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Aborto: um enfoque à luz do pacto internacional sobre direitos civis e políticos e da convenção americana de direitos humanos

Aborto: um enfoque à luz do pacto internacional sobre direitos civis e políticos e da convenção americana de direitos humanos

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A revisão da legislação penal quanto ao aborto é medida essencial para a defesa dos direitos à vida, à saúde, à autonomia, ao respeito e à dignidade das mulheres. E, sobretudo, um imperativo de direitos humanos, sob a perspectiva da saúde pública e da justiça social.

Resumo:  O presente artigo trata do tema do aborto à luz do direito comparado e dos tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Estado brasileiro, em especial o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana de Direitos Humanos. Estabelece, como premissa, a existência de um atraso pontual da legislação pátria, que criminaliza o aborto, quando comparada à legislação de países desenvolvidos, que permitem a interrupção da gravidez nos primeiros estágios da gestação. O aborto, principalmente durante o primeiro trimestre de gestação, já foi eliminado dos códigos penais de diversas partes do mundo. A maioria dos países desenvolvidos do Atlântico Norte e da Europa descriminalizou tal prática durante os primeiros estágios da gestação, de modo que a restrição severa ao aborto é medida prevalecente, apenas, nos países em desenvolvimento, como o Brasil. Paralela e contrariamente a esse contexto de privação de autonomia individual da mulher brasileira, firmou-se o processo de universalização, positivação e especificação dos direitos humanos em âmbito internacional, legitimando a preocupação, globalizada, a respeito dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Isso porque, em face do avanço dos direitos humanos em nível global, a liberdade de procriação não pode ser objeto de manipulação estatal. Nesse sentido, com base na observação do tratamento internacional conferido à interrupção voluntária da gravidez, necessário se faz a cristalização de novos valores sociais sobre os direitos fundamentais da mulher no mundo contemporâneo, de modo que, sob uma perspectiva sociojurídica, esses direitos não podem ser negligenciados quando se buscam soluções mais justas e adequadas para a ultrapassagem dessa retrógrada fase de proibição do aborto. Essa é a problemática abordada pelo presente artigo.

Palavras-chave: 1. Aborto. 2. Legislação Brasileira. 3. Tratados Internacionais de Direitos Humanos. 4. Direito Internacional


1      INTRODUÇÃO

A análise do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e da Convenção Americana de Direitos Humanos fundamenta o entendimento da possibilidade do direito de se legalizar o aborto com base nos direitos e garantias individuais (liberdade, intimidade, privacidade, autonomia reprodutiva), e sociais (saúde) da mulher.

As evidências têm demonstrado que a simples proibição do aborto em nada tem contribuído para diminuir sua prática entre as mulheres. Constata-se que países com legislações restritivas apresentam taxas mais elevadas de aborto entre mulheres em idade reprodutiva do que países que asseguram ampla autonomia da mulher em decidir pelo destino da gravidez, nos quais as taxas de aborto estão entre as mais baixas. Nesse contexto, o aborto já foi amplamente eliminado dos códigos penais, principalmente durante o primeiro trimestre de gestação, a exemplo do Canadá em 1969, Estados Unidos (1973), França (1975), Austrália (1975), Nova Zelândia (1977), Itália (1978), Holanda (1980), Espanha (1985), Alemanha (1993), tornando a proibição total uma medida que prevalece, apenas, nos países em desenvolvimento[1].

No Brasil, o aborto é considerado crime, com duas exceções: em caso de risco de vida para a mulher e em caso de estupro[2]. Apesar disso, dados coletados em todo Brasil urbano, comprovem que uma em cada cinco mulheres entre 18 e 40 anos de idade  já  realizou pelo menos um  aborto. Isso significa que mais de cinco milhões de mulheres em idade reprodutiva, ou 15% das mulheres nessa faixa etária, já realizaram o aborto[3].

Paralelamente a esse contexto, vivencia-se uma fase de universalização, positivação e especificação dos direitos humanos, sendo legítima e necessária a preocupação a respeito do modo pelo qual os habitantes de outros Estados são tratados, uma vez que a proteção dos direitos humanos não deve ser reduzida ao domínio reservado do Estado, isto é, não se deve restringir à competência nacional exclusiva ou à jurisdição doméstica exclusiva, porque revela tema de legítimo interesse internacional, o que inclui o tratamento dispensado ao tema alusivo ao aborto.

Com base no exposto, observa-se que a legislação interna, restritiva, e punitiva está em total desconexão com os parâmetros internacionais, contrariando, assim os princípios que regem as relações internacionais da República Federativa do Brasil, em especial a prevalência dos direitos humanos[4], consagrada no art. 4º, II, da Carta Magna. Assim, questiona-se se seria possível um avanço no plano legal associando o aborto aos direitos e garantias individuais (liberdade, intimidade, privacidade, autonomia reprodutiva), e sociais (saúde) da mulher, sem conflitar com a Norma Fundamental e com os tratados internacionais de direitos humanos ratificados por nosso país. 

A metodologia será pautada no método bibliográfico.


2      OS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES COMO DIREITOS UNIVERSAIS

A universalidade é uma das características básicas dos direitos humanos[5], reconhecida no preâmbulo da Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH):

(...) o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo[6].

Tal característica significa dizer que os direitos humanos se estendem a todos os seres humanos existentes no planeta e tem como base a ideia de que a condição de pessoa é o requisito único para a dignidade e a titularidade de direitos. Dessa forma, a dignidade humana é colocada como o fundamento dos direitos humanos, pressuposto para o estabelecimento de uma ordem pública mundial, visto que abriga os valores considerados básicos da humanidade.

Ao fixar a ideia de que os direitos humanos são direitos universais decorrentes da dignidade humana, pressupõe-se que tais direitos não derivam das peculiaridades sociais e culturais de determinada sociedade, portanto, independente da cultura em que o indivíduo esteja inserido, cada ser humano, em sua individualidade, pelo simples fato de ter nascido, tem dignidade e direitos iguais a qualquer outro. Conforme esclarece Emmanuel Ribeiro[7], trata-se de universalizar os valores embutidos na ideia de dignidade humana, da qual decorre uma série de direitos que precisam ser institucionalizados e concretizados para garantir proteção, segurança e bem-estar a cada um dos membros da sociedade. Assim, cada sociedade em particular deve introduzir em sua estrutura normativa jurídica esse mínimo comum que garanta uma existência digna para os seus membros.

Nesse sentido, a proteção dos direitos humanos não deve se reduzir ao domínio restrito do Estado, tampouco se limitar à competência nacional exclusiva ou à jurisdição doméstica exclusiva, porque se constitui em tema de interesse internacional:

O Direito Internacional dos Direitos Humanos pressupõe como legítima e necessária a preocupação de atores estatais e não estatais a respeito do modo pelo qual os habitantes de outros Estados são tratados. A rede de proteção dos direitos humanos internacionais busca redefinir o que é matéria de exclusiva jurisdição doméstica dos Estados[8].

