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Direitos e garantias fundamentais - já podemos falar em quarta e quinta dimensões?

Direitos e garantias fundamentais - já podemos falar em quarta e quinta dimensões?

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O presente artigo busca analisar sucintamente as gerações ou dimensões dos direitos e garantias fundamentais, percebendo sua evolução histórica e a repercussão da ampliação desses direitos na ciência jurídica constitucional, observando, por fim, a tendência contemporânea de já se falar nos chamados direitos de quarta e quinta dimensões.

 

1. INTRODUÇÃO

Não é de hoje que a garantia dos direitos fundamentais vem ganhando destaque na sociedade. O nascimento do Estado surge exatamente com a ideia de limitar o poder centralizado e garantir a soberania do povo que, em última instância, efetiva-se pelos seus direitos individuais, sociais e políticos. Se antes de existir o Estado tínhamos uma sociedade com ausência de governo central, com o surgimento dele tivemos uma forte idéia de concentração de poder. Passamos, então, de um extremo (ausência de governo) para o outro (centralização de poder), dando origem aos chamados regimes absolutistas, onde o governante tinha controle absoluto em todos os níveis de governo (“o Estado sou eu”). Muito tempo se passou até surgirem as democracias, constituindo-se em regimes políticos onde a origem do poder e o controle do seu exercício se encontra no povo.

É nesse contexto em que se inserem os direitos e garantias fundamentais, decorrentes justamente da luta do povo para conter o poder estatal. Ou seja, a história e evolução constitucional associa-se diretamente ao avanço dos direitos e garantias fundamentais. O núcleo central dos textos constitucionais é a existência de regras de limitação ao poder autoritário e de prevalência dos direitos fundamentais, como forma de distanciar-se da concepção autoritária de Estado presente no regime antigo. Estudar os direitos fundamentais é, de um modo geral, analisar a evolução das garantias que, ao longo dos tempos, foram conquistadas e asseguradas ao homem, do ponto de vista individual e coletivo, de forma a evitar os abusos da minoria que detinha o poder em dada época histórica.


2. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA

Em princípio, vale destacar que direitos e garantias não são sinônimos. Direitos são normas de conteúdo declaratório (por exemplo, direito à honra, locomoção), enquanto as garantias são normas de conteúdo assecuratório, preservando o direito declarado (por exemplo, indenização por dano à honra, habeas corpus para garantir a locomoção). Portanto, enquanto o direito se presta a declarar, a garantia, por sua vez, busca preservar. A Constuição Federal, quando se refere aos direitos e garantias fundamentais, traz um gênero que se subdivide em algumas espécies, conforme o Título II da Carta Magna. Da forma como nele exposto, os direitos e garantias fundamentais são classificados em: (a) Direitos Individuais e Coletivos: estão presentes em extensa lista no rol do art. 5º, ressaltando-se que o STF já firmou entendimento de que os direitos e garantias individuais podem ser encontrados em outros dispositivos constitucionais espalhados na CF/88; (b) Direitos Sociais: estão previstos entre os artigos 6º a 11 da CF/88; (c) Direitos de Nacionalidade: previstos no art. 12 e 13 da CF/88; (d) Direitos Políticos: previstos na forma dos arts. 14 a 17 da CF/88.

No que se refere aos titulares dos direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal, o caput do art. 5° da CF/88 menciona: "garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País...". Ou seja, todos os brasileiros, natos e naturalizados, bem como os estrangeiros residentes no país, estão expressamente assegurados pela Constituição Federal. E ainda, segundo o STF, pelo princípio da universalidade, todos os que estão no território brasileiro, ainda que temporariamente e sem residência, sejam estrangeiros ou até apátridas, serão titulares de direitos fundamentais trazidos ao logo da Constituição Federal. De outro modo, não apenas as pessoas físicas, mas também as pessoas jurídicas são titulares de direitos fundamentais. Obviamente, as pessoas jurídicas são titulares apenas de alguns dos direitos, e não de todos, porque existem aqueles que são são incompatíveis com a sua própria natureza de pessoa jurídica. Mas, de maneira genérica, pode-se dizer que as pessoas jurídicas são igualmente admitidas como titulares de direitos fundamentais. Aliás, existem alguns direitos que até mesmo são específicos da pessoa jurídica, como a proteção ao nome empresarial, nos termos do inciso XXIX do art. 5° da CF/88.

