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Extradição de Henrique Pizzolato. Negar a extradição: um lídimo direito da República Italiana.

"É dando que se recebe"

Extradição de Henrique Pizzolato. Negar a extradição: um lídimo direito da República Italiana. "É dando que se recebe"

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Análise do pedido feito pelo Brasil. Expectativas que norteiam o pedido e alternativas para uma eventual negativa de extradição.

É dando que se recebe.

O RECLAMADO

Henrique Pizzolato, brasileiro, bancário, nascido no distrito de Engenho Velho, Concórdia, Santa Catarina, Brasil. Portanto, brasileiro nato. Contudo, por ter raízes na Itália, de conformidade com a legislação daquela nação, optou por ter, também, nacionalidade italiana. No governo anterior, marcado por escândalos “jamais vistos na história deste País”, ocupou o cargo de diretor de “marketing” do Banco do Brasil, do qual se prevaleceu para ser um dos mais importantes protagonistas do maior de todos os escândalos, o “Escândalo do Mensalão”, repassando, segundo apuração do Ministério Público Federal, no mínimo, 73 milhões de reais do Fundo Visanet (administrado pelo Banco do Brasil) para as agências de Marcos Valério, outro não menos ilustre componente da gang que se instalou no Palácio do Planalto no governo do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva. Denunciado, juntamente com alguns dos muitos co-partícipes, foi, após cumpridos os devidos, mas extremamente  demorados, trâmites legais, julgado e condenado pelo Supremo (?) Tribunal Federal, pelo cometimento dos crimes de corrupção passiva, peculato e  lavagem de dinheiro, ao cumprimento de pena privativa de sua liberdade por doze (12) anos e sete (7) meses. Contudo, antes da expedição do mandado de prisão, daqui fugiu e homiziou-se em território italiano.

Sabe-se, hoje, que essa fuga começou a ser planejada em 2007, quando teve ciência do acatamento pelo STF das denúncias contra ele feitas pelo Ministério Público Federal, começando dali por diante a falsificar vários documentos do irmão Celso Pizzolato, morto há 35 anos. Portanto, não foi uma fuga precipitada, desesperada, mas, sim, uma fuga detalhadamente arquitetada. Os documentos foram submetidos a “test drive”, para ter ele a certeza de que não sofreriam qualquer impugnação quando se determinasse a fugir do País.


REQUERENTE E REQUERIDA

A parte requerente é a República Federativa do Brasil, por solicitação do Poder Judiciário (Supremo Tribunal Federal), através da Procuradoria Geral da República, ao Poder Executivo (Presidência da República-Ministério da Justiça-Ministério das Relações Exteriores), e a parte requerida é a República Italiana. E que não se diga que a reclamação foi feita pelo Governo brasileiro por respeito à solicitação do Supremo Tribunal Federal. Foi, sim, por força do clamor da sociedade brasileira. A submissão do Poder Judiciário às conveniências do Poder Executivo ficou evidente quando, há não muito tempo, essa mesma Itália teve a si negado pelo Brasil requerimento por si feito solicitando a  extradição do delinquente italiano Cesare Battisti, condenado pela justiça daquele país e que aqui se homiziou. Naquela oportunidade o Governo brasileiro, contrariando o comando sentencial proferido pelo Supremo (?) Tribunal Federal no processo extradicional, não atendeu à súplica da Itália - o que se caracterizou como uma afronta, um desrespeito, uma subestimação à Máxima (?) Corte de Justiça do País.

Pois é, graças ao STF, que não fez valer sua prerrogativa constitucional de decidir e fazer cumprir a decisão sobre a extradição do criminoso italiano, vive ele leve e solto no seio da sociedade brasileira.     


FUNDAMENTAÇÃO DO REQUERIMENTO

Fundamentou-se o requerimento do Brasil no mesmo tratado de que se valeu a Itália para requerer a extradição de Cesare Battisti, e que foi desrespeitado pelo Brasil, apesar do comprometimento assumido quando da celebração do mesmo. Reza o art. 1º do tratado extradicional: “Cada uma das partes OBRIGA-SE a entregar a outra, mediante solicitação, segundo as normas e condições estabelecidas no presente Tratado, as pessoas que se encontrem em seu território e que sejam procuradas pelas autoridades judiciárias da parte requerente, para serem submetidas a processo penal ou para a execução de uma pena restritiva de liberdade pessoal” (grifos nossos).


EXPECTATIVAS QUE NORTEIAM O PEDIDO DE EXTRADIÇÃO

A situação da República Italiana diante do pedido de extradiçãol do delinquente-condenado Henrique Pizzolato é bastante cômoda; decidirá da maneira que bem lhe aprouver. Concedendo ou não a extradição do reclamado, estará imune a qualquer crítica sobre sua decisão, seja do Brasil, seja da comunidade jurídica internacional.  

O ordenamento jurídico peninsular, desde remotas épocas, foi - e continua sendo - espelho para legislações de diversas nações, dentre elas a nossa. Hoje, certamente, a Itália é um dos países que mais se dedicam ao combate à criminalidade – não só à criminalidade, em todas as suas espécies -, mas, sobretudo, ao empenho para que esse esforço seja coroado com a punição dos criminosos.

