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Exigência do comum acordo para a propositura do dissídio coletivo: inconstitucionalidade principiológica

Exigência do comum acordo para a propositura do dissídio coletivo: inconstitucionalidade principiológica

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Quase sempre é impraticável a obtenção do consenso para a propositura do dissídio coletivo econômico. O não preenchimento do pressuposto para a apresentação do conflito ao Judiciário pode gerar uma situação de perpetuação da contenda coletiva com enormes repercussões sociais.

“O fim do Direito não é abolir nem restringir, mas preservar e ampliar a liberdade”.

John Locke

Resumo: Esta monografia tem como principal objetivo a análise da constitucionalidade da exigência do comum acordo para a propositura do dissídio coletivo econômico. Partindo-se de um exame dos conflitos laborais, verifica-se que as ações que têm por objeto os conflitos coletivos de trabalho são chamadas de dissídios coletivos. Dentre eles, destacam-se as instâncias econômicas, também chamadas de dissídios de interesse, que visam a criação de novas normas e condições do trabalho. Em seguida, analisa-se o poder normativo da justiça laboral, atipicamente exercido quando da solução dos ditos dissídios, restando nítida a atuação legiferante dos tribunais trabalhistas. São tecidos breves comentários sobre a sentença normativa, fruto do exercício desse poder pela Especializada. Perpassando por exposições sobre a reforma implementada no judiciário pela Emenda Constitucional nº. 45/2004, percebe-se que o poder normativo da laboral não foi extinto, tendo apenas sofrido limitações, pelo que permanece vivo no ordenamento jurídico, com contornos de atividade legislativa e sem ter se transformado em exercício de arbitragem. Abrem-se parênteses para analisar o dissídio coletivo de índole jurídica, notando-se que a possibilidade de sua propositura não foi extirpada pela EC. Entendendo-se ser a exigência do comum acordo um novo pressuposto processual, cuja inserção no ordenamento foi motivada por pressões econômicas e pelo estímulo à negociação coletiva, destaca-se a constitucionalidade formal da exigência. Não obstante, conclui-se que a necessidade de mútuo consentimento é substancial e principiologicamente inconstitucional, eis que viola os mais basilares princípios norteadores da Constituição brasileira, tais como a efetividade da prestação jurisdicional, a garantia de acesso ao judiciário, o direito de ação e a proibição de non liquet. Não sendo os sindicatos brasileiros suficientemente fortes e estruturados para pressionar os empregadores pela negociação, qualquer obstáculo ao acesso dos trabalhadores aos Tribunais Trabalhistas representa uma verdadeira negação de justiça.

Palavras-chave: poder normativo; reforma do judiciário; Emenda Constitucional nº. 45/2004; comum acordo; inconstitucionalidade material e principiológica.


1 INTRODUÇÃO

Os conflitos coletivos de trabalho intensificaram-se em progressão geométrica, pois também na seara laboral são constantes os embates e descontentamentos típicos do convívio em sociedade. Contraditoriamente, a Reforma implementada pela Emenda Constitucional nº. 45/2004, apesar de inegavelmente ter primado por uma maior celeridade e efetividade da prestação jurisdicional, inseriu no ordenamento jurídico exigências para o ajuizamento das ações adequadas à tutela dos interesses gerais da coletividade.

É certo que houve ampliação da competência da Especializada, mas esta veio acompanhada de novos pressupostos para a propositura dos dissídios coletivos de natureza econômica. Se antes da Emenda acima referida bastava a comprovação de prévia tentativa de negociação frustrada para a instauração da instância, agora é necessário o comum acordo entre as partes. Não seria esse requisito, entretanto, de difícil preenchimento? Então, quais as consequências de sua ausência?

Neste diapasão, as alterações provocadas pela Emenda Constitucional nº. 45/2004 geraram grandes controvérsias e cizânias envolvendo o futuro da função normativa da Justiça Trabalhista. Teria o poder normativo dos Tribunais Laborais chegado ao fim? Foi morto pela reforma? A problemática envolve uma enorme complexidade. Não à toa que doutrina e jurisprudência enveredam esforços para tentar chegar a uma solução coerente, buscando, sobretudo, não desamparar os maiores interessados, que são os trabalhadores e as empresas.

No cerne destas questões é que se encontra o objeto de estudo do presente trabalho, tendo em vista que a exigência do comum acordo para a instauração do dissídio de interesse pode constituir-se em um verdadeiro retrocesso às conquistas e direitos trabalhistas já alcançados. Partindo-se de uma breve conceituação dos conflitos laborais, analisa-se a grande freqüência com que surgem embates envolvendo vários trabalhadores, pelo que se faz importante tecer comentários sobre suas formas de solução. Nesse intento, percebe-se que as partes constantemente recorrem ao poder judiciário, ajuizando dissídio coletivo, não se podendo deixar de estudar, então, os contornos do instituto, notadamente suas espécies e procedimento.

Depara-se, então, com a função normativa da justiça laboral quando do julgamento da instância coletivas. Após sua conceituação, imprescindível analisar os impactos da EC nº. 45 sobre o poder normativo da Especializada. Qual a sua natureza, atividade legiferante ou jurisdicional propriamente dita? Ademais, as alterações tiverem o condão de lhe transformar em arbitragem?

Ora, como em toda democracia, os poderes não podem ser ilimitados, pois isso conduziria à inegável tirania, com a prevalência dos inquestionáveis e arbitrários ditames do chefe. Assim, também o poder normativo dos Tribunais do Trabalho sofre uma série de limitações, cuja análise é essencial.

Seguindo-se ao estudo de algumas relevantes questões processuais, sobretudo dos pressupostos processuais e das condições da ação, bem como das consequências de suas ausências, eclode a problemática da constitucionalidade da exigência do requisito do comum acordo. Afinal, posicionar-se pela validade ou não do mútuo assentimento repercute de forma incisiva na situação daqueles que, quase sempre, são mais frágeis tanto jurídica quanto economicamente na relação, ou seja, os trabalhadores.

A cizânia também se reveste de grande importância por envolver o incentivo à negociação coletiva, tema bastante atual em tempos nos quais a autocomposição é cada vez mais estimulada, inclusive através de movimentos dos tribunais brasileiros. Entretanto, sem negar suas vantagens, esse tipo de solução não pode obstar o acesso ao judiciário.

Não se pode olvidar o caráter protecionista e paternalista do Direito do Trabalho. Logo, muito mais do que estudar as inovações resultantes da reforma, especificamente a exigência do comum acordo, é imprescindível zelar pela coerência do ordenamento jurídico, para que eventuais contradições sejam dele extirpadas. Outrossim, a anuência da parte contrária não estaria ferindo o direito de agir constitucionalmente assegurado, por afrontar diretamente o Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição?

Considere-se que, embora o direito processual seja um ramo autônomo do Direito, ele não pode ser isolado do direito substancial. Direito material e direito processual devem caminhar lado a lado, para que ambos cumpram devidamente suas funções e sejam efetivamente aplicados com celeridade. Logo, tem de ser adotada uma visão sistemática do direito, nunca se desligando da idéia de que as normas processuais existem para servir, são instrumentos do direito material, dele não se desvinculando. Dessa forma, mister que seja conferida racionalidade ao sistema jurídico, interpretando-se as normais em consonância com todos os princípios e garantias constitucionais.

Durante a análise, abrir parênteses para fazer alguns comentários sobre a instância coletiva de natureza jurídica é necessário, pois surgiram relevantes questionamentos na doutrina sobre eventual supressão do mesmo pela EC nº. 45. Como esse processo tem por objeto a interpretação de disposição normativa específica da categoria, valiosa a abordagem.

Uma resposta coerente aos questionamentos feitos acima (e aos demais surgidos no bojo desse trabalho) somente se faz possível a partir da compreensão do exato alcance da nova exigência relacionada à instância econômica coletiva. Lograr esse êxito, entretanto, á uma tarefa bastante complicada, exigindo atenção detalhada em relação a cada instituto, para que não se chegue a conclusões precipitadas e equivocadas

Inúmeros juristas que já se manifestaram sobre a temática incorreram em alguns deslizes, o que provavelmente decorreu da precipitação e falta de estudo pormenorizado sobre o assunto. São substancialmente divergentes os posicionamentos defendidos, residindo aí a importância de confrontá-los, com a sugestão de contornos mais homogêneos para a elucidação das discussões.

Após a análise de uma série de premissas, buscando-se, inclusive, destacar a importância da manutenção do poder normativo da Justiça do Trabalho, passa-se à defesa da inconstitucionalidade principiológica da exigência do comum acordo como um pressuposto para a propositura dos dissídios coletivos econômicos, em nítida oposição à constitucionalidade formal de que se reveste a alteração.

Ademais, inserir qualquer obstáculo para o acesso ao Judiciário é fechar os olhos para a dura realidade fática em que se encontram os sindicatos representativos dos trabalhadores, fracos e despidos da devida força para pressionar os empregadores pela negociação.

Tendo o Estado a precípua função de manter e zelar pela continuidade da paz social, a precipitada e sumária decretação de extinção do processo por extremo apego ao formalismo deturpa a moderna interpretação do princípio da instrumentalidade das formas, ocultando a verdadeira missão do processo.

Inegável é que a nova exigência processual vem gerando enorme perplexidade entre os operadores do direito do Trabalho. Iminente, pois, a solução sobre a constitucionalidade da exigência do comum acordo, pois variados problemas práticos podem surgir da adoção de um ou outro posicionamento, dentre os quais negativas consequências para os trabalhadores e para os sindicatos obreiros. Urge que Supremo Tribunal Federal manifeste-se sobre o impasse, dando a definitiva solução para o problema.


2 CONFLITOS COLETIVOS

2.1 CONCEITO

Ser social por natureza, o homem não pode nem consegue viver eternamente sozinho. Para ele, é de transcendental importância o convívio em sociedade, o que facilita o alcance de seus objetivos e a fruição de seus direitos. O indivíduo não é auto-suficiente, por isso tem a natural tendência de se unir como forma de alcançar os intentos que excedam suas capacidades.  

Nesse contexto, é natural a existência de conflitos, até mesmo por ser rotineiramente mantido um contato entre pessoas com ideais e personalidades diferentes. Os indivíduos possuem gostos e interesses distintos, daí porque chega a ser utópico imaginar uma convivência totalmente pacífica entre eles. E assim, desde que surgiu a humanidade, há relatos de brigas entre os homens, tenham sido elas pela disputa de alimentos e moradia ou ainda por oposição de interesses, dentre inumeráveis outros motivos.

Também no seio de suas atividades laborativas o homem está em constante relacionamento com terceiros, sejam eles superiores hierárquicos ou mesmo colegas de função. Entretanto, muitas vezes ocorrem perturbações no âmbito das relações de trabalho, que nem sempre de desenvolvem de forma harmônica, dentro da normalidade. Percebe-se que as situações conflituosas, inerentes ao convívio em coletividade, estão tão presentes nas relações de trabalho como em qualquer área da vida em sociedade.

Para o surgimento de um embate, basta que haja lesão do direito de uma parte por outra, divergência de interesses, diferenças a respeito da interpretação e do alcance de normas ou mesmo percepção da necessidade de mudanças nas vigentes condições. Esses são apenas alguns exemplos das inúmeras situações que podem abalador o equilíbrio e harmonia necessários à pacífica convivência em grupo.

Em síntese, o conflito ocorre quando as reivindicações dos trabalhadores são resistidas ou não são atendidas pelo empregador ou grupo de empregadores. Em outras palavras, a cizânia surge quando as partes da relação não conseguem, por si só, acordar os termos e condições das convenções anteriormente estabelecidas, tendo de recorrer a alguma das formas de solução permitidas pelo ordenamento.

Destaque-se que, face às econômicas e jurídicas desigualdades em que se encontram as partes em uma relação de trabalho, simplificadamente empregador e empregado, os conflitos trabalhistas apresentam-se cheios de peculiaridades quando comparados aos desentendimentos na esfera cível. A hipossuficiência do trabalhador, parte quase sempre mais fragilizada na relação, deixa clara a relevância de sua organização e a necessidade constituição de alianças como instrumentos de luta para o alcance de direitos e garantias, além da minimização de desigualdades. Segundo Amauri Mascaro Nascimento[1], a razão de ser das relações coletivas está na necessidade de união dos trabalhadores, para que possam defender, em conjunto, as suas reivindicações.

Considerando-se os sujeitos conflitantes, os conflitos trabalhistas classificam-se em individuais e coletivos. Individuais são aqueles que ocorrem entre um ou diversos trabalhadores individualmente considerados e o empregador (considerando-se o contrato individual de emprego), enquanto os coletivos referem-se a interesses gerais e envolvem um grupo de trabalhadores e vários empregadores (ou mesmo um). Nas palavras de Amauri Mascaro Nascimento, os conflitos coletivos envolvem “pessoas não determinadas unidas em torno de um ponto comum, enquanto nos individuais há pessoas agindo no interesse próprio, direto e imediato”[2].

Nos ensinamentos de Wagner D. Giglio[3], para que seja feita a classificação dos embates devem ser considerados três critérios: partes, objeto e finalidade. No âmbito dos coletivos, ao menos uma das partes é composta por um número indeterminado de pessoas (coletividade de trabalhadores), ao passo em que nos individuais sempre estão envolvidos sujeitos determinados. Além disso, os coletivos têm por objeto interesses abstratos e os individuais têm como objeto interesses concretos. Acrescenta ainda que enquanto o conflito envolvendo a coletividade possui como finalidade a criação, modificação ou interpretação de uma norma, o individual visa a aplicação de uma norma prévia ao caso concreto.

Do exposto, infere-se que quando um grupo de trabalhadores indeterminados defende interesses abstratos pertencentes a toda a categoria, com a finalidade de criar, modificar ou mesmo interpretar uma norma, surge o conflito coletivo de trabalho. Ele envolve matéria de ordem geral, afeta a uma coletividade de pessoas, ocorrendo entre um grupo de trabalhadores abstratamente considerados e um grupo de empregadores.

Com a Revolução Industrial, a sociedade passou por significativas alterações. Os trabalhadores, residentes principalmente da zona rural, mudaram-se em massa para as cidades, passando a conviver de maneira mais próxima com os demais, além de enfrentar uma série de dificuldades, que também eram comuns aos seus colegas. Os grandes empresários, detentores do poderio econômico, cegos pelo lucro exacerbado, faziam o impossível para ganhar cada vez mais, deixando, consequentemente, de respeitar e valorizar o trabalho humano que se escondia por traz da produção massificada, em larga escala. 

Trabalhando sem parar para garantir a produção intensa, os empregados almejavam receber justos salários. Entretanto, os patrões lhes pagavam muito pouco, não sendo o ínfimo valor recebido suficiente nem mesmo para custear a sobrevivência digna e alimentação de sua família. Por conseguinte, o descontentamento individual tornava-se comum a várias pessoas a partir de simples conversas com os colegas sobre as péssimas condições de trabalho a que eram submetidos.

Nesse contexto, tornou-se nítida a oposição dos interesses e desejos entre empresários e trabalhadores. Este embate deu ensejo ao surgimento das primeiras manifestações concretas de divergências tocantes à coletividade. As frequentes greves passaram a causar prejuízos à classe empresária, mas também a toda a sociedade, via reflexa. Atualmente, tamanha a complexidade das relações sociais e da própria convivência em coletividade, tornaram-se rotineiros os descontentamentos comuns à coletividade.

2.2 CLASSIFICAÇÃO

Os conflitos coletivos laborais classificam-se em econômicos e jurídicos. Os primeiros, também chamados de conflitos de interesse, estão relacionados às reivindicações referentes às condições de trabalho, enquanto nos jurídicos a discussão gira em torno da interpretação ou aplicação de certa norma jurídica. Ao discorrer sobre o tema, elucida Sérgio Pinto Martins:

“Os conflitos econômicos são aqueles nos quais os trabalhadores reivindicam novas condições de trabalho ou melhores salários. Já nos conflitos jurídicos tem-se por objeto apenas a declaração da existência ou inexistência de relação jurídica controvertida, como ocorre em dissídio coletivo em que se declara a legalidade ou ilegalidade da greve”[4].

Do exposto, infere-se que na instância econômica busca-se a obtenção de uma norma jurídica para ser aplicada ao caso concreto, ao passo em que na jurídica a finalidade é estabelecer o sentido (significado) de uma norma preexistente ou executar uma regra não obedecida pelo empregador. Fábio Túlio acrescenta ainda que na caracterização de um conflito econômico é suficiente que a pretensão “signifique a conquista de novos direitos para a classe trabalhadora, ou o incremento dos já reconhecidos, ainda que sem expressão em pecúnia”[5].

2.3 FORMAS DE SOLUÇÃO

Antigamente, era comum a solução dos problemas através do uso da força (o que, indubitavelmente, favorecia os mais fortes), época em que a “autodefesa” era a regra na solução de problemas. Com a evolução da sociedade e dos valores éticos e morais, surgiu a necessidade de o Estado passar a ser o responsável por compor os interesses maneira justa e pacífica. Dessa forma, por meio de um terceiro capacitado a decidir com imparcialidade e neutralidade as questões, chamou para si o papel de emitir decisões condizentes com os ditames da justiça e da equidade.

No intento de pacificar e harmonizar as relações entre trabalhadores e patrões, emergiram variadas formas de composição dos conflitos coletivos. Destacam-se como principais meios de solução a autocomposição e a heterocomposição. Amauri Mascaro Nascimento[6] acrescenta ainda a autodefesa, afirmando que a mesma é caracterizada pela solução direta da divergência pelos próprios litigantes, havendo a imposição de um sobre o outro, a exemplo da greve e do lockout (lembre-se que este último é vedado pela legislação brasileira).

Entretanto, por meio da autodefesa, aqui exemplificada pela greve, os trabalhadores apenas conseguem se organizar para, assim, pressionarem pela solução do conflito, que será verdadeiramente resolvido através das formas autocompositivas ou heterocompositivas surgidas a partir das pressões. Assim, melhor entendimento é aquele segundo o qual a autocomposição não é uma forma de solução de conflitos coletivos. Nesse sentido:

“A greve, citada por alguns como forma de solução de conflitos coletivos, constitui, para nós, um meio de autodefesa ou um instrumento de pressão econômica e política conferido aos trabalhadores socialmente organizados que possibilitará a solução do conflito. Vale dizer, não é a greve em si que soluciona o conflito, pois a greve possui natureza instrumental, mas sim as normas autocompositivas e heterocompositivas que certamente dela – greve – surgirão”[7].

As medidas autocompositivas decorrem do princípio da autonomia privada negocial existente entre as partes. Nelas, as normas que irão solucionar o problema são criadas pelos próprios envolvidos e interessados, sem que haja participação do Estado-juiz, ou seja, tratam-se de formas extrajudiciais. Como exemplos, têm-se os acordos coletivos, as convenções coletivas e a mediação[8].

Os acordos coletivos são estabelecidos entre o sindicato da categoria profissional e a empresa, estando os seus efeitos adstritos às partes acordantes. Eles normalmente destinam-se a solver matérias mais específicas, tais como problemas ocorridos no âmbito de uma determinada empresa (o entendimento é diretamente feito com o empregado).

As convenções coletivas são constituídas pelos sindicatos representantes da categoria profissional e da patronal. O resultado através delas alcançado é erga omnes. Elas resultam de um ajuste bilateral, somente perfazendo-se caso haja o acordo de vontades entre os dois contratantes (art. 8º, VI da CF e art. 611 da CLT). Na mediação, um terceiro auxilia as partes, tendo apenas o papel de aconselhar pela resolução do impasse, intermediando a controvérsia sem que haja imposição da solução. Nessa modalidade, inexistem poderes decisórios, haja vista que o mediador tem a “função de ouvir as partes e formular propostas”[9].

Também conhecida por negociação coletiva, a autocomposição é considerada a melhor e mais adequada forma de apaziguar os conflitos pela Organização Internacional do Trabalho, pois nela os limites das tratativas são estabelecidos pelos próprios interessados[10]. Justamente por decorrer do consenso, admite maior elasticidade, flexibilidade e possibilidade de adequação às circunstâncias.

Para Amauri Mascaro Nascimento, a heterocomposição é uma forma de solução com “fonte suprapartes, que decide com força obrigatória sobre os litigantes”[11]. Nela, não são as próprias partes que, por si mesmas, põem fim o conflito, havendo a intervenção de um terceiro que resolve a questão, impondo a decisão. Como exemplos, têm-se a arbitragem e a jurisdição. A arbitragem consiste na atribuição da solução do conflito a um terceiro que, com poderes decisórios, é escolhido comumente pelas partes negociantes com o intuito de dirimir a lide extrajudicialmente[12].

No ordenamento pátrio, a solução judicial das questões conflituosas relativas a um grupo de trabalhadores é feita através dos dissídios coletivos, no âmbito da Justiça do Trabalho. Como visto, os embates laborais podem possuir índole jurídica ou econômica. Ao analisar os meios judiciais para a solução destes, aduz Andréa Presas:

“Os primeiros (conflitos de natureza jurídica) podem ser solucionados de forma semelhante aos conflitos individuais, haja vista que as principais ações utilizadas para a superação destes são também adotadas para solução daqueles, tais como a reclamação trabalhista, a ação de cumprimento e a ação civil pública. Os conflitos de índole econômica, por seu turno, exigem procedimento especial para a sua solução, vale dizer, devem ser resolvidos por meio de ação específica: o dissídio coletivo, de acordo com o procedimento estabelecido nos artigos 856 a 871 e 873 a 875, da CLT”[13].

Saliente-se que é totalmente possível a solução de um conflito coletivo de natureza jurídica através do dissídio. Ademais, em geral, os dissídios ajuizados costumam cumular tanto conflitos caráter econômico quanto de caráter jurídico. Entretanto, no tocante aos de natureza econômica, por expressa previsão constitucional[14], é imprescindível a instauração da instância, o que não ocorre, como dito, em relação aos jurídicos.

Acrescente-se que a vontade de não exposição direta do trabalhador quando das reivindicações pertinentes ao seu contrato de trabalho fez emergir a atuação de um substituto processual, qual seja, o sindicato, que, constitucionalmente legitimado, visa atender aos reclames da categoria representada. Como observa Wagner D. Giglio, “o resultado da autocomposição dos conflitos coletivos depende da liberdade de negociação, e essa liberdade requer igualdade de situação”[15].

Atualmente, o sindicato possui como primordial função atuar na negociação coletiva, notadamente se considerado que a legislação pátria vem progressivamente acolhendo a autocomposição e reconhecendo os acordos e as convenções coletivas de trabalho como importantíssimas formas solução de controvérsias e descontentamentos.


3 DISSÍDIO COLETIVO

3.1 CONCEITO

Como dito, através do dissídio coletivo que é feita a solução jurisdicional dos conflitos coletivos de trabalho no Brasil. Situando-se no plano da heterocomposição, ele não é mais posto como um simples embate, mas sim como um litígio existente entre os sujeitos dos interesses. Dessa forma, a atmosfera para a solução autônoma é afastada, sendo, nestes casos, imposta a figura de um terceiro que, atualmente, deverá ser provocado por ambas as partes, de comum acordo: o Estado-juiz. Nos dizeres de Bezerra Leite:

“Para nós, portanto, o dissídio coletivo é uma espécie de ação coletiva conferida a determinados entes coletivos, geralmente os sindicatos, para a defesa de interesses cujos titulares materiais não são as pessoas individualmente consideradas, mas sim grupos ou categorias econômicas, profissionais ou diferenciadas, visando a criação ou interpretação de normas que irão incidir no âmbito dessas mesmas categorias”[16].

Neste diapasão, dissídios coletivos são ações propostas à Justiça do Trabalho por pessoas jurídicas (sindicatos, federações ou confederações de trabalhadores ou de empregadores) para solucionar questões que não puderam ser solucionadas pela negociação direta entre trabalhadores e empregadores. Segundo Andréa Presas, tratam-se de procedimentos de solução de problemas tocantes a uma grupo de trabalhadores perante o poder judiciário. A autora afirma que nele o “interesse controvertido é de todo um grupo, genérica e abstratamente considerado”[17], ou seja, é transindividual e a sua solução deverá ocorrer pela via jurisdicional.

As instâncias coletivas são aquelas que envolvem, imediatamente, interesses abstratos de uma categoria ou grupo, encontrando-se nesse ponto a indeterminação dos indivíduos interessados na eventual solução. Nesse sentido:

“Quando o dissídio envolve interesses coletivos, não singulares, temos o dissídio coletivo. Este instituto de direito processual se caracteriza pelo fato de permitir que o conflito coletivo seja canalizado a um processo, por via do qual se busca a solução da controvérsia oriunda da relação de trabalho de grupos e não do interesse concreto de uma ou mais pessoas pertencentes aos mesmos grupos”[18].

Na definição de Sérgio Pinto Martins, é “o processo que vai dirimir os conflitos coletivos do trabalho, por meio de pronunciamento do Poder Judiciário, criando ou modificando condições de trabalho para certa categoria ou interpretando determinada norma jurídica”[19]. Destaque-se, entretanto, que embora seja comumente definido como processo, o dissídio deve ser entendido como o próprio conflito judicialmente instaurado. Nesse sentido, é ele que origina a ação.

Importante diferenciar ação coletiva de ação individual plúrima. A primeira é aquela iniciada pelo dissídio coletivo, envolvendo a discussão de interesses abstratos de uma categoria. Já na ação individual plúrima são discutidos interesses concretos individuais de mais de um trabalhador, ou seja, é aquela em que se forma um litisconsórcio ativo[20].

Para um melhor entendimento do instituto em análise, importante tecer breves comentários sobre sua evolução histórica e razões fáticas de sua inserção no ordenamento jurídico brasileiro.

3.2 BREVE PANORAMA HISTÓRICO

Ramo autônomo que é, o Direito do Trabalho trata das relações individuais e coletivas laborais. Pode-se conceituar relação coletiva de trabalho como aquela estabelecida entre o sindicato representativo de uma categoria e a entidade patronal, que por sua vez pode estar representada por um sindicato ou diretamente pela própria empresa.

O direito trabalhista permite que se observe, ao longo de sua história, uma intensa intervenção estatal nas relações entre capital e trabalho, ingerência esta que continua presente, de maneira bastante incisiva, em países que ainda estão necessitando de grande desenvolvimento sócio-econômico (dentre outra esferas), talvez como uma tentativa de assegurar a real igualdade entre empregados e empregadores, tirando-a do plano meramente formal, tratamento desigualmente os desiguais como forma de igualá-los juridicamente[21]

No Brasil, até mesmo por resquícios da herança cultural européia, a solução judicial dos conflitos, dentre eles os coletivos do trabalho, sempre foi o meio preferido para a pacificação de controvérsias, quase não deixando espaço para as modalidades extrajudiciais. As pessoas, provavelmente, estavam (e ainda estão) acostumadas a apenas acreditar e confiar na resolução de um litígio se a decisão final fosse imposta pelo judiciário, como se nisso vislumbrassem uma garantia de justiça, pelo que as formas não judiciais de composição quase sempre restam desprezadas.  

