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Modificação de regime de exploração para produção independente de energia elétrica

Modificação de regime de exploração para produção independente de energia elétrica

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A Resolução Normativa ANEEL nº 467/11 pretende conferir maior competitividade ao setor, com incremento da capacidade instalada do parque gerador de energia elétrica e incentivo à geração de benefícios econômicos para agentes de mercado e consumidores.

1. Introdução.

A Lei federal nº 9.074, de 1995, estabelece, no seu art. 5º, que serão objeto de concessão, mediante licitação, o aproveitamento de potenciais hidráulicos de potência superior a 1.000 kW e a implantação de usinas termelétricas de potência superior a 5.000 kW, destinados à execução de serviço público (inciso I), bem como o aproveitamento de potenciais hidráulicos de potência superior a 1.000 kW, destinados à produção independente de energia elétrica (inciso II). Além disso, prevê também a licitação de uso de bem público para a concessão de aproveitamento de potenciais hidráulicos de potência superior a 10.000 kW, para uso exclusivo de autoprodutor (inciso III).

De outro modo, o art. 7º da Lei dispõe que são objeto de autorização a implantação de usinas termelétricas, de potência superior a 5.000 kW, destinadas a uso exclusivo do autoprodutor (inciso I) e o aproveitamento de potenciais hidráulicos, de potência superior a 1.000 kW e igual ou inferior a 10.000 kW, destinados a uso exclusivo do autoprodutor (inciso II), excluindo-se deste rol aquelas cuja fonte primária de energia seja a nuclear (parágrafo único).

Por sua vez, a Lei nº 10.848, de 15 de março de 2004 (dispõe sobre comercialização de energia e outras providências), possui as seguintes normas:

“Art. 20. As pessoas jurídicas concessionárias, permissionárias e autorizadas de distribuição e de geração de energia elétrica deverão adaptar-se às disposições contidas nos §§ 5º, e 7º do art. 4º da Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995, com a redação dada por esta Lei, no prazo de 18 (dezoito) meses a contar de sua entrada em vigor.

§ 1º O prazo acima estabelecido poderá ser prorrogado pela ANEEL, 1 (uma) única vez, por igual período, se efetivamente comprovada a impossibilidade de cumprimento das disposições decorrentes de fatores alheios à vontade das concessionárias, permissionárias e autorizadas de serviços públicos citados neste artigo.

§ 2º Excepcionalmente, as pessoas jurídicas em processo de adaptação previsto no caput deste artigo poderão celebrar novos contratos relativos às atividades previstas nos incisos I, II, III e IV do § 5º do art. 4º da Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995, com a redação dada por esta Lei, durante o prazo máximo de 12 (doze) meses, contado da data de 11 de dezembro de 2003, observado, em qualquer hipótese, o disposto no art. 2º desta Lei e, no caso de empresas sob controle da União, dos Estados e dos Municípios, o rito previsto no art. 27 da Lei nº 10.438, de 26 de abril de 2002, com redação dada por esta Lei.

§ 3º  As concessões de aproveitamentos hidrelétricos resultantes da separação das atividades de distribuição de que trata o caput deste artigo poderão, a critério do poder concedente, ter o regime de exploração modificado para produção independente de energia, mediante a celebração de contrato oneroso de uso de bem público e com prazo de concessão igual ao prazo remanescente do contrato de concessão original, observado, no que couber, o disposto no art. 7º da Lei nº 9.648, de 27 de maio de 1998. (Incluído pela Lei nº 11.488, de 2007)

 § 4º  Aplica-se o disposto nos §§ 1º a 8º do art. 26 da Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996, bem como as regras de comercialização a que estão submetidas às fontes alternativas de energia, aos empreendimentos hidrelétricos resultantes da separação das atividades de distribuição de que trata este artigo, desde que sejam observadas as características previstas no inciso I do art. 26 da Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996. (Incluído pela Lei nº 11.488, de 2007)

 § 5º  Aplica-se o disposto nos §§ 3º e 4º aos empreendimentos hidrelétricos resultantes de separação entre as atividades de distribuição e de geração de energia elétrica promovida anteriormente ao comando estabelecido no caput e àqueles cuja concessão de serviço público de geração foi outorgada após 5 de outubro de 1988. (Incluído pela Lei nº 12.111, de 2009)” (nossos grifos)

A Agência Nacional de Energia Elétrica editou a Resolução Normativa nº 467, de 6 de dezembro de 2011, em vigor desde a sua publicação (DOU 09.12.11), que estabelece os requisitos e critérios para modificação, a pedido do concessionário, do regime de exploração das concessões de aproveitamentos hidrelétricos para geração de energia elétrica destinada a serviço público, com potência superior a 1.000 kW e igual ou inferior a 50.000 kW, para o regime de exploração de produção independente. Isso implica, para o concessionário, migrar do regime jurídico do inciso I do art. 5º da Lei nº 9.074/95, para aquele estabelecido no inciso II subsequente.