Lá, na Itália, a impunidade não é uma prevalente, como ocorre em muitas nações, a exemplo do Brasil, onde a justiça é discriminatória. Aqui impera o dinheiro, as classes – endinheiradas e políticas: “cadeia é para pretos e pobres”. Seu, da Itália, aparelhamento – polícia e justiça – é eficaz e destemido, tanto no combate ao crime como na efetiva e exemplar punição aos infratores. Prova disso é o enfrentamento que esse aparelhamento trava contra a temida máfia italiana, mesmo já tendo sofrido baixas em todos os seus escalões – de simples policiais a conceituados magistrados.

E esse desejo da Itália ultrapassa suas fronteiras. Não lhe interessa ver punidos só os delitos cometidos no seu território. Depreende-se esse propósito pelo quanto exposto no art. 26 da Constituição italiana: “L'estradizione del cittadino può essere consentita soltanto ove sia espressamente prevista dalle convenzioni internazionali” (A extradição do cidadão (nacional) pode ser admitida desde que esteja expressamente prevista em convenção internacional). O código penal italiano ao tratar da extradição, no seu art. 13, estabelece: “Estradizione ... Non è ammessa l’estradizione del cittadino, salvo che sia espressamente consentita nelle convenzione internazionali” (Não é admitida a extradição do cidadão (nacional), salvo se estiver expressamente consentida em convenção internacional).Vê-se, pois, que no seu afã a Itália permite até a extradição do seu nacional, desde que a permissibilidade esteja inserida em convenção internacional.

O art. 6º do tratado extradicional firmado entre a Itália e o Brasil, ao tratar da extradição facultativa, no seu inciso I, reza:Quando a pessoa reclamada, no momento do recebimento do pedido, fornacional do Estado requerido, este não será obrigado a entregá-la. ...” (grifo nosso).

Muito se tem especulado sobre que decisão será adotada pela Itália no processo extradicional de Henrique Pizzolato: atende ou não a solicitação do Brasil?

Confessamos: não conhecemos o inteiro teor do instrumento elaborado pela Procuradoria Geral da República, ou melhor, não conhecemos sequer em parte o requerimento. Gostaríamos, sim, de conhecê-lo, para podermos tentar entender os reais porquês do extremado otimismo demonstrado pelo procurador geral, numa das muitas entrevistas que lhe foram feitas ultimamente, quanto ao atendimento pela Itália ao pleito do Brasil. Nessa entrevista, sucintamente, a procurador geral esboça as razões do seu otimismo: o reclamado é fugitivo condenado por sentença transitada em julgado pela justiça brasileira; o Brasil celebrou tratado extradicional com a Itália, onde faculta à requerida extraditar ou não seu nacional; a legislação italiana permite a extradição do seu nacional; e, também, considera juridicamente viável a apresentação do requerimento de extradição à República Italiana, em razão de Pizzolato também ser cidadão brasileiro. "Além da base legal, há o notável fato de que a extradição desse cidadão ítalo-brasileiro far-se-ia para o Brasil, país do qual ele também é nacional, e não para uma nação estrangeira em relação a ele (extraditando)",argumentou o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, nessa entrevista.

Nessa mesma reportagem, surgem duas alternativas para o caso de a Itália se negar a entregar o reclamado ao Brasil: uma atribuída à Procuradoria Geral da República, qual seja, o cumprimento da pena na Itália, o que faria o Brasil com amparo em tratados internacionais; e, a outra, como última alternativa e que a reportagem não atribui diretamente à PGR, um pedido para que o reclamado – Henrique Pizzolato – seja julgado pela justiça italiana, com base nas provas colecionadas no processo que o condenou aqui no Brasil.

Realmente, diante dessas circunstâncias, parece improvável que a Itália negue o pleito extradicional do Brasil. Para atendê-lo basta se valer da faculdade a si conferida pelo inciso I do art. 6º do tratado Brasil-Itália. Dir-se-á: portanto, a extradição do reclamado dependerá única e exclusivamente de boa vontade da Itália; do seu real comprometimento no combate à criminalidade externado no tratado entabulado com o Brasil.

 Não, não é bem assim. Estamos convencidos de que essa possibilidade fica mesmo só na aparência. Fica no “far-se-ia” conjecturado pelo ilustre procurador geral, quando, na entrevista, vislumbra a possibilidade da extradição por ser o reclamado ítalo-brasileiro e a extradição ser requerida por um país do qual ele é nacional, e não por nação pela qual assim não é reconhecido. Sinceramente, entendemos que à Itália sobejam razões para não atender ao pedido do Brasil. Senão vejamos.


O PRINCÍPIO DA RECIPROCIDADE

É por demais sabido que nas relações internacionais, no que diz respeito à extradição, atendendo à necessidade de cooperação judiciária internacional no combate ao crime, as nações observam os tratados ou convenções entre si celebradas, onde são fixadas obrigações recíprocas. Rege, pois, o instituto da extradição o princípio da reciprocidade, que consiste na entrega do paciente reclamado, condicionada à promessa de igual tratamento quando de um eventual similar pedido feito pela requerida, ou seja, “é dando que se recebe”.

 É especialmente o fato de não poder o Brasil dispensar à Itália tratamento igual em semelhante pedido que a extradição do delinquente reclamado não será levada a efeito pela Itália, a exemplo do que ocorreu no pedido de extradição do também delinquente Salvatore Cacciola, o que à época provocou injustificáveis críticas à justiça e governo italianos.

