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A tutela constitucional da liberdade de expressão, de informação e de pensamento versus a proteção conferida pela lex mater à imagem, à honra e à vida privada

os direitos da personalidade em conflito com o direito à livre (divulgação de) informação e a liberdade de expressão e de pensamento: a problemática das biografias não autorizadas

A tutela constitucional da liberdade de expressão, de informação e de pensamento versus a proteção conferida pela lex mater à imagem, à honra e à vida privada: os direitos da personalidade em conflito com o direito à livre (divulgação de) informação e a liberdade de expressão e de pensamento: a problemática das biografias não autorizadas

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Com base no ordenamento jurídico vigente, em que banida a censura estatal, é descabida a submissão da livre manifestação de autores e historiadores ao direito potestativo dos biografados ou de seus herdeiros para a redação das biografias não autorizadas.

Sumário: INTRODUÇÃO. 1. OS DIREITOS DA PERSONALIDADE EM CONFLITO COM O DIREITO À LIVRE (DIVULGAÇÃO DE) INFORMAÇÃO E A LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DE PENSAMENTO. 1.1. OS DIREITOS DA PERSONALIDADE - ASPECTOS GERAIS. 1.2 O DIREITO À IMAGEM. 1.3 O DIREITO À HONRA. 1.4. O DIREITO À VIDA PRIVADA. 1.5 DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO, DE INFORMAÇÃO E DE PENSAMENTO. 1.6 O CONFLITO DE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS: A PONDERAÇÃO. 2. A INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL, SEM REDUÇÃO DE TEXTO, DOS ARTS. 20 E 21 DA LEI Nº 10.406/02 – CÓDIGO CIVIL – A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 4815/STF. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Quem controla o passado, controla o futuro

George Orwell in “1984”


INTRODUÇÃO

A proibição da comercialização da biografia “Roberto Carlos em detalhes”, de autoria do historiador e jornalista Paulo César de Araújo, e a longa disputa judicial envolvendo a família do jogador de futebol Garrincha e o escritor e jornalista Ruy Castro, autor da obra “Estrela Solitária”, trouxeram ao conhecimento público um novo termo cunhado pela Imprensa: “censura privada”.

Personalidades públicas ou seus herdeiros, na hipótese das já falecidas, têm impedido a divulgação total ou parcial de obras de caráter biográfico, histórico e jornalístico, tanto sob a forma literária como audiovisual.

Em que pese o termo “censura” possuir uma acepção na Comunicação Social – visto que assim é considerada toda e qualquer forma de vedação à divulgação de informação ou manifestação de pensamento –, debateremos neste trabalho o vocábulo conceituado na ciência do Direito.

Falaremos em “censura judicial” referindo nos às decisões proferidas pelo Judiciário nas quais não existe a adequada ponderação entre a liberdade de expressão e os direitos da personalidade na proibição da publicação de biografias não autorizadas.

O confronto entre os princípios constitucionais da liberdade de expressão, de informação e de pensamento versus a tutela à imagem, à honra e à vida privada é o mote deste artigo, que ao abordar a temática das “biografias não autorizadas” analisa, comenta e explica o porquê da necessária ponderação de princípios.

O gênero biografia pode ser definido como uma narrativa descritiva a partir de referências subjetivas dos protagonistas dos fatos integrantes desta história.

Usualmente, tais obras literárias narram a vida de indivíduos cuja trajetória pessoal, profissional, artística, esportiva ou política tenha tomado dimensão pública, e, por isso, goza de uma esfera de intimidade e privacidade naturalmente mais estreita do que o restante dos “homens comuns”.

Suas histórias de vida se confundem com a história coletiva.

Exatamente pela historicidade demonstraremos o interesse público em favor da liberdade de informar e ser informado, facetas do direito à liberdade de expressão e de pensamento e, mais do que isso, da preservação da memória e da identidade cultural da sociedade.

Ao tratarmos do direito à liberdade de expressão, de informação e de pensamento, será esquadrinhada a questão do abuso de direito, a necessária veracidade das informações – que devem atender à função social da atividade informativa –, o conceito de dano injusto e o direito ao esquecimento.

Na sequência, serão tecidas considerações a respeito da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.815, proposta pela Associação Nacional dos Editores de Livros (Anel), que tramita perante o Supremo Tribunal Federal tendo por objeto a declaração de inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, dos arts. 20 e 21 do Código Civil.

O Projeto de Lei nº 393/11, de autoria do Deputado Federal Newton Lima, também terá destaque neste trabalho, pois, ao dispor sobre a alteração do art. 20 do Código Civil, pretende ampliar a liberdade de expressão, informação e acesso à cultura.

A imperiosidade da difusão de ideias e do imprescindível relato dos fatos históricos faz com que duas grandes disciplinas – a Comunicação Social e a História – se encontrem com o Direito nesta discussão sobre a ponderação de princípios de envergadura constitucional: a tutela da liberdade de expressão, de informação e de pensamento versus a proteção conferida pela Lex Mater à imagem, à honra, e à vida privada na publicação do gênero biografia “não autorizada”.


1. OS DIREITOS DA PERSONALIDADE EM CONFLITO COM O DIREITO À LIVRE (DIVULGAÇÃO DE) INFORMAÇÃO E À LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DE PENSAMENTO

Os Direitos da Personalidade - Aspectos gerais

Conforme os ensinamentos do festejado doutrinador Carlos Alberto Bittar:

Consideram-se como da personalidade os direitos reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesmo e em suas projeções na sociedade, previstos no ordenamento jurídico exatamente para a defesa de valores inatos ao homem, como a vida, a higidez física, a intimidade, a honra, a intelectualidade e outros tantos 1.

Nas palavras da professora da PUC/SP, Maria Helena Diniz, citando Gofredo da Silva Telles:

A personalidade consiste no conjunto de caracteres da própria pessoa. A personalidade não é um direito, de modo que seria errôneo afirmar que o ser humano tem direito à personalidade. A personalidade é que apóia os direitos e deveres que dela irradiam, é objeto de direito, é o primeiro bem da pessoa, que lhe pertence como primeira utilidade, para que ela possa ser o que é, para sobreviver e se adaptar às condições do ambiente em que se encontra, servindo-lhe de critério para aferir, adquirir e ordenar outros bens 2.

Os direitos da personalidade3 são a vida, a integridade física e psíquica, o nome, o direito moral do autor, a honra, a imagem, a vida privada, a liberdade, o direito ao corpo, o direito à voz, o direito ao segredo, à intimidade, entre outros, visto que o rol não é exaustivo.

Carlos Alberto Bittar4 individualiza os direitos da personalidade que chama de:

  • físicos – direito à vida; à integridade física; ao corpo; a partes do corpo; ao cadáver; à imagem; à voz; à locomoção;

  • psíquicos – liberdade de expressão; de culto; de credo; integridade psíquica, segredo, intimidade; e,

  • morais – direito à honra; ao nome; à identidade; criação intelectual; ao sepulcro; às lembranças de família.

Conforme leciona Pedro Frederico Caldas, alguns dos atributos da personalidade só se justificam “no relacionamento social do indivíduo, pois liberdade, honra, intimidade, identidade só fazem sentido como fenômenos emergentes da vida em sociedade, de relações intersubjetivas” 5.

O direito à liberdade de expressão, de informação e de pensamento também se encontra na mesma perspectiva do ser humano tomado em suas relações intersubjetivas.

Exatamente por isso, como lembrado por René Ariel Dotti6, há verdadeira tendência material de que liberdade de expressão, de informação e de pensamento, e direito à privacidade, à honra e à imagem colidam quando colocados em confronto.

Diz a Constituição Federal, in verbis:

Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamento:

(...)

III – a dignidade da pessoa humana

(....)

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros, residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

(...)

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (destacou-se).

Também deve ser mencionado o inc. XLI do art. 5º da CF por dar tutela genérica aos direitos da personalidade ao prescrever que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais.

Deve ser frisado que com a Lex Legum de 1988 os direitos da personalidade adquiriram previsão de forma clara em nosso ordenamento jurídico.

O Código Civil em seus arts. 11 a 21 trata dos direitos da personalidade sem, entretanto, esgotar sua enumeração, em consonância ao Enunciado nº 274 da IV Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal7, que afirma:

Os direitos da personalidade, regulados de maneira não exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral da tutela da pessoa humana, contida no art. 1º, III, da Constituição (princípio da dignidade da pessoa humana). Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve se aplicar a técnica da ponderação.

Entre as características dos direitos da personalidade podemos citar a essencialidade, a originalidade, a vitaliciedade, a oponibilidade erga omnes, a extrapatrimonialidade, a intransmissibilidade, a irrenunciabilidade, a imprescritibilidade, a impenhorabilidade e, em regra, a indisponibilidade, além de serem necessários, inexpropriáveis e ilimitados.

O Direito à Imagem

Nas elucidativas palavras da Professora Maria Helena Diniz, o direito à imagem pode ser definido como o:

direito da personalidade de autorizar a exposição ou a reprodução pública da imagem. A utilização desta é admitida apenas com autorização do retratado ou de seus sucessores, salvo se tal publicação se relacionar com fins científicos, didáticos ou com eventos de interesse público. É, portanto, o direito de dispor da própria imagem, que é um bem jurídico essencial8.

Nas sempre judiciosas palavras do mestre Bittar, o direito à imagem:

Consiste no direito que a pessoa tem sobre a sua forma plástica e respectivos componentes distintos (rosto, olhos, perfil, busto) que a individualizam no seio da coletividade. Incide, pois, sobre a conformação física da pessoa, compreendendo esse direito um conjunto de caracteres que a identifica no meio social. (...) É o vínculo que une a pessoa à sua expressão externa, tomada no conjunto, ou em partes significativas (como a boca, os olhos, as pernas, enquanto individualizadoras da pessoa)9.

Assim sendo, pode o titular extrair proveito econômico do uso de sua imagem, ou componentes, mediante contratos próprios, como o de licença de uso, em que devem estar explicitados todos os elementos que compõem o ajuste de vontades. Os aspectos e os direitos não compreendidos, por expresso, no contrato permanecem sob reserva do titular. Frise-se, entretanto, que nosso ordenamento jurídico não admite a cessão de imagem.