Na medida em que há a cristalização da ideia de que o indivíduo, na condição de sujeito de Direito, deve ter direitos protegidos na esfera internacional, passam a ser admitidas intervenções no plano nacional em prol da proteção dos direitos humanos, e a noção tradicional de soberania absoluta do Estado passa a sofrer um processo de relativização, permitindo formas de monitoramento e responsabilização internacional, quando os direitos humanos forem violados[9].

Dessa forma, o consenso internacional a respeito de temas centrais focado nos direitos humanos, através da adoção de inúmeros tratados internacionais voltados à proteção de direitos fundamentais, passam a ser admitidos como reflexo da consciência contemporânea compartilhada pelos Estados de que os direitos humanos devem ser tratados globalmente de forma justa e equitativa, em pé de igualdade e com a mesma ênfase[10].

O primeiro tratado de fundamental importância para a proteção dos direitos humanos das mulheres de âmbito global foi a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher[11], de 1979[12], que dentre suas previsões, consagrou a urgência em se erradicar todas as formas de discriminação contra as mulheres, a fim de que se garantisse o pleno exercício de seus direitos civis e políticos, como também de seus direitos sociais, econômicos e culturais. No dizer de Andrew Byrnes:

Inúmeras previsões da Convenção também incorporam a preocupação de que os direitos reprodutivos das mulheres devem estar sob o controle delas próprias, cabendo ao Estado assegurar que as decisões das mulheres não sejam feitas sob coerção e não sejam a elas prejudiciais, no que se refere ao acesso às oportunidades sociais e econômicas[13].

Percebe-se, nessa Convenção a semente de todo um desenvolvimento normativo posterior no tocante à construção conceitual dos direitos reprodutivos, como direitos que demandam do Estado um duplo papel: de um lado negativo – dimensão própria dos direitos civis, como a não discriminação, o espaço da autonomia e da autodeterminação no exercício da sexualidade e reprodução – e de outro, positivo e promocional – dimensão própria dos direitos sociais, como o direito à saúde, mediante a implementação de políticas públicas positivas pelo Estado.

Em 1993, a Declaração de Direitos Humanos de Viena, que reitera a concepção de universalidade da DUDH[14], afirma, em seu parágrafo 18, que os direitos humanos das mulheres são parte inalienável, integral e indivisível dos direitos humanos universais[15].

Esses delineamentos foram aprimorados e consolidados a partir do Plano de Ação da Conferência sobre População e Desenvolvimento do Cairo, de 1994 e pela Declaração e Plataforma de Ação de Pequim, de 1995, que, embora não sejam tratados internacionais, mas declarações, apresentam valor jurídico, na medida em que deles são extraídos princípios internacionais, que constituem importante fonte do Direito Internacional a nortear e orientar a interpretação e a aplicação do Direito[16].

Feitas essas considerações sobre o alcance da concepção contemporânea de direitos humanos das mulheres, passa-se à reflexão do aborto no cenário internacional.


3 SISTEMA GLOBAL DE PROTEÇÃO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS:

A universalização dos direitos humanos fez com que os Estados consentissem em submeter ao controle da comunidade internacional o que até então era de seu domínio reservado, trazendo a necessidade de implementação de direitos comuns, mediante a criação de uma sistemática internacional de monitoramento e controle. Como a Declaração Universal de Direitos Humanos, de 1948, não apresenta força jurídica obrigatória e vinculante, se faz necessário assegurar, de maneira juridicamente obrigatória, a observância dos preceitos nela contidos, é assim que surgem, em 1966[17], dois tratados internacionais distintos: o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que passam a constituir referências necessárias para o exame do regime normativo de proteção internacional dos direitos humanos.

A seguir a análise do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, mas especificamente a análise de seu art. 6º, o qual dispõe sobre o direito à vida.

3.1 A proteção à pessoa humana conferida pelo Pacto Internacional Dos Direitos Civis e Políticos de 1966

O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, elaborado em 1966, pela Assembleia Geral da ONU só entrou em vigor, em 1976, ao atingir o número mínimo de ratificações. Foi aprovado pelo Brasil em 1991 e entrou em vigor em 1992. Tal Pacto reafirma alguns dos ideais trazidos pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, introduzindo tais direitos entre os tratados de cumprimento obrigatório, e, principalmente, trazendo medidas contra a violação destes.

Quanto ao catálogo de direitos civis e políticos propriamente dito, o Pacto não só incorpora inúmeros dispositivos da DUDH, com maior detalhamento, como também estabelece o elenco desses direitos[18].

Dentre os principais direitos e liberdades contemplados pelo Pacto de Direitos Civis e Políticos, está o direito à vida, consagrado em seu art. 6º, da seguinte forma: “O direito à vida é inerente à pessoa humana. Este direito deverá ser protegido por lei. Ninguém poderá ser arbitrariamente privado de sua vida”.

Ao dispor que o direito à vida é inerente à pessoa humana, o referido dispositivo leva a compreensão de que falar em vida humana e em pessoa humana não é a mesma coisa, e, assim, a proteção à vida do nascituro não é equivalente àquela proporcionada após o nascimento. Esse é o entendimento esposado pelo jurista Daniel Sarmento, em sua obra Legalização do Aborto e Constituição[19], e que tem prevalecido amplamente no mundo[20], como se pode, assim, observar:

(...) o nascituro, embora já possua vida, não é ainda pessoa. Isto, frise-se bem, decorre não apenas da lei. Recorde-se, no particular, que o Código Civil brasileiro é expresso ao estabelecer, logo no seu art. 2º, “que a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos o nascituro”. [...] Neste ponto cumpre esclarecer que falar em vida humana e em pessoa humana não é a mesma coisa. Indiscutivelmente o embrião pertence a espécie homo sapiens, sendo, portanto, humano [...]  Possui o embrião identidade própria caracterizada pelo fato de que constitui um novo sistema em relação à mãe e é dotado de um código genético único, trata-se, portanto, de autêntica vida humana, e como projeto de pessoa, merece já o nascituro a proteção do ordenamento e da Constituição. Não, porém, o mesmo grau de proteção que se confere à pessoa[21].