Foi no episódio de Salvatore Cacciola como, provavelmente, será agora no caso Henrique Pizzolato, incensurável a negativa de extradição decidida pela Itália. O art. 5º, inciso LI, da Constituição da República Federativa do Brasil reza: “nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei” (grifo nosso).

Tratava-se Salvatore Cacciola de cidadão italiano “da gema”, naturalizado brasileiro. Henrique Pizzolato é cidadão brasileiro “da gema”, naturalizado italiano. Se ambos tivessem cometido seus crimes na Itália e aqui se homiziassem, num eventual pedido de extradição dos mesmos feito pela Itália, ou qualquer outra nação, o Brasil não poderia atender à súplica sem que infringisse o dispositivo constitucional retro transcrito. O primeiro, embora italiano, cometeu o crime e si imputado após naturalizado brasileiro e o segundo é brasileiro nato, circunstâncias que são impedientes constitucionais para concessão de extradição pelo Brasil.

Portanto, negando a Itália a extradição de Henrique Pizzolato, seja por considerá-lo seu nacional e, por conseguinte, amparando-se no art. 6º, inciso I, do tratado extradicional, seja por ter a certeza de que não será atendido em eventual requerimento análogo feito ao Brasil, o que fere o princípio basilar de um tratado de extradição, qual seja, o princípio da reciprocidade, impassível estará de sofrer justas críticas quanto ao seu posicionamento.

Outrossim, entendemos que serão de total improcedência eventuais críticas feitas à Itália pelo fato de vir a negar a extradição de Henrique Pizzolato em represália à negativa recebida quando de sua solicitação de extradição do criminoso Cesare Battisti - o que não acreditamos que venha a fazer, pois sabedora é de que a postura arbitrária contra si adotada naquela ocasião não correspondeu à vontade do Brasil, do povo brasileiro. Foi uma atitude isolada, compreensivelmente impensada, tomada por uma pessoa incapaz de comedir suas consequências; uma pessoa que geriu o Brasil como se estivesse gerindo um sindicato de classe operária; que se achava dono do País, e que assim continuará se achando até que a sujeira que se encontra embaixo dos tapetes do Palácio do Planalto seja descoberta e exposta ao povo brasileiro.

E que não se diga que tomou a irresponsável atitude por ser ignorante, por ser semianalfabeto – atributos dos quais sempre se vangloriou –, e que por isso se deixou levar pelas apaixonadas e inexplicáveis intervenções do ex-ministro da Justiça de seu governo, Tarso Genro, e de outros partidários, no sentido de obstar a remessa do meliante solicitado; inexplicáveis para alguns, as qualidades do Cesare Battisti nos levam a crer que aqui estava (e ainda deve estar) reservado para ele o mesmo papel que desempenhou o “Che” Guevara na “revolução” cubana -  e que, portanto, a eles deve ser creditada  tal irresponsabilidade.  Não! Não concordamos. Deve ser creditada a ele, o ex-presidente.  Era ele quem avocava para si os louros atribuídos à gestão do Brasil; era ele quem vestia a toga da arrogância, quando algumas nações, inadvertidamente, lhe concediam títulos de “doutor honoris causa”, na ilusão de que os propalados progressos do Brasil não eram fantasiosos, de que a realidade do povo brasileiro havia mudado radicalmente durante seu governo – mudou, é verdade, a realidade dele e de “seu do povo”. Achava-se, mesmo “doutor”; e ainda está convicto disso. Portanto, não há que se falar em sua inimputabilidade. A irresponsabilidade pelo desgaste da credibilidade, pelo comprometimento da honradez do Brasil, não só diante da Itália, mas também perante a comunidade internacional, da mesma forma que os elogios, a ele deve ser atribuída. Sua irresponsabilidade fez ver ao mundo não só sua tirania, expôs a fragilidade, a subserviência, do Poder Judiciário ao seu Governo, como também a conivência do Poder Legislativo com seus desmandos, o que até então estava reservado à nossa intimidade. Mas se alguém achar que seu ato comporta divisão de “irresponsabilidade”, entendemos que a divisão há de ser feita não com os aficionados do paciente reclamado, mas, sim, com o Poder Judiciário e com o Poder Legislativo brasileiros.


HOJE, INEXISTÊNCIA DE TRATADO EXTRADICIONAL

Modestamente, entendemos nós que uma negativa de extradição do reclamado Henrique Pizzolato que não seja fundada nos argumentos retro expostos (a faculdade de extraditar ou não e a observância do princípio da reciprocidade) não deve ser confundida como represália à negativa de extradição do delinquente italiano Cesare Battisti, mas, sim, ao fato de o Brasil não mais poder invocar o tratado de extradição celebrado com a Itália. Aquele entabulamento, hoje, não tem mais valia; foi rompido unilateralmente pelo ex-presidente do Brasil - não pelo Brasil -, numa atitude, comandada, arbitrária e irresponsável, que contou, principalmente, com a irresponsável, submissa e prevaricativa aquiescência da Suprema (?) Corte de Justiça do País e com o também não menos irresponsável consentimento omissivo do nosso Congresso Nacional. Quando aqui consignamos “principalmente” é porque de outros segmentos da sociedade brasileira esperávamos insurgências, como, por exemplo, da imprensa e da comunidade jurídica nacionais. Mas o que vimos foi uma passividade que de outra forma não pôde ser interpretada senão como aquiescência desses setores àquela arbitrariedade.