Cumpre informar a confusão existente na doutrina entre direito à imagem e à honra.

Pontes de Miranda10 sustentava que a imagem de alguém é protegida como decorrência de simultânea ofensa a sua honra e, portanto, não chegaria a constituir um direito autônomo da personalidade.

Porém, como bem lembrado por Regina Beatriz Tavares da Silva:

O direito à imagem é autônomo, não se confundindo com a honra e a intimidade. Muito embora haja quem a classifique como imagem-retrato e imagem-atributo, a primeira como aparência física, ou forma plástica da pessoa, e a segunda como a imagem social, que é o conjunto de caracteres que a pessoa apresenta socialmente, preferimos destacar um direito do outro, reservando à imagem “a projeção física e plástica do indivíduo” e à honra, nos seus mais variados aspectos, dos pessoais aos profissionais “o conjunto de atributos cultivados pela pessoa, reconhecidos socialmente” ou “visão social do indivíduo”, inclusive quando reproduzida por meio de biografia 11.

A imagem-retrato é a representação física da pessoa, também assim considerada quando identificável em partes separadas (olhos, nariz, boca), levando ao reconhecimento de seu titular seja por meio de fotografia, escultura, desenho, pintura, interpretação dramática, cinematográfica, televisão, ou via Internet. A imagem-atributo seria o conjunto de caracteres ou qualidades cultivadas pela pessoa e que tenham reconhecimento social, como habilidade, competência, lealdade.

Imagem e honra não se confundem, preservando ambos os direitos sua autonomia, apesar de, eventualmente, estarem conexos. Basta rememorarmos o clássico exemplo da fotografia de uma modelo, de uso autorizado, para específica campanha publicitária, e utilizada para outro fim publicitário idôneo pela mesma agência responsável pelo primeiro trabalho. Na hipótese, haverá violação ao direito de imagem, mas será inexistente afronta à honra12.

José Afonso da Silva, ao comentar o inc. X do art. 5º da Carta Maior, diz que a inviolabilidade da imagem da pessoa tutela o aspecto físico, não tratando da imagem como conceito, mas de imagem como figura, retrato, representação gráfica, plástica ou fotográfica da pessoa.13

Outrossim, deve ser destacada a confusa redação do inc. V do art. 5º da CF, “além da indenização por dano material, moral ou à imagem”, que dá vazão a dúvidas por sinalizar que a indenização poderia se dar por dano moral, material ou imagem, como se esta última fosse outra categoria de dano indenizável.

A lesão à imagem não pode ser considerada como uma terceira forma de dano indenizável, visto que a lesão a tal direito da personalidade poderá ter como consequência um dano material, um dano moral ou ambos14.

O direito à imagem sofre, como todos os direitos privados, certas limitações, nos termos da construção doutrinária e jurisprudencial:

  • a notoriedade da pessoa, aí se inserindo os artistas, escritores famosos, celebridades instantâneas, desde que preservada a vida íntima;

  • o exercício de cargo público, pela necessidade de exposição;

  • os serviços de Justiça e de polícia;

  • atendimento a interesse público, a fins culturais, científicos e didáticos;

  • acontecimentos da atualidade (notícias);

  • poses ou instantâneos em multidão, desde que inexista destaque da pessoa.

No entanto, vale frisar a impossibilidade da utilização comercial em publicidade, ainda que institucional, ou na ilustração de produtos ou embalagens.

Maria Helena Diniz trata magistralmente do assunto, aprofundando-se em cada uma das categorias limitadoras do direito à imagem:

Todavia há certas limitações do direito à imagem, com dispensa da anuência para sua divulgação quando: a) se tratar de pessoa notória, mas isso não constitui uma permissão para devassar sua privacidade, pois sua vida íntima deve ser preservada. A pessoa que se torna de interesse público, pela fama ou significação intelectual, moral, artística ou política não poderá alegar ofensa ao seu direito à imagem se sua divulgação estiver ligada à ciência, às letras, à moral, à arte e à política. Isto é assim porque a difusão de sua imagem sem seu consenso deve estar relacionada com sua atividade ou com o direito à informação; b) se referir a exercício de cargo público, pois quem tiver função pública de destaque não poderá impedir que, no exercício de sua atividade, seja filmada ou fotografada, salvo na intimidade; c) se procurar atender à administração ou serviço da justiça ou de polícia, desde que a pessoa não sofra dano à sua privacidade; d) tiver de garantir a segurança pública, em que prevalece o interesse social sobre o particular, requerendo a divulgação da imagem, p. ex., de um procurado pela polícia ou a manipulação de arquivos fotográficos de departamentos policiais para identificação de delinquente. Urge não olvidar que o civilmente identificado não pode ser submetido a identificação criminal, salvo nos casos autorizados legalmente (CF, art. 5º, LVIII); e) se busca atender ao interesse público, aos fins culturais, científicos e didáticos; f) houver necessidade de resguardar a saúde pública. Assim, portador de moléstia grave e contagiosa não pode evitar que se noticie o fato; g) se obter imagem, em que a figura é tão somente parte do cenário (congresso, enchente, praia, tumulto, show, desfile, festa carnavalesca, (...) restaurante etc.), sem que se a destaque, pois se pretende divulgar o acontecimento e não a pessoa que integra a cena; h) se tratar de identificação compulsória ou imprescindível a algum ato de direito público ou privado (...)15.

Confira-se a redação do dispositivo legal em comento:

Art. 20. Salvo autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais. (grifos nossos)

Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes. (destacou-se).

O Direito à honra

A honra é dividida pela doutrina nos seus aspectos intrínsecos e extrínsecos. Assim, aquela espécie seria a honra subjetiva – a autoestima ou consideração própria, o sentimento da própria dignidade, a consciência do próprio valor moral e social, nas palavras de Nelson Hungria,16 – e esta, a honra objetiva – a consideração ou reputação social, o apreço, a fama, o respeito que se lhe devota.

Alguns juristas dividem tal direito da personalidade em várias subespécies, como a honra individual, a honra civil, a honra política, a honra profissional, a honra artística, a honra conjugal, dentre outras17 18.

Conforme as lições de José Afonso da Silva lastreado nas judiciosas palavras de Adriano de Cupis:

A honra é o conjunto de qualidades que caracterizam a dignidade da pessoa, o respeito dos concidadãos, o bom-nome, a reputação. É direito fundamental da pessoa resguardar essas qualidades. A pessoa tem o direito de preservar a própria dignidade (...) mesmo fictícia, até contra ataques da verdade, pois aquilo que é contrário à dignidade da pessoa deve permanecer um segredo dela própria. Esse segredo entra no campo da privacidade, da vida privada – e é aqui onde o direito à honra se cruza com o direito à privacidade19.

Informe-se que o direito à honra, além da tutela constitucional, também encontra assento na esfera infraconstitucional, conforme a leitura do já citado art. 20 do CC e arts. 138 a 140 do CP.

Frise-se, ademais, que o direito à honra não é ilimitado e sofre alguns temperamentos, como:

  • a possibilidade da exceptio veritatis (a exceção da verdade), nos casos em que é permitida por lei;

  • o constrangimento derivado de ordem judicial;

  • a distorção humorística da personalidade (animus jocandi), desde que nos limites da comicidade, geralmente em charges e caricaturas, e desde que não configurada a intenção do agente em ofender a pessoa retratada; e,

  • o direito de crítica, assim considerada a opinião desfavorável da crítica literária, artística, científica ou desportiva, desde que não quede para o insulto pessoal.20

1.4. O Direito à Vida Privada

Para José Afonso da Silva, a privacidade deve ser entendida como o “conjunto de informação acerca do indivíduo que ele pode decidir manter sob seu exclusivo controle, ou comunicar, decidindo a quem, quando, onde e em que condições, sem a isso poder ser legalmente sujeito”21.

O direito à vida privada é gênero no qual a doutrina insere as espécies privacidade, intimidade e segredo.

A Carta Magna prevê no inc. X do art. 5º “a intimidade e a vida privada”, o que trouxe dúvidas na intelecção do dispositivo, visto que, para alguns juristas, se assim foi redigido pelo constituinte, versariam sobre direitos distintos.

Segundo Claudio Luiz Bueno de Godoy,22 a doutrina procura diferenciar vida privada e intimidade do indivíduo, estabelecendo-se entre os conceitos verdadeira relação de gênero e espécie. Assim, a intimidade seria um núcleo mais restrito da vida privada, orientação que reflete a teoria dos chamados círculos concêntricos, em que a intimidade, menos ampla, seria um círculo com raio menor que o da vida privada.

Nas palavras de Carlos Alberto Bittar, o ponto nodal da intimidade exige:

Isolamento mental ínsita no psiquismo humano, que leva a pessoa a não desejar que certos aspectos de sua personalidade e de sua vida cheguem ao conhecimento de terceiros. Limita-se, com esse direito, o quanto possível, a inserção de estranho na esfera privada ou íntima da pessoa23.

É classificado como um direito negativo, ou seja, expresso exatamente pela não exposição a conhecimento de terceiro de elementos particulares da esfera do indivíduo.

José Afonso da Silva nos informa que a Constituição deu destaque ao conceito falando em “intimidade” e “vida privada” para que seja mais abrangente, como conjunto de modo de ser e viver, como direito de o indivíduo viver sua própria vida. Considera que a vida das pessoas compreende dois aspectos, um voltado para o exterior e outro para o interior. Assim, a vida exterior envolve a pessoa nas relações sociais e nas atividades públicas, e pode ser objeto das pesquisas e das divulgações de terceiros, visto que é pública. Já a vida interior, segundo o doutrinador, se debruça sobre a pessoa mesma, sobre os membros de sua família, sobre seus amigos. Esta última é a vida privada, inviolável, nos termos do inciso X do art. 5º da CF.24

Nos termos do art. 21 do Código Civil: “A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma”.