Nesse mesmo sentindo, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ao comentar a Constituição da República Portuguesa anotada[22], esclarecem:

A Constituição não garante apenas o direito à vida, enquanto direito fundamental das pessoas. Protege igualmente a própria vida humana, independentemente dos seus titulares, como valor ou bem objectivo (...) Enquanto bem ou valor constitucionalmente protegido, o conceito de vida humana parece abranger não apenas a vida das pessoas, mas também a vida pré-natal, ainda não investida numa pessoa (...).. É seguro, porém, que (a) o regime de protecção da vida humana, enquanto simples bem constitucionalmente protegido, não é o mesmo que o direito à vida, enquanto direito fundamental das pessoas, no que respeita à colisão com outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos (v. g., vida, saúde, dignidade, liberdade da mulher, direito dos progenitores a uma paternidade e maternidade consciente); (b) a protecção da vida intra-uterina não tem que ser idêntica em todas as fases do seu desenvolvimento, desde a formação do zigoto até ao nascimento;(c) os meios de protecção do direito à vida designadamente os instrumentos penais podem mostrar-se inadequados ou excessivos quando se trate da protecção da vida intra-uterina."[23]

É possível notar que esse entendimento reconhece a tutela constitucional da vida intrauterina, mas atribui a ele uma proteção mais débil do que a concedida à vida extrauterina. Dessa forma, não nega à vida em formação qualquer proteção, porém, não a iguala por completo à da pessoa que já nasceu, uma vez que o embrião se encontra somente a caminho de se tornar homem.

Portanto, é possível concluir que a proteção à vida embrionária não possui peso absoluto; de forma que tal direito há que ser ponderado quando em confronto com os direitos fundamentais das pessoas já nascidas, in casu, os direitos das mulheres à saúde, privacidade, liberdade e autonomia reprodutiva, de modo a haver uma harmonização dos preceitos contidos não só na Constituição da República Federativa do Brasil como também em outros tratados internacionais sobre direitos humanos.


4 SISTEMA REGIONAL DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS – SISTEMA INTERAMERICANO

O sistema internacional de proteção dos direitos humanos pode apresentar diferentes âmbitos de aplicação. Assim, podemos falar em dois sistemas: o sistema global e o regional. Os instrumentos de direitos humanos produzidos no âmbito das Nações Unidas, como, por exemplo, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, acima analisado, representam os Estado participantes da comunidade internacional; já os instrumentos que buscam internacionalizar os direitos humanos no plano regional, como, particularmente, na Europa, América e África, integram os sistemas regionais de proteção. Tal divisão visa a um consenso político mais facilitado.

A Convenção Americana de Direitos Humanos – analisada adiante – é o principal e mais importante instrumento do sistema regional interamericano de proteção dos direitos humanos.

4.1 A proteção à vida conferida pela Convenção Americana de Direitos Humanos (1969).

A Convenção Americana de Direitos Humanos, denominada, também, de Pacto de San José da Costa Rica, foi assinada em San José, Costa Rica, em 1969, entrando em vigor em 1978, sendo ratificada pelo Brasil, apenas, em 1992.

Substancialmente, ela assegura um catálogo de direitos civis e políticos similar ao previsto pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos. Dentre os direitos consagrados, dispõe, no item 4.1, sobre o direito à vida da seguinte forma:

4.1Toda pessoa tem direito a que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente.

  Observa-se que o Pacto de San José protege a vida desde a concepção, reforçando a Teoria Concepcionista[24], pela qual o ser humano adquire personalidade jurídica desde a fecundação, sendo já considerado pessoa, ainda que em situação extracorpórea. É com base, nessa Teoria, que os segmentos que reprovam a liberalização do aborto fundamentam a incompatibilidade instransponível entre a descriminalização da interrupção voluntária da gravidez e o disposto no Pacto.

  De fato, uma primeira impressão pode dar margem ao entendimento de que o Pacto de San José  da  Costa  Rica  é  antagônico ao aborto, mas o emprego da expressão ‘em geral’, no texto do item 4.1, revela que não se pode falar em proteção absoluta à vida intrauterina. A esse propósito, afirma o jurista e professor Fábio Konder Comparato:

Ao dispor o art. 4º que o direito à vida deve ser protegido pela lei desde o momento da concepção, vetou em princípio a legalização do  aborto.  Digo  “em  princípio”,  porque  a  cláusula  em  geral, constante  dessa  disposição,  parece  abrir  a  possibilidade  do estabelecimento  de  exceções  à  regra.[25]                                                

Este também é o entendimento professado por Daniel Sarmento, que afirma que o uso da cláusula ‘em geral’ mostra que a proteção à vida intrauterina deve ser concebida como um princípio e não como uma regra, de forma que a proteção do nascituro seria um ‘mandado de otimização’ em favor de um interesse constitucionalmente relevante, qual seja, a vida embrionária, sujeito, contudo, a ponderações com outros princípios constitucionais e que pode ceder diante deles em determinadas circunstâncias, vejamos:

A tese que ora se sustenta também parte da premissa de que a proteção da vida se inicia no momento da concepção. Apenas afirma que a tutela da vida anterior ao parto tem de ser menos intensa do que a proporcionada após o nascimento, sujeitando-se, com isso, a ponderações de interesses envolvendo outros bens constitucionalmente protegidos. Notadamente os direitos fundamentais da gestante. Aliás, o emprego da expressão “em geral”, no texto do artigo em discussão, revela com nitidez que as partes celebrantes do tratado não quiseram conferir à vida intra-uterina uma proteção absoluta. Neste particular, o uso da cláusula em geral evidencia que a proteção à vida intra-uterina deve ser concebida como um princípio e não como uma regra. Em outras palavras, e empregando a conhecida fórmula de Robert Alexy, a proteção ao nascituro constitui um “mandado de otimização” em favor de um interesse constitucionalmente relevante – a vida embrionária – sujeito, contudo, a ponderações com outros princípios constitucionais, e que pode ceder diante deles em determinadas circunstâncias[26].

Nota-se que esse entendimento se reforça diante da interpretação sistemática da CADH, que consagra uma série de outros direitos titularizados pelas mulheres e também pelas gestantes, quais sejam: direito ao respeito à integridade física, psíquica e moral (art. 5º,1), direito à liberdade e segurança pessoais (art. 7º,1), direito à proteção à vida privada (art. 11, 2).

Ademais, deve-se ainda buscar uma harmonização entre o disposto no Pacto de San José da Costa Rica e os demais tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil, de modo que os direitos da mulher à saúde, à privacidade, à autonomia reprodutiva, aos direitos sexuais, não podem ser esquecidos em detrimento do direito à vida do nascituro, todos esses são direitos constitucionalmente relevantes e que merecem ser devidamente protegidos.


5 O ABORTO NO CENÁRIO INTERNACIONAL

O aborto é uma questão moral altamente controvertida em todo o mundo. As legislações dos diferentes países vão da criminalização e da proibição completa até o acesso praticamente irrestrito à interrupção voluntária da gravidez. Pesquisas sobre o tema têm demonstrado que é notório que as taxas de aborto nos países onde esse procedimento é permitido são muito semelhantes àquelas encontradas nos países onde ele é ilegal. Na verdade, a principal diferença entre os países que escolheram criminalizar essa prática e aqueles que a permitem é a taxa de incidência de abortos arriscados ou com pouca segurança. A criminalização também tem sido vista como uma discriminação de fato contra mulheres pobres que precisam recorrer a métodos primitivos de interrupção da gestação devido à falta de acesso à assistência médica, pública ou privada[27].

