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Seletividade penal na Lei de Drogas - Lei n. 11.343/2006

Seletividade penal na Lei de Drogas - Lei n. 11.343/2006

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A intenção é expor o quão seletiva é a norma penal quanto à caracterização em relação ao usuário e ao traficante, demonstrando que a nova norma que rege as drogas não pode ser considerada como igualitária, já que ela deu margem para critérios subjetivos.

INTRODUÇÃO

Com o advento da Lei n. 11.343/2.006 – Nova Lei de Drogas – surgiu uma grande discussão quanto à tipificação do agente ser usuário ou traficante. Essa discussão se deu por conta do §2º do artigo 28 da referida lei, que elenca os critérios que deverão ser utilizados pelo magistrado para tipificar a conduta praticada pelo sujeito.

A doutrina e a jurisprudência têm se posicionado para suprir o erro cometido pela lei, quando esta elencou critérios subjetivos para tal caracterização, de modo que deu margem para que ocorresse uma seletividade por conta tanto do policial na abordagem do agente, quanto pelo magistrado ao decidir o caso.

Um dos principais critérios elencados que causaram essa repercussão é a falta de quantificação da substância apreendida, acompanhado pela análise das circunstancias sociais e pessoais do agente. Estes critérios foram considerados pela doutrina como sendo subjetivos, dando possibilidade para a aplicação da seletividade.

A presente monografia busca demonstrar como essa seletividade ocorre, conceituando todas as circunstâncias expostas pela lei e o momento em que ela é propensa a acontecer.

No primeiro capítulo foi feito um breve estudo a respeito do crime de uso, tipificado no artigo 28 da Lei n. 11.343/2.006, diferenciando a conduta prevista na lei atual com a lei revogada (6.368/76). Foi demonstrado que as condutas elencadas na lei anterior, eram apenas três, enquanto que na lei vigente são cinco. Outra diferença entre estas leis é que a pena para o agente que for condenado pelo crime de uso, não poderá mais ser privativa de liberdade, senão apenas restritiva de direitos, havendo assim uma novatio legis in mellius.

No segundo capítulo, o qual trata do crime de tráfico de drogas, foi feito um estudo conceituando cada conduta prevista no artigo 33, as causas de diminuição de pena e a classificação do crime.

Já no terceiro capítulo, foi demonstrado quais são os parâmetros - previstos no parágrafo 2º do artigo 28 - que o juiz deve considerar para diferenciar o usuário do traficante.

No quarto capítulo foi feito um estudo sobre a teoria do labbeling approach ou “etiquetamento” e como ela é aplicada quando se trata dos crimes de drogas.

O quinto e último capitulo buscou demonstrar o quão seletivo é o direito penal brasileiro quanto aos parâmetros são só utilizados pelo magistrado, como também no momento da abordagem policial.


I. USUÁRIO

A legislação de drogas era composta das Leis 6.368?76 e 10.409?2.002. A intenção desta última era substituir a lei anterior, mas por conta de seu projeto possuir incontáveis vícios de inconstitucionalidade e deficiências técnicas, sua parte penal foi completamente vetada, tendo sido aprovada apenas a sua parte processual. Dessa forma, a parte penal continuava sendo a de 1.976 e a parte processual de 2.006.

Para acabar com essa situação, foi criada a Nova Lei de Drogas – 11.343?2.006, a qual está em vigor e que por meio de seu artigo 75 revogou expressamente ambos os diplomas legais, dando tratamento diferenciado ao usuário em relação ao que era dado pelas leis anteriores.

A lei 6.368/76 previa no seu art. 16, pena de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de 20 (vinte) a 50 (cinquenta) dias-multa para quem portava droga para uso próprio. Já a lei 11.343-2.006 em seu art. 28, I, II e III, passou a prever pena de: advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviço à comunidade, medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

O uso de drogas está disciplinado no artigo 28, da Lei 11.343/2.006, que considera usuário aquele que adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Refletindo o espírito da lei com relação ao usuário:

O intuito da Lei foi o de evitar, a qualquer custo, a aplicação de pena privativa de liberdade ao usuário de drogas. Partindo-se da premissa de que a reclusão do usuário ou dependente não teria qualquer benefício seja à saúde individual, seja à saúde pública, o legislador determinou a aplicação de outras penas não privativas de liberdade, as quais chamou, eufemisticamente, de “medidas educativas”. Analisando a nova Lei, verifica-se que em nenhuma hipótese poderá ser aplicada pena privativa de liberdade ao usuário. (MENDONÇA; CARVALHO, 2008, p. 46) 

O art. 16, caput da Lei 6.368-76 determinava somente três condutas para o usuário de drogas: adquirir, guardar e trazer. Já a atual lei (11.343-2.006), criou duas novas figuras típicas, prevendo assim, cinco condutas: adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo. Aumentando assim o rol de condutas previstas para se configurar o crime para o usuário de drogas. Mendonça e Carvalho, salientam ainda que:

Se para a caracterização do tipo previsto no art. 28 é necessário que a droga destine-se a consumo pessoal, aquele que retém em nome e para uso de terceiro não se enquadrará no tipo do art. 28, mas no art. 33. Da mesma forma, se alguém comprar a droga para consumo pessoal de terceiro, responderá neste mesmo art. 33 e não como partícipe do crime do art. 28. (2008, p. 49) 

Com isso, observa-se que a vigente lei foi bem específica quanto à pessoa que irá consumir tal droga, aplicando-se o art. 28 apenas àqueles que adquirirem, guardarem, tiverem em depósito, transportarem ou trouxerem consigo a droga para consumo próprio.

A referida lei presente tipificou ainda, o mesmo tratamento penal que o usuário, conforme o §1º do referido artigo, àquele que para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica.

Com relação ao consumo de drogas, previsto no artigo 28, a maior polêmica advinda da doutrina, sem dúvida, trata-se da descriminalização ou não desta conduta, haja vista que dentre as sanções previstas na lei atual para serem aplicadas ao usuário de drogas não há previsão de imposição de pena privativa de liberdade, contrariando assim a definição legal de crime prevista no artigo 1º, da Lei de Introdução ao Código Penal.

Na lei anterior, o crime era tratado como sendo de menor potencial ofensivo, e o agente era punido com a pena de detenção de 6 meses a 2 anos (admissível o sursis, a progressão de regime e a substituição da pena restritiva de direitos, se presentes as condições gerais do Código Penal) e a multa, de 20 a 50 dias-multa, calculados na forma do revogado art. 38 da Lei 6.368?76. Por ser tratado como crime de menor potencial ofensivo, sujeitava-se ao procedimento da Lei 9.099?95, incidindo igualmente seus institutos despenalizadores, desde que preenchidos os requisitos legais.

No entanto, a Lei n. 11.343?06 trouxe notáveis modificações quanto a este aspecto, sendo que para as condutas previstas no §1º do artigo 28, passou a prever as penas de: I – advertência sobre os efeitos das drogas; II – prestação de serviços à comunidade; III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

Observando estas novas penas, há de se observar que a nova lei retirou qualquer possibilidade de imposição de pena privativa de liberdade para aquele que adquire, guarda, traz consigo, transporta ou tem em depósito, de droga para consumo pessoal ou para aquele que pratica a conduta equiparada (§1º).           

As condutas trazidas no artigo 28, admitem apenas a forma dolosa, ou seja, o agente deve saber e querer ter a posse de droga, não se admitindo assim a forma culposa do delito. Sendo assim, o agente que tiver a posse da droga sem saber do que se trata, encontra-se em erro de tipo. Por outro lado, se o agente sabe que está portando a droga, mas acredita que ela não é proibida, estaremos diante de erro de proibição.

O tipo necessita ainda, de outro elemento subjetivo, sendo este, de extrema importância e elemento diferenciador. Somente quem tem o objetivo de consumir a droga sem autorização ou em desacordo com determinação legal é que pode ser sujeito ativo desta conduta, ou seja, a intenção especial do agente em possuir a droga para consumo pessoal. Assim, se o sujeito tem a posse da droga para destiná-las a terceiro, a tipificação será conduta prevista no artigo 33, não incidindo mais o artigo 28. Este é o chamado dolo específico, que para alguns doutrinadores o tipo requer tal tipo doloso.

Em relação à conduta, temos como sujeito ativo qualquer pessoa. Tratando-se do sujeito passivo, temos a coletividade.

Como elemento normativo, observa-se a expressão “sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”, cabendo ao julgador verificar a ocorrência ou não de tal elemento.

O uso de drogas é considerado um delito de mera conduta, ou seja, basta cometer a conduta para configurar e consumir o delito. Sendo assim, não é necessária a prova de nenhum perigo concreto. O objeto material da infração é a droga, portanto, se esta não for apreendida, será impossível a comprovação da materialidade do delito.

Tratando-se da tentativa do crime, na conduta adquirir, é possível que alguém seja surpreendido tentando adquirir a droga. Neste caso, se ocorrer o crime na sua forma tentada, a aplicação da redução da pena com o redutor de 1/3 e 2/3 previsto no §único do art. 14 do CP, por não existir mais pena privativa de liberdade, se realizaria da seguinte forma: quanto à prestação de serviços à comunidade e imposição de medida educativa, é possível realizar a dosagem da pena dentro dos prazos estabelecidos em lei (5 meses se primário; 10 meses se reincidente). Já em relação à advertência, isso não é possível ocorrer, e esta deverá ser aplicada sem qualquer diminuição. Tais penas poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, bem como substituídas a qualquer tempo, ouvidos o Ministério Público e o defensor.

Imagine que o agente descumpra a imposição de uma das penas, a exemplo de não comparecer para ser advertido, não prestar serviço que fora designado a prestação, o que fará o juiz? O magistrado poderá submetê-lo sucessivamente, a admoestação verbal e em sequência à multa. Essa multa nunca poderá ser imposta com quantidade inferior à 40 (quarenta) nem superior a 100 (cem) dias-multa, atribuindo sucessivamente, respeitando a capacidade econômica de cada agente, o valor de trinta avos até três vezes o valor do maior salário mínimo. É importante demonstrar que tais valores são revertidos e creditados à conta do Fundo Nacional Antidrogas.

Com a unificação das matérias tratadas nas Leis n. 6.368/76, e n. 10.409/2.002 – que foram expressamente revogadas - feita por meio do advento da Lei 11.343/2.006, legitimou-se, também, no ordenamento jurídico brasileiro a política criminal da justiça terapêutica em relação ao tratamento concedido ao usuário e dependente de drogas, constituindo-se em uma das principais inovações da nova legislação.

Em razão disso, quanto ao usuário, ocorreu uma novatio legis in mellius, recebendo um tratamento diferenciado, tendo em vista que a nova lei revelou-se muito mais benéfica à anterior. Sendo assim, tal lei vem revestida do caráter retroativo pleno, abrangendo desde o condenado até aquele que está sendo investigado em inquérito policial.

1.1    Posse de droga para consumo pessoal: descriminalização ou despenalização?

Em decorrência da redação o artigo 28 e das novas sanções previstas, gerou-se uma grande polêmica: Teria a Lei n. 11.343?2.006 descriminalizado ou despenalizado a posse de drogas para consumo pessoal?

Discute-se este assunto, pois a lei só previu penas restritivas de direito (advertência, prestação de serviço à comunidade e medida educativa), sem a possibilidade de aplicação de pena privativa de liberdade.

É importante distinguir o termo “descriminalizar” e “despenalizar”. Trata-se de descriminalização quando ocorre uma abolição à criminalização, tornando a ação jurídico-penalmente irrelevante. Já a despenalização, é a substituição (legislativa ou judicial) da pena de prisão por penas de outra natureza (restritiva de direito, etc.). Sendo assim, se com a descriminalização o fato deixa de ser infração penal (crime ou contravenção), com a despenalização a conduta permanece criminosa.

Nucci critica o novo tratamento conferido ao usuário, pela “brandura da punição com resultado imponderável”. Para o autor, o usuário de drogas assemelha-se ao “doente mental”. Seguindo essa linha de raciocínio, assevera: “parece que, temendo a reação social à eventual descriminalização da conduta do consumidor de drogas, o legislador preferiu eliminar a pena privativa de liberdade, optando por outras formas de sanção extremamente brandas”. E conclui:

[...] A falta de efetiva punição ao usuário de drogas (não estamos falando do dependente, que é viciado, logo, doente mental) pode levar, se houver rejeição à idéia lançada pelo legislador, os operadores do Direito, com beneplácito da sociedade, ao maior enquadramento dos usuários como traficantes. Essa medida pode desvirtuar as finalidades do novo art. 28 desta Lei, prejudicando, enormemente, o âmbito da punição justa em matéria de crime envolvendo o uso de drogas ilícitas. (2006, p. 756).

Na visão de Carlos Bacila e Paulo Rangel (2007, p. 43):

[...] assim como ninguém conceberia punir criminalmente um dependente de álcool, parece errôneo tipificar a conduta do dependente de drogas ou daqueles que as usam eventualmente. Contudo, não se pode também deixar de compreender que o usuário de droga sustenta o tráfico, gera problemas para a família, para a sociedade e, de certo modo, por uma questão humanitária, não se pode esquecer que a autolesão que pratica afeta a todos de um jeito ou de outro.