Vale ressaltar que o §1° do art. 5° da CF/88, estabelece aplicabilidade imediata aos direitos e garantias fundamentais, assim dispondo: "As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata". Dizer que uma norma tem aplicabilidade imediata significa afirmar que elas não dependem de regulamentação para ganharem eficácia, ou seja, podem ser aplicadas imediatamente. Isso nem sempre ocorre de forma plena. Nesse sentido, vale lembrar a classificação que concebe as normas constitucionais com eficácia plena, contida e limitada. Normas constitucionais de eficácia plena são aquelas que produzem todos os seus efeitos sem que seja necessário qualquer medida ou complemento por lei, isto é, sozinho o dispositivo já é capaz de produzir todos os efeitos para os quais foi idealizado. Já as normas constitucionais de eficácia contida são aquelas que também produzem todos os seus efeitos desde logo, porém, lei infraconstitucional pode reduzí-los. São as chamadas normas de eficácia restringível ou redutível. Os seus efeitos não estão limitados inicialmente, a norma já está hábil a produzí-los, apenas posteriormente pode-se conter um pouco dessa eficácia por meio de lei. Quanto a estas duas, vale dizer, normas de eficácia plena e normas de eficácia contida, não há polêmica, possuem aplicabilidade imediata, podendo produzir todos os seus efeitos desde logo. A questão torna-se mais delicada quanto às normas constituiconais de eficácia limitada.

De fato, existem normas constitucionais que não estão aptas a produzir todos os efeitos, porque falta-lhes complemento que garanta a sua eficácia. Chamamos estas de normas constitucionais de eficácia limitada. Nesse caso, a norma constitucional nasce com dependência de uma outra, havendo um limite inicial que precisa ser superado para que os seus efeitos possam ser produzidos plenamente. Se na eficácia contida a lei futura reduz os efeitos da norma constitucional, na eficácia limitada, ao contrário, a lei futura amplia os seus efeitos. Por outro lado, se na eficácia contida a norma constitucional nasce com eficácia plena, mas uma lei futura contém em parte os seus efeitos, na eficácia limitada, ao contrário, a norma constitucional nasce com eficácia limitada, mas a lei futura a torna com eficácia plena. Contudo, nenhuma norma nasce completamente limitada, sem força, sem produzir efeitos, ainda que mínimos. A norma constitucional de eficácia limitada produz poucos efeitos, porque depende de lei, mas embora poucos, existem efeitos produzidos, o que significa que possui aplicabilidade imediata. Isso se percebe, inclusive, pela possibilidade de manejo de mandado de injunção (art. 5º, LXXI, CF/88) e ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, §2º), possibilitando ao judiciário, nesses casos de inércia do legislativo, atuar como legislador negativo, assegurando os direitos e garantias fundamentas.

Vale ressaltar que a doutrina moderna estabelece como norma constitucional de eficácia limitada não apenas aquela em que a Constituição estabelece expressamente a necessidade de lei futura que lhe regulamente, mas também as normas que permanecem com pequena produção de efeitos por deficiência do Estado. Nesse sentido, classificam-se as espécies de normas constitucionais de eficácia limitada em: (a) normas de princípio institutivo; (b) normas de princípio programático. As primeiras são aquelas que precisam de lei futura, tratando-se de normas de eficácia limitada por expressa previsão constitucional da necessidade de lei que venha lhe regulamentar. Contudo, existem também as normas de princípio programático, que igualmente possuem eficácia limitada. São aquelas que estabelecem diretrizes ou programas a serem implementados pelos Poderes Públicos, fixando um plano de atuação para o Estado. Exemplos seriam o salário mínimo condizente com todos os direitos que assegura no art. 7º, IV, da CF/88, ou ainda, o direito à saúde que confira todo o suporte que estabelece o art. 196 da CF/88, dentre outros. Essas normas programáticas produzem poucos efeitos (eficácia limitada) porque precisam de uma evolução do Estado. Nesse caso, não há eficácia plena porque falta lei regulamentadora, mas por causa da lenta evolução do Estado, de modo que que os seus efeitos não são plenos.

De toda sorte, sejam normas de princípio programático ou institutivo, em ambos os casos, apesar da eficácia limitada, quaisquer normas produzem efeitos, mesmo poucos, mas o sufiente para gerar direitos subjetivos, o que assegura-lhes a aplicabilidade imediata. Segundo o STF, as normas programáticas são capazes de gerar direitos subjetivos porque o Estado tem o dever de realizar um mínimo existencial. Quer dizer, essas normas programáticas não são poesias colocadas na Constituição, mas elas produzem efeitos. Não há mais normas programáticas no sentido de estabelecer conselhos, avisos ou lições morais sem caráter vinculante, até mesmo pela atual percepção material dos direitos e garantias fundamentais e o reconhecimento da supremacia material da Constituição. Daí resulta o ativismo do judiciário, na chamada “judicialização das relações políticas e sociais”. O STF já fixou entendimento no sentido da possibilidade de se recorrer diretamente ao judiciário para exigir uma prestação fundada num direito social, porque o Estado não pode demitir-se do gravíssimo encargo de tornar efetivos os direitos fundamentais. É função institucional do Poder Judiciário determinar a implantação de políticas públicas quando os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos político-jurídicos que sobre eles incidem, vierem a comprometer a eficácia e a integridade de direitos individuais e/ou coletivos de estatura constitucional, ainda que derivados de cláusulas revestidas de conteúdo programático. Por isso é que, apesar da natureza de norma de eficácia limitada, há produção de efeitos. Logo, não há dúvidas de que todos os direitos e garantias fundamentais, no modelo do sistema constitucional brasileiro, possuem aplicabilidade imediata.