Não, não, nem de longe estamos sendo levianos. Se isto asseveramos o fazemos com responsabilidade e embasados na legislação pátria.

Pedimos tolerância aos nossos eventuais leitores para, doravante, reproduzir passagens que externamos em alguns trabalhos por nós escritos à época do imbróglio em que se envolveu o STF quando da apreciação do pedido de extradição de Cesare Battiti.

É do conhecimento geral – geral mesmo, pois a repercussão do desfecho do imbróglio foi amplamente internacional, o impacto negativo não foi sentido só pela Itália, foi um sentimento globalizado - que o Supremo (?) Tribunal Federal, após inconcebíveis desacertos processuais, por fim, decidiu pelo deferimento do pleito da República Italiana. Uma sentença caríssima para o cofre público, mas que de nada valeu, pois quem deveria cumprir seu comando achou por bem desprezá-la como se papel higiênico fosse e, impropriamente, acintosamente, desrespeitosamente, tomando a decisão como opinião de um órgão a si subordinado, resolveu negar a extradição do paciente reclamado.

E não se deveu isso só à incompetência, à subserviência do Máximo (?) Colegiado Jurisdicional do País (ressalve-se a não unanimidade de seus membros) e do conivente Congresso Nacional; em muito contribuiu nossa mídia e nossa comunidade jurídica, tendenciosamente ou não.

Em “EXTRADIÇÃO – DECISÃO IMPERATIVA. Submissão absoluta do Presidente da República Federativa do Brasil ao acórdão prolatado pelo Supremo Tribunal Federal” externamos:

 “Após as vexatórias procrastinações no processamento da vindicação feita pela Itália, a começar pelas maquinações perpetradas pelo ex-ministro da Justiça do Brasil, senhor Tarso Genro, e a terminar pelas não só injustificáveis, mas, acima de tudo, inconcebíveis vacilações do Supremo Tribunal Federal para se reconhecer competente para processar e julgar o feito, mesmo tendo diante de si cristalinas disposições legais de fácil interpretação por qualquer do povo, desde que relativamente alfabetizado, e isso porque a legislação extradicional tem como principais destinatários os não nacionais, pelo que o legislador se empenhou ao máximo para escrevê-la de maneira simples e clara, proporcionando-lhes mais fácil assimilação ...”.

Nesse mesmo trabalho consignamos:

“Publicado o acórdão, incontinenti, a nossa mídia propalou aos quatro ventos: “SFT publica acórdão de extradição de Battisti e libera decisão de Lula”; “STF autoriza extradição de Cesare Battisti, mas decisão final está nas mãos de Lula”; “Supremo decide dar palavra final à Lula e causa polêmica; ...”.

 A extradição do senhor Cesare Battisti dependerá única e exclusivamente da vontade do Presidente Lula. Foi essa a errônea interpretação – que se não emitida tendenciosamente só se pode crer que foi por ignorância, deixando-se levar pelas inconvenientes intervenções do ex-ministro Tarso Genro e outros aficionados pelo delinquente reclamado - que a imprensa nacional deu ao quanto consubstanciado na Ementa nº 08 e que foi irresponsavelmente repassada para a sociedade brasileira. E não se ouviu uma voz sequer do STF contrariando esse errôneo entendimento, pelo que “gregos e troianos”, leigos e alguns operadores do Direito têm-na como expressão da vontade do órgão que a prolatou”

Eis o conteúdo da ementa nº 08 do acórdão prolatado no processo extradicional de Cesare Battisti, tombado no STF sob o nº 1085:

“EXTRADIÇÃO. Passiva. Executória. Deferimento do pedido. Execução. Entrega do extraditando ao Estado requerente. Submissão absoluta ou discricionariedade do Presidente da República quanto à eficácia do acórdão do Supremo Tribunal Federal. Não reconhecimento. Obrigação apenas de agir nos termos do Tratado celebrado com o Estado requerente. Resultado proclamado à vista de quatro votos que declaravam obrigatória a entrega do extraditando e de um voto que se limitava a exigir observância do Tratado. Quatro votos vencidos que davam pelo caráter discricionário do ato do Presidente da República. Decretada a extradição pelo Supremo Tribunal Federal, DEVE O PRESIDENTE DA REPÚBLICA observar os termos do Tratado celebrado com o Estado requerente, QUANTO Á ENTREGA do extraditando” (grifos nossos).

Permitam-nos repetir aqui a análise da ementa feita no retro citado trabalho:

“- Extradição. Passiva. Executória. DEFERIMENTO DO PEDIDO.

Presentes os pressupostos de admissibilidade – a legislação brasileira agasalha o instituto da extradição e o Brasil mantém Tratado Extradicional com a Itália -, foi a extradição conhecida e, por fim, verificada a legalidade e procedência, foi a solicitação provida;

- Execução. ENTREGA DO EXTRADITANDO AO ESTADO REQUERENTE.

Julgada procedente a vindicação feita pela Itália, restava tão-só determinar a entrega do paciente-reclamado à nação requerente; e assim o fez o STF;

- Submissão absoluta ou discricionariedade do Presidente da República quanto à eficácia do acórdão do Supremo Tribunal Federal. NÃO RECONHECIMENTO, OBRIGAÇÃO APENAS DE AGIR NOS TERMOS DO TRATADO CELEBRADO COM O ESTADO REQUERENTE”.