Seguindo essa linha, os autores acima referidos defendem que a melhor maneira de lidar com tal questão é ver o usuário como um dependente químico - e não como um criminoso que deve ser punido a qualquer custo - tratando-o com responsabilidade.

Nesse sentido Luiz Flávio Gomes (2004, p. 118 e 119) profere:

[...] Se as penas cominadas para a posse de droga para consumo pessoal são exclusivamente alternativas, não há que se falar em “crime” ou em “contravenção penal”, consequentemente, o art. 28 contempla uma infração sui generis (uma terceira categoria, que não se confunde nem com o crime nem com a contravenção penal).           

Já Fernando Capez (2012, p.67), entende que:

[...] não houve a descriminalização da conduta. O fato continua a ter natureza de crime, na medida em que a própria Lei o inseriu no capitulo relativo aos crimes e as penas (Capítulo III); além do que as sanções só podem ser aplicadas por juiz criminal e não por autoridade administrativa, e mediante o devido processo legal (no caso, o procedimento criminal do Juizado Especial Criminal, conforme expressa determinação legal do art. 48, §1º, da nova Lei). A Lei de Introdução ao Código Penal está ultrapassada nesse aspecto e não pode ditar os parâmetros para a nova tipificação legal do século XXI.

Convém ainda salientar que o fato não perdeu seu caráter ilícito, pois a posse de drogas não foi legalizada. Constitui sim um fato ilícito, porém, de natureza sui gerenis.

Mas, o Supremo Tribunal Federal decidiu que “o que houve foi uma despenalização, cujo traço marcante foi o rompimento – antes existente apenas com relação às pessoas jurídicas e, ainda assim, por uma impossibilidade material de execução (CF/88, art. 225, §3º); Lei 9.605/98, arts. 3º; 21/24) – da tradição da imposição de penas privativas de liberdade como sanção principal ou substitutiva de toda infração penal”.

Realmente, o que ocorreu foi uma mera despenalização, já que o conceito de infração penal é essencialmente formal: crime é o que a lei declara como tal, independentemente da espécie de pena que lhe é cominada. O que realmente interessa para a definição legal do crime não é a espécie cominada, mas sim os seus pressupostos legais formais.

É importante ainda ressaltar que o rol das penas constitucionais é meramente exemplificativo, e não taxativo, sendo assim o legislador pode a qualquer momento, criar outros tipos de penas, desde que respeite a dignidade da pessoa humana e o principio da humanidade das penas.

Visa-se ainda que como o art. 28 não cominou pena privativa de liberdade, não implicou o abolitio criminis, mas simples despenalização, ou seja, manteve-se a criminalização, porém com a vedação da pena privativa de liberdade.

É importante frisar as três penas que são aplicadas de acordo com a lei vigente, e são elas:

I – advertência sobre os efeitos das drogas

II – prestação de serviços à comunidade: será aplicada pelo prazo de 05 meses, se primário, 10 meses se reincidente (cf. §§3º e 4º, do art. 28). Será cumprida em programas comunitários, entidades educacionais ou assistenciais, hospitais, estabelecimentos congêneres, públicos ou privados sem fins lucrativos, que se ocupem, preferencialmente, da prevenção do consumo ou da recuperação de usuários e dependentes de drogas (cf. §5º). Não se aplica aqui a regra do art. 46 do CP.

III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo: será aplicada no prazo de 05 meses, se primário; 10 meses, se reincidente.

Quando a lei menciona a reincidência, estaria ela se referindo ao reincidente específico?

Alguns respeitáveis doutrinadores, como Luiz Flávio Gomes, a lei estaria somente se referindo ao reincidente específico do artigo 28 da Lei n. 11.343?2.006. Já para Fernando Capez, a lei não estabeleceu essa exigência, mencionando apenas genericamente a palavra reincidente. Diz ainda, que qualquer forma de reincidência torna incidente o §4º do art. 28, do contrário, a lei estaria punindo com mais rigor o reincidente em detenção de droga para fins de uso, do que o infrator que tivesse condenação anterior por crimes mais graves, violando assim o princípio constitucional da proporcionalidade.           

1.2    Identificação do usuário

Com relação à identificação do usuário, cabe a análise da redação do §2º, do mesmo artigo 28, ao juiz para verificar se a droga destinava-se a consumo pessoal ou não. Ou seja, para o magistrado saber qual o destino que alguém que está transportando a droga quer dar a ela, deve analisar o artigo em questão. Para tanto, deverá analisar a natureza e a quantidade da substância apreendida, o local e as condições em que se desenvolveu a ação, as circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e os antecedentes do agente. Todos os elementos deverão ser analisados conjuntamente, não bastando apenas a existência de um elemento na determinação.

Destaca-se as circunstâncias sociais e pessoais e o local, no trecho acima, para que desde já chame-se atenção quanto à seletividade desta normal penal.

Por mais que a lei diga que quem deverá identificar o usuário é o juiz, sabemos que na prática, a identificação é feita por meio da polícia no momento em que os policiais efetuam a prisão (ou encaminham à Delegacia, no caso de considerarem ser uso de drogas, haja vista que não se impõe flagrante ao usuário) e é o Delegado de Polícia que conduz o inquérito policial (ou é o responsável pelo Termo Circunstanciado, no caso de entender que a hipótese é de consumo e não de tráfico). Sendo assim, a diferenciação começa já na abordagem do sujeito encontrado com a droga e não apenas no momento em que o juiz vai julgar a ação.

1.3    Conduta equiparada – Plantio para consumo pessoal (art. 28, §1º)

Com a vigência da Lei n. 11.343?2.006, houve uma grande inovação legal em relação as condutas previstas no artigo 28. Passou-se a incriminar a conduta de semear, cultivar ou colher, para consumo pessoal, plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica.

Antes da vigência desta nova lei, quando ainda vigorava a Lei n. 6.368/76, a conduta prevista em seu artigo 12,§1º era a de semear, cultivar ou fazer a colheita de planta destinada à preparação de entorpecente ou de substância que determine dependência física ou psíquica. Porém, essa conduta constituía crime equiparado ao tráfico, de maneira que se discutia se a conduta de semear, cultivar ou fazer a colheita para uso próprio configurava o crime do art. 12, §1º ou o revogado art. 16 (porte de drogas para uso próprio).

Existiam três fortes correntes que transcreviam à respeito do tema abordado. A primeira dizia que o fato era atípico. Para a segunda posição, o fato enquadrava-se no artigo 12, §1º, II. Já para a terceira e dominante corrente, o fato configurava o delito previsto no art. 16, com a justificativa a incidência da analogia in bona partem, ou seja, como não existia uma conduta especifica para o plantio para uso próprio, por analogia, equiparava-se às condutas previstas no artigo 16 (trazer consigo, guardar e adquirir para uso próprio) para que não configurasse um mal maior ao agente, que se enquadrado analogicamente ao crime de tráfico, seria prejudicado.

Porém, para evitar maiores discussões, este problema foi resolvido com o advento da Lei n. 11.343/2.006, que passou a configurar crime previsto no artigo 28, §1º de maneira expressa, o plantio para fins de uso próprio.

É importante destacar que, é um fator de fundamental relevância para que o tipo do artigo 28, §1º da Lei 11.343/2.006 afaste a aplicação do crime do artigo 33, §1º, II da mesma lei é a caracterização da pequena quantidade de drogas. Salienta-se ainda que para cada tipo de droga é fixado um critério diferente para se afirmar o que se considera pequena quantidade. 

1.4    Procedimento

Por se tratar de infração de menor potencial ofensivo, o art. 28 da Lei n. 11.343/2.006 está sujeito ao procedimento da Lei dos Juizados Especiais Criminais (Lei n. 9.099/95), por expressa previsão legal, salvo se houver concurso com os crimes previstos nos arts. 33 a 37 da referida lei.

Incidirá no caso, a regra disposta no art. 60 da Lei n. 9.099/95, com redação determinada pela Lei n. 11.343/2.006:

O Juizado Especial Criminal, provido por juízes togados ou togados e leigos, tem competência para a conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão e continência. Parágrafo único: Na reunião de processos, perante o juízo comum ou o tribunal do júri, decorrentes da aplicação das regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos da transação penal e da composição de danos civis.

É importante ressaltar que o disposto no art. 33, §2º (cessão ocasional e gratuita de drogas) configura infração de menor potencial ofensivo, e portanto o concurso dessa modalidade com o art. 28 não afastará a competência dos Juizados Especiais  Criminais,  o que vai contra o que se entende à redação do dispositivo do art. 48, o qual no que diz respeito ao artigo 33, refere-se apenas quanto ao caput e §1º.

1.5    Prisão em flagrante

No que diz respeito à prisão em flagrante e o art. 28 da lei em questão, é importante destacar que não se aplicará em nenhum caso a prisão em flagrante, devendo o autor do faro ser imediatamente encaminhado ao juízo competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e pericias necessárias.

A prisão em flagrante será apenas possível quando o autor se recusar a assumir o compromisso de comparecer em juízo, conforme está disciplinado no art. 69, §único da Lei 9.099/95.

O mais importante em se destacar é que o agente que for surpreendido com a posse de droga para consumo pessoal, por expressa disposição legal jamais poderá ter como pena imposta a privativa de liberdade, mas sim apenas poderá estar sujeito às medidas educativas. Sendo assim, não é admissível que o indivíduo seja preso em flagrante ou provisoriamente, sendo que nem no final poderá ocorrer este tipo de pena, sequer à primeira vista.

1.6    Critérios para aferir o consumo pessoal 

É nítida a dificuldade para diferenciar o crime do artigo 28 do crime do artigo 33, já que normalmente o que ocorre é o julgamento precipitado por conta das aparências e do local em que se foi apreendida a droga. A diferença reside no dolo, devendo ser investigado se ele é para o uso ou para o comércio. A promoção da circulabilidade é um elemento objetivo importante para se aferir o dolo no caso concreto.

O que ocorre na realidade é que “os usuários flagrados na posse de drogas continuam sujeitos ao arbítrio da polícia na prisão em flagrante (e depois, ao arbítrio do juiz), pela falta de critério legal para determinar se a droga apreendida era destinado ao consumo ou ao tráfico”, haja vista que os critérios estabelecidos no artigo 28, §2º da Lei 11.343/2.006 são extremamente genéricos e é bastante subjetivo de modo que não impedem os desvios de finalidade.

Sendo assim, é imprescindível acentuar os elementos do tipo do artigo 28, não só para a sua configuração, mas também para que haja uma tentativa de diferenciar com menor imprecisão as condutas do artigo 33, já que em sua redação ambos artigos possuem diversos núcleos do tipo iguais.

Para verificar se a droga apreendida destina-se ao consumo pessoal ou ao mercado, o que modifica drasticamente seu enfoque penal, o juiz tem a sua disposição no artigo 28, §2º da Lei 11.343/2.006, alguns nortes que deverão ser sobrepesado. São eles: I) a natureza das drogas; II) quantidade da substância apreendida; III) o local da apreensão; IV) as condições em que os fatos se desenvolveram; V) as circunstâncias sociais concretas; VI) a conduta do agente; VII) os antecedentes do agente.

Cada caso fático tem o seu peso e devem ser explorados e fundamentados pelo magistrado para que se atinja um maior grau de transparência, já que o princípio constitucional da presunção da inocência impõe valoração benéfica ao perseguido penal para as situações em que não haja elementos de informação nos autos.

1.7    Antecedentes 

Mesmo que seja explorado o critério dos antecedentes, somente se houver condenação penal irrecorrível em fatos ligados ao tráfico de drogas é que ao antecedentes podem servir de indicador contrário ao consumo e, mesmo assim, desde que haja coerência com os demais elementos de informação colhidos.


TRAFICANTE 

O tráfico de drogas encontra-se previsto no artigo 33, caput, e é caracterizado pelas seguintes condutas: importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Trata-se da modalidade do tipo misto alternativo, de modo que a prática de mais de uma conduta não implica concurso de crimes, mas um único crime.

Nas mesmas penas incorre quem importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas; utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, u consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas, segundo o parágrafo primeiro do artigo 33.

A lei equipara ao tráfico, em seu artigo 34, as condutas que consistem em fabricar, adquirir, utilizar, transportar, vender, distribuir, entregar a qualquer título, possuir, guardar ou fornecer, ainda que gratuitamente, maquinário, aparelho, instrumento ou qualquer objeto destinado à fabricação, preparação, produção ou transformação de drogas, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Ainda aquele que, conforme o artigo 37 da mesma lei, colaborar, como informante, com grupo, organização ou associação destinados à pratica de qualquer dos crimes previstos nos artigos 33, caput e §1º, e 34, da Lei 11.343/2.006, também tem sua conduta equiparada à do traficante.

Salienta-se ainda que as condutas previstas nos artigos 35 e 36 também sofrerão os mesmos rigores penais destinados às condutas descritas no artigo 33, caput, e parágrafo primeiro, no art. 34 e no art. 37, ou seja, no caso de associação de duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos artigos 33, caput e §1º, e 34, bem como de associação para a prática reiterada do crime definido no art. 36, e nas hipóteses de financiamento ou custeio da prática de qualquer dos crimes previstos nos artigos 33, caput e §1º, e 34 da Lei de Drogas, não será permitida a concessão de fiança, sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória e ainda será vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.