Por outro lado, quando os direitos fundamentais surgiram, ainda na fase da primeira e segunda dimensões, os únicos destinatários do dever de sua observância, inicialmente, eram os Poderes Públicos. Como a relação entre particulares e Poder Público é de subordinação, e não de coordenação, esta eficácia dos direitos fundamentais ficou conhecida como eficácia vertical ou pública, em razão dessa relação Estado-particular ser vertical, de subordinação. Esta é a eficácia clássica dos direitos fundamentais. Com o passar do tempo, contudo, foi se constatando que a opressão e a violência vinham não só do Estado, mas de outros particulares. Foi exatamente aí que surgiram os direitos fundamentais de terceira geração, relacionados à fraternidade. Começou a haver, então, uma mudança nessa eficácia dos direitos fundamentais. A idéia de que não só o Estado é órgão opressor dos indivíduos, mas também outros particulares, fez com que surgisse a teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, hoje absolutamente consagrada no constitucionalismo contemporâneo.

Portanto, as normas consagradoras de direitos e garantias fundamentais devem ser obrigatoriamente observadas não somente pelo Estado em relação ao indivíduo (eficácia vertical), mas também pelas pessoas privadas quando estabelecem relações jurídicas com outros sujeitos jurídicos privados (eficácia horizontal). E isso, obviamente, aplica-se a todas as dimensões de direitos fundamentais, seja primeira, segunda ou terceira gerações. Quer dizer, apenas no seu nascedouro, os direitos às liberdades públicas e os direitos sociais eram direcionados exclusivamente ao Estado, mas depois passaram a ser vistos como obrigação de observância, também, dos demais particulares, juntamente com os direitos de terceira dimensão. É claro que um particular não tem, por exemplo, o dever de fornecer moradia básica a outro indivíduo (direito social), mas tem o dever de respeitá-la, seja não invadindo a propriedade alheia (direito individual), seja conferindo função social à sua própria propriedade (direito coletivo). Quer dizer, o estatuto dos direitos fundamentais, enquanto complexo de poderes, direitos e garantias guardadas na Constituição, não se restringe à esfera das relações verticais entre o Estado e o indivíduo, mas também incide sobre o domínio em que se processam as relações de caráter meramente privado.

Assim, os particulares, enquanto terceiros, ficam adstritos a uma atitude negativa de respeito pelos direitos constituídos dos demais cidadãos, por força da atribuição de uma eficácia externa dos direitos fundamentais, limitando a autonomia privada e a respectiva liberdade negocial. Obviamente, não se pode perder de vista as especificidades desta incidência, já que é cediço que o indivíduo é dotado de um poder de autodeterminação da sua vontade. Logo, a eficácia horizontal dos direitos fundamentais tem que ser vista com cautela, em razão do princípio da autonomia da vontade. Isso significa que a eficácia dos direitos fundamentais não pode ser percebida da mesma forma no plano vertical e no plano horizontal, é necessário reserva nesse último. Contudo, o fato é que a liberdade individual não pode ser exercida como instrumento a permitir que particulares adotem regras descompassadas em relação aos direitos e garantias fundamentais, em flagrante descumprimento dos princípios constitucionais básicos, pois o conceito constitucional de liberdade não supõe e nem admite a sua indiscriminada utilização, sem guardar harmonia com os demais direitos fundamentais.


3. GERAÇÕES OU DIMENSÕES DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

As gerações (ou dimensões) dos direitos fundamentais foram criadas em 1979 pelo polonês Karel Vazak e difundida pelo italiano Norberto Bobbio. No Brasil, Paulo Bonavides deu publicidade a esta classificação. A teoria das gerações dos direitos está associada ao surgimento e evolução dos direitos fundamentais, os quais foram surgindo gradativamente, a partir de fatos históricos relacionados à evolução da teoria constitucional (as dimensões dos direitos fundamentais estão diretamente associadas às fases do constitucionalismo). Só que uma geração não substitui a geração anterior. O fato de terem surgido direitos de segunda geração não significa que a primeira geração acabou. E assim sucessivamente. Daí porque a doutrina moderna vem preferindo falar em “dimensões” dos direitos fundamentais, todas coexistentes, ao invés de falar em “gerações”, porque este último termo traz a idéia de algo anterior que ficou superado. Contudo, todos os direitos e garantias fundamentais coexistem, foram ampliados. Na verdade, a classificação doutrinária diz respeito, pois, à dimensão desses direitos, ao plano de incidência deles, ao objeto de proteção. E assim temos a clássica divisão doutrinária dos direitos e garantias fundamentais: (a) primeira dimensão: direitos individuais; (b) segunda dimensão: direitos sociais; (c) terceira dimensão: direitos difusos ou metaindividuais.

