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A possibilidade de renúncia ao julgamento pelo tribunal do júri no Brasil

A possibilidade de renúncia ao julgamento pelo tribunal do júri no Brasil

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Defende-se uma reforma constitucional e legal que permita ao acusado optar, conforme indicação de seu advogado, pelo julgamento entre o Tribunal do Júri e um juiz togado.

Concite-se, então, o leitor a uma questão: como conhecê-lo, distingui-lo e decifrá-lo para, posteriormente, melhor aprendê-lo? Por qual porta nele penetrar ou por qual janela observá-lo? Quem dará o melhor testemunho? Quem será seu mais fiel intérprete?

Primeiro, a compostura londrina: uma leve reverência, um curvar de cabeça para adentrar neste mundo — “o Júri vale mais que toda a Constituição da Inglaterra”, acentuava o abade Sièyes—, para mergulhar na alma desta casa solene, de portas altas e misteriosas, escaninhos, sótãos e, por que não dizer, porões. Mas, casa humana, onde fermentou a liberdade, os direitos e garantias individuais, a justa aplicação das penas, por isso devemos-lhe esse respeito. Uma Instituição que, malgrado toda crítica, apontada todas as falhas — que em rigor tanto lhe cabem, como em qualquer outra Instância de Justiça —, é plena de grandezas, pois acentua um passado grandioso, projetando um futuro maioral.

Depois, para que não se percam nossas vistas de milhares de janelas d’além e d’aquém fronteira que simbolizam nossos tribunais, enfim, para que não incorramos no erro de tomar a parte pelo todo, é mister questionar, então, por onde o olharemos, qual a primeira janela que devemos perscrutar-lhe, para sondá-lo melhor? Melhor conhecerá o Júri o juiz, o advogado ou o promotor?

Pouco importa, contanto que se abra a janela de seu coração, Janela que não é dele, fisicamente, mas nossa: porque, para conhecê-lo, mister que possibilitemos primeiro o acesso a essa nova via afetiva —a janela de nossos corações! —, por onde há de passar um sopro de verdade, caldeado por séculos de uma história colossal, quando poderemos sentir que a razão do Júri consiste na própria alma da democracia.

Edilson Mougenot Bonfim

Resumo: O presente trabalho traz um estudo sobre a competência do Tribunal do Júri no Brasil. Discorre sobre a competência prevista na Constituição Federal de 1988, que o prevê como o juízo competente para os crimes dolosos contra a vida, em seu artigo 5º, inciso XXXVIII. Aduz-se que a previsão da competência dentre os direitos e garantias fundamentais o eleva à condição de cláusula pétrea, bem como o torna um direito fundamental do réu. Expõe-se que nem sempre o Tribunal do Júri se mostrará vantajoso ao acusado, e que a atual ordem jurídica brasileira não permite a não utilização do direito de julgamento pelo Tribunal Popular. Defende-se, por fim, uma reforma constitucional e legal que permita ao acusado optar, conforme indicação de seu advogado, pelo julgamento entre o Tribunal do Júri e um juiz togado.

Palavras-chave: Tribunal do Júri, Conselho Popular, competência, renúncia, juiz singular, cláusula pétrea.

Sumário: INTRODUÇÃO.CAPÍTULO 1 – O TRIBUNAL DO JÚRI . 1.1 Conceito e origem..1.2 Histórico do Júri no Brasil. 1.3 Princípios e características do Tribunal do Júri no Brasil. 1.3.1 A plenitude de defesa. 1.3.2 O sigilo das votações. 1.3.2 .1 O princípio do livre convencimento. 1.3.3 A soberania dos veredictos. 1.3.4 A competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. CAPÍTULO 2 - QUANDO O TRIBUNAL POPULAR SE TORNA INJUSTO.. 2.1 Os crimes midiáticos. 2.2 A convicção religiosa nos julgamentos. 2.3 A defesa pela extinção do Tribunal do Júri. CAPÍTULO 3 - A RENÚNCIA AO JULGAMENTO PELO JÚRI . 3.1 A renúncia no mundo. 3.2 A renúncia no Brasil . 3.3 O Tribunal do Júri como cláusula pétrea. 3.3.1 A Previsão do Tribunal do Júri como direito fundamental. 3.3.2 A mutabilidade das cláusulas pétreas. CONCLUSÃO.. BIBLIOGRAFIA.. 


INTRODUÇÃO

O Tribunal do Júri é uma instituição cuja origem é controversa, levando cada doutrinador a apontar determinada civilização como a precursora do mesmo. Tal divergência ocorre devido à eleição do critério de semelhanças. Assim, embora alguns apontem a Inglaterra Antiga, entendemos que não são as formalidades e procedimento que devem ser considerados, e sim a idéia principal, a qual ainda hoje é utilizada por todos aqueles países que mantém tal instituto.

Desta feita, foi na Grécia Antiga que se iniciou a participação popular em julgamentos dos crimes públicos, que eram de interesse comum, nos quais participavam membros do povo. Tal característica, cuja dissociação acabaria por descaracterizar completamente o Tribunal do Júri, é que deve ser analisada toda vez que se pretende discutir o instituto.

É sabido que o Tribunal do Júri possui defensores fervorosos, assim como críticos ferrenhos. O ponto fundamental da polêmica é a entrega do julgamento ao Conselho de Sentença, formado por leigos. Questiona-se a capacidade destes de compreender a lei melhor que um juiz togado, que conhece o direito e se encontra menos vulnerável à influência da boa retórica.

Por outro prisma, os defensores do júri os defendem de forma contundente, e o fazem com conhecimento de causa. Não obstante, é importante destacar que, até mesmo os que o defendem, apontam para a falibilidade que este está sujeito.

Como exemplo, não é novidade que o julgamento popular se torna injusto nos crimes que tiveram grande repercussão na mídia, dos quais dispomos de inúmeros exemplos recentes: Os casos Suzane von Richthoffen, Isabella Nardoni, Elisa Samúdio e João Hélio, por exemplo, foram tão divulgados pela imprensa que seria impossível imaginar um corpo de jurados que não estivesse influenciado ou com opinião já formada.

Outrossim, a própria convicção religiosa é capaz de afastar completamente a formação de certeza baseada no caso concreto em julgamento, como nos casos dos crimes de aborto e o induzimento, instigação, ou auxílio ao suicídio, atualmente abrangidos pela competência do Júri. A depender da formação cultural da comarca em que será realizado o julgamento, é possível que, antes mesmo de a primeira palavra ser proferida, o resultado já esteja decretado.

Buscou-se demonstrar, no decorrer de toda a dissertação, o caráter dúplice que o Tribunal do Júri apresenta: ao passo em que se mostra atraente em certos casos à defesa do acusado, por ser um tribunal mais humanitário e livre, em outros se mostra impiedoso, e de certa forma até irracional, por desconsiderar defesas técnicas e se deixar influenciar por argumentos emotivos ou de forte caráter moral.

Destarte, chega-se a uma indagação inevitável: sendo o Júri apontado como um direito fundamental, de ser julgado por membros da própria comunidade e evitando, desta forma, decisões monocráticas legalistas do juiz togado, nos casos em que esse direito se reveste em um prejuízo, um obstáculo intransponível, não socorre o réu o direito de renunciar a tal tipo de julgamento, para ser julgado por um juiz togado?

Pela lógica, poderia se responder que sim. No entanto, basta analisar o contexto atual da prática forense criminal, em que não há qualquer exemplo de tal modificação de competência, para se concluir que, da forma como se apresenta o júri na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional, tal raciocínio não se aplica.

Preliminarmente, há de se considerar que a competência do Tribunal do Júri é definida na Constituição Federal, art. 5°, inciso XXXVIII, alínea d, dispondo que a instituição do júri possui competência para o julgamento de crimes dolosos contra a vida, apontando ainda os incisos anteriores que lhe são assegurados a plenitude de defesa, o sigilo das votações, e a soberania dos veredictos.

Por conseguinte, doutrina e jurisprudência são pacíficas quanto ao entendimento de que os crimes conexos também serão julgados pelo Conselho de Sentença, assim como a competência estabelecida pela Constituição é mínima, podendo a legislação infraconstitucional ampliar o rol de crimes.

A questão a ser analisada, portanto, é se poderíamos mitigar tal competência, mormente em razão de o inciso XXXVIII, ao ser previsto no rol de direitos e garantias fundamentais, ser uma cláusula pétrea, por força do artigo 60, §4º, da Constituição Federal.

Para este fim, devemos analisar caráter da norma constitucional do Tribunal do Júri. Sendo esta um direito ou garantia fundamental, é imprescindível distinguir a quem tal direito ou garantia se destina.

Deve ser considerado, outrossim, que a competência do Tribunal do Júri não é absoluta, vez já se contemplam alguns casos em que esta é modificada, como nos foros especiais por prerrogativa de função, bem como no caso do desaforamento, que embora não tire a competência do Tribunal do Júri, afasta o seu juiz natural, justamente pela suspeita de imparcialidade do Conselho de Sentença.

Por conseguinte, é mister que se analise a possibilidade de modificação das cláusulas pétreas, único meio possível de se permitir a renúncia de julgamento pelo júri sem rompimento com a atual ordem constitucional.


CAPÍTULO 1 – O TRIBUNAL DO JÚRI

1.1 Conceito e origem

O Tribunal do Júri é uma instituição que visa, primordialmente, oportunizar ao réu o julgamento por seus pares, ou seja, outros membros do corpo social em que vive. Ainda que cada país que o adota possua peculiaridades que os torne consideravelmente diferentes, é esta característica que os une ideologicamente.

Acarreta uma situação em que o povo, em mais uma oportunidade, manifesta-se diretamente em um assunto relevante a si próprio. Isto porque o Estado — ao menos onde há democracia, consubstancia-se no corpo representativo da sociedade que organiza, em determinado território. O júri, tal qual no caso de plebiscitos ou referendos, é uma das situações em que o povo avoca para si o exercício de uma função estatal, no caso, a função judicante.

Quanto à sua origem, não se pode falar que é incerta, sendo mais correto apontá-la como controversa, levando cada doutrinador a defender determinada civilização como a precursora do mesmo. Tal divergência ocorre devido à eleição do critério de semelhanças. Como aponta Gomes (2010):

O grande dissenso nos posicionamentos deve-se a uma conjuntura de fatores: 1º) falta de acervos históricos seguros e específicos; 2º) o fato de o instituto estar ligado às raízes do direito e quase sempre acompanhar quaisquer aglomerações humanas, desde e principalmente as mais antigas, esparsas e menos estudadas, dificultando o estudo e a pesquisa; 3º) e de maior relevância, o fato de não se conseguir destacar um traço mínimo essencial à identificação de sua existência, para se poder afirmar a sua presença em determinado momento da história.

É nesta esteira que alguns doutrinadores e historiadores apontam que os judeus, quando escravizados no Egito, foram os primeiros povos que inseriram a participação popular nos julgamentos, através do Coselho de Anciãos. Outros apontam ainda Grécia e Roma, em seus períodos clássicos, como precursores do Júri, havendo ainda quem defenda a origem inglesa, tendo em vista que lá surgiram as formalidades e procedimentos adotados, em parte, até os dias atuais, posicionamento adotado por Nucci (2010).

Para este, o Tribunal do Júri foi propagado nas civilizações ocidentais através da Magna Carta de 1215, a qual preceituava que ninguém poderia ser detido, preso ou despojado de seus bens, costumes e liberdades, senão em virtude de julgamento de seus pares, segundo as leis do país.

Neste ponto, consideramos razoável a consideração feita por Silva (2010), segundo o qual não são as formalidades e procedimento que devem ser considerados, e sim a idéia principal deste procedimento, qual seja, o julgamento pelos pares da sociedade. É assim que o autor conclui:

Em Roma, no período evolutivo do sistema acusatório do processo penal, foi instituída a quaestio – “órgão colegiado constituído por cidadãos, representantes do populus romano (...)”, algumas características do julgamento pelante a quaestio, de acordo com Tucci, seriam próximas ao do que temos hoje no Brasil, razão pela qual a origem do Tribunal do Júri deve ser considerada como sendo romana.

Data vênia, embora acatemos o critério utilizado pelo autor, não concordamos com a conclusão a que ele chegou. Afinal, ele desconsiderou a origem grega pelo fato de a cidadania deste país, no período clássico, ser negada a grande parte da população, o que se observa, porém, em muitas culturas antigas, inclusive em Roma.

Desta feita, apontamos que foi na Grécia Antiga que se iniciou a participação popular em julgamentos dos crimes públicos, que eram de interesse comum, nos quais participavam membros do povo.

1.2 Histórico do Júri no Brasil

Já no Brasil, o Tribunal do Júri foi instituído em 18 de junho de 1822, através de Decreto Imperial de Dom Pedro I, atendendo-se, segundo Nucci (2010), à propagação da instituição por toda a Europa. Sua competência se restringia aos crimes de imprensa, e era formado por vinte e quatro cidadãos, dentre homens bons, honrados, inteligentes e patriotas. Suas decisões somente podiam ser revistas pelo próprio Príncipe Regente.

A primeira previsão constitucional foi em 1824, quando o Tribunal do Júri foi alocado na seção do Poder Judiciário, tendo a sua competência extendida também às causas cíveis, também inspirada no direito alienígena. Nesta época, a legislação infraconstitucional modificava constantemente o rol de crimes de competência deste Tribunal.