É importante lembrar ainda que também há restrição ao livramento condicional, que só será concedido após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao reincidente específico, conforme artigo 44 da Lei 11.343/2.006.

Deste modo, fica fácil observar que o legislador concedeu ao usuário de drogas o direito de não ser submetido à pena de prisão e ao traficante, além do aumento das penas, proibiu a concessão de benefícios que não são restringidos nem mesmo pela Lei n. 8.072/1.990, a qual trata dos crimes hediondos, como por exemplo, a possibilidade de sursis e de penas restritivas de direitos.

O tráfico ilícito previsto no art. 33, é o tipo legal fundamental para os efeitos da ocorrência do crime de tráfico, já que os demais o pressupõem, direta ou indiretamente. Trata-se de uma lei penal em branco heterogênea, já que a norma primária, por ser incompleta, remete à complementação a um preceito de grau inferior, o qual é encontrado em uma portaria da ANVISA, já que a lei não informa quais são exatamente as drogas por ela proibidas. Cabe ao Ministério da Saúde, por consequência, publicar periodicamente listas atualizadas sobre as substancias e produtos considerados drogas.

O art. 1º, parágrafo único da referida Lei, restringe-se em dizer que “para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União”. Desta forma, o conceito de drogas é antes de tudo um conceito jurídico.

De acordo com Antônio Escohotado (2008, p. 1188), antes de surgirem leis repressivas, a definição de droga geralmente admitida era grega. Phármakon era, então, uma substância que compreendia remédio e veneno; não uma coisa ou outra, mas ambas. Como disse Paracelso, “só a dose faz de algo veneno”. Por isso, quem busca objetividade, tratará, escreve Escohotado, de não misturar ética, direito e química.

Embora, seja decisivo ter sempre presente que qualquer droga possui um potencial veneno e um potencial remédio, e o fato de ser nociva ou benéfica em cada caso depende exclusivamente de: a) as condições de acesso ao produto e as pautas culturais de uso; b) a dose; c) a ocasião em que se usa; d) o grau de pureza da substância.

Por ser constituída de um conceito técnico-jurídico, só é droga o que a lei declara como tal. Sendo assim, mesmo que a substância cause uma dependência física ou psíquica, se ela não se encontra no rol das substancia legalmente proibidas, ela não será tratada como se droga fosse, como exemplo disso, o álcool. E também, ainda que faça parte das elencadas como substâncias definidas juridicamente como droga, não haverá crime sempre que o agente dispuser de autorização legal ou regulamentar para tanto, como ocorre com os remédios.

Afinal, o tráfico ilícito e equiparados pressupõem, necessariamente que a ação seja praticada “sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”, já que este é o elemento normativo do tipo.

Neste crime, o elemento subjetivo é o dolo, ou seja, há a necessidade de vontade do agente para que possa ser configurada a conduta ilícita.

2.1 - Das condutas previstas no artigo 33 da Lei nº 11.343/06 

Após tais conceituações, torna-se relevante expor a configuração de cada uma das condutas previstas no artigo 33.

Começando com a conduta de importar, que se trata de inserir a droga no pais, nas mais diversas maneiras possíveis. Tal ação consuma-se com a efetiva entrada da droga. A tentativa em tese, é permitida quando por circunstâncias alheias se impede a entrada da droga do pais.

Exportar é tirar a droga do pais para que esta entre em outros países, nas mais diversas formas possíveis. Consuma-se com a efetiva saída da droga do país. É possível a tentativa quando a droga não sai por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Já remeter, é enviar a substância por terceiros ou também via entrega pela empresa de correios, sempre ocorrendo a ação dentro do país. A sua consumação se retrata com a efetiva remessa. Também neste caso admite-se a tentativa quando ocorrem situações alheias à vontade do agente.

Por sua vez, preparar, como já se entende pelo próprio nome, significa o ato de misturar a substância para se chegar à droga. Como diz Damásio de Jesus (2009, p. 34), consuma-se a ação quando “o sujeito compõe o objeto material”. Admite-se a tentativa no crime instantâneo e não no permanente, quando se evita a preparação por fatos que saem da esfera do agente.

Já se tratando da conduta produzir, o entendimento é diverso, pois nesta não há mistura de substâncias, mas parte-se do ponto zero para que a droga passe a existir. Como expõe Gilberto Thums e Vilmar Velho Pachecho Filho (2004, p. 23), “produzir seria um ato de invenção ou descoberta”. Ocorre a consumação com a efetiva criação da droga, e em tese, a preparação permite tentativa.

A fabricação se traduz na fabricação em massa, com o uso de maquinários ou instrumentos próprios para a produção industrial. Consuma-se apenas com a efetiva produção em massa da droga. Neste caso também é permitida a tentativa no caso de circunstâncias alheias à vontade do agente.

Já se referindo à aquisição, esta ocorre quando a pessoa, mediante troca ou compra com dinheiro ou outro produto ou serviço, tem acesso à posse da substância. É importante destacar aqui que abrange o ato gratuito, não necessitando neste caso da onerosidade da ação. Sua consumação se dá com o recebimento da droga e, com a interrupção do mesmo por fatos alheios ao adquirente há a tentativa.

Vindo em contrário à aquisição, está a conduta de vender. Nesta, o agente realiza a entrega da substância mediante remuneração em dinheiro ou com outros bens ou serviços. Também nesta conduta está inserida a troca. Com o recebimento da remuneração, dos bens ou dos serviços se tem configurada a consumação. Também neste caso se permite a tentativa no caso de circunstancias alheias à vontade do agente.

É importante salientar ainda que não se confunde a venda com a exposição expor à venda, pois nesta conduta basta à vontade do agente de mostrar a droga com o intuito de mercancia. Esta conduta consuma-se com o ato de exposição e somente em especulação cerebrina há a possibilidade de tentativa.

Tratando da conduta oferecer, para que esta seja configurada, basta o ato de sugestão, de oferta para a aquisição do produto, mesmo que tal ato tenha natureza gratuita, já que é com o mero oferecimento “inocente” que se inicia a teia de captação dos usuários e possíveis dependentes. Tal conduta se consuma com o oferecimento, e não há que se falar neste caso em tentativa, já que se a interrupção se dá antes do oferecimento, a conduta fica na alçada da cogitação ou de atos preparatórios, à exemplo do oferecimento feito por escrito.

A conduta fornecer drogas, insinua o ato de entrega constante e habitual à terceira pessoa de drogas. Esta conduta pode ser ou não onerosa, conforme disposto no artigo 33 da Lei 11.343/2.006, ao prever a possibilidade do fornecimento da droga ainda que gratuitamente.

De acordo com Gilberto Thums e Vilmar Velho Pacheco Filho (2004, p. 25), representa “a ação de quem abastece, como se fosse uma fonte, isto quer dizer, que tem como intuito à entrega reiterada, continuada”.

Vale observar que a determinada conduta, quando despida do seu caráter econômico, como disposto no artigo 33 da Lei 11.343/2.006, não se acomoda na noção conceitual de tráfico de drogas e, portanto, não recebe o tratamento de conduta equiparada aos dos crimes hediondos. Quem pratica a conduta gratuita não trafica, mas dá sem qualquer contraprestação. Quanto à tentativa, como o fornecimento demanda entrega habitual, esta não será admitida.

Referindo-se da conduta entregar à consumo, esta pode ser entendida como o ato de fazer chegar a droga ao consumidor, e deve ser interpretada de maneira que seja uma conduta esporádica, já que, se fosse habitual, o núcleo do tipo se deslocaria para o fornecimento, e não mais à entrega. Sua consumação se dá com a chegada da droga ao consumidor. A tentativa neste caso, é permitida quando a droga não chega por fatos alheios que não passa pelo controle do agente.

Nesta hipótese se enquadram os casos nos quais familiares entregam drogas para o consumo de reeducando. Existem decisões que tratam de politica criminal, que desclassificam a conduta para o tipo do consumo.

Na lição de Vicente Greco Filho (2011, p. 58), a conduta ter em depósito, tem o conteúdo físico de detenção com “um sentido de provisoriedade e mobilidade do depósito”. Por ser um crime permanente, neste caso não é admitida a tentativa, já que ao consumir a droga, mesmo que de maneira provisória o crime se consuma. No caso da pessoa já ter a intenção de ter em depósito antes de tê-la, não há que se referir à tentativa, mas mera cogitação.

Guardar tem o mesmo significado de detenção, contudo, em um sentido mais genérico. Conforme Damásio de Jesus (2009, p. 29), esta conduta pode ou não ser permanente, e sendo uma ou outra, o efeito prático é o mesmo, sendo irrelevante se a intenção de detenção de forma é provisória ou permanente. O que é indispensável para a configuração deste tipo penal, é a detenção, o contato com a droga e por isso, não se admite a tentativa, já que não havendo o contato, não se trata do núcleo do tipo guardar.

Já transportar é a conduta de deslocar-se com a substância. Não poderá ser utilizado como “meio de transporte” o corpo, já que neste caso se configura outro tipo, o de trazer consigo. Por se tratar de crime permanente, sua consumação se dá com o efetivo deslocamento. A doutrina entende inadmissível a tentativa.

No núcleo do tipo trazer consigo a pessoa tem a droga em seu poder físico. Conforme ensinamento de Gilberto Thums e Vilmar Velho Pacheco Filho (2004, p. 27), normalmente o trazer consigo implica em se colocar a droga “junto ao corpo, nas vestes, na bolsa, na mala, colada ao próprio corpo com fitas adesivas, às vezes até nas entranhas do corpo (vagina, ânus)”. Não há que se falar em tentativa.

Na conduta prescrever há a configuração do núcleo do tipo quando alguém recomenda ou receita a droga. O crime se consuma com o recebimento da receita escrita ou oral, e é admitida a tentativa.

Ao passo que na conduta de ministrar, que indica um ato de aplicação, de fazer alguém tomar via oral ou por inoculação via injeção. Para Thums e Pacheco Filho (2004, p. 28), para que se configure tal crime, é necessário que exista especial condição. Consuma-se com a aplicação ou inoculação da droga. A tentativa neste caso é improvável.

2.2    Tráfico Privilegiado

O art. 33, §3º, prevê uma nova figura típica, sem correspondente na lei anterior – tráfico privilegiado, qual seja, “oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para juntos consumirem”.

Para a caracterização deste tipo penal, o de crime de tráfico privilegiado, são exigidos dois elementos subjetivos do tipo. O primeiro deles, é denominado de elemento subjetivo do positivo, e consiste no “para juntos consumirem”. O segundo, é o chamado de elemento subjetivo negativo, “sem objetivo de lucro”, logo, a intenção do agente é o consumo de drogas, e não a sua mercancia.

Ainda para sua caracterização, é importante observar que o oferecimento deve dar-se “eventualmente”, posto que a habitualidade caracteriza crime de tráfico.

A conduta típica “oferecer” indica que o crime é formal, consumando-se independentemente da ocorrência do resultado naturalístico, que seria a aceitação e consumo conjunto da droga.

Contudo, caso o agente, para oferecer a droga à pessoa de seu relacionamento, para juntos consumirem e inexistindo o objetivo de lucro, antes a tiver trazido consigo, para consumo pessoal, estaremos diante de concurso material de crimes, aplicando-se a pena cumulativamente.

Por tratar-se de crime de menor potencial ofensivo, tal conduta sujeita-se ao procedimento da Lei n. 9.099/95.

Causas de diminuição de pena

Quanto às causas de diminuição de pena, prevista no §4º do art. 33 da nova lei, preleciona Andreucci (2009, p. 124):

Para que o agente obtenha a redução de pena, deve satisfazer os seguintes requisitos:

a)             Ser primário;

b)             Possuir bons antecedentes;

c)              Não se dedicar às atividades criminosas;

d)             Não integrar organização criminosa.

É importante observar que as cláusulas negativas destacadas nas letras “c” e “d”, objetivam o favorecimento do agente. Caberá ao Ministério Público provar as referidas cláusulas, já que, com a ausência desta prova, a aplicação da diminuição será inafastável, porque satisfeitos os demais requisitos legais. Essa inafastabilidade, trata-se de novatio legis in mellius, de aplicação imediata aos processos em andamento e, ainda, de retroatividade obrigatória.

Desta forma, ensina o referido doutrinador (2009, p. 127):

Ressalta-se, entretanto, que a causa de diminuição não poderá incidir, nos processos em curso ou já julgados, sobre a pena de 03 a 15 anos fixada pelo art. 12 da Lei n. 6.368/76, mas sim sobre o novo montante de 05 a 15 anos. Assim, se o agente, no processo em curso, foi denunciado pela prática do art. 12 da Lei n. 6.368/76, não pode pretender a aplicação da causa de diminuição sobre a pena mínima de 03 anos, se satisfeitos os requisitos do §4º do art. 33. Nesse caso, se o juiz aplicar a nova causa de diminuição, deverá calculá-la tendo como base a pena mínima de 05 anos.

2.4    Classificação dos crimes           

Conforme todo exposto acima, pode-se concluir que os crimes de tráfico e afins consumam-se com a realização de quaisquer das ações típicas (adquirir, receber, ocultar, etc.). Nos casos em que o tipo prevê vários verbos, se num mesmo contexto o agente praticar várias ações, haverá delito único (guardou, adquiriu, etc.), por se tratar de crime de múltipla ação ou de conteúdo variado.