Conforme a lição de Claudio Luiz Bueno de Godoy, em citação a Hermano Duval25, merece referência a questão do vedetismo a que se entregam algumas vezes pessoas notórias, chamando a atenção sobre si, até mesmo sobre sua vida privada, em verdadeira autopromoção.

Por óbvio, nestes casos, não pode a própria pessoa valer-se do socorro a sua privacidade deliberadamente exposta.

Normalmente, a pessoa dotada de notoriedade, e desde que no exercício de sua atividade, está excepcionada da proteção de sua privacidade, sendo admissível a revelação de fatos de interesse público, independentemente de sua anuência.

Necessária se faz a distinção entre a tutela da intimidade da pessoa privada, digamos comum, e da pessoa notória. Não é o direito que se altera, mas seu conceito e abrangência, desde que se trate ou não de uma personalidade pública. Frise-se que não é a pessoa propriamente dita, mas seu cargo ou posição social ocupada, ou mesmo aspirada, que determinam a circunscrição de sua intimidade e privacidade.

Isso não significa que a personalidade pública não possua intimidade, mas que sua esfera de vida privada ou íntima é mais restrita que a do homem comum. Outrossim, a divulgação de informações a respeito da intimidade e/ou privacidade da pessoa notória deve ser de interesse público, que não deve ser confundido com interesse do público, alimentado com a boataria e o sensacionalismo da imprensa.

Conforme os ensinamentos de Sonia Maria D´Elboux26, alicerçada na doutrina de Enéas Costa Garcia, o interesse público remete ao conjunto de valores que são mais caros à sociedade, que dizem respeito à sua própria estrutura, que viabilizam sua existência e tratam do funcionalismo de suas instituições fundamentais.

Conforme as lições de Gilberto Haddad Jabur:

A atuação livre sem peias da imprensa, a difusão excessiva e irreprimível de informações pouco afeitas ao interesse público inequívoco e mais voltada à satisfação da curiosidade pegajosa de alguns e insolente de outros renega a missão primacial da comunicação de massa e rompe, mais e cada dia um pouco mais, o isolamento fundamental da pessoa. O recato é exigência da vida. O ser humano não vive despreocupado com sua honra e privacidade. Justamente por isso tantos as agregam, tantos as confundem (...). A informação deve acrescentar, educar, desvendar, elucidar e esclarecer, e não ferir, ofender, vulgarizar, saciar a indiscrição alheia ou o desejo sovina de tantos27.

No entanto, na hipótese da caracterização de interesse público, expressão que suscita acaloradas discussões no meio jurídico, há redução dos limites da privacidade dos políticos, atletas, artistas em geral, e outras pessoas que mantêm contato com o público em maior intensidade. Este seria o ônus do bônus da notoriedade e/ou fama.

Conforme lição do festejado Bittar:

(...) Existem graus diferentes na escala de valores comunicáveis ao público, em função exatamente da posição do titular (...). Assim, há que da esfera privada separar-se ações que se encartam no plano relacional e que se dimensionam em função da condição de notoriedade da pessoa, se, de um lado, comum, ou, de outro, político, artista ou desportista, abrindo-se mais o leque com respeito às últimas (...)28.

As limitações ao direito à intimidade ocorrem em razão de ordem histórica, científica, cultural ou artística; exigências de cunho judicial ou policial; exigências de saúde pública; exigências de ordem tributária ou econômica, dentre outras.

Em sua relevante obra, Bittar29 ainda diz que é possível a divulgação de fatos extraordinários que envolvam uma pessoa, de interesse científico, histórico, artístico, como, por exemplo, a descoberta de substância ou de bem de interesse da coletividade.

O ilustre civilista observa que limitações existem ao direito à intimidade em razão de interesses vários da coletividade e pelo desenvolvimento crescente das atividades estatais, que a doutrina tem apontado, a saber:

  • exigências de ordem histórica, científica, cultural ou artística;

  • exigências de cunho judicial ou policial (inclusive com aparato tecnológico, como é o caso dos grampos telefônicos);

  • exigências de ordem tributária ou econômica;

  • exigências de saúde pública e de caráter médico-profissional;

  • exigência de informação, pela constituição de empresas, bancos, ou centros, públicos ou privados, de dados, de interesse negocial, e de agências de divulgação comercial30.

Ao tratar especificamente das biografias, Bittar aduz31 que, na redação da obra, devem ser respeitados os limites necessários à satisfação do interesse visado, observando que a notícia do fato não deve avançar sobre componente outro da intimidade não relacionado.

Direito à Liberdade de Expressão, de Informação e de Pensamento

Quanto à liberdade de expressão, de informação e de pensamento, revela-se providencial a distinção metodológica realizada por Vidal Serrano Nunes Júnior,32 que realiza subdivisões à temática ao apresentar o direito de informação, o direito de opinião, o direito de expressão e o direito de comunicação.

O direito de opinião é o direito da manifestação de pensamento, visto que o pensamento, enquanto processo interno de reflexão, não pode ser apropriado.

O direito de expressão se alinha à “sublimação da forma das sensações humanas”33, exteriorizando-as, tais como a música, a pintura, a manifestação teatral, a fotografia.

O direito de comunicação e a recepção do pensamento, a difusão de informações, a manifestação artística ou a composição audiovisual, quando veiculadas por meio de comunicação de massa, incluem-se no chamado direito de comunicação social.

Já o direito de informação contempla três subtemas: o direito de informar, o direito de se informar e o direito de ser informado.

Nas palavras do jurista em epígrafe:

O direito de informar consiste basicamente na faculdade de veicular informações, ou, assumindo outra face, no direito a meios para transmitir informações, como, verbi gratia, o direito a um horário no rádio ou na televisão.

O direito de se informar consiste na faculdade de o indivíduo buscar as informações desejadas sem qualquer espécie de impedimento ou obstrução.

Por fim, o direito de ser informado remete à faculdade de ser mantido integral e corretamente informado 34.

Pontes de Miranda diferenciava a liberdade de pensamento da liberdade de manifestação de pensamento, aduzindo que: “a livre manifestação ou emissão do pensamento é direito de liberdade do indivíduo em suas relações com os outros, no que se distingue da liberdade de pensamento, que é direito do indivíduo sozinho, de per si” 35.

Para Pedro Frederico Caldas, a opinião constitui este “movimento de pensamento de dentro para fora; é a forma de manifestação do pensamento, resume a própria liberdade de pensamento, encarada, aqui, como manifestação de fenômeno social” 36.

A Carta Magna dispõe in verbis:

Art. 5º (...):

(...)

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

(...)

IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

(...)

XIV – é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional.

(...)

Art. 220 A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

(...)

§ 6° - A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade (...) (destacou-se).

Além da Lex Legum, prevê a Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1948, em seu art. 19, como garantia da liberdade de opinião a de “sem interferências, ter opiniões e de procurar receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”.

Também possui similar disposição o art. 13.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica, datado de 1969, ao qual aderiu o Brasil, conforme o Decreto nº 678/92, dispondo que a liberdade de expressão e de opinião é a “de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda a índole, sem consideração de fronteiras, seja oralmente, por escrito ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro meio eleito”.

Desta forma, em um primeiro momento, temos o direito subjetivo de o indivíduo manifestar seu próprio pensamento, verdadeira garantia da liberdade individual, e, ao lado deste direito individual, o direito da coletividade à informação.

Vislumbra-se a existência de correntes aparentemente antagônicas – na verdade complementares e interdependentes – no que concerne ao direito à informação. Uma delas é a liberal, calcada no individualismo, na liberdade de manifestação do pensamento; e a outra é a chamada funcional, assentada na teoria da liberdade de informação e de imprensa como uma garantia de expressão social, alicerçada no interesse da sociedade no acesso à informação, inclusive como motor das transformações político-sociais.

Pelas teorias institucionais, desenvolvidas pós Segunda Guerra Mundial, assevera-se que a sociedade tem direito público institucional à expressão, no pressuposto da participação coletiva que legitima o exercício do Poder Público.

A liberdade de informação é deslocada para o campo dos direitos políticos do cidadão, sendo a motivação para sua ascensão como princípio – informar e formar, base ao próprio desenvolvimento da pessoa e, consequentemente, do Estado justo e solidário.

Por óbvio, em plena era da sociedade da informação, o indivíduo isolado, alienado aos acontecimentos, ou ainda o mal-informado, não tem como desenvolver-se a contento, permanecendo alheio aos processos decisórios da sociedade. Não questionará, ou fará suas indagações de forma equivocada por não possuir ferramentas intelectuais para tanto.

A atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal37 reconhece que a liberdade de expressão é instrumento decisivo na formação da cidadania e da democracia.

Na petição inicial da Adin 4815, em trâmite no Pretório Excelso38, que contesta a constitucionalidade dos arts. 20 e 21 do Código Civil, o subscritor, Gustavo Binenbojm, afirma que integram o núcleo da definição de democracia:

(i) tanto a tutela da livre manifestação de opiniões e ideias por parte dos indivíduos, como direito subjetivo fundamental; (ii) como a promoção de um ambiente deliberativo potencialmente ativo e informado, que torne a condução da coisa pública expressão real da vontade do povo 39.

1.6 O conflito de Princípios Constitucionais: a ponderação

O busílis deste trabalho reside exatamente em responder ao questionamento: é possível a compatibilização dos direitos da personalidade – honra, imagem e vida privada – com os direitos à liberdade de expressão, de informação e de pensamento, direitos de envergadura constitucional e que, não raras vezes, colidem no gênero literário “biografia não autorizada”? Como? Por quê?

De plano, é conveniente informar que os direitos fundamentais não são absolutos ou ilimitados, nem existe relação de hierarquia entre eles.

Nas palavras de Pedro Frederico Caldas, com referência a Canotilho, é o princípio da unidade hierárquico-normativa:

(...) segundo o qual as normas contidas numa constituição formal têm igual dignidade, impondo o princípio da unidade da constituição aos seus aplicadores a obrigação de lerem e compreenderem as suas regras, na medida do possível, como se fossem obras de um só autor, exprimindo uma concepção correta do direito e da justiça 40.

