mas para quem fala de dentro “o que realmente importa é a discussão ética, acima da econômica e política: dar de comer primeiro, debater depois; para eles, os que passam necessidade têm que ser atendidos, o mais depressa possível: quem tem fome, tem pressa”[17] (BARBOSA, 2006, p. 99).

Nessa perspectiva, poder-se-ia dizer que o que difere o debate contra e o debate à favor do Terceiro Setor, é o ângulo da análise, mais do que os aspectos ideológicos ou opinativos. Ainda, outra constatação importante de Barbosa (2006, p. 103) é que “ambas as perspectivas apresentam conclusões verdadeiras sobre a temática, se observado o caminho analítico percorrido por cada pólo”. Enfim, é fácil perceber que os defensores do Terceiro Setor amparam seus argumentos na prática da vida cotidiana, no trabalho que realizam.

Se uma organização, que desenvolve trabalhos de recuperação de dependentes químicos e etílicos, conseguir propiciar que cinco indivíduos se libertem da dependência, será uma imensa conquista que gratificará a todos que trabalham por isso, de modo que fica complicado realizar reflexões profundas, em meio a essa prática cotidiana, sobre as causas da drogadição e como essas organizações poderiam atacar essas causas, de modo abrangente. Como ressalta Barbosa (2006, p. 107), os trabalhadores do Terceiro Setor, absorvidos pelas suas atividades diárias, não têm tempo para observar a configuração global da questão, em meio a trabalhos difíceis, como esperar que participantes de ONGs parem para pensar sobre sua funcionalidade para o projeto neoliberal de redução do Estado, ou ainda, a instrumentalização dessas iniciativas para os interesses do capital?

Algumas das entidades entrevistadas, por exemplo, reiteram uma das conclusões a que já havia chegado Losekann (2005), de que as mesmas têm consciência de que desempenham um papel de sanar a lacuna deixada pelo Estado no que tange o atendimento às pessoas portadoras de deficiência, e não deixam de salientar que essa função devia ser preenchida pelo Estado. Nas palavras de um dos respondentes entrevistados, se o Estado fosse cumpridor de todas as suas obrigações em quantidade e qualidade, a existência de Organizações da Sociedade Civil seria completamente dispensável.

Propositadamente, no intuito de criar uma ligação com as considerações finais que virão a seguir, deixou-se por último a questão da inserção dos profissionais assistentes sociais nessas organizações assistenciais e beneficentes. A maioria das organizações assistenciais pesquisadas possui em sua equipe uma assistente social, no entanto, esse vínculo não é diretamente com a entidade. Em muitas delas, os profissionais do Serviço Social tem quatro, oito, dez horas de cedência da Prefeitura Municipal de seus respectivos municípios de atuação. Outras contratam profissionais, mas em geral não passa de dez horas semanais, não constituindo vínculo empregatício com base na Consolidação de Leis Trabalhistas – CLT, mas sim, como profissionais autônomos.

Nessas organizações, o profissional que trabalha esse número de horas semanais, tem outros empregos no tempo excedente, em outras organizações. Nesse aspecto, Carneiro (2005) já havia concluído em seu estudo, que não só o vínculo empregatício do Assistente Social que fica prejudicado no Terceiro Setor, mas também outras questões fundamentais para uma qualidade satisfatória de trabalho, como o espaço físico adequado, com condições de atender em sigilo, os recursos materiais disponíveis, abrangendo equipamentos, automóvel, etc., a remuneração também é defasada, e especialmente a não relação entre jornada de trabalho, salário e tempo de serviço.

Como não era o objetivo da pesquisa, não foi realizado um levantamento de todas essas questões que foram pesquisadas por Carneiro (2005) no que tange as relações de trabalho dentro das organizações do Terceiro Setor para o Serviço Social. Por isso, a única observação concernente às organizações pesquisadas da Região Fronteira Noroeste é a questão das horas, ou seja, quando há assistente social trabalhando na entidade, não é por contrato formal (CLT) e com pouquíssimas horas de trabalho. Sem entrar no mérito da questão, mas a título de opinião e com base na experiência empírica, é praticamente impossível para um profissional estabelecer vínculos com os usuários, conhecer detalhadamente a demanda, realizar diagnóstico, e ter condições de intervir com qualidade tendo apenas quatro, oito, dez horas semanais.