Como é a maioria dos tipos penais da Lei, nos crimes de múltipla ação, a tentativa é tecnicamente possível. Haverá tentativa sempre que o agente, tendo iniciado o cometimento de uma ação típica determinada (remeter, transportar, importar, etc.) não lograr consumá-la por circunstâncias alheias à sua vontade.

De acordo com Alexandre Bizzotto, Andrea de Brito Rodrigues e Paulo Queiroz (2010, p. 83), o único crime que não admite tentativa é prescrição culposa de droga (art. 38), visto que os crimes culposos são incompatíveis com a tentativa, instituto que diz respeito aos delitos dolosos, exclusivamente.

Quanto ao fato de o tráfico ser classificável como crime de mera conduta – ou formal, conforme alguns autores -, isso não constitui obstáculo à admissão da tentativa, pois como assinala Juarez Tavares (2009, p. 28):

[...] nos delitos chamados de mera atividade, é admissível a tentativa, que se produz no momento em que o agente dá inicio à ação, mas ainda não consegue conduzi-la de conformidade com a descrição típica. Por exemplo, no crime de violação de domicilio (art. 150), haverá tentativa quando o agente tenha já colocado um pé dentro da residência alheia, mas ainda sem haver transpostos integralmente a soleira de sua porta.

Por ser crime de perigo abstrato ou de mera conduta, tradicionalmente não tem sido admitida a utilização do principio da insignificância para as condutas hoje descritas no artigo 33 da Lei 11.343/2.006, haja vista não importar a quantidade de drogas para a provocação do perigo abstrato.

Em resumo, a consumação se dá com a prática de qualquer das condutas previstas da figura típica, independentemente de qualquer outro resultado. É importante salientar que, dentre os dezoito núcleos integrantes do art. 33, há aqueles que constituem crimes instantâneos (adquirir, vender, fornecer, etc..) e outras que constituem crimes permanentes (guardar, expor à venda, ter em depósito, etc..). É importante identificar de que tipo de crime se trata, já que a tentativa só será permitida no caso dos crimes instantâneos, e não nos permanentes.

Contudo, existe entendimento contrário à este, no sentido da inadmissibilidade da tentativa no crime de tráfico, independente de ser crime instantâneo ou permanente. Tal entendimento se explica em razão da multiplicidade de condutas incriminadoras (RT, 777/724 e 613/288).

Nesse sentido, o TJSC – JC, 61/279:

A jurisprudência e a doutrina predominantes não admitem a tentativa de tráfico de entorpecente. Evidenciado o começo de execução já se tem o crime por consumado. Isto porque o delito em questão constitui-se de ações múltiplas, bastando, para sua configuração, que a conduta do agente seja subsumida numa das ações expressas pelos verbos empregados no art. 13 da Lei n. 6.368/76, o que afasta a tentativa. Ademais, neste tipo de crime, o bem jurídico tutelado é a saúde pública, cujo objetivo da lei é evitar o dano para a saúde, que o uso das drogas causa, sendo prescindível, a ocorrência efetiva de dano, para a configuração do delito, o que afasta a admissibilidade do ‘conatus’.

O tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins é um crime equiparado a hediondo, conforme art. 2º da Lei n. 8.072/90. Crime equiparado a hediondo, hediondo é.

A Lei 11.343/06 não diz expressamente o que se pode entender por tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins. Apesar de não usar nomen juris para a designação dos delitos de que se ocupa, considera-se como tráfico ilícito de droga, em sentido amplo, os crimes previstos nos arts. 33, caput e §1º, e 34, 35, 36 e 37, os quais são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direito (art. 44).

Pode-se chegar à essa conclusão, após a leitura do Titulo IV (da repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas) e Capitulo II (dos crimes) e art. 44 da referida lei.

Nem tudo que é previsto nestes artigos é rigorosamente considerado tráfico de droga, o fato é que o que a lei equipara a tráfico, tráfico é, o que não quer dizer que essa equiparação seja conforme a Constituição Federal.

A legislação só não equiparou a hediondo os crimes dos arts. 28, e §1º (posse para cosumo), 33, §§2º e 3º (auxílio ao uso e uso compartilhado), 38 (prescrição culposa de droga) e 39 (conduzir embarcação ou aeronave após o consumo de droga). Portanto, em regra ocorre a equiparação à hediondo; a não-equiparação é a exceção.

De acordo com Alexandre Bizzotto, Andrea de Brito Rodrigues e Paulo Queiroz (2010, p. 55):

[...] nem tudo que a lei equiparou ao tráfico, tráfico de droga é, logo, não era passível de equiparação a hediondo, sob pena de violação à Constituição Federal. Com efeito, parte dessa equiparação contravém a Constituição Federal, em seu artigo 5º, XLIII, o qual dispõe:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;

Tal inciso fala especificamente de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, razão pela qual a Carta Magna deve ser interpretada restritivamente, de modo a afastar o pretendido caráter hediondo de todos os delitos que não sejam subsumíveis neste conceito estrito.

O tratamento que a lei dá para alguns casos, também é abusivo ao equipará-los, ao tráfico atos meramente preparatórios para o tráfico, violando o principio da proporcionalidade (proibição de excesso).

Por ser uma de suas possíveis formas, apesar de constituir um tipo penal autônomo, a única equiparação a crime hediondo compatível com a Constituição Federal, é o financiamento para o tráfico (art. 36).

Seja como for, nos crimes hediondos ou equiparados a hediondos, o livramento condicional é possível desde que o agente tenha cumprido mais de 2/3 da pena e não seja reincidente específico, isto é, reincidente em tráfico de droga ou outro crime hediondo à ele equiparado.

Com exceção da conduta prevista no art. 38 (prescrição culposa de droga), todos os crimes previstos na lei só são puníveis à titulo de dolo, isto é, quando o agente quer o resultado (dolo direto) ou assume o risco de produzi-lo (dolo eventual), à exemplo deste (dolo eventual) do sujeito que recebe, em condições suspeitas, expressiva quantia em pagamento para trazer uma mala para o Brasil cujo conteúdo não confere ou ignora, mas tendo fundada razão para saber que se trata de droga ilícita.

Para a configuração do dolo, é irrelevante que se objetive o lucro, bastando apenas que o agente pratique, voluntária e conscientemente, uma das ações típicas.

O elemento subjetivo é a vontade livremente dirigida a quaisquer das ações previstas no respectivo tipo. Conforme os ensinamentos de Nelson Hungria (1959, p. 155), sabendo o autor que se trata de droga e que procede sem autorização de quem de direito ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Havendo erro de tipo, não haverá dolo, pois faltarão seus elementos constitutivos: consciência e vontade de realizar os elementos do tipo. Sendo assim, a ação será atípica.

O tráfico é considerado tipo penal fundamental, já que todos os demais o pressupõem, direta ou indiretamente. Por este motivo, a configuração de alguns dos crimes previstos na lei pressupõe, a existência de crime anterior de tráfico, razão pela qual, se não restar caraterizado ou provado o delito principal, tampouco se poderá cogitar do crime acessório. Um exemplo disso é o financiamento para o tráfico, o qual requer prévia existência de tráfico e prova nesse sentido.

Nesse sentido, de acordo com o principio da subsidiariedade, em se consumando o tipo principal, haverá, como regra, crime único, e não concurso de crimes, exceto quando se tratar de ações claramente autônomas e distintas praticadas em contextos diversos.

Em regra, o crime de tráfico é considerado crime de perigo (abstrato) porque a lei presume, juris et de jure, que a produção, o comércio e o uso são nocivos à saúde, independentemente de prova em sentido contrário. Por se tratar de crime de perigo abstrato, é irrelevante que determinada droga ilícita seja incapaz de produzir, concretamente, danos à saúde do usuário ou de causar dependência, bastando o simples fato de figurar no rol das substâncias proibidas.

Nem mesmo prova no sentido contrário, de que a droga cause benefícios à saúde ou à vida de determinadas classe de usuários pode servir de pretexto à impunidade. Em resumo, a lei presume a lesividade da droga, independentemente de sê-lo concretamente.

Porém, existe uma exceção, a qual está prevista no art. 39 (conduzir embarcação ou aeronave sob o efeito de droga), por ser crime de perigo concreto, mesmo porque o bem jurídico protegido neste caso não é a saúde do agente, mas sim a segurança de transporte marítimo, fluvial ou aéreo e a incolumidade física das pessoas.

Sendo assim, são crimes de mera conduta, já que a lei não exige nenhum resultado naturalístico para a sua consumação, bastando o cometimento de uma das ações típicas descritas.

2.5    Das penas 

Diferentemente da lei anterior (Lei n. 6.368/76), a atual Lei n. 11.343/2.006, proíbe, expressa e terminantemente, quanto ao crime de tráfico e equiparados, a substituição da pena de prisão por pena restritiva de direito, além de considera-los inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, etc.

Sídio Rosa de Mesquita Júnior (2007, p. 78), entende, no entanto, que a lei não proíbe a substituição, mas a conversão, a cargo do juiz da execução:

[...] a Lei n. 11.343/2.006 não proíbe a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito. Por isso, ela só se volta ao juiz da Execução, não atingindo o Juiz criminal. Este, no momento da sentença, não encontrará obstáculo legal ao impor a norma de conteúdo material, isso em face do aspecto garantista da norma criminal.

Parece evidente, porém, que o legislador utilizou a expressão conversão no sentido de substituição.

Em se tratando do crime previsto no art. 33 (crime de tráfico), a vedação seria desnecessária, em virtude da severidade da pena mínima cominada, não fosse a possibilidade de aplicação de pena inferior a cinco aos de reclusão, conforme dispõe o §4º. Quanto aos crimes previstos nos arts. 34 e 37, equiparados ao tráfico, cuja pena mínima é de, respectivamente, três e dois anos de reclusão, não haveria em principio obstáculo à substituição, se a pena aplicada não exceder a quatro anos. (CP, art. 44, I).

No que diz respeito ao crime de tráfico de drogas (art. 33), a nova lei atribui tratamento mais rigoroso ao traficante, ocorrendo uma novatio in pejus, de maneira que a lei incide apenas em situações a partir de sua vigência.

Dá-se destaque para algumas figuras quanto ao rigor das novas penas, dentre elas:

Traficante – para ele, a pena é de reclusão de 5 a 15 anos, e a multa varia de 500 a 1.500 dias-multa. Todo aquele que trabalha fabricando ou transportando maquinários e aparatos para o tráfico, tem a pena de reclusão um pouco inferior, de 3 a 10 anos, mas a multa é mais gravosa, poia varia de 1.200 a 2.000 dias-multa.O legislador visa desestimular o aparelhamento do traficante sob o ponto de vista econômico. Outra conduta tipificada como tráfico, é a daquele que colabora com o traficante, cuja pena é um pouco inferior. Será de reclusão de 2 a 6 anos e, a multa um pouco reduzida, de 300 a 700 dias-multa.

 Incentivador – aquele que simplesmente oferece drogas, sem o intuito de lucro, para consumir com terceiro e que, na verdade, não é um traficante. A pena é de 6 meses a 1 ano e o pagamento de 700 a 1.500 dias-multa, tendo todos os benefícios da lei, já que não há qualquer conduta que configure tráfico na hipótese em questão.

Financiador – é a mais preocupante figura do tráfico em geral. É aquele tem que tem extraordinário poder econômico e custeia a logística do tráfico, chamando de grande traficante ou chefe do narcotráfico. Aqui a pena mínima é de 8 anos de reclusão, podendo chegar a 20 anos, e a multa varia de 1.500 a 4.000 dias-multa. O número de dias-multa poderá ser multiplicado por cinco, iniciando em um trinta avos do maior salário mínimo (art. 43, caput).

O artigo 12 da antiga lei de drogas (Lei n. 6.368/76) previa somente penas de reclusão de 3 a 15 anos e de multa de 50 a 360 dias-multa. A nova Lei 11.343/2.006, em seu artigo 33, impõe penas de 5 a 15 anos de reclusão e de multa de 500 a 1.500 dias-multa. É importante observar que a pena de multa pode ser aumentada em caso de concurso de crimes até o décuplo, o que significa um aumento substancial.

A lei em vigência foi extremamente severa com o agente que financiar ou custear a prática do crime de tráfico, de modo que pode ter sua pena de multa majorada até o décuplo.

Ela ainda foi mais rígida quando o tráfico envolver dois ou mais países. Entre Estados e Federações ou entre estes e o Distrito Federal; quando envolver ou visar atingir criança ou adolescente; quando o traficante prevalecer-se para tal, da função pública; quando no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância; quando a infração for praticada nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sede de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, beneficentes, de locais de trabalho coletivo e outros. Nessas hipóteses, a pena será aumentada de um sexto a dois terços.

Já em se tratando da discussão em relação à possibilidade ou não da substituição da pena de prisão aplicada em caso de condenação por crime de tráfico por pena restritiva de direitos está prejudicada, eis que, não bastasse a impossibilidade em face da quantidade de pena prevista, a nova lei literalmente proíbe a substituição.


III.           IDENTIFICAÇÃO DO USUÁRIO 

A Lei 11.343/2.006, no §2º de seu artigo 28, estabeleceu uma série de critérios para definir se a droga destina-se ou não ao consumo pessoal:

§2º - Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, as circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.       