O que importa é perceber que todos estes são direitos fundamentais que os indivíduos conquistaram ao longo dos anos. Sabemos que o constitucionalismo nada mais é do que a luta do povo para a garantia dos seus direitos através da limitação do poder do Estado. Se esses direitos foram consagrados é porque houve, de certa forma, uma luta social e conquista histórica. Daí porque, quando falamos no atual princípio da vedação ao retrocesso, referimo-nos também ao fato de que os direitos conquistados por uma sociedade não podem ser objeto de retrocesso, pois não foram dados pelo Estado, mas conquistados através de lutas e fatos históricos. É nesse sentido que se insere o princípio da vedação ao retrocesso, pleo qual o Estado não pode mais retirar um direito que foi assegurado aos indivíduos. A evolução dos direitos e garantias fundamentais está diretamente ligada à história do constitucionalismo e, sobretudo, ao lema da Revolução Francesa: “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”. Quer dizer, a Revolução Francesa é anterior ao surgimento dessas dimensões de direitos, foi ela que deu início à ampliação dos direitos fundamentais e profetizou no seu famoso lema, não só o conteúdo, mas a própria sequencia histórica deses direitos e garantias: “Liberdade” está associada aos direitos individuais; “Igualdade” diz respeito aos direitos sociais; e “Fraternidade” relaciona-se aos direitos difusos. Vejamos:

3.1. Direitos e Garantias Fundamentais de Primeira Dimensão:

São aqueles que historicamente foram reconhecidos em primeiro lugar. O fator histórico que deu origem à primeira dimensão dos direitos fundamentais foram as chamadas revoluções liberais, ocorridas no final do Século XVIII. Revoluções liberais porque o principal valor que se buscava era a liberdade. O contexto histórico era o absolutismo, daí porque os direitos individuais, também chamados de liberdades públicas, tornaram-se o núcleo das revoluções liberais. Assim, a burguesia se uniu ao Terceiro Estado (povo) e iniciaram a Revolução Francesa para limitar o poder do Estado, garantindo que as liberdades fossem respeitadas e protegidas. E o mesmo aconteceu nos Estados Unidos com a Revolução Liberal norte-americana. Desse modo, os direitos de primeira dimensão são os direitos civis e políticos, as liberdades públicas e, portanto, essencialmente são direitos individuais.

Nos direitos de primeira dimensão, o Estado tem o dever principal de não fazer, de não agir, de permitir as liberdades individuais. São exemplos de direitos de primeira dimensão: vida, liberdade, propriedade, etc. Nesses casos, o dever do Estado é não fazer, por isso os direitos individuais também são chamados de direitos de defesa (direitos negativos), a atitude do Estado é negativa. Tais direitos impõem uma abstenção estatal para a garantia da liberdade individual. Daí porque as primeiras constituições escritas eram chamadas de constituições negativas ou abstencionistas. Isso porque, na verdade, o único destinatário desses direitos, durante o período em que surgiram, era o próprio Estado. Obviamente, como dito, a teoria dos direitos fundamentais evoluiu para contemplar as relação não apenas entre indivíduo e Estado (eficácia vertical), mas também a aplicação dos direitos fundamentais nas relações entre os próprios indivíduos (eficácia horizontal). Contudo, no nascimento dos direitos de primeira dimensão, o Estado era o único destinatário dos deveres de se abster, justamente para respeitar os direitos civis e políticos garantidos ao indivíduo. O contexto social da época era a luta do povo contra o absolutismo, a centralização do poder. Era natural, portanto, que o clamor inicial voltasse para a garantia das liberdades públicas.

Os direitos de primeira dimensão não eram, então, oponíveis a outro indivíduo, mas apenas ao Estado. Por isso é que, antes de ser um direito direcionado ao particular, tais direitos surgem muito mais como um dever de tolerância do Estado. A rigor, embora se tratassem de liberdades individuais (direitos civis e políticos), o real destinatário das normas que previam os direitos de primeira dimensão era o Estado. Temos, então, o Estado mínimo, que se abstém, não interfere, abre espaço à liberdade individual. O ideário nessa época refere-se ao pensamento iluminista de liberdade. Logo, os direitos de primeira dimensão tem esse enfoque: por um lado, representam uma conquista de liberdades individuais; por outro lado, exigem uma conduta estatal negativa (constituições negativas, abstencionismo). De toda sorte, embora historicamente surgidos em primeiro, as liberdades públicas continuam a surgir ainda hoje, mais uma prova de que o termo dimensão é mais apropriado. As dimensões dos direitos não estão paradas no tempo, apenas marcam a sua evolução. Hoje, fala-se, por exemplo, no direito de morrer com dignidade, ou ainda, no direito ao esquecimento de fatos degradatórios à imagem, dentre outros direitos atualíssimos que continuam a surgir no tempo, mesmo se classificando como direitos e garantias fundamentais de primeira dimensão.