No entanto, com referência a essa amostra, percebe-se claramente que, se existe a afirmação que o Terceiro Setor significa expansão do espaço de trabalho do Serviço Social, disponibilizando mais vagas e abrindo diferentes possibilidades, na prática é mais correto supor que as vagas de trabalho nessas instituições são precárias, e as condições que o profissional tem para atuar não são exatamente as melhores, especialmente no que diz respeito ao contrato de trabalho.

Em linhas gerais, são essas as observações a que a pesquisa de campo originou, um esforço de sistematizar a enorme quantidade de dados coletados nas dezoito organizações pesquisadas, salientando que não seria possível expor todas as opiniões e números em suas particularidades, pois as mesmas têm realidades, missões, beneficiários, objetivos e práticas cotidianas diferentes. A seguir, apresentam-se as considerações finais acerca do trabalho.


4. Considerações Finais

É necessário aprofundar a questão do Terceiro Setor na Região Fronteira Noroeste. Existem muitos trabalhos acadêmicos, livros, artigos, etc. a respeito da temática do Terceiro Setor, entretanto, poucos deles tratando da Região Fronteira Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. É preciso, então, realizar estudos e pesquisas mais abrangentes, englobando por exemplo, as outras organizações com outras finalidades, sejam elas culturais, ambientais, educacionais, etc., também fazer parte do Terceiro Setor, e demandam atenção acadêmica e intelectual.

Da mesma forma, é necessário expandir o conhecimento não só sobre a relação Estado/Sociedade Civil, tratada neste trabalho, mas também outros aspectos relevantes desse tema, como a questão do capital social, desenvolvimento regional, geração de trabalho e renda através da economia solidária, fortalecimento da democracia, potencialização da participação da sociedade civil não só em deliberações, fiscalização e controle, mas também na execução de programas sociais.

Enfim, o termo Terceiro Setor, com suas variações e conceitos distintos, é um potencial desencadeador de polemicas, e por isso mesmo se torna um campo fértil, não só para as ciências sociais, mas também para outras áreas de conhecimento humano. Conforme o exposto durante o trabalho, não há como negar ou se furtar a reconhecer a profunda e indissolúvel aliança entre o Estado Moderno e o capital, desde suas origens, tendo como ponto de partida a Revolução Francesa de 1789. Dessa relação subordinada, originaram-se diferentes modelos de Estado (Liberal, Welfare State, Neoliberal), mas todos eles com um aspecto em comum: a prioridade direta de atendimento aos interesses do capital, sendo que todos os demais foram secundários, de segundo plano.

Sabemos, por exemplo, que embora o Welfare State tenha proporcionado uma grande margem de conquistas aos trabalhadores – não sem luta, evidentemente – não é necessário ser um grande pensador para verificar que esse modelo de Estado possuía uma funcionalidade direta ao capital: prestar socorro ao sistema, controlando as revoltas populares e movimentos trabalhistas.

Por outro lado, sabe-se que, embora a desigualdade entre os seres humanos se dá a partir da invenção da propriedade privada (ENGELS, 1997), é com o capitalismo que o conjunto de problemas sociais se agravam, dando origem ao que entendemos por questão social, que conforme Castel (2004), é produto do conflito entre capital e trabalho. Conforme o capitalismo foi passando de fase, evoluindo para um sistema mais complexo e dominante, as refrações da questão social foram se sofisticando, outras foram surgindo, e demandaram a intervenção do Estado.

As políticas sociais, portanto, são frutos desse processo, como já foi referido no capítulo I, e cada modelo de governo sustentava seu padrão de resposta às manifestações da questão social. Como vimos, para Montaño (2002), o Terceiro Setor, termo que o autor usa entre aspas, é o padrão emergente para a intervenção nas refrações da questão social, funcional ao capital, integrado a um conjunto de outras estratégias que compõem o Projeto Neoliberal de reestruturação capitalista, que visa entre outras coisas, mas principalmente, a redução da capacidade interventiva do Estado, inclusive na área social.