Em 02 de maio de 1939, por meio do decreto-lei nº. 1.237, foi instituído, no Brasil, o dissídio coletivo, que até então não possuía previsão no ordenamento jurídico pátrio. A competência para conciliá-lo e julgá-lo era (e ainda o é) da Justiça do Trabalho. Saliente-se que, nessa época, a Justiça Laboral ainda não era um ramo autônomo e independente, pois pertencia à estrutura administrativa do Poder Executivo, na esfera do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio[22].

Logo quando de sua instituição por meio de previsão no dito decreto, o dissídio coletivo, atrás de uma máscara protecionista, era comumente utilizado como paliativo para aliviar as intensas tensões sociais e pressões trabalhistas por melhorias. Assim, encaixou-se perfeitamente no contexto do sindicalismo atrelado ao Estado, lembrando-se que a greve era considerada um recurso nocivo e anti-social, contrário ao capital e ao trabalho, por não se mostrar compatível com os superiores interesses da produção nacional e dos grandes empresários.

Em meio a esse contexto, tornou-se imperioso desenvolver, de forma minuciosa, a regulação das relações coletivas de trabalho, a fim de tornar desnecessária a atuação sindical, condicionando estes interlocutores a uma busca incansável pelo Estado a fim de solucionar os conflitos emergentes. Dessa forma, estariam afastadas as ameaças ao forte intervencionismo, garantidor do controle pelos detentores do poder.

A primeira Constituição brasileira a tratar do Poder Normativo da Justiça do Trabalho foi a de 1946[23], dispondo, no §2º do art. 123, que “a lei especificará os casos em que as decisões, nos dissídios coletivos, poderão estabelecer normas e condições de trabalho”. A dita constituição coadunava com a áurea liberal que se seguia ao fim do Fascismo e do Nazismo na Europa, bem como ao final do Estado Novo, com a queda de Getúlio Vargas no ano de 1945.

Afirma Ricardo Nunes de Mendonça:

“O dissídio coletivo de trabalho foi concebido, em princípio, como direito genérico, abstrato, público e subjetivo, que as categorias de empregados e empregadores devidamente substituídos por seus sindicatos; as empresas individualmente consideradas; o Ministério Público do Trabalho e os Juízes Presidentes dos tribunais, nos casos de suspensão do trabalho, poderiam exercer para exigir do Poder Judiciário um provimento jurisdicional que tivesse por escopo: a) criar normas e condições de trabalho por meio de sentenças normativas; b) interpretar norma jurídica criada por sentença normativa, acordos ou convenções coletiva anteriores; ou d) declarar a abusividade de greve”[24].

Mesmo com a promulgação da Constituição Federal de 1988, consagradora da autonomia e liberdade sindicais (art. 8º), manteve-se o ideário conceitual segundo o qual o dissídio coletivo não passava do mero exercício de um direito de ação, com a eventual peculiaridade de exigir um provimento judicial com caráter nitidamente legislativo, dado o seu poder de criação de normas e condições de trabalho através das sentenças normativas, bem como da interpretação de normas jurídicas preexistentes.

3.3 ESPÉCIES DE DISSÍDIO COLETIVO

Como visto, os conflitos coletivos do trabalho podem ter natureza econômica ou natureza jurídica. Do mesmo modo, os dissídios coletivos, que são ações para a solução dos ditos conflitos pela via judicial, classificam-se em econômicos e jurídicos.

3.3.1 NATUREZA JURÍDICA

Os dissídios coletivos de natureza jurídica são aqueles ajuizados com o objetivo de interpretar uma norma preexistente (considere-se como norma preexistente não apenas a emanada do poder legislativo, mas também os contratos coletivos e outras decisões normativas)[25]. Assim, eles possuem a finalidade de interpretar o direito, mas sempre diante de um caso concreto e na presença de interesses coletivos, seja na aplicação ou na interpretação de uma norma. Em síntese, neles há a declaração da existência ou inexistência de uma relação jurídica[26].

Eles estão previstos no art. 114 da Constituição de 1988, que estabelece estar credenciada a Justiça do Trabalho para julgar feitos oriundos do descumprimento de sentença normativa ou aqueles que visem aclarar as ditas sentenças.  Não confundir o dissídio coletivo de natureza jurídica com a ação de cumprimento, que é uma reclamação plúrima através da qual determinados trabalhadores, identificados, postulam direitos decorrentes da sentença normativa.

3.3.2 NATUREZA ECONÔMICA

Os dissídios coletivos de natureza econômica, também chamados de dissídios de interesse, são identificados pela natureza do pedido, que normalmente está ligado a novas normas e condições de trabalho, a exemplo da remuneração do trabalhador. Em síntese, eles têm por objetivo a criação de direito novo, seja através de novas normas ou de novas condições de trabalho. Neste diapasão, não tardam alguns doutrinadores, a exemplo de Edilton Meireles[27], em classificá-lo como um processo legislativo.

Neles, o interesse envolvido é abstrato, não estando limitados às partes envolvidas no litígio. Assim, a sentença proferida irá lançar os seus efeitos àqueles que, na ocasião, sejam empregados da empresa e mesmo aos que vierem a ser posteriormente admitidos (desde que a sentença ainda esteja vigente). Dessa forma, eventual aumento de salário por meio de sentença normativa é extensivo a todos os empregados da empresa ou a todos os integrantes de certa categoria profissional, sejam associados ou não do sindicato suscitante.

Com a edição da Emenda Constitucional n° 45/2004, foi sensivelmente alterado o procedimento para o julgamento dos dissídios coletivos de natureza econômica, o que deu (e ainda dá) margens a polêmicas e intensos debates no plano doutrinário e jurisprudencial, conforme será analisado nos capítulos seguintes.

3.3.3 SUBCLASSIFICAÇÕES

Classificam-se ainda os dissídios coletivos em originários, de revisão e de declaração de greve.

Como sugerido pelo próprio nome, dissídios originários são os primeiros, porque inexistentes normas e condições especiais de trabalho decretadas em sentenças normativas. Os dissídios de revisão destinam-se a rever normas e condições coletivas de trabalho preexistentes que se hajam tornadas injustas ou ineficazes pela modificação das circunstâncias que as ditaram. A última modalidade, dissídio de declaração sobre a paralisação do trabalho decorrente de greve dos trabalhadores, destina-se a apreciar a paralisação do trabalho, e, nesse caso, o tribunal pronunciar-se-á sobre a qualificação jurídica da greve e suas consequências[28].

Ao abordar o ponto, Sérgio Pinto Martins[29] elenca as seguintes modalidades:

1. Dissídios originários, nos termos do art. 867 da CLT, quando não existem ou não vigoram normas e condições especiais de trabalho, com a criação de condições especiais de trabalho;

2. De revisão, que se destinam a rever normas e condições coletivas de trabalho preexistentes e que se tornaram ineficazes ou injustas de acordo com as circunstâncias, conforme artigos 873 a 875 da CLT;

3. De declaração sobre paralisação de trabalho em decorrência de greve;

4. De extensão, que visam estender as condições de trabalho a outros trabalhadores, nos termos dos artigos 868 a 871 da CLT.

Para Alexandre Lindoso, o dissídio coletivo de natureza jurídica não foi recepcionado pela Emenda Constitucional nº 45/2004. Esta Emenda, ao conferir nova redação ao art. 114 da Constituição Federal, ocasionou a ruptura da postura ampliativa anteriormente em vigor, haja vista que antes a Justiça do trabalho possuía competência para julgamento do gênero dissídio coletivo. Após a alteração do dito artigo, foi adotada uma dicção restritiva, estando especificadas as espécies passíveis de serem submetidas ao crivo do Judiciário Trabalhista: o dissídio coletivo de natureza econômica e o dissídio coletivo de greve[30]. Este posicionamento não parece ser o mais correto, pois a competência para o julgamento do dissídio de índole jurídica decorre da própria redação do art. 114 da CF, como será adiante demonstrado.

Mesmo em face da significativa alteração decorrente da mudança do texto da carta maior, instituto continua sendo disciplinado pelo texto consolidado de 1943 com suas alterações, não esquecendo que este deve ser hermeneuticamente interpretado à luz dos ditames constitucionais.

3.4 PROCEDIMENTO ANTES DA EC Nº. 45/2004

A legitimidade para propor uma ação, no âmbito das reclamações individuais, pertence aos trabalhadores ou mesmo às empresas, que provocarão o judiciário na busca da satisfação do pleito. Já no domínio coletivo a situação é diferente, haja vista que a legitimidade para o ajuizamento de ações é dos sindicatos representativos de determinada categoria. Lembre-se que, nos moldes do art. 857 da CLT, caso não haja sindicato representativo na localidade, serão legítimos a federação ou a confederação, respectivamente.

Em caso de greve, tanto a Procuradoria do Trabalho quanto o sindicato econômico podem propor o dissídio. Nessa situação, conforme o artigo 856 da CLT, a instância também pode ser instaurada pelo Presidente do Tribunal.

Frise-se que a instauração do dissídio coletivo depende expressamente de prévia aprovação em assembléia designada especialmente para esse fim, pelo que não pode a diretoria sindical recorrer ao poder judiciário sem a anuência dos seus associados. Note-se que essa necessidade de prévia aprovação em assembléia, com a observação do quorum determinado no art. 612 da CLT, constitui um dos pressupostos para o ajuizamento do dissídio. Nesse sentido, vide o seguinte julgado:

RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO COLETIVA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. INOBSERVÂNCIA DO QUÓRUM ESTABELECIDO NO ART. 612 DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO. Acórdão regional em que se decretou a extinção do processo sem resolução do mérito, em razão da inobservância do quórum estabelecido no art. 612 da Consolidação das Leis do Trabalho, nos termos da Orientação Jurisprudência nº 13 da Seção Especializada em Dissídios Coletivos desta Corte. Cancelamento dessa orientação jurisprudencial. Existência de irregularidades diversas no ajuizamento da ação coletiva que igualmente determinam a extinção do processo sem resolução do mérito: a) inobservância do quórum fixado no art. 859 da Consolidação das Leis do Trabalho; b) falta de fundamentação das cláusulas reivindicadas; ausência de registro na ata da assembléia geral da pauta de reivindicações. (RODC – 20177/2004-000-02-00. RELATOR: FERNANDO EIZO ONO. DJ 16/05/2008).

A autorização em assembléia, como acima exposto, entretanto, não se mostra suficiente para que haja a instauração do dissídio, pelo que devem ser preenchidos outros requisitos. Aponta-se como outro pressuposto para o ajuizamento deste a prévia tentativa de negociação. Daí se conclui que o poder judiciário apenas pode ser provocado a se manifestar caso as negociações precedentes tenham se mostrado infrutíferas, o que demonstra uma preocupação do legislador em valorizar as formas autocompositivas de solução de conflitos. Acrescente-se ainda que, convencendo-se o Tribunal de que não houve uma concreta e efetiva tentativa de negociação, deverá de pronto extinguir o dissídio coletivo sem julgamento do mérito, nos trâmites do artigo 267, IV do CPC, e não converter o julgamento dele em diligência como meio de suprir a falta[31].

Depois de ajuizada a representação, haverá autuação da mesma, momento em que deve ser designada audiência de conciliação e instrução. Depois de cientificadas as partes, o suscitado deverá apresentar sua defesa (em que pese o artigo 862 da CLT não explicitar a apresentação de contestação, a praxe possibilita a apresentação de tal peça de forma escrita, garantindo a lisura do procedimento).

A defesa do suscitado deve observar a estrutura normal dos processos civil e trabalhista, com preliminares acerca dos pressupostos processuais, das condições da ação e quanto ao mérito, normalmente refutando cláusula a cláusula da reivindicação, nada impedindo o reconhecimento parcial do pedido. O reconhecimento da totalidade do pedido objetivamente implica na conciliação[32].

Tendo sido obtido êxito na conciliação entre as partes do dissídio ou após o encerramento da instrução, será o processo distribuído ao relator e ao revisor, mediante sorteio. Destaque-se que alguns tribunais regionais fixam em seus regimentos internos que, após a instrução, as partes terão dez minutos para produzir razões finais.

O Ministério Público do Trabalho opina nos dissídios coletivos oralmente em caso de conciliação e não, havendo acordo, após o encerramento da instrução, com redução a termo, ou após a designação do relator e revisor, na sessão de julgamento do dissídio, transcrito em síntese na certidão, pela secretaria, ou, ainda, mediante parecer por escrito, no prazo de oito dias, mediante remessa dos autos pelo Relator[33].

Voltando os autos do Ministério Público, o relator procederá a sua análise no prazo de dez dias e o revisor em cinco dias. Imediatamente em seguida, o dissídio será submetido a julgamento, em sessão ordinária ou extraordinária do órgão competente[34].

Este era o trâmite básico para o julgamento de um dissídio coletivo até antes da EC 45/2004, tendo sido a reforma do Judiciário responsável por significativas alterações, principalmente no que concerne à legitimação para a propositura da ação, como será posteriormente analisado.


4 PODER NORMATIVO DA JUSTIÇA DO TRABALHO

4.1 CONCEITO

Como ocorre em todos os Estados Democráticos, a tripartição de funções é consagrada como princípio fundamental estruturante da Constituição Federal de 1988. Seu artigo 2º consagra a Teoria da Separação dos Poderes, que fora desenvolvida por Montesquieu em seu livro “O Espírito das Leis” (1748). Através dessa teoria, o pensador objetivou moderar o poderio estatal, dividindo o mesmo em funções e atribuindo as competências a diferentes órgãos como meio de evitar a concentração de todo o poder nas mãos de uma só pessoa, o que, inevitavelmente, levaria à tirania, a extremas arbitrariedades, a mais rígida ditadura. Lembre-se que as idéias de Montesquieu tiveram por inspiração as teses lançadas por John Locke, ainda que implicitamente, cerca de cem anos antes.

Dispõe o dito artigo que a União é formada por três poderes, todos eles independentes e harmônicos entre si. São eles: o poder Legislativo, o poder Executivo e o poder judiciário. Logo, geralmente cabe ao Judiciário, exercendo suas funções típicas, a resolução de conflitos por meio de um processo, normalmente aplicando, em uma atividade subsuntiva, a norma preexistente ao caso concreto. Enquanto isso, o Legislativo é tipicamente competente para editar normas gerais e abstratas (leis), dotadas de eficácia erga omnes, nos moldes do processo legislativo constitucionalmente estabelecido.

Em uma simplificada exposição, pode-se afirmar que a divisão dos poderes consiste em atribuir cada uma das funções básicas do Estado a diferentes órgãos, descentralizando o poder para que ele não pertença a uma única pessoa[35]. Saliente-se que a Constituição brasileira de 1988 está lastreada no ideário de interação entre os poderes, os quais devem coexistir de forma independente, porém harmônica. Além disso, cada um dos poderes exercerá funções que lhe são típicas e outras que lhes são atípicas, desde que legalmente previstas. Dessa forma, a competência típica atribuída ao Congresso Nacional para legislar, por exemplo, não exclui dos demais poderes a competência de criar normas, nos limites constitucionalmente estabelecidos.

Como dito, em regra, compete ao poder judiciário solucionar os conflitos que lhe são postos. Entretanto, esta está muito longe de ser a sua única função, possuindo o mesmo variadas outras competências constitucionalmente estabelecidas. A Constituição brasileira de 1934 já conferia aos tribunais trabalhistas a atribuição de proferir, nos dissídios coletivos, sentenças normativas, estabelecendo novas normas e condições de trabalho[36].

A Constituição de 1937 também consagrou o poder normativo, mas somente a Constituição de 1946 foi responsável pela fixação de limites ao exercício deste. Seguindo a mesma linha, todas as Constituições brasileiras posteriores trouxeram previsão expressa sobre a função normativa da Justiça do Trabalho.

Já fora afirmado que, dentre as formas de solução dos conflitos coletivos, está a jurisdicional. A justiça laboral intervém neles através das sentenças que são proferidas nos dissídios. Estes podem possuir natureza jurídica ou econômica, o que já foi acima abordado. Importante destacar que nas instâncias de índole jurídica as sentenças prolatadas possuem natureza declaratória da existência ou inexistência de determinada relação jurídica, ao passo em que nos econômicos as sentenças possuem caráter constitutivo, pois criam normas de caráter geral e abstrato, disciplinadoras das relações de emprego[37].

Do exposto, infere-se que são nos dissídios coletivos de natureza econômica que surge o poder normativo. Isso porque, diante deles, os tribunais trabalhistas possuem competência para o estabelecimento de normas e condições de trabalho, oponíveis erga omnes às categorias econômicas (ou às empresas) e às categorias profissionais envolvidas no litígio. Assim, é indubitável que reconhecer a competência da Justiça laboral para apreciar os dissídios coletivos tem como direta consequência o reconhecimento de seu poder normativo, pois a resolução desses conflitos cria novos direitos.

Neste diapasão, dispõe Amauri Mascaro Nascimento que o poder normativo consiste na competência constitucional dos tribunais laborais para proferir decisões nos processos de dissídios econômicos, criando condições de trabalho com força obrigatória[38].

Afirma Wilson Ramos Filho que o poder normativo é “a possibilidade que o ordenamento jurídico nacional atribui aos Tribunais do Trabalho de criar normas coletivas aplicáveis erga omnes a todos os integrantes de determinada categoria profissional”[39]. Acrescenta Amador Paes de Almeida que o poder normativo é “a faculdade atribuída à Justiça do Trabalho de estabelecer, nos dissídios coletivos de natureza econômica, normas e condições de trabalho”[40].

Segundo os ensinamentos de Valton Pessoa, seguindo essa mesma linha de raciocínio, o poder normativo é o poder conferido aos Tribunais Trabalhistas para criarem normas jurídicas com prazo de vigência limitado, tendo força de lei para as categorias de sindicatos que participaram do dissídio[41]. Do conceito posto pelo autor, infere-se que se atribui à sentença normativa, fruto do exercício do poder normativo dos tribunais, força de lei material para todas as categorias envolvidas no dissídio, independentemente de serem representadas pelo sindicato, já que a Lei não exclui da apreciação do judiciário a análise dos acordos coletivos celebrados entre o sindicato obreiro diretamente com as empresas, conforme precedente normativo fixado pela SDC do TST:

Nº 19. DISSÍDIO COLETIVO CONTRA EMPRESA. LEGITIMAÇÃO DA ENTIDADE SINDICAL. AUTORIZAÇÃO DOS TRABALHADORES DIRETAMENTE ENVOLVIDOS NO CONFLITO.

Art. 214. Têm legitimidade para o ajuizamento do dissídio coletivo as entidades sindicais e os empregadores, estes quando não houver entidade sindical representativa ou os interesses em conflito sejam particularizados. (Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho - RITST - RA-000.908-2002).

Sintetizando o conceito de poder normativo, aduz Edilton Meireles que este consiste na atribuição que um órgão estatal possui de criar direito, de legislar, de disciplinar as relações jurídicas[42]. Infere-se, então, que a competência conferida à Justiça Trabalhista para modificar e estabelecer normas e condições de trabalho, respeitados os direitos já alcançados pelos trabalhadores, recebeu o nome de poder normativo.

Saliente-se que a atribuição de poder normativo ao poder judiciário como forma de compor conflitos coletivos apenas se faz presente na Justiça do Trabalho.  Muitos doutrinadores teceram discussões sobre a solução judicial dos embates tocantes à coletividade prevista no ordenamento pátrio. Nesse sentido, explica Orlando Teixeira da Costa que tais fontes normativas, à margem do Poder Legislativo, são admitidas “com a finalidade de garantir um perfeito entrosamento dos ritmos de vida do trabalho e da vida jurídica da sociedade”[43].

Para Ives Gandra Martins Filho, pode-se explicar a função normativa da Justiça do Trabalho com base no “dinamismo das relações econômico-trabalhistas”[44]. Por haver uma rápida evolução e modificação nas condições da prestação de serviços, consequente das constantes modificações pelas quais perpassam a sociedade, a regulamentação jurídica também deve ser rápida. Seguindo a mesma linha de raciocínio, Carlos Henrique Zangrando defende ser a função normativa necessária à justiça laboral:

“[...] temos que o Poder Normativo é uma necessidade prática, uma vez que permite ao órgão judiciário adequar suas decisões à capacidade e ao desenvolvimento econômico das classes envolvidas no dissídio. Assim, a Justiça do Trabalho tem poderes para ‘acomodar’ a rigidez da legislação trabalhista nacional aos desníveis existentes entre as diferentes áreas econômicas e geopolíticas da Nação [...]”[45].

Frise-se que o legislador não tem o condão mágico de prever, em abstrato, regulamentação para todas as situações conflituosas que venham a existir. Nesse diapasão, o poder normativo da Justiça do Trabalho não significa a competência para solucionar um conflito através da proclamação do direito já existente, mas sim a possibilidade de criar direito novo. Dessa forma, o judiciário trabalhista atua, concorrentemente com o poder legislativo, na criação de normas e cláusulas com eficácia parecida à da lei, dentro do âmbito das categorias envolvidas.

Segundo alguns autores[46], a função normativa da justiça laboral acaba por desestimular a negociação coletiva, pois as pessoas preferem contentar-se com a decisão judicial imposta a empenhar-se na busca de um acordo. Nos dizeres de Pedro Carlos Sampaio Garcia, a dita função “inibe a negociação coletiva entre os atores sociais, que se acomodam com a intervenção judicial e não procuram a solução autônoma para os conflitos laborais econômicos”[47]. Entretanto, coadunar com esse pensamento seria o mesmo que dizer que a solução judicial dos conflitos individuais desestimula a conciliação entre as partes. A função normativa não desestimula a negociação coletiva, mas põe-se a solucionar conflitos em relação aos quais não houve acordo.

Os sindicatos brasileiros ainda não são fortes o suficiente para fazer efetivas pressões às empresas pela negociação coletiva. Assim, a intervenção do Estado na solução dos conflitos coletivos sempre que provocado, através do exercício de sua função normativa, mostra-se de fundamental importância para a proteção dos trabalhadores, que quase sempre estão em situação de inferioridade jurídica e, principalmente, econômica.

Ressalte-se que o exercício de uma atividade atípica por determinado poder estatal possui caráter excepcional, devendo, por isso mesmo, ser interpretado de forma restritiva e ser praticada dentro dos limites legalmente previstos, para que não colida com as funções atribuídas aos demais poderes. Assim, a função normativa exercida pelos tribunais visa normatizar situações que envolvem os sujeitos das relações de trabalho apenas nas lacunas legais, conforme já decidido pelo STF no RE 114836/MG:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRABALHISTA. DISSÍDIO COLETIVO. AUSENCIA DE PREVISÃO LEGAL PARA CLÁUSULAS DEFERIDAS. PODER NORMATIVO DA JUSTIÇA DO TRABALHO. LIMITES NA LEI. 1. A jurisprudência da Corte é no sentido de que as cláusulas deferidas em sentença normativa proferida em dissídio coletivo só podem ser impostas se encontrarem suporte na lei. 2. Sempre que a Justiça do Trabalho editar norma jurídica, há de apontar a lei que lho permitiu. Se o caso não se encaixa na classe daqueles que a especificação legal discerniu, para dentro dela se exercer sua atividade normativa, está a Corte Especializada a exorbitar das funções constitucionalmente delimitadas. 3. A atribuição para resolver dissídios individuais e coletivos, necessariamente in concreto, de modo algum lhe dá a competência legiferante. Recurso extraordinário conhecido e provido. (REX/114836-5. MG, 2ª Turma - Rel. Ministro Maurício José Corrêa. DJ. 06.03.1998, p. 16).

Nem sempre o poder normativo da Justiça do Trabalho possuiu os atuais contornos, tendo passado a sua regulamentação por diversas alterações decorrentes de mudanças governamentais ocorridas no país e no mundo. As modificações introduzidas pelo legislador constituinte acerca do poder normativo devem ser entendidas levando em conta a evolução histórica pela qual passou este instituto.

4.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO PODER NORMATIVO NO BRASIL

Foi na Itália, sob a égide do regime fascista, que surgiu a função normativa da Justiça do Trabalho. Naquela época, não eram permitidas as greves e os lockouts, que, inclusive, eram duramente punidos. Surgindo qualquer conflito coletivo laboral, incumbia à magistratura trabalhista a solução do dissídio[48].

A Carta del Lavoro de 1927, que refletia os ideais fascistas vigentes à época de sua elaboração, é apontada como o paradigma do poder normativo nos tribunais trabalhistas brasileiros. Ela atribuía à magistratura do trabalho o poder para regular as controvérsias, seja através da resolução dos conflitos coletivos trabalhistas, seja pela fixação de condições regulamentares. Daí se infere que a criação de normas jurídicas laborais era de competência do judiciário trabalhista.

Como dito, no Brasil, via de regra, os conflitos sempre foram  resolvidos por meios judiciais. E assim também ocorreu com os embates coletivos. Foi no governo de Getúlio Vargas, com a Constituição de 1937, que o poder normativo dos tribunais laborais foi inserido no ordenamento pátrio[49].

O modelo de governo Vargas foi marcado pelo enorme intervencionismo estatal em todos os setores da economia. Afirma José Augusto Rodrigues Pinto que o corporativismo nas relações de trabalho era “peça fundamental da integração Estado/empresa, envolvendo o trabalho, fator essencial ao desenvolvimento desta última”[50].

No Brasil, o poder normativo surgiu com a própria Justiça do Trabalho, em sua fase administrativa, quando ela ainda não era judicializada. Foi introduzido no ordenamento jurídico nacional pelo então Ministro Lindolfo Collor, responsável por implementar as condições para o exercício desse poder, em proposta ao Chefe de Governo Provisório[51].

Foram criadas, em 1932, por meio do Decreto nº. 21.396, as Comissões Mistas de Conciliação entre empregados e empregadores, e do Conselho Nacional do trabalho. Nelas, buscavam-se solucionar os embates coletivos entre as categorias, que cada dia mais entravam em conflitos. Esse decreto foi o primeiro dispositivo legal a prever uma intervenção estatal na solução dos conflitos trabalhistas.

Em 10 de novembro de 1937, com o golpe do Estado Novo, foi imposta por Getúlio Vargas uma nova Constituição ao Brasil. O texto desta deixava claro o intuito de fortalecimento do Poder Executivo, instaurando, assim, um Estado Corporativista no país. O discurso do então presidente não deixava dúvidas quanto à atuação estatal nas relações de trabalho, sendo as palavras utilizadas para tratar do protecionismo uma verdadeira maquiagem ao intento de total controle nacional, sobretudo no âmbito econômico.  

À época, negavam-se os conflitos trabalhistas. O Estado queria fazer a população acreditar que eles não existiam, ocultando-os por serem considerados nocivos aos interesses da produção econômica, que deveria fluir sem empecilhos, sem as incômodas reivindicações da massa trabalhadora. Entretanto, caso estas surgissem, o Estado, utilizando-se de todo o seu maquinário, deveria rapidamente resolvê-las, pondo fim a qualquer tipo de tensão, visando restabelecer a dita paz social. Resta nitidamente demonstrado o objetivo de matar, desde o embrião, qualquer possibilidade de rebelião social, aniquilando, assim, qualquer manifestação de descontentamento[52].