3.2. Direitos e Garantias Fundamentais de Segunda Dimensão:

Se a primeira dimensão refere-se aos direitos individuais (liberdades públicas), a segunda dimensão dos direitos fundamentais refere-se aos direitos socieis, estando ligada aos valores de igualdade. Vale ressaltar que essa igualdade, agora, não é a igualdade formal, porque essa já havia sido consagrada antes com as revoluções liberais (tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual). A igualdade que se fala nos direitos de segunda dimensão é a igualdade material, isto é, aquela igualdade referente à atuação do Estado para reduzir desigualdades existentes, aplicando sua atuação na garanta dos direitos sociais, econômicos e culturais. Não se tem verdadeira liberdade se não há direitos essenciais básicos, como saúde, educação, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança, etc. Todos esses são exemplos de direitos de segunda dimensão. Aqui, sim, trata-se de igualdade material, associada aos direitos sociais, garantindo efetivamente condições mínimas a todo e qualquer indivíduo de forma isonômica, e não somente deixar ao crivo das liberdades individuais. Dessa forma, temos na primeira dimensão os direitos civis e políticos e na segunda dimensão os direitos sociais, econômicos e culturais. São os chamados direitos prestacionais, que exigem uma ação estatal em favor do indivíduo.

O fator histórico que deu origem ao surgimento desses direitos geralmente está relacionado à Revolução Industrial, fruto da luta do proletariado por direitos sociais, no século XIX. Além disso, tivemos também o final da I Guerra Mundial, momento em que a sociedade começou a perceber que só liberdade não adiantava. Sentiu-se um certo esgotamento da idéia liberal, que protegia apenas os direitos liberais, mas não os sociais. Contudo, de nada valeria ter a liberdade sem existir a igualdade substancial. A mantença do Estado Liberal estava levando a desigualdades sociais gritantes, sendo urgente uma intervenção estatal. Era preciso, pois, equilibrar materialmente, colocar os indivíduos em pé de igualdade através da garantia de direitos mínimos sociais. Assim, aquela atuação estatal limitada e a interferência mínima na esfera privada acabou sendo abrandada pela necessidade do Estado regular, também, os direitos sociais. A liberdade, então, depende necessariamente de direitos mínimos associados à igualdade material. E se esta não estava sendo atingida pelo Estado liberal (Estado abstencionista), caberia ao Estado social agir (Estado prestacional).

Na primeira dimensão dos direitos fundamentais temos os chamados direitos de defesa, garantia das liberdades, que exigem atitudes negativas do Estado, sendo marcados pela  abstenção estatal (Estado mínimo). Agora, a segunda dimensão traz direitos prestacionais, exigindo atitudes positivas do Estado. (Estado social). A grande marca desse novo período, entao, é que a atuação estatal limitada e a interferência mínima na esfera privada cedeu espaço para a necessidade da garantia dos direitos sociais. Nesse contexto de transformação do Estado de Direito (do liberal para o social), com o passar do tempo os direitos amparados nas Constituições foram ampliados para além dos direitos e liberdades individuais. Temos conquistados, assim, os direitos de segunda dimensão.

3.2. Direitos e Garantias Fundamentais de Terceira Dimensão:

Apesar das grandes conquistas percebidas com os direitos fundamentais de primeira e segunda dimensão, estes ainda não eram suficientes. Em decorrência dos eventos maléficos advindos da doutrina nazista, evento propulsor da lavagem de sangue ocorrida na II Guerra Mundial, o mundo percebeu que era preciso a garantia de direitos não apenas individuais (liberdade) e sociais (igualdade), mas também direitos difusos (fraternidade), como o direito à paz, meio ambiente, cultura, patrimônio histórico, dentre tantos outros. O rol é exemplificativo (numerus clausus).

De fato, a sociedade precisava melhor se estruturar, surgindo os direitos fundamentais de terceira dimensão, ligados à solidariedade entre as nações, que escapam do plano individual e pertencem à toda coletividade (metaindividuais). É exatamente a partir dessa fase que se consagra a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, pelo reconhecimento de que a opressão e a violência poderiam vir não só do Estado, mas também de outros particulares, daí decorre o dever de observância dos direitos fundamentais também na esfera das relações privadas, com aplicação para todas as dimensões.

Assim, temos a evolução: os direitos de primeira dimensão se referem às liberdades do indivíduo; já os direitos de segunda dimensão são aqueles referentes à garantia das condições mínimas sociais que o Estado deve garantir ao indivíduo; por sua vez, os direitos de terceira dimensão são aqueles direitos metaindividuais, que escapam do plano individual e pertenem a uma coletividade indeterminada de pessoas (direitos difusos). Enquanto os direitos sociais são voltados para o indivíduo, visando garantir a este a igualdade material, os direitos metaindividuais escapam da visão do indivíduo, são prestações voltadas a um número indefinido de passoas, grupos determinados ou a própria coletividade de um modo geral.