A interrupção voluntária da gravidez, principalmente durante o primeiro trimestre de gestação, tem sido amplamente eliminada dos códigos penais, começando com o Canadá (1969), os Estados Unidos (1973) e a França (1975). Diversos outros países seguiram essa tendência, incluindo a Austrália (1975), a Nova Zelândia (1977), a Itália (1978), a Holanda (1980) e a Bélgica (1990). Na Alemanha uma decisão judicial, de 1993, levou à descriminalização do aborto durante o primeiro trimestre, desde que certas condições sejam satisfeitas. Pesquisas comprovam que a maioria dos países desenvolvidos do Atlântico Norte e da Europa descriminalizou o aborto durante os primeiros estágios da gestação, tornando a proibição total uma medida que prevalece, apenas, nos países em desenvolvimento[28].

As dinâmicas na tendência de liberalização do aborto variaram de país para país, bem como as soluções adotadas, de forma que não seria possível discorrer, detalhadamente, o que ocorreu nos inúmeros Estados que modificaram a legislação relativa ao aborto[29], porém, da análise de trechos de alguns julgados que levaram a liberalização dessa prática é possível perceber que todos adotaram como premissa básica a ideia de que a proteção ao feto não é absoluta e deve haver uma ponderação entre a vida do embrião e outros direitos da gestante que não à própria vida. Seguem pois alguns dos entendimentos adotados por Cortes estrangeiras:

5.1 Estados Unidos:

A questão do aborto não está diretamente regulada pela Constituição norte-americana, mas, no famoso caso Roe vs. Wade, julgado pela Suprem Corte, em 1973, entendeu-se que o direito à privacidade envolveria o direito da mulher de decidir sobre a continuidade ou não da sua gestação. Assim:

“O direito de privacidade (...) é amplo o suficiente para compreender a decisão da mulher sobre interromper ou não sua gravidez. A restrição que o Estado imporia sobre a gestante ao negar-lhe esta escolha é manifesta. Danos específicos e diretos, medicamente diagnosticáveis até o início da gestação, podem estar envolvidos. A maternidade ou a prole adicional podem impor à mulher uma vida ou futuro infeliz. O dano psicológico pode ser iminente. A saúde física e mental podem ser penalizadas pelo cuidado com o filho. Há também a angústia, para todos os envolvidos, associada à criança indesejada e também o problema de trazer uma criança para a família inapta, psicologicamente ou por qualquer outra razão, para cria-la. Em outros casos, como no presente, a dificuldade adicional e o estigma permanente da maternidade fora do casamento podem estar envolvidos (...) Nós assim concluímos que o direito de privacidade inclui a decisão sobre o aborto, mas que este direito não é incondicionado e deve ser sopesado em face daqueles importantes interesses estatais[30].

5.2 Itália:

A Corte Constitucional italiana declarou, em fevereiro de 1975, a inconstitucionalidade parcial do art. 546, do Código Penal, que punia o aborto sem excetuar a hipótese de que sua realização poderia implicar em dano ou risco à saúde das gestantes. A  seguir, um trecho da Sentença nº18:

(...) o interesse constitucionalmente protegido relativo ao nascituro pode entrar em colisão com outros bens que gozam de tutela constitucional e que, por consequência, a lei não pode dar ao primeiro uma prevalência total e absoluta, negando aos segundos adequada proteção. E é exatamente este o vício de ilegitimidade constitucional que, no entendimento da Cote, invalida a atual disciplina penal do aborto (...) Ora, não existe equivalência entre o direito não apenas à vida, mas também à saúde de quem já é pessoa, como a mãe, e a salvaguarda do embrião, que pessoa ainda pode tornar-se[31].

5.3 Alemanha:

Em 1993, a Corte Constitucional da Alemanha emitiu decisão conhecida como Aborto II; nesse julgamento, ela afirmou que a proteção ao feto não precisava ser, necessariamente, através dos meios repressivos de Direito Penal, mas através de outras medidas de caráter assistencial e administrativo:

Os embriões possuem dignidade humana; a dignidade não é um atributo apenas de pessoas plenamente desenvolvidas ou do ser humano depois do nascimento... Mas, na medida em que a Lei Fundamental não elevou a proteção da vida dos embriões acima de outros valores constitucionais, este direito a vida não é absoluto... pelo contrário, a extensão do dever do Estado de proteger a vida do nascituro deve ser determinada através da mensuração da sua importância e da necessidade de proteção em face de outros valores constitucionais. Os valores afetados pelo direito à vida do nascituro incluem o direito da mulher a proteção e respeito à própria dignidade, seu direito a vida e à integridade física e seu direito ao desenvolvimento da personalidade... Embora o direito à vida do nascituro tenha um valor muito elevado, ele não se estende ao ponto de eliminar todos os direitos fundamentais das mulheres à autodeterminação. Os direitos fundamentais das mulheres podem gerar situação em que seja permissível em alguns casos, e até obrigatório, em outros, que não se imponha à elas o dever legal de levar a gravidez a termo. [32]

5.4 Espanha:

Na decisão em que se analisou a constitucionalidade do Projeto de Lei que previa a alteração do Código Penal, em 1985, a Corte Espanhola adotou, como premissa, a ideia de que a vida do nascituro é protegida pela Constituição, mas não com a mesma intensidade com que se tutela a vida humana após o nascimento, concluindo no sentido da admissibilidade da realização de ponderação entre a vida do embrião e outros direitos da gestante que não a própria vida:

Os casos envolvendo aborto não podem contemplar-se tão somente desde a perspectiva dos direitos da mulher nem desde a proteção da vida do nascituro. Nem esta pode prevalecer incondicionalmente frente àqueles, nem os direitos da mulher podem ter primazia absoluta sobre a vida do nascituro (..). Por isso, na medida em que não se pode afirmar de nenhum deles (os interesses em conflito) seu caráter absoluto, o intérprete constitucional se vê obrigado a ponderar os bens e direitos ... tratando de harmonizá-los se isto for possível ou, em caso contrário, precisando as condições e requisitos em que se poderia admitir a prevalência de um deles.[33]

Hoje, o aborto é permitido na Espanha até a 14ª semana de gestação e, até a 22ª, desde que a gestação possa comprometer a vida ou a saúde da gestante ou constatada malformação no feto, se certificada por dois médicos.