Seria ingênuo, pois, supor que o Terceiro Setor, ou outras denominações afins, com a expansão das organizações da sociedade civil, especialmente aquelas denominadas com a sigla ONGs, fizesse parte de um processo imune a essa mesma lógica capitalista, e estando dentro da sociedade atual, regulada pelos princípios inerentes ao capitalismo, não fosse funcional a ele. Ao longo da história, tudo aquilo que não é útil ao capital ou que de alguma forma o ameace, é discretamente abafado até que a iniciativa desapareça. Analisando por esta linha, é possível dizer que se o Terceiro Setor não fosse funcional ao capitalismo, não tivesse sua utilidade frente aos interesses do capital, representando ganhos a esse último, já teria se extinguido, logo nos primeiros passos.

Ao contrário, o capital não só “deixa” que o Terceiro Setor ganhe corpo e visibilidade, como também apóia, incentiva, financia. Prova disso é a inserção do Estado nesse processo, com a possibilidade de efetuar parcerias com as organizações da sociedade civil. Montaño (2002), que tem uma visão catastrófica, praticamente apocalíptica, do futuro da proteção social nas mãos do Terceiro Setor, classifica isso como o “canto da sereia”, que é muito bonito, atrai, mas ao final, leva à tragédia.

Buscando evitar simplismos e exageros, erros comuns quando se analisam as situações por apenas uma ótica, procura-se minimizar esse conceito pessimista de Montaño (2002), sobre o que se escreve acerca das respostas às seqüelas da questão social protagonizada pelas organizações da sociedade civil. Existem outros autores, conforme revisto no capítulo II, que estão no outro extremo, e consideram o Terceiro Setor como a forma inovadora de fazer frente às mazelas produzidas pelo capitalismo, como espaço de fortalecimento da democracia, de participação da sociedade civil, de enfrentamento à questão social.

Nesse tocante, é oportuna uma observação feita por uma autora clássica do Serviço Social, Marilda Vilela Iamamoto, um ícone no corpo intelectual da profissão, quando discorre acerca da atitude fatalista e da atitude messiânica por parte dos assistentes sociais e da categoria. Por atitude messiânica, Iamamoto (2001, p. 22) entende a visão heróica do Serviço Social que reforça a vontade política dos sujeitos sem confrontá-la com as possibilidades e limites da realidade social.

A atitude fatalista é apresentada por Iamamoto como aquela que se posiciona indiferente, “como se a realidade já estivesse dada em sua forma definitiva (...) que pouco se pode fazer para alterá-la”. Fazendo uma analogia com as defesas exageradas do Terceiro Setor – a santificação, para Montaño (2002) – e o ceticismo convicto dos autores de orientação dialético-marxista, pode-se dizer que não é prudente se posicionar em extremos: não significa que o Terceiro Setor é o milagre, o personagem herói que vai solucionar todos os problemas, preencher todas as lacunas, concertar o mundo, mas também não se deve atribuir a ele a vilania pela desregulamentação do Estado e minimização deste nas intervenções sociais de sua responsabilidade constitucional.

Pensa-se que as transformações societárias evidenciadas, sobre as quais discorre Netto (1996), as profundas conseqüências da mudança de orientação do capitalismo após os anos 70, a profusão de novas tecnologias, novas formas de comunicação, novos parâmetros de relação entre seres humanos, a globalização, as mudanças no mundo do trabalho, processos estes concomitantes e entrelaçados, deram um nó na cabeça de muitos intelectuais, que não estão imunes nem ao exagero nem ao erro.

Verifica-se uma profusão de novos termos, novos conceitos, novas explicações para tudo, em que cada autor se debate para explicar de sua maneira e de acordo com sua linha teórica as mudanças de nossa época. Chegamos, apenas para citar um exemplo, ao extremo de ter de ouvir que havíamos chegado ao “fim da história”. Expressão essa que se deve a Fukuyama, leva a explicação de que as possibilidades humanas haviam chegado a tal patamar de evolução, que a partir de então, não haveria mais mudanças significativas, ou seja, a expectativa de um “não-futuro”.

Sem entrar no mérito da questão, esse exemplo da tese defendida por Fukuyama é bem ilustrativo do ponto a que chegaram os pensadores contemporâneos na tentativa de elaborar a teoria mais condizente com os nossos tempos. Sabe-se que a História, e esse é um fato que nem precisa de argumentação, não acabou e não acabará, pois como o próprio Marx dizia, a primeira condição para o início da história da humanidade é a existência de seres humanos. Sendo assim, é muito óbvio que para que se chegue ao “fim da história”, pretendido por Fukuyama, a condição primeira é a inexistência de seres humanos.