4. QUARTA E QUINTA DIMENSÕES DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

Até aqui mencionamos as três principais gerações ou dimensões dos direitos fundamentais. Há de se ressaltar, contudo, que alguns autores defendem, ainda, uma quarta dimensão dos direitos e garantias fundamentais e, mais além, há aqueles que chegam até a falar já em quinta dimensão dos direitos e garantias fundamentais. Na verdade, não há consenso doutrinário, prevalece as três dimensões principais, mas importa destacar o que alguns doutrinadores vem chamando de direitos de quarta e de quinta dimensão.

No que se refere especificamente aos chamados direitos fundamentais de quarta dimensão, existe discussão acadêmica acerca do que viriam a ser. Quer dizer, além do debate quanto à existência ou não de uma quarta dimensão dos direitos, nem existem consenso dentre aqueles que a defendem. Uma primeira corrente doutrinária defende que os direitos de quarta dimensão seriam aqueles decorrentes da evolução da ciência, como a clonagem, manipulação genética, transgênicos. Mas esta tese vem perdendo força ultimamente. A corrente doutrinária que vem ganhando destaque afirma que os direitos de quarta dimensão estariam ligados à democracia e ao pluralismo, que remonta aos direitos das minorias no aspecto político.

É que a democracia, atualmente, não é vista apenas em seu aspecto formal (voto, plebiscito, eleições, cidadania), em seu sentido estrito, que está diretamente ligada à premissa majoritária (vontade da maioria por meio dos representantes eleitos). Hoje, a democracia também é percebida, sobretudo, no seu aspecto substancial, que abrange, além da vontade da maioria, também a proteção de direitos fundamentais, inclusive das minorias. Ou seja, as minorias também devem ter acesso aos direitos básicos, caso contrário, não haverá uma vontade verdadeiramente livre, isto é, haverá democracia formal, mas não material. É o caso, por exemplo, da prática de compra de votos nas eleições, com candidatos se aproveitando da situação de miserabilidade de certos eleitores.

A vontade das maiorias é expressa através das leis, por seus representantes eleitos, mas a vontade das minorias também precisa ser espeitada, através da garantia mínima das condições para o exercício livre da democracia, caso contrário esta será exercida de forma viciada. É exatamente a partir daí que ganha enfoque o ativismo do judiciário no exercício da jurisdição constitucional que se trata de característica marcante no neoconstitucionalismo. Ao Judiciário são ampliados os poderes para a guarda constitucional e garantia dos direitos da minoria, exercendo o papel contra-majoritário, porquanto não tem vinculação à vontade da maioria, não é eleito pelo povo, como o Legislativo e Executivo o são, formados pela vontade da maioria através dos representantes eleitos.

Por isso é que, hoje, o STF entende que, havendo omissão dos poderes representativos (Executivo e Legislativo) de pautarem a sua atuação pela axiologia constitucional, deve o Judiciário, como representante das minorias, poder contramajoritário, exercer o papel de garantidor dos direitos e darantias fundamentais, como guardião constitucional. Quer dizer, a inércia ou incompetência do legislador e do administrador muitas vezes obrigam uma atuação do judiciário, caso contrário é ele próprio quem vai estar descumprindo a Constituição.

O Estado não pode demitir-se do gravíssimo encargo de tornar efetivos os direitos sociais sob pena de o Poder Público, por violação positiva ou negativa da Constituição, comprometer de modo inaceitável a integridade da própria ordem constitucional. O Legislativo e o Executivo são os atores para o estabelecimento das políticas prioritárias, mas quando estes se omitem ou retardam o cumprimento de um direito, aí se torna necessária a intervenção judicial. Logo, o déficit democrático, a falta de credibilidade nas instâncias democráticas, faz com que o judiciário tenha que intervir. Em que pese as críticas, o próprio sistema jurídico impõe ao judiciário, antes um dever do que um poder, para efetivar a guarda da Constituição e os direitos e garantias fundamentais.

Assim, o que caracteriza uma democracia não é a vontade da maioria, mas o tratamento igualitário, este considerado no plano material, o que pressupõe a necessária garantia dos direitos mínimos para que seja assegurada a dignidade da pessoa humana, valor central do sistema em torno do qual gravitam os direitos fundamentais. Não há hierarquia entre seres humanos, todos possuem a mesma dignidade, inclusive as minorias, valor absoluto que não comporta gradações. Exatamente desse conceito vem o crescimento da democracia, o respeito a todos, o pluralismo, os direitos das minorias, a participação popular nas decisões políticas, tudo como forma de garantir a voz das porções minoritárias e assegurar a soberania popular também no seu aspecto democrático, o que passou a ser objeto de proteção constitucional no chamado Estado Democrático de Direito.

Nesse sentido, o pluralismo também seria outra exteriorização dos direitos de quarta geração. Pluralismo seja ele ideológico, político, cultural, artístico, religioso. Essa diversidade de ideologias é uma característica da nossa sociedade. O pluralismo está associado ao respeito à diversidade, ao direito das minorias. A comunidade jurídica percebeu, sobretudo após o derramamento de sangue ocorrido na II Guerra Mundial, que muitos problemas da humanidade não eram apenas a falta de solidariedade (daí surgem os direitos de terceira dimensão), mas também a falta de tolerância ao desamparar o direito das minorias (daí surge a preocupação com a garantia da democracia material).