5.5 A criminalização do aborto no Brasil

No Brasil, o aborto é considerado crime, com duas exceções: em caso de risco de vida para a mulher e em caso de estupro[34]. Apesar disso, de acordo com os dados coletados em todo Brasil urbano, uma em cada cinco mulheres entre 18 e 40 anos de idade já realizou pelo menos um aborto. Isso significa que mais de cinco milhões de mulheres em idade reprodutiva, ou 15% das mulheres nessa faixa etária, já realizaram o aborto[35].

As evidências têm demonstrado que a simples proibição do aborto em nada tem contribuído para diminuir sua prática entre as mulheres. Constata-se que países com legislações restritivas apresentam taxas mais elevadas de aborto entre mulheres em idade reprodutiva do que países que asseguram ampla autonomia da mulher em decidir pelo destino da gravidez, nos quais as taxas de aborto estão entre as mais baixas[36].

O assunto ‘aborto’ vem sendo tratado em diferentes tendências com o passar dos anos; a primeira caracterizou-se pelo uso de leis criminais como instrumento de proteção de grau máximo da vida humana; uma segunda tendência é a de regular o acesso ao abortamento por leis de saúde, relacionando as questões de reprodução humana ao direito à saúde[37]; uma terceira tendência, seguindo o exemplo de diversos países, seria/deveria, então, apontar para o uso de leis constitucionais e convenções internacionais dos direitos humanos, que associam o direito ao aborto aos direitos e garantias individuais (liberdade, intimidade, privacidade, autonomia reprodutiva), e sociais  (saúde),  defendendo  o  direito  da  mulher  ao  aborto  voluntário, mesmo que, para isso, sejam satisfeitas determinadas condições.

Embora já existam avanços pontuais no entendimento jurisprudencial pátrio, como o de não ser punível o aborto no caso de fetos anencefálicos[38], as tentativas de alargamento das possibilidades de prática do aborto no Brasil são frustradas; os projetos de leis para a ampliação dos permissivos legais relativos ao abortamento, ou aqueles que preveem a retirada do aborto do rol de crimes, ou, ainda, a legalização da prática, não avançam.

Constata-se, no âmbito do poder executivo brasileiro, que já deveria ter havido a implementação de algumas ações importantes para avanços no plano legal da possibilidade de aborto em nosso país, uma vez que o Governo Federal assumiu, em 2002 e em 2010, através do Programa Nacional de Direitos Humanos 2 e 3[39], o compromisso de apoiar reformas legais que visassem à adequação do Código Penal para a descriminalização do aborto e o alargamento dos permissivos para a prática do aborto legal, em conformidade com os compromissos assumidos pelo Estado brasileiro no marco da Plataforma de Ação de Pequim(1995)[40], como  uma questão de direitos humanos relevante.

Não obstante a existência de ações pontuais do setor saúde e de promoção de políticas para as mulheres no âmbito federal, essas, apenas, têm revelado a disposição governamental na discussão e não o efetivo avanço no plano legal da possibilidade de aborto como direito e garantia individual da mulher em nosso país.

À luz desse contexto, procede-se a avaliação da viabilidade de legalização do aborto no Brasil com base no direito público, no direito público privado e no direito interno, visando responder se seria compatível entre esses sistemas a mudança do tratamento legal conferido ao aborto em nosso país.


6 A VIABILIDADE DE LEGALIZAÇÃO DO ABORTO NO BRASIL COM BASE NO DIREITO PÚBLICO, NO DIREITO PÚBLICO PRIVADO E NO DIREITO INTERNO

A Carta Magna Brasileira não trata expressamente do aborto, o que não significa, obviamente, que o tema da interrupção voluntária da gravidez seja um indiferente constitucional; muito pelo contrário, a matéria está fortemente impregnada de conteúdo constitucional na medida em que envolve direitos fundamentais que concernem proteção não só a mulher, mas também, ao feto. Ademais é, na Constituição, que deve ser buscado o norte para o equacionamento jurídico a ser conferido à questão da descriminalização do aborto, devendo qualquer entendimento voltado à interrupção voluntária da gravidez se coadunar com seus preceitos.

É necessário se atentar, ainda, para o caráter constitucional dos tratados internacionais sobre direitos humanos[41], de modo que os preceitos legais infraconstitucionais devem buscar harmonização não só com a Constituição, mas também com os tratados de direitos humanos e demais tratados ratificados pelo país, uma vez que a previsão do art. 5º, §2º, da Carta de 1988, dispõe que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes dos tratados internacionais de que o Brasil é integrante.

Como esclarecido anteriormente, um argumento muito forte para os segmentos que reprovam a liberalização do aborto seria a incompatibilidade instransponível entre a legalização e o Pacto de San José da Costa Rica, e um argumento muito forte para aqueles que defendem a liberalização do aborto seria o da proteção à vida do nascituro não ser equivalente àquela proporcionada à vida após o nascimento, com respaldo não só no Pacto de Direitos Civis e Políticos, mais ainda na Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher, no Plano de Ação da Conferência sobre População e Desenvolvimento do Cairo de 1994 e pela Declaração e Plataforma de Ação de Pequim de 1995[42].

Ocorre que, mesmo para quem atribua caráter constitucional ao Pacto de San José da Costa Rica, não se pode conferir peso absoluto à proteção da vida embrionária quando a saúde da mulher, a privacidade, a autonomia reprodutiva e a igualdade são valores contidos não só na Constituição da República, como também em outros tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo nosso país, a exemplo do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e da Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher.

Esse posicionamento, conforme já demonstrado, foi adotado por diversos países e encontra total respaldo em nosso sistema normativo. Observa-se que a Carta de 1988, em seu artigo 226, parágrafo 7º, está afinada com os parâmetros internacionais, na medida em que afirma o planejamento familiar como livre decisão do casal (e dos indivíduos), cabendo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito (prestação estatal positiva, típica dos direitos sociais), vedada qualquer coerção (prestação estatal negativa, típica dos direitos civis). A Lei 9.263, de 12 de janeiro de 1996, veio regulamentar o aludido preceito constitucional, tratando do planejamento familiar, no âmbito do atendimento global e integral à saúde. Em seu artigo 2º, a Lei define o planejamento familiar como ‘o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal’. O parágrafo único desse artigo proíbe a utilização de tais ações para qualquer tipo de controle demográfico[43].