As disposições dessa Resolução da ANEEL foram tema de discussão da Audiência Pública nº 30/2011, realizada entre os meses de maio e julho, tendo recebido 50 contribuições de 11 participantes. A norma aplica-se apenas ao regime jurídico de concessões nos casos de aproveitamento de potenciais hidráulicos, porque o inciso II do art. 5º só prevê essa situação para a produção independente de energia elétrica.

Cumpre ressaltar, ainda, que a Resolução Normativa nº 467/11 dirige-se apenas ao regime de concessão. Embora o art. 11 da Lei nº 9.074/95 considere Produtor Independente de Energia Elétrica (PIE) a pessoa jurídica ou empresas reunidas em consórcio que recebam concessão ou autorização do poder concedente para, por sua conta e risco, produzir energia elétrica destinada ao comércio, seja de toda ou de parte da energia produzida, pela mera leitura do art. 7º da Lei percebe-se que o regime de autorização só se aplica para o autoprodutor.

Portanto, a normatização da ANEEL trata, exclusivamente, do aproveitamento de potenciais hidráulicos (não de implantação de usinas termelétricas), sob regime de concessão, por migração do regime de produção destinado à execução de serviço público para o regime de produção independente de energia elétrica.

2. Procedimentos e requisitos.

Conforme Resolução Normativa/ANEEL nº 467/11, o procedimento de modificação do regime de exploração das concessões de aproveitamentos hidrelétricos para geração de energia elétrica destinada a serviço público, para o regime de exploração de produção independente, inicia-se com o requerimento da concessionária, individualmente por aproveitamento hidrelétrico ou em conjunto, formulado à Superintendência de Concessões e Autorizações de Geração (SCG), da ANEEL (art. 3º).

A concessionária deve comprovar a regularidade fiscal, o adimplemento quanto ao recolhimento ou pagamento de encargos e obrigações setoriais e, quando for o caso, apresentar relatório técnico, demonstrando que o aproveitamento hidrelétrico atende aos critérios para enquadramento na condição de Pequena Central Hidrelétrica (PCH), em razão de determinadas vantagens.

Para a mudança do regime para produção independente, é necessário que o requerente cumpra ao menos um dos requisitos listados no art. 2º da norma da ANEEL, verbis:

“Art. 2º [...].

I – seja resultante de separação das atividades de distribuição e de geração de que trata o art. 20 da Lei nº 10.848, de 2004;

II – seja resultante de separação das atividades de distribuição e de geração promovida anteriormente ao comando legal mencionado no inciso anterior;

III – tenha sido outorgada após 5 de outubro de 1988.”

Observe-se que o contexto normativo da Resolução Normativa é exatamente a regulamentação dos §§ 3º, 4º e 5º do art. 20 da Lei federal nº 10.848, de 2004 (redação dada pelas Leis nºs 11.488/07 e 12.111/09).

A Lei nº 10.848/04 determinou prazos fixos para a desverticalização das concessionárias de serviço público de distribuição de energia elétrica vinculadas ao Sistema Interligado Nacional, consagrando o Programa Nacional de Desestatização, criado pela Lei nº 8.031/90, iniciado no setor elétrico pela Lei nº 9.074/95 e efetivamente implantado a partir de 1996, por meio do Projeto de Reestruturação do Setor Elétrico Brasileiro (Projeto RE-SEB), do Ministério de Minas e Energia.

Desse modo, a Resolução Normativa nº 467/11 apresenta o propósito de firmar critérios regulamentares para que os aproveitamentos hidrelétricos com potência superior a 1MW e igual ou inferior a 50 MW que sejam vinculados às concessões originadas a partir dos processos de separação das atividades de distribuição de energia (art. 20, § 3º, Lei nº 10.848/04), ou outorgados após 5 de outubro de 1988 (art. 20, § 5º, da mesma Lei), possam ser submetidos ao regime jurídico do PIE. A Lei nº 10.848/04, portanto, ampararia, sob a ótica do princípio da legalidade, os requisitos previstos no art. 2º da Resolução da ANEEL.