Tudo isso causa inquietação, e o Terceiro Setor é um dos temas que mobiliza a comunidade intelectual a produzir conceitos, que estão muito longe de serem consensuais, e que provocam agudas polêmicas. A história muda a cada dia, a cada segundo, e sempre será assim desde que haja seres humanos circulando sobre este planeta. O fenômeno do Terceiro Setor, exemplificado e representado aqui pelas organizações assistências pesquisadas na Região Fronteira Noroeste do Rio Grande do Sul, é mais um movimento dessa história que os homens fazem acontecer a cada dia.

A globalização teve sua parcela de responsabilidade pela expansão do fenômeno do Terceiro Setor, sendo que este teve maior expressão nos estados norte-americanos, e em pouco tempo passou a existir em grande parte das nações, inclusive os países latino-americanos. No Brasil, não pode ser considerado simplesmente como uma cópia do modelo americano, mas a influência, especialmente na questão das ONGs surgidas depois da década de 90, está clara e evidencia a penetração dos hábitos e formas de organização internacionais no país.

O ceticismo em relação à capacidade do Terceiro Setor superar essa condição atual, de inegável funcionalidade ao capital, poderia ser explicado pelo que Habermas (1987) classifica como esgotamento das energias utópicas. Enfim, como já havia salientado Bobbio (1982) no século passado os “profetas” diziam que a tendência de futuro da humanidade era a liberdade, essa era uma convicção utópica que de que o destino da sociedade era ser livre. No entanto, isso não aconteceu, houve a derrocada do socialismo real, a vitória agigantada do capitalismo, e hoje, “profetas” semelhantes, sem nenhum pingo de utopia, prevêem um futuro sem realizações fantásticas, e sim, repleto de obscuro domínio e de desolado conformismo.

Enfim, o título escolhido para o trabalho já remete a uma questão central: afinal, as organizações assistenciais da Região Fronteira Noroeste, agem de forma paralela ou complementar ao Estado?

Vimos ao longo deste trabalho que, ao menos legalmente, as organizações assistenciais, qualificadas como OSCIP, UPF ou mesmo aquelas que funcionam apenas com autorização do Conselho Municipal de Assistência Social, não oferecem paralelismo, oposição ou fragmentação a política de assistência social, já que a regulação de seu funcionamento e a própria condição de sua existência estão previstas na Constituição Federal, na LOAS e também no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. A Lei do Terceiro Setor, explanada mais detalhadamente no item 2.2 do segundo capítulo deste trabalho, não oferece oposição aos princípios estabelecidos na LOAS, no sentido de que esta última dispõe sobre o direito do cidadão vítima de exclusão social receber atendimento e ter assegurada a sua condição de cidadania (REGULES, 2005).

A oposição à LOAS e aos princípios constitucionais, que estabelecem a Assistência Social como direito inserido no tripé da seguridade social, não é feita pelas organizações assistenciais do Terceiro Setor, que simplesmente oferecem complementação e parceria às esferas estatais na execução das responsabilidades, que continuam sendo do Estado, mas que infelizmente tem fracassado consecutivamente em seu projeto de proteção social.

Esta oposição é feita sim, em outras situações que pouco ou nada tem a ver com o Terceiro Setor, por exemplo, quando gestores públicos usam-se da Política de Assistência Social para praticar o paternalismo e o clientelismo, com fins eleitoreiros. São desrespeitados os princípios da LOAS, quando primeiras-damas tem gabinetes que atuam paralelamente à ação dos profissionais Assistentes Sociais, incentivando e perpetuando a ótica do favor, da esposa “boazinha” do Prefeito que realiza atos de “bom coração”.

Se há limites à concretização da Lei Orgânica de Assistência Social e do projeto ético-político da categoria dos assistentes sociais no contexto da precarização da ação estatal e sua “passagem” para a sociedade civil, esses desafios não são menores ou mais abrandados nos espaços públicos, onde a cultura política impregnada e arcaica no Brasil se constitui em obstáculo maior do que a própria inserção das ideologias neoliberais “abrasileiradas”.