Conforme o exposto no texto da lei acima, pode-se entender que os critérios diferenciadores se traduzem em: natureza e quantidade da substância apreendida (objeto material do delito), local e condições em que se desenvolveu a ação (o desvalor da ação), circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e os antecedentes do agente (agente do fato).

Em outras palavras, pode-se dizer que a quantidade da droga, por si só, não constitui em regra, critério determinante, salvo exceções, como quando se tratar de casos com enormes quantidades de entorpecentes. Daí a necessidade de se valorar não apenas um isolado critério, sendo este o quantitativo, mas sim todos os fixados na Lei.

O contexto vivenciado pela sociedade brasileira deixa nítido que o legislador buscou inovar no tratamento dado ao traficante e ao usuário com a vigência da nova lei de drogas.

Não faltam críticas doutrinárias ao novel diploma, principalmente no que se diz respeito aos critérios e à forma de utilização destes pelos agentes que atuam no enquadramento da conduta praticada por cada indivíduo. Contudo, essas críticas serão tratadas em outro capítulo deste trabalho.

Luiz Flávio Gomes (2007, p. 161), em uma de suas ilustres obras, discorre de maneira clara e objetiva sobre os sistemas legais:

[…] Há dois sistemas legais para se decidir sobre se o agente (que está envolvido com a posse ou porte de droga) é usuário ou traficante: (a) sistema de quantificação legal (fixa-se, nesse caso, um quantum diário para o consumo pessoal; até esse limite legal não há que se falar em tráfico); (b) sistema do reconhecimento judicial ou policial (cabe ao juiz ou à autoridade policial analisar cada caso concreto e decidir sobre o correto enquadramento típico). A última palavra é a judicial, de qualquer modo, é certo que a autoridade policial (quando o fato chega ao seu conhecimento) deve fazer a distinção entre usuário e traficante.                                              

O referido doutrinador, ainda em suas obras, destaca que o ordenamento jurídico pátrio adotou o segundo critério, o do sistema de reconhecimento judicial ou policial. Sendo assim, compete ao juiz ou a autoridade policial reconhecer, com fundamento nos critérios legais objetivos, se a droga encontrada destina-se ao consumo pessoal ou ao tráfico. Porém, o julgamento do magistrado não pode constituir-se em apreciação meramente subjetiva, pois terá como parâmetro os critérios legais para valorar se o fato configura tráfico ou consumo pessoal de drogas. Logo, o critério adotado pela lei brasileira, foi o de que o critério de avaliação é objetivo e não subjetivo.

No direito comparado, a jurisprudência (v.g. espanhola) por vezes consolida quantidades tanto para a tipificação quanto para a aplicação da pena. Porém entre o ordenamento jurídico brasileiro, não há nada parecido, apesar de mencionado no art. 28, §2º, fazer referência à natureza e à quantidade da substância, e o 42 da Lei dispor que, para efeito de individualização da pena, o juiz considerará, como circunstâncias preponderantes, a qualidade e a quantidade da droga.

Há grande discussão no que diz respeito aos critérios elencados pelo §2º do art. 28 da referida lei, e um dos que mais se destacam é o da quantidade de drogas que o agente possui, de modo que dá-se como solução à essa discussão inserir no dispositivo quantidades determinadas de cada substância entorpecente, de maneira que se pudesse objetivamente enquadrar o indivíduo como usuário ou traficante a partir da quantidade de drogas que possuísse. Sem dúvidas essa modificação legislativa contribuiria para a redução de equívocos cometidos pelas autoridades policias no momento de classificar o agente como traficante ou usuário.

A grande diferença entre os artigos 28 e 33, reside no dolo, devendo ser investigado se o agente utilizará para o uso ou para o comércio. Faticamente a promoção da circulabilidade é um elemento objetivo importante para se aferir o dolo no caso concreto.

Tem-se observado que na prática – para fugir da despenalização do artigo 28 - há um exagero ainda maior dos órgãos policiais e judiciais na classificação dos fatos para tipifica-los artificialmente como sendo fatos afetos ao artigo 33.

Sendo assim, torna-se imprescindível acentuar os elementos do tipo do artigo 28, não só para sua configuração, mas também para que haja uma tentativa de diferenciar com menor imprecisão as condutas do artigo 33.

Pelo fato dos tipos penais previstos nos artigos 28 e 33 da Lei 11.343/2.006 conterem em seu texto legal diversos núcleos do tipo iguais, para que se verifique se a droga que foi apreendida tinha como destino o consumo pessoal e não o da promoção da circulabilidade, o que deve ser analisado são as circunstâncias que são analisadas pelo magistrado.

A primeira delas, trata-se da natureza e da quantidade da substância apreendida. Este é um fator fundamental para que os tipos penais sejam diferenciados. Como já exposto acima, não temos um parâmetro numérico para configurar se o agente trata-se de um mero usuário ou um traficante, e com isso, na prática acabam ocorrendo inúmeros erros grosseiros quanto à essa caracterização. O ideal seria que a lei o fizesse. A subjetividade judicial resta alargada e a jurisprudência ficará encarregada dos contornos da pequena quantidade. É importante destacar que para cada tipo de droga deverá ser fixado critério diferente para a afirmação de pequena quantidade.

Se a quantidade de tóxico apreendida em poder do réu é muito pequena, de modo a sugerir que se trate de porte para uso próprio e não havendo qualquer indício que faça supor o tráfico, o delito se enquadra no art. 28 da Lei. 11.343/06. (TACRIM – SP – AC 228.517 – Rel. Jefferson Perroni – JUTACRIM 64/191).

Não se desclassifica o crime para simples uso quando a quantidade de droga apreendida é capaz de denunciar a destinação criminosa do tráfico de entorpecentes. (TJSE – AC 103/95 – Rel. Gilson Gois Soares – RT 737/684).

Neste primeiro parâmetro, pode haver a aplicação do princípio da insignificância quanto ao delito previsto no artigo 28 da Lei 11.343/2.006. Dessa maneira, se a quantidade de droga apreendida for ínfima a ponto de nem mesmo causar alteração no próprio indivíduo, a atipicidade deverá ser reconhecida.

Quando a insignificância estiver presente, haverá ausência de justa causa tanto para a promoção da ação penal, para a manutenção de um processo, quanto para justificar uma condenação penal.

Quantidade ínfima de maconha – Inocuidade para gerar distorções psíquicas – Fato atípico (TJSP – AC 42.883 – Rel. Gonçalves Sobrinho – RJTJSP 102/451).

Em sentido contrário:

Para a caracterização do crime previsto nos arts. 12 e 16 da Lei. 6.368/76 basta a verificação dos fatos ali descritos. Irrelevante, por isso mesmo, a circunstância de ser ínfima a quantidade apreendida com o agente, como causa desfiguradora. (STJ – Resp – Rel. Fláquer Scartezzini – JSTJ-TRF 16/202).

No que se diz respeito ao ônus probatório, não cabe ao acusado produzir qualquer espécie de provas de que é usuário, cabendo ao Estado todo o ônus da prova, aplicando-se o principio constitucional da presunção de inocência. A situação duvidosa perante a autoridade policial ou judicial necessariamente deve funcionar a favor da versão de quem está em situação de se envolver com a droga e que alega o consumo pessoal.

Nesse sentido:

Apreensão de alentada quantidade de maconha – “Para que se reconhece a existência de tráfico ou comércio de drogas, é mister prova absolutamente segura. No caso de dúvida em se saber se o réu é traficante ou usuário, deve subsistir a segunda hipótese, como solução benéfica do in dubio pro reo”I (TJSP – AC 133.383-3 – Rel. Egydio de Carvalho – JTJ 140/276).

Embora possuindo o agente razoável quantidade de maconha mas não comprovada, quantum satis, a traficância, a solução mais justa é considerar a droga como para uso próprio (TJSC – AC 16.592 – Rel. Aloysio de Almeida Gonçalves – JC 34/545).

Tráfico de entorpecente – Delito não comprovado – Desclassificação para porte, por ser o acusado viciado – Revisão deferida – Inteligência dos arts. 12 e 16 da Lei 6.368/76 – Embora não fosse pequena a quantidade de tóxico apreendida com o acusado, desclassifica-se a infração no art. 12 para o art. 16 da Lei 6.368/76, se não ficou evidente a sua condição de traficante e de que aquele se destinasse ao comércio maldito. (TACRIM-SP – Ver. – Rel. Silvia Leme – RT 516/338).

Quanto ao segundo critério, que se refere ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, o magistrado ao julgar a conduta do agente deverá levar em conta a forma de armazenamento da droga, se se encontra ou não em invólucros destinados à mercância; ao local em que se encontra tanto a droga, como o agente no momento da flagrância, se o local em questão era local suspeito, se era conhecido por haver tráfico ou reuniões de usuários; se as condições em que foi feita a apreensão do agente era suspeita ou não, à exemplo deste se encontrar na porta de uma escola, no interior de uma festa.

Tratando-se do critério “das circunstâncias sociais e pessoais”, este se refere às condições financeiras do agente, de como este estava vestido, se transparece ser de boa ou má índole, se o agente possui emprego e renda fixa ou se trata de mero desocupado. Nesta linha de pensamento:

Tráfico – Apreensão de grande quantidade de cocaína – Desclassificação pra uso – Inadmissibilidade - Acusado, individuo desocupado e sem emprego fixo – Suficiência, para tanto, da prova do tráfico, conjugando-se a quantidade do entorpecente. (TJSP – AC 124.618-3 – Rel. Cunha Bueno – RJTJSP 138/453).

Entorpecente – Transporte – Denúncia anônima à Polícia Federal – Ônibus, intermunicipal, em que viajava o réu, que é interceptado na estrada – Encontro da droga, com o acusado, que a escondia sob a culpa – Fato corrobado por testemunhas – Quantidade da droga transportada que caracteriza o réu como traficante – Sentença condenatória mantida – Certo que se classifica o traficante pela quantidade exagerada do tóxico. Mas no caso em tela, não há fugir tratar-se de traficante de cocaína: a quantidade, 320,123g, a condição pessoal do réu, ausente capacidade econômica para vinculação ao uso, as condições de sua prisão, ausência total de prova a seu favor, ocupação de ônibus intermunicipal carregando a elevada quantidade de droga, demonstram ser ele traficante. (TJSP – AC 122.729-3/8 – Rel. Renato Talli – RT 691/297).

Finalmente, quanto ao último critério de avaliação a ser feito pelo magistrado, se relaciona com a conduta e aos antecedentes do agente. Neste, basta uma leitura para sua integral interpretação, sendo que a conduta refere-se ao modo com que o agente estava praticando a ação no momento deflagrador. Quanto aos antecedentes do agente, levar-se-á em consideração se o réu já possui condenações pelos crimes dispostos da Lei n. 11.343/2.006.

Quando explorados os critérios dos antecedentes, Bizzoto (2010, p. 82) defende que “somente se houver condenação penal irrecorrível em fatos ligados ao tráfico de drogas é que os antecedentes podem servir de indicador contrário ao consumo e, mesmo assim, desde que haja coerência com os demais elementos de informação colhidos”.

Para que não ocorram obscuridades nas decisões, defende-se que cada caso merece que todos os critérios legais colocados no artigo 28, §2º da Lei 11.343/06 sejam mencionados de forma fundamentada na decisão judicial, sendo que o principio constitucional da presunção da inocência impõe valoração benéfica ao perseguido penal para as situações em que não haja elementos de informação nos autos. 


IV.           LABELLING APPROACH

O labelling approach é denominado na literatura, alternativa e sinonimicamente, pela teoria do interacionismo simbólico, rotulação, paradigma da “reação social”, do “controle” ou como mais conhecido, teoria do etiquetamento.

Coelho e Mendonça (2009, p. 13) conceituam em simples palavras que:

A teoria do labelling approach parte da premissa de que a criminalidade não existe na natureza, não é um dado, mas uma construção da sociedade, uma realidade que decorre de processos de definição e de interação social. O crime passa a ser compreendido não como uma qualidade intrínseca, determinada, e sim como uma decorrência de critérios seletivos e discriminatórios que o definem como tal.

Hassemer (2005, p. 101-102) também conceitua essa teoria:

O labelling approach significa enfoque do etiquetamento, e tem como tese central a idéia de que a criminalidade é resultado de um processo de imputação, a criminalidade é uma etiqueta, a qual é aplicada pela polícia, pelo ministério público e pelo tribunal penal, pelas instâncias formais de controle social. O labeling approach remete especialmente a dois resultados da reflexão sobre a realização concreta do Direito: o papel do juiz como criador do Direito e o caráter invisível do ‘lado interior do ato.

Molina (1996, p. 229), em sua obra, demonstra que há duas formas de labelling, sendo uma radical e uma moderada, onde a tendência radical acentua a função criadora de criminalidade exercida pelo controle social: o crime é uma etiqueta que a polícia, os promotores e os juízes (instâncias do controle social formal) colocam no infrator, independentemente de sua conduta ou merecimento. Enquanto que a moderada afirma que a justiça penal apenas integra uma mecânica formadora da criminalidade. 