E foi exatamente essa a origem da barbárie que ocorreu com o nazismo, doutrina que estabelecia discriminações a ponto de conceber alguns seres humanos superiores intocáveis em detrimento de outros considerados inferiores (judeus, negros, etc), como se fossem raças de segundo escalão desprotegidos pelo direito, o que acabou resultando no brutal extermínio de algumas classes minoritárias. Era preciso, portanto, assegurar a democracia também no seu aspecto material com o respeito aos direitos das minorias (Estado Democrático de Direito). É direito fundamental, portanto, o respeito recíproco com as diferenças (o que não é importante para a maioria, pode ser para uma minoria). É o caso dos quilombolas, do indigenato, das cotas raciais, dentre outros. Essa simbiose de cultura e idéias é marca de um povo e tem que ser assegurada, por isso ganha destaque nos tempos atuais o pluralismo, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, nos termos do art. 1° da Constituçao Federal.

Portanto, podemos sintetizar dizendo que os direitos de quarta geração seriam a democracia e o pluralismo, decorrentes da globalização política, relacionando-se com os direitos das minorias. Contudo, como dito anteriormente, há discussão acadêmica e o tema está longe de tornar-se pacífico. Se não há consenso quanto aos direitos de quarta dimensão, parece exagero já se partir para uma quinta dimensão dos direitos fundamentais, embora o tema já esteja iniciando na doutrina. Tratar-se-iam dos chamados direitos transnacionais, algo que deve ser buscado pelos Estados em conjunto no plano internacional. Paulo Bonavides classifica o direito à paz como um direito de quinta dimensão, algo a ser buscado pelos Estados em cooperação.

De fato, o estudo combinado do direito interno com o direito transnacional sugere ser a evolução do neoconstitucionalismo, que fará surgir o que a doutrina já tem antecipado como transconstitucionalismo. Esse fenômeno da globalização tem mudado o enfoque das relações internacionais. Se antes eram características marcantes da sociedade internacional ser paritária e descentralizada (sem hierarquia e poder central), hoje percebemos que tais características estão em franca mutação, cada vez mais surgindo organizações centralizando o poder e tribunais hierarquizando interpretações, com a sociedade global passando a ganhar instituições parecidas com as existentes no plano doméstico.

Há uma nítida hierarquia se estabelecendo no plano internacional. A soberania de cada Estado permanece, mas a regulação no plano externo ganha força. Em outros termos, podemos dizer que a soberania no plano material tem sido mitigada pela nova ordem internacional. Isso é exatamente o que se chama de constitucionalização do direito internacional, uma expressão doutrinária que retrata um fenômeno através do qual o direito internacional interfere na organização do direito interno, justamente por decorrência da cosmopolitanização do direito. Transpor as fronteiras geográficas buscando uma harmonização jurídica a nível global, esse seria a essência dos chamados direitos de quinta dimensão (direitos transnacionais), mas sem consenso, a doutrina é iniciante no tema.

4.1 Aplicabilidade Prática da Nomenclatura

Sabemos que, quanto à essência (critério ontológico), a Constituição brasileira ainda pode ser caracterizada como nominal. O critério ontológico ou essencialista, difundido pelo jurista alemão Karl Loewenstein, estuda a essência da Constituição, aquilo que ela é na realidade, verifica a concordância das normas constitucionais com a realidade do processo de poder, a partir da premissa de que a Constituição é aquilo que os detentores e destinatários de poder fazem dela na prática. A Constituição nominal traz normas constitucionais que, em certa dose, carecem de força normativa adequada para alterar a realidade, falta-lhes efetividade, em algumas situações não saem do papel. Preocupa-se com o futuro, planejando as ações para a frente, mas não regula de forma efetiva a situação atual, representando mais o plano do ideal do que o real.

Vejamos, por exemplo, o art. 7º, IV, da CF/88: "São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo...". Outro exemplo, ainda, seria o art. 196 da CF/88: "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação". De fato, há descompasso entre a projeção futura e a realidade.

A partir dessa observação, parece-nos mais apropriado, então, antes de querermos apressar a nomenclatura das dimensões dos direitos fundamentais como um indicativo da existência de mais garantias conquistadas, precisamos efetivar e consolidar o que já tem previsão. Se ao invés de nos preocuparmos com gerações futuras de direitos fundamentais, efetivássemos concretamente as que já existem, estaríamos com a sociedade em melhor realidade. Como falar em quarta e quinta dimensões se as primeiras nem são efetivamente cumpridas? Aliás, a jurisprudência do STF fala no chamado fenômeno da “erosão da consciência constitucional”, que consistiria no perigoso processo de desvalorização funcional da Constituição Federal em decorrência da omissão inconstitucional do Poder Público, o que lhe diminuiria sua força normativa.