O Código de Processo Criminal de 1832 disciplinou o Tribunal do Júri, atribuindo-lhe a competência e a função dos jurados, bem como regulamentando seu procedimento, tal qual aponta por Silva (2010):

O procedimento do Tribunal do Júri, assemelhando-se com o modelo inglês, dividia-se em duas fases: a primeira era o ‘grande júri’, também conhecido como ‘júri de acusação’, quer era formado por vinte e três jurados reunidos na sede da Comarca, de seis em seis meses, para ratificar as decisões de pronúncia. Somente em caso de decisão procedente da acusação, é que a matéria era levada ao ‘júri de sentença’ ou ‘pequeno júri’, formado por doze jurados, que condenavam ou absolviam os acusados.

Como se vê, o sistema bifásico adotado nos dias atuais teve a sua origem, no ordenamento jurídico brasileiro, neste Código de 1832, muito embora uma reforma por este sofrida em 1841 tenha extinto o “júri de acusação”. Tal reforma não alterou, contudo, os demais procedimentos e caraterísticas de forma significativa.

Após a proclamação da República, em sua primeira Carta Constitucional, de 1891, ocorreu um fato importante e significativo para a instituição do Júri em nosso país: pela primeira vez, este foi previsto no capítulo destinado à declaração dos direitos dos cidadãos brasileiros, transferência esta motivada, segundo Nucci (2010), pela “intransigente defesa do Tribunal Popular feita por Rui Barbosa, seu admirador inconteste”.

No mandato de Getúlio Vargas, com a outorga da Constituição de 1934, o Tribunal do Júri voltou a ser alocado no Capítulo destinado ao Poder Judiciário, e suprimido completamente em 1937, sendo reinserido em 1938, pelo Decreto-lei 167, sem contudo possuir soberania dos veredictos. Não obstante, tal decreto normatizou muitas das características adotadas até os dias atuais, como o número de jurados.

A Constituição de 1946, finalmente, trouxe o Tribunal Popular para o capítulo dos direitos e garantias fundamentais, todavia por motivos pouco louváveis, nas palavras de Nucci (2010):

A Constituição de 1946 ressucitou o Tribunal Popular no seu texto, reinserindo-o no capítulo dos direitos e garantias individuais, como se fosse uma autêntica bandeira na luta contra o autoritarismo, embora as razões desse retorno terem ocorrido, segundo narra Vitor Nunes Leal, por conta do poder de pressão do coronelismo, interessado em garantir a subsistência de um órgão judiciário que pudesse absolver seus capangas (Coronelismo, enxada e voto, p. 231-236).

Por conseguinte, a Lei 263, de 1948, realizou modificações no Código de Processo Penal de 1941 (vigente atualmente) que resistiram pouco alteradas nos dias atuais. A Constituição seguinte, de 1967, não realizou alterações no instituto, assim como a Emenda Constitucional de 1969, todavia omitindo novamente a soberania dos veredictos, a plenitude de defesa e o sigilo das votações.

A Constituição Federal de 1988, fazendo valer a sua alcunha de “Constituição Cidadã”, dispôs em seu artigo 5º, dentre os direitos e garantias fundamentais, que é reconhecida a instituição do júri, deixando a cargo da lei sua regulamentação, e reconhecendo os quatro princípios basilares, quais sejam, a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

1.3 Princípios e características do Tribunal do Júri no Brasil

A característica do Tribunal do Júri primordial para este trabalho é a sua previsão constitucional no rol de direitos e garantias fundamentais, o que automaticamente torna o inciso que o prevê uma cláusula pétrea, por força do artigo 60, § 4º, IV, da Constituição Federal.

Desta forma, o estudo de qualquer modificação em sua competência e demais características deve atentar para esse fato, caso contrário há risco de afronta à Lei Maior, sequer permitida por esta.

Preliminarmente, é necessário destacar a diferença entre direitos e garantias fundamentais. Para Lenza (2011), “os direitos são bens e vantagens prescritos na norma constitucional, enquanto as garantias são os instrumentos através dos quais se assegura o exercício dos aludidos direitos (preventivamente) ou prontamente os repara, caso violados”.

Feita tal distinção, o importante agora é analisar se o Tribunal do Júri é um direito ou uma garantia, e para quem ele se destina: se para a socidade, para o indivíduo que vier a ser julgado por um crime doloso contra a vida, ou mesmo para o devido processo legal.

Tal análise se mostrará imprescindível para a interpretação que se almeja, qual seja, verificar  a possibilidade de renúncia ao julgamento pelo Tribunal Popular. Interessante aqui destacar alguns posicionamentos de importantes doutrinadores. Para Nucci (2010):

Observa-se, majoritariamente, na doutrina ser o júri uma garantia (Rui Barbosa, Marcelo Caetano, Pontes de Miranda, José Afonso da Silva, Hamilton Moraes e Barros, João Mendes Júnior, julio Fabbrini Mirabete, Rogério Lauria Tucci, José Duarte, James Tubenchlak, Hélio Tornaghi, Pinto Ferreira, Aristides Milton, Rui Stoco, Hélio Costa, Nádia Araújo e Ricardo Almeida). No sentido de ser um direito individual, os magistérios de Celso Bastos e Adriano Marrey (ver, a respeito o nosso Júri – princípios constitucionais, p. 54). Entendemos, também, ser o Tribunal do Júri uma garantia individual. Mas, pergunta-se: garantia a qual direito? Muitos têm sustentado, a nosso ver equivocadamente, ser uma garantia ao direito de liberdade. Fosse assim e teríamos que admitir ser o júri um escudo protetor do criminoso, que atenta contra a vida humana, o que não pode ser admissível. Além disso, é preciso destacar ser o direito à vida igualmente protegido na Constituição – tanto quanto o direito à liberdade -, de forma que o júri nao poderia proteger um, em prejuízo do outro. A vida da vítima foi eliminada pelo réu e o Tribunal Popular não tem por fim proteger ou garantir fique o acusado em liberdade. Trata-se de uma garantia ao devido processo legal, este sim, uma garantia ao direito de liberdade. Assim, temos a instituição do júri, no Brasil, para constituir o meio adequado de, em sendo o caso, retirar a liberdade do homicida. (...) É o Tribunal Popular garantia fundamental formal, simplesmente por ter sido previsto na Constituição como tal, mas não o é em seu sentido material. (...) Por outro lado, não deixamos de revelar ser o júri, em segundo plano, mas não menos importante, um direito individual, consistente na possibilidade que o cidadão de bem possui de participar, diretamente, dos julgamentos do Poder Judiciário. Em síntese: o júri é uma garantia individual, precipuamente, mas também um direito individual”. (grifos não constantes no original)

Ou seja, para o renomado doutrinador, oTribunal do Júri é previsto constitucionalmente tão somente como garantia ao devido processo penal e à sociedade, quanto à participação nos julgamentos. Entendemos, contudo, que o Tribunal do Júri constitui sim um direito fundamental em seu sentido material, assegurado ao réu, sem que isso signifique, necessariamente, um direito à impunidade.

É que a garantia dada ao réu, quando julgado por Conselho de Sentença, consubstancia-se no fato de ser julgado por seus pares na sociedade, sendo-lhe assegurada a plenitude de defesa, inclusive. Como diz Oliveira (2010):

Costuma-se afirmar que o Tribunal do Júri seria uma das mais democráticas instituições do Poder Judiciário, sobretudo pelo fato de submeter o homem ao julgamento de seus pares e não ao da Justiça togada. É dizer: aplicar-se-ía o Direito se segundo a sua compreensão popular e não segundo a técnica dos tribunais.

Para Aras (2010), o júri é um direito material e processual, isto é, um direito de julgamento pelos próprios pares em certos crimes. Neste sentido, também aponta Silva (2010):

O direito fundamental de ser julgado pelo Tribunal do Júri, quando da ocorrência de homicídio doloso contra a vida, tem o escopo alardeado de evitar decisões monocráticas legalistas do juiz togado, podendo decisões absolutórias ser levadas em consideração devido carga emocional e aos sentimentos da sociedade, além de ser julgado por membros da própria comunidade (portanto, conhecedores das peculiaridades e sentimentos regionais).

Há de se observar que os direitos e garantias fundamentais se destinam ao indivíduo, como proteção deste face ao Poder Estatal. Sob esse prisma, ganha mais relevância a tutela a um direito ao réu, que um direito a um devido processo legal ou à coletividade. Nesse sentido se aplica a lição de Oliveira (2009):

O Estado, mesmo quando inserido no contexto de um devido processo legal, atua em posição de nítida vantagem a ele incubindo as funções de investigação, de acusação e de julgamento. Assim, e por isso, dada tal desigualdade fática, as diversas garantias processuais arroladas no art 5º, LIX, da Constituição da República, estão dirigidas e dimensionadas para a proteção individual em face do desenvolver-se da ação estatal persecutória. Eis o eixo teórico: o processo é e deve ser sempre uma garantia individual, destinada a promover o quanto possível, e mesmo por ocasião da fase investigatória, e o sistema probatório deve também levar a apontada e concreta desigualdade de partes.

Assim, considerando que os direitos e garantias fundamentais são, em sua essência, uma proteção ao indivíduo em face do Poder Estatal, assim também deve ser considerado o Tribunal do Júri, ou por nenhum outro motivo se justificaria a sua previsão no rol de direitos e garantias fundamentais. Fosse uma garantia simplesmente a um devido processo legal diferenciado do comum, bastaria a previsão neste sentido, no capítulo destinado ao Poder Judiciário.

Lopes Júnior, em obra dedicada à conformidade constitucional do processo penal (2009), explica que, em matéria penal, todos os interesses situam-se na dimensão dos direitos e garantias fundamentais, principalmente os do réu, assim aduzindo:

W. GOLDSCHIMIDT explica que os direitos fundamentais, com tais, dirigem-se contra o Estado, e pertencem, por conseguinte, à seção que trata do amparo do indivíduo contra o Estado. (...) O processo penal constitui um ramo do Direito Público, e, como tal, implica autolimitação do Estado, uma soberania mitigada.

Destarte, a verdadeira garantia oferecida pelo Tribunal do Júri ao réu é o julgamento livre do rigor excessivo da lei, o que se traduz em uma vantagem considerável em algumas situações. Afinal, o ordenamento jurídico deve refletir as aspirações e os ideiais de uma sociedade.

Ribeiro (1998) aponta que o julgamento pelos pares tornou-se obsoleto e impráticavel nos dias atuais, afinal, as sociedades hoje possuem densidade demográfica consideravelmente maior que as de antigamente:

Atualmente, os membros do júri (na Inglaterra são 12) são convocados para proferir um veredicto imparcial, sem ter prévio conhecimento do acusado, numa relação de anonimato que é conseqüência do desaparecimento das sociedades medievais fechadas e do crescimento das cidades. Assim, faltando amparo histórico, a idéia de julgamento por pares é irreal, além de saudosista, na medida em que repete um tradição milenar. Nada obstante, ressalte-se que ela sustenta a existência de júri no Brasil.

Embora tal raciocínio não seja completamente incorreto, não se deve perder de vista que o julgamento popular não precisa ser realizado por conhecidos. Pelo contrário, um Conselho de Sentença formado por cidadãos que já conheciam o acusado inevitavelmente será parcial. O que se almeja é a manifestação da sociedade, ciente do mundo cultural em que vive o acusado.

Inconcebível, por exemplo, imaginar que, caso o adultério ainda fosse tipificado como crime, uma sociedade muçulmana, de algum país com governo teocrático e extremista, julgaria de igual forma uma mulher adúltera, em relação a uma sociedade mais liberal (em comparação), como a sociedade brasileira.

Para cada sociedade, a reprovabilidade de um crime é diferente, e o Tribunal do Júri é a “unidade de medida” mais adequada à vontade popular, pois sete pessoas do povo dizem melhor o juízo de reprovação que a sociedade faz, que apenas um juiz, ainda que togado e conhecedor das leis.

Sendo a lei abstrata, característica essa que visa apontar ao juiz do fato uma uniformidade em diversas situações que não poderiam ser descritas minuciosamente pelo texto legal, mas que guardam algum elo ideológico entre si, por vezes não consegue se tornar compatível com o desejo da sociedade. É nesse aspecto que o Tribunal do Júri aparece como compensador da lei, adequando-a à vontade popular.

É certo que, ao passo que esse julgamento por pessoas do povo, ao mesmo tempo em que se mostra mais vantajoso e justo em diversos casos, pode também se tornar impiedoso e irracional em outros, por uma série de fatores. Apenas para exemplificar, temos os casos que repercutiram de forma tão contundente na mídia, que a parcialidade do Conselho de Sentença se mostra impossível.

Sendo assim, partindo-se do pressuposto que as Constituições visam controlar o Poder Estatal e os eventuais abusos que inevitavelmente se apresentam, em todas as sociedades e em todas as épocas, não se deve de igual forma buscar algum mecanismo para proteger o cidadão, individualmente, da fúria da sociedade, quando por algum motivo se mostra impiedosa e desejando vingança, ou simplesmente reprovando irracionalmente uma conduta?

Imperioso, contudo, antes de demonstrar detalhadamente as hipóteses em que o Tribunal do Júri pode ser prejudicial ao réu, mister que analisemos as demais garantias intrínsecas ao Tribunal do Júri, previstas na Constituição Federal de 1988. Assim dispõe o seu artigo 5º, inciso:

XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;

c) a soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;

1.3.1 A plenitude de defesa

A primeira delas é a plenitude de defesa, peculiar ao Júri, e de maior alcance em relação à ampla defesa, prevista para os demais procedimentos. É que a ampla defesa, também prevista como direito fundamental, é o direito de o réu utilizar-se de todos os recursos legais para a sua defesa.