Cabe ao País, em vez de interferir nas decisões sobre a reprodução, livre de discriminação, coerção ou violência, adotar políticas públicas garantidoras do direito à saúde sexual e reprodutiva, dimensão típica dos direitos sociais[44], bem como criar mecanismos extrapenais para evitar a banalização da prática. A mudança da legislação pátria relativa ao aborto baseia-se não só em argumento fáticos e políticos, mas principalmente em argumentos jurídicos:

No plano jurídico, a criminalização do aborto viola os chamados direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, amparados pela Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento do Cairo de 1994, bem como pelas Conferências de Copenhagem de 1994 e de Pequim de 1995. A criminalização do aborto resulta, assim, como uma violação a direitos humanos internacionalmente protegidos, em particular nas esferas da sexualidade e reprodução. Importa reiterar que a comunidade internacional, por meio de comitês da ONU sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher (CEDAW), e sobre Direitos Humanos (PIDCP) recomendou ao Estado brasileiro a adoção de medida que garantem o pleno exercício dos direitos sexuais e reprodutivos. Este comitês enfatizaram a necessidade de revisão da legislação punitiva com relação ao aborto a fim de que o mesmo seja enfrentado como grave problema de saúde pública. [45].

Apesar disso, há uma falta de ação do poder legislativo brasileiro, que parece deixar prevalecer questões culturais e socioeconômicas para a mudança da lei restritiva brasileira, que não mais é compatível com o conjunto de novos valores e vivências. Sabe-se que o Código Penal Brasileiro é de 1940 e foi elaborado no contexto de uma sociedade profundamente machista, e num momento político autoritário, em que a liberdade e os direitos sexuais não eram devidamente prezados, porém, hoje, não há como se negligenciar os valores que têm sido incorporados e aceitos como elementos da vida moderna em especial nos grandes centros urbanos do país como, por exemplo, a liberdade sexual para homens e mulheres, a difusão de métodos contraceptivos, a divulgação e uso da camisinha como elemento moderno de garantia de vida e de saúde no contexto da AIDS, o reconhecimento da maternidade solteira, etc.[46].

Ademais, a observância da legislação internacional e, em particular daquela relativa a direitos humanos, se constitui em diretriz relevante nos dias atuais, uma vez que a Carta Magna Brasileira, ao consagrar a prevalência dos direitos humanos como princípio a reger a ordem constitucional[47], se compromete não apenas com o engajamento do país no processo de elaboração de normas vinculadas ao Direito Internacional dos Direitos Humanos, mas sim na busca da plena integração de tais regras na ordem jurídica interna brasileira[48], de modo que o Estado, ao adotar determinado tratado internacional de direitos humanos, passa a ter o dever de equacionar o direito interno com as obrigações internacionalmente assumidas.

 


7 CONCLUSÃO

A cristalização de novos valores sociais sobre o papel da mulher no mundo contemporâneo, o reconhecimento da igualdade de gênero e a mudança de paradigma em relação à sexualidade feminina, com a superação da ótica que circunscrevia a legitimidade do seu exercício às finalidades reprodutivas, são componentes essenciais de um novo cenário axiológico, absolutamente diverso daquele em que foi editada a legislação repressiva de cuja revisão ora se cogita.

Hoje, não há mais como pensar no tema da interrupção voluntária da gravidez sem levar na devida conta o direito à autonomia reprodutiva da mulher, questão completamente alheia às preocupações da sociedade machista e patriarcal do início da década de 40 do século passado. Parece assente que, embora essa autonomia não seja absoluta, ela não pode ser negligenciada na busca da solução mais justa e adequada para a problemática do aborto, seja sob o prisma moral, seja sob a perspectiva estritamente jurídica.

Nesse contexto, seria bastante razoável o Brasil adotar solução semelhante àquela perfilhada por grande parte dos países mais desenvolvidos que legalizaram a realização do aborto voluntário no trimestre inicial de gestação, mas, por outro lado, criaram mecanismos extrapenais para evitar a banalização dessa prática, relacionados à educação sexual, ao planejamento familiar e ao fortalecimento da rede de proteção social voltada para a mulher.

Observa-se, porém, que o nosso país ainda está muito preso a aspectos socioculturais, e valores religiosos, o que demonstra um atraso pontual no marco de um Estado Democrático de Direito, guiado pelos princípios da laicidade, do pluralismo e da razão pública.

Assim, a revisão da legislação penal quanto ao aborto é medida essencial para a defesa dos direitos à vida, à saúde, à autonomia, ao respeito e à dignidade das mulheres. E, sobretudo, um imperativo de direitos humanos, sob a perspectiva da saúde pública e da justiça social.

Portanto, a observância da legislação internacional de direitos humanos é diretriz relevante nos dias no nosso sistema normativo, consagrado como princípio que rege a ordem constitucional, de modo que a observância dos parâmetros internacionais acerca do tema em discussão exige a mudança da postura adotada pelo legislador brasileiro.


8 REFERÊNCIAS

BARROSO, Luís Roberto.  A dignidade da pessoa humana no direito constitucional contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência mundial. Luiz Roberto Barroso. Belo Horizonte: Fórum, 2012. 132p.

BARTESTD, Leila Linhares. Direitos Humanos e descriminalização do aborto. In Piovesan, Flávia. Direitos sexuais e reprodutivos: aborto inseguro como violação aos direitos humanos. In: Nos Limites da Vida. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.

BRASIL. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 54. Voto. Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=204878

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BRASIL. Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. – Código Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm

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RIBEIRO, Emmanuel Pedro S. G. Direitos humanos e pluralismo cultural: uma discussão em torno da universalidade. Disponível em: http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/manaus/direito_intern_pub_emmanuel_pedro_ribeiro.pdf

SARMENTO, Daniel. Legalização do Aborto e Constituição. In Piovesan, Flávia. Nos limites da vida: aborto, clonagem humana e eutanásia sob a perspectiva dos direitos humanos. Editora Lumen Juris, 2007.

SOARES, Gilberta S.; Galli, Maria Beatriz; Viana, Ana Paula de A. L. Advocacy para o acesso ao aborto legal e seguro: semelhanças no impacto da ilegalidade na saúde das mulheres e nos serviços de saúde em Pernambuco, Bahia, Paraíba, Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro. / [elaboração e execução do projeto Beatriz Galli [et. al.]. Recife: Grupo Curumim, 2010. Disponível em: http://www.senado.gov.br/noticias/agencia/pdfs/advocacy.pdf


Notas

[1] BARROSO, Luís Roberto.  A dignidade da pessoa humana no direito constitucional contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência mundial. Luiz Roberto Barroso. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p.100.

[2] Artigos 124 a 128, do Código Penal Brasileiro. Em abril de 2012, a Suprem Corte brasileira entendeu não ser crime a realização de aborto nos casos de anencefalia do feto, porém ainda não houve alteração na legislação pátria.

[3] DINIZ Débora; MEDEIROS Marcelo. Aborto no Brasil: uma pesquisa domiciliar  com  técnica de urna. Ver Ciência e Saúde Coletiva. 2010; 15(1):959-966. Pesquisa Premiada – Prêmio Fred L. Soper Award for Excellence in Helth Literture. OPAS. 2012. In: http://www.aads.org.br/gea/documentos/REFORMA_CPENAL_SENADO.pdf

[4] Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

I - independência nacional; II - prevalência dos direitos humanos; III - autodeterminação dos povos; IV - não-intervenção; V - igualdade entre os Estados; VI - defesa da paz; VII - solução pacífica dos conflitos; VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X - concessão de asilo político.