A prestação de políticas públicas sociais não pode ser considerada como monopólio do Estado, não pode ser entendido como função única e exclusiva das esferas estatais, pois mais do que nunca, elas transitam entre o mercado, o Estado e a Sociedade Civil, ou seja, através de projetos executados no interior de empresas, como as políticas empresariais de aumento de produtividade dos funcionários, que incluem serviços que propiciem o bem-estar deste e de sua família, bem como através das organizações da sociedade civil. Sabe-se que há muito tempo essas organizações existem, primeiramente em um caráter filantrópico, religioso e caritativo, hoje em moldes diferentes, com novas roupagens, mas de qualquer forma, a inovação se encontra justamente na articulação que toma corpo e se fortalece, entre os três setores aqui referenciados.

As ONGs precisam direcionar um rumo para conseguirem superar a imediaticidade. Concorda-se com Barbosa (2006) quando diz que é necessário que as organizações assistenciais protagonizem um ataque certeiro às raízes do problema, e gerar resultados duradouros, para além do urgente, de efeito emancipatório.

Usando das palavras de Boaventura de Souza Santos, é importante lembrar que o que existe hoje não é medida para o que possa existir. Se o capitalismo é hoje o sistema hegemônico, quem garante que ainda será daqui a vinte, cinqüenta, cem anos? Se o Estado hoje assume essas características, não significa de forma alguma que ele sempre ostentará a mesma configuração. Se a sociedade hoje é absolutamente desigual, e encontramos perspectivas desoladoras de um futuro aterrador, não significa que essa situação é imutável, que é inútil lutar contra ela. Conforme aponta Demo (2003, p. 108), “nem a história passada tão desigual é argumento no sentido de que no futuro só poderia existir sociedade desigual”.

Nesse mesmo sentido, resgato a obra de Boaventura de Souza Santos, intitulada “A crítica da razão indolente contra o desperdício da experiência”. Este autor, embora pouco utilizado pelo Serviço Social, e até rejeitado por aqueles que têm uma tradição marxista mais intransigente, é, nessa e em outras obras suas, perfeito para ser usado na elaboração dessas breves conclusões, na medida em que suas explanações são muito mais abertas e responsáveis, bem menos radicais e mais diplomáticas, e que sempre direcionam para uma solução.

Em Santos (2000), encontra-se um apelo para que as boas experiências da humanidade, sem distinções, sejam levadas em consideração para a elaboração de um futuro com outras dimensões, ou seja, um apelo para que essas experiências não sejam desperdiçadas. Nesse sentido, talvez o Terceiro Setor precise ganhar caráter de movimento social, e realizando, conforme as disposições de Santos (2000), uma reciclagem de experiências de lutas hegemônicas passadas que foram abandonadas, não aproveitadas.

Segundo esse autor, embora as forças dominantes mantenham sua hegemonia, as lutas contra ela sempre foram e ainda são intensas, e pelas lições deixadas por elas, é possível traçar caminhos anti-hegemônicos, rumo a utópica libertação da sociedade, da humanidade. E quem será capaz de afirmar com toda a convicção, sem medo de errar, que o Terceiro Setor, as iniciativas que cada vez mais brotam da sociedade civil, não virão a ser um dia um protagonista de uma luta anti-hegemônica, contra a dominação do capital, como já o é hoje as iniciativas de economia solidária/alternativa?

Já diria Marx, em o “O Capital”, a bíblia do socialismo, que o limite do capitalismo é o próprio capital. Sua ambição pela acumulação é tão extrema, que pode vir a destruir as condições que lhe proporcionariam estável sustentabilidade. É por isso que o capital entra tanto em crise. Por exemplo, o proletariado só não venceu o capitalismo na primeira fase dos movimentos sociais, por que se contentaram com as migalhas, as esmolas pacificadoras do Estado de Bem Estar Social. Eles não almejavam serem livres do capital, e sim, queriam apenas sobreviver dignamente. Isso é que Santos (2002) chama de “baixas expectativas”.

Talvez realmente tenhamos, na organização da sociedade civil, a que denominam “Terceiro Setor”, a existência do mesmo problema: as baixas expectativas. Como já referido no texto, as organizações aqui pesquisadas, e com certeza uma grande fatia desse universo de organizações, não pretende livrar-se do capitalismo para sempre, e na verdade, nem pararam para pensar nisso, a única meta é dar de comer a quem tem fome, ajudar a quem precisa, estender algum auxílio que minimize o sofrimento daqueles que se encontram em precárias condições, mas não se mergulha na raiz do problema, não se faz um movimento reflexivo a fim de responder a questão: por que essas pessoas são pobres e excluídos? O que é possível fazer para que eles superem essa condição e passem a não precisar mais de ajuda?