E ainda conforme o constitucionalista Luís Roberto Barroso:

(...) os princípios se comportam de maneira diversa. Como comandos de otimização, pretendem eles ser realizados da forma mais ampla possível, admitindo, entretanto, aplicação mais ou menos ampla de acordo com as possibilidades jurídicas existentes sem que isso comprometa sua validade 41.

Para o equacionamento da questão, três correntes doutrinárias se apresentam, conforme as lições de Xavier O´Callaghan42.

No regime de exclusão, considera-se o valor absoluto dos direitos da personalidade, asseverando-se que em nenhuma situação, ou sob qualquer pretexto, mesmo o de eventual interesse coletivo envolvido, poderiam ser violados.

A segunda vertente doutrinária fala sobre a ponderação de princípios e considera que, existindo eventual colisão, o correto é proceder a casuística e necessária equalização entre os direitos envolvidos, visto que o direito de crítica e, de forma geral, o direito de informação não são absolutos, devendo ser ponderados pelo direito da personalidade.

A terceira teoria, a da concorrência normativa, não nega que os direitos fundamentais sejam limitados, em especial os direitos de informação e de crítica, fixando, entretanto, que estes últimos têm preferência em relação aos primeiros, notadamente se o assunto for de interesse geral ou tiver relevância pública. Segundo esta concepção, a opinião pública livre é alicerce do sistema democrático, sendo instituição essencial à democracia, não significando que os direitos da personalidade fiquem anulados ante o direito de informação, mas apenas retraídos, desde que, casuisticamente, justifique-se a relevância do conteúdo veiculado.

No Brasil, utiliza-se a técnica da ponderação dos direitos em confronto, com base em suas limitações – posto que nem mesmo os direitos fundamentais são ilimitados –, em que, dentro dos princípios da proporcionalidade, adequação, necessidade e razoabilidade, é verificado qual é o direito mais relevante ao caso concreto.

Isso porque não há espaço para a aplicação da regra lex posterior derogat legi priori, que reza que diante de duas normas do mesmo nível hierárquico e escalão a última prevaleça sobre a anterior.

Também não há se falar da regra especial, derrogando a previsão geral para solucionar o conflito.

Logo, não estamos diante da antinomia aparente de normas solucionável pela aplicação dos critérios da hierarquia, cronologia ou especialidade dos dispositivos, e sim diante da antinomia real das normas. Esta constatação leva à compreensão dos princípios de forma que se integrem e harmonizem.

Isso porque os direitos da personalidade são alicerçados no princípio da dignidade da pessoa humana, nos termos do art. 1º, inc. III, da CF, e a liberdade de expressão é fundada no Estado Democrático de Direito, nos termos do caput do mesmo dispositivo da Lex Mater.

Daniel Sarmento, citado por L.G. Grandinetti Castanho de Carvalho,43 explica que a ponderação de interesses deve levar a um ponto de equilíbrio entre eles. Assim, a restrição a cada um dos interesses deve ser idônea para garantir a sobrevivência do outro; tal restrição deve ser a menor possível para a proteção do interesse contraposto; e o benefício logrado com a restrição a um interesse deve compensar o grau de sacrifício imposto ao interesse antagônico.

Deve ser mencionado que a teoria da ponderação já foi alvo de críticas, fundamentadas principalmente no possível perigo na relação entre preceitos constitucionais e outros bens jurídicos.

Como alternativa à técnica da ponderação, defendeu-se a adoção do critério da concordância prática, teoria pela qual seriam estabelecidos limites a ambos os direitos visando alcançar o desfecho mais favorável, conforme as circunstâncias do caso concreto.

Porém, observa-se que esta alternativa também realiza a ponderação de bens, pois, no caso concreto, um direito terá de recuar em nome da prevalência de outro.

Conforme os ensinamentos de Karl Larenz, alicerçado na jurisprudência alemã:

(...) haverão de confrontar-se entre si: de um lado, a importância para a opinião pública do assunto em questão, a seriedade e a intensidade do interesse na informação; de outro lado, a espécie (esfera privada ou apenas esfera profissional) e a gravidade (modo deformado e injurioso da reportagem) do prejuízo causado ao bem da personalidade44.

Logo, o exercício da liberdade de informação deve almejar fins legítimos, ou seja, é necessário verificar, casuisticamente, se o sacrifício da honra, privacidade e intimidade de uma pessoa se reveste de interesse público.

Em virtude da grandiosidade do direito à liberdade de expressão prevista na Carta Maior, nossos Tribunais estão se filiando à doutrina da posição preferencial. Tal teoria, desenvolvida inicialmente nos EUA, assevera que a solução de colisões envolvendo liberdade de expressão e outros bens, direitos e valores constitucionais se resolve em favor da primeira. Isso porque a liberdade de expressão, em todas as suas vertentes, é erigida pela Carta Magna como pilar da democracia.

O princípio do pluralismo previsto no art. 1º, inc. V, da CF é do pluralismo político, histórico e cultural, e também pode ser invocado para justificar a publicação das biografias não autorizadas.

É indispensável, entretanto, que o relatado seja verdadeiro, ou que, assim não o sendo, haja reais divergências históricas quanto aos acontecimentos. Notícias falsas não são protegidas pela liberdade de informação.

O Juiz norte-americano Oliver Wendell Holmes Jr.45 já afirmava que a liberdade de expressão não protege “quem falsamente grita fogo num teatro cheio”, ou seja, que a mentira não tem proteção legal.46

A divulgação de obra literária, no caso, de biografias não autorizadas, em que haja relatos sobre a vida pessoal do retratado, se justifica em existindo interesse público neste conhecimento, ou seja, se o relato versar sobre assunto ou tema de interesse cultural, político ou outro que a sociedade precise tomar conhecimento.

Observe-se, entretanto, que o ordenamento jurídico não tolera o abuso.

Caio Mário da Silva Pereira leciona que:

A caracterização da figura do abuso do direito toma forma quando o autor do dano exerceu um direito definido, mas além dos limites das prerrogativas que lhe são conferidas. Quando alguém se contenta em exercer estas prerrogativas estará usando o seu direito. Comete abuso quando as excede47.

O abuso de direito se verifica quando o agente ultrapassa os limites que seriam necessários, deixando de conciliar seus interesses com os demais integrantes da sociedade.

Nos termos do art. 187 do Código Civil: “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.

A liberdade de expressão possui limites e não pode ser exercida sem a indispensável responsabilidade.

Porém, a dificuldade reside exatamente na verificação de quando o ato caracterizado como o exercício regular de um direito ultrapassa os limites admitidos, afrontando o ordenamento jurídico e, levando, consequentemente, ao dever de reparar os danos causados ao ofendido.

A necessidade de o exercício da liberdade de expressão e de pensamento observar os direitos da personalidade encontra alicerce na própria regra do § 1º do art. 220 da Carta Magna.

Por isso, um dos limites impostos ao direito de informação é a verdade. Não haverá responsabilidade se o fato divulgado for verdadeiro.

No entanto, conforme já decidido pelo STJ48, se a divulgação da verdade, ainda que de forma abreviada ou resumida, omitir voluntariamente, por dolo ou culpa, parte do fato que seja relevante para a valoração ética da conduta da pessoa objeto da informação, não há resumo ou abreviatura, mas sim abuso.

Em outro emblemático acórdão, a relatora, Ministra Nancy Andrighi, asseverou que a liberdade de informação e de expressão se sobrepõem aos direitos da personalidade do indivíduo, considerando o interesse público à informação e a busca de fontes fidedignas pelos jornalistas.

A hipótese versava sobre a veiculação de notícia acerca do suposto envolvimento em fato criminoso de um indivíduo que, posteriormente, foi considerado inocente.

A honra e a imagem dos cidadãos não são violadas quando se divulgam informações verdadeiras e fidedignas a seu respeito e que, além disso, são do interesse público. O veículo de comunicação exime-se de culpa quando busca fontes fidedignas, quando exerce atividade investigativa, ouve as diversas partes interessadas e afasta quaisquer dúvidas sérias quanto à veracidade do que divulgará. O jornalista tem um dever de investigar os fatos que deseja publicar. Isso não significa que sua cognição deve ser plena e exauriente à semelhança daquilo que ocorre em juízo. A elaboração de reportagens pode durar horas ou meses, dependendo de sua complexidade, mas não se pode exigir que a mídia só divulgue fatos após ter certeza plena de sua veracidade. Isso se dá, em primeiro lugar, porque os meios de comunicação, como qualquer outro particular, não detêm poderes estatais para empreender tal cognição. Ademais, impor tal exigência à imprensa significaria engessá-la e condená-la à morte. O processo de divulgação de informações satisfaz verdadeiro interesse público, devendo ser célere e eficaz, razão pela qual não se coaduna com rigorismos próprios de um procedimento judicial. A reportagem (...) indicou o recorrido como suspeito de integrar organização criminosa. Para sustentar tal afirmação, trouxe ao ar elementos importantes, como o depoimento de fontes fidedignas (...). Não se tratava, portanto, de um mexerico, fofoca ou boato que, negligentemente se divulgava em cadeia nacional. A suspeita que recaía sobre o recorrido, por mais dolorosa que lhe seja, de fato, existia e era, à época, fidedigna. Se hoje já não pesam sobre o recorrido essas suspeitas, isso não faz com que o passado se altere. Pensar de modo contrário seria impor indenização a todo veículo de imprensa que divulgue investigação ou ação penal que, ao final, se mostre improcedente 49.

Existe atualmente um direito de quarta geração que é o correlacionado com o de informar apenas o que seja verdadeiro, pois não basta simplesmente divulgar, visto que devem ser noticiados fatos verdadeiros atendendo à função social da atividade informativa.

Assim, nem tudo que é verdade pode ser divulgado, mas tudo que é divulgado deve ser verdadeiro.

Deve ser frisado que a premissa se refere à liberdade de informação, e não à de expressão, que possui um conteúdo mais amplo e, por consequência, dispensa o limite da verdade exigido por aquele direito.