Já a plenitude de defesa lhe permite utilizar em seu proveito todo e qualquer argumento que julge lhe ser benéfico. Essa é uma das características mais importantes do tribunal do júri e aliada à livre convicção íntima dos jurados, garante que argumentos mais diversos sejam alegados e acatados, a fim de convencer os jurados. Podemos apontar como exemplo, a insuficiência das provas ou a não reprovabilidade da conduta. Neste sentido dispõe Capez (2007):

A finalidade do Tribunal do Júri é a de ampliar o direito de defesa dos réus, funcionando-se como uma garantia individual dos acusados pela prática de crimes dolosos contra a vida e permitir que, em lugar do juiz togado, preso a regras jurídicas, sejam julgados pelos seus pares.

Já para Nucci (2010), o que se busca garantir ao réu, no Tribunal do Júri, é uma defesa plena, completa, o mais próxima possível do perfeito, e não somente uma defesa ampla. Para ele, a própria previsão da ampla defesa e da plenitude de defesa em incisos distintos, bem como a escolha das palavras pelo constituínte, depreende-se que a diversidade existente entre ambas evidencia-se.

Assim, para esse autor, enquanto que no procedimento ordinário a ampla defesa lhe garante produzir provas, questionar dados, contestar alegações e oferecer dados técnicos suficientes, para que o magistrado possa considerar equibrada a demanda:

Por outro lado, no Tribunal do Júri, onde as decisões são tomadas pela íntima convicção dos jurados, sem qualquer fundamentação, onde prevalecem a oralidade dos atos e a concentração da produção de provas, bem como a identidade física do juiz, torna-se indispensável que a defesa atue de modo completo e perfeito – logicamente dentro das limitações impostas pela natureza humana. A intenção do constituinte foi aplicar ao Tribunal Popular um método que privilegie a defesa, em caso de confronto inafastável com a acusação, homenageando a sua plenitude. Como já tivemos ocasião de expor e tratar com maiores detalhes, “júri sem defesa plena não é um tribunal justo e, assim sendo, jamais será uma garantia ao homem.

Importante anotar também a lição de Távora e Antonni (2009), para os quais prevalece, no Tribunal do Júri, a possibilidade não só da utilização de argumentos técnicos, mas também os de natureza sentimental, social, e até mesmo de política criminal, no intuito de convencer o corpo de jurados.

De fato, o Código de Processo Penal veda tão somente, em seu artigo 478, as referências às decisões de pronúncia ou posteriores na sustentação oral em Plenário, que beneficiem ou prejudiquem o acusado, e ao silêncio deste, o que na verdade, se dirige quase que exclusivamente à acusação, se mostrando mais um benefício ao acusado que um cerceamento à sua defesa.

Destarte, a plenitude de defesa está tão intimamente ligada ao objetivo  fundamental do Tribunal do Júri, e à tradição desta instituição no Brasil, que dificilmente se consegue imaginar sua supressão, bem como, ressalte-se, é uma de suas características menos criticadas por quem o reprova.

1.3.2 O sigilo das votações

A segunda característica do Tribunal do Júri é o sigilo das votações. Importante destacar que o sigilo se manifesta de duas formas: através da votação em sala especial, onde estarão presentes apenas os sujeitos do processo indispensáveis, e através do sigilo dos votos dos jurados.

Tem-se que, a partir da reforma advinda da Lei 11.689/08, importante passo foi dado para garantir o sigilo, já que a partir de então se encerra a votação assim que a maioria dos votos é atingida, ou seja, quatro votos semelhantes.

Anteriormente, todos os votos eram computados, o que tornava o voto conhecido quando unânime. Por tais razões, a reforma legal veio como uma garantia ao jurado, que pode votar convictamente, sem temer qualquer eventual futura represália. Assim apontou o colendo Supremo Tribunal Federal:

O veredicto do júri resta imune de vícios acaso não conste o número de votos no Termo de Julgamento no sentido afirmativo ou negativo, não só por força de novatio legis, mas também porque a novel metodologia preserva o sigilo e a soberania da deliberação popular. (...) O art. 487 do CPP foi revogado pela Lei 11.689/2008, aprimorando assim o sistema de votação do júri, já que não se faz mais necessário constar quantos votos foram dados na forma afirmativa ou negativa, respeitando-se, portanto, o sigilo das votações e, consectariamente, a soberania dos veredictos. (HC 104.308, Rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 31-5-2011, Primeira Turma, DJE de 29-6-2011.)

Como destaca Silva (2010), citando Antônio Scarance Fernandes[1] e Alexandre de Moraes[2]:

A doutrina majoritária propala que o sigilo das votações não ofende a garantia da publicidade, uma vez que, ‘além de estar previsto na própria Constituição, justifica-se como medida necessária para preservar a imparcialidade do julgamento, evitando-se influência sobre os jurados que os impeça de, com liberdade, manifestar seu convencimento pela votação dos quesitos’. (...) De acordo com Alexandre de Moraes, ‘o preceito constitucional do sigilo das votações significa que a liberdade de convicção e opinião dos jurados deverá sempre ser resguardada, devendo a legislação ordinária prever mecanismos para que não se frustre o mandamento constitucional’.

Trata-se de um mecanismo de proteção, sobretudo, aos jurados, que exercem uma função importantíssima para a justiça, porém não gozam das proteções destinadas aos magistrados. Ressalte-se que não podem recusar sem justo motivo a convocação para composição da lista de jurados.

O magistrado togado, tendo escolhido a profissão por sua livre vontade, exerce sua função ciente dos riscos que esta possui, e por esta é remunerado. Ademais, sempre que se sentir ameaçado, pode pleitear proteção policial, sendo ingenuidade acreditar que o Estado possui condições de oferecer tal proteção também a todos os cidadãos que participarem do Tribunal do Júri.

Sendo assim, o sigilo constitui-se na melhor proteção que o Estado pode oferecer ao jurado, principalmente a partir da nova sistemática inaugurada em 2008, quando se torna impossível distinguir o voto individual do conselho de sentença. Assim, o voto permanece secreto, diferente do que ocorria antes, quando havia unamidade.

1.3.2 .1 O princípio do livre convencimento

Devemos destacar, quanto à votação dos jurados, que uma das características mais criticadas do Tribunal do Júri é o princípio do livre convencimento. Observa-se, nas demais decisões em um processo criminal, o princípio da persuasão racional, pelo qual o juiz poderá valorar livremente as provas processuais, devendo em contrapartida fundamentar suas decisões, explicando quais provas levou em consideração para julgar de determinado modo.

A diferença entre os sistemas do livre convencimento motivado ou persuação racional para o sistema da certeza moral do juiz, ou da íntima convicção, é bem explicado por Távora e Antonni (2009), que os conceituam, respectivamente:

É o sistema reitor no Brasil, estando o juiz livre pra decidir e apreciar as provas que lhe são apresentadas, desde que o faça de forma motivada (art. 93, IX, CF). (...) A liberdade do julgador lhe permite avaliar o conjunto probatório em sua magnitude e extrair da prova sua essência, transcendendo ao formalismo castrador do sistema da certez legal. Não existe hierarquia entre as provas, cabendo ao juiz imprimir na decisão o grau de importância das provas produzidas.

O juiz está absolutamente livre para decidir, despido de quaisquer amarras, estando dispensado de motivar a decisão. Pode utilizar o que não está nos autos, trazendo ao processo seus pré-conceitos e crenças pessoais. A lei não atribui valor às provas, cabendo ao magistrado total liberdade. É o sistema que preside, de certa forma, os julgamentos pelo Tribunal do Júri, em sua segunda fase, na atuação dos jurados, pois estes votam os quesitos sigilosamente, sem fundamentar.

Essa ausência de fundamentação, como já dito, recebe muitas críticas, como a de Sutter Filho (2006), segundo o qual:

Em todo caso, processualmente, todos os cidadãos possuem o direito de terem suas decisões fundamentadas, sob risco de apelação. Em suma, todos possuem o direito de tomarem conhecimento de porquê foram condenados, com base em quê o Juiz decidiu, fator este ainda amparado pelo Princípio do Contraditório e Ampla Defesa. Já no Tribunal do Júri, mais um flagrante desrespeito ao cidadão se percebe claramente, pois as sentenças não precisam de forma alguma ser fundamentadas, e ainda, o voto é sigiloso. É como dar um sopapo no filho sem explicar ao mesmo o motivo do castigo.

De igual forma se posiciona Oliveira (2010), em brilhante crítica à instituição do Júri, reconhecendo-a, tal qual pretende se demonstrar nesse trabalho, a dupla faceta que esta apresenta:

Costuma-se afirmar que o Tribunal do júri seria uma das mais democráticas instituições do Poder Judiciário, sobretudo pelo fato de submeter o homem ao julgamento de seus pares e não da justiça togada. É dizer: aplicar-se-ia o Direito segundo a compreensão popular e não segundo a técnica dos tribunais.

Nesse sentido, de criação de justiça fora dos limites positivo, o Tribunal do Júri é mesmo democrático.

Mas não se pode perder de vista que nem sempre a democracia esteve e estará a serviço do bem comum, ao menos quando aferida simplesmente pelo critério da maioria. A história está repleta de exemplos de eleições (legítimas) de ditadores inteiramente descompromissadas de direitos humanos.

E o Tribunal do Júri, no que tem, então, de democrático, tem também, ou melhor, pode ter também, de arbitrário.

E isso ocorre em razão da inexistência do dever de motivação dos julgados. A resposta à quesitação pelo Conselho não exige qualquer fundamentação acerca da opção, permitindo que o jurado firme seu convencimento segundo lhe pareça comprovada ou revelada (aqui, no sentido metafísico) a verdade. E, convenhamos, esse é realmente um risco de grandes proporções. Preconceitos, ideias pré-concebidas, e toda sorte de intolerância podem emergir no julgamento em Plenário, tudo a depender da eficiência retórica dos falantes (Ministério Público, assistente de acusação e defesa).

Antes de tecer críticas acerca do posicionamento do renomado professor, cumpre-nos esclarecer o porquê, segundo nosso entendimento, da utilização do sistema da certeza moral do juiz. Parece-nos, analisando conjuntamente com a plenitude de defesa, que este sitema de fato é o mais adequado ao Tribunal do Júri.

Afinal, assim como as mais variadas teses defensivas não se limitam ao tecnicismo da lei, podendo ser utilizados quaisquer argumentos que lhe socorram, também assim devem ser as decisões, fundamentadas em quaisquer argumentos que possam parecer convincentes aos jurados.

Dessa forma, os jurados não devem estar adstritos à adequação de suas convicções à lei. Pode o jurado julgar simplesmente baseado em seu senso de justiça, e valorar da forma que entender adequada a reprovabilidade da conduta do réu.

Na falta de exemplo melhor para o fim que se deseja, podemos apontar as atenuantes genéricas do artigo 65 do Código Penal, que reconhecem o relevante valor moral e o social. Nestas atenuantes de pena, é lícito ao juiz reconhecer que o motivo que impeliu o agente a cometer o crime torna sua conduta menos reprovável.

Aos jurados também é permitido reconhecer o “justo motivo”, ou ao menos o compreensível e perdoável motivo, de forma mais abrangente que o juiz togado. Tal reconhecimento, pelos jurados, poderia ser prejudicado caso lhes fosse obrigado a explicar seus motivos.

É que o juiz encontra inúmeras dificuldades para fundamentar uma sentença baseado apenas em suas convicções, mesmo que o ordenamento jurídico reconheça causas supralegais de exclusão de ilicitude e culpabilidade. Ainda que plenamente convencido da materialidade e autoria delitiva, não poderá condenar o acusado se as provas dos autos assim não permitirem. Tal impedimento não prejudica o convencimento dos jurados. Para Forti (2009):

No sempre recorrente exemplo do homem que, deliberadamente, identifica, persegue e mata o estuprador da sua filha, também o Tribunal do Júri terá maior margem de liberdade que o Juiz togado para, apesar das provas existentes, deliberar no sentido da absolvição: a desnecessidade de fundamentar o veredicto confere aos jurados a liberdade de afastar-se da lei e legitimar conduta que, de forma geral e abstrata, é proibida.

Ademais, a ausência de fundamentação se justifica também por uma razão prática, afinal, não possuem os jurados formação jurídica para prolatar uma sentença. Como esperar que o juízes leigos consigam apontar, ainda que tenham se baseado unicamente na lei, as excludentes de ilicitude, por exemplo, ou utilizando outros institutos complexos, como a diferença entre o dolo eventual e a culpa consciente?

Por esse motivo, a sentença fica a cargo do juiz-presidente do Tribunal do Júri, que possui o conhecimento técnico para tanto, o qual não fundamenta, porém, as decisões tomadas pelo Conselho de Sentença, fazendo tão somente a dosimetria da pena.

Quanto à hipótese de prejuízo para eventual recurso a ser interposto, o que se verifica é que, ainda que a sentença não seja fundamentada, sempre socorre ao réu condenado o direito de apelar.

Se por um lado pode parecer que a ausência de pontos determinados a serem combatidos configura um prejuízo ao seu recurso, é de se considerar também que lhe socorre um efeito devolutivo geral, podendo, sob o argumento de que o julgamento foi contrário às provas dos autos, devolver ao juízo toda a matéria que entender necessária.

Destarte, a consequência da anulação de decisão proferida por Conselho de Sentença é a designação de novo julgamento, o que somente poderá ocorrer uma única vez. Caso novamente, não haja conformismo do réu,o jus puniendi estatal irá, de qualquer forma, se manifestar.

Salienta-se, neste ponto, que o não conformismo a decisões condenatórias é inerente a todas as decisões irrecorríveis, não sendo característica exclusiva do júri, nem mesmo decorrente da ausência de fundamentação da sentença.