Conde e Hassemer destacam que:

Segundo uma versão radical dessa teoria, a criminalidade é simplesmente a etiqueta que se aplica pelos policiais, pelos promotores de justiça e pelos tribunais penais, ou seja, pelas instâncias formais de controle social. Outros representantes desta teoria, menos radicais, reconhecem que os mecanismos do etiquetamento não se encontram somente no âmbito do controle social formal, mas também no informal [...] A direção moderada do intervencionismo simbólico admite que a justiça penal se integra na mecânica do controle social geral da conduta desviada. Isso não constitui exculpação do fato da definição seletiva da criminalidade, mas comporta o reconhecimento de que o sistema penal não leva a cabo o processo de estigmatização à margem ou inclusive contrário aos processos ferais de controle social. Pelo contrário, a direção radical faz uma crítica muito mais devastadora da própria Administração da Justiça, sustentado que é o Direito Penal que faz o delinquente, sem nenhum respeito ao principio da igualdade, pois recai mais fortemente sobre as camadas sociais mais baixas que sobre as demais(2008, p. 111-112).

O labelling approach, segundo os ensinamentos de Pereira de Andrade (2003, p. 208), possui três níveis explicativos para o fenômeno criminológico, sendo eles:

a)              Um nível orientado para a investigação do processo de definição da conduta desviada, ou criminalização primária, que corresponde ao processo de criação das normas penais, em que se definem os bens jurídicos protegidos, bem como as definições informais apresentadas pelo público, onde se pode incluir a mídia (definições de senso comum).

b)              Um nível orientado para a investigação do processo de atribuição do status criminal, ou processo de seleção ou criminalização secundária, sendo tal o processo de aplicação das normas penais pela polícia e pela justiça, sendo este o momento da atribuição das etiquetas ao desviante (etiquetamento ou rotulação), que pode ir desde a simples rejeição social até a reclusão de um indivíduo em uma prisão ou manicômio;

c)              Por fim, um nível orientado para a investigação do impacto de atribuição do status do criminoso na identidade do desviante, definindo o chamado “desvio secundário”, onde se estuda as “carreiras desviadas”, evidenciando que a intervenção do sistema penal, em especial a prisão, ao invés de exercer um efeito reeducativo sobre o delinquente, acaba na grande maioria dos casos consolidando uma verdadeira carreira criminal.

Esse três níveis explicativos podem dar uma luz para o entendimento de como a criminalização das drogas, ao invés de proteger a saúde pública, acaba por criar uma rotina punitiva de “cartas marcadas”, que tem seu início no processo legislativo de aumento de penas e restrições às liberdades individuais daqueles que são escolhidos para responder pela conduta definida como “tráfico de drogas”, bem como a criação de carreiras criminais no sistema penitenciário para estes “etiquetados”.

Para explicar o processo de criminalização secundária, o ponto de partida das teorias da reação social, é que este reside na observação de que o desvio é criado pela própria sociedade.

Não quero dizer com isto o que se compreende normalmente, ou seja, que as causas do desvio estão localizadas na situação social do desviante ou nos “fatores sociais” que induzem a ação. Quero dizer mais do que isso, que os grupos sociais criam o desvio ao fazer as regras cuja infração constitui desvio e ao aplicar essas regras à pessoas particulares e rotulá-las como marginais e desviantes. Deste ponto de vista, o desvio não é uma qualidade do ato que a pessoa comete, mas uma consequência da aplicação por outras pessoas de regras e sanções a um “transgressor”. O desviante é alguém a quem aquele rótulo foi aplicado com sucesso; comportamento desviante é o comportamento que as pessoas rotulam como tal (BECKER, 1977, p. 60).

Para Becker, o fato de alguém infringir uma regra não significa que os outros reagirão como se isso tivesse acontecido, bem como o fato de alguém não violar uma regra não significa que não será ameaçado, em algumas circunstancias como se tivesse feito. Portanto, na definição do desvio, o importante é a resposta dos outros àquele comportamento.

O mesmo comportamento pode ser uma infração de regras num momento e não em outro; pode ser uma infração quando cometido por uma pessoa, mas não quando cometido por outra; algumas regras são quebradas com impunidade, outras não. Em resumo, se um determinado ato é desviante ou não depende em parte da natureza do ato (ou seja, se ele viola ou não uma regra) e em parte do que as pessoas fazem em relação a ele. (BECKER, 1977, p. 64)           

A teoria da rotulação, segundo Becker (1977, p. 64), prossegue ao definir diferentes graus em que outras pessoas reagirão a um ato dado como desviante. Pode-se dizer que o primeiro tipo de variação da resposta encontra-se no fato tempo, já que “uma pessoa que se acredita haver cometido um determinado ato desviante pode, num momento, receber uma resposta muito mais indulgente que em outro momento”.

A reação à posse de drogas, como nos ensina Nilo Batista (1999, p.34) , é um bom exemplo desta variação de respostas no tempo, que vão de um modelo sanitarista ao atual modelo bélico. Para se ter uma ideia, essa conduta de quem tem a posse de substâncias proibidas para uso próprio, já foi tratado pela nossa legislação como sendo fato atípico, fato equiparado ao tráfico, sendo hoje considerada infração de menor potencial ofensivo. Ao passo que, as condutas definidas pelo artigo 33 da Lei 11.343/06 – tráfico de drogas ilícitas – ganharam relevância punitiva ao serem equiparadas a crimes hediondos, a partir da Constituição Federal de 1.988.

Becker (1977, p. 63) ainda diz que “o grau em que o ato será tratado como desviante depende também de quem cometeu o ato e de quem sente que foi prejudicado por ele”, fazendo com que as regras tendam a ser aplicada mais a algumas pessoas do que a outras.

Meninos de áreas de classe média não sofrem um processo legal que vá tão longe quando são presos como garotos das favelas. É menos provável que o menino de classe média, quando apanhado pela polícia, seja levado ao posto policial; é menos provável, quando levado ao posto policial, ele seja fichado; e é extremamente improvável que seja indiciado e julgado. Essa variação ocorre mesmo se a infração original da regra for a mesma nos dois casos.

Na lição da professora Maria Lúcia Karam, a criminalização desigual das condutas definidas como tráfico de drogas é o exemplo vivo da seletividade qualitativa (em razão da qualidade da pessoa ou até mesmo dos países):

A distribuição desigual do status criminoso determina a ideia de criminalidade como um comportamento característico de indivíduos provenientes daquelas camadas mais baixas e marginalizadas, levando à identificação das classes subalternas como classes perigosas. No caso das drogas, pense-se, por exemplo, nas favelas do Rio de Janeiro, em relação às quais se passa a ideia de uma ligação generalizada de seus moradores com o tráfico, reproduzindo-se a mesma linha que, internacionalmente, cria o já mencionado estereótipo delitivo latino-americano. Neste caso de países perigosos, basta lembrar que, quando se fala de drogas, não se pensa, por exemplo, na Suíça, lavando mais branco, mas apenas na Colômbia com seus cartéis, ou na Bolívia, com suas folhas de coca.

As possibilidades de uma pessoa ser etiquetada como delinquente, com todas as consequências que isso implica, encontram-se desigualmente distribuídas.

A teoria do etiquetamento recusa o monismo cultural e o modelo de consenso como explicativos das normas penais, e Da Fonseca (2006, p. 35), defende que as normas penais são decorrentes de um pluralismo, sendo que seu processo de criação não deriva de um amplo consenso social nem é guiado pela efetiva tutela dos interesses gerais, mas sim representam as relações de poder existentes.

É interessante destacar que o labelling nega alguns princípios da criminologia tradicional, como o principio da igualdade, que é considerado a base do direito penal, pois idealiza que todos devem ser tratados iguais perante a lei já que a reação penal se aplica de modo isonômico a todos os autores dos delitos. Este principio é severamente questionado, pois segundo o labelling approach, o desvio e a criminalidade não são entidades ontológicas preconcebidas, mas, ao revés, um status atribuído a determinados sujeitos através dos mecanismos oficiais e não-oficiais de seleção (ANDRADE, 2003, p. 201-203).

Outro princípio que é renegado pelo labelling approach é o princípio do interesse social e do delito natural. Fonseca (2006, p. 32-33) diz que:

Este princípio concebe que os interesses protegidos pelo direito penal são comuns a toda sociedade (delito natural) e apenas uma pequena parte dos delitos representa a violação de determinados arranjos políticos e econômicos, sendo punidos em função da supremacia(ainda que momentânea) deste grupo de poder. Entretanto, a teoria do etiquetamento confronta tal idéia através da localização das variáveis do processo de definição nas relações de poder e nos grupos sociais, tomando em conta a estratificação social e os conflitos de interesse. Há, segundo a teoria em estudo, não apenas uma desigual distribuição do status de criminoso, mas também uma desigual distribuição entre os grupos sociais das pessoas que podem ditar o que é criminalidade. Assim, aqueles que detêm este poder, o fazem em prestígio a ideologia do grupo ao qual pertencem e não em nome dos interesses fundamentais para uma determinada sociedade ou para toda a sociedade. Como conseqüência, aquele aspecto político dos delitos artificiais(diagnosticado pela Defesa Social) é estendido a todos os delitos, como resultado do fenômeno total da criminalidade, como realidade social não preconcebida mas criada através dos processos de criminalização.

Sendo assim, o princípio da finalidade (prevenção) vislumbra na pena o fim preventivo, não apenas o retributivo, visto que deve criar no criminoso o receio da prática do comportamento desviante, o qual questiona-se na medida em que as instituições totais não reeducam, e muito menos ressocializam, pelo contrário, geram sanções estigmatizantes.

O princípio do interesse social e do delito natural, como um dos postulados da ideologia da defesa social, apresentada por Baratta (2002, p. 42), é questionado pelas teorias do conflito que, desenvolvidas sobre a base do labbeling, tratam de localizar as verdadeiras variáveis do processo de definição nas relações de poder e nos grupos sociais, tomando em conta a estratificação social e os conflitos de interesse.

A criminologia da reação social “assenta, pois na recusa do monismo cultural e do modelo de consenso como teoria explicativa da gênese das normas penais”. De acordo com Baratta (2002, p. 42):

A legitimação tradicional do sistema penal como um sistema necessário à tutela de condições essenciais de vida de toda a sociedade civil, além da proteção de bens jurídicos e de valores igualmente relevantes para todos os consórcios, é fortemente problematizada no momento em que se passa – como é lógico em uma perspectiva baseada na reação social – da pesquisa sobre a aplicação seletiva das leis penais à pesquisa sobre a formação mesma das leis penais e das instituições penitenciárias.

A teoria do etiquetamento se propõe a compreender a delinquência não como fenômeno real, mas sim como fenômeno definitorial, como fenômeno atribuído contra os membros das classes sociais marginalizadas por aqueles que manejam o poder. Desta forma, trata-se de uma explicação fatorial da criminalidade, já que esta, como se concebe no labelling, não existe: é um produto inventado. (BARATTA, 2002, p. 88)

É nítido que as desigualdades sociais presentes na sociedade motivaram os processos sociais de etiquetamento e de reação social. Com isso, a teoria do labelling tenta mostrar que o desvio e a criminalidade não são entidades inerentes ao indivíduo, mas sim rótulos que determinados processos de seleção, altamente discriminatórios colocados e direcionados a certos sujeitos por meio de regras impostas pela sociedade.

Becker (2008, p. 15) explica de que forma as regras são feitas e como, em certos momentos, tentam impô-las. Essas regras sociais definem padrões de comportamentos, que apontam uns como certos e proibindo outros como errados, e quando um individuo infringe tal regra é considerado errado pelo grupo.

Segundo Coelho e Mendonça (2009, p. 16), de acordo com o labelling, o processo de rotulação tem inicio com o cometimento do primeiro delito – criminalização primária – onde a sociedade responderá com a celebração de atos punitivos, denominada de cerimônias degradantes. Tais cerimônias são processos ritualizados, onde um indivíduo que cometeu um delito é submetido, e se traduzem no contato com as instâncias de controle formal, polícia, Ministério Público, Judiciário e com o processo, em que uma nova identidade lhe é dada.

Porém, em si nenhuma conduta é criminal, nem seu autor um criminoso por concretos traços de sua personalidade ou influência de seu meio ambiente. A criminalidade é revelada principalmente como sendo um status atribuído a determinadas pessoas mediante um duplo processo: a “definição” legal de crime, que atribui à conduta o caráter criminal, e a “seleção” que etiqueta e estigmatiza um autor como criminoso entre todos aqueles que praticam tais condutas.

Pode-se dizer que são dois os principais problemas de uma teoria da criminalidade: o primeiro é como surge o comportamento desviante; e o segundo, como os atos desviantes são ligados simbolicamente, e as consequências efetivas desta ligação para os desvios sucessivos por parte da pessoa. Baratta apud Lemert (2002, p. 90) sustenta que enquanto houver o desvio primário se reporta, pois, a um contexto de fatores sociais, culturais e psicológicos, que não se centram sobre a estrutura psíquica do indivíduo, e não conduzem, por si mesmos.

Em tese os grupos criam o desvio ao fazer as regras cuja infração constitui o desvio e aplicar as ditas regras a certas pessoas em particular e qualifica-las de marginais (estranhos). Desde esse ponto de vista, o desvio não é uma qualidade do ato cometido pela pessoa, senão uma consequência da aplicação que os outros fazem das regras e sanções para um ofensor. O desviante é uma pessoa a quem se pode aplicar com êxito dita qualificação (etiqueta). A conduta desviante é a conduta assim chamada pela gente. (ANDRADE, 2003, p. 41).