A conclusão:

“Decretada a extradição pelo Supremo Tribunal Federal, DEVE O PRESIDENTE DA REPÚBLICA observar os termos do Tratado celebrado com o Estado requerente, QUANTO Á ENTREGA do extraditando”.”

Quando desse comentário questionamos e aqui voltamos a indagar: em que parte da decisão o STF “libera”, “autoriza”, "dá a palavra final” para o Presidente da República extraditar ou não o paciente reclamado? Em resposta, mantemos a mesma percepção: em parte alguma.

Nossa convicção não é aleatória; emerge da análise de dispositivos constitucionais que não dão margem a outra conclusão. E o acerto desta conclusão demonstramos ou, pelo menos, tentamos demonstrar no trabalho “EXTRADIÇÃO – LEI 6.815/80 (A quem compete conceder a extradição?)”, quando explanamos:

CELEBRAÇÃO DE ACORDO OU TRATADO

A Constituição da República Federativa do Brasil, no seu art. 84, diz: “Compete privativamente ao Presidente da República: ...; VIII – celebrar tratados, acordos e atos internacionais, sujeitos a referendo do congresso nacional” (grifos nossos).

A legislação brasileira dispensou à extradição os cuidados indispensáveis à delicadeza e seriedade do instituto. A Constituição Federal outorga poderes, privativos, ao Presidente da República para celebrar tratados, acordos e atos internacionais. Mas condiciona a validade desses instrumentos ao referendo do Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal). É com esse referendo que eles – tratados, acordos e atos - adquirem força de lei e passam a vigorar como se emanados do povo brasileiro.  É lei no sentido próprio da palavra).


TRATADO DE EXTRADIÇÃO BRASIL-ITÁLIA

O Tratado de Extradição Brasil-Itália observou as formalidades legais, ou seja, foi celebrado, por delegação, pelo Presidente da República Federativa do Brasil; foi referendado pelo Congresso Nacional brasileiro; teve seus termos ratificados e trocados pelas nações celebrantes e; por fim, foi posto em vigor por força de Decreto Presidencial. É lei no sentido próprio da palavra

O art. 1º do Decreto Presidencial nº 863, de 9 de julho de 1993, diz o seguinte: “O Tratado de Extradição, firmado entre a República Federativa do Brasil e a República Italiana, em 17 de outubro de 1989, apenso por cópia ao presente decreto, será executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém” (grifo nosso). No Artigo I do Tratado de Extradição Brasil-Itália está estabelecido: “Cada uma das Partes OBRIGA-SE a entregar a outra, mediante solicitação, segundo as normas e condições estabelecidas no presente Tratado, as pessoas que se encontrem em seu território e que sejam procuradas pelas autoridades judiciárias da Parte requerente, para serem submetidas a processo penal ou para a execução de uma pena restritiva de liberdade pessoal” (grifos nossos)”.


DO PROCESSO E JULGAMENTO

O art. 102 da Constituição Federal preceitua: “Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I – processar e julgar, originalmente: ...; g) a extradição solicitada por Estado Estrangeiro; ...” (grifos nossos).

O art. 83 da Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980 (Estatuto do Estrangeiro)  estabelece: “Nenhuma extradição será concedida sem prévio pronunciamento do Plenário do Supremo Tribunal Federal sobre sua legalidade e procedência, não cabendo recurso da decisão” (grifos nossos).

O legislador brasileiro cercou-se de todas as cautelas para que um eventual pedido de extradição fosse observado com a merecida acuidade. Assim é que para a concessão ou negação de extradição delegou poderes à elite da cultura jurídica nacional – o Supremo Tribunal Federal -, e razão outra para isso não teve senão a de garantir uma apreciação extremamente técnica da questão e uma decisão não comprometedora da honradez e dos interesses da Nação brasileira. Salientamos, o legislador foi exigente na medida da importância do instituto da extradição. A necessidade de uma apreciação extremadamente abalizada fez com que ele não se contentasse com um exame da legalidade e procedência do pedido de extradição por um ministro-juiz do STF; nem por uma de suas Turmas. Determinou que a verificação dos pressupostos legais e, por consequência, a procedência ou não da vindicação fosse encargo do Supremo, na sua composição plena.

À exigência de composição plenária do Supremo o legislador fez corresponder uma confiança plena no quanto por ele decidido. A certeza de juridicidade de sua decisão é tanta que não se admite reforma do entendimento consubstanciado no veredicto (“..., não cabendo recurso da decisão”), ou seja, faz-se coisa julgada (imutável) desde que prolatada, decorrendo dessa circunstância a necessidade de sua imediata efetivação. E isso não por força da decisão concessória ou denegatória do pedido, que não deve trazer no seu contexto comando nesse sentido. Poderia deixar transparecer imposição de obrigação ao Executivo pelo Judiciário, quando, nesse momento, o Governo deve cumprir uma obrigação (no caso de decisão concessória) a si imposta por ele próprio, decorrente de mandamento estabelecido em Tratado ou Acordo-Lei ao qual, em nome do povo brasileiro, se vinculou e que, também em nome desse mesmo povo e, sobretudo, em respeito à sua honra, deve cumpri-la”.