Conforme o elucidativo comentário de Luiz Manoel Gomes Junior e Miriam Fecchio Chueiri: “a liberdade de expressão se traduz na emissão de uma opinião, uma determinada posição sobre um tema, não havendo assim, um vínculo de dependência com a verdade, ainda que os abusos não só possam como devam ser punidos” 50.

Nos termos do parecer da Advocacia-Geral da União, referente à Adin 481551:

Liberdade de expressão e direito de informação são originados do preceito liberal da liberdade da palavra. Porém, não se confundem. A liberdade de expressão é a expressão da ideia, da opinião, do pensamento e não encontra, necessariamente, apego aos fatos, à veracidade ou à imparcialidade, atributos que não lhe cabe preencher. Sua manifestação será necessariamente parcial, pessoal, impregnada de uma cognição já realizada pelo seu emissor e o recebedor aderirá ou não ao pensamento já formulado.

O direito de informação, ao contrário, exige coerência com os fatos e a informação deve ser despida de qualquer apreciação pessoal. O recebedor avaliará o fato objetivamente ocorrido e estabelecerá sua cognição pessoal, seu pensamento sobre o mesmo, sem qualquer interferência 52.

A exigência de que a informação seja verdadeira na liberdade de opinião não priva seu autor da proteção contra equívocos ou eventuais erros, desde que esteja demonstrada a diligência na captação das informações, sua averiguação, o confronto com outras fontes e o cuidado na elaboração do texto.

E não poderia ser diferente, visto que o ordenamento jurídico autoriza a responsabilização em decorrência das condutas negligentes, ou seja, por culpa, como ocorre na divulgação de informações baseadas em boatos.

Assim, para que as obras biográficas encontrem respaldo legal para sua publicação, é essencial e indispensável que a informação do biografado seja verdadeira, tenha função social – inclusa aí a de cunho histórico – e que seja exercida dentro dos limites éticos aceitáveis, ou seja, sem a utilização de ofensas pessoais e gratuitas à pessoa cuja vida esteja sendo retratada.

O acórdão lavrado quando do julgamento da ADPF 130, que considerou a Lei de Imprensa não recepcionada pelo ordenamento jurídico vigente, bem elucida a questão:

O pensamento crítico é parte integrante da informação plena e fidedigna. O possível conteúdo socialmente útil da obra compensa eventuais excessos de estilo e da própria verve do autor. O exercício concreto da liberdade de imprensa assegura (...) o direito de expender críticas a qualquer pessoa, ainda que em tom áspero ou contundente. (...) O próprio das atividades de imprensa é operar como formadora de opinião pública, espaço natural do pensamento crítico e “real alternativa à versão oficial dos fatos” (Deputado Federal Miro Teixeira)(...) 53.

Fatos em princípio reservados, de natureza pessoal, podem apresentar interesse pela condição de seu protagonista, no caso, personalidade pública, seja um notório jogador de futebol em atividade, um político da época da ditadura militar já falecido, ou uma celebridade instantânea participante de um reality show.

Manuel da Costa Andrade chama tais personalidades notórias de “pessoas da história de seu tempo em sentido absoluto” 54, as Personen der Zeitgeschichte do Direito e jurisprudência alemã.

Outrossim, a alegação de que as editoras estariam proibidas de publicar as biografias “afrontosas” aos direitos da personalidade, mesmo de pessoas públicas e notórias, devido aos seus fins exclusivamente comerciais não merece prosperar.

A interpretação correta quanto aos “fins comerciais” se refere à utilização comercial em publicidade (mesmo que institucional), na ilustração de produtos ou embalagens, ou ainda nas notícias ou obras sensacionalistas, típicas da imprensa marrom55, em que reste demonstrada a ausência de qualquer finalidade informativa (pela inverossimilhança, fonte ilícita ou destinada a escopo ilícito).

Porém, uma dúvida ainda permanece. O que seria a censura prévia?

Segundo Fernando Toller, citado na obra de Antonio Jeová Santos:

(...) este nome em sentido estrito alude a um instituto sistemático de polícia preventiva de nítido caráter administrativo, consistente na revisão antecipada e obrigatória do que será difundido, com o fim de controlar seu conteúdo para aprová-lo, desaprová-lo ou exigir sua modificação, em que a mera omissão de submeter à revisão o material, à margem de seu conteúdo, torna ilícita sua difusão e engendra sanções penais e administrativas 56.

Assim, surge a indagação: decisões judiciais podem ter caráter censório?

A imprensa brasileira considera censura toda e qualquer forma de proibição de divulgação de informação ou manifestação de pensamento.

No entanto, conforme as magistrais palavras de Sonia Maria D´Elboux:

(...) Somente pode ser considerada como censura a proibição judicial de divulgação de informações que seja, efetivamente, atentatória da liberdade de imprensa, isto é, a resultante de decisão judicial em que não se vislumbre uma adequada ponderação entre a liberdade de imprensa e os direitos da personalidade, e sim a prevalência pura e simples destes sobre aquela 57.

Deve ser ressaltado, mais uma vez, que o ordenamento jurídico protege a liberdade de expressão, mas não tolera o abuso de direito.

Para ilustrar a assertiva, vale trazer ao estudo o emblemático julgamento pelo STF, no qual houve a denegação do writ ao habeas corpus58 impetrado pelo editor de livros Siegfried Ellwanger, cujas publicações negacionistas do holocausto59, também chamadas de revisionistas, foram tipificadas no crime de racismo.

Tendo em vista o princípio da liberdade de expressão, a liberdade da manifestação de pensamento, e o direito fundamental de acesso a todo tipo de obra, o controle judicial acerca das atividades do editor não poderia se dar a priori, em verdadeira censura prévia.

Na hipótese, o controle ocorreu in concreto e a posteriori quando comprovado que a atividade editorial ocultava propósito criminoso.

Considerou-se que escrever, editar, divulgar e comercializar livros “fazendo apologia de ideias preconceituosas e discriminatórias” contra a comunidade judaica constitui crime de racismo sujeito às cláusulas de inafiançabilidade e imprescritibilidade.

No mais, o acórdão explicita que a garantia constitucional da liberdade de expressão não é absoluta pela existência de limites morais e jurídicos, visto que “não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal”.

Neste tópico também cabe tecer considerações sobre o conceito de dano injusto.

Na dogmática do sistema romano-germânico, estes são os danos que, por opção do legislador, se caracterizam como ressarcíveis. Assim, o dano decorre da caracterização de ato ilícito.

Na área da Comunicação Social são inúmeras as hipóteses nas quais o exercício da liberdade de informação e de expressão atinge os direitos da personalidade do retratado, sem que com isso se afigure o dano injusto.

Outrossim, poderia ser levantada a objeção do direito ao esquecimento.

Emblemático case law envolvendo Doca Street, condenado e sentenciado pela prática de homicídio60, chegou aos Tribunais há menos de uma década abordando o direito ao esquecimento.

Discutiu-se se a reconstituição em programa televisivo do crime praticado por Street, que já havia cumprido sua pena, reavivando seu passado, afrontaria seus direitos de personalidade.

Nos termos da ementa do acórdão:

(...) A informação jornalística que apresenta fatos ou ideias, independente da contemporaneidade, e resguarda os seus sentidos originais, sem truncá-los e deturpá-los, cumpre função inerente à sua natureza; corresponde ao direito coletivo de ser corretamente informado e expressa o puro exercício de atividade constitucionalmente assegurada. (...). Nesse contexto, o relato de acontecimento relacionado a crime doloso contra a vida, fato verídico e público, não constitui abuso ou lhe retira o caráter puramente informativo, e descaracteriza a afronta ao direito à honra e imagem de pessoa que se obriga a conviver com seu passado 61.

O caso suscitou polêmica na Corte, onde foi dado, inclusive, um voto vencido.

A hipótese é bastante similar à questão das biografias não autorizadas.

No caso de Doca Street e sua pretensa censura à divulgação do programa televisivo que rememoraria o homicídio praticado há cerca de trinta anos, falamos de jornalismo histórico, de um caso que teve repercussão nacional, figurando como matéria de primeira página em periódicos durante a apuração e julgamento do crime. Trata-se de pessoa e fatos públicos, condição que traz para a coletividade o legítimo interesse do conhecimento.

O homicídio de Angela Diniz por Doca Street motivou intensos debates não só no âmbito jurídico, mas também social, psicológico, histórico e antropológico, pois, no primeiro julgamento, o réu foi absolvido sob a justificativa de “legítima defesa da honra”, tendo em vista a suposta infidelidade da companheira.

O que atualmente pode parecer absurdo como motivo para absolvição criminal começou a ser discutido em solo pátrio em fins dos anos 1970, exatamente neste emblemático julgamento.

Nos termos do voto-vogal do Desembargador Antonio Saldanha Palheiro:

A conclusão inafastável é de que, se por qualquer razão externou interesse social e acadêmico, a sociedade passa a deter o direito de discutir e avaliar suas causas e consequências independente do tempo decorrido, já que inserido nos anais históricos daquela coletividade 62.

E ainda em brilhantes palavras: “uma das principais trincheiras da luta da liberdade contra o autoritarismo é exatamente a luta da informação contra o esquecimento”.

O vogal ainda afirma:

Se o respeito ao direito à privacidade, que reverenciamos como um dos fundamentos bastiões da democracia, servir de camuflagem para ocultar da memória do povo a identidade dos criminosos e prestar-se a enterrar o lixo da história, deve ser ponderadamente mitigado em benefício do sentido pedagógico e crítico que acarretam a evolução social 63.

O que deve estar claro é que o eventual dano causado pela informação de fato considerado histórico, mesmo que ocorra a publicação de fatos íntimos ou privados do retratado, não é indenizável, pois tal dano não é injusto, visto que a Lei das Leis assegura a liberdade de expressão, de informação e de pensamento.

Assim, de grande lucidez o entendimento esposado pelo Tribunal de Justiça fluminense, visto que patente o interesse social e acadêmico despertado pelo caso, levando à sociedade o direito de debatê-lo, sejam seus motivos ou seus sucedâneos, independentemente do tempo transcorrido.