Erosão significa corrosão, desgaste, tratando-se de processo contínuo de degradação, enfraquecimento. Dessa forma, podemos dizer que a erosão da consciência constitucional seria a degradação da sua magnitude, perda do relevo da Constituição, justamente porque esta perde a sua efetividade. A consequência de tal conduta erosiva (inércia dos poderes públicos) é provocar na sociedade uma idéia de que a Constituição não tem efetividade, a consciência constitucional fica enfraquecida (perda da credibilidade) pela ausência de ato do poder público que confira efetividade às normas constitucionais.

Isso pode provocar a degradação constitucional, redução da sua funcionalidade (perda da efetividade), influindo na consciência coletiva acerca da inefetividade da Constituição, por não cumprir a função para a qual foi criada, daí resulta a desvalorização funcional da Constituição, que passa a ser vista pela sociedade como algo que está no papel, mas não provoca transformação social. A rigor, quanto maior a preocupação de formalizar direitos, maior a dificuldade de lhes garantir uma aplicação efetiva. Melhor seria, então, ao invés de se preocupar com o futuro e prever quarta e quintas dimensões de direitos e garantias fundamentais, garantir a efetividade das que já existem.

Nesse ponto, ressalte-se que se observa ao redor do mundo um fenômeno chamado de “rematerialização das Constituições”, no sentido de consagrarem um extenso rol de direitos fundamentais. As Constituições atuais são prolixas (analíticas ou regulamentares), tratando de forma ampla das matérias. Tratam também de metas a serem alcançadas, programas de atuação a serem seguidos pelo Poder Público, com normas tipicamente dirigentes. No Brasil, por exemplo, o rol dos direitos e garantias fundamentais atingiram um nível de formalização que dificilmente poderá ser muito ampliado. É óbvio que podem surgir um ou outro direito de acordo com a evolução da sociedade, mas nós atingimos um nível de formalização dos direitos hoje, de fato, bastante satisfatórios. É o que se chama de rematerialização das Constituições.

Ocorre que, de nada adianta estar previsto na Constituição se não é garantido na realidade. A formalização dos direitos evoluiu muito, mas a preocupação atual não é com o plano da formalização e existência (reconhecer mais direitos na Constituição), mais que isso, fazer com que esses direitos saiam do papel e venham para a realidade. Os direitos fundamentais, então, têm duas acepções: formal e material. A dimensão formal é a positivação dos direitos fundamentais, algo já conquistado, inclusive como se percebe desse fenômeno da rematerialização das Constituições. A dimensão material, por sua vez, refere-se à efetividade desses direitos, isto é, que esses direitos deixem de ter apenas eficácia (formal) e passem a ter efetividade (material), sejam cumpridos na prática, efetivamente usufruídos por todos. Nesse plano, temos a dimensão material dos direitos fundamentais. É esta que deve ser a maior preocupação do constitucionalismo contemporâneo.


4. CONCLUSÃO

Por todo o exposto, podemos concluir que a evolução dos direitos e garantias fundamentais e sua concretização no mundo atual tem origem na luta do povo para conter o poder estatal. O núcleo central dos textos constitucionais é a existência de regras de limitação ao poder autoritário e de prevalência dos direitos fundamentais, como forma de distanciar-se da concepção autoritária de Estado presente no regime antigo. Logo, analisar os direitos fundamentais é perceber a evolução das garantias que, ao longo dos tempos, foram conquistadas e asseguradas ao homem. É nesse sentido que se inserem os direitos e garantias fundamentais de primeira (liberdade), segunda (igualdade) e terceira (fraternidade) dimensões.

Contudo, a doutrina moderna já começa a falar, também, em direitos de quarta (democracia material e pluralismo) e quinta (direitos transnacionais) dimensões. O primeiro se relaciona aos direitos das minorias na busca dos direitos mínimos para que seja assegurada a dignidade da pessoa humana, valor central do sistema em torno do qual gravitam os direitos fundamentais. O segundo diz respeito ao estudo combinado do direito interno com o direito transnacional, decorrente da cosmopolitanização do direito. Em todo caso, a doutrina ainda é iniciante no tema. O que importa é que, antes de se preocupar com o avanço na nomenclatura para indicar a suposta evolução a partir da existência de mais dimensões de direitos fundamentais, precisamos efetivar e consolidar os já existentes.


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Autor

  • Francisco Gilney Bezerra de Carvalho Ferreira

    Mestrando em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Especialista em Direito Público pela Faculdade Projeção e MBA em Gestão Pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Graduado em Direito pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR) e Engenharia Civil pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Procurador Federal em exercício pela Advocacia-Geral da União (AGU) e Professor do Curso de Graduação em Direito da Faculdade Luciano Feijão (FLF-Sobral/CE).

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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA, Francisco Gilney Bezerra de Carvalho. Direitos e garantias fundamentais - já podemos falar em quarta e quinta dimensões?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3828, 24 dez. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26078. Acesso em: 28 mar. 2024.