O Decreto Lei nº. 1.237 organizou a Justiça do Trabalho ainda como um órgão administrativo, prevendo a competência normativa no julgamento de dissídios coletivos para os Conselhos Regionais do Trabalho. O art. 94 do mencionado decreto balizava o conteúdo dessas decisões, estabelecendo, in litteres:

“Na falta de disposição expressa de lei ou de contrato, as decisões da Justiça do Trabalho deverão fundar-se nos princípios gerais do direito, especialmente do direito social, e na equidade, harmonizando os interesses dos litigantes com os da coletividade, de modo que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público”[53].

Com o advento da Constituição brasileira de 1946, a Justiça do Trabalho passou a fazer parte do poder judiciário, anexada aos órgãos do mesmo. O seu art. 123 tratava expressamente do poder normativo:

“Art. 123. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores, e as demais controvérsias oriundas de relações do trabalho regidas pela legislação especial.

Parágrafo 2º. A lei especificará os casos em que as decisões, nos dissídios coletivos, poderão estabelecer normas e condições de trabalho”.

A Constituição de 1967, com a emenda de 1969, praticamente nada alterou no texto da Constituição anterior, trocando apenas o vocábulo “casos” por “hipóteses”, mantendo a competência da Justiça Laboral para estabelecer novas condições de trabalho, quando autorizada pela lei ordinária. Inegável a determinação da limitação da atividade normativa pela edição de Lei Ordinária, a quem coube regulamentar a Justiça laboral, espécie esta que nunca foi promulgada, dificultando a análise exegética dos Tribunais Trabalhistas.

Sensível ampliação ocorreu em 1988 com a promulgação da Constituição Federal em 05 de outubro, que estabeleceu, no § 2º do artigo 114, a competência da Justiça do Trabalho para “estabelecer normas e condições” de trabalho. Não se faz mais necessário todo aquele esforço hermenêutico, já que o texto constitucional não subordinou o estabelecimento de “'normas e condições”' à existência de qualquer especificação de lei precedente. Concedeu, pura e simplesmente, à Justiça do Trabalho, o poder de estabelecer normas e condições, exigindo apenas, afora obediência às limitações inerentes ao princípio da harmonia e independência dos poderes, respeito às disposições convencionais ou legais mínimas de proteção ao trabalho[54].

A análise histórica do poder normativo deixa claro que sua instituição e manutenção objetivavam controlar a atuação reivindicatória e a capacidade de união dos trabalhadores. Esse poder sempre foi usado como fundamental instrumento de controle do Estado sobre o movimento sindical brasileiro e, por consequência, sobre o operariado[55].

Os governos então vigentes buscavam estabelecer, de forma minudente, através do exercício típico do poder legislativo conferido ao Congresso, as condições de exercício do poder normativo, estando sua previsão normativa sempre atrelada ao objetivo estatal de manter-se no controle ou, ao menos, na supervisão das relações trabalhistas.

4.3 PREVISÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO

A Constituição de 1988 traz expressa previsão do poder normativo da justiça do trabalho. Para alguns doutrinadores, tais como Geraldo Bezerra Menezes[56], o instituto já encontrava previsão desde as Constituições de 1946, 1967. Pedro Vidal Neto acredita que o embrião legislativo do mesmo foi fecundado desde 1936, quando disseminado o debate entre Oliveira Vianna e Waldemar Ferreira acerca do anteprojeto de organização da Justiça do Trabalho[57]. Saliente-se que as calorosas discussões giravam em torno atribuição da competência normativa à Justiça do Trabalho.

Na década de 40, a regulamentação da Justiça Trabalhista foi remetida à Lei ordinária, com a expressa disposição de que não lhe caberiam as prerrogativas da Justiça Comum. O Decreto Lei 1.237 de 1939 deu competência aos Conselhos Regionais para conciliar e julgar os dissídios coletivos, estendendo suas decisões a todos os empregados da empresa envolvida ou a toda categoria. Observe-se:

“Art. 28. Compete aos Conselhos Regionais:

Conciliar e julgar os dissídios coletivos que ocorrerem dentro da respectiva jurisdição”.

O conteúdo de tais decisões ficava determinado pelo artigo 94 do próprio decreto:

“Art. 94 Na falta de disposição expressa de lei ou de contrato, as decisões da Justiça do trabalho deverão fundar-se nos princípios gerais do direito, especialmente do direito social, e na equidade, harmonizando os interesses dos litigantes com os da coletividade, de modo que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público”.

Ao aprovar a Consolidação das Leis Trabalhistas, o Decreto Lei 5.452/43 trouxe em seu corpo, mais precisamente no artigo 867, a extensão e a vigência da sentença normativa prolatada em sede de dissídio coletivo.

“Art. 867 - Da decisão do Tribunal serão notificadas as partes, ou seus representantes, em registrado postal, com franquia, fazendo-se, outrossim, a sua publicação no jornal oficial, para ciência dos demais interessados.

Parágrafo único - A sentença normativa vigorará: (Incluído pelo Decreto-lei nº 424, de 21.1.1969)

a) a partir da data de sua publicação, quando ajuizado o dissídio após o prazo do art. 616, § 3º, ou, quando não existir acordo, convenção ou sentença normativa em vigor, da data do ajuizamento; (Incluída pelo Decreto-lei nº 424, de 21.1.1969)

b) a partir do dia imediato ao termo final de vigência do acordo, convenção ou sentença normativa, quando ajuizado o dissídio no prazo do art. 616, § 3º. (Incluído pelo Decreto-lei nº 424, de 21.1.1969)”.

A Constituição de 1946 aludiu, no § 2° do artigo 123, ao poder normativo. Entretanto, condicionava-o à regulamentação pela lei ordinária.

“Art. 123 - Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores, e, as demais controvérsias oriundas de relações, do trabalho regidas por legislação especial.

§ 1º - Os dissídios relativos a acidentes do trabalho são da competência da Justiça ordinária.

§ 2º - A lei especificará os casos em que as decisões, nos dissídios coletivos, poderão estabelecer normas e condições de trabalho”.

A Constituição de 1967, bem como a emenda de 1969, manteve a idéia original da Carta anterior, limitando a atuação do poder normativo à edição de legislação ordinária posterior.

Observa-se que a atuação do judiciário trabalhista através do poder normativo era limitada pelo próprio ordenamento jurídico. Nesse sentido, aduz Carlos Coqueijo Costa que “o Poder Normativo, atribuído à Justiça do Trabalho, limita-se ao norte, pela Constituição; ao sul, pela lei, à qual não pode contrariar; a leste, pela equidade e o bom-senso; e a oeste, pela regra consolidada no art. 766”[58].

“Art. 766 - Nos dissídios sobre estipulação de salários, serão estabelecidas condições que, assegurando justos salários aos trabalhadores, permitam também justa retribuição às empresas interessadas”.

A Constituição de 1988 introduziu significativa modificação, trazendo a falsa percepção da ausência de limites para a atividade normativa da justiça do Trabalho. O texto constitucional excluiu o antigo parágrafo 2°, que atribuía à lei o estabelecimento dos casos pacíficos da atuação judicial, dispondo apenas que esse poder deveria ter por base as disposições convencionais e legais mínimas de proteção ao trabalho[59]. Observe-se:

“§ 2° Recusando-se qualquer das partes à negociação ou à arbitragem, é facultado aos respectivos sindicatos ajuizar dissídio coletivo, podendo a Justiça do Trabalho estabelecer normas e condições, respeitadas as disposições convencionais e legais mínimas de proteção ao trabalho”.

Da leitura do parágrafo supra infere-se que era muito pequeno o espaço reservado à atuação da justiça trabalhista através do poder normativo, pois o judiciário, ao ter de resolver as questões controvertidas tendo por base as disposições convencionais e legais, ficaria nitidamente amarrado ao legislador. Neste diapasão, restaria à atividade normativa trabalhista a atuação para suprir as lacunas legais ou em determinadas situações nas quais a própria legislação esclarecesse que estariam sendo estabelecidos apenas parâmetros mínimos, a exemplo do artigo 7º, XVI da CF/88.

Em 2004, a Emenda Constitucional n.º 45 promoveu significativa alteração no § 2º do art. 114 da CF/88. A partir de então, passou a ser exigido o “comum acordo” dos litigantes para o ajuizamento do dissídio. Essa expressão é causadora de inúmeras polêmicas e vem sendo objeto, inclusive, de ações diretas de inconstitucionalidade.

“§ 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente”.

Hodiernamente, o poder normativo da justiça laboral encontra-se demasiadamente limitado, pois a sentença normativa, fruto de seu exercício, fundamenta-se, legalmente, no parágrafo acima transcrito, pelo que não mais representa, fidedignamente, os anseios legislativos da época da idealização do instituto. Consequentemente, alguns doutrinadores afirmam que a mesma foi extinta do ordenamento jurídico pátrio. O conceito de sentença normativa será a seguir analisado com maior detalhamento.

4.4 BREVE CONCEITUAÇÃO DE SENTENÇA NORMATIVA

A sentença normativa resulta da atividade legiferante atribuída a órgãos específicos dos tribunais trabalhistas, sendo exceção, neste ponto, ao exercício jurisdicional típico deste poder. Ela nada mais é do que a decisão proferida no dissídio coletivo, ou seja, o acórdão do Tribunal Regional do Trabalho ou da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho.

Sob pena de nulidade, deve ser fundamentada e tem de traduzir, em seu conjunto, a justa composição do conflito de interesses das partes, além de dever guardar adequação com o interesse da coletividade[60]. Afirma Lígia Simão Oliveira, citando Paulo Emílio Ribeiro Vilhena, que a sentença normativa não visa tutelar interesses gerais da sociedade, função esta exercida pela lei, tampouco interesses atendíveis mediante prestações individuais, sendo sua razão teleológica a tutela de interesses individuais vistos sobre o espectro das categorias[61].

Para José Anchieta Falleiros, a sentença normativa é fonte formal do Direito Laboral. Diz ser a mesma “fonte original do Direito do Trabalho, verdadeira inovação, de características constitucionais”[62]. Ela é fruto do poder que tem o juiz do trabalho de proferir ordens com o fim de regular novas condições de trabalho.

Como dito, a sentença normativa cria ou modifica condições de trabalho. Assim, pode ter natureza “constitutiva” (Chiovenda), “dispositiva” (Carnelutti) ou “determinativa” (Raselli), mas nunca “condenatória” (Jaeger)[63]. De maneira geral, pode-se ainda afirmar que é declaratória, como a maioria das sentenças. A natureza constitutiva justifica-se dada a criação de novas condições de trabalho. A dispositiva por ela dispor sobre a relação de emprego, que nada mais é do que uma relação jurídica, estabelecendo normas e condições para as partes envolvidas, como se uma lei fosse. Já a função determinativa está presente por ela dispor ou complementar a lei, atendendo as particularidades das relações jurídicas entre os envolvidos.

A sentença normativa possui eficácia erga omnes, o que a aproxima ou equipara à lei, enquanto que as outras produzem efeitos somente "inter partes". Para Délio Maranhão[64], é um “ato regra”, e, portanto, fonte do direito, sendo materialmente lei, embora com corpo de sentença. Neste diapasão, percebe-se que a sentença normativa, produto da função atípica do judiciário trabalhista, tem corpo de uma sentença, com seus essenciais requisitos (relatório, fundamentação e dispositivo), porém alma de lei, com efeito para todos do grupo ao qual é proferida. Nas palavras de Renato Fleischmann, a sentença normativa “tem natureza híbrida, com característica de ato jurisdicional, assim como de ato legislativo”[65].

Sintetizando, pode-se conceituar a sentença normativa como aquela que finaliza o processo de dissídio coletivo ou como a manifestação do poder normativo da justiça laboral. Dessa conceituação, resta clara a sua finalidade, qual seja, fixar novas normas e novas condições de trabalho.

Acrescente-se também que o Tribunal Trabalhista está autorizado a decidir o dissídio coletivo por equidade. Assim, em dissídios que versem sobre estipulação salarial, serão, por exemplo, estabelecidas condições asseguradoras de justo salário aos trabalhadores e que também possibilitem justa retribuição pelas empresas interessadas.

4.5 PODER NORMATIVO VERSUS FUNÇÃO JURISDICIONAL

Como visto, jurisdição é o poder que tem o Estado de dizer o direito, aplicando-o aos casos concretos que lhes são postos, geralmente através de uma atividade de subsunção, objetivando resolver os conflitos de interesses entre as partes, restaurando e resguardando, consenquentemente, a ordem jurídica e presenvando a autoridade das leis. Assim, a função jurisdicional, que se realiza por meio de um processo judicial, é a de aplicação das normas e tem por objetivo a atuação da vontade da lei. Ela parte do direito preexistente para apreciar um conflito de interesse posto.

Por outro lado, o poder normativo dos tribunais trata-se do exercício de uma atividade tipicamente legiferante constitucionalmente delegada e não do efetivo exercício de atividade jurisdicional basicamente. Para Andréa Presas:

“O poder normativo não é expressão do poder jurisdicional, tratando-se, na verdade, de atuação de índole legislativa. Ao Judiciário cabe o exercício da função jurisdicional, que consiste naquela atividade substitutiva da vontade das partes em conflito pela vontade do Estado, que faz atuar a vontade do direito objetivo válida para o caso concreto. O desempenho de atividade legislativa pela Justiça do Trabalho, através do poder normativo, deve ser vista como de caráter excepcional, porque desbordante da função típica desse Poder de Estado, que é a jurisdicional”[66].

Resumindo, a função jurisdicional significa dizer o direito, aplicando a norma ao caso concreto, função esta que é típica do judiciário. Enquanto isso, através do poder normativo a justiça laboral atua na criação do direito, de normas, semelhantemente ao legislativo.

Destaque-se que, ao exercer o dito poder, observando-se os limites mínimos legais, os Tribunais prestam-se a criar novas condições de trabalho e de remuneração, ao invés de aplicar o silogismo jurídico e a subsunção do fato à norma. Daí se tem que, no exercício do mesmo, a Justiça do Trabalho não está no uso de sua atribuição típica jurisdicional. Está, em verdade, exercendo uma função legislativa, tal como o Congresso a exerce em sua atividade típica[67].

Do exposto, infere-se que o exercício do poder normativo é, pois, fruto de uma atribuição legislativa exercida por órgão não integrante do Poder Legislativo, não passando de expressão do exercício do Poder legislativo assegurado à União[68]. Trata-se da atuação atípica do judiciário trabalhista.

Importante vislumbrar o parecer emitido Procurador Geral da República em eminente decisão proferida na ADI n° 3432-4/DF, no qual defendeu o mesmo não se confundir o poder normativo com a função jurisdicional, com a seguinte ementa:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE EM FACE DO § 2º DO ARTIGO 114 DA CF, COM A REDAÇÃO DADA PELO ART. 1º DA EMENDA 45/2004. O Poder normativo da Justiça do Trabalho, por não ser atividade jurisdicional, não está abrangido pelo âmbito normativo do art. 5º, XXXV da CF. Assim sendo, sua restrição pode ser levada a efeito por meio de reforma constitucional, sem que seja violada a cláusula pétrea que estabelece o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário.”

Não se pode deixar de ter em mente que o Poder Normativo trata-se de um poder originário, pois diretamente outorgado diretamente pela Constituição Federal aos Tribunais do Trabalho[69], a qual, expressamente, impõe seus limites.

4.6 LIMITAÇÕES AO PODER NORMATIVO

Nas democracias, não existem poderes sem limites. Face à ausência de qualquer limitação, seus titulares certamente cometeriam abusos e agiriam de acordo com seus impulsos, nada podendo ser feito contra tais atitudes, o que acarretaria transtornos imensuráveis a toda sociedade. Isso colidiria frontalmente com os pilares dos ideais democráticos, por conduzir à tirania e às ordens típicas das ditaduras, impossíveis de serem contestadas. Assim também o é com o Poder Normativo, que sofre uma série de restrições emanadas do ordenamento jurídico.

Lembre-se que o Poder Normativo da Justiça do Trabalho é excepcional. Trata-se de um poder anômalo, pois envolve o exercício de atribuição típica de outro poder, qual seja, o Legislativo. O fato de ter a Constituição atribuído função normativa anômala ao Judiciário Trabalhista em seu artigo 114, §2º não implica em violação à teoria da separação dos poderes. Este dispositivo expressamente determina o respeito às disposições legais mínimas de proteção ao trabalho e às normas convencionadas.

Em relação ao limite legal, não há maiores questionamentos, haja vista serem as normas tutelares mínimas, previstas em lei, intangíveis, além de não admitirem reformas prejudiciais[70]. Assim, o poder normativo somente é livre para ampliar as garantias ou criar novas, desde que observe eventuais reservas postas pela Constituição.

Controvérsias surgiram, entretanto, a respeito das normas anteriormente convencionadas. Alguns passaram a defender que as normas coletivas são inalteráveis, não podendo o poder normativo nem mesmo promover modificações benéficas[71]. Outros admitem a alteração, desde que para que haja ampliação das garantias dos trabalhadores[72], entendimento fundamentado no princípio da proteção.  

Tendo como balizamento o ideário da teoria da separação dos poderes, já abordada neste trabalho, fica fácil compreender que não é possível haver confronto entre duas esferas de poder quando idêntica a matéria tratada na atividade normativa de ambos[73]. Assim, o Poder Normativo da Justiça laboral não pode criar normas ou condições sobre situações já regulamentadas pelo poder legislativo, o que restringe seu âmbito de atuação, que está limitado àquilo o que é novo, que não está regido pelas normas e que já não foi disciplinado pelo Congresso Nacional.

Como poder jurídico que é, o Poder Normativo da Justiça do Trabalho não pode ser arbitrário, ou seja, o magistrado detém uma grande quota de arbítrio na solução dos conflitos coletivos, entretanto não pode afastar-se do sistema legal, para que não seja rompida a unidade e coerência do ordenamento jurídico. Assim, a despeito de inserir-se na conveniência do jurista, a distinção entre discricionariedade e arbitrariedade faz-se premente.

Ato discricionário é aquele que permite certa margem de liberdade ao jurista, mas que deve ser praticado dentro dos limites (normalmente preestabelecidos) e em conformidade com a lei. Arbitrário, todavia, será aquele ato praticado contrariamente à lei, de forma excedente. Tratam-se, pois, a discricionariedade e a arbitrariedade de conceitos literalmente opostos, vez que uma está ligada à legalidade enquanto a outra reside na seara do ilegal ou excedente.

Acrescente-se ainda que o Poder Normativo também se sujeita ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, devendo seguir o seu posicionamento sempre que a norma oriunda da decisão do dissídio envolver matéria constitucional. Sendo a Suprema Corte responsável por zelar pela supremacia da Constituição, bem como pela coerência do ordenamento jurídico, ela exercerá, consequentemente, uma espécie de fiscalização para que, no exercício de seu poder anômalo, a justiça laboral não vá de encontro aos mandamentos da carta maior.

Seguindo o entendimento de Pedro Garcia, escreveu Jorge Luis Machado:

“O Supremo Tribunal Federal vem adotando uma concepção restritiva acerca da abrangência da jurisdição normativa, visando compatibilizá-la com a competência legislativa do Congresso Nacional. De fato, não se deve olvidar que a jurisdição normativa consiste em uma função atípica conferida ao Judiciário, muito menos que o artigo 1º da Constituição Federal de 1988 estabeleceu, como cláusula pétrea, o império do Estado Democrático de Direito, ou seja, o predomínio da norma legal. Isso posto, não cabe à sentença normativa contrariar dispositivo constitucional ou legal, ou mesmo invadir reserva legal específica, sob pena de extrapolar os limites de sua competência constitucional”[74].

Para Arion Sayão Romita, esse poder atípico da justiça trabalhista possui limites máximos e mínimos. Estes últimos são aqueles a que a Constituição faz menção expressa. Já os máximos estão fixados por fontes materiais e formais de forma implícita[75]. Seguindo sua linha de raciocínio, diz Pedro Carlos Sampaio Garcia:

“As fontes materiais são representadas por valores constitucionalmente consagrados, como o direito de propriedade, da livre iniciativa e da livre concorrência. As fontes formais encontram-se nos arts. 5.º, II, e 49, XI, da Constituição Federal. O primeiro assegura o direito fundamental de que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. O segundo estabelece que o Congresso Nacional deve zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes. Resulta da interpretação desses dois preceitos que, havendo texto de lei regulando determinada matéria, a competência normativa respeitará o comando legal, não podendo ampliar nem reduzir a garantia ali estabelecida”[76].

Do exposto, conclui-se que, quando do exercício do poder normativo, está o juiz subordinado à Constituição e à lei, tendo o dever de observar os limites destas no exercício de sua conveniência. Essas restrições são provenientes de uma lógica facilmente compreensível, eis que a Lei, emanada da atividade do Legislativo, se legitima na vontade da coletividade nacional que elegeu seus representantes nos trâmites constitucionalmente previstos, afastando a possibilidade de ser contrariada por norma emanada de Poder que não foi eleito para elaborar leis.

Saliente-se que a Constituição de 1988 trouxe significativa modificação em relação às normas e aos textos constitucionais que lhe antecederam, pois deixou de mencionar que a lei estabeleceria as hipóteses nas quais o Poder Normativo da Justiça Laboral poderia ser exercido. Isso, de certa forma, alargou o âmbito de utilização do dito poder, já que não há mais a necessidade de texto legal estabelecendo as possibilidades de exercício do mesmo.  

Alguns estudiosos trabalhistas, a exemplo de Edson Braz da Silva, passaram a defender que a legislação vigente antes da Emenda Constitucional nº45/2004 inibia a negociação coletiva, reduzia o poder de organização e de negociação entre os sindicatos, priorizando uma relação oportunista entre os sujeitos da relação de emprego. Esse autor chegou a comparar as decisões da Justiça do Trabalho no exercício do poder normativo à fixação judicial de aluguel na Justiça comum, quando, para ele, o valor estipulado pelo juiz é sempre pouco para quem recebe e muito para quem o paga[77].

“... constata-se que o poder normativo da Justiça do Trabalho, combinado à possibilidade de que uma das partes possa, unilateralmente, pedir um dissídio coletivo, inibe a negociação coletiva e reduz o poder de organização do sindicato”[78].

Para alguns, o Poder Normativo figurou como um antídoto ou anestésico ao dialético fortificante que a organização sindical passa a cada campanha reivindicatória. Para estes, bem ou mal sucedido, o pleito organizado, solidificaria o legítimo representante dos trabalhadores[79].

Respeitando-se o posicionamento em contrário, acredita-se que o fato de o dissídio coletivo poder ser instaurado por apenas umas das partes não obstava o trabalho negocial dos sindicatos. Ao contrário, primava por uma negociação prévia, a fim de que as partes compusessem o conflito anteriormente à instauração judicial, já que, instaurado o dissídio, a lide escaparia das mãos dos sujeitos, que se sujeitariam à decisão de um terceiro julgador.


5 REFORMA DO PODER JUDICIÁRIO

Globalização, comunicação em massa, avanços tecnológicos e velocidade antes inimaginável dos meios de transportes são apenas algumas das características da atual sociedade. As mudanças ocorrem tão rapidamente que as pessoas acabam por não percebê-las ou por considerar grandes feitos como coisas normais, quotidianas. Nesse contexto, o mundo impôs, e vem diariamente impondo, uma nova dinâmica às relações sociais, que se tornaram por deveras intensas.

Uma das grandes discussões do presente envolve a temática da urgente necessidade de reformas do Estado. Sim, pois ele, seja pelos burocráticos procedimentos e meios de administração, pela inoperância e lentidão do legislativo ou pela desatualização das normas que balizam a atividade do judiciário, está longe de atender adequadamente às necessidades sociais.

Observou-se, historicamente, que a esperança e a confiança do povo costumaram residir no Judiciário, o qual ainda continua sendo considerado uma viga mestra para a manutenção da democracia. As pessoas vêem nesse poder uma espécie de garantia de respeito aos seus direitos, de uma convivência pacífica e de concretização da justiça. Logo, uma reforma no Estado tem de focar alterações no Judiciário.

A maioria das normas e dos códigos hoje vigentes foi elaborada em um contexto social, tecnológico e mercadológico totalmente diferente dos atuais padrões. Por conseguinte, o sistema jurídico não se mostra apto a disciplinar, atender e solucionar as modernas questões, o que faz crescer a certeza de que o ordenamento encontra-se ultrapassado, arcaico. Nesse contexto, tornam-se cada vez mais frequentes os casos polêmicos, situações para as quais não há previsão legal, ficando os juízes inseguros sobre como solucionar as lides, o que gera, por muitas vezes, sentenças totalmente contrárias sobre um mesmo problema. Afirma Ismael Marinho Falcão:

“Temos que reconhecer, forçosamente, que a falência do sistema que compõe o aparato governamental do Estado, na estrutura da tripartição do poder em funções, os chamados estamentos, já não atende mais aos anseios sociais, porque se trata de uma estrutura arcaica e carcomida, fundada num modelo concebido no Século XVIII, para realidades diametralmente diversas das que temos nos dias presentes. Ali, convém lembrar, uma parcela muito pequena da população era sujeito de direito, enquanto hoje, de modo diferente, todos quantos nascem e vivem sobre o globo terrestre, seja de que cor for e a que gradação social pertença, é sujeito de direitos e pode exercitá-los”[80].

Não mais poderia continuar passando despercebida a imobilização do Judiciário, que há muito se manteve engessado nos moldes antigos e já ultrapassados, assentado em fórmulas não mais condizentes com a realidade do mundo moderno. Consequentemente, o inegável descompasso vem norteando mini-reformas da legislação processual ordinária, como uma espécie de paliativo, e também a proposta de reforma do Poder Judiciário, que tem como principal fonte de inspiração a morosidade, aparentemente o maior problema a ser combatido[81].

Dentre as causas da lentidão, aponta-se como a mais evidente o excessivo número de demandas. Esse fator, associado à própria estrutura do Judiciário (carente de aparelhamento em nível administrativo), à desproporção entre o número de juízes e a quantidade de causas, além do evidente despreparo dos operadores do direito, contribui para a intolerante demora das soluções judiciais.

A celeridade é de transcendental importância para a concretização da justiça. Neste diapasão, a reforma do Poder Judiciário visava extirpar, ou, ao menos, reduzir as causas que obstavam o andamento regular dos processos, a fim de torná-lo mais efetivo e eficaz, dando aos cidadãos a resolução para seus conflitos de interesse de modo breve, sem, contudo, prejudicar a qualidade das decisões.

Variados foram os meios de solução para os problemas encontrados pela reforma, a exemplo do controle e fiscalização do Poder Judiciário, da criação do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, do efeito vinculante das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade, etc. Dentre eles, vale destacar a ampliação da competência constitucionalmente conferida à Justiça Laboral e a modificação de institutos que lhes eram próprios, objetivando adaptar esta especializada à nova realidade emergente das relações sociais e internacionais, que repercutem nas relações trabalhistas.