Outro ponto importante da nova Resolução da ANEEL é que dispõe, no art. 4º, que a modificação do regime de exploração da concessão obrigará a concessionária ao pagamento pelo uso de bem público, durante cinco anos, limitados ao prazo remanescente da concessão original, contados da assinatura do respectivo contrato de concessão de uso de bem público, estabelecendo a fórmula de cálculo de pagamento, cujo valor anual será estipulado pela ANEEL, para pagamentos mensais de 1/12 avos. A norma regulamentar ampara-se nos arts. 13 e 14 da Lei nº 9.074/95, no art. 11 do Decreto nº 2.003/96 e no próprio § 3º do art. 20 da Lei nº 10.848/04:

“Art. 4º A modificação do regime de exploração da concessão obrigará a concessionária ao pagamento pelo uso de bem público, durante cinco anos, limitados ao prazo remanescente da concessão original, contados da assinatura do respectivo contrato de concessão de uso de bem público, cujo valor anual será calculado pela ANEEL da seguinte forma:

VPA = VP*GF*VR*8760/100

onde:

VPA = valor do pagamento anual pelo uso de bem público;

VP = valor percentual a ser aplicado sobre a receita anual estimada do aproveitamento hidrelétrico, igual a 2,5%;

GF = garantia física do aproveitamento hidrelétrico, em MW médio, definida pelo poder concedente, e na ausência desta, o valor obtido do produto entre a potência instalada e o fator de capacidade igual a 0,55;

VR = Valor Anual de Referência, em R$/MWh, em vigor na data de publicação do ato administrativo que aprovar a modificação do regime de exploração da concessão.

§ 1º A concessionária recolherá à União parcelas mensais equivalentes a 1/12 (um doze avos) do valor do pagamento anual, na forma indicada pela ANEEL.

§ 2º O valor do pagamento anual pelo uso de bem público calculado na forma estabelecida no caput será atualizado anualmente ou com a periodicidade que a legislação permitir, utilizando-se o Índice de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA, da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE ou, em caso de sua extinção, o índice que vier a ser definido pelo Poder Concedente para sucedê-lo, de acordo com a seguinte fórmula:

VPAk = VPA0 * (IPCA-Mk / IPCA-M0),

onde,

VPAk = valor do pagamento anual pelo uso de bem público para o ano k;

VPA0 = valor do pagamento anual pelo uso de bem público calculado conforme descrito no caput;

IPCA-Mk = valor do IPCA relativo ao mês anterior ao da data da atualização em processamento;

IPCA-M0 = valor do IPCA relativo ao mês anterior ao da data de publicação do ato administrativo que aprovou a modificação do regime de exploração da concessão.”

Deve ser observado que, pela redação do art. 10 da Resolução Normativa/ANEEL nº 467/11, tal ato normativo aplicar-se-ia, com base nos §§ 3º e 4º do art. 20 da Lei nº 10.848/04, inclusive aos requerimentos de modificação do regime de exploração já formulados ao tempo da sua entrada em vigor e ainda em tramitação na ANEEL e/ou no Ministério de Minas e Energia, devendo as respectivas concessionárias complementarem e/ou atualizarem, sendo o caso, a documentação pertinente à regularidade fiscal e ao relatório técnico, para eventual enquadramento como PCH.

Deferido o pedido, a modificação do regime de exploração da concessão requererá ajustes no respectivo ato de outorga, conforme a legislação de regência.

3. Vantagens para a PCH.

A Lei nº 9.427/96 dispõe:

“Art. 26.  Cabe ao Poder Concedente, diretamente ou mediante delegação à ANEEL, autorizar:  (Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004)

I - o aproveitamento de potencial hidráulico de potência superior a 1.000 kW e igual ou inferior a 30.000 kW, destinado a produção independente ou autoprodução, mantidas as características de pequena central hidrelétrica; (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998)

II - a compra e venda de energia elétrica, por agente comercializador; (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998)

III - a importação e exportação de energia elétrica, bem como a implantação das respectivas instalações de transmissão associadas, ressalvado o disposto no § 6º do art. 17 da Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995; (Redação dada pela Lei nº 12.111, de 2009)