[5]A concepção universal dos direitos humanos demarcada pela Declaração sofreu e sofre fortes resistências dos adeptos do movimento do relativismo cultural. Para os relativistas, a noção de direito está estritamente relacionada ao sistema político, econômico, cultural, social e moral vigente em determinada sociedade; sob esse prisma, cada cultura possui seu próprio discurso acerca dos direitos fundamentais, que está relacionado às específicas circunstâncias culturais e históricas de cada sociedade. A respeito confira PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 215.

[6] Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.

[7] RIBEIRO, Emmanuel Pedro S. G. Direitos humanos e pluralismo cultural: uma discussão em torno da universalidade. Disponível em: http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/manaus/direito_intern_pub_emmanuel_pedro_ribeiro.pdf

[8]SIKKINK, Kathryn. Human Rights, Principled issue-networks, and Sovereignty in Latin America. In: International Organizations. Massachusetts: IO Foundation e Massachusetts Institute of Technology, 1993, p.413. In Piovesan, Flávia. Direitos reprodutivos como direitos humanos. Disponível em www.mp.pe.gov.br/.../Artigo_-_Direitos_reprodutivos_como_direitos_humanos.

[9] PIOVESAN, Flávia. Direitos reprodutivos como direitos humanos. Disponível em www.mp.pe.gov.br/.../Artigo_-_Direitos_reprodutivos_como_direitos_humanos. p.3.

[10] Entendimento retirado da Declaração de Direitos Humanos de Viena, de 1993, parágrafo 5º: “Todos os direitos humanos são universais, interdependentes e inter-relacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos globalmente de forma justa e equitativa, em pé de igualdade e com a mesma ênfase.

[11] Foi resultado de reivindicação do movimento de mulheres a partir da primeira Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada no México, em 1975.

[12] Ratificada pelo Brasil em 01.02.1984

[13] BYRNES, Andrew. The "other" human rights treaty body: the work of the Committee on the Elimination of Discrimination against Women. In: PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 270.

[14] Quando afirma em seu parágrafo 5º que “Todos os direitos humanos são universais, interdependentes e inter-relacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos globalmente de forma justa e equitativa, em pé de igualdade e com a mesma ênfase.”

[15] 18.Os Direitos do homem das mulheres e das crianças do sexo feminino constituem uma parte inalienável, integral e indivisível dos direitos humanos universais. A participação plena e igual das mulheres na vida política, civil, económica, social e cultural, a nível nacional, regional e internacional, e a irradicação de todas as formas de discriminação com base no sexo constituem objectivos prioritários da comunidade internacional. A violência com base no género da pessoa e todas as formas de assédio e exploração sexual, incluindo as resultantes de preconceitos culturais e tráfico internacional, são incompatíveis com a dignidade e o valor da pessoa humana e devem ser eliminadas. Tal pode ser alcançado através de medidas de carácter legal e da acção nacional e da cooperação internacional em áreas tais como o desenvolvimento sócio-económico, a educação, a maternidade e os cuidados de saúde, e assistência social. Os Direitos do homem das mulheres deverão constituir parte integrante das actividades das Nações Unidas no domínio dos direitos do homem, incluindo a promoção de todos os instrumentos de Direitos do homem relacionados com as mulheres. A Conferência Mundial sobre Direitos do Homem insta os Governos, as instituições e as organizações intergovernamentais e não governamentais a intensificarem os seus esforços com vista à protecção e ao fomento dos Direitos do homem das mulheres e das crianças do sexo feminino.

[16] PIOVESAN, Flávia. Direitos reprodutivos como direitos humanos. Disponível em www.mp.pe.gov.br/.../Artigo_-_Direitos_reprodutivos_como_direitos_humanos. p. 11

[17] Embora aprovados em 1966 pela Assembleia Geral das Nações Unidas, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais entraram em vigor apenas 10 anos depois, em 1976, tendo em vista que, somente, nessa data, alcançaram o número de ratificações necessário para tanto.

[18] PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 229.

[19] SARMENTO, Daniel. Legalização do Aborto e Constituição. In Piovesan, Flávia. Nos limites da vida: aborto, clonagem humana e eutanásia sob a perspectiva dos direitos humanos. Editora Lumen Juris, 2007. p. 3-50.

[20]  O autor cita-nos o seguinte exemplo: Aliás, a ideia de que a proteção à vida do nascituro não é equivalente àquela proporcionada após o nascimento já está presente, com absoluta clareza, no ordenamento brasileiro. É o que se constata, por exemplo, quando se compara a pena atribuída à gestante pela prática do aborto – 1 a 3 anos de detenção (art. 124 do Código Penal) – com a sanção prevista para o crime de homicídio simples, que deve ser fixada entre 6 e 20 anos de reclusão (art. 121, do CP).Trata-se, por outro lado, de noção fortemente arraigada no sentimento social, mesmo para os segmentos que reprovam a liberalização do aborto. Tome-se, por exemplo, o aborto espontâneo: por mais que se trate de um fato extremamente doloroso para a maioria das famílias, o evento não costuma representar sofrimento comparável à perda de um filho já nascido, pois a percepção geral é a de que a vida vale muito mais depois do nascimento. Cf. Sarmento, Daniel. Legalização do Aborto e Constituição. In Piovesan, Flávia. Nos limites da vida: aborto, clonagem humana e eutanásia sob a perspectiva dos direitos humanos. Editora Lumen Juris, 2007. p.30

[21] Op. Cit. pág. 31/32

[22] Constituição da República Portuguesa anotada, 2º edição., v.I., Coimbra, Almedina, 1985, p.175. In Sarmento, Daniel. Legalização do Aborto e Constituição. In Piovesan, Flávia. Nos limites da vida: aborto, clonagem humana e eutanásia sob a perspectiva dos direitos humanos. Editora Lumen Juris, 2007. p.33.

[23] Grifo nosso

[24] A teoria Concepcionista conta com adeptos de peso, como Limongi R. França, André Franco Montoro, Maria Helena Diniz e Stella Maris Martinez..

[25] COMPARATO,  Fabio  Konder.  A  afirmação  histórica  dos  direitos humanos, São Paulo: Ed. Saraiva, 2003. 3ªed.   p.364. Disponível em: http://www.sbdp.org.br/arquivos/material/414_flavia.pdf

[26] Sarmento, Daniel. Legalização do Aborto e Constituição. In Piovesan, Flávia. Nos limites da vida: aborto, clonagem humana e eutanásia sob a perspectiva dos direitos humanos. Editora Lumen Juris, 2007. p.34

[27] BARROSO, Luís Roberto.  A dignidade da pessoa humana no direito constitucional contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência mundial. Luiz Roberto Barroso. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p.100.