Em suma, a “grande reforma do Judiciário” envolvia, principalmente, alterações legislativas aptas a efetivamente contribuir para que a Justiça, como instituição, conseguisse granjear o prestígio e a força social indispensáveis em uma democracia[82]. Paralelamente, buscou-se preparar a legislação pátria para uma futura intervenção internacional nas protecionistas normas trabalhistas, adaptando-as ao quanto recomendado pela Organização Internacional do Trabalho.

5.1 AMPLIAÇÃO DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA LABORAL

Em 2004, depois de demorados e numerosos anos de tramitação, foi aprovada, pelo Congresso Nacional, a reforma do Poder Judiciário através da Emenda Constitucional nº. 45. Ela objetivou, principalmente, promover o alcance de maior celeridade na justiça. Para tanto, veio repleta de eficazes provimentos, aptos a efetivamente atender os numerosos conflitos de interesses diariamente postos aos magistrados, bem como de dispositivos legais balizados por tal escopo.

Destaque-se que a mencionada reforma conferiu maior proeminência à Justiça do Trabalho. As alterações foram intensas e profundas, possuindo, inclusive, o condão de alterar a visão que se possa ter dessa Justiça Especializada. A dita Emenda gerou inúmeras repercussões na seara laboral, dadas a modificações por ela promovidas no artigo 114 da Constituição Federal de 1988.

 Antes da modificação, o texto constitucional, no inciso I do citado artigo, atribuía à Justiça do Trabalho competência para julgar os dissídios individuais e coletivos decorrentes da relação de emprego e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho. Perceba-se que, basicamente, somente poderiam ser resolvidos pelos juízes trabalhistas conflitos entre trabalhadores e empregadores, desde que configurada a relação de emprego com todos os seus requisitos essenciais, cuja análise ultrapassa o objeto desse trabalho. Isso porque a competência para tratar das relações de trabalho dependia de lei específica, a exemplo do que ocorria com os dissídios resultantes de pequena empreitada, em que o empreiteiro fosse operário ou artífice (inciso III, alínea a, do art. 652 da CLT). Em relações às demais, a incompetência era latente.

No inciso I, art. 114 da CF/88, houve a substituição da expressão “relação de emprego” pela expressão “relação de trabalho”. Aparentemente, apenas foi feita a troca de uma palavra por outra que, inclusive, é considerada sinônima pelos leigos em direito. Entretanto, tal alteração causou enorme repercussão na Justiça do Trabalho, pois ampliou veementemente a sua competência. Essa Especializada recebeu, então, numerosas ações que tramitavam nas Justiças Comum e Federal, quais sejam, aquelas quem envolviam relações que não possuíam os requisitos da onerosidade, não eventualidade, subordinação e pessoalidade, caracterizadores da relação de emprego. Assim, os magistrados trabalhistas passaram a ser responsáveis pelo trâmite de muito mais processos do que antes, o que causou um abarrotamento das secretarias.

Além desse elastecimento, outra mudança ocorrida diz respeito ao procedimento utilizado no julgamento dos dissídios coletivos de natureza econômica, objeto do exercício normativo atribuído aos tribunais trabalhistas. Não se pode olvidar que as relações trabalhistas estão inseridas num contexto de globalização da economia, o que repercute nas crises econômicas, na acirrada competitividade entre os mercados, na flexibilização, na terceirização e, principalmente, no enfraquecimento do movimento sindical.

Como citado, variadas foram as alterações que ocasionaram a significativa ampliação da competência da Justiça do Trabalho, mas não cabe aqui detalhar cada uma delas. Houve ainda a inserção de expressões no texto constitucional, algumas das quais passaram a constituírem-se em verdadeiros requisitos para a propositura de ações, tais como a exigência de “comum acordo” para o ajuizamento do dissídio coletivo. Esse assunto, entretanto, será detalhadamente abordado em capítulo próprio.

Acrescente-se também que, como consequência da reforma, surgiu grande discussão envolvendo a extinção do poder normativo dessa Especializada. No Brasil, a Justiça Trabalhista, além de mais avançada em variados procedimentos quando comparada à Justiça Comum, representa uma evolução dos quadros regulamentares das relações de trabalho. Isso decorre do fato de ela tratar-se de uma Justiça extremamente especializada. Consequentemente, emerge o seguinte questionamento: a quem interessaria uma reforma tão drástica a ponto de indagar-se se esta não representaria, na realidade, a extinção daquele poder? Isso não seria um retrocesso às conquistas já galgadas pela classe operária[83]?

Fazendo uma brevíssima alusão ao direito comparado, em países onde a legislação é mínima, a exemplo dos Estados Unidos da América, a variedade de métodos estabelecidos pelas próprias partes para a solução dos conflitos é bastante desenvolvida e efetiva. Inversamente, no Brasil, a variedade é mínima, atribuindo-se ao Estado, praticamente, um monopólio da resolução dos conflitos[84]. Saliente-se que os brasileiros sempre preferiram a imposição de soluções pela figura do juiz do que a tentativa de autocomposição de seus problemas, talvez por vislumbrar no magistrado a garantia de que será feita a justiça.

As primeiras deliberações sobre Tribunais do Trabalho adotadas pela OIT faziam nítida distinção entre a natureza jurídica e a natureza econômica dos conflitos trabalhistas, sendo que estes deveriam ser confiados a órgãos extrajudiciais, enquanto àqueles deveriam ser submetidos à análise do Poder Judiciário[85]. A solução brasileira, contudo, assim como a de outros países da América Latina, prima por uma Justiça do Trabalho competente tanto para a solução dos conflitos econômicos, como pela resolução dos conflitos jurídicos.

5.2 REPERCUSSÕES DA EC Nº. 45/2004 NO DISSÍDIO JURÍDICO

Apesar não integrar o foco deste trabalho, válido abrir parênteses para tecer brevíssimos comentários sobre os impactos da EC nº. 45 sobre o dissídio coletivo de natureza jurídica.

Foi acrescida à redação do §2º, art. 114 da CF/88 a expressão “natureza econômica” adjetivando o já existente termo “dissídio coletivo”. Ora, com a alteração, não é mais possível o ajuizamento de dissídios coletivos de natureza jurídica? Vários doutrinadores passaram a defender que restou extinta a possibilidade de ajuizamento deles[86].

Porém, esse posicionamento, data vênia, não é o mais coerente. Como acima elucidado, o objetivo dos dissídios coletivos jurídicos é a interpretação ou a aplicação de normas preexistentes[87]. Esse escopo claramente integra o bojo das típicas atividades jurisdicionais, que consistem, simplificadamente, na análise de normas integrantes do ordenamento para a sua consequente aplicação ao caso concreto. Por conseguinte, fundamenta-se o ajuizamento do dissídio jurídico no inciso I, art. 114 da CF, que trata da competência genérica da Justiça Trabalhista.

Assim, ao apreciar a instância coletiva jurídica, o tribunal laboral nada mais está fazendo a não ser exercer sua atividade típica. Nas palavras de Andréa Presas:  

“A rigor, ao atuarem na apreciação de um dissídio de natureza jurídica, as Cortes Trabalhistas exercem atividade própria do Poder Judiciário, tal como ocorre, ainda que de forma genérica, nos julgamentos das reclamações trabalhistas, ações civis públicas, mandados de segurança, ações de cumprimento, e, bem assim, nas variadas ações coletivas que buscam a interpretação de norma jurídica atinente a interesse meta-individual, a exemplo dos mandados de segurança coletivos, ações civis públicas, ações diretas de inconstitucionalidade, dentre outras”[88].

O TST, julgando um dissídio coletivo, deixou claro seu entendimento de que a EC nº 45 não acabou com a possibilidade de ajuizamento dos dissídios coletivos jurídicos:

AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONSTITUCIONAL DE DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. Questiona-se a possibilidade jurídica do pedido, em face da ausência de previsão constitucional, após a Emenda Constitucional 45/2004, de dissídio coletivo de natureza jurídica. Ocorre que o art. 114, inc. I da Constituição da República trata da competência da Justiça do Trabalho para julgar litígio oriundo da relação de trabalho. Ora, o dissídio coletivo é a ação destinada a dirimir o conflito coletivo de trabalho nascido da relação empregatícia. Assim, ainda que o objeto do litígio seja mera interpretação de texto normativo, matéria própria do dissídio coletivo de natureza jurídica, competirá à Justiça do Trabalho apreciar a demanda decidindo o conflito. O art. 1º da Lei 7.701/1988, editada sob a égide da Constituição da República de 1988, contempla a modalidade de dissídio coletivo de natureza jurídica. Preliminares de extinção do processo sem resolução do mérito que se rejeitam. (...) (TST-DC-1746116-74.2006.5.00.0000, Rel. João Batista Brito Pereira, DJ 11/02/2007). (grifos nossos).

Em suma, mesmo depois da reforma, é totalmente possível o ajuizamento de dissídio coletivo de natureza jurídica, não havendo necessidade de sua expressa previsão no §2º do art. 114 da CF, pois sua admissibilidade encontra-se tacitamente prevista na competência genérica da Especializada (inciso I, art. 114 da CF).

5.3 IMPACTOS DA REFORMA SOBRE O PODER NORMATIVO

Já fora afirmado que nas lides coletivas trabalhistas há o confronto de interesses de uma categoria, podendo haver o estabelecimento de novas condições de trabalho quando da solução do dissídio. A resolução desses conflitos ocorre, variadas vezes, à margem do direito em vigor e acaba por criar norma vinculante ao grupo, o que é possível graças ao poder normativo.

O projeto inicial de reforma do Judiciário, que aguardava votação conclusiva antes da promulgação no plenário do Senado, eliminaria o parágrafo 2º do artigo 114 da Constituição, que assegurava o poder normativo aos tribunais do trabalho. De acordo com a PEC, a Justiça Laboral continuaria processando e julgando as ações oriundas das relações de trabalho, nos planos individual e coletivo, mas não poderia mais criar obrigações de natureza econômica.

Assim, os dissídios coletivos seriam apenas de natureza jurídica. Caberia ao tribunal interpretar e determinar a aplicação do texto de lei, de acordo ou convenção em vigor, sem, contudo, poder atender às reivindicações que motivaram a ação judicial. Logo, se houvesse, por exemplo, impasse em uma negociação relacionado ao índice de reajuste, o tribunal do trabalho não poderia, caso uma das partes ingressasse com dissídio coletivo, resolver a pendência, já que não disporia mais do poder normativo[89].

Tratando-se de greve, entretanto, a Justiça do Trabalho seria obrigada a julgar eventuais pedidos de suspensão do movimento paredista, inclusive com a prerrogativa de fixar multa em caso de desobediência quanto à data de retorno às atividades, mas não poderia atender a reivindicação que motivou a greve, salvo se as partes resolvessem, de comum acordo, designá-la como árbitro.

A mudança na competência da Justiça Laboral, no que se refere ao fim do poder normativo, sem alternativa para a solução dos dissídios de natureza econômica, seria adotada de forma precipitada. O pretexto para a supressão de tal poder – que, na proposta que chegou da Câmara ao Senado, já era mitigado, na medida em que só permitia o dissídio coletivo quando fosse ajuizado "de comum acordo" entre trabalhadores e empregadores – foi de que o direito coletivo do trabalho deveria ser disciplinado na reforma sindical, que está em fase de formulação e que expressamente prioriza a arbitragem, pública ou privada, em caso de impasse nas negociações coletivas. Enquanto não fosse encaminhada, aprovada e promulgada a reforma sindical, ficaria um vácuo na legislação, caso se confirmasse a decisão de supressão do poder normativo da Justiça do Trabalho na reforma do Judiciário[90].

O que preocupava nesse processo, além do vácuo que ficaria entre a promulgação da reforma do Judiciário e a sindical, é que se suprimiria uma fonte de direito (a sentença normativa) sem qualquer garantia ou contrapartida em termos de manutenção do poder de compra dos salários[91].

Antes da Emenda Constitucional nº. 45, dispunha o art. 114, § 2º da CF/98:

“Recusando-se qualquer das partes à negociação ou à arbitragem, é facultado aos respectivos sindicatos ajuizar dissídio coletivo, podendo a justiça do trabalho estabelecer normas e condições, respeitadas as disposições convencionais e legais mínimas de proteção ao trabalho”. (grifos nossos).

Depois da reforma, eis o novo teor do dispositivo:

“Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente”. (grifos nossos).

Observe-se que não mais consta expressamente do texto constitucional a possibilidade da Justiça Laboral estabelecer normas e condições de trabalho. Assim, passou-se a questionar a existência do poder normativo, que consiste justamente no possível estabelecimento das ditas normas e condições. Teria ele sido extinto pela EC nº. 45? Entretanto, não seria exagero se falar em extinção?

5.3.1 EXTINÇÃO DO PODER NORMATIVO?

Antes da EC nº. 45/2004, o § 2º do art. 114 da CF expressamente atribuía poder normativo à justiça do trabalho através da faculdade de estabelecer normas e condições. Com a supressão dessa possibilidade, instaurou-se grande cizânia em torno da extinção ou não de tal poder, já que ele fundamentava-se, justamente, nesta autorização legal.  

Se antes o tribunal trabalhista era competente, por autorização constitucional, para exercer atividade legiferante, com o advento da reforma passou a apenas poder “decidir o conflito”. Ora, se o poder normativo exercido em seu conceito stricto sensu se baseava justamente na possibilidade de criar, confeccionar e estabelecer normas, extirpadas tais autorizantes e reduzida a sua atividade à solução do conflito posto, onde estaria o antigo poder normativo?

Por uma interpretação exclusivamente literal, poder-se-ia defender que, tendo restado apenas o condão de decidir o conflito, estaria extinto o poder normativo. Seguindo essa linha de raciocínio, Nelson Mannrich afirma que a justiça laboral não mais possui tal poder, aludindo:

“Assim, apenas na hipótese de comum acordo entre as partes, é possível o ajuizamento de dissídio coletivo de interesse. Mas, mesmo nesse caso, serão respeitadas não só as condições mínimas de proteção legal, como as convencionadas anteriormente. Portanto, com o ajuizamento de comum acordo do dissídio, cabe à Justiça do Trabalho, decidindo o conflito, submeter-se àquelas restrições, ou seja, respeitar as condições mínimas de proteção, previstas em lei ou em negociação anterior, não subsistindo mais o poder normativo”[92].

Adotando posicionamento contrário, para Ives Gandra Filho, a reforma apenas diminuiu o poder de atuação normativo dos tribunais, que está “quantitativamente reduzido e qualitativamente alterado” [93], já que ainda lhes resta a possibilidade de decidir o conflito posto, objetivando uma ampliação da capacidade negocial dos sindicatos e transformando a corte especial numa verdadeira corte arbitral. O eminente doutrinador entende que não houve extinção do poder normativo, entretanto, defende ter a atuação da Especializada, nesse tocante, transformado-se arbitragem.

 Seu entendimento é o mais coerente, ressalvada a afirmação de ter o poder normativo virado uma espécie de arbitragem, o que não ocorreu, como será adiante demonstrado. É certo que, quando da decisão do conflito, a Especializada ainda tem o poder de estabelecer normas e condições de trabalho. Caso contrário, porque haveria de se falar em respeito às disposições mínimas de proteção ao trabalho e às anteriormente convencionadas? Sem a possibilidade de estabelecer normas e condições, não teria como a Justiça Trabalhista resolver o conflito.

Na maioria das vezes, a simples interpretação da literalidade das palavras de uma norma não é suficiente para a sua compreensão, pois não reflete por completo o seu significado. O sistema jurídico deve ser visto como um todo harmônico para que atenda aos ditames da justiça. Assim, conjugadas, as interpretações literal, gramatical, sistemática, teleológica e histórica refletem uma realidade deveras satisfativa. Lógico que não se pode afirmar que o poder normativo permanece intacto, como concebido em sua origem, dada a supressão das expressões do texto constitucional acima mencionadas, que deixavam expressa a possibilidade de criação. Entretanto, persiste o poder criativo da Justiça Laboral, entendimento que decorre de uma análise sistemática dos institutos.

 Assim, permanece vivo o poder normativo da Justiça do Trabalho, que apenas sofreu mais algumas limitações. Ele é livre para criar novas garantias ou mesmo maximizar as garantias legais, desde que dentro dos limites constitucionais e, sobretudo, observando as mínimas disposições protetivas e as anteriormente convencionadas. Aliás, em uma análise mais aprofundada, o magistrado não é um simples um aplicador do direito, exercendo, claramente, atividade criativa para solucionar os casos concretos que lhe são postos, ainda mais quando se encontra diante das lacunas legais. Afirma Sérgio Pinto Martins:

“De fato, se houver a extinção do poder normativo da Justiça do Trabalho, muitos direitos dos trabalhadores conquistados em dissídios coletivos não mais poderão ser discutidos e acabarão sendo perdidos, salvo se forem mantidos em convenção ou acordo coletivo”[94].

Nessa mesma linha de raciocínio, aduz Ives Gandra:

“Pela nova redação do art. 114, § 2º da Constituição Federal, o poder normativo da Justiça do Trabalho saiu fortalecido e, de certa forma, ampliado, uma vez que não sujeito quer à limitação da lei ordinária ao seu exercício, quer à interpretação castrativa levada a cabo pelo Pretório Excelso”[95].

Importante destacar que o poder normativo lato sensu, ou seja, aquele atribuído aos tribunais e a outros órgãos emanadores de decisões para criarem suas próprias regras regimentais continua incólume, pois não foi ou é objeto de qualquer alteração legislativa.

As mudanças introduzidas causam debates entre os doutrinadores que, até então, não pacificaram um entendimento quanto à alteração ou não da natureza jurídica conferida ao poder normativo dos tribunais trabalhistas.

5.3.2 MUDANÇA DA NATUREZA JURÍDICA DO PODER NORMATIVO?

Para a composição dos dissídios coletivos econômicos trabalhistas, é necessária a elaboração de uma norma jurídica que regule o interesse da categoria envolvida. Evidente que há, nessas ações, atividade normativa que envolve a criação. Assim, atribui-se às sentenças normativas a qualidade de fonte formal do Direito Trabalhista.

Neste diapasão, divergem os doutrinadores no tocante à classificação do poder normativo após as alterações promovidas pela reforma do judiciário. Continuaria ele sendo o exercício de atividade legiferante ou teria se transformado em atividade tipicamente jurisdicional? Ademais, teria a EC nº. 45/2004 transformado o seu exercício pela justiça laboral em uma Corte Arbitral? No intuito de responder a tais questionamentos, faz-se necessário o breve confronto entre alguns institutos.  

5.3.2.1 ATIVIDADE JURISDICIONAL OU ATIVIDADE LEGISLATIVA?

A palavra jurisdição deriva de duas expressões em latim: jus ou júris, que significa direito e dictio ou dictionis, significando ação de dizer. Assim, corresponde a dizer o direito. A função jurisdicional surgiu da necessidade de por um fim à temerária prática da autodefesa, quando a justiça era feita com as próprias mãos. O Estado, objetivando evitar a desordem na sociedade, chamou para si o dever de administrar a justiça em substituição às partes, no intuito de garantir, através do devido processo legal, soluções imparciais e ponderadas que dessem uma justa composição aos litígios, dotadas de caráter imperativo.

Destaque-se, entretanto, que no Estado organizado a atividade jurisdicional preexistiu mesmo à legislativa, à formação de normas jurídicas. Desde sua origem, aos juízes se delega a tarefa de sancionar a conduta dos grupos sociais, aplicando a justiça como se somente eles tivessem acesso ao que é certo. Na sociedade moderna esta realidade não se alterou, sendo o Estado o detentor dos instrumentos através dos quais se procura manter a ordem[96].

Como garantia de provimentos imparciais, o Estado autolimitou o seu poder, dando aos órgãos jurisdicionais a função de pacificar a contenda utilizando-se, para tanto, de forma soberana, da norma vigente no ordenamento jurídico que disciplinasse o caso concreto. Assim, a atuação deve ocorrer dentro dos ditames legais, aplicando-se a lei ao caso concreto. 

Em síntese, tipicamente judiciária, a atividade jurisdicional é aquela em que o Estado, quando provocado, tutela o interesse dos cidadãos através da aplicação de normas, sem a possibilidade do afastamento das decisões prolatadas. É a imposição coercitiva da decisão de um terceiro, quando este é instado a se manifestar.

Diferentemente, a atividade legislativa corresponde à elaboração de leis que regulam o Estado, ou seja, compreende atos tidos por normativos. Assim, compete tipicamente ao poder Legislativo a criação de normas de direito dotadas de abstração e generalidade, com abrangência geral ou individual, aplicáveis a toda a sociedade.

Para o desempenho de suas missões, a Constituição Federal prescreve algumas garantias ao Poder Judiciário. Essas garantias são classificadas em duas espécies: as institucionais, que dizem respeito à instituição como um todo, especialmente quanto ao relacionamento com os demais Poderes, e as funcionais, que possibilitam aos magistrados exercerem a função jurisdicional com dignidade e imparcialidade.

Como já afirmado, há funções desempenhadas pelo Poder Judiciário que se caracterizam como não judiciais, que não se sujeitam às espécies de controles ditados pela Constituição e pelas normas de processo. Explica Hely Lopes Meirelles:

"... todos os poderes têm necessidade de praticar atos administrativos, ainda que restritos à sua organização e ao seu funcionamento, e, em caráter excepcional admitido pela Constituição, desempenham funções e praticam atos que a rigor seriam de outro Poder"[97].

Nesse contexto está inserido o poder normativo, criativo dos órgãos não legislativos, inclusive dos tribunais trabalhistas. A peculiaridade deste, todavia, reside no fato de o exercício de parcela deste poder abranger a possibilidade de ser imposto a terceiros, ou seja, indivíduos não vinculados diretamente aos tribunais podem ser afetados pela imposição normativa dos mesmos.

Neste viés, a atividade legislativa dos órgãos judiciários, em especial dos tribunais laborais, divide-se pelo âmbito de sua atuação em externa ou interna. O âmbito de atuação interna, pelo qual há criação de normas dispondo sobre a organização dos próprios órgãos, não gera conflito na seara doutrinária. A delegação da atividade legislativa, neste aspecto, faz-se imprescindível para a manutenção da própria separação entre os Poderes, garantindo a imparcialidade e operatividade do Judiciário.

Já a atuação externa, entretanto, intimamente ligada com o exercício do poder normativo e o alcance da sentença normativa, gera inquietação entre doutrinadores, sendo rejeitado por uns[98] e aceito por outros[99]. Ora, o poder normativo da Justiça Trabalhista a distingue dos demais ramos do Judiciário justamente pela amplitude e abstração da sentença normativa. Havendo conflito coletivo de natureza econômica endereçado aos tribunais laborais, manifesta-se a sua competência criativa. Lembre-se que a sentença normativa é uma norma caracterizada pela abstração, pela criação de direito novo, produção de nova norma, podendo, inclusive, ser invocada como fundamento de processos ulteriores. Logo, ao produzi-la, a Justiça Laboral atua de modo atípico.

Aqueles que defendem ser o exercício do poder normativo uma atividade jurisdicional embasam seu posicionamento na equidade, mecanismo próprio de integração e interpretação do ordenamento jurídico[100]. Entretanto, existe mesmo o uso da equidade na criação de normas genéricas e abstratas pelo juiz? Ela é o adequado instrumento para o exercício do poder normativo?

Em verdade, a equidade orienta o aplicador do direito na busca da justiça no caso concreto, já que se trata de um método de aplicação e interpretação do Direito. Está intimamente ligada à concreção do direito e à individualização da norma. Maria Helena Diniz elucidou de forma brilhante a questão, afirmando que “não é a equidade uma licença para o arbítrio puro, mas uma atividade condicionada às valorações positivas do ordenamento jurídico”[101].

Na elaboração de novas normas, o legislador age discricionariamente, estando apenas limitado pela Constituição Federal, que, inclusive, também foi por ele elaborada. Ele faz opções valorativas e estabelece regras genéricas. Assim, se utiliza a equidade, não é da acima definida, tratada pela filosofia e ciência do Direito, mas sim, simplesmente, àquela relacionada à abstrata idéia de equilíbrio[102]. Já o juiz não possui a mesma liberdade, o que é característico do poder por ele exercido. Nesse tocante, a equidade lhe funcionada como um mecanismo para melhor compreender o direito existente e não para criação arbitrária, pois, como afirma Maria helena, “a equidade é um ato judiciário e não legislativo. É poder conferido ao magistrado para revelar o direito latente...”[103], adequando a norma geral ao caso concreto. 

Assim, não há utilização da equidade (entendida como meio de integração e aplicação de normas) no poder normativo da Justiça Laboral. A sentença normativa, como afirmado, possui caráter abstrato e genérico, típico de uma lei, o que difere do ideal da justiça para o caso concreto, próprio da equidade. Nela, há criação de direito novo, novas normas e condições com eficácia genérica para as categorias envolvidas no conflito.

Do exposto, resta claro, através do poder normativo, age o juiz do trabalho em nítida atividade legiferante, embasado na oportunidade e conveniência, com arbítrio semelhante ao de um legislador. Nas palavras de Pedro Garcia, “não busca temperar nem aplicar um corretivo à lei genérica na sua aplicação a um caso concreto, pois na atuação normativa o Juiz do Trabalho cria a regra genérica, que depois será ou não bem aplicada”[104]. O próprio TST já se posicionou nesse sentido, conforme abaixo transcrito:

EXIGÊNCIA DE COMUM ACORDO PARA INSTAURAÇÃO DE DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA ECONÔMICA (...) I - A Emenda Constitucional nº 45/2004 não aboliu o poder normativo da Justiça do Trabalho, nem lhe subtraiu sua função jurisdicional, desautorizando assim a tese sustentada aqui e acolá de que teria passado à condição de mero juízo arbitral, extraída da exigência de comum acordo para instauração do dissídio coletivo. II - A atividade jurisdicional inerente ao poder normativo da Justiça do Trabalho qualifica-se como atividade atípica, na medida em que, diferentemente da atividade judicante exercida no processo comum, não tem por objeto a aplicação de direito preexistente, mas a criação de direito novo, detalhe a partir do qual se pode divisar situação sui generis de ela, na sua atividade precípua como órgão integrante do Judiciário, desfrutar ainda que comedidamente da atividade legiferante inerente ao Poder Legislativo. (...) (TST-RODC-3626/2005-000-04-00.9, Min. Barros Levenhagen, DJ - 16/02/2007). (grifos nossos). 

Assim, quando a Justiça do Trabalho, julgando os dissídios coletivos econômicos, estabelecer norma genérica e abstrata, estará exercendo atividade legislativa e não propriamente julgando.