 A hipótese levantada logo no início do trabalho era de que há a possibilidade sim de um consenso, de valorização da sociedade civil em forma de parcerias com o Estado, ampliando assim as noções de democracia, a participação da sociedade, sem que as Organizações assistenciais ajam como substitutivas da ação estatal, e sim, complementarem suas atividades de forma a melhorá-las. O Estado, inegavelmente, deixa lacunas, são demandas não atendidas, que ficariam totalmente desprotegidas se não fosse a atuação das organizações do Terceiro Setor, e sabe-se que a palavra demanda aqui pode ser entendida como muitos e muitos seres humanos com necessidades a serem supridas, com direitos a serem garantidos.

Assim, acredita-se com base nos estudos realizados que as Organizações Assistenciais e Beneficentes, assim como outras que possuem diferentes finalidades, podem atuar em parceria com o Estado sem que isso signifique substituição ou transferência de deveres. Assim como as organizações assistenciais da Região Fronteira Noroeste não tem caráter de movimento social e nem sonham se livrar do capitalismo, elas também não pretendem e nem sequer cogitam a hipótese de um dia, serem substitutas do Estado em suas funções. Elas simplesmente pretendem suprir necessidades, sanar lacunas deixadas pelo poder público no atendimento às refrações da questão social.

Enfim, para Boaventura de Souza Santos, um autor contemporâneo, um outro mundo é possível, vencer o capitalismo é possível, mas não sem uma sociedade civil forte e organizada. E talvez aquilo que hoje chamam de Terceiro Setor, pode vir a ser, com “altas expectativas”, a semente de uma nova ordem social. Porém, essa reflexão foge aos limites do trabalho, e aqui preferimos deixar algumas sugestões de ordem prática para potencializar e melhorar a relação Estado/Sociedade Civil e melhorar a própria qualidade dos serviços e atendimento prestado:

A) Criação de uma Associação Regional de Organizações da Sociedade Civil: uma entidade regional, que integrasse todas as demais organizações da Região Noroeste, poderia ser a solução para muitas dificuldades, especialmente as de cunho técnico (elaboração de projetos, assessoria jurídica, etc.), e no que tange a captação de recursos, pois teria maior peso perante as comissões de avaliação para destinação de recursos das agências financiadoras.

B) Capacitação/qualificação dos administradores e/ou diretores: a carência em conhecimento sobre a legislação e normas geralmente aplicáveis ao Terceiro Setor foi sentida nas falas dos entrevistados, de modo que seria necessário iniciativas (cursos, seminários, eventos, etc.) visando uma maior qualificação dos diretores e administradores.

C) Busca pela qualificação como OSCIP: O Titulo de Utilidade Pública Federal não engloba a possibilidade de acessar recursos públicos, nem dá o direito às entidades de firmarem termos de parceria (convênio) com esferas estatais. Por isso, seria interessante que um número maior de entidades aderissem a Lei 9.790/99, acessando a qualificação como OSCIP. O impedimento maior em alguns casos seria a vinculação religiosa que algumas organizações, bem como outras regras determinadas nessa legislação, como por exemplo, a impossibilidade de ter em seu conselho diretor, membros que ocupem cargos públicos (estatutários, comissionados ou com função gratificada).

D) Parcerias Internas e Externas: A questão do envio dos projetos para captação de recursos em agências financiadoras, empresas, fundações, institutos, etc., também tem suas determinações. Por exemplo, projetos que tenham parcerias firmadas com uma ou mais entidades, tem preenchido o critério de sustentabilidade, sendo maiores as chances de seleção. Então, é interessante que cada vez mais as organizações se articulem e formem parcerias, tanto dentro dos municípios quanto entre organizações de vários municípios.

E) Publicidade/Divulgação: As organizações poderiam estar utilizando o Portal Social como ferramenta de divulgação e de captação de recursos, assim como desenvolvendo estratégias de publicidade.