Desta forma, a rotulação seria o processo pelo qual um papel desviante se cria e se mantém através da imposição dos rótulos delitivos.

A título de exemplo, imagine dois jovens – um branco, de classe média, vestido como “playboyzinho” típico dos bairros nobres; outro negro e pobre, de camiseta surrada, bermuda velha, boné virado e sandália de dedo – estão em uma padaria no momento em que uma senhora dá pela falta de sua carteira, deduz que a furtaram e pede socorro. Um policial que estava à paisana na padaria, puxa a arma e ordena que ninguém saia da padaria. O policial dirige-se à porta, passa os olhos de águia em sobrevoo pelos fregueses e escolhe o suspeito. Não preciso lhe dizer quem foi brindado pela sorte, ou pelo azar. Todos os fregueses se retiram do estabelecimento, enquanto o policial revista o jovem negro e malvestido.

O outro rapaz escapa trêmulo, e lívido, mas sem dar bandeira. Carrega no bolso várias trouxinhas de maconha que acabara de comprar no morro próximo à padaria para servir aos convidados em sua festa de aniversario. Seu nervosismo não se justifica. Ele sabe, pela experiência de seus amigos, que, se fosse pego, nada lhe aconteceria. Seria levado à delegacia, autuado, mas, apesar de a quantidade permitir o enquadramento no crime de tráfico, seria liberado, porque os policiais – assim como o juiz, depois deles – aceitariam suas explicações de que comprara um pouco mais somente para estoque pessoal, evitando idas e vindas à favela. Se os policiais não aceitassem sua explicação, seu pai os convenceria com os fortes argumentos de sua conta bancária. E o caso nem chegaria ao conhecimento do juiz.

Já o rapaz malvestido, o qual não havia furtado a carteira da senhora, e nunca furtara na vida, porém estava servindo de aviãozinho, se encontrava com a mesma quantidade de drogas que o rapaz bem de vida. O menino tenta se explicar para a polícia, mas as trouxinhas são numerosas e permitem seu enquadramento no crime de tráfico. O garoto grita, esperneia, e leva uns tapas do policial. Pedestres se aglomeram, e inclusive alguns querem linchá-lo.

A Constituição proclama que todos são iguais perante as leis, por isso, em nosso pais vigora o Estado democrático de direito. O que ocorre na prática é que, uns são “mais iguais” que outros. A desigualdade no acesso à Justiça é nosso maior motivo de vergonha perante o que se convencionou chamar “mundo civilizado” e constitui a mais mesquinha, cínica e cruel manifestação de desrespeito coletivo que ainda toleramos no Brasil.

Essa desigualdade começa com a abordagem policial (que varia de acordo com a classe social, cor da pele, vestuário, idade e gênero abordado) e termina com a sentença determinada pelo juiz, e o cumprimento da pena, mas também passa pela eficiência na garantia de direitos, que varia de acordo com a classe social daqueles que os reivindicam.

É nítido habitualmente, que são vários mecanismos os responsáveis por propagar e vincular a conduta dita como desviada à criminalizada, onde destaca-se como um dos principais percussores a mídia, responsável por atingir todas as camadas sociais, levando noticias e influenciando como se tudo que ali fosse dito fosse consenso, e ainda categorizando os que ali estão sendo noticiados como bons ou maus.

Do que foi exposto, pode-se afirmar que somente será considerada desviante, a conduta que a sociedade e seus órgãos punitivos decidem perseguir como tal. A partir dessa etiqueta que lhe é colocada o individuo passa a ser criminoso, e não exatamente pelo ato por ele praticado.


V.  SELETIVIDADE PENAL

Na lição de Nilo Batista e Zaffaroni (2003, p. 43), o poder punitivo penal se traduz num processo seletivo de criminalização que se desenvolve em duas etapas denominadas, respectivamente, primária e secundária.

A denominada criminalização primária, é aquela exercida pelas agências políticas (poder legislativo) e se traduz no ato e efeito de sancionar uma lei penal material que incrimina ou permite a punição de certas pessoas. Trata-se de um programa de punição a ser executado pelas agências de criminalização secundária (promotores, juízes, advogados, policiais, agentes penitenciários).

Já quando se fala da criminalização secundária, entende-se que é a ação punitiva exercida sobre pessoas concretas, que se desenvolve desde a investigação policial até a imposição e a execução de uma pena e que, necessariamente, se estabelece através de um processo seletivo.

No entendimento de Zaccone (2007, p. 16), a seleção punitiva ocorre uma vez que é impossível para os gestores da criminalização secundária realizarem o projeto “faraônico” de criminalização primária previsto em todas as leis penais de um país. Ou seja, não é possível ao sistema penal prender, processar e julgar todas as pessoas que realizam as condutas descritas na lei como crime e, por conseguinte, as agências penais devem optar entre o caminho da inatividade ou da seleção. Zaffaroni e Nilo Batista (2003, p. 43) concluem ressaltando que esse poder de seleção corresponde, fundamentalmente, às agências policiais “como a inatividade acarretaria o seu desaparecimento, elas seguem a regra de toda burocracia e procedem à seleção”.

Desta forma, ocorre uma inversão da estrutura formal do aparelho repressor, já que a magistratura e o Ministério Público passam a ter delimitadas as suas faixas de atuação pela polícia, que na realidade em suas práticas habituais e informais, decide quem vai ser processado e julgado criminalmente:

Exatamente ao reverso do que apregoa a ideologia, é a policia quem controla a atividade do Judiciário, pois este só trabalha com o material concedido por aquela. Graças a isto pode o Judiciário manter uma aparência de isenção e pureza, uma vez que a parte ostensivamente suja da operação discriminatória se realiza antecedentemente à sua atuação. (THOMPSON, 1998, p. 87)           

Sendo assim, de que forma o sistema penal realiza a seleção das pessoas que vão responder pela conduta prevista no artigo 33 da Nova Lei de Drogas – tráfico de drogas ilícitas?

De acordo com Zaccone (2007, p. 17), “a criminologia crítica incumbiu-se da análise chamada “cifra negra””. Isto é, do estudo daqueles delitos cometidos na sociedade que nunca chegam ao conhecimento das autoridades constituídas e de outros que, apesar de gerarem um procedimento investigatório, não resultam em processo criminal.

A criminóloga venezuelana Lola Anyar de Castro, em seu livro Criminologia da reação social, explica a categoria “cifra oculta da criminalidade”. Ela distingue a criminalidade legal da aparente e da real.

Para ela a criminalidade legal é aquela que aparece registrada nas estatísticas oficiais, já que a aparente é toda aquela que é conhecida por órgãos de controle penal (Ministério Público, polícia, juízes, etc.), ainda que não apareçam nas estatísticas por diversos motivos, como, por exemplo, a falta de sentença, a desistência da ação, autoria não identificada, arquivamento, entre outros. Por fim, temos a criminalidade real, que é a quantidade de delitos verdadeiramente cometidos em um determinado momento. Afirma Lola Anyar (1983, p. 68):

Entre a criminalidade real e a criminalidade aparente, há uma enorme quantidade de casos que jamais seroa conhecidos pela polícia. Esta diferença é o que se denomina cifra obscura, cifra negra ou delinquência oculta. A diferença entre a criminalidade real e aparente seria, pois, dada pela cifra negra.

São quatro os fatores essenciais que servem para explicar o fenômeno, de acordo com Thompson (2000, p. 60): a visibilidade da infração; a adequação do autor ao estereótipo do criminoso construído pela ideologia prevalente; a incapacidade do agente em beneficiar-se da corrupção ou prevaricação; e a vulnerabilidade à violência. Thompson (2000, p. 244) conclui da seguinte maneira:

As classes média e alta tendem a passar a maior parte do tempo em locais fechados; os indivíduos marginalizados vivem a céu aberto. Compreende-se por isso mesmo, haver muito mais probabilidade de serem os delitos dos miseráveis vistos pela polícia d que os perpretados pela gente de posição social mais elevada. Como consequência, idênticos comportamentos, dependendo do estrato a que pertence o sujeito, mostrarão variações quanto a gerar o reconhecimento de serem criminosos.

Dessa maneira, o estereótipo do bandido vai-se consumando na figura de um jovem negro, funkeiro, morador da favela, próximo do tráfico de drogas vestido com tênis, boné, cordões, portador de algum sinal de orgulho ou poder e de nenhum sinal de resignação ao desolador cenário de miséria e fome que o circunda.

5.1 A polícia e a seletividade

 O sistema penal subterrâneo, como rotula Zaffaroni (2003, p. 53), persiste em fazer suas “bem vindas vítimas”, haja vista que os critérios estatuídos no §2º do art. 28 da referida Lei Antidrogas são bastante genéricos e tem uma carga de subjetividade que não impedem os desvios de finalidades. Deste modo, os usuários flagrados na posse de drogas continuam sujeitos ao arbítrio da polícia na prisão em flagrante (e depois, ao arbítrio do juiz), pela falta de critério legal para determinar se a droga apreendida era destinada ao consumo ou ao tráfico.

A polícia constitui o símbolo mais visível do sistema formal de controle, o mais presente no cotidiano dos cidadãos e, por via de regra, a “porta de entrada” da lei criminal. O seu papel no processo de seleção é, por isso, determinante.

Por meio de sua discricionariedade, ela pode partir espontaneamente à descoberta e à detenção dos delinquentes, como também operar apenas quando a prova lhe é oferecida. Há que ter sobretudo em consideração a presença diferencial da policia em relação a grupos de indivíduos que, pela cor da pele, estilo de vestuário, corte de cabelo ou barba, locais frequentados, etc., se apartam dos padrões estereotipados da respeitabilidade. Como acentua Chapman (1968, p. 56), um dos índices mais significativos da repartição desigual do prestigio, do status ou do poder é a distribuição diferencial da imunidade, correspondente ao espaço e ao tempo de privaticidade de que se dispõe; índice este que te, reflexos sensíveis no recrutamento dos criminosos.

Quando a policia age espontaneamente à descoberta, toda a estratégia que ela utiliza para enquadrar os suspeitos é feita obedecendo a poderosos estereótipos, que correspondem a versões simplificadas de determinadas teorias sobre as causas do crime e a natureza do delinquente. São os estereótipos que, em grande parte, determinam para onde a policia deve se dirigir e que tipos de pessoas deve abordar.

Deste modo, a polícia tende a deslocar-se para áreas habitadas por minorias desclassificadas e a abordar sobretudo as pessoas que – pela cor da pele, gestos, modo de vestir, corte de cabelo ou barba, etc. – são a imagem exterior da desconformidade. Segundo Cicourel (1967, p. 67), a policia elabora teorias sobre os indivíduos e os grupos, a moralidade e a imoralidade, as pessoas boas e más, as instituições, as práticas e as tipificações das formas comunitárias e emprega estas teorias ou construções de forma rotineira.

Sendo assim, os jovens negros e aqueles cuja aparência corresponde ao estereótipo do delinquente são mais frequentemente abordados e interrogados, muitas vezes mesmo sem quaisquer indícios de prática de crime. A policia justifica o seu tratamento seletivo em termos epidemiológicos, concentrando a sua atenção sobre aqueles jovens que, segundo ela acredita, mais provavelmente cometeriam crimes.

Habitualmente o que se percebe nas ruas é que um jovem branco, num carro importado, com boa aparência, num bairro de baixo poder aquisitivo, procura naturalmente sexo ou droga. Já inversamente, um jovem que aparenta não possuir poder aquisitivo, que não possui boa aparência em um bairro nobre, está naturalmente se preparando para cometer algum crime.

Dessa maneira, fica claro que o autor do crime, quando este sendo um jovem proveniente da classe média flagrado com certa quantidade de droga, não corresponde à imagem estereotipada do delinquente. Será, no tema tratado, portanto, tipificado como mero usuário pela sua simples aparência, enquanto que o jovem proveniente de classes inferiores, se flagrado com a mesma quantidade de drogas, possivelmente enquadrado como traficante.

Essas discrepâncias que ocorrem como consequência da falta de previsão legal sobre a quantidade da droga para a tipificação dos delitos, permitem uma análise subjetiva do agente, e com isso, como no exemplo dado acima, erros grotescos.           

5.2    Critérios quantitativos e sua falta de especificação legal

Olinger (2009, p.11), expõe em sua obra que o fato do dispositivo legal não especificar quantidades determinadas para que ocorra a diferenciação entre o consumidor e o traficante, expondo apenas que deverá o juiz analisar as circunstancias da infração, perfil do agente, entre outros, abriu caminho para uma discussão que vem sido feita após a promulgação do referido diploma. E ainda diz (2009, p.12):

Dessa forma existe uma tendência a continuar prendendo negros e pobres como traficantes, já que mesmo que sejam encontrados com uma quantidade muito pequena de droga, tem grande probabilidade de ser acusados, pelas circunstancias e perfil social, de estar servindo de atravessador/avião, enquanto o menino de classe média vai ter um bom advogado e mostrar que, com seu perfil e condição social não é traficante.