5.3.2.2 ARBITRAGEM?

Em decorrência das alterações promovidas pela Emenda Constitucional n.º 45/2004 no § 2º do art. 114 da CF/88, emergiu a seguinte discussão: o exercício do poder normativo teria se transformado, no fundo, em arbitragem? No afã de responder a esse questionamento, faz-se necessário tecer breves considerações a respeito desse instituto.

As modernas relações sociais e contratuais exigem que eventuais conflitos delas decorrentes sejam solucionados de maneira dinâmica, eficiente e célere, pois o tempo é um elemento crucial no estágio em que se encontra o mundo, marcado por transformações cada vez mais velozes. Frente a tantas variáveis, é essencial a busca pelos meios não estatais de solução de conflitos, pois o Poder Judiciário, cada vez mais abarrotado com a crescente quantidade de ações que lhe são postas, não tem condições de atender, com a devida presteza e em tempo razoável, as demandas a ele submetidas.  

Nesse panorama, vem sendo feito enorme estímulo às soluções extrajudiciais dos litígios, tais como a Arbitragem, a Mediação e a Conciliação. A Arbitragem e a Mediação, chamadas coletivamente de solução alternativa de controvérsias ou ADR (Alternative Dispute Resolutions), são dois processos principais dentro de um amplo espectro de meios para a solução de controvérsias[105]. Alguns autores brasileiros, a exemplo de Pedro Antônio Batista, utilizam-se da expressão “substitutos processuais” para fazer menção à atividade arbitral:

 “A complexidade dos vários sistemas legais, a integração dos países em mercados comuns e a especialização do direito, leva-nos a buscar uma via mais prática e objetiva de realização de justiça. Nesse particular, amplia a importância dos substitutos processuais, do qual a arbitragem é espécie”[106].

Segundo José Eduardo Carreira Alvim, a arbitragem:

 “É a instituição pela qual as pessoas capazes de contratar confiam a árbitros, por elas indicados ou não, o julgamento de seus litígios relativos a direitos transigíveis. Esta definição põe em relevo que a arbitragem é uma especial modalidade de resolução de conflitos; pode ser convencionada por pessoas capazes, físicas ou jurídicas; os árbitros são juízes indicados pelas partes, ou consentidos por elas por indicação de terceiros, ou nomeados pelo juiz, se houver ação de instituição judicial de arbitragem; na arbitragem existe o “julgamento” de um litígio por “sentença” com força de coisa julgada”[107].

Pode-se definir a arbitragem como um processo no qual as pessoas escolhem um árbitro (terceiro desinteressado) para tomar uma decisão sobre os seus problemas, após ouvir os seus argumentos e examinar as provas. Essa decisão terá força de sentença para elas.

Em uma segunda definição, pode-se conceituar a arbitragem como um processo legal, porém não-judicial, já que não se processa no âmbito do judiciário. Além de mais simplificado e mais rápido, dito processo apresenta muitas vantagens. Nela, as partes solicitam a intermediação de um profissional técnico com larga experiência no assunto, nomeado perito, para o esclarecimento do problema[108].

Pode-se afirmar que a arbitragem é um meio alternativo ao Judiciário para solução de controvérsias, ao qual as partes (pessoas físicas ou jurídicas), livre e voluntariamente (não há lei que obrigue), se submetem, para obter soluções ágeis e de custo reduzido. Segundo Carlos Alberto Carmona:

“A arbitragem é uma técnica para a solução de controvérsias através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nesta convenção sem intervenção do Estado, sendo a decisão destinada a assumir eficácia de sentença judicial.[109]

Em síntese, pode-se afirmar que a arbitragem é uma jurisdição privada autônoma, instituída por convenção entre as partes (que devem ser pessoas capazes), envolvendo matéria afeta aos direitos disponíveis. Elas escolherão um terceiro com a missão de resolver o conflito por meio de uma sentença arbitral, que não é passível de recurso.

Dentre as suas características, vale destacar a especialidade e neutralidade do árbitro, voluntária e livremente escolhido pelas partes. Não havendo consenso em torno de um único profissional apto para solucionar o problema, cada parte escolherá aquele de sua confiança e ambos escolherão um terceiro, ou as partes delegarão poderes à entidade arbitral para que ela designe o terceiro árbitro.

Como vantagens da arbitragem, enumeram-se a celeridade, a confiabilidade, a confidencialidade, a informalidade do procedimento, a especialidade e a flexibilidade[110]. Segundo Fredie Didier Júnior, não há qualquer vício de inconstitucionalidade na instituição da arbitragem, a qual não é compulsória. Trata-se de uma opção conferida a pessoas capazes para a solução de problemas relacionados a direitos disponíveis, não se admitindo o uso deste instituto para resolução de causas penais[111].

O instituto agora em análise classifica-se em diversas formas a depender de variados fatores, tais como o grau decisório conferido ao árbitro, a coercibilidade conferida às decisões e o local em que a sentença arbitral é proferida. Entretanto, a análise pormenorizada de cada uma de suas modalidades extravasaria o foco deste trabalho[112].

No Brasil, a arbitragem é regida pela Lei 9.307/96 e pode ser constituída por meio de um negócio jurídico denominado convenção de arbitragem, compreendendo tanto a cláusula compromissória quanto o compromisso arbitral. Trata-se, então, de um contrato onde pode ser expressamente renunciada a atividade jurisdicional do Estado, a fim de eliminar uma controvérsia específica, e não somente especificável[113]. Lembre-se que a convenção arbitral ou o contrato tem de prever, com exatidão, as cláusulas que serão objeto da arbitragem, não podendo o árbitro adentrar em outro âmbito senão naquele especificamente delimitado pelo negócio.

Pois bem. Um grupo de conceituados doutrinadores atuantes na seara laboral sustenta o entendimento de que as mudanças operadas pela EC nº. 45, notadamente a nova exigência do comum acordo, transformaram o dissídio coletivo econômico em uma forma de arbitragem. São alguns deles Ives Gandra Martins Filho[114], Pedro Sampaio Garcia[115] e Otávio Brito Lopes[116].

Ora, é certo que a dita Emenda Constitucional passou a exigir o mútuo consentimento, ou seja, o “comum acordo” para o ajuizamento do dissídio coletivo de natureza econômica. Entretanto, tal necessidade não é suficiente para conferir natureza arbitral à função desempenhada pela Justiça Laboral, pois existe enorme diferença entre os contornos da anuência para o dissídio coletivo e para a arbitragem.

Como visto, é pressuposto da arbitragem o assentimento das partes, seja através de cláusula ou de convenção de arbitragem. Porém, essa concordância não visa apenas legitimar a escolha da solução da lide por um terceiro. Vai além, extrapolando a propositura da demanda, haja vista que também implica na prévia aceitação dos termos da sentença arbitral pelos contendores. Em outras palavras, ao anuir com o procedimento arbitral, as partes já se submetem ao que eventualmente for decidido pela sentença, já que, sendo a mesma irrecorrível, apenas pode ser atacada através da ação anulatória. Diferentemente, o consentimento das partes no dissídio coletivo econômico trata-se apenas de um requisito necessário ao ajuizamento da demanda junto ao Tribunal competente.

Na jurisdição trabalhista, as partes não escolhem livremente aquele que irá decidir a contenta, pois o processo corre de acordo com as vigentes normas processuais reguladoras da competência, que são garantidoras do princípio do juiz natural. Contrariamente, no procedimento arbitral o árbitro é escolhido ao arbítrio dos conflitantes, ou seja, eles já sabem, desde o início, qual será a pessoa que colocará fim ao problema. 

Outra diferença reside na inexecução dos provimentos, pois o descumprimento de uma sentença normativa dá lugar à propositura da ação cognitiva de cumprimento, nos termos do art. 872 da CLT, enquanto o não cumprimento da sentença arbitral permite a imediata execução[117].

Além disso, para a resolução do conflito, o árbitro deve seguir as normas do direito vigente, salvo se as partes previamente elegerem a utilização do critério da equidade. Já no julgamento do dissídio coletivo, o Tribunal Trabalhista irá fazer a composição da norma reguladora. Nota-se, assim, que há flagrante diferença entre os critérios de apreciação dos litígios.

Já foi acima afirmado que a sentença arbitral é irrecorrível, pelo que contra ela só cabe ação anulatória. Distintamente, a sentença normativa é recorrível, podendo, nos termos do artigo 873 da CLT, ser revista quando modificadas as circunstâncias que a ditaram. Acrescente-se ainda que ela não tem de obedecer aos critérios fixados na lei nº. 9.307/ 96 para a sentença arbitral.

Defendendo a diferenciação, leciona Jorge Luis Machado:

“Apesar de as alterações da norma constitucional terem acrescentado um novo pressuposto processual específico (condição da ação, para alguns) para a instauração do dissídio coletivo de natureza econômica, qual seja, a necessidade de haver acordo entre as partes para o ajuizamento da instância, tal fato, por si só, não possui o condão de transformá-lo em espécie do gênero arbitragem. Ora, o artigo 114 da Constituição Federal trata especificamente da arbitragem em seu parágrafo 1° e no início do parágrafo 2°, dispondo, de forma expressa, que o ajuizamento da instância só ocorrerá quando houver recusa das partes à negociação coletiva e àquela forma de heterocomposição”[118].

Observe-se que o próprio texto da CF/88 diferencia a arbitragem do poder normativo, pois somente havendo recusa das partes a ela é facultada a instauração da instância, ou seja, do dissídio coletivo econômico.

Lastreando-se nos argumentos supra, pode-se afirmar, sem nenhum medo, mas com total respeito às opiniões em contrário, que não procede a tese segundo a qual, depois da Reforma, o exercício do poder normativo tornou-se atividade arbitral. Não se pode olvidar, entretanto, que a Constituição implantou o requisito do mútuo consentimento na seara coletiva trabalhista, que é também é típico da arbitragem. Mas essa identidade de requisitos nem de perto faz com que haja identidade entre os institutos.


6 BREVE ANÁLISE DE ALGUMAS QUESTÕES PROCESSUAIS

A maior celeuma causada pela inserção do “comum acordo” reside exatamente na dinâmica processual que a expressão impôs à conjuntura do julgamento do dissídio trabalhista. Não há um consenso doutrinário sobre sua natureza jurídica. Esse assentimento seria um pressuposto processual ou uma condição da ação?

A resposta a esse questionamento repercute diretamente na análise sobre a constitucionalidade da exigência. Logo, importante tecer sucintos comentários sobre esses institutos, no afã de aclarar as indagações. 

6.1 PRESSUPOSTO PROCESSUAL

Para a existência e validade de uma relação processual, é necessário que sejam observados alguns requisitos formais e materiais. Como bem afirma Fredie Didier Júnior, a simples afirmação de que certo elemento é um pressuposto processual não é suficiente para que se saiba muito a seu respeito. Em geral, apenas se pode concluir, de maneira acertada, que tal requisito trata-se de matéria pertinente ao processo, cuja análise será feita preliminarmente ao mérito[119].

No intuito de trazer mais clareza ao instituto, talvez na tentativa de dirimir o impasse, o autor parte do entendimento de que o processo deve ser visto como um todo, ou seja, analisado em seu conjunto. Isso porque defende ser o processo um procedimento de ato-complexo de formação sucessiva[120].

Em uma enxugada conceituação, pressupostos processuais são os requisitos necessários para a existência jurídica e a validade do processo. Importante destacar que a expressão pressuposto processual pode ser empregada em sentido amplo ou em sentido restrito. Na acepção lato sensu, denota os elementos de existência, os requisitos de validade e as condições de eficácia do processo a ser examinado.

Os pressupostos processuais em sentido estrito são os de constituição[121]. Assim, a ausência de qualquer um deles implica na inadmissibilidade do processo como um todo e não somente a existência de um ato-simples isolado dentro do contexto geral.

Para Ada Pellegrini, os pressupostos processuais são os requisitos para a constituição de uma relação processual válida. Os vícios a eles relacionados, assim, não maculariam a existência da relação, mas tão somente a sua regularidade perante o direito. Data vênia, a doutrinadora confunde os lato e stricto sensu, motivo pelo que sua afirmação não é de todo correta. Assim, a conclusão da autora em relação ao conceito atribuído ao instituto somente seria acertada acaso se resumisse ao pressuposto lato sensu, já que o pressuposto processual em si, tido como o stricto sensu, conspurca justamente a existência do ato.

Mais coerente e completo é o entendimento de Fredie Didier Júnior, para quem pressuposto é aquilo que precede ao ato e se coloca como elemento indispensável para a sua existência jurídica. Requisito, por outro lado, é tudo o quanto integra a estrutura do ato e diz respeito à sua validade. Assim, seria mais técnico falar-se em pressupostos de existência e em requisitos de validade, vez que os pressupostos, como acima definidos, tangem à existência (prévia) do ato e não sua validade (continuidade)[122].

Doutrinadores sintetizam os requisitos dos pressupostos processuais da forma seguinte: é necessário uma correta propositura da ação, feita perante uma autoridade jurisdicional, por uma entidade capaz de ser parte em juízo[123].

A relação jurídica processual imprescinde de elementos subjetivos, quais sejam, juiz (órgão investido de jurisdição) e autor. Presentes estes pressupostos de existência subjetivos, está configurada a existência da relação jurídica (considere-se a existência da demanda como o pressuposto de existência objetivo). Porém, é possível que, apesar de existente a relação jurídica processual, falte a determinado ato processual um pressuposto de existência jurídica. Nessa situação, analisando-se o processo como um todo integrado por partes, tem-se que poderá faltar um pressuposto de existência a um ato dentro do procedimento, independente da existência da relação jurídica como um todo[124].

Seguindo esse raciocínio, Fredie Didier destaca a necessidade de se examinar a validade do processo (como um todo ou fragmentado em atos). Assim, existente a relação jurídica, passa-se à análise da validade dos atos. Atenção: não se está discutindo aqui a validade da relação jurídica, posto que esta existe ou não existe, mas sim dos atos do processo[125].

Importante ressaltar que, no direito processual brasileiro, a expressão “pressupostos processuais” foi empregada para designar os elementos indispensáveis ao surgimento, validade e eficácia do processo. Os requisitos pertinentes à ação constituem elementos a serem encartados em outra categoria processual, aquela a que se designou de condições da ação[126].

6.2 CONDIÇÕES DA AÇÃO

O direito de ação é abstrato. Apesar disso, o legislador ordinário pode submeter o seu exercício a determinadas particularidades. São as chamadas condições da ação, ou seja, aquelas cujo preenchimento é necessário para que se possa, de fato, exigir o provimento judicial[127]

Decidindo pela regularidade do processo, o magistrado passará ao exame das condições da ação, verificando se elas estão presentes, de forma que o exercício do direito de ação esteja legitimado. Assim, ditas condições têm como momento de análise a prolação do inicial juízo de admissibilidade do procedimento[128].  

A doutrina aponta como condições da ação a possibilidade jurídica do pedido, o interesse de agir e a legitimidade ad causam.

A possibilidade jurídica do pedido está relacionada à admissão do pleito no ordenamento jurídico. Deve ser entendida como a inexistência de previsão que torne inviável a pretensão do autor. Logo, não é correto afirmar que ela consiste na existência de previsão para a dita pretensão, pois é sabido que o legislador não tem o mágico poder de prever todas as eventuais situações em abstrato. Ademais, vige no direito o princípio segundo o qual “tudo aquilo o que não está juridicamente proibido é permitido”, pelo que não se pode afirmar que o pleito de determinada pessoa é juridicamente impossível apenas por não encontrar previsão que lhe seja compatível. No entendimento de Dinamarco, o pedido é juridicamente impossível quando se choca com preceitos de direito material, de modo que jamais poderá ser atendido, independentemente dos fatos e circunstâncias do caso concreto[129].

Já o interesse de agir é um interesse instrumental, secundário, subsidiário, de natureza processual. Envolve a necessidade de obter uma providência jurisdicional quanto ao interesse substancial contido na pretensão. Para se examinar a presença dessa condição, devem-se observar duas circunstâncias, quais sejam: utilidade/necessidade do provimento judicial, além da adequação da via eleita. Na aferição da dita necessidade (utilidade), parte-se da premissa de que a jurisdição apenas deve ser usada em última hipótese, ou seja, como a última alternativa para solucionar o litígio, por se perceber que os outros meios não lhe resolveriam, além de que o provimento há de ser útil aos interesses das partes. Daí se infere repousar essa condição da ação na obrigação que tem o Estado de intervir nos conflitos a fim de concretizar a justiça, pois ele é o detentor do poder de dizer o direito. A adequação, por sua vez, está ligada à evidência de que o provimento solicitado deve ter aptidão para solucionar o mal que se busca corrigir. Em síntese, engloba a relação existente entre a situação lamentada pelo autor ao vir a juízo e o provimento jurisdicional concretamente solicitado[130].

Por último, a legitimidade ad causam é a pertinência subjetiva da ação[131]. Sabe-se que é constitucionalmente garantido o direito à provocação do judiciário. Entretanto, não é possível que qualquer pessoa possa levar a juízo qualquer pretensão relacionada a qualquer objeto litigioso. Isso geraria um verdadeiro caos, a ponto de, absurdamente, indivíduos pleitearem no judiciário pretensões que não estão a eles relacionadas. Logo, a priori, é titular do direito de ação a própria pessoa que se afirma titular do direito “lesado”. Nessa mesma ótica, o acionado deve ser o titular da obrigação correspondente[132].

6.3 CONSEQUÊNCIAS DA AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS E DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO

Mesmo que o processo tenha se iniciado regularmente, verificada a ausência dos pressupostos processuais, caso a irregularidade não seja sanada (se  possível) ou perdure, o magistrado não poderá proferir sentença de mérito, pelo que extinguirá o processo.

Da mesma forma, a ausência das condições da ação acima estudadas (possibilidade jurídica do pedido, legitimidade ad causam e interesse de agir) implica na extinção do processo sem julgamento de mérito, inteligência do artigo 267, VI do CPC. Daí se infere que a presença das mesmas é essencial para uma sentença meritória. Em suma, a falta de qualquer dessas condições da ação importará em sua carência e, declarando o autor carecedor da ação, o juiz extinguirá o processo.

Das exposições acima, pode-se concluir que os pressupostos processuais não se confundem com as condições da ação. Ora, em apertada síntese, eles têm por objeto o processo ou algo que nele interfira. Já as condições da ação estão relacionadas à lide. Nas palavras de Humberto Theodoro Júnior:

“Os pressupostos, portanto, são dados reclamados para a análise de viabilidade do exercício do direito de ação, sob o ponto de vista estritamente processual. Já as condições da ação importam o cotejo do direito de ação concretamente exercido com a viabilidade abstrata da pretensão de direito material. Os pressupostos, em suma, põem a ação em contato com o direito processual, e as condições de procedibilidade põem-na em relação com as regras do direito material”[133].

É cediço que, nos moldes do ordenamento jurídico vigente, a ausência dos pressupostos processuais e das condições da ação leva à extinção do processo sem a análise do mérito da lide[134]. Entretanto, a extinção de um processo sem julgamento meritório não representaria uma sutil forma de burlar a proibição do non liquet[135]? Mas o Estado não é o maior interessado em oferecer ao jurisdicionado a íntegra prestação judicial, pois com isso evita maiores conflitos sociais? Nessa linha de raciocínio, não deve o magistrado, a priori, extinguir um processo sem julgamento de mérito quando diante da ausência de um pressuposto ou condição sanável. Ademais, o comportamento em contrário não significaria deixar que o princípio da instrumentalidade das formas fosse malferido pelos rigores das exigências formalistas?

6.4 COMUM ACORDO: PRESSUPOSTO PROCESSUAL OU CONDIÇÃO DA AÇÃO?

Não há, na doutrina, um consenso a respeito da natureza jurídica do “comum acordo” necessário à propositura do dissídio coletivo econômico. O embate gira em torno de ser esse “consentimento” um pressuposto processual ou uma condição da ação. 

Para Edson Braz da Silva, subprocurador geral do trabalho, o “comum acordo” possui natureza de condição da ação e não de pressuposto processual. Ele embasa a sua afirmação no entendimento de que não deve ser exigida excessiva formalidade processual para a propositura do dissídio. Caso contrário, não estará sendo respeitada a sua maior finalidade, qual seja, a de restabelecer a paz social[136].

Pensando diferente, alude Andréa Presas Rocha que “o ‘comum acordo’ é pressuposto processual de constituição e desenvolvimento do processo [...], sem o qual não se estabelece a relação jurídica inerente ao dissídio”[137].

Respeitando as manifestações em contrário, a nova exigência trazida pela EC nº. 45/2004 trata-se, em verdade, de um pressuposto processual, já que é um requisito para a constituição e o regular desenvolvimento do processo. A necessidade de “comum acordo” para a instauração da instância está ligada ao exercício do direito de ação (em uma ótica processual) e não diretamente ao aspecto material da lide (leia-se: à abstrata viabilidade do direito material), pelo que tal assentimento não representa uma condição da ação.

Em outras palavras, não há elementos suficientes a indicar que seja o comum acordo uma condição da ação, pois estas se referem aos requisitos a que está vinculada a análise do direito material em litígio. Assim, mesmo que ausente a mútua concordância, não se pode falar em falta de interesse de agir da parte autora, já que ainda estará presente a necessidade/utilidade que caracterizam o interesse processual.

O próprio TST já entendeu ser o “comum acordo” um pressuposto processual, tendo expressamente afirmado que ele é um pressuposto para o desenvolvimento válido do dissídio, conforme pode ser conferido nas ementas abaixo transcritas:

DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA. ‘COMUM ACORDO’ PARA A INSTAURAÇÃO DO DISSÍDIO COLETIVO. IMPERTINÊNCIA. A exigência do ‘comum acordo’ como pressuposto para o desenvolvimento válido do processo de dissídio coletivo, objeto do § 2º do art. 114 da Constituição da República, introduzida pela Emenda Constitucional 45/2004, visa estimular e prestigiar a negociação coletiva como forma de composição dos conflitos coletivos do trabalho. Tendo em vista que para o Dissídio Coletivo de natureza jurídica não se exige negociação prévia, aquele pressuposto processual somente tem lugar em sede de Dissídio Coletivo de natureza econômica. (...) (TST-DC-1746116-74.2006.5.00.0000, Rel. João Batista Brito Pereira, DJ 11/02/2007). (Grifos nossos).

DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA ECONÔMICA. AJUIZAMENTO. COMUM ACORDO. NOVA REDAÇÃO DO § 2º DO ARTIGO 114 DA CONSTITUIÇÃO ATUAL APÓS A PROMULGAÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. Ressalvado o entendimento pessoal este Relator, a Seção Especializada em Dissídios Coletivos deste Tribunal Superior do Trabalho firmou jurisprudência no sentido de que a nova redação do § 2º do artigo 114 da Carta Política do país estabeleceu o pressuposto processual intransponível do mútuo consenso dos interessados para o ajuizamento do dissídio coletivo de natureza econômica. Recurso ordinário provido. (TST RODC - 628/2006-000-12- 00.3. Data de Julgamento: 08/06/2009, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Divulgação: DEJT 07/08/2009. (Grifos nossos).

Acrescente-se que, a priori, se não preenchido o pressuposto aqui analisado haverá o indeferimento da petição inicial depois de esgotado o prazo concedido pelo juiz para o suprimento da irregularidade, nos moldes do art. 248 do CPC. Percebe-se que a decisão extintiva do feito por indeferimento da inicial não apreciará o mérito, pelo que, consequentemente, não resolverá a lide, além de também não adentrar na análise das condições da ação, que poderá, inclusive, ser repetida após a correção do defeito.

Saliente-se que existe outro pressuposto processual para a instauração do dissídio coletivo econômico além do “comum acordo”, qual seja, a exigência da prévia negociação coletiva, conforme disposto no art. 114, § 2º da CF/88 e no art. 616, §§ 2º e 3º da CLT.

Independendo de qual se acredite ser a natureza jurídica da nova exigência, importante questionar a efetividade da alteração inserta no art. 114, §2º da CF.   


7 EXIGÊNCIA DO COMUM ACORDO PARA O AJUIZAMENTO DO DISSÍDIO COLETIVO ECONÔMICO

Já foi reiteradamente afirmado que a Emenda Constitucional nº. 45/2004 efetivou uma série de mudanças nos dissídios coletivos de natureza econômica. Como transcrito no item 4.3, a nova redação do § 2º do artigo 114 da CF foi acrescida da expressão “comum acordo”, o que limitou a possibilidade de ajuizamento desse tipo de instância.   

Antes da reforma, para a instauração do dissídio aqui tratado bastava a comprovação da prévia tentativa frustrada de negociação coletiva. Por tal motivo, o novo pressuposto vem suscitando uma série de discussões, notadamente a respeito da constitucionalidade da exigência acrescida, o que é objeto de análise deste trabalho[138].

Para uma melhor compreensão da problemática, deve-se abandonar a mera interpretação gramatical e partir para uma análise do novo dispositivo à luz do contexto geral do sistema, ou seja, inserto na lógica do ordenamento jurídico, bem como do perfil do modelo sindical existente no Brasil.

7.1 MOTIVOS QUE LEVARAM À INSERÇÃO DA EXPRESSÃO

Como visto, a reforma do Judiciário, levada a feito pela EC nº. 45/2004, priorizou conferir maior celeridade na solução dos litígios, assegurando ao jurisdicionado a efetivação da garantia da razoável duração do processo, nos ditames do art. 5º, LXXVIII da CF. Entretanto, que motivos levaram o constituinte a inserir a exigência do comum acordo para o ajuizamento do dissídio coletivo? Ademais, o que justifica a inserção no texto constitucional e não a mera exigência por meio de uma lei ordinária?

Renomados autores defendem que intencionou o legislador, com a inclusão da exigência do comum acordo, estimular as negociações coletivas entre as partes, para que estas não continuassem acomodadas com as soluções judiciais dos impasses, buscando compor seus conflitos de forma mais direta, sem a imperiosa intervenção do Estado-juiz. Nas palavras de Andréa Presas:

“Nos parece que o Legislador Reformador teve em mente a salutar valorização da composição dos conflitos coletivos diretamente pelas partes envolvidas, uma vez que a alteração do texto constitucional privilegia a negociação direta entre os  interlocutores sociais, pondo de lado a intervenção estatal, antes aviada pelo poder normativo atribuído à Justiça do Trabalho”[139].

O legislador constituinte objetivou acabar com a falta de disposição das partes à negociação coletiva, haja vista que estas quase sempre preferiram esperar por uma cômoda solução estatal para os conflitos, sem ter de empenhar-se na busca de soluções diretas. Saliente-se que a solução por via negocial é mais condizente com os interesses dos conflitantes, pois levada a feito por eles mesmos e não por um terceiro estranho à problemática, o qual, por mais conhecimento que tenha da situação, não está pessoalmente inserido no contexto.