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Notas

[1] Esta nomenclatura é definida pelo Conselho Regional de Desenvolvimento – COREDE, sendo considerada oficial, no entanto, essa região também é conhecida como “Região da Grande Santa Rosa”, pelo fato de Santa Rosa ser considerada a referência de localização, população, economia, etc. (ROTTA, 2008).

[2] De acordo respectivamente, com as Leis 9.790/99 e Lei 91/1935.

[3] http://www.mj.gov.br

[4] A mudança no perfil demográfico é caracterizada por Netto (1996) por dois fatores: o aumento da expectativa de vida e a redução da taxa de natalidade, que faz com que haja mais pessoas idosas e menos pessoas jovens.

[5] Embora Netto (1996) assuma que existe uma cultura de consumo, ele não compactua com a teoria de Sociedade de Consumo, cujo interlocutor é Baudrillard.

[6] O Consenso de Washington foi uma reunião de cúpula onde o grande capital, orientando-se nos pressupostos da teoria neoliberal, passa aos países latino-americanos o “dever de casa”, nas palavras de Montaño (2002), de adequação ao projeto neoliberal de reestruturação capitalista.

[7] Segundo o Art. 16 do Código Civil Brasileiro, as pessoas jurídicas de direito privado são:

I – as sociedades civis, religiosas, pias, morais, cientificas ou literárias, as associações de utilidade pública e as fundações; (...) (SZAZI, 2001, p. 144).

[8] Como exemplo destas, cita-se Bresser Pereira (1998), Bresser Pereira e Grau (1999), Naves (2003), Szazi (2001), Gohn (1998), Coelho (2000), Rico (1998), etc.

[9] A saber, os sites consultados são: www.portaldovoluntário.org.br, www.filantropia.org.br, www.programavoluntarios.org.br, www.abong.org.br, www.rits.org.br, www.gife.org.br.

[10] Sobre isso, é interessante citar a conclusão a que chegou Barbosa (2006), de que os contrastes de opiniões existem mesmo dentre os estudiosos da mesma ala. Para ela “é nítido também, o choque entre o argumento daquele que está inserido na atividade no Terceiro Setor, com relação à fala daquele estudioso que não atua diretamente na área das ONGs, por exemplo” (BARBOSA, 2006, p. 99).

[11] A principal diferença entre OSCIP e UPF segundo o Manual de Entidades Sociais (MJ): “A DECLARAÇÃO DE UTILIDADE PÚBLICA era originalmente apenas um ato através do qual o Poder Público se valia para condecorar instituições privadas que prestavam serviços relevantes à sociedade”(...) “Já a qualificação como OSCIP é pré requisito para a assinatura de um Termo de Parceria entre a entidade privada qualificada e o Poder Público. O objetivo da lei foi estabelecer critério para organização das contratações de entidades sem fins lucrativos que atuam em parceria com o Estado” (ROMÃO, 2007, p. 20).

[12] ver Lei 8.742, de 8 de dezembro de 1993;

[13] A Pesquisa de Campo foi realizada entre os dias 26 de outubro a 09 de novembro do ano de 2009, e a análise dos dados se deu logo após o fechamento de toda a coleta, compreendendo as informações prestadas por todas as organizações escolhidas.

[14] No intuito de preservar as entidades pesquisadas, optou-se por não usar neste artigo suas respectivas denominações.

[15] Controle Social é o elemento desse processo dialógico que faz a conexão com a sociedade civil, permitindo a mudança e arbitrando os interesses públicos. Entendido como fiscalização da sociedade civil sobre o Estado e das comunidades envolvidas nas instituições privadas de interesse público (CABRAL, 2006, p. 36).

[16] Segundo Paoli (2002) apud (Groppo, 2007), “responsabilidade social é um espaço filantrópico organizado por empresas nacionais e empresas internacionais multinacionais, pretendendo ação civil e voluntária diante das carências da população pobre do país”.

[17] A autora usa a frase do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, na campanha Natal Sem Fome do ano de 2005, que na opinião dela, sintetiza a as intenções: “amenizar o problema agora, para pensar em saná-lo depois” (BARBOSA, 2006, p. 109). 


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ZALAMENA, Juliana Costa Meinerz. As organizações assistenciais do terceiro setor na região fronteira noroeste do Rio Grande do Sul: paralelidade ou complementaridade à ação estatal?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3558, 29 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24063. Acesso em: 8 maio 2024.