IV - a comercialização, eventual e temporária, pelos autoprodutores, de seus excedentes de energia elétrica. (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)

V - os acréscimos de capacidade de geração, objetivando o aproveitamento ótimo do potencial hidráulico. (Incluído pela Lei nº 10.438, de 2002)

VI - o aproveitamento de potencial hidráulico de potência superior a 1.000 (mil) kW e igual ou inferior a 50.000 (cinquenta mil) kW, destinado à produção independente ou autoprodução, independentemente de ter ou não características de pequena central hidrelétrica. (Incluído pela Lei nº 11.943, de 2009)

§ 1º  Para o aproveitamento referido no inciso I do caput deste artigo, para os empreendimentos hidroelétricos com potência igual ou inferior a 1.000 (mil) kW e para aqueles com base em fontes solar, eólica, biomassa e co-geração qualificada, conforme regulamentação da ANEEL, cuja potência injetada nos sistemas de transmissão ou distribuição seja menor ou igual a 30.000 (trinta mil) kW, a ANEEL estipulará percentual de redução não inferior a 50% (cinqüenta por cento) a ser aplicado às tarifas de uso dos sistemas elétricos de transmissão e de distribuição, incidindo na produção e no consumo da energia comercializada pelos aproveitamentos. (Redação dada pela Lei nº 11.488, de 2007)

§ 2º Ao aproveitamento referido neste artigo que funcionar interligado e ou integrado ao sistema elétrico, é assegurada a participação nas vantagens técnicas e econômicas da operação interligada, especialmente em sistemática ou mecanismo de realocação de energia entre usinas, destinado a mitigação dos riscos hidrológicos, devendo também se submeter ao rateio do ônus, quando ocorrer. (Redação dada pela Lei nº 10.438, de 2002)

§ 3º A comercialização da energia elétrica resultante da atividade referida nos incisos II, III e IV, far-se-á nos termos dos arts. 12, [15] e 16 da Lei nº 9.074, de 1995. (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)

§ 4º É estendido às usinas hidrelétricas referidas no inciso I que iniciarem a operação após a publicação desta Lei, a isenção de que trata o inciso I do art. 4º da Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989. (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)

§ 5º O aproveitamento referido nos incisos I e VI do caput deste artigo, os empreendimentos com potência igual ou inferior a 1.000 kW (mil kilowatts) e aqueles com base em fontes solar, eólica e biomassa cuja potência injetada nos sistemas de transmissão ou distribuição seja menor ou igual a 50.000 kW (cinquenta mil kilowatts) poderão comercializar energia elétrica com consumidor ou conjunto de consumidores reunidos por comunhão de interesses de fato ou de direito, cuja carga seja maior ou igual a 500 kW (quinhentos kilowatts), observados os prazos de carência constantes dos arts. 15 e 16 da Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995, conforme regulamentação da Aneel, podendo o fornecimento ser complementado por empreendimentos de geração associados às fontes aqui referidas, visando à garantia de suas disponibilidades energéticas, mas limitado a 49% (quarenta e nove por cento) da energia média que produzirem, sem prejuízo do previsto nos §§ 1º e 2º deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 12.783, de 2013)

§ 6º Quando dos acréscimos de capacidade de geração de que trata o inciso V deste artigo, a potência final da central hidrelétrica resultar superior a 30.000 kW, o autorizado não fará mais jus ao enquadramento de pequena central hidrelétrica. (Incluído pela Lei nº 10.438, de 2002)

§ 7º As autorizações e concessões que venham a ter acréscimo de capacidade na forma do inciso V deste artigo poderão ser prorrogadas por prazo suficiente à amortização dos investimentos, limitado a 20 (vinte) anos. (Incluído pela Lei nº 10.438, de 2002)

§ 8º Fica reduzido para 50 kW o limite mínimo de carga estabelecido no § 5º deste artigo quando o consumidor ou conjunto de consumidores se situar no âmbito dos sistemas elétricos isolados. (Incluído pela Lei nº 10.438, de 2002)

Ao tempo da edição da Resolução Normativa/ANEEL nº 467/11, a redação do parágrafo quinto do art. 26 Lei nº 9.427/96, então conferida pela Lei nº 11.943, de 2009, era praticamente a mesma da atual, não tendo a Medida Provisória nº 579, de 2012, convertida na Lei nº 12.783, de 2013, trazido qualquer alteração de redação significativa ao ponto de negar eficácia aos dispositivos da Resolução Normativa/ANEEL nº 467/11.