Também, na tentativa de dirimir qualquer dúvida quanto à competência original do STF para processar e julgar processo extradicional e tornar mais claro que nesse tipo de feito o  Presidente da República não tem ingerência alguma, em “EXTRADIÇÃO – DECISÃO IMPERATIVA. Submissão absoluta do Presidente da República Federativa do Brasil ao acórdão prolatado pelo Supremo Tribunal Federal” fizemos a seguinte explanação:

“E não só na Constituição (art. 102) e nos dispositivos regedores da extradição da Lei 6.815/80 percebemos que a competência é exclusivamente do Supremo Tribunal Federal. Ao regular a expulsão essa mesma lei estabelece no art. 60: “Caberá exclusivamente ao Presidente da República resolver sobre a conveniência e a oportunidade da expulsão ou de sua revogação” (grifos nossos). Pois é, quando o legislador entendeu que a saída forçosa de um estrangeiro do nosso território se desse por força de ato exclusivo e discricionário do Presidente da República – sem precedê-lo ato de qualquer outro órgão, assim o fez; e o fez “explicitamente E mais, no seu parágrafo único proclama o mesmo art. 60: “A medida expulsória ou sua revogação far-se-á por decreto”. Outro não pode ser esse decreto senão um decreto administrativo, um decreto presidencial. Podemos ser considerados maçantes, mas tentando esclarecer ainda mais dizemos que o art. 102 da C.F. preceitua: “Compete ao  Supremo Tribunal Federal, ... :  I – processar e julgar, originalmente: ...; g) a extradição solicitada por Estado Estrangeiro; ...”;e que o art. 83 da Lei nº 6.815/80 impõe: “Nenhuma extradição será concedida sem prévio pronunciamento do Plenário do Supremo Tribunal Federal sobre sua legalidade e procedência, não cabendo recurso da decisão” (grifos nossos). A extradição é, pois, concedida “por decisão” do Supremo Tribunal Federal; decisão que se consubstancia numa sentença, num acórdão, num decreto, mas “um decreto judicial”

Ora, é óbvio, a Itália, conhecedora da legislação brasileira pertinente, celebrou tratado de extradição com o Brasil na certeza de que aqui quem legisla é o Poder Legislativo; que as leis, por ele elaboradas devem ser havidas como se emanadas do povo brasileiro, as quais, devem ser por todos, sem qualquer distinção,  observadas;  e,  que o Poder Judiciário brasileiro tem como instância máxima uma Suprema Corte, a quem cabe, originalmente processar e julgar vindicação extradicional, cuja decisão é imutável, e a quem cabe também fazer cumprir o quanto decidido a respeito.

Mas o que viu a Itália no processo em que vindicou a extradição de Cesare Battisti? Viu que aquela certeza não era certa; era, sim, simplesmente presunção. Viu o ex-presidente da República atirar na lixeira de seu sanitário a decisão do Supremo (?) Tribunal Federal que decidiu pela extradição do criminoso Cesare Battisti, em evidente desrespeito não só ao STF, mas especialmente ao ordenamento jurídico nacional.

O inusitado ato - “jamais visto na história deste País” - expôs ao mundo a falta de resguardo da Constituição da República Federativa do Brasil; mostrou que os Poderes da União brasileira não são independentes como assim está estabelecido no art. 2º da nossa Carta Magna, o que já era do conhecimento do povo brasileiro, mas que nunca se manifestou de forma tão explícita.

Dando-se o ex-presidente ao direito de descumprir o comando sentencial proferido pelo STF e decidir da forma pela qual foi levado a decidir, sem irresignação de quem se podia esperar, fez-se ele uma instância “judicial” superior ao Supremo (?) Tribunal Federal.

As leis brasileiras, como em qualquer nação que se constitua em estado democrático de direito, se produzem no tempo de acordo com a demanda social e, pois, não se pretendem perenes; vigem até quando se mostrarem inconvenientes para a sociedade. Aqui no Brasil, de acordo com as normas vigentes, para deixarem de produzir seus efeitos - parcial (derrogadas) ou totalmente (ab-rogadas) – terão que ser revogadas por quem as criou, através de lei nova e de igual hierarquia. Ora, deixando de entregar o extraditando reclamado - após verificados os requisitos e cumpridas as formalidades legais - o ex-presidente avocou para si prerrogativa constitucionalmente conferida ao Congresso Nacional e revogou totalmente o tratado-lei celebrado entre o Brasil e a Itália, já que o escopo do entabulamento é justamente a entrega do extraditando. Ab-rogado, sim, pode a Itália considerar o tratado. Após o “show” de incompetência, de subserviência, de conivência com ilegalidades, que interesse tem aquela nação em manter vigente um tratado para ser inobservado quando conveniente for para quem estiver governando o Brasil?

Pois é, foi grande o estrago. Entendemos que o dano maior produzido pelo inconsequente ato do ex-presidente foi à honradez, à credibilidade, do Brasil. Hoje, diante do acontecido, não só a Itália como qualquer outro país – mantenha ou não tratado de extradição, seja ou não subscritor de convenção da qual o Brasil também participe - pode, sem temor a críticas, negar solicitação extradicional pleiteada pelo Brasil.


AS ALTERNATIVAS SUGERIDAS

Voltamos a salientar que o Brasil, após o abuso cometido pelo ex-presidente da República no processo extradicional de Cesare Battisti, deixou de ter credibilidade para pleitear junto a qualquer nação a extradição ou qualquer outro ato que à mesma pretenda substituir. Mas mesmo assim faremos breve análise das alternativas sugeridas.

Cumprimento da pena na Itália.