O Enunciado nº 531, aprovado durante a VI Jornanda de Direito Civil, realizada em março de 2013, diz que: “A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito ao esquecimento”.

Porém, conforme muito bem ressaltado pelo Desembargador do TRF da 5ª Região, Rogério Fialho Moreira, o Enunciado garante apenas a possibilidade de discutir o uso que é dado aos eventos pretéritos nos meios de comunicação social, sobretudo nos meios eletrônicos, não atribuindo a ninguém o direito de apagar fatos passados ou reescrever a própria história64.

O que o ordenamento jurídico veda, e esta é a interpretação que deve ser dada aos arts. 20 e 21 do Código Civil, é a liberdade de informação desvirtuada, aquela que configura mentira ou meia-verdade.


2.A INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL, SEM REDUÇÃO DE TEXTO, DOS ARTS. 20 E 21 DA LEI Nº 10.406/02 – CÓDIGO CIVIL – A ADIN Nº 4815/STF

No mês de julho de 2012, a Associação Nacional dos Editores de Livros – Anel propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) perante o Supremo Tribunal Federal, tendo por objeto a declaração da inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, dos arts. 20 e 21 do Código Civil em virtude da interpretação que tem sido dada aos dispositivos pelo Poder Judiciário.

As decisões judiciais têm levado à proibição da edição de biografias não autorizadas pelas pessoas cuja vida está retratada nas obras literárias ou audiovisuais – ou de seus herdeiros, em caso de pessoas falecidas – , ou de pessoas retratadas como coadjuvantes, em total afronta à sistemática constitucional que prevê a liberdade de expressão e o direito à informação, caracterizando verdadeira censura privada.

Conforme linha argumentativa presente na petição inicial da Adin, a extensão dos comandos extraíveis da literalidade dos artigos supracitados, ao não preverem qualquer exceção contemplando as obras biográficas, acaba por violar as liberdades de manifestação do pensamento, da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação (CF, art. 5º, IV e IX), além do direito difuso da cidadania à informação (art. 5º, inc. XIV).

Assim, por via de interpretação conforme a Constituição, a pretensão é afastar do ordenamento jurídico o entendimento que tem sido invocado para obstar a publicação de obras biográficas não autorizadas.

Na inicial não se nega a importância da tutela dos direitos da personalidade, mas denuncia-se que a interpretação literal dos arts. 20 e 21 do Código Civil afronta a liberdade de expressão, de informação e de pensamento.

Considerando-se a legitimidade da interpretação que vem sendo dada pelo Judiciário, poderia ser dado ensejo a restrições à livre divulgação de informações pela imprensa, tendo em vista a previsão da necessidade de prévia autorização do retratado em qualquer publicação, exposição ou utilização da imagem da pessoa por veículos de comunicação social. De tão absurda, essa interpretação é afastada pela jurisprudência por ser manifestamente inconstitucional65. Porém, quanto às biografias não autorizadas, a publicação é passível de contestação com alicerce nos dispositivos legais.

Exatamente por isso, somente as obras “chapas-brancas”, que muitas vezes caracterizam verdadeira hagiografia66, têm sido publicadas.

Destaque-se que a versão dos fatos contada apenas pelos seus protagonistas, e, na maioria das vezes, distorcida, é causadora da deturpação da História, causadora de verdadeira stalinização67.

E o pior: as biografias oficiais tendem a amenizar ou suprimir fatos desabonadores da vida do biografado.

Como bem salientado na inicial da Adin, a ninguém é dado cogitar de impedir a publicação de biografias autorizadas pelo fato de estas faltarem com a verdade, pois, por mais panegíricas que sejam, representam a versão do personagem central dos fatos, cuja liberdade de expressão deve ser protegida.

Porém, é afrontoso à liberdade de expressão condenar o leitor à biografia única e, o pior, à autobiografia, ditada pelo próprio biografado ou seus herdeiros. O leitor deve formar livremente suas opiniões e convicções pela leitura de quantas biografias quiser.

Quanto à alegação de que o leitor pode se fiar a uma imagem deturpada do biografado a solução não é a censura, mas a educação. Por meio do pensamento crítico adquirido com uma boa cultura, o leitor será capaz de refutar e contraditar informações.

No mais, conforme disposto no capítulo 1, em caso de abuso de direito consubstanciado na falta de veracidade das informações, culpa ou dolo na divulgação, ofensas pessoais, muitas vezes caracterizadoras de crimes contra a honra, enfim, dano injusto, será cabível indenização por danos materiais e/ou morais.

Outrossim, deve ser frisado que nos casos de afronta gritante aos direitos da personalidade deve ser buscada a tutela preventiva no Judiciário. Aqui nos referimos àquelas informações divulgadas sem qualquer embasamento nos fatos, desprovidas de veracidade, nas quais restem caracterizados o dano injusto e o abuso de direito.

O Professor Gustavo Tepedino se manifesta com pena de ouro em parecer proferido para o caso:

Os arts. 20 e 21 do Código Civil, ao tutelarem a imagem, privacidade e a honra das pessoas, hão de ser interpretados em conformidade com a Constituição da República, de modo a não sacrificarem o direito fundamental à informação e às liberdades de expressão e de pensamento. Exclui-se, assim, por inconstitucional, qualquer interpretação daqueles dispositivos legais que proíba as obras biográficas, literárias ou audiovisuais, de pessoas notórias sem prévia autorização dos biografados ou de seus familiares na hipótese de pessoa falecida. As biografias, com efeito, revelam narrativas históricas descritas a partir de referências subjetivas, isto é, do ponto de vista dos protagonistas dos fatos que integram a história. Tais fatos, só por serem considerados históricos, já revelam seu interesse público em favor da liberdade de informar e de ser informado, da memória e da identidade cultural da sociedade 68.

Além da censura pura e simples, a Adin merece acolhida para vedar outro fenômeno que se agiganta: a precificação dos direitos da personalidade.

Escritórios de representação têm negociado preços absurdos para licenças, observando-se no mercado editorial uma disputa puramente mercantil, “verdadeiro leilão da história pessoal de vultos históricos”69.

Pelo viés da historiografia, a questão adquire ares mais funestos. As exigências descabidas dos biografados ou de seus herdeiros, ou ainda a ameaça de uma demanda judicial que, dependendo do personagem retratado, pode ocasionar a falência da editora e a insolvência do escritor, ocasionam grave desestímulo à produção intelectual.

Com a liberdade de expressão tolhida, uma das ferramentas mais importantes para a realização da democracia, resta fulminado um dos alicerces do Estado Democrático de Direito.

Isso porque o julgamento casuístico em relação às informações que podem ou não ser reportadas, ou, ainda, conforme expresso na petição inicial da Adin, uma “filtragem prévia” das pessoas que poderiam ou não ser mencionadas em obras biográficas, caracterizaria verdadeira censura.

O envolvimento de alguém em acontecimento de relevância pública faz com que tal indivíduo seja suscetível de citação pela historiografia, até porque será mencionado ora pelo personagem central ora por outros envolvidos na narrativa.

O professor Gustavo Tepedino de forma magistral ilustrou esta questão:

Como contar a história do primeiro reinado sem levar em conta as relações extraconjugais do Imperador, relevantes para a compreensão dos costumes da época, das ligações entre a burguesia e a nobreza, do método de nomeação de autoridades e cargos públicos e assim por diante? Seria razoável condicionar a divulgação de cartas e documentos que retratam fielmente o relacionamento do Imperador com suas amantes e a Imperatriz à autorização dos descendentes da nobiliarquia brasileira? Seria possível cogitar-se de liberdade de expressão sem a ampla permissão constitucional para a publicação de tais biografias? 70 71.

Também merece ser ressaltado que muitas vezes a censura da obra acaba por aguçar a curiosidade do leitor que busca conhecer os fatos nebulosos por meio de publicações apócrifas e textos anônimos divulgados na Internet. Não raras vezes o verdadeiro dano à personalidade advém dessas informações que não podem ser cotejadas com a biografia do retratado.

Por conduzir à censura privada, é incoerente com a sistemática da liberdade de expressão e de pensamento a seleção de fatos a respeito de personalidades notórias, sejam políticos, artistas, cientistas, que são passíveis de divulgação em obras biográficas.

A compreensão dos arts. 20 e 21 do Código Civil como limites prestabelecidos às manifestações de pensamento afronta as garantias constitucionais à livre informação, principalmente no que concerne às informações jornalísticas e biográficas.

No caso das obras literárias classificadas como biografias, permanecerá sujeito a juízo a posteriori – a não ser em raríssima exceção – o abuso de direito ou desvio do exercício da liberdade de informação, seja pela ilicitude de fontes, falsidade evidente dos fatos ou desvirtuamento da finalidade do interesse tutelado.

Isto porque, conforme já mencionado ao tratarmos do julgamento do HC 82.424 pelo Pretório Excelso, com base no princípio da liberdade de expressão, da liberdade de manifestação de pensamento, e o direito fundamental de acesso a todo tipo de obra, o controle judicial somente ocorre a priori em casos excepcionais, sob pena de verdadeira censura prévia.

Exemplificamos situação excepcional com a hipotética publicação e divulgação de obra literária que contenha em seu encarte fotos de atos sexuais com crianças.

Pensamento contrário, que seria o da censura prévia, nos levaria à institucionalização da “queima” de livros pelo Judiciário – metáfora para a retirada de circulação das obras “proibidas” – verdadeiro pastiche dos atos cometidos pela infame Inquisição e pelo Nazismo.

O mais grave nesta situação é o fato de o julgamento sobre a conveniência ou não de determinada obra, com conteúdo supostamente afrontoso aos direitos da personalidade, ficar ao alvedrio de um Juiz singular ou, no máximo, de um Colegiado.

Infelizmente muitos civilistas ainda conferem à personalidade humana o tratamento hermenêutico influenciado pela concepção patrimonialista, esquecendo-se de que a liberdade de manifestação de pensamento é também inerente à personalidade humana, sendo sua restrição afrontosa à dignidade.