É bem verdade que, estando a ausência de intimamente ligada à sua finalidade, qual seja, permitir que o jurado julgue intimamente o caso que lhe é apresentado, a decisão íntima dos jurados pode se pautar em diversos motivos, que não o senso de justiça, como bem ressaltado por Oliveira (2010). Tais casos, como já alertado, serão expostos mais adiante.

1.3.3 A soberania dos veredictos

Por conseguinte, o terceiro princípio do Tribunal do Júri é a soberania dos veredictos. Trata-se de disposição constitucional determinando que apenas o corpo de jurados julgue o mérito da causa, através da resposta aos quesitos formulados pelo juiz presidente. Este, de acordo com as respostas recebidas, sem delas se afastar, irá prolatar a sentença. Assim discorre Silva (2010):

O terceiro princípio norteador do Tribunal do Júri, assegurado pela Constituição, é a soberania dos veredictos (art. 5°, “c”). Tal princípio, por parte da doutrina, é considerado relativo, uma vez que o tribunal superior poderá anular o julgamento na ocorrência de circunstâncias específicas, determinando a realização de um segundo Júri. Outra parte da doutrina afirma que a soberania não resta prejudicada pela anulação do julgamento, pois se devolve a matéria para o próprio Júri, sendo vedada a reforma do mérito pela segunda instância.

Oliveira (2010) é um defensor da tese de que a revisão criminal mitiga a soberania dos veredictos, nos seguintes termos:

Embora semelhante possibilidade, à primeira vista, possa parecer uma afronta manifesta à garantia da soberania dos veredictos, pode-se objetar em seu favor o seguinte: a ação de revisão criminal somente é manejável no interesse do réu e somente em casos excepcionais previstos em lei (art. 621, I, II e III); funciona, na realidade, como uma ação rescisória (do cível), legitimando-se pelo recebimento da falibilidade inerente a toda espécie de convencimento judicial e, por isso, em todo julgamento feito pelos homens.

A soberania dos veredictos visa assegurar a competência constitucional do Tribunal do Júri. O povo, representado em cada julgamento pelo Conselho de Sentença, é o juiz natural dos crimes dolosos contra a vida e, exceto em hipóteses previstas na própria Constituição Federal, não pode ser preterido em sua competência.

Assim, a decisão tomada pelos jurados não pode ser desrespeitada, sob pena de afronta ao princípio do juiz natural e à própria alínea c, inciso XXXVIII, do artigo 5º. Verifica-se que os recursos somente são possíveis nos casos previstos no Art. 393, do Código de Processo Penal:

Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias:

III - das decisões do Tribunal do Júri, quando

a) ocorrer nulidade posterior à pronúncia;

b) for a sentença do juiz-presidente contrária à lei expressa ou à decisão dos jurados;

c) houver erro ou injustiça no tocante à aplicação da pena ou da medida de segurança

d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos.

§ 1º Se a sentença do juiz-presidente for contrária à lei expressa ou divergir das respostas dos jurados aos quesitos, o tribunal ad quem fará a devida retificação.

§ 2º Interposta a apelação com fundamento no no III, c, deste artigo, o tribunal ad quem, se Ihe der provimento, retificará a aplicação da pena ou da medida de segurança.

§3º Se a apelação se fundar no nº III, d, deste artigo, e o tribunal ad quem se convencer de que a decisão dos jurados é manifestamente contrária à prova dos autos, dar-lhe-á provimento para sujeitar o réu a novo julgamento; não se admite, porém, pelo mesmo motivo, segunda apelação

§4º Quando cabível a apelação, não poderá ser usado o recurso em sentido estrito, ainda que somente de parte da decisão se recorra. 

Depreende-se, desta forma, dos parágrafos do inciso, que os recursos visam, simplesmente, corrigir eventuais falhas advindas da sentença do juiz presidente do Tribunal do Júri, quando da prolatação da sentença, tanto no que diz respeito aos fatos quanto à dsimentria da penal, ou quando é patente que o julgamento pelos jurados se deu contra as provas contidas nos autos.

Neste segundo caso, porém, o efeito do provimento do recurso não é a reforma da sentença, mas simplesmente a devolução para novo julgamento, por um outro Conselho de Sentença, o qual dará a decisão definitiva, sendo vedado pelo parágrafo 3º novo recurso, evitando-se assim a perpetuação ad eternum do julgamento.

Portanto, jamais o Tribunal ad quem poderá revertir-se de juiz da causa, sendo preservado assim a soberania dos veredictos e a competência constitucional do Tribunal do Júri.  Neste sentido aponta a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRIBUNAL DO JÚRI. DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. SOBERANIA DOS VEREDICTOS NÃO VIOLADA. LIMITE DE ATUAÇÃO DO TRIBUNAL DO JÚRI E DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. DENEGAÇÃO. 1. A soberania dos veredictos do tribunal do júri não é absoluta, submetendo-se ao controle do juízo ad quem, tal como disciplina o art. 593, III, d, do Código de Processo Penal. 2. Conclusão manifestamente contrária à prova produzida durante a instrução criminal configura error in procedendo, a ensejar a realização de novo julgamento pelo tribunal do júri. 3. Não há afronta à norma constitucional que assegura a soberania dos veredictos do tribunal do júri no julgamento pelo tribunal ad quem que anula a decisão do júri sob o fundamento de que ela se deu de modo contrário à prova dos autos. 4. Sistema recursal relativo às decisões tomadas pelo tribunal do júri é perfeitamente compatível com a norma constitucional que assegura a soberania dos veredictos. 5. Juízo de cassação da decisão do tribunal do júri, de competência do órgão de 2º grau do Poder Judiciário (da justiça federal ou das justiças estaduais), representa importante medida que visa impedir o arbítrio. 6. A decisão do Conselho de Sentença do tribunal do júri foi manifestamente contrária à prova dos autos, colidindo com o acervo probatório produzido nos autos de maneira legítima. 7. Habeas corpus denegado. (STF, 2ª Turma, HC 88707/SP, Relatora Min. ELLEN GRACIE, Julgamento: 09/09/2008) (grifos não constantes no original)

1.3.4 A competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida

Por fim, a quarta alínea do inciso XXXVIII, do artigo 5º, prevê que ao Tribunal do Júri é assegurada a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Tais crimes são previstos em capítulo próprio do Código Penal, quais sejam: homicídio (artigo 121); induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio (artigo 122); infanticídio (artigo 123) e aborto (artigos 124 a 127).

Competência é um critério legal de administração eficiente da atividade dos órgãos jurisdicionais, definindo previamente a margem de atuação dos mesmos, isto é, externando os limites de poder, conforme conceito apresentado por Távora e Antonni (2009). Estes citam ainda Tourinho Filho[3], para o qual é “o âmbito, legislativamente delimitado, dentro do qual o órgão exerce o seu Poder Jurisdicional”.

A competência do Tribunal do Júri é o ponto central deste trabalho, motivo pelo qual todas as suas peculiaridades devem ser analisadas. A questão suscitada, portanto, é se poderíamos mitigar tal competência, pelos motivos já expostos. Para este fim, deveríamos nos valer de uma interpretação do texto da Constituição.

O primeiro ponto controverso é a natureza da norma constitucional que institui o Tribunal do Júri. Para Mendes, Coelho e Branco (2008), as disposições constitucionais podem ser classificadas em normas de organização, de estrutura ou de competência, e normas definidoras de direitos.

As primeiras seriam as que disciplinam a ordenação dos poderes do Estado, sua estrutura, competência, articulação recíproca e o estatuto dos seus titulares, e as outras as que definem os direitos fundamentais dos jurisdicionados.

O Tribunal do Júri, conforme já exposto, não está previsto no Título destinado à organização dos poderes, que contém as regras de competência dos diversos órgãos do Poder Judiciário, e sim no Título dos direitos e garantias fundamentais. Daí se depreende que eventuais conflitos de competência envolvendo o Tribunal Popular não podem ser resolvidos da mesma forma que os demais, considerando essa peculiaridade.

Pois bem, o primeiro ponto, que é pacífico na doutrina, refere-se à amplitude da competência, ou seja, a Constituição Federal prevê a competência mínima para o Tribunal Popular, podendo ser legalmente ampliada a critério do legislador. Nesse sentido, Oliveira (2010) aponta que “a cláusula pétrea no direito brasileiro, impossível de ser mudada pelo Poder Constituinte Reformador, não sofre nenhum abalo, caso a competência do júri seja ampliada, pois sua missão é impedir justamente o seu esvaziamento”.

O entendimento também é corroborado pela jurisprudência, destacando-se o posicionamento expresso do Supremo Tribunal Federal:

A competência do Tribunal do Júri, fixada no art. 5º, XXXVIII, d, da CF, quanto ao julgamento de crimes dolosos contra a vida é passível de ampliação pelo legislador ordinário. A regra estabelecida no art. 78, I, do CPP de observância obrigatória, faz com que a competência constitucional do Tribunal do Júri exerça uma vis atractiva sobre delitos que apresentem relação de continência ou conexão com os crimes dolosos contra a vida. (...) A manifestação dos jurados sobre os delitos de sequestro e roubo também imputados ao réu não maculam o julgamento com o vício da nulidade. (HC 101.542, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 4-5-2010, Primeira Turma, DJE de 28-5-2010.) (No mesmo sentido: RHC 98.731, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 2-12-2010, Primeira Turma, DJE de 1º-2-2011.)

Ademais, os crimes tentados também são de competência do tribunal do júri, somente se excluido deste os crimes culposos. Evidentemente, o Conselho de Sentença pode reconhecer em plenário que o crime ocorreu por culpa e não por dolo, porém o julgamento somente será submetido ao Júri se, no juízo de prelibação, for o réu pronunciado pelo crime na forma dolosa.

Outros crimes, por possuírem resultado morte, constantemente induzem a erro, porém não são de competência do Tribunal do Júri. São os casos de latrocínio, que é o roubo seguido de morte, a lesão corporal seguida de morte, e o genocídio. Neste ponto, a disposição topográfica no Código Penal é bastante didática, já que o crime de latrocínio figura como crime patrimonial, e a lesão corporal seguida de morte também aparece em capítulo próprio.

Ainda assim, questionou-se tanto a competência para o crime de latrocínio, que o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula nº 603, com o seguinte teor:  “A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do juiz singular e não do tribunal do júri”.

Já no que diz respeito ao crime de genocídio, segundo aponta Silva (2010), mesmo quando este abranger atos de homicídio, é de competência do juiz singular, pois o núcleo do bem jurídico afetado é a destruição de grupo nacional, étnico, racial ou religioso, de acordo com o Estatuto de Roma (o qual passou a vigorar no Brasil em 01.09.2002, com o Decreto 4.388/02).

Há de se destacar ainda que a competência do Tribunal do Júri, mesmo em casos de crimes dolosos contra a vida, não é absoluta, havendo hipóteses excepcionais, como nos casos em que há foro por prerrogativa de função, nos não haverá julgamento pelo Tribunal do Júri. Nesse sentido, Lopes Júnior (2010):

Em que pese a competência do júri ser constitucional, se a prerrogativa de foro também estiver prevista na Constituição, prevalece a prerrogativa de função. Isso porque, quando ambas as competências forem constitucionais, prevalece a prerrogativa de função. Nesse caso, um órgão de primeiro grau, como o tribunal do júri, jamais prevalece sobre um Tribunal (jurisdição superior prevalente). Mas, destaque-se, a prerrogativa deve estar prevista na Constituição Federal.

Sendo assim, há uma linha clara de raciocínio, que será desenvolvida mais adiante: a competência do Tribunal do Júri pode ser mitigada, desde que haja previsão constitucional. E vale ressaltar, a previsão tem que ser na Carta Magna Federal, ou será inconstitucional a previsão.

Nesta esteira, o colendo Supremo Tribunal Federal editou súmula informando que foro especial previsão por Constituição Estadual não tem o condão de mitigar a competência do Tribunal do Júri:

Súmula nº 721: A competência constitucional do tribunal do júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela Constituição Estadual.

Outrossim, temos ainda o desaforamento, consistente em um mecanismo legal com o intuito de tornar o Tribunal do Júri menos parcial, previsto nos artigos 427 e 428 do Código de Processo Penal. Dispõe o caput do artigo 127, in verbis:

Art. 427.  Se o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, o Tribunal, a requerimento do Ministério Público, do assistente, do querelante ou do acusado ou mediante representação do juiz competente, poderá determinar o desaforamento do julgamento para outra comarca da mesma região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais próximas.

Inicialmente, verifica-se que o desaforamento afasta o juiz natural da causa, consagrado pelos incisos XXXVII e LIII do art. 5º da Constituição, segundo os quais são vedados o juízo e o tribunal de exceção, e é garantindo que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente.

Destarte, o juiz natural dos crimes dolosos contra a vida é a própria comunidade que onde estes ocorreram. É esta que está ciente de todos os aspectos culturais que envolvem o fato e o autor do fato, e que deve apontar como reprovável ou não a sua conduta. Segundo o entendimento do colendo Supremo Tribunal Federal:

O desaforamento do julgamento para a comarca da capital, em detrimento de outras comarcas mais próximas, deu-se com base em fundamentação idônea, indicando a possível parcialidade do julgamento popular em comarcas próximas à de origem, pelo temor de represálias imposto pelo grupo ligado ao paciente. A constatação do juízo, no sentido da possível parcialidade do julgamento em outras comarcas mais próximas, goza de fé-pública e só pode ser contrastada por meio da análise aprofundada de fatos e provas, inviável em habeas corpus. (HC 97.547, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 19-10-2010, Segunda Turma, DJE de 19-11-2010.) No mesmo sentido: HC 93.986, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 7-12-2010, Segunda Turma, DJE de 3-5-2011.