No caso de aproveitamento hidrelétrico que, tendo modificado o regime de exploração para produção independente, atenda aos critérios para enquadramento na condição de PCH, aplica-se, conforme o art. 5º da Resolução Normativa nº 467/11, o disposto nos §§ 1º a 8º do art. 26 da Lei nº 9.427/96, bem como as regras de comercialização a que estão submetidas as fontes alternativas de energia, em razão do disposto no § 4º do art. 20 da Lei nº 10.848/04.

Portanto, são vários os benefícios previstos, como o percentual de redução não inferior a 50%, estipulado pela ANEEL, a ser aplicado às tarifas de uso dos sistemas elétricos de transmissão e de distribuição (TUST e TUSD), incidindo na produção e no consumo da energia comercializada pelos aproveitamentos, nos termos do § 1º do art. 26 da Lei nº 9.427/96 (redação dada pela Lei nº 11.488/07).

Ainda no âmbito dos aproveitamentos hidrelétricos enquadráveis como PCH, outro benefício que pode ser mencionado é aquele previsto no art. 7º da Resolução Normativa: o concessionário ficará desobrigado de aplicar recursos no Programa de Pesquisa e Desenvolvimento do setor elétrico, regido pela Lei nº 9.991/2000, na parcela da receita relativa ao aproveitamento hidrelétrico que teve o regime de exploração modificado.

Contudo, o benefício do § 4º do art. 26 da Lei nº 9.427/96 somente será concedido ao aproveitamento hidrelétrico que tenha iniciado sua operação comercial após 27 de maio de 1998, data de promulgação da Lei nº 9.648, que estendeu ao aproveitamento de potencial hidráulico com características de PCH a isenção de que trata o inciso I do art. 4º da Lei nº 7.990/89, referente ao pagamento da compensação financeira (CFURH), assegurada no § 1º do art. 20 da Constituição Federal.

Observe-se que o aproveitamento de potencial hidráulico só poderá ser enquadrado como detentor de características de PCH para as margens de potência em valor superior a 1.000 kW e igual ou inferior a 30.000 kW, além de preencher outros requisitos da Resolução Normativa ANEEL nº 343, de 2008. Todavia, lembrando que a Resolução Normativa nº 467/11 prevê possibilidade de mudança de regime para aproveitamentos hidrelétricos com potência superior a 1.000 kW e até 50.000 kW, observamos que algumas não se enquadrarão, já por esse critério, nas características de PCH (até 30.000 kW).

Mesmo assim, no caso de aproveitamento hidrelétrico que, tendo modificado o regime de exploração para produção independente, não venha a atender aos critérios para enquadramento na condição de PCH, será aplicável ao menos o benefício disposto no § 5º do art. 26 da Lei nº 9.427/96 (redação dada pela Lei nº 11.943/09), referente à comercialização de energia elétrica com consumidor ou conjunto de consumidores reunidos por comunhão de interesses de fato ou de direito, cuja carga seja maior ou igual a 500 kW, sem prejuízo do previsto nos §§ 1º e 2º do art. 26 da Lei nº 9.427/96, tudo em razão do enquadramento previsto no inciso VI do mesmo dispositivo.

4. Alterações da Resolução Normativa/ANEEL nº 548, de 07.05.2013.

A redação original do art. 8º da Resolução Normativa/ANEEL nº 467/11 era a seguinte:

“Art. 8º Toda isenção e desconto decorrentes da modificação do regime de exploração, auferidos por aproveitamento hidrelétrico que tenha celebrado contrato de compra e venda de energia elétrica com concessionária de distribuição nos termos do inciso II do art. 2º da Resolução Normativa nº 167, de 10 de outubro de 2005, ensejarão a redução da tarifa da energia elétrica estabelecida no respectivo contrato, visando à modicidade tarifária.”