O último andamento da Adin72 informa que os autos se encontram “conclusos ao relator”.

Também não podemos deixar de observar que, caso o julgamento da Adin 4.815 se alongue, pode perder seu objeto.

Isto porque está em trâmite na Câmara dos Deputados o projeto de lei nº 393/1173 74, de autoria do deputado federal Newton Lima (PT-SP).

O PL dispõe sobre a alteração do art. 20 do Código Civil, para ampliar a liberdade de expressão, informação e acesso à cultura75.

O objetivo é garantir a divulgação de imagens e informações biográficas sobre pessoas de notoriedade pública cuja trajetória pessoal tenha dimensão pública ou cuja vida esteja inserida em acontecimentos de interesse da coletividade. Conforme consulta ao site da Câmara dos Deputados, o parecer asseverando a legalidade da alteração foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) em 02.04.2013, e em 04.04.2013 ocorreu a publicação deste documento.

Em 18.04.2013, com o encerramento do prazo, um recurso foi apresentado.

Vale a pena destacar as alterações objetivadas pelo projeto. Pretende-se que o art. 20 do Código Civil, após a alteração de seu parágrafo único para § 1º, passe a vigorar com o seguinte texto:

Art.20............................................................................................................................

§1º Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes;

§ 2º A mera ausência de autorização não impede a divulgação de imagens, escritos e informações com finalidade biográfica de pessoa cuja trajetória pessoal, artística ou profissional tenha dimensão pública ou esteja inserida em acontecimento de interesse da coletividade (destacou-se).

Na justificação do PL, afirma-se que as personalidades públicas são consideradas políticos, esportistas, artistas, entre outros, pessoas cujas trajetórias profissionais e pessoais se confundem e servem de paradigma para toda a sociedade.

Considera-se que tais pessoas, por sua posição de destaque em relação aos demais cidadãos, norteiam, com suas condutas, as decisões de diversos segmentos sociais, os quais valorizam as escolhas pessoais realizadas por tais personalidades públicas, muitas vezes até reproduzindo-as.

Enfatiza-se que é evidente o protagonismo que um jogador de futebol consagrado ou um artista popular exercem sobre a tomada de decisão de pessoas ditas comuns, citando, inclusive, a imitação de um simples corte de cabelo.

A justificação ressalta que a inexigência de autorização para publicação de obra biográfica não significa atentado à dignidade da pessoa humana, nos termos do art. 1º, III, da CF, permanecendo garantido o direito ao nome, conforme o art. 17 do Código Civil.


CONCLUSÃO

A publicação do gênero literário biografia não autorizada tem se revelado um investimento de alto risco para as editoras, fato que não ocorre na edição das autobiografias, em sua maioria, panegíricas, “chapas-brancas”, elogiosas, enfim, parciais, e geralmente redigidas por ghost writers.

Com base no ordenamento jurídico vigente, em que banida a censura estatal, é descabida a submissão da livre manifestação de autores e historiadores ao direito potestativo dos biografados ou de seus herdeiros para a redação das biografias não autorizadas.

O direito de informação é de grandiosidade ímpar ao possibilitar que diversos problemas sejam de conhecimento público e, em razão disto, possam ser enfrentados e discutidos, levando às transformações político-sociais tão caras à dinâmica da coletividade.

A importância da atividade jornalística e da historiografia, principalmente quando rememoramos o passado recente brasileiro, não pode ser olvidada. A atuação destes profissionais é determinante para que não caiam no esquecimento os desmandos políticos da Ditadura Militar (1964-1985) e os escândalos envolvendo homens públicos de renome, apenas para exemplificar.

Em um país carente de educação formal, também cabe à Imprensa e à História a tarefa hercúlea de desmascarar inúmeras personalidades endeusadas pela mídia.

Não causa espanto que os maiores opositores dos projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional com o objetivo de alterar a redação dos arts. 20 e 21 do Código Civil – devido à abertura textual dos dispositivos – sejam os políticos de reputação duvidosa. Como regra, os opositores das biografias não autorizadas são aqueles que temem sua própria história de vida, parafraseando Gustavo Binenbojm na petição inicial da Adin 4.815/STF.

Por óbvio não defendemos a isenção de responsabilidade do biógrafo ou do historiador.

As informações divulgadas nas biografias devem ser verazes, cumprirem sua função social – tópico no qual englobamos não só a historicidade dos fatos, mas também a relevante função de pulverizar as personalidades inverossímeis e imaculadas apresentadas na Imprensa –, observando limites éticos aceitáveis, ou seja, sem descambar em ofensas pessoais e gratuitas.

Também deve ser considerado o aforismo que diz que nem tudo que é verdade pode ser divulgado, mas que tudo que é divulgado deve ser verdadeiro, pois equívocos ou eventuais erros não devem levar à responsabilização do autor desde que demonstrada diligência na captação de informações, sua escorreita averiguação, o confronto com outras fontes e o cuidado na elaboração do texto.

Outrossim, deve ser frisado que o ordenamento jurídico prevê a responsabilidade em decorrência de negligência, imprudência ou imperícia, exatamente o que ocorre quando há a divulgação de informações baseadas em boatos ou maledicências.

Nos casos de abuso de direito, no qual o autor faça uso doloso de informações falsas e ofensivas à honra do biografado ou coadjuvantes, será eventualmente cabível sua responsabilização civil e penal, porém em juízo a posteriori e in concreto. Conseguimos visualizar pouquíssimas situações excepcionais de controle a priori, dentre elas, a publicação de obra contendo encarte fotográfico de atos sexuais com crianças.

Caso contrário, resta caracterizada a censura prévia, teratologia jurídica na qual, sem qualquer ponderação de princípios, é dada relevância aos direitos da personalidade.

As reiteradas decisões neste sentido sugerem que os civilistas ainda conferem à personalidade humana o tratamento hermenêutico influenciado pela concepção patrimonialista, esquecendo-se de que a liberdade de manifestação de pensamento é também inerente à personalidade humana, sendo sua restrição afrontosa à dignidade.

Na área da comunicação social, não raras vezes, o exercício da liberdade de informação e de expressão afrontará os direitos da personalidade do retratado, sem que com isso se afigure o dano injusto.

A objeção do direito ao esquecimento também não merece guarida como justificativa para a não publicação de biografia não autorizada eventualmente afrontosa aos direitos da personalidade, pois existindo interesse social e/ou acadêmico nos fatos que tenham entrado para os anais históricos da coletividade há motivação suficiente a rememorá-los.

Desta forma, sendo a liberdade de expressão, aí inserida a liberdade de informação e de pensamento, pilar da democracia, determinante para a formação do espírito cético e questionador, verdadeiro alicerce para o acesso ao conhecimento, impulsionador das transformações sociais, aderimos ao pedido disposto na Adin 4.815/STF de declaração de inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, dos arts. 20 e 21 do Código Civil.

Lembramos que o bom jornalismo, seja em reportagens investigativas seja em biografias não autorizadas, revela a imagem histórica das pessoas notórias para que o público possa realizar juízo de valor sem a interferência de herdeiros ou cônjuges – que ora tentam apagar as máculas de um passado não muito lisonjeiro para o retratado, ora ganharem algum dinheiro negociando, e não protegendo, eventual afronta à imagem –, ou até mesmo de marqueteiros e publicitários que buscam vender produtos em cima de imagens, principalmente comportamentais, inexistentes na vida real.

Por isso, deve ser dada interpretação conforme a Constituição aos dispositivos supramencionados do Código Civil para afastar do ordenamento jurídico o entendimento que tem sido invocado para obstar a publicação de obras biográficas não autorizadas.


REFERÊNCIAS

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Notas

1 Bittar, Carlos Alberto. “Os direitos da personalidade”. 7ª ed. rev. e atual. de acordo como o Novo Código Civil por Eduardo C. B. Bittar, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008, p. 1.

2 Diniz, Maria Helena. “Curso de Direito Civil Brasileiro”. 22ª ed., São Paulo: Saraiva, 2005, v. 1, p. 121.

3 Em que pese a pessoa jurídica ter direitos da personalidade, como o direito ao nome e à honra objetiva, neste trabalho abordaremos a questão dos direitos da personalidade da pessoa natural.

4 Bittar, Carlos Alberto. Op. cit., p. 64.

5 Caldas, Pedro Frederico. “Vida privada, liberdade de imprensa e dano moral. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 21.

6 Dotti, René Ariel. “Proteção da vida privada e liberdade de informação”. São Paulo: RT, 1980, p. 181.

7 As jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal são promovidas a cada biênio pelos Centros de Estudos do colegiado e reúnem especialistas de todo o Brasil. Os enunciados servem de orientação para o entendimento de artigos do Código Civil.

8 Diniz, Maria Helena. “Dicionário Jurídico”, 3ª edição rev. atual. e aumentada, São Paulo: Saraiva, 2007, vol. II, p. 149.

9 Bittar, Carlos Alberto. Op. cit., p. 94.

10 Pontes de Miranda, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. 2ª ed., Rio de Janeiro: Borsoi, 1956, v. 7, p. 54 apud Godoy, Claudio Luiz Bueno. “A liberdade de imprensa e os direitos da personalidade”. 2ª ed., São Paulo: Atlas, p.35.

11 Silva, Regina Beatriz Tavares da. “Sistema protetivo dos direitos da personalidade”. In: Regina Beatriz Tavares da Silva e Manoel J. Pereira dos Santos (coords). “Responsabilidade Civil na Internet e nos demais meios de comunicação”. 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012. p. 49.

12 Godoy, Claudio Luiz Bueno de. “A liberdade de imprensa e os direitos da personalidade. 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2008, p. 45.

13 Silva, José Afonso da. “Comentário contextual à Constituição”. 8ª ed., São Paulo: Malheiros, 2011, p. 104.

14 D´Elboux, Sonia Maria. “O fantasma da censura volta a assombrar a imprensa brasileira”. Revista Científica Virtual da Escola Superior de Advocacia da OAB-SP, versão 2012, ano IV, nº 9, p. 131. Disponível em: http://www.esaoabsp.edu.br/revista/edicao09/index.swf. Acesso em 24.04.2013.