Assim, o desaforamento, utilizado quando se suspeita da imparcialidade do Conselho de Sentença, de certa forma frustra a finalidade do Tribunal do Júri, de julgamento pela comunidade que conhece as suas próprias peculiaridades, suas necessidades e sua ética.

Saliente-se que tal apontamento não se constitui uma crítica ao desaforamento. Pelo contrário, visa demonstrar que o ordenamento jurídico pátrio busca mecanismos para um julgamento mais justo, mesmo a contrario sensu do objetivo do Tribunal Popular.

Portanto, restou claro que a competência do Tribunal Popular, nesta condição de norma de organização judiciária, pode ser declinada, quando em conflito com outras normas de competência, ou quando se verifica a possibilidade de um julgamento injusto.


CAPÍTULO 2 - QUANDO O TRIBUNAL POPULAR SE TORNA INJUSTO

2.1 Os crimes midiáticos

Apresentados os argumentos em favor da manutenção do Tribunal do Júri, é necessário também apontar os contrários, pois não há verdade absoluta. Na verdade, é de bom senso apontar o Tribunal Popular como ora justo e ora reprovável. Ainda que se entenda como fundamental a sua manutenção, também se defende a sua mitigação em casos que não há possibilidade de prevalecer a justiça.

Acontecimentos recentes tem dado espaço a um debate acerca da parcialidade do Tribunal do Júri, principalmente no que diz respeito aos crimes que tem ganhado destaque na mídia. Vladimir Aras (2010), a exemplo, defende que o julgamento popular se torna injusto nestes crimes, dos quais dispomos de inúmeros exemplos recentes: os casos Suzane von Richthoffen, Isabella Nardoni, Elisa Samúdio e João Hélio, apenas para citar.

Tais episódios foram divulgados tão massivamente pela imprensa que seria impossível imaginar um corpo de jurados que não estivesse influenciado ou com opinião já formada. Destaque-se um trecho introdutório do artigo que este membro do Parquet publicou na revista Custus Legis, demonstrando o seu inconformismo com o Tribunal do Júri:

“Porém, curiosamente, a plenitude da defesa, imprescindível ao fair trial, corre o risco de lesada pela própria instituição do júri, na medida em que juízes leigos podem, em algumas circunstâncias, deixar-se influenciar pelo calor dos eventos e pelo clamor das ruas, em prejuízo de um julgamento justo. Em tal cenário, o julgamento do réu pelos pares leigos pode levar a decisões injustas, animadas pela paixão e não pelas provas dos autos.

Por isto não há como negar que, em casos criminais midiáticos, há perceptível e importante tensão entre o direito fundamental ao devido processo legal e a um fair trial e a instituição do júri, com suas idiossincrasias”.

O caso Isabela Nardoni é emblemático neste ponto, tal foi a comoção popular, que pode ser verificada na aglomeração de pessoas em frente à porta do Tribunal onde ocorria o julgamento. A população enfurecida chegou a agredir o advogado do casal em julgamento, chamando-o de “defensor de assassino” e de outras palavras de baixo calão.

Tal comportamento é inaceitável em um estado democrático de direito, onde reinam os princípios da presunção de inocência, da ampla defesa e do contraditório e o do devido processo legal. Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória, alcançada por processos judiciais nos quais se assegura o contraditório e a plenitude de defesa, através de um devido processo legal, ditam os princípios.

O Conselho de Sentença formou-se de integrantes deste mesmo povo, revoltado com o acontecimento após dois anos de intensa acusação pelos canais midiáticos. Ademais, vê-se que o povo em geral pouco compreende o significado de um julgamento, onde é essencial a defesa dos acusados para que se torne justo.

Mais pareceu que o julgamento foi mero formalismo a ser cumprido para posterior aplicação da pena. Neste caso, nem mesmo um desaforamento seria capaz de atenuar este prévio julgamento, entendendo Vladimir Aras (2010) que este instituto é paliativo, sem força suficiente para compensar a influência da mídia, dispondo com acerto:

Contudo, num caso como o de Isabella Nardoni dificilmente o desaforamento resolveria o problema do viés condenatório do tribunal, evitando a formação de um júri viciado. As reportagens publicadas ao longo de dois anos pela imprensa foram massacrantes. A difusão massiva de dados do processo foi proporcional ao mal causado à inocente menina. Seria muito difícil encontrar em qualquer comarca do Estado de São Paulo, mesmo a mais longínqua, um ambiente razoavelmente “neutro”, no qual pudessem ser selecionados sete jurados para julgar a causa com verdadeira isenção de ânimo, ou sem ideias preconcebidas.

De igual forma, este entendimento pode ser aplicado a diversos outros casos, sendo mister que se busque novos mecanismos que tornem ainda mais justo o Tribunal Popular.

2.2 A convicção religiosa nos julgamentos

Verifica-se, outrossim, que os outros crimes com menos repercussão também são julgados pelo Tribunal do Júri, como o aborto. Recorrente é a discussão na sociedade quanto à moralidade do aborto, tendo em vista a divergência quanto à moralidade da conduta da abortante.

Se, por um lado, defende-se que a legalização do aborto é questão de saúde pública, e que a normatização do procedimento somente traria benefícios à gestante, posto que não precisaria buscar meios clandestinos de realizar seu intento, por outro os representantes religiosos atacam incessantemente qualquer representante político que iniciam algum debate sobre o tema, incitando desta forma todos os seus seguidores a fazer o mesmo.

Enfim, à parte do posicionamento provocado pelo fanatismo religioso no tão necessário debate social prévio à atividade legislativa, uma situação que merece melhor análise, pois desde já se verificam prejuízos, é o pré-julgamento de um corpo de jurados, no caso de um crime de aborto, quando este é composto por membros de uma comunidade bastante religiosa, ocasião em que o julgamento se torna mera formalidade para condenação.

O que se dizer então a respeito então, do induzimento, da instigação, e do auxílio ao suicídio, quando se verifica que toda a sociedade ainda discute acerca do assunto? Aponta Delmanto (2010):

A criminalização do auxílio ao suicídio, presente não só no Brasil, como também na França, no Canadá e em outros países, tem gerando polêmica quando a pessoa é portadora de doença terminal, estando lúcida ao desejar por fim ao sofrimento que o destino lhe impôs, mediante a sua própria morte, mas de forma indolor, com o auxílio de médicos.

Continua o doutrinador destacando os desdobramentos jurídicos do auxílio ao suicídio pelo mundo:

Na França, embora a eutanásia não esteja legalizada, em 1993 o Senado votou uma lei reconhecendo a título excepcional a “morte doce”. No Canadá, um portador de esclerose lateral amiotrófica entrou com uma ação visando que a Suprema Corte julgasse inconstitucional o crime de auxílio ao suicídio, alegando ter ele a liberdade e a autonomia para dispor da própria vida, não podendo o Estado impor a ele, em estado terminal, uma morte dolorosa e atroz, um atentado à sua dignidade”. (...) Todavia, em outros países, com fundamento na dignidade da pessoa que se encontra em estado terminal, tanto o “suicídio assistido” quanto a eutanásia têm sido aceitos. Lembramos a Holanda (Lei 14 de abril de 1994, desde que com autorização judicial) e sobretudo a Suíça (onde a prática tem sido freqüente)”.

Se tal assunto é polêmico a ponto de não se ter uma corrente forte dentre os estudiosos do direito, se a própria lei não conseguiu regulamentar de forma satisfatória as diversas modalidades de suicídio, não se pode esperar que o Tribunal Popular consiga ser justo, já que composto por pessoas que não se debruçaram em uma análise minuciosa e necessária sobre o tema.

Como esperar que um Conselho de Sentença formado por jurados fervorosamente religiosos, de religião que condene como pecado imperdoável o aborto, exista a possibilidade de absolvição dos réus?

2.3 A defesa pela extinção do Tribunal do Júri

Nesse ponto, defendem os críticos do júri que os magistrados togados, ainda que já superada a ideia de imparcialidade total em um julgamento, poderiam de forma menos relutante acatar argumentos técnicos, tais como excludentes de culpabilidade, ainda que estas se fundamentem em argumentos subjetivos.

Mendes, Coelho e Branco (2008), em um contexto diferente do ora tratado, embrenham-se em uma explicação acerca do papel do magistrado como hermeneuta, ou seja, o de conformar as normas constitucionais e legais com o mundo fático e o contexto atual da sociedade:

Sob essa perspectiva, pode-se dizer que a constante adequação das normas aos fatos — um trabalho essencialmente entregue à clarividência dos intérpretes-aplicadores — apresenta-se como requisito indispensável à própria efetividade do direito, o qual só funciona enquanto se mantém sintonizado com a realidade social, muito embora essa adequação não deva comprometer a autonomia dos modelos normativos e a sua pretensão de conformar, juridicamente, a sociedade segundo pautas axiológicas quanto possível independentes.

Mais adiante, aduziram:

Mesmo assim, para que o direito possa operar efetivamente e dar a cada um o que é seu, é necessário que os seus aplicadores funcionem como instâncias redutoras do descompasso entre os problemas sociais e as respectivas soluções legislativas, uma tarefa que apenas eles estão funcionalmente habilitados a desempenhar.

O que se pretende demonstrar que é que a atividade de julgar é bastante complexa, envolvendo, além de inúmeros outros fatores, um delicado equilíbrio na relação entre os órgãos do Poder Estatal, o Judiciário e o Legislativo, atuando o Judiciário como instância final na “elaboração” da lei, ou seja, aplicar a lei significa também participar do processo legislativo.

Sendo então a atividade judicante, por vezes apontada como o poder-dever estatal de dizer o direito, de tal importância e complexidade, talvez o mais correto seria restringir a aplicação do direito àqueles que receberam formação jurídica, ou, nas palavras dos autores, a quem está funcionalmente habilitados a desempenhar a tarefa judicante.

Forti (2009), baseando-se em argumentos utilizados por Mezzomo (2003), expõe os motivos pelos quais crê ser injustificada, nos dias atuais, a manutenção do Tribunal do Júri no Brasil. Apresenta um panorama completo que sintetiza todas as críticas lançadas sobre o Tribunal popular, pelo que vale a pena expô-los em sua completude.

Para ele, o Poder Judiciário, quando estruturado no Estado Democrático de Direito, possui uma Magistratura independente, autônoma e isenta, e protegida por uma série de garantias. Ademais, atua a magistratura de forma pública, sujeita à fiscalização ampla da sociedade. Neste sentido, defende que não se justifica mais o julgamento por jurados, sendo questionado, inclusive, se já se justificou em algum momento neste.

Tais garantias processuais asseguram a imparcialidade do juiz togado. Este exerce a atividade de julgar profissionalmente, tendo assim melhores condições de avaliar não só os autos e o caso trazido a julgamento, mas também com mais consciência da importância da própria função de julgar.

Já os jurados leigos, neste ponto de vista, possuem menos recursos para julgar com imparcialidade, podendo sofrer pressão das famílias dos acusados, ou dos meios de intimidação de que dispõem grupos criminosos.

Por conseguinte, o jurado leigo irá exercer uma função nova e desconhecida, desacostumado como o linguajar jurídico e com termos técnicos, levando-o a julgar pelo que já conhecia do caso através da mídia ou de outras fontes não oficiais, ou mesmo se baseado em provas que não analisa satisfatoriamente, valorando-as apressada e desatentamente, após longas e cansativas sessões — isto quando não julga impulsionado por interesses próprios.

A ausência de conhecimentos técnicos do jurado, continua argumentando, não se justifica pelo fato deste somente se pronunciar em relação aos fatos e, nas suas palavras, “o julgamento pelo ‘homem médio' é a razão de ser do Juiz: primeiro, porque haverá necessidade de exercício constante de apreciação intelectiva das provas, valorando-as”.

No mais, a quesitação envolverá conceitos jurídicos, tais como violenta emoção, provocação injusta, torpeza, motivo fútil, traição, que por mais que possam ser compreendidos superficialmente pelos jurados, não poderão ser objeto de "apreciação acurada e serena dentro de cada caso, tarefa essa incompatível com o turbilhão da plenária".

O que explica tais discrepâncias, para os articulistas, é o fato de os jurados terem contato pela primeira vez com uma atividade a que não estão acostumados, restando perplexos quando encaram a complexidade das questões apresentadas, expondo, em seguida, talvez a maior e mais contundente crítica ao Tribunal do Júri, ou seja, de que este é um teatro. Alegam neste sentido:

Os argumentos valem menos pela sua solidez e conclusividade do que pela forma teatral com que são expostos, de modo que a capacidade cênica dos "atores" lhes conferem mais probabilidade de êxito quanto ao convencimento dos julgadores leigos que propriamente a solidez de seus argumentos. Isso faz com que os "atores" mais experientes tenham mais probabilidade de êxito, e é inegável que, principalmente em cidades do interior ou no julgamento de réus que não têm condições de contratar advogados experientes, a habilidade dos Promotores majora o risco de condenações sem provas suficientes. Diante de um Juiz técnico, por outro lado, Promotor e Advogado agem de forma técnica, argumentativa, e não teatralizada, o que faz com que o foco do julgamento esteja no "racional", e não no "emocional".

Como último argumento suscitado, aduzem que o contraditório e a ampla defesa refletem na imposição constitucional da fundamentação da sentença, pois esta é que permite se fazer uma correlação lógica da decisão com o conteúdo do processo. Prossegue:

De nada adianta garantirmos a participação ativa e profícua do réu e uma defesa técnica altamente competente cujo resultado, baseado em um substrato probatório sólido e conclusivo, indique uma absolvição, se os jurados não estão obrigados a permanecerem adstritos aos autos e à lógica ou, dir-se-ia, à justiça. Os jurados, dispensados que estão, pelo sigilo das votações, de fundamentar, julgam com base na íntima convicção não motivada, e, ao prescindir da necessária correlação entre a atividade processual das partes e o resultado do julgamento, cujos reais motivos se desconhecem, faz cair por terra qualquer possibilidade de fiscalização da sociedade acerca dos 'porquês' e, portanto, do acerto ou desacerto do julgado.