Com a entrada em vigor da Resolução Normativa/ANEEL n.º 548, de 07.05.2013, o art. 8º da Resolução Normativa/ANEEL nº 467/11 passou a ter a seguinte redação:

“Art. 8º A concessionária que houver celebrado, com agente de distribuição, contrato de compra e venda de energia elétrica na modalidade geração distribuída por chamada pública, contrato bilateral anterior à Lei nº 10.848, de 2004, ou Contrato de Comercialização de Energia no Ambiente Regulado − CCEAR em que é possível identificar o empreendimento que confere lastro ao agente vendedor, terá a modificação do regime de exploração condicionada à celebração de termo aditivo contratual de forma a prever a aplicação de desconto na fatura de energia equivalente ao desconto obtido na TUSDg, enquanto vigorar o contrato. (Redação dada pela REN ANEEL 548, de 07.05.2013)

Art. 8°-A Para os contratos mencionados no artigo 8º que permitem a alteração das condições contratuais em função de desequilíbrio econômico e financeiro decorrente da Política Energética Nacional, as partes deverão submeter à homologação da ANEEL proposta de alteração do preço da energia, de forma a refletir na modicidade tarifária todos os efeitos econômicos decorrentes da alteração do regime de exploração da concessão. (Incluído pela REN ANEEL 548, de 07.05.2013)

Art. 8º-B Os termos aditivos contratuais resultantes das alterações a que aludem os artigos 8º e 8º-A deverão, conforme o caso, ser homologados ou registrados pela ANEEL, nos termos da Resolução Normativa nº 323, de 8 de julho de 2008, ou regulamentação superveniente.” (nossos grifos)

Vale lembrar que a TUSDg é a TUSD aplicada a unidades geradoras conectadas aos sistemas de distribuição (Resolução Normativa/ANEEL nº 166, de 10 de outubro de 2005, art. 2º, inciso III).

5. Conclusões.

A regulamentação dos §§ 3º, 4º e 5º do art. 20 da Lei nº 10.848/04, dada pela Resolução Normativa nº 467/11, trazendo a concreta possibilidade, com critérios previamente estabelecidos, de que o concessionário possa pleitear a mudança de regime de exploração de potenciais hidrelétricos para produção de energia elétrica, de produção destinada à execução de serviço público para o regime de PIE, significa o fortalecimento da disposição do Estado brasileiro para a valorização da disputa de mercado, dando continuidade ao que se iniciou com as políticas de desverticalização, no contexto maior do Programa Nacional de Desestatização.

Assim, a regulamentação expedida pela ANEEL faz parte de um arcabouço normativo que pretende conferir maior competitividade ao setor, com incremento da capacidade instalada do parque gerador de energia elétrica, buscando incentivar a geração de benefícios de mercado que poderão ser colhidos tanto por agentes econômicos, como pelos consumidores em geral.


Neste texto estão as opiniões pessoais do Prof. Thiago D’Ávila, que NÃO NECESSARIAMENTE são as opiniões de qualquer entidade ou organização a que esteja vinculado.


Autor

  • Thiago Cássio D'Ávila Araújo

    Procurador Federal da Advocacia-Geral da União (PGF/AGU) em Brasília/DF. Foi o Subprocurador Regional Federal da Primeira Região (PRF1). Ex-Diretor Substituto e Ex-Diretor Interino do Departamento de Contencioso da Procuradoria-Geral Federal (DEPCONT/PGF), com atuação no STF e Tribunais Superiores; Ex-Coordenador do Núcleo de Assuntos Estratégicos do Departamento de Contencioso da Procuradoria-Geral Federal (NAEst/DEPCONT/PGF); Ex-Coordenador-Geral de Matéria Finalística (Direito Ambiental) e Ex-Consultor Jurídico Substituto da Consultoria Jurídica do Ministério do Meio Ambiente (CONJUR/MMA); Ex-Consultor Jurídico Adjunto da Matéria Administrativa do Ministério da Educação (MEC); Ex-Assessor do Gabinete da Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça. Desempenhou atividades de Procurador Federal junto ao Instituto Brasileiro de Turismo (EMBRATUR), junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), dentre outras funções públicas. Foi também Conselheiro Titular do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN). Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN/2001) e Mestre em Direito e Políticas Públicas pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB/2010). Em 2007, aos 29 anos, proferiu uma Aula Magna no Supremo Tribunal Federal (STF).

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Informações sobre o texto

A versão publicada no Jus Navigandi foi atualizada e ampliada em dezembro de 2013. A primeira versão foi elaborada em fevereiro de 2012 e inicialmente publicada sob o título "Energia elétrica: modificação de regime de exploração para produção independente" na Revista Jurídica Consulex, Brasília, p. 48 - 50, 15 fev. 2012.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Thiago Cássio D'Ávila. Modificação de regime de exploração para produção independente de energia elétrica . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3827, 23 dez. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26230. Acesso em: 29 mar. 2024.