Perpassando-se por uma análise histórica percebe-se que, no Brasil, o Estado sempre interveio incisivamente na seara privada, notadamente no âmbito das relações laborais. Essa intensa intervenção acaba por obstar a modernização e a flexibilização da legislação laboral, condizentes com as exigências do capitalismo, notadamente dos países que detém o poderio econômico. Citando Eduardo Gabriel Saad, afirma Luciana Cardoso:

“Em 1994, Saad manifestou sua opinião no sentido de que se deve abrir campo às negociações diretas entre patrões e empregados para discutir fórmulas que superem suas divergências. E só eles – e não os juízes – sabem ao certo até que ponto a empresa pode fazer concessões sem ameaçar sua sobrevivência. Só assim os empregados ficam em condições de evitar, em muitos casos, o mal maior representado pelo desemprego”[140].

Independentemente da conclusão a que se chegue sobre a constitucionalidade da nova exigência, não se pode olvidar que as alterações constitucionais resultaram de variados debates e opiniões de juristas competentes. Deve ser levado em consideração o cenário econômico em que está inserto o atual mercado de trabalho. O mundo capitalista, notadamente os fortes mercados internacionais, está ávido por uma maior flexibilidade das normas trabalhistas, pois as garantias aos trabalhadores chocam de frente com seus ferozes intentos expansionistas na incessante busca pelo lucro. Nesse contexto, é o dinheiro que dita tudo, pelo que nada pode obstar o seu acúmulo. Assim, os ditos países desenvolvidos constantemente pressionam o governo brasileiro, objetivando minar, paulatinamente, algumas conquistas e garantias que os trabalhadores adquiriram ao longo da evolução das relações laborais estabelecidas.

Ora, estaria simplesmente o Estado cansado de intervir nas relações privadas, saindo de cena após anos de intervenção? Imaturidade seria acreditar que mitigação tão drástica da ingerência estatal sobre o domínio econômico partiria voluntariamente do próprio Estado. Assim, a inserção da exigência do comum acordo, objetivando estimular a negociação direta entre as partes, foi, em última análise, decorrente das pressões por uma menor intervenção do Estado na seara laboral.

É cediço que, no Brasil, não pode haver mais de um sindicato representativo de uma categoria profissional dentro de uma mesma base territorial (não inferior à área de um município), o que é conhecido por “unicidade sindical”[141]. Consequentemente, não pôde ser adotada pelo governo brasileiro a Convenção nº. 87 da OIT, pois esta, ao possibilitar a existência de mais de um Sindicato para a mesma categoria dentro de uma única base territorial, garantiu a Pluralidade Sindical. É evidente que a dita Convenção, prezando por uma maior liberdade sindical, colide frontalmente com os ditames da CF/88, pelo que não pôde ser ratificada. Caso contrário, haveria desrespeito hierárquico ao texto constitucional.

Saliente-se, entretanto, que a OIT possui uma característica bastante peculiar: ela é a única organização multilateral que celebra tratados a respeito dos quais todos os Estados membros devem obrigações no âmbito internacional, ainda que não os tenha individualmente ratificado[142]. Em outras palavras, a Constituição da OIT estabelece verdadeiros deveres a serem cumpridos frente a seus órgãos de controle, tanto pelos Estados que ratificam as suas Convenções, como também por aqueles que, sendo membros da Organização, não o fazem. Assomado a isso, o 346º Informe do Comitê de Liberdade Sindical já expressamente recomendou que o Brasil adotasse as necessárias medidas para modificar a sua legislação interna, para que os trabalhadores possam criar organizações sindicais ao nível de empresa, se assim o desejarem.

Não restam dúvidas de que o desrespeito às Convenções ou mesmo às Recomendações da OIT é passível de retaliações econômicas por parte dos Estados que detém o poder econômico mundial (que, por coincidência, também controlam as decisões da Organização). Ademais, apesar de essas possibilidades de represálias não constarem expressamente das normas que regem a Organização, é certo que serão adotadas como forma de obrigar a adesão a seus ideais, ou seja, como maneira de fazer com que os países economicamente mais fracos comportem-se de maneira a não impedir o desenfreado domínio do capitalismo exacerbado.

Ora, toda essa pressão internacional por uma maior liberdade sindical, exercida, inclusive, por uma fortíssima organização como a OIT, visa, nitidamente, primar pela negociação direta entre as partes como meio de solução dos conflitos, afastando a constante intervenção do Estado através do judiciário. Assim, fez-se necessária uma adaptação da legislação nacional, que começou a se concretizar a partir da inserção da exigência do comum acordo[143]. Nesse contexto, no Fórum de um debate organizado pelo MTE, foi apontado que o marco normativo das leis trabalhistas atualmente em vigor deve ser revisto e adaptado às novas configurações do mundo do trabalho, privilegiando a adoção de mecanismos voluntários de composição de interesses[144].

Deixando de lado outros eventuais questionamentos a respeito da motivação da inserção da exigência do comum acordo, certo é que essa alteração não poderia ser feita de outra maneira a não ser por modificação no texto constitucional. Se a mudança fosse efetivada por lei ordinária, não vingaria por latente inconstitucionalidade, já que afrontaria diretamente o art. 5°, inciso XXXV da CF/88. Seguindo a lógica desse raciocínio, encontra-se a justificativa para a opção do legislador por proceder a uma emenda ao texto constitucional ao invés de elaborar lei ordinária que disciplinasse o instituto, o que seria bem mais fácil e descomplicado.

Importante destacar que de nada adianta incentivar as negociações coletivas, com uma menor intervenção estatal, se os sindicatos brasileiros ainda continuarem inexpressivos, fracos e desorganizados. Segundo Luciana Cardoso:

“(...) embora acredite que a negociação coletiva seja o ponto central da dinâmica do direito do trabalho, faz-se mister que primeiro haja o fortalecimento da estrutura sindical do país. A necessidade da intervenção estatal para a regulamentação das relações trabalhistas manifesta-se já a partir do caráter tutelar do direito do trabalho”[145].

É inconteste que a exigência do comum acordo sem a paralela reforma sindical (que ainda não veio) acabará por ameaçar a existência de muitos sindicatos brasileiros, que não possuem a força suficiente para levar os grandes empresários às mesas de negociação, exercendo a pressão suficiente para galgar melhores condições para os representados. Inteligente a conclusão de Raimundo Simão de Melo:

“Foi na busca deste objetivo que o legislador constituinte derivado implementou o pressuposto do ajuizamento do Dissídio Coletivo de comum acordo, para forçar as partes à negociação coletiva. Contudo, uma coisa é o desejável, no caso, a priorização do negociado; outra coisa é a realidade brasileira, de um modelo, na grande maioria dos casos, de sindicatos frágeis, que não têm poder negocial e de pressão contra o empresariado. E desta realidade não se pode fazer abstração. No dia-a-dia, raros não são os casos em que as empresas ou a categoria econômica não reconhecem o sindicato dos trabalhadores, não negociam uma solução para o conflito e também, por razões óbvias, não concordam com o ajuizamento do Dissídio Coletivo”[146].

Sabendo que a alteração do texto constitucional repercutirá negativamente perante os sindicatos mais fragilizados, já foram ajuizadas inúmeras ADI’s pleiteando a declaração da inconstitucionalidade da exigência do comum acordo.  Afinal, a negociação coletiva nem sempre se mostra viável, pelo que, consequentemente, poderá haver grande dificuldade para a propositura do dissídio coletivo em conjunto.

7.2 SIGNIFICADO DO “COMUM ACORDO”: LEGITIMAÇÃO PARA O AJUIZAMENTO DO DISSÍDIO COLETIVO ECONÔMICO

O significado da expressão “comum acordo” repercute diretamente na legitimação e forma de propositura do dissídio coletivo de natureza econômica. Afinal, para que esteja cumprida a nova exigência deve ser protocolada petição inicial assinada conjuntamente pelas partes? Ou isso não seria necessário, bastando a concordância expressa ou tácita do suscitado?

Defendendo que a expressão comum acordo significa petição conjunta, diz Davi Furtado Meirelles:

“O poder normativo somente pode ser exercido pela Justiça do Trabalho se as partes assim desejarem. E a forma de ajuizamento poderá ser por petição em conjunto, ou por instauração de uma delas com declaração de concordância da outra parte (...). O fato de a parte contrária não apresentar contestação ao pedido de julgamento do dissídio coletivo, fazendo apenas a sua defesa contra os termos aludidos na peça inaugural, não nos parece ser suficiente para interpretar como concordância tácita ao exercício do poder normativo. Se a nova regra constitucional impõe a condição de concordância mútua, compete ao instrutor do feito verificar o preenchimento dessa condição”[147].

Entretanto, pensar em petição assinada em conjunto pelos oponentes não é uma alternativa muito viável, pois, no bojo discussões e embates, quando da tentativa das negociações, se as partes já não querem ceder reciprocamente, imagine expressamente concordar com que seja demandada em juízo. Aduz José de Luciano Castilho:

“Começamos por indagar o significado da expressão de comum acordo. Evidentemente não pode significar, necessariamente, petição conjunta. Logo, estou entendendo que o comum acordo não precisa ser prévio. Ele pode vir – de modo expresso ou tácito – na resposta do suscitado ao Dissídio ajuizado. Assim, ajuizado o Dissídio Coletivo pelo sindicato dos empregados, sem o acordo expresso da parte contrária, deve o juiz mandar citar o suscitado e apenas na hipótese de recusa formal ao Dissídio Coletivo, a inicial será indeferida”[148].

Assim, o concurso de vontades entre os sindicatos representativos não significa, necessariamente, ação coletiva de iniciativa conjunta entre as partes. Fundamental, entretanto, é que haja a concordância expressa ou tácita de ambas as categorias. Como bem defende Edson Braz da Silva:

“Desse modo, o suscitado deve externar a objeção ao dissídio coletivo unilateral na primeira oportunidade, ou seja, no início da audiência de conciliação e instrução, que é o primeiro ato processual do dissídio coletivo pós-citação. Se o suscitado participar da tentativa de conciliação promovida pelo Tribunal, sem antes deixar clara a discordância com o ajuizamento unilateral do dissídio coletivo, terá tacitamente suprido a exigência legal do comum acordo”[149].

Entende-se que a expressão “de comum acordo” não significa a necessidade de petição em conjunto, nem mesmo a prévia e expressa anuência do suscitado. Daí conclui-se, inclusive, que o preenchimento desse pressuposto pode ser aferido em momento posterior ao da propositura da demanda, quando da resposta do suscitado.  A lei, porém, não possui palavras inúteis. Logo, não se pode ignorar a inserção da exigência e seguir os trâmites previstos para o dissídio coletivo econômico antes da EC nº. 45.

Ao inserir a exigência, o legislador objetivou limitar a atuação normativa dos tribunais laborais. Consequentemente, citado o suscitado e expressando este a falta de consenso na instauração, o dissídio coletivo deverá ser extinto sem exame do mérito por falta de pressuposto. Todavia, a simples apresentação de contestação faz suprir o requisito faltante, demonstrando tacitamente que o sindicato suscitado está apto a negociar. Destaquem-se as seguintes ementas:

DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA ECONÔMICA. Art. 114, Parágrafo 2º, CF. COMUM ACORDO NÃO SIGNIFICA, NECESSARIAMENTE, PETIÇÃO CONJUNTA. INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA. Aplicação do princípio da inevitabilidade da jurisdição (art. 5º/XXXV/CF). Negociação infrutífera. Concordância tácita à atuação da jurisdição. Precedente desta E. SDC. Dissídio que é conhecido e julgado procedente em parte. (TRT 2ª Região – SDC - Proc. 9-20067-2005-000-02-00 – Rel. Juiz Carlos Francisco Berardo – DOE-SP PJ de 27.1.2006).

DISSÍDIO COLETIVO - AJUIZAMENTO SEM A CONCORDÂNCIA DA PARTE CONTRÁRIA (ART. 114, PARÁGRAFO 2º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988) - CONSEQUÊNCIA. O disposto pelo art. 114, parágrafo 2º, da Lei Magna, não deve ser interpretado de modo literal e isolado, e sim sob a ótica da interpretação lógica e conjunta do ordenamento jurídico. O que emana do referido dispositivo constitucional é que as partes detêm a faculdade de ajuizar dissídio coletivo em caso de recusa da parte contrária em proceder à negociação coletiva ou à arbitragem ou na hipótese de malogro das tentativas conciliatórias, sob pena de, a se pensar o contrário, dar-se ensejo à violação do direito de ação constitucionalmente garantido (CF, art. 7º, inc. XXXV). Ademais, a participação do suscitado na audiência de conciliação e instrução perante este Tribunal e, bem assim, nas reuniões com o suscitante perante a Delegacia Regional do Trabalho, representa a concordância tácita com o presente dissídio coletivo. (TRT 3ª Região – Seção Especializada de Dissídios Coletivos - Proc. DC 00474-2006-000-03-00-9 – Rel. Juiz Sebastião Geraldo de Oliveira – DJMG de 25.8.2006, p. 2).

Para Júlio Bernardo do Carmo, é possível, inclusive, face à recusa injustificada da parte contrária, que haja o suprimento judicial do consenso. Leia-se:

“Se o sindicato dos trabalhadores for inexpressivo, tíbio, sem poder de barganha contra o patronato e sem meios de exercer com sucesso o direito de greve, a recusa de consentimento da categoria econômica para o ajuizamento conjunto do dissídio coletivo de natureza econômica pode sim caracterizar a recusa abusiva, injurídica ou de extrema má-fé que obsta potestativamente o exercício do direito de ação coletiva por parte do operariado. Neste contexto parece-me que a parte prejudicada poderá sim, de imediato, ajuizar o dissídio coletivo de natureza econômica e nele requerer de forma incidental o suprimento judicial da recusa da categoria econômica contraposta”[150].

Coerente o posicionamento do doutrinador, pois, através do dito suprimento, o sindicato laboral fica protegido de eventual recusa imotivada ou mesmo decorrente de má-fé por parte do sindicato patronal. Trata-se de uma forma de proteger a possibilidade de o trabalhador continuar a obter melhores condições de trabalho via dissídio coletivo.

Frise-se que, apesar das mudanças, ainda continua sendo de prerrogativa dos sindicatos o exercício da ação coletiva econômica, com exceção dos casos de dissídios instaurados pela categoria obreira diretamente contra uma empresa, conforme explanado no precedente normativo n° 19 da Seção de Dissídio Coletivo do TST. Assim, em caso de ausência de sindicatos representativos na base territorial delimitada, tem-se que continuam legitimadas para a instauração do dissídio as federações e confederações respectivas. Desse modo, são legítimos para instaurarem o dissídio coletivo de natureza econômica apenas os sindicatos, econômico e obreiro, estando o MPT autorizado a instaurar instância apenas nos casos de paralisação das atividades essenciais quando a defesa da ordem jurídica ou o interesse público assim o exigir.

7.3 CONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA EXIGÊNCIA

Grande foi a inovação trazida pela EC nº. 45/2004 ao introduzir a exigência do comum acordo para o ajuizamento dos dissídios coletivos de índole econômica. A doutrina e a jurisprudência realizam polêmicos debates sobre a alteração, inclusive pelo fato de tramitarem variadas ações diretas de inconstitucionalidade envolvendo a temática no Supremo Tribunal Federal[151].

São tecidas intensas discussões a respeito da validade da expressão “de comum acordo” e as demandas que tramitam no STF possuem como principal objeto a declaração de sua inconstitucionalidade. É cediço que o art. 5º, XXXV da CF traz como cláusula pétrea o Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição. Leia-se: “a lei não excluirá a apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Ora, não colidiria o pressuposto do mútuo consenso com a garantia do livre acesso ao jurisdicionado? Em outras palavras, ele não impediria que os sindicatos representantes dos trabalhadores exercessem o direito de ação contra os sindicatos patronais?

Pois bem. Como já acima explicitado, a exigência foi inserida no texto constitucional através de uma Emenda, não tendo sido introduzida no ordenamento por meio de uma simples lei ordinária que, caso contrariasse a constituição, seria aprioristicamente tida por inconstitucional. Acrescente-se ainda que a EC nº. 45 respeitou todos os trâmites procedimentais constitucionalmente previstos para a elaboração de uma emenda, pelo que não há como negar que ela é formalmente constitucional. Mesmo diante desses argumentos, viria a afirmação segundo a qual uma Emenda Constitucional pode ser formalmente constitucional, entretanto não o ser substancialmente. Afinal, hoje já é pacífica a possibilidade de controle de constitucionalidade dessas espécies normativas, pois toda e qualquer alteração do texto da Magna Carta tem de, obrigatoriamente, respeitar os limites (expressos ou implícitos, materiais ou formais) traçados pelo Poder Constituinte Originário

Neste diapasão, embora seja formalmente constitucional, questiona-se a validade substancial do pressuposto, a dizer, a sua adequação aos princípios e ditames da Magna Carta. Renomados doutrinadores defendem não haver inconstitucionalidade alguma na exigência. Neste sentido, sustenta Edson Braz da Silva que não se pode confundir direito com interesse jurídico. Para ele, o interesse trata-se de uma vantagem ou benefício pretendido no intuito de satisfazer um desejo ou necessidade, sem que haja, porém, correspondente norma garantidora do dito interesse. Já o direito encontra paralelo em um bem juridicamente tutelado, ou seja, somente se tem direito sobre aquilo o que está juridicamente garantido. Logo, enquanto o direito pode ser violado, o interesse, por ser mera expectativa, não pode[152].

Completando o seu raciocínio, afirma o autor que por ser o dissídio coletivo uma ação tendente a apreciar interesses das categorias e não direitos preexistentes, não há de se falar em ofensa aos ditames constitucionais da Inafastabilidade do Controle Jurisdicional. Acrescenta ainda que a norma constitucional originária (art. 5º, XXXV) e a inserida por Emenda (art. 114, §2º) encontram-se em um mesmo patamar hierárquico, tratando-se ambas de normas constitucionais, não podendo uma sobrepor-se à outra. Concluindo a sua tese, afirma que é a Lei que não pode excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, e não a própria constituição que pode, como o faz, excepcionar seus próprios ditames[153].

Otávio Brito Lopes também defende a constitucionalidade do novo pressuposto, fundamentando seu posicionamento no não exercício de atividade jurisdicional pelo Tribunal Laboral quando do julgamento dos dissídios coletivos econômicos. Escreveu: 

“A se considerar o Poder Normativo como atividade jurisdicional, não se poderá deixar de reconhecer que a exigência do mútuo consentimento dos atores sociais para deflagrar o Poder Normativo se configura em verdadeiro cerceamento do acesso amplo ao Judiciário, o que seria inadmissível. Em se tratando, entretanto, de arbitragem judicial voluntária, como a nosso ver é a hipótese, não há que se falar em tal inconstitucionalidade, mesmo porque a arbitragem voluntária é de nossa tradição e decorre de nosso ordenamento jurídico (Lei n. 9.307, de 23 de setembro de 1996), haja vista que o Brasil não adota a arbitragem compulsória”[154].

Utilizando-se do argumento de que o Dissídio Coletivo não tem como objeto um conflito ou uma lide, por não visar evitar a lesão ou a reparação a um direito reconhecido pelo ordenamento jurídico, o autor deixa evidente que as decisões nele proferidas possuem natureza de atividade legiferante, não estando, consequentemente, abarcada pela garantia do art. 5º, XXXV da CF/88. Em suma, como o exercício do poder normativo não é jurisdição, não há de se falar em ofensa à garantia de acesso ao judiciário.

Em novembro de 2007, foi aprovado, na Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, o Enunciado nº. 35, que adota a tese da constitucionalidade da exigência, como se pode observar:

“Dissídio coletivo. Comum acordo. Constitucionalidade. Ausência de vulnerabilidade ao art. 114, § 2º da CRFB. Dadas as características das quais se reveste a negociação coletiva, não fere o princípio do acesso à Justiça o pré-requisito do comum acordo (§2º, do art. 114, da CRFB) previsto como necessário para a instauração da instância em dissídio coletivo, tendo em vista que a exigência visa a fomentar o desenvolvimento da atividade sindical, possibilitando que entes sindicais ou a empresa decidam sobre a melhor forma de solução dos conflitos”[155].

Em que pese os expostos posicionamentos sobre a constitucionalidade e respeitando-se as opiniões dos ilustres doutrinadores, entende-se que, apesar de ser a exigência um pressuposto constitucional do ponto de vista formal, pois inserido através de Emenda que observou os devidos trâmites processuais, ela não se reveste de constitucionalidade substancial, material ou principiológica, como será a seguir demonstrado.

7.4 INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL E PRINCIPIOLÓGICA DA EXIGÊNCIA DO COMUM ACORDO

Como afirmado no tópico anterior, a exigência do comum acordo foi inserida na Constituição Federal por Emenda, tendo cumprido com exatidão os requisitos necessários para que seja formalmente constitucional. Entretanto, não se pode fazer uma análise literal do texto da Magna Carta, baseada em formalismos exacerbados, sem levar em consideração os princípios básicos que norteiam toda a lógica do sistema, dentre os quais está a celeridade, a inafastabilidade de jurisdição e o respeito aos direitos e às garantias individuais.

De tudo o que já foi exposto nesse trabalho, fácil perceber que o principal interessado no Dissídio Coletivo Econômico como mecanismo para galgar conquistas é o empregado, jurídica e economicamente hipossuficiente na relação laboral. Ele vislumbra, nesse instituto, a chance de conseguir melhores condições e novos direitos não previstos nos textos normativos, daí a importância do procedimento. Nesse contexto, o sindicato obreiro, tradicionalmente fraco e inexpressivo frente aos poderosíssimos entes patronais, sempre encontrou no dissídio coletivo econômico uma maneira de compelir ou mesmo obrigar o empregador a negociar melhorias nas condições para os seus representados.

Ora, com a exigência do comum acordo, o que acontecerá se o sindicato não tiver força para pressionar os patrões pela negociação? Não será feito nada? Ficarão, assim, os empregados legalmente desamparados? Desses questionamentos já emerge a inconstitucionalidade substancial da mútua anuência, como será detalhadamente demonstrado.

É cediço que o inciso XXXV, art. 5º da CF consagra o princípio do acesso à justiça, pelo que todos aqueles que sofram ou estejam ameaçados de sofrerem lesões aos seus direitos podem recorrer ao Poder Judiciário.

 Essa garantia, entretanto, mais do que belas palavras representativas de um ideário, tem de ser efetiva, ou seja, produzir efeitos práticos para que nenhum cidadão sinta-se privado de seus direitos e garantias. Ademais, a palavra direito foi utilizada no dito inciso em sentido amplo, não apenas significando os bens juridicamente tutelados, que tenham previsão legal, mas também para abranger toda e qualquer garantia ou condição condizente com a dignidade da pessoa humana.

Assim, não prospera o argumento segundo o qual a exigência do comum acordo é constitucional porque o dissídio econômico envolve interesses e não direitos. Aliás, em uma última análise, o que seriam os interesses senão a expectativa de futuros direitos? Sim, pois através do alcance de melhores condições de trabalho, o trabalhador, inegavelmente, está conquistando direitos para si. Seguindo essa linha de raciocínio, obstar o acesso do sindicato obreiro ao judiciário com base no argumento de que ele não está pleiteando direitos é uma contradição, pois a garantia de condições e de satisfação de interesses nada mais é do que uma maneira de se conquistar novos direitos.

Afinal, não tendo o legislador como prever e normatizar todas as situações em abstrato, o acesso ao judiciário em busca de conquistas verdadeiramente constitui-se em uma maneira de busca pela positivação e garantia de novos direitos. Impedir esse acesso seria, em última análise, impedir o direito de ação. Sustentando esse entendimento, afirma Amauri Mascaro Nascimento:

“Não é sustentável a afirmação de que no dissídio coletivo não há direitos, mas apenas interesses, para com esses pressupostos concluir-se que o princípio da inafastabilidade da jurisdição não foi violado. Dizer que no dissídio coletivo econômico não há um direito, mas um interesse e por tal razão nenhum direito teria sido violado é deslocar a discussão do seu núcleo. Não se discute o direito material pretendido. O que se verifica é se foi afetado o direito processual. É que a premissa é equivocada. Há um direito violado, sim: o direito de ação. O princípio constitucional do acesso ao Judiciário tem por fim assegurar a quem é titular, ainda que aparente, de um direito, a possibilidade de pedir a tutela jurisdicional para defendê-lo, quando outros meios lícitos de sua obtenção se mostrarem inócuos”[156].

Defende o autor, inteligentemente, que no dissídio coletivo está, em uma aprofundada análise, envolvido o direito de ação, que é constitucionalmente garantido. Assim, a exigência do comum acordo constitui-se em um impedimento ao livre exercício do direito de ação, pois cria um obstáculo para o sindicato obreiro.

Da mesma forma, improcede a tese segundo a qual o comum acordo não fere a garantia de acesso ao Poder Judiciário, pois este exerce atividade legiferante na apreciação de litígios. Como visto, o que visa o inciso XXXV, art. 5º da CF é garantir o direito de ação, de petição ao poder judiciário, independentemente da natureza da atividade ou decisão a ser proferida por este diante do pleito.

Quase sempre é impraticável a obtenção do consenso para a propositura do dissídio coletivo econômico. Estando as partes envolvidas em embates, conflitos e animosidades suficientes para impedirem que prosperem a negociação coletiva ou a arbitragem, resta claro que toda essa cizânia também obstará o comum acordo para a propositura da instância. Dessa forma, o não preenchimento do pressuposto para a apresentação do conflito ao judiciário pode gerar uma situação de perpetuação da contenda coletiva com enormes repercussões sociais.

Como o pressuposto constitui-se em exigência muito difícil de ser satisfeita, o conflito coletivo estaria sendo afastado da tutela jurisdicional. E isso não pode ocorrer, já que a exigência de que o autor cumpra requisito impraticável cerceia o seu direito de agir, o que é inconstitucional por afrontar toda a lógica e princípios da CF/88.

Acrescente-se ainda que exigir a anuência do réu para que possa ser exercido o direito de ação contra ele constitui-se em uma verdadeira aberração jurídica. Estaria sendo transferido o direito de ação para o réu, pois o autor somente poderia lhe demandar se ele assim anuísse. Qual o interesse do requerido em consentir que lhe seja proposta uma ação em juízo? Nos ensinamentos de Antonio Carlos de Araújo, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco:

“O princípio da inevitabilidade significa que a autoridade dos órgãos jurisdicionais, sendo uma emanação do próprio poder estatal soberano, impõe-se por si mesma, independentemente da vontade das partes ou de eventual pacto para aceitarem os resultados do processo; a situação de ambas as partes perante o Estado-juiz (e particularmente a do réu) é de sujeição, que independe de sua vontade e consiste na impossibilidade de evitar que sobre elas e sobre sua esfera de direitos se exerça a autoridade estatal”[157].