Posta desta maneira a questão, não há como negar que os críticos possuem argumentos plausíveis e bem fundamentados. Se há motivos para se exaltar o Tribunal do Júri como uma bela manifestação democrática da vontade popular, estes também existem no sentido contrário, chegando-se a uma questão que a primeira vista parece intransponível: sopesando-se os prós e contras, há motivos para a manutenção do Tribunal Popular?

Na verdade, defendemos que esta análise está fora de questão. Afinal, o Tribunal do Júri possui previsão constitucional no rol de direitos e garantias fundamentais, sendo, por força do art. 60, § 4º, da Constituição, uma cláusula pétrea. Ou seja, é impossível suprimir totalmente o Tribunal do Júri em nossa ordem constitucional.

Assim, para a efetiva retirada do Tribunal do Júri no nosso ordenamento jurídico, seria necessária a elaboração de uma nova Carta Magna, hipótese completamente descartável em nosso atual contexto político. A manutenção do Tribunal do Júri não se tornou insustentável, a ponto de clamar por tal solução drástica.

A Constituição Federal de 1988 ainda é bastante aclamada, pelo avanço que trouxe à sociedade brasileira e ao direito pátrio. Ademais, o Tribunal do Júri, longe de trazer prejuízo suficiente à sociedade que demande uma nova Constituição, possui muitos aspectos positivos em seu favor. O debate deve então prosseguir em outro sentido.


CAPÍTULO 3 - A RENÚNCIA AO JULGAMENTO PELO JÚRI

3.1 A renúncia no mundo

Buscou-se demonstrar, até o presente momento, que o sentido da inclusão do Tribunal do Júri no artigo 5º da Constituição foi de conferir, principalmente, um Tribunal mais humanitário ao réu, um benefício. Todavia, nem sempre é vantajoso ser julgado pelo Tribunal Popular. Visando suprimir tal defeito, é imperioso buscar alguma solução jurídica para essa questão.

Neste intuito, entendemos que a melhor solução é a renúncia ao julgamento pelo Tribunal do Júri, por opção do réu, cujo advogado deverá, através de seus conhecimentos técnicos e experiência jurídica, eleger o juiz para a causa, de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto.

Cumpre destacar que, segundo aponta a doutrina, os direitos e garantias fundamentais são irrenunciáveis, sendo mais correto falar em não exercício dos mesmos. Entretanto, utilizaremos o termo renúncia em sua conotação usual, por ser de mais fácil assimilação ou entendimento.

Diversos países que adotam o Tribunal Popular acatam a possibilidade de renúncia, bem como outras formas de tentar garantir um julgamento justo. Aras (2010) aponta no direito americano (um dos que mais utiliza o Tribunal do Júri) os principais mecanismos para essa tentativa de equilíbrio.

O primeiro deles é investigação preliminar que é feita, para tentar descobrir se os jurados possuem algum preconceito sobre o caso em questão, o que possibilita as recusas motivadas, diferente do que ocorre no Brasil, onde cada uma das partes possui três recusas imotivadas. Ademais, o direito americano comporta a determinação de sigilo absoluto em relação ao processo.

O método mais eficaz, no entanto, é a livre recusa do acusado em ser julgado por um Conselho Popular. Trata-se do waiver of jury trial — permitida em razão do trial by jury ser um direito previsto na Constituição norte-americana. Explica-se, com o complemento da lição de Forti (2009), que é dado ao acusado o direito de se declarar culpado ou inocente, geralmente, através das plea bargains ou plea agreements.

Costuma-se então a realização de julgamento por um juiz togado (bench trial) quando o acusado se declara culpado, enquanto que o julgamento pelo júri geralmente ocorre quando se declara inocente. Em razão de cada estado americano possuir legislação diferente, alguns não permitem a renúncia em certos casos, como Luisiana, que veda a opção em caso de crime punido com pena de morte, e Nova Iorque, em caso de homicídio doloso qualificado.

Nos demais países cujo ordenamento jurídico baseia-se na common law, em que o Tribunal de Júri possui forte tradição, as possibilidades de renúncia são recentes, e não são previstos como um direito do acusado, mas como opção da promotoria. Na Irlanda, tal opção é possível a partir do Terrorism Act, de 2000, em caso de acusação de terrorismo.

Já na Inglaterra e no País de Gales, onde a previsão do júri remota à Magna Carta de 1215, e cujos últimos julgamentos se deram sem júri em 1641, pela Star Chamber (tribunal de exceção usado para perseguição política), a Criminal Justice Act introduziu em 2003 duas possibilidades de renúncia: para crimes financeiros (Crown Court) e quando há ameaças a jurados e risco de manipulação (júri tampering), sempre para promotoria.

Em Portugal, por fim, é previsto na Constituição que tanto a acusação quanto a defesa podem requerer um julgamento por um colegiado de juízes em casos de crime de terrorismo e de criminalidade altamente organizada.

Neste sentido, pode-se apontar que o direito alienígena guarda certa coerência quanto à possibilidade de renúncia. Nos países em que o júri é um direito do acusado, é permitido dispor deste direito, ao passo em que nos países onde o Tribunal do Júri simplesmente compõe o Poder Judiciário, não se garante ao acusado tal prerrogativa.

3.2 A renúncia no Brasil

Cabe aqui retomar a discussão acerca da atribuição da qualidade de direito fundamental do Tribunal do Júri no Brasil. Como já exposto em capítulo anterior, Nucci (2010) defende que o Tribunal do Júri somente é uma garantia ao devido processo legal, posto que é o rito do Júri o procedimento adotado pela Constituição Federal para processar acusados de cometimento de crimes dolosos contra a vida; ou mesmo um direito da sociedade, de participar ativamente do Poder Judiciário.

Em sentido oposto, defendemos que a previsão no artigo 5º da Constituição tem por objetivo alçar o Tribunal do Júri como direito fundamental do acusado de ser julgado por um Tribunal Popular, visto que, como aponta Oliveira (2009) e Lopes Júnior (2009), os direitos fundamentais constituem-se em proteções ao indivíduo em face do Poder Estatal.

Posto isso, há quem entenda que, pelo simples fato de constituir um direito do réu, a renúncia a tal direito já é permitida pela Constituição, e somente não se aplica no Brasil atualmente por falha interpretativa. Esse erro ocorre em virtude da ausência de abordagem mais profunda da característica do Tribunal do Júri como direito ou garantia fundamental, tanto pela doutrina como pela jurisprudência.

Forti (2009) propõe que o artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição seja reinterpretado, para possibilitar ao réu optar pelo júri. Também parte do pressuposto de que o Tribunal do Júri pode, dependendo do caso concreto, ser favorável ou prejudicial ao réu. Argumenta que tal interpretação é a que melhor que se pode extrair do caráter de direito fundamental:

Como visto, o texto da legislação infraconstitucional e a jurisprudência minimizam a importância do Tribunal do Júri como garantia. O problema maior, a nosso ver, foi diagnosticado por ROBERTO KANT DE LIMA, que denuncia como, no Brasil, o Júri não é tratado como direito subjetivo, como opção do acusado, mas sim como instituição judiciária obrigatória (isto é, como mera regra de competência). (...) A conseqüência dessa garantia é bastante clara: se o júri é uma instituição reconhecida como garantia individual, o acusado tem o direito de não optar por ele, sob pena de isto constituir uma obrigação ao invés de assegurar um direito. O Tribunal do Júri, portanto, só poderá cumprir seu papel de "garantia fundamental" se ao réu for concedido o direito de optar, na fase inicial do processo (após o que se dará a preclusão da oportunidade de escolha), entre a submissão da denúncia à apreciação de um Juiz togado e o julgamento pelo Júri. As garantias que o atual estágio evolutivo do nosso Direito faz decorrer da atuação independente e fundamentada da Magistratura de carreira só podem ceder espaço ao julgamento não fundamentado realizado por leigos se contar com a concordância expressa do réu. Se assim não for, o Júri não será verdadeiramente uma garantia individual fundamental, mas, como bem notou ROBERTO KANT DE LIMA, uma mera regra de competência jurisdicional. E, pelas mesmas razões, se o réu desejar - e manifestar oportunamente esse seu desejo, sob pena de preclusão - ser julgado pelo Júri, a previsão do foro por prerrogativa de função não pode se impor em detrimento daquilo que a Constituição prevê como garantia do indivíduo. (grifos não constantes no original)

Ao final de seu artigo, Forti (2009) aduz que não há nada na Constituição ou nas leis vigentes que contrariem a conclusão a que chegou, a renúncia é um direito de aplicabilidade imediata, não necessitando de alteração legislativa para o seu exercício.

Neste mesmo sentido é o posicionamento de Ribeiro (1998), em artigo intitulado como “Júri: um direito ou uma imposição?”:

—O acusado de crime doloso contra a vida tem a alternativa de ser julgado por um juiz togado, em vez de jurados? A resposta, pela prática atual, só pode ser não. O júri, na leitura feita pela doutrina e pela jurisprudência atualizadas, é obrigatório e se restringe ao julgamento de crimes dolosos contra a vida. Essa resposta não é fiel ao texto constitucional. Em primeiro lugar, o júri na Constituição Federal, é direito e garantia do indivíduo; não é órgão do Poder Judiciário; está inserido no art. 5º, e não no artigo 92. A propósito, em praticamente todas as Constituições estaduais, o júri foi inserido no título do Poder Judiciário, como órgão deste Poder. Mantiveram na íntegra os textos anteriores à Constituição Federal de 1988, sem perceber a reforma da lei sem alterar seu texto. Não notaram que uma idéia velha passou a exigir espírito novo.(...) Se o júri no Brasil é um direito garantido, se é um direito individual por classificação constitucional, não pode ser impositivo; não pode ser obrigatório. A nova doutrina dos direitos e garantias individuais contempla a renúncia a eles. (...) A Constituição Federal autoriza, como regra geral, o julgamento dos acusados pelo Poder Judiciário. A garantia individual é o direito de opção pelo julgamento popular. (...) A consequência desta garantia é bastante clara: se o júri é uma instituição reconhecida como garantia individual, o acusado tem o direito de não optar por ele, sob pena de isto constituir uma obrigação ao invés de assegurar um direito. (grifos não constantes no original)

Não obstante tomemos como correta toda a fundamentação apresentada, não podemos concordar com a conclusão a que chegaram os articulistas. A possibilidade de renúncia não é tão simples assim, a ponto de uma nova interpretação do texto constitucional possibilitá-la, imediatamente.

Trata-se, a nosso ver, de um esforço interpretativo, visto que as redações atuais dos textos da Constituição e do Código de Processo Penal não permitem a renúncia. O primeiro ponto a ser analisado é a força normativa que possui este último em relação ao Tribunal do Júri.

Dispõe a Carta Magna, em seu artigo 5º, inciso XXXVIII, que é reconhecida a instituição do júri, com a instituição que lhe der a lei, assegurados a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos, e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra vida.

Trata-se, em razão do no trecho “com a instituição que lhe der a lei”, de uma norma constitucional de eficácia limitada, como aponta a doutrina. Patente então é a intenção do constituinte em dotar o legislador infraconstitucional de poderes para regulamentar o Tribunal do Júri.

As normas constitucionais de eficácia limitada possuem aplicabilidade mediata ou indireta, ou seja, é imprescindível para que possam efetivamente entrar em vigor a sua regulamentação por uma norma infraconstitucional. Daí se depreende que o campo de atuação do legislador é amplo, sendo-lhe permitido dispor de toda a estrutura que terá o Tribunal Popular.

Desta forma, o Código de Processo Penal é a lei que complementa a Constituição Federal, responsável pela regulamentação do Tribunal do Júri. Prevê, no Livro II (Processos em Espécie), Título I (Do Processo Comum), Capítulo II (Do Procedimento Relativo Aos Processo de Competência do Tribunal do Júri), do artigo 406 ao 497 as normas de organização da instituição do Tribunal do Júri.

Cumpre ressaltar que, embora as normas de eficácia limitada não possuam força para, por si só, fazer valer seu mandamento, elas produzem um “mínimo de efeito, ou ao menos o efeito de vincular o legislador infraconstitucional aos seus vetores”, conforme explica Lenza (2011). Aduz ainda que:

Nesse sentido José Afonso da Silva, em sede conclusiva, observa que referidas normas têm, ao menos, eficácia jurídica imediata, direta e vinculante já que: a) estabelecem um dever para o legislador ordinário; b) condicionam a legislação futura, com a consequência de serem inconstitucionais as leis ou atos que as ferirem.

É assim que, atendendo ao estabelecido pela Carta Magna, o Código de Processo Penal protege a competência do Tribunal do Júri, como se vê nos artigos 74 e 78, e respectivos parágrafos, como exemplo:

Art. 74. A competência pela natureza da infração será regulada pelas leis de organização judiciária, salvo a competência privativa do Tribunal do Júri.

§ 1º Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes previstos nos arts. 121, §§1º e 2º, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou tentados.

Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas as seguintes regras:

I - no concurso entre a competência do júri e a de outro órgão da jurisdição comum, prevalecerá a competência do júri;

Por tal razão, de plano está descartada a hipótese de renúncia atualmente, por imposição legal do julgamento pelo Conselho Popular. Afinal, a norma vigente é, até que se prove o contrário, compatível com a Constituição Federal. Sendo ainda a norma que regulamenta o procedimento do Tribunal do Júri, é incabível ser desconsiderada, sob a simples alegação de que fere um direito constitucional.