Dissemos linhas atrás que, em reportagem, a Procuradoria Geral da República, afirmara que, frustrada a tentativa de extradição de Henrique Pizzolato, tinha como alternativa o pedido à Itália para que a pena imposta pela justiça brasileira ao paciente reclamado fosse cumprida na Itália, o que  faria com base em convenções internacionais subscritas pelo Brasil e pela Itália, já que o tratado Brasil-Itália – que entendemos não mais subsistir - não contempla essa alternativa. Permissa vênia, não vislumbramos chance de o Brasil lograr êxito. Entendemos que, da mesma forma que a Itália está desobrigada de observar o tratado aqui multicitado, está com relação à observância de convenções internacionais em que o Brasil também seja subscritor e que envolvam o instituto da extradição. E mesmo que não usasse da prerrogativa que entendemos a si caber, não aceitaria a incumbência de custodiar o reclamado pelo tempo da condenação ao mesmo imposta pela justiça brasileira. Ainda que o Brasil consipropusesse arcar com os custos da manutenção do condenado no cárcere. É desinteressante, é oneroso para a Itália; teria mais um preso sob sua guarda, uma responsabilidade a mais.

Não sabemos se esse foi um pedido alternativo consignado no requerimento da extradição ou se a alternativa será objeto no caso de frustrado o otimismo do Procurador Geral da República. Em qualquer caso certamente o resultado será o mesmo. Lamentamos dizer, mas se trata de uma ingenuidade inconcebível. O Procurador Geral da República parece desconhecer o tamanho do dano que o ex-presidente causou à honradez do País. Age como se nada tivesse acontecido. Vê a Itália como se fosse “mulher de malandro” (não é verdade que mulher de malandro gosta de apanhar; ninguém gosta). Outrossim, olvida que o instituto da extradição é regido  pelo princípio da reciprocidade. Por que uma nação ofertar seu cárcere para cumprimento de pena de condenado por outra nação que não pode retribuir congênere oferta? Percebe-se isso ao se confrontar as condenações de Henrique Pizzolato e Cesare Battisti. Quanto ao cumprimento da pena de Henrique Pizzolato (doze (12) anos e sete (7) meses) na Itália não haveria problema algum, mas já com relação ao cumprimento da pena imposta a Cesare Battisti no Brasil haveria um obstáculo intransponível, já que no nosso ordenamento jurídico não está prevista a prisão perpétua.  

A pena a que foi condenado o Henrique Pizzolato e que o Governo brasileiro finge concorrer para vê-lo cumpri-la é privativa de sua liberdade. Privado de sua liberdade na Itália pelo tempo em que foi condenado, de qualquer sorte, estaria satisfeito o comando sentencial proferido pelo judiciário brasileiro. Em suma: surtiria o mesmo efeito buscado pela extradição. Se o Brasil, no episódio do Cesare Battisti, não contribuiu para satisfazer o comando da sentença proferida pela justiça italiana porque a Itália satisfaria o comando da sentença prolatada pela justiça brasileira?

Bem, se a alternativa foi pensada para solicitação a ser feita a posteriori, achamos que a Procuradoria Geral deve engavetá-la e ficar à espera da negativa da extradição pelo motivo que bem aprouver à Itália.

Julgamento pela justiça italiana

Na entrevista retro mencionada, cogitou-se também essa “maravilha” de alternativa: Henrique Pizzolato se submeter a um novo julgamento, mas dessa vez pela justiça italiana, com base nas provas que instruíram o processo que o levou à condenação pela justiça brasileira. Tal beldade a reportagem não atribuiu à Procuradoria Geral da República. E queremos crer que tamanha estupidez não tenha brotado das férteis cabeças pensantes que presentemente integram a instituição. Preferimos acreditar que tal escárnio ao STF ficou só na irracional imaginação do Henrique Pizzolato, que, após ser preso e vendo-se na iminência de ser extraditado, manifestou esse irracional e imoral desejo, como se apelando ao ex-presidente para lhe socorrer, pois do seu socorro é merecedor – até mais do que o Cesare Battisti, já que é brasileiro e tem “relevantes serviços” prestados ao seu governo.

O julgamento pela justiça italiana equivaleria à total avacalhação, à total esculhambação do já tão combalido Supremo (?) Tribunal Federal, que em tempo pretérito foi havido por muitos, especialmente os leigos em matéria jurídica, como o Supremo Tribunal Federal, a Máxima Corte de Justiça do País, composta da elite do saber jurídico nacional. A degradação dessa Casa, dia a dia, cada vez mais se acentua. Hoje, sua composição não é feita de conformidade com a Constituição, mas, sim, de acordo com conveniências políticas; é uma composição arquitetada, estrategicamente montada para, quando necessário, atender aos reclamos do poder dominante; não mais simboliza a instituição que dava às controvérsias a si levadas as mais sábias decisões jurídicas; não é um colegiado judicial; quando muito politico-judicial.