15 Diniz, Maria Helena. Op. cit. p. 133-134.

16 Hungria, Nelson. “Comentários ao Código Penal”. 2ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1953, v. 6, p. 38.

17 Silva, Regina Beatriz Tavares da. “Sistema Protetivo dos Direitos da Personalidade”. In: “Responsabilidade Civil na Internet e nos demais meios de comunicação”, Op. cit., p. 45.

18 Godoy, Claudio Luiz Bueno de. Op. cit., p. 29.

19 Silva, José Afonso da. Op. cit. p. 104.

20 Bittar, Calos Alberto. Op. cit., p. 135

21 Silva, José Afonso da. “Curso de Direito Constitucional Positivo”. 5ª ed., São Paulo: RT, 1989, p. 183.

22 Godoy, Claudio Luiz Bueno de. Op. cit., p. 39.

23 Bittar, Carlos Alberto. Op. cit., p. 111.

24 Silva, José Afonso da. “Comentário contextual à Constituição”. Op. cit., 103-104.

25 Duval, Hermano. “Direito à imagem”. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 141 apud Godoy, Claudio Luiz Bueno de. “A liberdade de imprensa e os direitos da personalidade”. 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2008, p. 74

26 D´Elboux, Sonia Maria. “O fantasma da censura volta a assombrar a imprensa brasileira”. Revista Científica Virtual da Escola Superior de Advocacia da OAB-SP, versão 2012, ano IV, nº 9, p. Disponível em: http://www.esaoabsp.edu.br/revista/edicao09/index.swf. Acesso em 24.04.2013, p. 134.

27 Jabur, Gilberto Haddad. Liberdade de pensamento e direito à vida privada: conflitos entre direitos da personalidade. São Paulo: RT, 2000, p. 189.

28 Bittar, Carlos Alberto. Op. Cit., p. 112-113

29 Idem, p. 115.

30 Idem, Ibidem.

31 Idem, Ibidem.

32 Nunes Júnior, Vidal Serrano. “Direito e Jornalismo”. São Paulo, Verbatim, 2011, p. 35.

33 Nunes Júnior, Vidal Serrano. Op. cit. p. 41.

34 Idem, p. 44.

35 Pontes de Miranda, Francisco Cavalcanti. “Comentários à Constituição de 1967”. São Paulo: RT, 1968, v. 5, p. 139.

36 Caldas, Pedro Frederico. Op. cit., p. 59.

37 STF, HC 83.996, 2ª Turma, Relator para o acórdão Min. Gilmar Mendes, DJ 26.08.2005 e ADPF 130, Plenário, rel. Ministro Ayres Britto, DJ 06.11.2009. Ambas disponíveis em http://www.stf.jus.br. Acesso em 18.04.2013. O primeiro acórdão versa sobre o caso Gerald Thomas, no qual afastou-se a alegada violação ao pudor público diante da liberdade de expressão; o segundo é o acórdão proferido no julgamento da ação que asseverou a não-recepção da Lei nº 5.250/67 (Lei de Imprensa) pela atual Carta Magna.

38 A discussão sobre a demanda será aprofundada no tópico 2 deste artigo.

39 Binenbojm, Gustavo. Petição inicial da Adin 4815/STF. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=4271057. Acesso em 26.04.2013

40 Caldas, Pedro Frederico. Op. cit., p. 89.

41 Barroso, Luís Roberto. “Temas de Direito constitucional”. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 358.

42 O´Callaghan, Xavier. “Libertad de Expresión: honor, intimidad e imagen”. Madri, Editoriales de Derecho Reunidas, s.d.

43 Sarmento, Daniel. “A ponderação de interesses na Constituição Federal” apud Carvalho, LG Grandinetti Castanho de. “Liberdade de informação e o direito difuso à informação verdadeira”. 2ª ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003, p. 43-44.

44 Larenz, Karl. “Metodologia da ciência do direito”. Trad. José Lamego. 3ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 583.

45 Juiz na Suprema Corte de 1902 a 1932.

46 Gaspari, Elio. Atos Falhos. Folha de São Paulo, 05.05.2009, Caderno 1, apud Gomes Junior, Luiz Manoel; Chueiri, Miriam Fecchio. “Direito de Imprensa e Liberdade de expressão – soluções teóricas e práticas após a revogação da Lei nº 5.250, de 09.02.1967”. São Paulo: RT, 2011.

47 Pereira, Caio Mário da Silva. “Responsabilidade Civil”. Rio de Janeiro, Forense, 1992, p. 252.

48 STJ, Resp 36.493-SP, 4ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, J. 09.10.1995, disponível em http://www.stj.jus.br. Acesso em 18.04.2013.

49 STJ, Resp 984.803, 3ª Turma, Rel. Ministra Nancy Andrighi, j. 26.05.2009, disponível em http://www.stj.jus.br. Acesso em 23.04.2013.

50 Gomes Junior, Luiz Manoel e Chueiri, Miriam Fecchio. “Direito de Imprensa e Liberdade de expressão – soluções teóricas e práticas após a revogação da Lei nº 5.250, de 09.02.1967”. São Paulo: RT, 2011, p. 122.

51 Conforme mencionado anteriormente, a discussão sobre a demanda será aprofundada no tópico 2 deste artigo.

52 Goulart, Thelma Suely de Farias. Parecer da Advocacia-Geral da União referente à Adin 4.815, lavrado em 13.08.2012. Disponível em http://s.conjur.com.br/dl/manifestacao-agu.pdf. Acesso em 25.04.2013.

53 STF, ADPF 130/DF, Plenário, rel. Ministro Ayres Britto, DJ 06.11.2009. Disponível em http://www.stf.jus.br. Acesso em 18.04.2013.

54 Costa Andrade, Manuel da. “Liberdade de imprensa e inviolabilidade pessoal”. Coimbra: Coimbra Editora, 1996, p. 262.

55 Assim chamada a imprensa sensacionalista, que se alimenta de escândalos e maledicências.

56 Toller, Fernando. “Libertad de prensa y tutela judicial efectiva” apud Santos, Antonio Jeová. “Dano moral indenizável”. 4ª ed., rev. ampl. e atual. de acordo com o novo Código Civil, São Paulo: RT, 2003, p. 341-342.

57 D´Elboux, Sonia Maria. 2012, p. 138. Disponível em http://www.esaoab.edu.br/revista/edicao09/index.swf. Acesso em 24.4.2013 .

58 STF, HC 82.424, Plenário, Rel. para o acórdão Ministro Maurício Correa, j. 17.09.2003.

59 O Negacionismo do Holocausto consiste em afirmações de que o genocídio de judeus durante a Segunda Guerra Mundial não aconteceu, ou que não aconteceu da maneira ou nas proporções historicamente reconhecidas.

60 Raul Fernando do Amaral Street, conhecido como Doca Street, ficou nacionalmente conhecido após ter matado em 30 de dezembro de 1976 a socialite Angela Diniz, com quem tinha um relacionamento amoroso.

61 TJRJ, Ap. Cível 2005.001.54774, 19ª Câmara Cível, Rel. Desembargador Milton Fernandes de Souza, J. 07.03.2006.

62 Idem

63 Idem.

64 “Enunciado trata do Direito ao esquecimento na sociedade da informação”. Disponível em http: www.editoramagister.com. Acesso em 24.05.2013.

65 Nos termos da petição inicial da Adin 4.815, disponível em http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=4271057. Acesso em 19.04.2013.

66 Como exemplo, vide biografia de Roberto Marinho escrita por Pedro Bial.

67 Josef Stálin, líder da União Soviética (1922-1953), reescreveu a história da Revolução Russa para atribuir a si mesmo um papel mais relevante nos eventos que levaram à derrubada do czar.

68 Tepedino, Gustavo. Opinião doutrinária acerca da interpretação conforme a Constituição da República dos arts. 20 e 21 do CC. Peça processual da Adin 4815 interposta pela Anel (Associação Nacional dos Editores de Livros). Disponível em: http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=4271057. Acesso em 19.04.2013.

69 Nos termos da petição inicial da Adin 4.815, disponível em http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=4271057. Acesso em 26.04.2013.

70 Tepedino, Gustavo. Opinião doutrinária acerca da interpretação conforme a Constituição da República dos arts. 20 e 21 do CC. Peça processual da Adin 4815 interposta pela Anel (Associação Nacional dos Editores de Livros). Disponível em: http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=4271057. Acesso em 19.04.2013.

71 Ainda discorrendo sobre D. Pedro I, o parecerista nos informa que somente após ampla divulgação dos fatos ditos íntimos, biografia atrás de biografia, publicação após publicação, foram superados os boatos e os mexericos, relativizando-se os fatos graças ao trabalho profissional de historiadores e pesquisadores.

72 Informação disponível em http://www.stf.jus.br. Acesso em 11.09.2013.

73 Informação disponível no site da Câmara dos Deputados. http://www.camara.gov.br. Acesso em 11.09.2013.

74 Os PLs 395/11 e 1422/11 estão apensados ao PL 393/11

75 Um grupo de celebridades pretende lançar um manifesto contra o mencionado projeto de lei. A trupe propõe que as biografias possam, sim, ser feitas sem autorização, porém, desde que não sejam comercializadas, ou seja, lançadas por editoras em livrarias e em outros pontos de venda. As obras literárias seriam apenas distribuídas em escolas e bibliotecas. Disponível em http:// http://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2013/05/1273686-celebridades-se-articulam-para-lancar-manifesto-contra-lei-das-biografias.shtml. Acesso em 27.05.2013.


Autor

  • Fernanda Freire dos Santos

    Fernanda Freire dos Santos

    Advogada. Editora Jurídica Adjunta dos Boletins NDJ. Bacharela em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUC/SP. Especialista em Direito Ambiental pela Faculdade de Saúde Pública da USP – Núcleo de Informações em Saúde Ambiental. Especialista em Direito do Entretenimento e da Comunicação Social pela ESA/OAB-SP

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