No mesmo entendimento, Thiago Rodrigues (2009. p. 10) adverte que:

Ao flexibilizar os critérios de definição de que quantidade da substância poderia ser para consumo próprio e o que caracterizaria tráfico, o Sisnad coloca a cargo da polícia ostensiva a decisão de abrir ou não um processo judicial, permitindo que o policial escolha quem será liberado e quem será encaminhado à Justiça. A nova lei de drogas legaliza a seletividade de sua aplicação. Quem define inicialmente se o indivíduo é traficante ou usuário ainda é o policial.          

Desta forma, Rodrigues expõe o entendimento que é necessário a modificação do dispositivo contido no §2º do art. 28 da nova Lei de Drogas, inserindo quantidades determinadas de cada substância entorpecente, de maneira que se pudesse objetivamente enquadrar o indivíduo como usuário ou traficante a partir da quantidade de drogas que possuísse. Por meio dessa mudança legislativa, haveria uma imensa contribuição para a redução de equívocos que habitualmente são cometidos pelas autoridades policiais no momento de classificar o agente como usuário ou traficante.

Há autores que ainda defendem a necessidade dos critérios quantitativos específicos na legislação de drogas, alegando ainda que este quesito é fundamental até mesmo para a atuação do magistrado, objetivando salvaguardar a sociedade de eventuais arbitrariedades.

Seguindo esta linha Pedrinha (2009, p. 5486):

A lei silencia quanto à quantidade específica de droga para classificar o usuário e o traficante, ficando a seleção ao arbítrio dos representantes do Estado. Dessa forma, a condição social, a cor, a raça de certos indivíduos serão fatores determinantes na aptidão à captura seletiva da policia e dos magistrados.

Na esteira do raciocínio de Pedrinha, soma-se o comentário de Nucci (2007, p. 308) quando aduz:

Naturalmente, espera-se que, com isso, não se faça uma juízo de valoração ligado às condições econômicas de alguém. Ex.: Se um rico traz consigo cinco cigarros de maconha, seria usuário porque pode pagar pelas drogas. Entretanto, sendo o portador pessoa pobre, a mesma quantidade seria considerada tráfico. [...] Ilustrando, de modo mais razoável: aquele que traz consigo quantidade elevada de substância entorpecente e já possui anterior condenação por tráfico evidencia, como regra, a correta tipificação no art. 33 desta Lei.[...] o agente que traz consigo pequena quantidade de droga, sendo primário e sem qualquer antecedente, permite a conclusão de se tratar de mero usuário [...]. Não há entre os critérios o predomínio de uns sobre os outros, tudo a depender do caso concreto.

Desta forma, adotando uma teoria mais crítica, Nucci considera que o magistrado, para diferenciar o traficante do usuário, observa apenas as circunstâncias pessoais e sociais, bem como os antecedentes do agente, ou seja, se for pobre será enquadrado como traficante, se for fico, como usuário.

Nesse sentido:

Levando-se em conta a grande quantidade de entorpecente encontrada, o valor e o escasso poder de compra do acusado, aliando-se ao fato de que levara ao local de serviço, tem-se que está correta a classificação do delito no art. 33 da Lei 11.343/2.006. (TJSP – AC 161.748-3/0 – Rel. Gentil Leite – RT 710/279)

Considerando a quantidade (15 g) e o valor da cocaína apreendida, em constrate com a modestíssima renda do recorrente confirmam a decisão de primeiro grau, que entendeu configurado o delito capitulado no art. 33 da Lei 11.343/06. (TJRS – AC – Rel. Oswaldo Proença – RJTJRS 145/115).

Em sentido contrário do que fora dito anteriormente, Vilar Lins (2007, p. 250), em suas observações apenas quanto ao modo como os critérios devem ser aplicados, sustenta que a mera quantidade não seria motivo suficiente para enquadrar a conduta nas hipóteses do art. 28, sendo assim necessário aplicar outros elementos para a identificação. Nesse sentido:

Impõe-se ao magistrado buscar informações sobre a quantidade máxima de uso de determinada substância, ou seja, o limite de tolerância do organismo, para avaliar se o numerário apreendido poderia ou não ser desarrazoado para o consumo de um único indivíduo. [...] Registra-se, entretanto, que o limite é variável de sujeito para sujeito, bem como, em muitas circunstâncias, a exemplo dos casos de vício, ou seja, de uso habitual, o usuário prefere adquirir em grande quantidade para não se ver compelido a retornar ao mundo do tráfico em um espaço curto de tempo. Verifica-se, ainda, que em diversas oportunidades, um indivíduo está a portar drogas cuja efetiva propriedade é de outrem, que pode ter conferido àquele a incumbência de adquirir ou guardar, temporariamente a droga.

5.3 A natureza da droga e os outros critérios diferenciadores

Quando se diz respeito à natureza da droga, essa referida autora (2007, p. 251) parte da premissa de que esse critério não deve ser analisado de forma isolada, sendo de extrema necessidade a apreciação juntamente com a quantidade da substância apreendida. Nesse entendimento, a mencionada autora dispõe que:

A natureza e a quantidade são critérios que devem ser pontuados conjuntamente, pois, a segunda está, essencialmente, atrelada à especificidade de cada substância. Assim, por exemplo, 100 gramas de cannabis (maconha) poderá ser considerado uma quantidade razoável para um usuário diário desta substância, o mesmo não podendo ser dito em face da cocaína ou heroína, cuja quantidade necessária para se obter o resultado esperado, bem como o seu nível de tolerância, é muito menor do que o da cannabis. A quantidade só será exorbitante, portanto, em face da natureza da substância em particular.

Ainda em seus ensinamentos sobre os critérios constantes do §2º do art. 28 da Lei de Drogas, Vilar Lins (2007, p. 251), ao discorrer sobre o local e a condição em que se desenvolve a ação de confisco da substância ilegal, assevera que:

O local e a condição em que ocorreu a apreensão formarão o cenário e o enredo em que estava inserido o usuário no momento em que foi flagrado. A doutrina fala, por exemplo, em locais em que, normalmente, são vendidas drogas, zona típica de tráfico. É conveniente ressaltar, entretanto, que, se existem essas zonas é porque também existem os usuários que lá transitam; assim, a presença de indivíduos neste loco não é razão suficientemente para enquadrá-lo no tráfico.

A autora explicita (2007, p. 251) ainda sobre as características pessoais e sociais do agente, sua conduta e antecedentes:

As características pessoais e sociais do agente, segundo a lei, também devem ser analisadas pelas autoridades. Dessa maneira, a atividade que o sujeito desenvolve, seu processo histórico, como se dão suas relações, qual sua fonte de renda e patrimônio são características que, em conjunto, formam o que Luiz Flávio Gomes (2006) denominou de modus vivendi do agente.

É nítido que neste momento entra em cena o principio da seletividade. Esse critério é um dos mais criticados pela doutrina, pois o que ocorre habitualmente é que apenas as pessoas marginalizadas terminam sendo punidas pelo sistema penal. A polícia no momento da abordagem do indivíduo já aplica o “etiquetamento” por meio dos estereótipos que foram criados.

O certo seria que no momento em que a autoridade estivesse diante do sujeito miserável, fosse imperiosa, de modo que a análise superasse apenas o estereótipo do agente e levasse em consideração a realidade e a problemática social, não apenas imputando maior lesão ao cidadão, fazendo com que a sua condição social sirva de mola propulsora ao encaminhamento do uso de drogas, bem como seja a própria navalha, apta a lhe proferir o novo golpe.

A condição miserável econômica e social do indivíduo não pode se tornar, ao mesmo tempo, o motivo de seu sofrimento diário e o argumento para concebê-lo como criminoso, sob pena de estar-se a violar a própria política de prevenção trazida pela Nova Lei de Drogas que resguarda uma proteção acrescida aos vulneráveis.

O entendimento de Vilar Lins (2007, p. 253) é de não oposição à norma e sim, quanto à aplicabilidade dos referidos critérios. Desse modo seu posicionamento defendendo que:

O estabelecimento de exemplos de situações que deverão ser investigadas para defrontar em qual delito está a incidir o agente é a solução menos arbitrária, pois, de alguma forma, a decisão deverá partir de critérios pré-estabelecidos pelos quais as autoridades, obrigatoriamente, deverão caminhar, na fundamentação de sua decisão. Apenas, aqui se alerta para a aplicabilidade destes critérios, em razão das profundas e abismais diferenças de padrão social e econômico dos indivíduos no Brasil.

Neste ponto em redor dos critérios diferenciadores entre o traficante e o usuário na Nova Lei de Drogas, a doutrina se diverge em várias opiniões, e levam à conclusão de que a análise desarrazoada destes dispositivos pelos aplicadores do direito, pode levar a uma serie de consequências errôneas e penosas aos seus destinatários. Já que por meio desses protagonistas e do meio como e onde vivem, da forma como fazem leitura do mundo e das pessoas, das ideologias que adotam nas suas manifestações, pode ocorrer uma penalização onde o alvo principal será apenas a população marginalizada, vista pela sociedade como costumeira infringidora da lei.


CONCLUSÃO

 A presente monografia buscou demonstrar como o direito penal brasileiro é seletivo ao estabelecer, por meio da Lei n. 11.343/2.006, as circunstâncias diferenciadoras que o juiz deve considerar ao diferenciar o usuário do traficante de drogas.

Feito isso, pode-se concluir que o direito penal não é igualitário, e que na verdade, prioriza os interesses das classes dominantes e criminaliza, de maneira seletiva, as classes sociais mais vulneráveis. Desde que as drogas foram criminalizadas, um grupo social, ou étnico, passou a ser identificado como criminoso, o que justificava a atuação do Estado contra essa parcela da população, certamente vulnerável, que sempre foi alvo de algum tipo de controle estatal.

O traficante possui um estereótipo de ser o sujeito que “comanda” o mercado das drogas, e habitualmente por meio da mídia, é relacionado a um rapaz jovem, negro, de bermuda e tênis, morador da favela, que controla grandes quantidades de drogas e que faz parte ou comanda o crime organizado.

A Nova Lei de Drogas, em seu artigo 28, §2º tentou diferenciar esse sujeito perigoso do usuário de drogas, dispondo que o juiz deverá considerar a natureza e a quantidade da substância apreendida, o local e as condições em que se desenvolveu a ação, as circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e os antecedentes do agente.

Quando a lei previu o local e as condições sociais do agente para determinar a diferença entre usuários e traficantes, ela já aplicou a seletividade primária, pois com isso, determinou-se que são as populações mais pobres as responsáveis pelo tráfico de drogas no Brasil. Desta forma, se uma pessoa da classe média (circunstancias sociais), num bairro também de classe média (local), for encontrada com determinada quantidade de droga, poderá ser mais facilmente identificada como usuário (e, portanto não será submetido à prisão) do que um pobre, com a mesma quantidade de droga, em seu bairro carente, confirmando assim a seletividade secundária.

A Nova Lei de Drogas demonstra que realmente o direito penal é seletivo, que está longe de defender a todos de maneira igualitária e que pune, de maneira desigual, aqueles que são submetidos ao sistema penal.

A seletividade punitiva, que se expressa através dos processos de criminalização primária e secundária revela a operacionalidade real do sistema penal. Desta forma, o sistema penal, ao tratar das drogas, legitima o controle social sobre as populações pobres, hoje vistas como “inimigas”, dada a sua exclusão do mercado consumidor. Na modernidade recente, ser pobre é sinônimo de ser “perigoso” e “criminoso”. Com isso, o poder configurador positivo do sistema penal se efetiva através do controle social exercido pela polícia sobre os guetos urbanos, seja restringindo o direito de reunião, locomoção, lazer ou da inviolabilidade domiciliar, sob a chancela discursiva do direito penal na “guerra contra as drogas”.

A repressão estatal se concentra na parte mais débil do mercado ilícito, ou seja, naquelas pessoas que não podem oferecer resistência aos comandos de prisão. Assim, a justiça penal não se destina a punir todas as práticas ilegais, operando tão somente um controle diferencial das ilegalidades.

É notório o aumento do encarceramento pelas condutas descritas como tráfico de droga, a partir da vigência da Lei n. 11.343/2.006. A atual lei reforça o discurso médico-jurídico para diferenciar o usuário e o traficante ao determinar “a observância do equilíbrio entre as atividades de prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas e de repressão à sua produção não autorizada e a seu tráfico ilícito, visando a garantir a estabilidade e o bem-estar social (art. 4º, IX)”. Em resumo, para o usuário prevenção, para os traficantes mais repressão.

O que ocorre na realidade quando se estuda a Lei n. 11.343/06, é que quem está preso por tráfico de drogas no Brasil, bem como onde está concentrada a repressão policial e o modelo de segurança pública adotado no Brasil para o “combate às drogas”, percebe-se que na realidade o que interessa para o Estado, apoiado pela mídia e por grande parcela da sociedade brasileira, é manter segregadas as classes sociais mais pobres.


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Nota

[1] BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Criminal : ACR 468911 SC 1988.046891-1. Relatora: Odete Maria de Oliveira. Disponível em <http://tj-sc.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/3757542/apelacao-criminal-acr-468911/inteiro-teor-10940926>. Acesso em 25 set 2013.



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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GODOY, Gabriella Talmelli. Seletividade penal na Lei de Drogas - Lei n. 11.343/2006. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3919, 25 mar. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27071. Acesso em: 29 mar. 2024.