[28] BARROSO, Luís Roberto.  A dignidade da pessoa humana no direito constitucional contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência mundial. Luiz Roberto Barroso. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p.100.

[30] SARMENTO, Daniel. Legalização do Aborto e Constituição. In Piovesan, Flávia. Nos limites da vida: aborto, clonagem humana e eutanásia sob a perspectiva dos direitos humanos. Editora Lumen Juris, 2007. p.10

[31] SARMENTO, Daniel. Op. Cit. p. 12

[32] SARMENTO, Daniel. Legalização do Aborto e Constituição. In Piovesan, Flávia. Nos limites da vida: aborto, clonagem humana e eutanásia sob a perspectiva dos direitos humanos. Editora Lumen Juris, 2007. p.15

[33] SARMENTO, Daniel. Op. Cit. p. 20

[34] Artigos 124 a 128, do Código Penal Brasileiro. Em abril de 2012, a Suprem Corte brasileira entendeu não ser crime a realização de aborto nos casos de anencefalia do feto, porém ainda não houve alteração na legislação pátria.

[35] DINIZ Débora; MEDEIROS Marcelo. Aborto no Brasil: uma pesquisa domiciliar  com  técnica de urna. Ver Ciência e Saúde Coletiva. 2010; 15(1):959-966. Pesquisa Premiada – Prêmio Fred L. Soper Award for Excellence in Helth Literture. OPAS. 2012. In: http://www.aads.org.br/gea/documentos/REFORMA_CPENAL_SENADO.pdf

[36]Dados do DATASUS demonstram que a curetagem pós-abortamento (CPA) é o segundo procedimento obstétrico mais realizado nos serviços de internação do SUS do país, ocorrendo cerca de 220 mil internações para assistência ao aborto, em 2007, com ou sem complicações (BRASIL, 2007). Percebe-se um decréscimo neste número, visto que a Comissão Parlamentar de Inquérito sobre Mortalidade Materna (2001) registrou 250 mil internações por ano. A curetagem, após aborto, foi a cirurgia mais realizada no Sistema Único de Saúde (SUS) entre 1995 e 2007, segundo levantamento do Instituto do Coração (InCor), da Universidade de São Paulo. Disponível em  http://www.senado.gov.br/noticias/agencia/pdfs/advocacy.pdf p. 13, http://brasil.campusvirtualsp.org/node/182117.

[37] Recomendações do Programa Nacional de Direitos Humanos 2 (2002) e PNDH 3 (2010). Disponível em: http://portal.mj.gov.br/sedh/pndh3/pndh3.pdf.

[38] Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou procedente o pedido contido na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54, ajuizada na Corte pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), para declarar a inconstitucionalidade de interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, todos do Código Penal. Ficaram vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso, que julgaram a ADPF improcedente. Disponível em:

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=204878

[39] PNDH- 3 - Objetivo estratégico III: Garantia dos direitos das mulheres para o estabelecimento das condições necessárias para sua plena cidadania. Ações programáticas: (...)g) Considerar o aborto como tema de saúde pública, com a garantia do acesso aos serviços de saúde. (Redação dada pelo Decreto nº 7.177, de 12.05.2010) Responsáveis: Ministério da Saúde; Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República; Ministério da Justiça Parceiros: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República Recomendação: Recomenda-se ao Poder Legislativo a adequação do Código Penal para a descriminalização do aborto. Proposta de ações governamentais nº179. Apoiar a alteração dos dispositivos do Código Penal referentes ao estupro, atentado violento ao pudor, posse sexual mediante fraude, atentado ao pudor mediante fraude e o alargamento dos permissivos para a prática do aborto legal, em conformidade com os compromissos assumidos pelo Estado brasileiro no marco da Plataforma de Ação de Pequim.

PNDH IIP Disponível em: http://portal.mj.gov.br/sedh/pndh3/pndh3.pdf.

[40] A Plataforma de Ação de Pequim, de 1995, endossa as ideias da Conferência do Cairo sobre População e Desenvolvimento, de 1994, e adiciona a noção da interdependência e indivisibilidade dos direitos humanos, ao afirmar que, na maior parte dos países, a violação aos direitos reprodutivos das mulheres limita, dramaticamente, suas oportunidades na vida pública e privada, suas oportunidades de acesso à educação e ao pleno exercício dos demais direitos.

[41] Após a inclusão do §3º, ao art. 5º da Constituição Federal, discute-se se houve ou não recepção, com hierarquia constitucional, dos tratados anteriores que não seguiram o procedimento determinado pelo novo parágrafo.

[42] Embora o Plano de Ação da Conferência sobre População e Desenvolvimento do Cairo, de 1994, e a Declaração e Plataforma de Ação de Pequim de 1995  não sejam tratados internacionais, mas, declarações, apresentam valor jurídico, na medida em que deles se extraem princípios internacionais, que constituem importante fonte do Direito Internacional a nortear e orientar a interpretação e a aplicação do Direito.

[43] Piovesan, Flávia. Direitos reprodutivos como direitos humanos. p.13. Disponível em www.mp.pe.gov.br/.../Artigo_-_Direitos_reprodutivos_como_direitos_humanosp.

[44] A respeito de outras iniciativas relevantes adotadas para se lograr a normatização de temas afetos aos direitos sexuais e reprodutivos, consultar “Diagnóstico sobre a situação dos direitos sexuais e reprodutivos na América Latina”, elaborado pelo CLADEM (Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher) e Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos, julho de 2001. In Piovesan, Flávia. Direitos reprodutivos como direitos humanos. p. 13 Disponível em www.mp.pe.gov.br/.../Artigo_-_Direitos_reprodutivos_como_direitos_humanos

[45] PIOVESAN, Flávia. Direitos sexuais e reprodutivos: aborto inseguro como violação aos direitos humanos. In: Nos Limites da Vida. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. P.66

[46] BARTESTD, Leila Linhares. Direitos Humanos e descriminalização do aborto. In Piovesan, Flávia. Direitos sexuais e reprodutivos: aborto inseguro como violação aos direitos humanos. In: Nos Limites da Vida. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. P.98.

[47] Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

I - independência nacional; II - prevalência dos direitos humanos; III - autodeterminação dos povos; IV - não-intervenção; V - igualdade entre os Estados; VI - defesa da paz; VII - solução pacífica dos conflitos; VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X - concessão de asilo político.

[48] PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 96.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACÊDO, Suzana Carolina Dutra. Aborto: um enfoque à luz do pacto internacional sobre direitos civis e políticos e da convenção americana de direitos humanos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3927, 2 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27364. Acesso em: 26 abr. 2024.