É perceptível que a obrigatoriedade de concordância da parte contrária para a propositura da instância fere o princípio da indeclinabilidade ou inafastabilidade da jurisdição. Desprovidos da força suficiente para negociar em pé de igualdade com os entes patronais, os sindicatos obreiros, sem a obtenção da anuência, ficarão de mãos atadas, sem ter o que fazer para galgar garantias à classe trabalhadora. Nesse sentido:

“Não tem nenhum sentido o processo judicial do dissídio coletivo, como tal, ajuizável somente quando as duas partes desejarem o processo, figura inexistente no direito processual contencioso. Se a natureza jurídica do dissídio coletivo é a de processo, condicioná-lo à autorização do réu, para que o processo possa ser movido, seria o mesmo que transferir o direito de ação do autor para o réu, portanto uma hipótese absurda e que contraria o princípio constitucional do direito de ação e a inafastabilidade da jurisdição, na medida em que é óbvio que ninguém autorizará outrem a processá-lo porque como contestante no processo, seria total a incompatibilidade entre o seu consentimento para que fosse demandado e a contestação que teria que fazer ao pleito para cuja propositura deu a sua aquiescência”[158].

Em meio a toda essa cizânia, a jurisprudência vem se posicionando por extinguir o processo sem exame de mérito face ao não cumprimento da exigência. Observe-se:

DISSÍDIO COLETIVO. EXIGÊNCIA DO COMUM ACORDO. Ajuizamento de Dissídio Coletivo deve ser resultado de comum acordo entre as partes envolvidas, podendo tal condição se apresentar de forma expressa ou tácita, sob pena de indeferimento da inicial e, via de consequência, extinção do processo, sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, inciso VI, do CPC (§ 2º, art. 114, CF). (TRT 5 - Processo 01026-2006-000-05-00-1 DC, AC. nº 009485/2007, Redatora Desembargadora Yara Trindade, SEDC, DJ 25/04/2007).

Apesar de a Desembargadora entender ser a exigência uma condição da ação, posicionamento que não é adotado neste trabalho, observa-se que a ausência do requisito, como já explanado anteriormente, leva à extinção do processo sem exame meritório. Resta latente que a relação processual é extinta de maneira totalmente prematura, o que põe em choque a constitucionalidade do mútuo consenso.

Importante deixar claro que não se quer desconstituir qualquer forma de extinção do feito sem julgamento do mérito, ou seja, aquelas em que esse procedimento se mostra necessário. Como bem explanado por José Orlando de Carvalho, não se está discutindo a utilidade do instituto nos casos necessários, especialmente nos que a ausência de pressuposto processual de existência é patente, em que há desinteresse pela lide ou mesmo nos casos de absoluto impedimento processual de abertura de jurisdição[159].

Entretanto, cabe tecer algumas ponderações sobre a possibilidade de terminação do feito decorrente de pressuposto processual. Isso porque o seu reconhecimento e decretação pelo magistrado pode causar uma inevitável negativa de acesso ao judiciário, principalmente se proclamado ex officio[160].

Baseando-se na moderna acepção de instrumentalidade do processo e de garantia de sua máxima efetividade, Humberto Theodoro Júnior adverte que a função processual, tendo por objeto precípuo a composição da lide, não permite que o magistrado supervalorize as questões formais, a ponto de dar a elas mais importâncias do que às materiais. Em outras palavras, não pode o formalismo exacerbado sobrepor-se ao mérito da lide. Consequentemente, o juiz somente pode decretar a extinção processual por vício de pressuposto (ou mesmo de condição da ação) quando o mesmo mostrar-se insuperável ou quando, depois de ordenado o saneamento, a parte incumbida não o promover dentro do prazo assinalado[161].

Analisando-se especificamente o pressuposto do comum acordo, somente a negativa expressa e fundamentada do sindicato em submeter o dissídio econômico coletivo à apreciação do Tribunal Laboral pode ensejar a extinção do feito por ausência de pressuposto. Mesmo assim, apesar de formalmente constitucional, essa prematura extinção vai de frontal encontro aos princípios da efetividade na prestação jurisdicional e da proibição do non liquet. Caso a negativa venha desacompanhada de coerente justificativa, poderá estar configurado o abuso de direito, a má fé ou mesmo um ato anti-sindical, os quais reclamam o suprimento judicial como maneira de evitar maiores prejuízos ao trabalhador.

Dessa forma, toda vez que o magistrado trabalhista se eximir de prestar a tutela, fundamentando-se no formalismo, evitando com que o processo cumpra o seu objetivo precípuo (de prestar a jurisdição com efetividade, dando ao titular do direito o que lhe é de direito obter), estará ferindo o princípio da instrumentalidade das formas e fazendo com que o processo seja um fim em si mesmo, o que deságua na mais nítida negação da justiça.

Outrossim, não existindo um consenso nas negociações coletivas, restará aos sindicatos patronais que não obtiverem o comum acordo duas alternativas: contentar-se apenas com os direito assegurados na legislação vigente, abrindo mão de lutar por novas condições, conquistas e de tudo aquilo o que foi galgado ao longo de anos de embates sindicais, ou deflagrar uma greve para pressionar a concessão de direitos e garantias.

Nas palavras de Amauri Mascaro Nascimento:

“A exigência do mútuo consentimento pode trazer outra consequência indesejada: o incentivo à litigiosidade contida. Ninguém pode duvidar que estará praticamente afetado o próprio direito de propor dissídio coletivo caso se conclua que a sua propositura deve ser autorizada pelo suscitado. Nesse caso, os Sindicatos de trabalhadores, frustrada a negociação coletiva e impossibilitado o dissídio coletivo, terão de encontrar uma desembocadura para o conflito. Certamente, à falta de negociação, os Sindicatos só terão uma alternativa: a greve, o que não é do interesse social e econômico do País. Desse modo, dar validade à exigência do ajuizamento bilateral do dissídio coletivo pode funcionar como um incentivo ao grevismo”[162].

Acrescenta Wilma de Araújo Vaz da Silva que o pressuposto do comum acordo acaba por inviabilizar a instância econômica, tendo como efeito colateral direto a instigação para a solução através das greves, pois elas seriam o único instrumento de pressão cuja deflagração não está sujeita pela lei à concordância do poder econômico. Logo, deve ser reconhecida a inconstitucionalidade da obrigatoriedade do pressuposto[163]. A instauração por mútuo consenso seria excludente do direito de ação, que é “personalíssimo e insuscetível de ser compartilhado pela parte contrária”[164].

Utilizando-se de coerente raciocínio, sustenta Francisco Gérson Marques de Lima:

“Não andou bem a EC n. 45/2004 quando fez constar, no §2° do art. 144, CF, que as partes têm a faculdade, ‘de comum acordo’, de ajuizarem dissídio coletivo. Houve um condicionamento para o ajuizamento da ação: ambas as partes têm de concordar com isso. Ora, levando em conta a cultura laboral brasileira, especialmente a empresária, o dispositivo inviabiliza o acesso à Justiça (art. 5°, XXXV, CF); fragiliza as categorias profissionais, que dependerão da aquiescência empresarial para promover a ação; e estimula o indesejável movimento grevista, uma vez que a greve é o único outro caso autorizador da instauração da instância coletiva, o que vai contra o princípio da paz social. Além de afrontar o princípio da razoabilidade, a disposição constitucional fere a inquebrantável cláusula pétrea do acesso à Justiça (art. 60, §4°, IV, CF). Tudo isso torna inconstitucional a nova disposição, que pode ser combatida tanto pela via concentrada, quanto pela via do controle difuso, incidentalmente em cada dissídio coletivo promovido nos Tribunais do Trabalho (TRT's e TST)”[165].

Por meio do controle de constitucionalidade concentrado ou difuso deve-se primar pela soberania da Constituição, retirando-se do ordenamento as normas violadoras de seus preceitos. Quanto à exigência do comum acordo, não resta dúvida de que a mesma é material e substancialmente inconstitucional, por afrontar diretamente os mais basilares princípios da Constituição federal, tais como a efetividade da prestação jurisdicional, a proibição do non liquet e a garantia de acesso ao judiciário.

Ora, a necessidade de preenchimento desse pressuposto, em análise aprofundada, acabaria por retirar da Justiça Laboral o poder de julgar o dissídio coletivo econômico. Consequentemente, estariam sendo descumpridos os mandamentos constitucionais, pois, através dessas instâncias, busca-se que seja proferido um julgamento equitativo, que compatibilize a livre iniciativa e os valores sociais do trabalho, fundamentos da República brasileira[166]. Mesmo que indiretamente, a exigência constitui-se em restrição limitadora de importante fonte material de normas coletivas, qual seja, a sentença normativa proferida no dissídio econômico, dada a dificuldade para que os empresários aceitem o seu ajuizamento.

Para agravar a situação, a inserção do pressuposto não veio acompanhada de uma reforma fortalecedora dos sindicatos, como poderia ter sido. Consequentemente, grandes e irreparáveis prejuízos podem ser causados aos trabalhadores caso não seja logo decretada pelo STF a inconstitucionalidade da exigência introduzida pela EC nº. 45/2004, já que, na maioria das vezes, eles não estão representados por sindicatos fortes e organizados aptos a exercer efetivas pressões capazes de levar os empresários a negociações ou mesmo responder com paralisações das atividades às injustificadas recusas de consentimento e negociação para o ajuizamento do Dissídio Coletivo Econômico.

Logo, é inconteste que a exigência ora em análise inviabiliza o alcance de melhorias das condições de trabalho, principalmente em face da intensa luta travada entre o capital e o trabalho, torneada pela cultura patronal de incessante busca pelo lucro. Sem sólidos fundamentos, os empregadores constantemente resistem aos pleitos dos empregados, vulneráveis econômica e juridicamente na relação, já que dependem dos salários para o sustento próprio e de seus familiares.  Assim, defender a constitucionalidade da exigência significa comprometer a paz social para, só depois, ser possível a instauração do dissídio.


8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Depois de grande esforço para a elaboração deste trabalho, no qual se fez necessária extensa pesquisa e dedicação, pode-se concluir que:

1- A existência de conflitos é normal a toda convivência em sociedade. Da mesma forma, são constantes as perturbações no âmbito das relações de trabalho, já que o trabalhador está em constante relacionamento com seus superiores hierárquicos ou mesmo com colegas de função. Observa-se que o conflito está tão presente nas relações de trabalho como em qualquer âmbito de convivência coletiva.

2- Quando as reivindicações dos trabalhadores não são atendidas ou são resistidas pelo empregador (ou grupo de empregadores) surge o conflito laboral. Este se classifica em individual ou coletivo. No primeiro, um ou diversos trabalhadores individualmente considerados pleiteiam seus interesses frente ao empregador. Observe-se que ele envolve sujeitos determinados, tem por objeto interesses concretos e visa, em geral, a aplicação de uma norma preexistente ao caso concreto.

3- O conflito coletivo de trabalho tem por objeto interesses gerais de pessoas indeterminadas, ou melhor, de um grupo. Neles, pelo menos uma das partes é composta por um número não determinado de pessoas, os interesses envolvidos são abstratos, pois tangem à coletividade de trabalhadores e o principal intento corresponde à criação, modificação ou interpretação de uma norma. Tamanha a atual complexidade das relações sociais, notadamente das laborais, tornaram-se cada vez mais comuns os conflitos coletivos de trabalho.

4- Os conflitos coletivos de trabalhos dividem-se em econômicos e jurídicos. Os econômicos, também chamados de conflitos de interesses, têm por objeto reivindicações relacionadas às condições de trabalho. Já os jurídicos envolvem discussões sobre a interpretação ou aplicação de determinada norma jurídica.

5- Hoje não mais se admite a solução das controvérsias por meio da força, tendo o Estado chamado para si o papel de resolver os problemas com base nos ditames da justiça e da equidade. Dentre os principais meios de composição dos conflitos coletivos laborais, destacam-se a autocomposição e a heterocomposição.

6- A autocomposição decorre do princípio da autonomia negocial privada existente entre as partes. Nela, os próprios envolvidos e interessados são responsáveis pela criação das normas que irão resolver a contenda, sem que haja participação do Estado-juiz. Percebe-se, assim, que se tratam de formas extrajudiciais de solução, tais como as convenções coletivas, os acordos coletivos e a mediação. Atualmente, é o sindicato que possui a primordial função de atuar na negociação coletiva, evitando, assim, a exposição direta do trabalhador e conseguindo, pela união, fazer maior pressão junto aos poderosos empregadores.

7- Na heterocomposição, há a intervenção de um terceiro, que irá solucionar o embate pela imposição de uma decisão. Nesse caso, não são as próprias partes que diretamente solucionam o conflito. Como exemplos, têm-se a arbitragem e a jurisdição. No Brasil, a solução judicial dos conflitos coletivos trabalhistas é feita através dos dissídios coletivos, no âmbito da justiça do Trabalho. Enquanto os embates coletivos de índole jurídica podem ser resolvidos de maneira semelhante aos conflitos individuais (através da reclamação trabalhista, da ação de cumprimento ou da ação civil pública), em relação aos de natureza jurídica é imprescindível a instauração do dissídio coletivo.

8- O dissídio coletivo é a forma heterocompositiva de solução jurisdicional dos conflitos coletivos laborais no Brasil. Trata-se de um litígio entre os sujeitos dos interesses coletivos, ou melhor, de uma espécie de ação coletiva proposta à Justiça do Trabalho por pessoas jurídicas (sindicatos, federações ou confederações de trabalhadores ou empregadores) para a solução de questões atinentes à criação ou interpretação de normas que irão incidir no âmbito de grupos ou categorias econômicas, profissionais ou diferenciadas. Destaque-se que o interesse controvertido é de todo um grupo, abstrata e genericamente considerado.

9- Os dissídios coletivos podem ter natureza jurídica ou econômica, classificação esta que vai variar de acordo com o tipo de conflito coletivo que lhe for objeto. Assim, os de índole jurídica são os ajuizados com o intuito de interpretar uma norma preexistente, ou seja, possuem a finalidade de interpretar o direito diante do caso concreto e na presença de interesses coletivos. Enquanto isso, os de natureza econômica objetivam a criação de direito novo, seja através de novas normas ou novas condições de trabalho, envolvendo interesses abstratos que não se limitam às partes envolvidas no litígio.

10- Nos ditames da Teoria da Separação dos Poderes, consagrada pela CF/88, os poderes devem coexistir de forma independente, porém harmônica. Cada um deles desempenha as funções que lhe são típicas ao lado de outras atípicas, dentro dos limites constitucionalmente estabelecidos. Em regra, compete ao poder judiciário solucionar os conflitos que lhe são postos. Entretanto, os Tribunais Trabalhistas podem proferir sentenças normativas nos dissídios coletivos, estabelecendo novas condições e normas de trabalho.

11- Em face dos dissídios coletivos de natureza econômica, emerge o poder normativo da justiça laboral, pois, diante deles, os tribunais possuem competência para o estabelecimento de normas e condições de trabalho. Logo, pode-se conceituar o poder normativo como a competência constitucional que possuem os tribunais trabalhistas para decidir os processos de dissídios econômicos, criando novas normas e condições, com força obrigatória.

12- À sentença normativa, resultado do exercício do poder normativo pelos tribunais, é atribuída força de lei material em relação a todas as categorias envolvidas no dissídio, independentemente de serem representadas pelo sindicato. Em apertada síntese, pode-se afirmar que ela nada mais é do que a decisão proferida no dissídio coletivo, ou seja, o acórdão do Tribunal Regional do Trabalho ou da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, ou seja, resulta da atividade legiferante constitucionalmente atribuída aos tribunais trabalhistas.

13- O legislador não tem o condão mágico de regulamentar, em abstrato, todas as possíveis e eventuais situações conflituosas. Nesse diapasão, o poder normativo da Justiça do Trabalho não significa a competência para solucionar um conflito através da proclamação do direito já existente, mas sim a possibilidade de criar direito novo. Dessa forma, o judiciário trabalhista atua, concorrentemente com o poder legislativo, na criação de normas e cláusulas com eficácia parecida à da lei, dentro do âmbito das categorias envolvidas.

14- A sentença normativa cria ou modifica condições de trabalho. Possui eficácia erga omnes, o que a aproxima ou equipara à lei, enquanto que as outras produzem efeitos somente "inter partes". Assim, pode-se afirmar que, materialmente, ela é lei, embora possua corpo de sentença. Em suma, é aquela que finaliza o processo de dissídio coletivo ou a manifestação do poder normativo da justiça laboral. Dessa conceituação, resta clara a sua finalidade, qual seja, fixar novas normas e novas condições de trabalho.

15- Longe de desestimular as negociações coletivas, a função normativa da Justiça do Trabalho é muito importante por prestar-se à solução de conflitos em relação aos quais não houve acordo entre as partes. Como os sindicatos brasileiros ainda não são organizados e fortes o suficiente para efetivamente pressionar as empresas pela negociação coletiva, a intervenção do Estado para a solução dos conflitos coletivos, quando este for provocado, mostra-se de fundamental importância, pois representa uma garantia de proteção aos trabalhadores, jurídica e economicamente hipossuficientes.

16- No exercício do poder normativo, os Tribunais trabalhistas praticam atividade tipicamente legiferante (constitucionalmente delegada), ou seja, não exercem atividade jurisdicional propriamente dita. Essa afirmação decorre do fato de que, através dele, a justiça laboral atua na criação do direito ou de normas, semelhantemente ao legislativo. Resumindo, o exercício do poder normativo resulta de uma atribuição legislativa exercida por órgão não integrante do Poder Legislativo, tratando-se, pois, de uma atuação atípica do judiciário trabalhista.

17- O poder normativo da Justiça do Trabalho é excepcional. Trata-se de um poder anômalo, pois envolve o exercício de atribuição típica de outro poder, qual seja, o Legislativo. Através dele, age o juiz do trabalho em nítida atividade legiferante, embasado na oportunidade e conveniência, com arbítrio semelhante ao de um legislador. Atualmente, o seu exercício encontra-se bastante limitado, pois a sentença normativa, produto de seu exercício, é legalmente fundamentada no parágrafo 2º do art. 114 da CF, o qual sofreu profundas alterações decorrentes da EC nº. 45/2004, que passou a exigir o comum acordo para a propositura do dissídio coletivo econômico. Como consequência da reforma, surgiu grande discussão envolvendo a extinção do poder normativo da Especializada.

18- Mesmo depois das mudanças promovidas pela EC nº. 45, é totalmente possível o ajuizamento de dissídio coletivo de natureza jurídica, não havendo necessidade de sua expressa previsão no §2º do art. 114 da CF, pois sua admissibilidade encontra-se tacitamente prevista na competência genérica da Especializada (inciso I, art. 114 da CF).

19- Com a reforma, o poder normativo da Justiça Trabalhista não foi extinto. Ele permanece vivo, tendo apenas sofrido algumas limitações. Assim, pode a Especializada criar novas garantias ou condições, bem como maximizar as legais já existentes, desde que observe os limites constitucionais e, sobretudo, as mínimas disposições protetivas e as anteriormente convencionadas.

20- A exigência do mútuo consentimento não é suficiente para conferir natureza arbitral à função desempenhada pela Justiça do Trabalho quando do julgamento dos dissídios coletivos econômicos. A afirmação lastreia-se no fato de existir grande diferença entre os contornos da anuência para a instância e para a arbitragem. Enquanto na arbitragem o árbitro é livremente escolhido pelas partes, o mesmo não ocorre na jurisdição trabalhista, em que vige o princípio do juiz natural. Ao passo em que a inexecução da sentença normativa dá lugar à propositura da ação cognitiva de cumprimento, o não cumprimento da sentença arbitral permite a imediata execução. Além disso, o árbitro deve seguir as normas do direito vigente para a resolução do conflito, sendo sua sentença irrecorrível, conquanto no julgamento do dissídio coletivo o Tribunal Trabalhista irá fazer a composição da norma reguladora, sendo a sentença normativa passível de recurso (pode ser revista quando modificadas as circunstâncias que a ditaram).

21- O “comum acordo” necessário à propositura do dissídio coletivo econômico é um pressuposto processual e não uma condição da ação, pois representa um requisito para a constituição e o regular desenvolvimento do processo. Em outras palavras, a necessidade desse mútuo consentimento está ligada ao exercício do direito de ação (em uma ótica processual) e não diretamente ao aspecto material da lide (leia-se: à abstrata viabilidade do direito material), pelo que não representa uma condição da ação.

22- Ao inserir a exigência do comum acordo para a propositura da instância econômica, o legislador objetivou estimular as negociações coletivas entre as partes, para que estas não continuassem acomodadas com as soluções judiciais dos impasses, buscando compor seus conflitos de forma mais direta, sem a imperiosa intervenção do Estado-juiz. Em última análise, essa inserção culminou das intensas pressões dos países economicamente desenvolvidos por uma menor intervenção do Estado na seara laboral, com a paralela flexibilização das normas e conquistas laborais. Assim, fez-se necessária uma adaptação da legislação nacional. Se a mudança fosse efetivada por lei ordinária, não vingaria por latente inconstitucionalidade, pelo que optou o legislador por proceder a uma emenda ao texto constitucional.

23- Sem a paralela reforma sindical, a exigência do comum acordo acabará por ameaçar a existência de muitos sindicatos brasileiros, que não possuem a força suficiente para levar os grandes empresários às mesas de negociação, exercendo a pressão suficiente para galgar melhores condições para os representados.

24- A expressão “de comum acordo” não significa a necessidade de petição em conjunto, nem mesmo a prévia e expressa anuência do suscitado. Assim, não implica em ação coletiva de iniciativa conjunta entre as partes, sendo fundamental, entretanto, que haja a concordância expressa ou tácita de ambas as categorias. A simples apresentação de contestação faz suprir o requisito faltante, demonstrando tacitamente que o sindicato suscitado está apto a negociar. Nesse sentido, pode o preenchimento do dito pressuposto ser aferido em momento posterior ao da propositura da demanda, quando da resposta do suscitado.

25- Face à recusa injustificada da parte contrária no consentimento, é possível que haja o suprimento judicial. Através do dito suprimento, o sindicato laboral fica protegido de eventual recusa imotivada ou mesmo decorrente de má-fé por parte do sindicato patronal. Trata-se de uma forma de proteger a possibilidade de o trabalhador continuar a obter melhores condições de trabalho via dissídio coletivo.

26- No tocante à validade da exigência do comum acordo, destaque-se que a EC nº. 45 respeitou todos os trâmites procedimentais constitucionalmente previstos para a elaboração de uma emenda, pelo que não há como negar que ela é formalmente constitucional. Não obstante, questiona-se a validade substancial do pressuposto, a dizer, a sua adequação aos princípios e ditames da Magna Carta.

27- Apesar de ser a exigência um pressuposto constitucional do ponto de vista formal, pois inserido através de Emenda que observou os devidos trâmites processuais, ela não se reveste de constitucionalidade substancial, material ou principiológica. Isso porque não é recomendável e correto fazer uma análise meramente literal do texto da Magna Carta, baseada em formalismos exacerbados, sem levar em consideração os princípios básicos que norteiam toda a lógica do sistema, dentre os quais está a celeridade, a inafastabilidade de jurisdição e o respeito aos direitos e às garantias individuais.

28- Consagrador do Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição, o inciso XXXV, art. 5º da CF/88 emprega a palavra direito em seu sentido mais amplo possível, não apenas significando os bens juridicamente tutelados (que tenham previsão legal), mas também para abranger toda e qualquer garantia ou condição condizente com a dignidade da pessoa humana. A previsão nele trazida, mais do que belas palavras representativas de um ideário, tem de ser efetiva, ou seja, produzir efeitos práticos. Logo, não prospera o argumento segundo o qual a exigência do comum acordo é constitucional porque o dissídio econômico envolve interesses e não direitos. Obstar o acesso do sindicato obreiro ao judiciário com base no argumento de que ele não está pleiteando direitos é uma contradição, pois a garantia de condições e de satisfação de interesses nada mais é do que uma maneira de se conquistar novos direitos

29- No dissídio coletivo está, em uma aprofundada análise, envolvido o direito de ação, que é constitucionalmente garantido. Assim, a exigência do comum acordo constitui-se em um impedimento ao livre exercício do direito de ação, pois cria um obstáculo para o sindicato obreiro.

30- Não procede a tese segundo a qual o comum acordo não fere a garantia de acesso ao Poder Judiciário, pois este exerce atividade legiferante na apreciação de litígios. O que visa o inciso XXXV, art. 5º da CF é garantir o direito de ação, de petição ao poder judiciário, independentemente da natureza da atividade ou decisão a ser proferida por este diante do pleito.

31- É muito difícil, às vezes até impossível, a obtenção do consenso para a propositura do dissídio coletivo econômico. Estando as partes envolvidas em embates, conflitos e animosidades suficientes para impedirem que prosperem a negociação coletiva ou a arbitragem, resta claro que toda essa cizânia também obstará o comum acordo para a propositura da instância. Dessa forma, o não preenchimento do pressuposto para a apresentação do conflito ao judiciário pode gerar uma situação de perpetuação da contenda coletiva com enormes repercussões sociais, afastando-se o embate da tutela jurisdicional. E isso não pode ocorrer, já que a exigência de que o autor cumpra requisito impraticável cerceia o seu direito de agir, o que é inconstitucional por afrontar toda a lógica e princípios da CF/88.

32- É uma contradição exigir a anuência do réu para que contra ele possa ser exercido o direito de ação. Nesse caso, estaria sendo transferido o direito de ação para o réu, pois o autor somente poderia lhe demandar se ele assim anuísse.

33- É inegável que a obrigatoriedade de concordância da parte contrária para a propositura da instância fere o princípio da indeclinabilidade ou inafastabilidade da jurisdição. Desprovidos da força suficiente para negociar em pé de igualdade com os entes patronais, os sindicatos obreiros, sem a obtenção da anuência, ficarão de mãos atadas, sem ter o que fazer para galgar garantias à classe trabalhadora.

34- Somente a negativa expressa e fundamentada do sindicato em submeter o dissídio coletivo econômico à apreciação do Tribunal Laboral pode ensejar a extinção do feito por ausência de pressuposto. Mesmo assim, apesar de formalmente constitucional, essa prematura extinção vai de frontal encontro aos princípios da efetividade na prestação jurisdicional e da proibição do non liquet. Caso a negativa venha desacompanhada de coerente justificativa, poderá estar configurado o abuso de direito, a má fé ou mesmo um ato anti-sindical, os quais reclamam o suprimento judicial como maneira de evitar maiores prejuízos ao trabalhador. Logo, toda vez que o magistrado trabalhista se eximir de prestar a tutela, fundamentando-se no formalismo, estará ferindo o princípio da instrumentalidade das formas e fazendo com que o processo seja um fim em si mesmo, o que deságua na mais nítida negação da justiça.

35- Ademais, o pressuposto do comum acordo acaba por inviabilizar a instância econômica, tendo como efeito colateral direto a instigação para a solução através das greves, pois elas seriam o único instrumento de pressão cuja deflagração não está sujeita pela lei à concordância do poder econômico. Logo, deve ser reconhecida a inconstitucionalidade da obrigatoriedade.

36- Para agravar a situação, a inserção do pressuposto não veio acompanhada de uma reforma fortalecedora dos sindicatos. Consequentemente, grandes e irreparáveis prejuízos podem ser causados aos trabalhadores caso não seja logo decretada pelo STF a inconstitucionalidade da exigência introduzida pela EC nº. 45/2004, já que, na maioria das vezes, eles não estão representados por sindicatos fortes e organizados aptos a exercer efetivas pressões capazes de levar os empresários a negociações ou mesmo responder com paralisações das atividades às injustificadas recusas de consentimento e negociação.