De início, em razão do entendimento predominante na atualidade ser no sentido de obrigatoriedade de julgamento pelo Tribunal do Júri, nos casos de crimes dolosos contra a vida. O Código de Processo Penal, que estrutura tal julgamento, reforça esta competência, prevendo os crimes que alcança e determinando que esta competência prevaleça, quando em detrimento com as demais.

Posta assim a questão, no mínimo uma reforma legal seria necessária para possibilitar a renúncia. Mas não é só. Entendemos que o próprio texto constitucional, na forma em que está redigido atualmente, não permite a renúncia.

3.3 O Tribunal do Júri como cláusula pétrea

3.3.1 A Previsão do Tribunal do Júri como direito fundamental

A bem da verdade, a redação do inciso XXXVIII não foi das mais felizes, já que não cumpriu esclarecer de forma satisfatória o motivo pelo qual a instituição do júri foi prevista dentre os direitos e garantias fundamentais. Não chega a ser absurda a hipótese de somente constar no rol de direitos e garantias fundamentais por tradição, já que Constituições anteriores assim o fizeram.

Do mesmo modo que também não é absurda a hipótese de constar no rol de direitos e garantias fundamentais para torná-lo cláusula pétrea, por força do artigo 60, §4º, IV, da Constituição, e assim tornar impossível a extinção do Tribunal do Júri, enquanto viger a nossa Carta Magna.

Como já exposto, assim ocorreu na Constituição de 1891, pioneira em prever o a instituição do Júri no capítulo destinado à declaração dos direitos dos cidadãos brasileiros, transferência motivada pela defesa do instituto por Rui Barbosa, que queria preservá-lo em nosso ordenamento jurídico, segundo Nucci (2010).

Outra crítica a ser feita em relação à redação do inciso XXXVIII é relacionada à percepção que esta norma provoca, de que o Tribunal do Júri foi previsto como um fim em si mesmo. O texto constitucional dispõe, claramente, que é assegurada à instituição do júri a competência para o julgamento de crimes dolosos contra a vida.

Destarte, este é um dos problemas provocados pela previsão de uma norma de organização judiciária como um direito fundamental. Ao passo que todos os órgãos que compõem a estrutura do Poder Judiciário recebem, como entes abstratos, uma competência, a qual evidentemente será exercida por seus membros, ao Tribunal do Júri mais parece que a sua competência é um direito.

Afinal, o inciso XXXVIII dispõe que a competência lhe é assegurada, como se um direito fosse, e um direito imutável, por ser cláusula pétrea. É o sentido que uma interpretação gramatical aponta, como se ao Tribunal do Júri fosse garantido o direito de existência e de irredutibilidade de competência.

Inobstante a tudo isso, desde os motivos pelos quais o Tribunal Popular foi inserido no artigo 5º, até as incongruências que isso pode causar, o fato é que o Tribunal do Júri atualmente é um direito fundamental, em seu sentido material, e não apenas formal, como defende Nucci (2010). Neste sentido aponta Ricardo Brás[4], ao discorrer acerca da interpretação das normas constitucionais:

Com todo o respeito ao Mestre Ferreira Filho entendo que essa visão, na atualidade, não é a mais adequada, vez que há diferenças entre: (a) mens legislatoris = vontade do legislador; e (b) mens legis= vontade da lei.

Deve-se prestigiar a vontade e o espírito da lei, no nosso caso específico a Constituição, ou seja, a mens legis.

Nesse sentido, esclarece Dirley Cunha Junior[5] que não é finalidade da interpretação jurídica elucidar a vontade do legislador (a mens legislatoris). A interpretação não pode ser reconduzida a uma atividade de reconstrução do pensamento do legislador. O que se interpreta é o texto à luz do caso ao qual ele vai ser aplicado e concretizado; logo, o que se busca na interpretação é construir o sentido do texto da norma em relação à sua realidade (a mens legis), que, ao fim de seu processo de positivação, adquire vida própria e autônoma, separando-se do legislador.

Ou seja, é característica da norma se desvincular da pretensão original do legislador, embora esta não seja ignorada, como se observa nas interpretações histórica e teleológica. Segundo Nascimento (2003), a interpretação teleológica busca identificar a finalidade que o legislador quis dar à norma.

No entanto, esse tipo de interpretação, também conhecido por interpretação sociológica, deve ser observado com restrição. Para Friede (2000), deve ser feita em último lugar, pois existe o risco de o intérprete acabar se confundindo com o legislador, criando normas onde não existem, ou deturpando os seus verdadeiros significados.

De qualquer forma, por todos os motivos que já foram expostos, o Tribunal do Júri é, primordialmente, um direito fundamental do réu. E assim sendo, o texto constitucional se mostra contraditório, pois ao mesmo tempo em que prevê um direito, o torna uma obrigação. Partindo deste pressuposto, resta analisar agora de que forma seria possível a reforma do inciso XXXVIII, sem atentar contra o mandamento do art. 60, artigo 60, § 4º, IV.

Mezzomo (2003) que defende, por sua vez, a supressão total do Tribunal do Júri, aponta uma solução inusitada. Para ele, a Constituição, em razão da qualidade inaugural, autônoma e ilimitada juridicamente do poder constituinte originário, “só pode ser jurídica à luz de um direito natural, e que materializa em um ‘poder de fato’ que a legitima”.

E, pela moderna concepção do Estado Democrático de Direito, herança do liberalismo, o poder fundante da Constituição é o povo, a soberania popular. Tal poder não encontra qualquer limitação, como se pode verificar, inclusive, no parágrafo único do artigo 1º da Constituição: “Todo poder emana do povo”.

Constrói então o pensamento silogístico, baseado no brocardo jurídico cui licet quod est plus, licet utique quod est minus, ou seja, se o povo possui soberania popular para promulgar uma nova Constituição, rompendo completamente a eficácia da anterior, possui então o poder de alterar qualquer dispositivo constitucional. Expõe, in verbis:

Se a soberania popular pode o mais, que é renegar uma ordem constitucional inteira substituindo-a, como se fez na CF/88, pode o menos que é alterar um dispositivo sem que se lhe possa opor o art. 60 § 4º da CF. Um movimento dessa espécie opera espontaneamente no que diz respeito à iniciativa, que prescinde de qualquer previsão legal mesmo porque à Constituição fenece poder para comandar um poder que lhe é antecedente e superior.

E assim, para Mezzomo a vontade popular, poderia ser conferida através de um plebiscito, e caso ficasse comprovado o descontento da maioria com a instituição, seria possível a sua supressão do ou alteração do texto do inciso XXXVIII do art. 5º.

Entretanto, conforme lecionam Mendes, Coelho e Branco (2008), ao discorrerem sobre as limitações materiais impostas ao poder reformador constitucional, a saber, as cláusulas pétreas, explicam que estas se fundamentam na necessidade de preservar a identidade básica da Constituição, mesmo que as reformas sejam necessárias. E aduz:

Esses limites, é claro, não têm força para impedir alterações do texto por meios revolucionários, mas, se, com desrespeito a essas cláusulas pétreas, impõe-se a mudança da Constituição, ao menos se retira do procedimento “a máscara da legalidade”.

Destarte, não há amparo constitucional para a supressão total de algum direito ou garantia fundamental. Ainda que não se discorde da força do poder popular, ou de qualquer outra atividade revolucionária para alterar a Constituição, tal alteração estará rompendo com a atual, e não encontrará nela respaldo.

Pelo contrário, atenta contra o próprio conceito de Constituição como norma fundamental e legitimadora do ordenamento jurídico. Deve a Constituição ter força normativa suficiente para se preservar válida e em conformidade com seu próprio texto enquanto vigente.

A Constituição Federal de 1988 é apontada pelos doutrinadores ora como rígida, ou seja, com procedimento de alteração mais dificultoso em relação ao da legislação de hierarquia inferior, ora como super-rígida, por possuir cláusulas pétreas. Tais cláusulas se justificam como normas que mantém a unidade constitucional, ou um núcleo essencial do projeto do poder constituinte originário.

Não pode, desta forma, legitimar uma alteração substancial em seu corpo, qual seja, a supressão de um direito fundamental, enquanto que prevê expressamente no sentido contrário. Mendes, Coelho e Branco (2008), ao discorrerem sobre as três correntes acerca da validade da cláusula pétrea, defendem a sua imprescindibilidade, afirmando que “eliminar a cláusula pétrea já é enfraquecer os princípios básicos do projeto do constituinte originário garantidos por ela”.

Pelo exposto, entendendo que a retirada do Tribunal do Júri, pelo meio que fosse, acabaria por retirar toda a força normativa da Constituição Federal de 1988, estabelecendo-se assim nova ordem constitucional; e como já defendido anteriormente, os eventuais prejuízos trazidos pelo Tribunal Popular não possuem o condão de clamar por uma nova Constituição, não há como se aceitar a retirada do inciso XXXVIII por plebiscito.

3.3.2 A mutabilidade das cláusulas pétreas

Superada então esta hipótese, é mister destacar que a competência do Tribunal do Júri não é absoluta. Os institutos do desaforamento e do foro especial por prerrogativa de função apontam nesse sentido, conforme já exposto anteriormente. O entendimento doutrinário e jurisprudencial não oferecem qualquer resistência à essa mitigação da competência. Nesse sentido:

A competência do Tribunal do Júri não é absoluta. Afasta-a a própria CF, no que prevê, em face da dignidade de certos cargos e da relevância destes para o Estado, a competência de tribunais – arts. 29,  VIII; 96, III; 108, I,  a; 105,  I,  a; e 102, I,  b e c. (HC 70.581, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 21-9-1993, Segunda Turma, DJ de 29-10-1993.)

O réu, na qualidade de detentor do mandato de parlamentar federal, detém prerrogativa de foro perante o STF, onde deve ser julgado pela imputação da prática de crime doloso contra a vida. A norma contida no art. 5º, XXXVIII, da CF, que garante a instituição do júri, cede diante do disposto no art. 102, I, b, da Lei Maior, definidor da competência do STF, dada a especialidade deste último. Os crimes dolosos contra a vida estão abarcados pelo conceito de crimes comuns. Precedentes da Corte. A renúncia do réu produz plenos efeitos no plano processual, o que implica a declinação da competência do STF para o juízo criminal de primeiro grau. Ausente o abuso de direito que os votos vencidos vislumbraram no ato. Autos encaminhados ao juízo atualmente competente. (AP 333, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 5-12-2007, Plenário, DJE de 11-4-2008.) (grifos não constantes no original)

Assim sendo, também vale lembrar a Súmula 721, segundo a qual a competência constitucional do tribunal do júri prevalece sobre o foro especial previsto em Constituição Estadual.

Nesta esteira é que entendemos que uma emenda constitucional teria força suficiente para permitir a renúncia ao julgamento pelo júri, tendo em vista que não há hierarquia entre as normas constitucionais, e somente a própria Constituição Federal pode prever limitações a si mesma.

Um possível impasse surgiria, entretanto, em razão da existência ou não do caráter de imutabilidade das cláusulas pétreas. Preliminarmente, interessante se faz notar o texto do art. 60, § 4º, IV: “não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: os direitos e garantias individuais”.

É de se considerar que a proibição visa impedir deliberação acerca de emenda que venha tentar abolir algum direito ou garantia fundamental; não se proíbe, como se depreende do texto constitucional, a reforma do texto constitucional, mas tão somente a supressão dos direitos e garantias.

Nesse sentido aponta Lenza (2011), ao defender a possibilidade da redução da maioridade penal, de 18 para 16 anos:

Esse tema foi enfrentado neste estudo no item 19.9.15 e concluímos ser perfeitamente possível a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, já que o texto apenas não admite a proposta de emenda (PEC) que tenda a abolir o direito e garantia individual. Isso não significa, como já interpretou o STF, que a matéria não possa ser modificada. O que não se admite é reforma que tenda a abolir, repita-se, dentro de um parâmetro de razoabilidade.

Reduzindo de 18 para 16 anos o direito à inimputabilidade, visto como garantia fundamental, ele não deixará de existir, e eventual modificação encontrará, inclusive, coerência com a responsabilidade política de poder exercer a capacidade eleitoral ativa (direito de eleger) a partir de 16 anos. (grifos não constantes no original)

É nesta esteira que defendemos que entendemos que uma emenda constitucional seria a solução jurídica hábil a modificar o inciso XXXVIII, de forma a melhor discorrer sobre a matéria, e tornando mais claro o caráter de direito fundamental da norma.

Muito embora o entendimento parte considerável da doutrina seja pela imutabilidade total das cláusulas pétreas, é claro o texto constitucional quando utiliza as palavras “tendentes a abolir”. Defendem os doutrinadores que possibilitar a reforma dos dispositivos constitucionais petrificados seria, de certa forma, abolir parcialmente seu mandamento.

Tal ponto de vista, entretanto, não se coaduna com a finalidade das cláusulas pétreas. É certo que novos direitos e garantias fundamentais podem ser criados, e desta forma, também receberão a proteção do artigo 60, § 4º, IV, da Constituição Federal. Neste sentido, Marmelstein (2008):

Nada impede, portanto, que novos direitos sejam acrescentados ao rol de direitos fundamentais através da emenda à Constituição. Pode-se mencionar, por exemplo, o direito à rápida duração do processo (art. 5º, inc. LXXVIII) e o direito à moradia (art. 6º). Eles não estavam no rol originário na Constituição de 88, tendo sido acrescentados, respectivamente, pela Emenda Constitucional 45/2004 e pela Emenda Constitucional 26/2000. Mesmo assim, uma vez incluídos no texto por emenda constitucional, eles se tornam também cláusulas pétreas. Vale ressaltar que o mesmo raciocínio se aplica aos tratados internacionais de direitos humanos que sejam incorporados ao direito brasileiro com força de emenda constitucional, observando o quorum do art. 5º, §3º, da CF/88. Nesse caso, o tratado internacional de direitos humanos também se tornará cláusula pétrea, não podendo mais ser abolido de forma arbitrária.