A fragilidade do nosso Poder Judiciário é notória. Denota incompetência para arcar com o múnus a si atribuído pela Constituição Federal, qual seja, ser seu guardião. Isso ficou explicita e notoriamente demonstrado quando deixou, passivamente, ou melhor, covardemente e ao mesmo tempo coniventemente, de fazer cumprir sua decisão que determinava a extradição de Cesare Battisti. Sua subserviência ao Executivo abriu um perigoso precedente. Diante dessa injustificável debilidade, vê-se hoje, também, o Legislativo no direito de não dar cumprimento aos seus comandos sentenciais. Assim é que o STF condena parlamentares por crimes que, constitucionalmente, implicam em perda de qualificação para o exercício de mandato parlamentar, ou outra qualquer função pública – crimes desqualificadores até para concorrer a vagas de emprego em empresas de iniciativa privada que primam pela decência, pela probidade, de seus colaboradores -, mas não se dá ao respeito de não se submeter a inescrupulosas pretensões, que só podem partir de pares possuidores dos mesmos predicados negativos dos condenados, para condicionar a perda dos mandatos a “referendum” dos colegiados (Câmara ou Senado) aos quais estavam vinculados os meliantes condenados. Essa permissividade, para um órgão rotulado como a Corte Suprema de Justiça da nação brasileira, transborda a medida da tolerância; não beira o ridículo, beira a promiscuidade.

Ora, é desagradável para um magistrado de primeiro grau ver a sentença por si proferida, com toda convicção que a tenha elaborado com acerto, reformada pela instância imediatamente superior. Desconfortável também é a reforma da decisão de um órgão colegiado por outro de maior hierarquia; Constrangedor por demais é a decisão do tribunal de maior hierarquia de um país ser reformada por esse mesmo tribunal – como foi o caso de algumas decisões do Supremo Tribunal Federal proferidas no julgamento do “mensalão”. Algumas de suas decisões sofreram reparos por esse mesmo Tribunal; só que com a substituição de alguns de seus pares. Uma recomposição que parece ter sido feita por encomenda. Parece ter sido feita não; feita para justamente atender aos anseios da banda podre do Partido dos Trabalhadores, tendo, inclusive, deixado transparecer que um dos novos juízes-ministros, Luís Roberto Barroso, foi agraciado com o cargo justamente por ter patrocinado, quando advogado, a defesa do Cesare Battisti; um agraciamento que não é novidade, pois também recentemente o juiz-ministro Dias Toffoli também fora guindado ao cargo por reconhecimento de seus serviços prestados ao Partido dos Trabalhadores, em especial aos “mensaleiros”. E participou do julgamento do “mensalão” sem qualquer constrangimento.  

Se esses constrangimentos por que vem passando o STF são inconcebíveis, imaginem o refazimento de seu julgado pela justiça de outra nação. Seria a negação de um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, ou seja, sua soberania. Se, por absurdo, o Governo brasileiro vier a fazer essa imoral proposta sem que haja uma incontinenti e enérgica tomada de posição, não só do Supremo Tribunal Federal, mas de todos os segmentos da nação brasileira, haveremos de deixar de nos considerar um país; estaremos reduzidos a nada; nem mesmo à antiga colônia portuguesa.

Diante da absurda proposição, só podemos cogitar de hipóteses. Assim, cremos piamente que se o Brasil ainda tivesse na sua gerência o ex-presidente, pela insignificância que para si representa o STF, por sua ignorância, pela sua falta de compromisso com a honradez do País – tudo isso demonstrou sobejamente -, o clamor do Henrique Pizzolato seria atendido. Mas isso não significa que ele se veria solto. Pelo contrário, pela seriedade da justiça italiana, as provas que o levaram à condenação de tão-só doze (12) anos e sete (7) meses poderiam levá-lo a ser privado de sua liberdade por tempo muito superior ao reconhecido pela justiça brasileira. Enfim, o tiro sairia pela culatra.

NOSSA UTÓPICA ALTERNATIVA.

Não nos faremos hipócritas. Sabemos que ao Governo brasileiro - na realidade a banda podre do Partido dos Trabalhadores, da qual o atual Governo não consegue se desvencilhar - tanto interessa a permanência de Cesare Battisti aqui como a de Henrique Pizzolato na Itália; ambos livres, é claro. É por isso que a alternativa que apresentaremos não passa de utopia.

Nossa sugestão é que o Brasil apresente à Itália um formal e solene pedido de desculpas pela negativa de extradição do Cesare Battisti, ressaltando que hoje toma assento na Presidência da República uma estadista preparada para exercer tal múnus e que seu governo prima pela legalidade, pelo respeito à Constituição da República Federativa do Brasil. Que recheie o pedido de desculpas com algumas inofensivas mentiras, como por exemplo: que as instituições brasileiras, hoje, são respeitadas e respeitadoras; o Supremo Tribunal Federal tem outra composição e que esse Colegiado cumpre com destemor o encargo de guardião da Constituição, não se deixando substituir por quem quer que seja; que o Congresso Nacional, também de cara nova, encarna o Poder Legislativo com as prerrogativas a si conferidas pela nossa Carta Magna e que delas não abdica em favor de ninguém. Por fim, não só reconhece a arbitrariedade do “despacho” denegatório da extradição requerida pela Itália como também lhe noticia a revogação daquele ato.

Cremos que diante disso a Itália não hesitaria em aceder ao pedido de extradição de Henrique Pizzolato. Não haveria necessidade de sugerir a troca de Cesare Battisti por Henrique Pizzolato – o que se concretizaria no meio do oceano Atlântico.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMOS, Ubiratan Pires. Extradição de Henrique Pizzolato. Negar a extradição: um lídimo direito da República Italiana. "É dando que se recebe". Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3957, 2 maio 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27766. Acesso em: 28 mar. 2024.