37- Em síntese, a exigência do comum acordo é material e substancialmente inconstitucional, por afrontar diretamente os mais basilares princípios da Constituição federal, tais como a efetividade da prestação jurisdicional, a proibição do non liquet e a garantia de acesso ao judiciário. A necessidade de preenchimento desse pressuposto, em análise aprofundada, acabaria por retirar da Justiça Laboral o poder de julgar o dissídio coletivo econômico.

38- Considerando-se que inúmeros dissídios coletivos têm sido ajuizados, necessitando de solução para a manutenção da paz social, bem como para que conquistas e garantias sejam galgadas pelos trabalhadores, além de que o Supremo Tribunal Federal ainda não tem posicionamento firmado e não se pronunciou definitivamente sobre a inconstitucionalidade da exigência do comum acordo, recomenda-se que os Tribunais Regionais Trabalhistas e o próprio Tribunal Superior do Trabalho, sempre que provocados no sentido, declarem, incidentalmente e de ofício, via controle de constitucionalidade difuso, a inconstitucionalidade do pressuposto do comum acordo.

39- Destaque-se ainda ser necessária uma rápida atuação do STF para julgar as Ações Diretas de Inconstitucionalidades já ajuizadas e decretar a inconstitucionalidade da exigência do comum acordo, o que garantirá segurança jurídica e homogeneidade de tratamento da questão em todas as instâncias.

 

 


9 REFERÊNCIAS

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Notas

[1] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 26.ed. São Paulo: LTr, 2000, passim.

[2] Id. Curso de Direito Processual do Trabalho. 21.ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 4.

[3] GIGLIO, Wagner D. Direito Processual do Trabalho. 12.ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 381.

[4] MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 15.ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 709.

[5] RIBEIRO, Fábio Túlio Correia. Processo do trabalho básico: da inicial à sentença. São Paulo: LTr, 1997, p. 231.

[6] NASCIMENTO, Amauri Mascaro, 2002, op. cit., p. 5.

[7] LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 6.ed. São Paulo: LTr, 2008, p. 1074.

[8] Ibid., loc. cit.

[9] NASCIMENTO, Amauri Mascaro, 2002, op. cit., p. 13.

[10] Nesse sentido, vide: GIGLIO, Wagner D., op. cit., p. 382.

[11] NASCIMENTO, Amauri Mascaro, 2002, op. cit., p. 6.

[12] Da interpretação do art. 114, §§ 1º e 2ª da CF infere-se que, no Brasil, o direito processual do trabalho prevê a arbitragem como forma alternativa de solução dos conflitos coletivos de trabalho.

[13] ROCHA, Andréa Presas. Dissídios coletivos: modificações introduzidas pela Emenda Constitucional nº. 45/2004. Elaborado em 04/2006. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/8147>. Acesso em: 4 abr. 2011.

[14] Dispõe o art. 114, §2º da CF: “Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente”.

[15] GIGLIO, op. cit., p. 383.

[16] LEITE, Carlos Henrique Bezerra, op. cit., p. 1076.

[17] ROCHA, Andréa Presas, 2006, op. cit., loc. cit.

[18] SITRÂNGULO, Cid José apud BASSO, Guilherme Mastrichi. Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_04/diss%EDdio_coletivo_ de_natureza_ju.htm>. Acessado em: 5 abr. 2011. 

[19] MARTINS, Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho. 24.ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 600.

[20] Nesse sentido, vide ALMEIDA, Ísis de. Manual de Direito Processual do Trabalho. 9.ed. atual. ampl. São Paulo: LTr, 1998, v.1, p. 365.

[21] SCHIAVI, Mauro. Aspectos polêmicos do Poder Normativo da Justiça do Trabalho e do Dissídio Coletivo de “comum acordo”. Disponível em: <http://www.lacier.com.br/artigos/ Aspectos%20pol%EAmicos%20do%20Poder%20Normativo%20e%20do%20diss%EDdio%20coletivo %20de%20comum%20acordo.doc>. Acessado em: 3 mar. 2011.

[22] Informações e dados obtidos em: ARRUDA, Hélio Mário de. Dissídios Coletivos. Disponível em: <http://professorhelio.zip.net/arch2007-07-29_2007-08-04.html>. Acessado em: 7 mar. 2011.

[23] Destaque-se que foi a Constituição brasileira de 1946 que integrou a Justiça do Trabalho ao Poder Judiciário da União

[24] MENDONÇA, Ricardo Nunes de. Os dissídios coletivos e poder normativo da Justiça do Trabalho segundo a nova ordem constitucional. Disponível em: <http://idd.net.br/direito-e-democracia/2010/05/os-dissidios-coletivos-e-poder-normativo-da-justica-do-trabalho-segundo-a-nova-ordem-constitucional/>. Acessado em: 3 jan. 2011.

[25] ANDRADE, Everaldo Gaspar de. Dissídio Coletivo. São Paulo: LTr, 1993, p. 39.

[26] NETO, Pedro Vidal. Do Poder Normativo da Justiça do Trabalho. São Paulo: LTr, 1983, p. 154.

[27] MEIRELES, Edilton. Competência e procedimento na justiça do trabalho: primeiras linhas da reforma do judiciário. São Paulo: LTr, 2005, passim.

[28] ARRUDA, Hélio Mário de, op. cit., loc. cit.

[29] MARTINS, Sergio Pinto, 2006, op. cit., p. 601.

[30] LINDOSO, Alexandre Simões. Proposta apensada 1. Disponível em: <http://www.anamatra.org.br/jornada/propostas/com3_proposta14.pdf>. Acessado em: 10 abr. 2011.

[31] TEIXEIRA FILHO, Manoel Antônio. Curso de Processo do Trabalho: perguntas e respostas sobre

assuntos polêmicos em opúsculos específicos, nº. 24: dissídio coletivo. São Paulo: LTr, 1998, p. 14.

[32] ARRUDA, Hélio Mário de, op. cit., loc. cit.

[33] Ibid., loc. cit.

[34] Ibid., loc. cit.

[35] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 1994, passim.

[36] BATALHA, Wilson de Souza Campos. Tratado de direito judiciário do trabalho. 3.ed. rev. atual. ampl. São Paulo: LTr, 1995, v.2, p. 406.

[37] ROCHA, Andréa Presas, 2006, op. cit., loc. cit.

[38] NASCIMENTO, Amauri Mascaro, 2002, op. cit., p. 20.

[39] RAMOS FILHO, Wilson. O fim do poder normativo e a arbitragem. São Paulo: LTr, 1999, p. 216.

[40] ALMEIDA, Amador Paes de. Curso prático de processo do trabalho. 16.ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 432.

[41] PESSOA, Valton. Manual de Processo do Trabalho. Salvador: JusPODIVM, 2007, p. 33.

[42] MEIRELES, Edilton, op. cit., p. 83.

[43] COSTA, Orlando Teixeira da. A intervenção do Poder Judiciário nos conflitos coletivos de trabalho. Revista LTr, n.2, v.47, p.141, 1983.

[44] MARTINS FILHO, Ives Gandra. Manual esquemático de direito e processo do trabalho. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 12.

[45] ZANGRANDO, Carlos Henrique da Silva. Resumo do direito processual do trabalho. Rio de Janeiro: Edições Trabalhistas, 1994, p. 23.

[46] Dentre eles, aponta-se: MARTINS FILHO, Ives Gandra, op. cit., loc. cit. e GARCIA, Pedro Carlos Sampaio. O sindicato e o processo: a coletivização do processo do trabalho. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 125.

[47] GARCIA, Pedro Carlos Sampaio, op. cit., loc. cit.

[48] BATALHA, Wilson de Souza Campos, op. cit., p. 398.

[49] Informações obtidas em SANTOS, Enoque Ribeiro dos. Dissídio Coletivo e Emenda Constitucional nº. 45/2004 – Considerações sobre as teses jurídicas da exigência do “comum acordo”. Justiça do Trabalho, ano 22, n.264, dez. 2005.

[50] RODRIGUES PINTO, José Augusto. Direito Sindical e Coletivo do Trabalho. São Paulo: LTr, 1998, p. 351.

[51] BELFORD, Fernando José Cunha. Organização Sindical Brasileira e Dissídio Coletivo. São Luís: Lithograf, 1995, passim.

[52] ROMITA, Arion Sayão. Sindicalismo, economia, estado democrático. São Paulo: LTr, 1993, passim.

[53] GARCIA, Pedro Carlos Sampaio, op. cit., loc. cit.

[54] COSTA, Orlando Teixeira da. Limites do Poder Normativo da Justiça do Trabalho apud GARCIA, Pedro Carlos Sampaio, op. cit., loc. cit.

[55] SILVA, Edson Braz da. Aspectos Processuais e Materiais do Dissídio Coletivo frente à Emenda Constitucional 45/2004. Retirado do site da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho – ANPT. Acessado em: 11 abr. 2011.

[56] MENEZES, Geraldo Bezerra apud NETO, Pedro Vidal, op. cit., p. 130.

[57] NETO, Pedro Vidal, op. cit., p. 127.

[58] COSTA, Carlos Coqueijo apud MARTINS FILHO, Ives Gandra. Processo Coletivo do Trabalho. São Paulo: LTr, 2003, p. 345.

[59] MARTINS FILHO, Ives Gandra, 2003, op. cit., passim.

[60] ARRUDA, Hélio Mário de, op. cit., loc. cit.

[61] OLIVEIRA, Lígia Simão apud BELFORD, Fernando José Cunha, op. cit., passim.

[62] FALLEIROS, José Anchieta apud CAMPOS, José Miguel de. Emenda Constitucional 45 e o Poder Normativo da Justiça do Trabalho. Disponível em: <http://www.anamatra.org.br/ opiniao/artigos/ler_artigos.cfm?cod_ conteudo=6001&descricao=artigos>. Acessado em: 5 fev. 2011.

[63] CAMPOS, José Miguel de, op. cit., loc. cit.

[64] MARANHÃO, Délio. Instituições de direito do trabalho. 18.ed. atual. por Arnaldo Süssekind e João de Lima Teixeira Filho. São Paulo: LTr, 1999, p. 165.

[65] FLEISCHMANN, Renato. Processo do trabalho: orientação básica. São Paulo: LTr, 1995, p. 60.

[66] ROCHA, Andréa Presas. Princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (direito de ação). Elaborado em 12/2005. Disponível em: < http://jus.com.br/artigos/14788>. Acessado em: 16 abr. 2011.

[67] MEIRELES, Edilton, op. cit., p. 84.

[68] Ibid., p. 85.

[69] FREITAS, Manoel Mendes de.  Comentários   aos   Precedentes   Normativos  e  à   Orientação

Jurisprudencial da SDC do TST. São Paulo: LTr, 2001, p. 15.

[70] Somente pode haver alteração dessas normas para ampliar os direitos já conferidos.

[71] Nesse sentido, vide: FAVA, Marcos Neves. Onde está o poder normativo? Ponderações sobre um aspecto restritivo na ampliação de competência instituída pela emenda constitucional nº. 45/04. Gênesis - Revista de Direito do Trabalho, Curitiba, v.145, p.95, jan./fev., 2005.

[72] Dentre eles, NASCIMENTO, Amauri Mascaro. A reforma do poder judiciário e o direito coletivo do trabalho. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, Rio de Janeiro, v.71, p.194, jan./abr., 2005.

[73] Ibid., p. 19.

[74] MACHADO, Jorge Luis.  A nova dimensão da função normativa da justiça do trabalho em face da reforma do judiciário e do princípio da separação dos poderes do estado. Disponível em: <http://www.faculdadeobjetivo.com.br/arquivos/ART2.pdf>. Acessado em: 15 jan. 2011.  

[75] ROMITA, Arion Sayão apud GARCIA, Pedro Carlos Sampaio. Limites do poder normativo da Justiça do Trabalho. Elaborado em 12/2003. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/4864>. Acessado em: 12 mar. 2011.

[76] Ibid., loc. cit. 

[77] SILVA, Edson Braz da, op. cit., loc. cit.

[78] CARDOSO, Adalberto Moreira. Sindicalismo e Relações Trabalhistas. Ed. Konrad Adenauer Stiftung, 2002, p. 53.

[79] WALDRAFF, Célio Horst. Inafastabilidade da jurisdição e a inibição do dissídio coletivo na Emenda Constitucional nº. 45/2004. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/8374>. Acessado em: 13 abr. 2011.

[80] FALCÃO, Ismael Marinho. A reforma do Poder Judiciário: aspectos sociais e jurídicos. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/228>. Acessado em: 8 jan. 2011.

[81] BARROS JUNIOR, Cássio Mesquita. A Justiça do Trabalho e a Reforma do Poder Judiciário. Revista da Academia Nacional de Direito do Trabalho, São Paulo, LTr, n.8, p.38, 2000.

[82] TRINDADE, Fernando. Aspectos da Reforma do Judiciário. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/web/cegraf/ril/Pdf/pdf_150/r150-20.pdf>. Acessado em: 8  jun. 2010.

[83] BARROS JUNIOR, Cássio Mesquita, op. cit., p. 43.

[84] Ibid., p. 44.

[85] Ibid, loc. cit.

[86] Nesse sentido, vide FAVA, Marcos Neves. O esmorecimento do poder normativo: análise de um aspecto restritivo na ampliação da competência da justiça do trabalho. In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves. Nova competência da justiça do trabalho. São Paulo: LTr, 2005, p. 286 e 290 et seq. 

[87] Coaduna com esse entendimento PEREIRA, José Luciano de Castilho. A reforma do poder judiciário: o dissídio coletivo e o direito de greve. In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves. Justiça do trabalho: competência ampliada. São Paulo: LTr, 2005, p. 251 et seq.

[88] ROCHA, Andréa Presas, 2006, op. cit., loc. cit.

[89] QUEIROZ, Antonio Augusto de. Justiça do Trabalho sem Poder Normativo. Disponível em: <http://www.sindireceita.org.br/index.php?ID_MATERIA=2307>. Acessado em: 3 fev. 2011.

[90] Ibid., loc. cit.

[91] Ibid., loc. cit.

[92] MANNRICH, Nelson. O Ocaso do Poder Normativo. Disponível em: <http://www.furlanitraducoes. com.br/material/dir%20trabalho/mannrich%201%20%20ocaso%20do%20poder%20normativo%20230905%20textofinal.pdf>. Acessado em: 2 abr. 2011.

[93] MARTINS FILHO, Ives Gandra apud CABRAL, Kelly Barreto de Arruda. A Reforma do Poder Judiciário e o Poder Normativo da Justiça do Trabalho. 2007. Trabalho de conclusão de pós-graduação em Direito e Processo do Trabalho – Faculdade Unyahna, Salvador, p. 32.

[94] MARTINS, Sérgio Pinto. Manutenção do poder normativo da Justiça do Trabalho. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/Materia.aspx?id=160>. Acessado em: 11 nov. 2010.

[95] MARTINS FILHO, Ives Gandra. O dissídio coletivo na nova ordem constitucional. São Paulo: LTr, 1989, v.53, n.2, p. 199 et seq.

[96] ABREU, Franciny Beatriz. A Jurisdição no Mercosul. Disponível em: <http://br.geocities.com/ esmesc_2000/pagina0503a.doc>. Acessado em: 22 set. 2010. 

[97] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 16.ed. RT, p. 53.

[98] ROMITA, Arion Sayão apud RIPPER, Walter Wiliam. Poder normativo da justiça do trabalho após a EC 45/2004. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/7176>. Acessado em: 22 out. 2010.

[99] NASCIMENTO, Amauri Mascaro apud RIPPER, Walter Wiliam, op. cit.

[100] Dentre eles, está o Ministro Luiz José Guimarães Falcão, afirmando que “a Constituição autoriza essa atuação normativa "com fundamento na equidade”. Na mesma linha de raciocínio, Ives Gandra, mesmo reconhecendo certo aspecto legislativo no exercício do poder normativo, também se vale da equidade para fundamentar a atuação do Juiz do Trabalho nos conflitos coletivos econômicos. Dados obtidos em: GARCIA, Pedro Carlos Sampaio, op. cit., loc. cit.

[101] DINIZ, Maria Helena. As lacunas no Direito. São Paulo: RT, 1981, p. 230.

[102] Para um maior detalhamento do tema, vide GARCIA, Pedro Carlos Sampaio, op. cit., loc. cit.

[103] DINIZ, Maria Helena, op. cit., p. 231.

[104] GARCIA, Pedro Carlos Sampaio, op. cit., loc. cit.

[105] COOLEY, John W. Advocacia de Arbitragem. Tradução de René Loncan. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2001, p. 22 et seq.

[106] MARTINS, Pedro Antônio Batista. Anotações sobre a Arbitragem no Brasil e o Projeto de Lei do Senado n°. 78/98. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 138.

[107] ALVIM, José Eduardo Carreira. Arbitragem no Direito Interno Brasileiro. Manuscrito, p. 7.

[108] WATANABE, Roberto. Arbitragem. Disponível em: <http://www.ebanataw.com.br/ roberto/pericias/exparb.htm>. Acessado em: 1 set. 2010.

[109] CARMONA, Carlos Alberto apud PAIVA, Natália Soares. Uma análise sobre a Arbitragem no Brasil: O julgamento do Agravo Regimental na sentença estrangeira n° 5.206-7. 2007.  Monografia (graduação em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade Federal da Bahia, Salvador.

[110] Nesse sentido, vide FILHO, Rodolfo Pamplona apud FAVA, Marcos Neves. A arbitragem como meio de solução dos conflitos trabalhistas. Disponível em: <http://www.trt02.gov.br/geral/ tribunal2/Legis/CLT/Doutrina/MNF_09_09_06_6.html>. Acessado em: 21 jul. 2010.

[111] DIDIER JÚNIOR, Fredie. Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. Salvador: JusPODIVM, 2006, p. 84.

[112] Dentre modalidades nas quais se classifica a da arbitragem, vale destacar algumas. Arbitragem voluntária aquela em que as partes tomam a iniciativa de resolver suas diferenças pela via arbitral em detrimento do processo judicial, enquanto a arbitragem obrigatória é a imposta independentemente da vontade das partes, não sendo aceita no Brasil. A arbitragem informal é a realizada pelo bom senso dos participantes, não havendo regras definidas, pelo que não é aceita pelo Poder Judiciário quando da execução da sentença, ao posso em que a formal é realizada segundo as regras ditadas pela Lei Federal nº. 9.307/96. Na arbitragem de direito, o árbitro toma a decisão baseando-se nas normas positivadas, retirando argumentos objetivos do ordenamento jurídico, enquanto que na arbitragem de equidade o árbitro pode tomar a decisão baseando-se no seu sentimento de justiça, considerando as circunstâncias particulares do caso que está sendo arbitrado. Arbitragem “ad hoc” é aquela em que as regras do processo são determinadas pelos participantes em consonância direta com as leis da arbitragem (é criada para o caso concreto), sendo a institucional aquela em que as regras do processo são determinadas pelo Tribunal Arbitral, uma instituição não governamental constituída especificamente para esse fim.

[113] DIDIER JÚNIOR, Fredie, op. cit., loc.cit.

[114] MARTINS FILHO, Ives Gandra. A reforma do Poder Judiciário e seus desdobramentos na Justiça do Trabalho. Legislação do Trabalho: Publicação Mensal de Legislação, Doutrina e Jurisprudência. São Paulo, a.69, n.01, p. 30-39, jan., 2006.

[115] GARCIA, Pedro Carlos Sampaio. O fim do poder normativo. In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves. (Coord.). Justiça do Trabalho: competência ampliada. São Paulo: LTr, 2005, p.381-396.

[116] LOPES, Otávio Brito. O poder normativo da Justiça do Trabalho após a Emenda Constitucional n. 45. Legislação do Trabalho: Publicação Mensal de Legislação, Doutrina e Jurisprudência, São Paulo, a.69, n.02, p. 166-170, fev., 2005.

[117] PONTUAL, Marina dos Anjos. O poder normativo e a Justiça do Trabalho. Elaborado em 12/2010. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/18491>. Acessado em: 18 abr. 2011.

[118] MACHADO, Jorge Luis, op. cit., loc. cit.

[119] DIDIER JÚNIOR, Fredie. Pressupostos Processuais e Condições da Ação: o juízo de admissibilidade do processo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 101.

[120] Ibid., p. 102.

[121] Os pressupostos de constituição são os requisitos para que o processo seja instaurado. Assim, a existência do processo está condicionada à propositura de uma demanda e à investidura jurisdicional do órgão a quem ela é endereçada.

[122] DIDIER JÚNIOR, Fredie, 2005, op. cit., p. 102.

[123] GRINOVER, Ada Pellegrini; ARAUJO, Antônio Carlos; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 297.

[124] DIDIER JÚNIOR, Fredie, 2005, op. cit., passim.

[125] Ibid, p. 107.

[126] CARVALHO, José Orlando Rocha de. Teoria dos Pressupostos e Requisitos Processuais. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2005, p. 8.

[127] GRINOVER, Ada Pellegrini; ARAUJO, Antônio Carlos; DINAMARCO, Cândido Rangel, op. cit., p. 266.

[128] DIDIER JÚNIOR, Fredie, 2005, op. cit., p. 168.

[129] DINAMARCO, Cândido Rangel, 2001, op. cit., p. 298.

[130] GRINOVER, Ada Pellegrini; ARAUJO, Antônio Carlos; DINAMARCO, Cândido Rangel, op. cit., p. 267.

[131] BUZAID, Alfredo apud Didier júnior, Fredie Didier, 2005, op. cit., p. 173.

[132] Ressalvam-se os casos de legitimação anômala, que, nos trâmites do artigo 6º do Código de Processo Civil, conferem a determinados órgãos o poder de reclamar em juízo a reparação de lesões a interesses que não lhes pertencem.

[133] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 18.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, v.1, p. 75.

[134] Ressalve-se que alguns vícios podem ser sanados, pelo que não acarretarão, necessariamente, a extinção sem julgamento de mérito se supridos.

[135] Pela regra da proibição do non liquet, o magistrado não pode deixar de julgar uma lide que lhe é posta sobre o argumento de que não há norma disciplinando a matéria, ou seja, os juízes têm o dever de proferir um julgamento para todos os conflitos que lhes são submetidos, ainda que não estejam seguros sobre qual é a melhor solução para a causa.

[136] SILVA, Edson Braz da, op. cit., loc. cit.

[137] ROCHA, Andréa Presas, 2006, op. cit., loc. cit.

[138] Importante olvidar que o §2º do art. 114 da CF expressamente refere-se à ação normativa de índole econômica da Justiça Laboral. Assim, não estão sob a égide de seus comandos as demais formas de dissídios coletivos, tais como o de greve e o declaratório jurídico. Outrossim, por possuir conteúdo que nitidamente restringe o acesso ao Judiciário, tem de ser restritivamente interpretado, de forma que apenas discipline a instância coletiva econômica stricto sensu.

[139] ROCHA, Andréa Presas, op. cit., loc. cit.

[140] SAAD, Eduardo Gabriel apud CARDOSO, Luciana de Miguel. Da exigência de comum acordo para a instauração dos dissídios coletivos frente ao princípio da inafastabilidade da jurisdição. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/9582>. Acessado em: 24 fev. 2011.

[141] Dispõe o art. 8º, II da CF: “é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município”.

[142] CRIVELLI, Ericson. A Reforma sindical no Brasil e a jurisprudência da OIT em matéria de Liberdade Sindical. São Paulo: LTR, 2004, p. 10.

[143] Acrescente-se que um dos maiores objetivos da reforma sindical que tramita no Congresso Nacional é adaptar a estrutura sindical brasileira aos princípios da liberdade e autonomia sindicais, emergindo esta como recomendação expressa do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.

[144] Informações obtidas em CRIVELLI, Ericson, op. cit., loc. cit.

[145] CARDOSO, Luciana de Miguel, op. cit., loc. cit.

[146] MELO, Raimundo Simão de. Ajuizamento de dissídio coletivo de comum acordo. Disponível em: <http://www.ufrnet.br/~tl/otherauthorsworks/melo_dissidio_coletivo_comum_acordo.pdf>. Acessado em: 12 abr. 2011.

[147] MEIRELLES, Davi Furtado. Poder normativo: momento de transição. Revista LTr, n.6, v.69, p.696, jun., 2005.

[148] PEREIRA, José Luciano de Castilho, op. cit. In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves, op. cit., p. 245.

[149] SILVA, Edson Braz da, op. cit., loc. cit.

[150] CARMO, Júlio Bernardo. Do mútuo consenso como condição de procedibilidade do dissídio coletivo de natureza econômica. Revista LTr, n.5, v.69, p.597, mai., 2005.

[151] Dentre elas, podem ser apontadas: ADIN 3392-DF, ADIN 3423-DF, ADIN 3431-DF, ADIN 3432-DF e ADIN3520-DF. Todas elas têm como relator o Ministro Cezar Peluso.

[152] SILVA, Edson Braz da, op. cit., loc. cit.

[153] Ibid., loc. cit.

[154] LOPES, Otávio Brito, op. cit., p. 167.

[155] Informações obtidas em: <http://www.jurisway.org.br/v2/bancojuris1.asp?pagina=1&idarea=1& idmodelo= 13721>. Acessado em: 2 abr. 2011.

[156] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. A questão do dissídio coletivo “de comum acordo”. Elaborado em 06/2006. Disponível em: <http://www.nucleomascaro.com.br/blog/arquivos/ Dissidio%20Coletivo%20Comum% 20Acordo.pdf>. Acessado em: 1 fev. 2011.

[157] GRINOVER, Ada Pellegrini; ARAUJO, Antônio Carlos; DINAMARCO, Cândido Rangel, op. cit., p. 139.

[158] NASCIMENTO, Amauri Mascaro, op. cit., loc. cit.

[159] CARVALHO, José Orlando Rocha de, op. cit., p. 190.

[160] Ibid., loc. cit.

[161] THEODORO JÚNIOR, Humberto, op. cit., passim.

[162] NASCIMENTO, Amauri Mascaro, 2006, op. cit., loc. cit.

[163] SILVA, Wilma Nogueira de Araújo Vaz da. Sobre a exigência de comum acordo como condição da ação de dissídios coletivos.Revista LTr, n.9, v.69, p. 1036, set., 2005.

[164] Ibid., p. 1035.

[165] LIMA, Francisco Gérson Marques de. Lineamentos de direito processual do trabalho. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 143.

[166] Nesse sentido, ver decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª região, com o relator Paulo Roberto Sifuentes Costa (TRT3 – DC 00318-2005-000-03-00-7. DJM 10.6.2005, p. 02).


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LORDELO, Paula Leal. Exigência do comum acordo para a propositura do dissídio coletivo: inconstitucionalidade principiológica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3597, 7 maio 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24378. Acesso em: 28 mar. 2024.