Por este prisma deve então ser analisada a possibilidade de modificação dos dispositivos petrificados, quando se almeja ampliar o direito nele contido, ou modificá-lo para melhor atender a sua finalidade, como ora é defendido.

O colendo Supremo Tribunal Federal já se manifestou acerca da mutabilidade das cláusulas pétreas, mormente no que tange aos demais incisos do § 4º do artigo 60. Foi o que ocorreu no julgamento do Mandado de Segurança de nº 23.074-3, do Distrito Federal, cujo relator foi o ínclito ministro Sepúlveda Pertence:

EMENTA: Emenda constitucional: limitações materiais (cláusulas pétreas); controle jurisdicional preventivo (excepcionalidade); a proposta de reforma previdenciária (PEC 33-I), a forma federativa de Estado (CF, art. 60, § 1º) e os direitos adquiridos (CF, art. 60, § 4º, IV, c/c art. 5º, 36): alcance das cláusulas invocadas: razões do indeferimento da liminar. (...)

Duas são as “cláusulas pétreas” que os impetrantes pretendem ameaçadas pela proposta: a que representa a “forma federativa de Estado” (CF, art. 60, § 4º, I) e a que, vedando proposições tendentes a abolir os “direitos e garantias individuais”, protege os direitos adquiridos. (...)

Reitero de logo que a meu ver as limitações materiais ao poder constituinte de reforma, que o art. 60, § 4º, da Lei Fundamental enumera, não significam a intangibilidade literal da respectiva disciplina na Constituição originária, mas apenas a proteção do núcleo essencial dos princípios e institutos cuja preservação nelas se protege. Convém não olvidar que, no ponto, uma interpretação radical e expansiva das normas de intangibilidade da Constituição, antes de assegurar a estabilidade institucional, é a que arrisca legitimar rupturas revolucionárias ou dar pretexto fácil à tentação dos golpes de Estado. Nesta linha, faz pouco, ao votar na ADIn 1.749, pude acentuar:

Na ADIn 98, a propósito do princípio da separação e independência dos poderes, permiti-me algumas digressões para mostrar que tais princípios constitucionais, quando consagrados na Constituição Federal e impostos à observância dos Estados, ou mesmo transformados em cláusula pétrea, não são conceitos abstratos: o conteúdo positivo deles há de ser extraído da versão concreta da separação de poderes ou da Federação acolhida na Constituição mesma.

Isso não significa, a meu ver, que, no dimensionamento de tal cláusula de intangibilidade, se tenham petrificados todos os pormenores constitucionais relativos à Federação, de tal modo que qualquer alteração deles, como na distribuição de renda ou dos encargos a cada um dos entes federativos, significasse violação ao limite material do poder constitucional.

Por isso, na espécie, afigura-se exagerado afirmar, como quer a impetração, que, na PEC 33-I, a redação proposta para o art. 40 CF tenda a abolir a “forma federativa de Estado”. (...) (MS 23047 MC, Relator(a):  Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 11/02/1998, DJ 14-11-2003 PP-00014 EMENT VOL-02132-13 PP-02552). (grifos não constantes no original)

Destarte, o acórdão do Pretório Excelso discorre brilhantemente sobre a não imutabilidade das cláusulas pétreas, informado que o fim almejado do artigo 60, § 4º é a proteção do núcleo essencial dos direitos e garantias fundamentais, e que o “engessamento” constitucional mais funciona como um atrativo às rupturas revolucionárias ou aos golpes de Estado, já que tornam a Carta Magna um texto insensível às mudanças sociais.

Em outra oportunidade, como no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade de nº 2.024-2, também do Distrito Federal, não foi outro o entendimento, senão o de possibilidade de modificação de cláusula pétrea, desde que não tenda a abolir as normas protegidas:

Ação direta de inconstitucionalidade: seu cabimento – sedimentado na jurisprudência do Tribunal – para questionar a compatibilidade de emenda constitucional com os limites formais ou materiais impostos pela Constituição ao poder constituinte derivado: precedentes. Previdência social (CF, art. 40, § 13, cf. EC 20/1998): submissão dos ocupantes exclusivamente de cargos em comissão, assim como os de outro cargo temporário ou de emprego público ao regime geral da previdência social: argüição de inconstitucionalidade do preceito por tendente a abolir a ‘forma federativa do Estado’ (CF, art. 60, § 4º, I): improcedência. A ‘forma federativa de Estado’ – elevado a princípio intangível por todas as Constituições da República – não pode ser conceituada a partir de um modelo ideal e apriorístico de Federação, mas, sim, daquele que o constituinte originário concretamente adotou e, como o adotou, erigiu em limite material imposto às futuras emendas à Constituição; de resto as limitações materiais ao poder constituinte de reforma, que o art. 60, § 4º, da Lei Fundamental enumera, não significam a intangibilidade literal da respectiva disciplina na Constituição originária, mas apenas a proteção do núcleo essencial dos princípios e institutos cuja preservação nelas se protege. À vista do modelo ainda acentuadamente centralizado do federalismo adotado pela versão originária da Constituição de 1988, o preceito questionado da EC 20/1998 nem tende a aboli-lo, nem sequer a afetá-lo. (...)

A matéria da disposição discutida é previdenciária e, por sua natureza, comporta norma geral de âmbito nacional de validade, que à União se facultava editar, sem prejuízo da legislação estadual suplementar ou plena, na falta de lei federal (CF 88, arts. 24, XII, e 40, § 2º): se já o podia ter feito a lei federal, com base nos preceitos recordados do texto constitucional originário, obviamente não afeta ou, menos ainda, tende a abolir a autonomia dos Estados-membros que assim agora tenha prescrito diretamente a norma constitucional sobrevinda. (ADI 2.024, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 3-5-2007, Plenário, DJ de 22-6-2007.)

Sendo assim, constatado não haver óbice, pela visão do Supremo Tribunal Federal, órgão incumbido da defesa constitucional, à modificação de cláusulas pétreas, também não deve haver óbice à modificação do inciso XXXVIII.

Vale ratificar que tal supressão encontra ampara tanto na jurisprudência quanto na doutrina, embora não seja unânime nesta última. Mais uma vez, é interessante destacar o posicionamento de Marmelstein (2008), que brilhantemente discorreu sobre a mutabilidade das cláusulas pétreas, corroborando com a tese de que as necessárias mudanças coíbem, inclusive, as drásticas rupturas com a ordem constitucional vigente:

Na verdade, é preciso reconhecer que a Constituição de 1988 pode sim ser melhorada, inclusive naquilo que foi considerado como cláusula pétrea. No entanto, aparentemente, já existem mecanismos capazes de possibilitar esse aperfeiçoamento do texto constitucional, antes de se partir para soluções mais drásticas de ruptura institucional. A reforma constitucional, através de emendas à Constituição, e a própria mutação constitucional, através da interpretação evolutiva do texto, são exemplos disso.

Conforme já se disse, a emenda constitucional pode modificar até mesmo as normas da Constituição que sejam consideradas como cláusulas pétreas, desde que fique demonstrado que a mudança não trará prejuízos para o regime geral de proteção à dignidade da pessoa humana, à limitação do poder ou aos princípios elementares da democracia. Ou seja, o que não se pode aceitar é uma mudança constitucional que destrua os valores básicos consagrados pelo constituinte originário. No mais, se houver uma demonstração concreta de que a mudança favorecerá o desenvolvimento humano, expandindo a liberdade, a igualdade, a solidariedade e a democracia, certamente ela será bem-vinda.

Desta forma, superada a impossibilidade de alteração no inciso XXXVIII, apresentamos uma proposta simplista de texto constitucional que poderia pacificar a questão:

XXXVIII - é assegurado ao réu o julgamento por um conselho de sentença popular, nas hipóteses de incidência e conforme a organização que lhe der a lei.

Parágrafo Único: a lei assegurará, na organização do Tribunal do Júri:

a) a plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;

c) a soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;

O texto proposto tem como objetivo primordial destacar o caráter de direito fundamental do réu, ou seja, o direito de ser julgado por um conselho popular. No mais, mantém as características do Tribunal do Júri, e a competência mínima deste para julgamento de crimes dolosos contra a vida.

Por conseguinte, incumbirá à legislação ordinária regulamentar a hipótese de renúncia, ou como já exposto, o não exercício do direito assegurado pelo inciso XXXVIII. Evidentemente, tal reforma deverá ser precedida de estudo minucioso, a fim de evitar possíveis nulidades advindas de tal faculdade.

Como exemplo, deverá ser regulado o momento em que o patrono do réu deverá optar pelo juízo da causa, a preclusão para tal opção, e até mesmo a possibilidade modificação na opção em caso de condenação pelo Tribunal Popular, provimento de apelo fundamentado em decisão contrário às provas dos autos, e a designação de novo julgamento.


CONCLUSÃO

Os estudos realizados para a realização do presente trabalho fundamentaram-se em uma profunda admiração pelo Tribunal do Júri. Por este motivo, buscou-se demonstrar, em um primeiro momento, muitos dos aspectos positivos do Tribunal Popular, e todos os motivos pelo qual se defende a manutenção deste histórico instituto.

Além do mais, é importante ressaltar que a utilização do Tribunal do Júri esteve na história intimamente ligada ao respeito aos direitos fundamentais pelo Estado, e sempre que houve a extinção nos países em que o adotam, foi em regimes totalitaristas e ditaduras, um momento de regressão social.

Por outro lado, mesmo defendendo a existência do Tribunal Popular, não se pode deixar de lado que este é injusto em muitos casos, e se mostra um empecilho a um julgamento justo. Em sintonia com isto, não é prudente ou razoável a defesa intransigente ou o ataque irracional do Tribunal do Júri: é um instituto com seus méritos e deméritos.

Nesta esteira, defendê-lo sem atentar para seus defeitos é militar por sua defasagem, a qual pode evoluir até um ponto que se torne insustentável. Como a sociedade está em constante mutação, assim também deve estar o direito. Por outro lado, advogar pela sua extinção é entrar numa batalha perdida, visto que o Tribunal do Júri é previsto como cláusula pétrea em nossa Constituição, por isso, não pode ser abolido.

Sendo assim, é mister que se busque mecanismos que auxiliem a evolução do Tribunal Popular, para que este se mantenha prestando bons serviços à justiça. A renúncia ao julgamento pelo Conselho de Sentença vem, neste sentido, aprimorá-lo e sintonizá-lo com a Constituição Federal, tornando mais evidente o seu caráter de direito fundamental.

É assim que, adentrando nas minúcias do Tribunal do Júri, percebemos em um primeiro instante que sua competência não é absoluta. O foro especial por prerrogativa de função, também previsto na Lei Maior, mitiga a competência do Tribunal do Júri. Não obstante, o foro especial previsto em Constituição Estadual não possui essa força, do que se depreende que somente a própria Constituição Federal pode suprimir a competência do Tribunal Popular.

Outrossim, a busca pela justiça é o objetivo maior do direito, e nesse sentido aponta o direito brasileiro. Tanto que, havendo risco de parcialidade do Conselho de Sentença, o Código de Processo Penal prevê o desaforamento. No entanto, há casos em que, por suas peculiaridades, o desaforamento não representa qualquer compensação. Logo, a busca por mecanismos mais eficientes deve prosseguir.

Considerando-se o caráter de direito fundamental do Tribunal do Júri, e a situação de desigualdade que o réu se encontra em face do Poder Estatal, deve ser privilegiada a sua defesa. Até mesmo em homenagem à sua plenitude de defesa, deve lhe ser dado a oportunidade de não utilização de seu direito fundamental, mormente quando esse direito se mostra um obstáculo intrasponível.

Por via de consequência, é preciso que a Carta Magna seja reformada, através de uma emenda constitucional, para tornar mais claro o caráter de direito fundamental da norma. Afinal, embora possa parecer que este está evidente, não encontra respaldo em parte considerável da doutrina e da jurisprudência ou, pelo menos, não possui qualquer efeito prático em benefício do réu.

Por conseguinte, verificou-se que não há óbice para a reforma de direitos e garantias fundamentais, já que a vedação contida no artigo 60, §4º, IV, da Constituição apenas proíbe a deliberação de propostas que tendam a aboli-los, e não reformá-los, principalmente quando a reforma visa aprimorar o mandamento contido nas normas.

Destarte, uma reforma constitucional seria suficiente para despertar a atenção de toda a comunidade jurídica para este aspecto esquecido, e originaria um debate que, inevitavelmente, resultaria numa reforma legal para possibilitar a renúncia, à escolha do réu, conforme orientação de seu advogado.


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Notas

[1] FERNANDES, Antônio Scarance. Processo penal constitucional. 5ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

[2] MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários, aos arts. 1º ao 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.

[3] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

[4] BRÁS, Sebastião Ricardo Braga. Teoria geral do direito constitucional – Hermenêutica e interpretação constitucional. Mensagem recebida por [email protected], em 03 nov. 2011.

[5] CUNHA JÚNIOR, Dirley. Curso de Direito Constitucional. Bahia: JusPODIVM, 2009, p. 197.



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIEIRA, Paulo Victor de Oliveira. A possibilidade de renúncia ao julgamento pelo tribunal do júri no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3612, 22 maio 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24474. Acesso em: 10 maio 2024.