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Reflexões sobre meio ambiente no prisma constitucional

Reflexões sobre meio ambiente no prisma constitucional

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"São os homens e não as leis que precisam mudar. Quando os homens forem bons, melhores serão as leis.Quando os homens forem sábios, as leis, por desnecessárias, deixarão de existir". José Hermógenes.

REFLEXÕES SOBRE MEIO AMBIENTE NO PRISMA CONSTITUCIONAL

1.1- MEIO AMBIENTE NA CONSTITUIÇÃO DE 1988.

            A palavra ambiente indica a esfera, circulo, o âmbito que nos cerca, em que vivemos. Em certo sentido, portanto, nela já se contém o sentido da palavra meio.

            O ambiente integra-se, realmente, de um conjunto de elementos naturais e culturais, cuja interação constitui e condiciona o meio em que se vive, daí porque a expressão “meio ambiente” se manifesta mais rica de sentido como conexão de valores de que a simples palavra ambiente. Esta exprime o conjunto de elementos; aquela expressa o resultado da interação desses elementos.

            O conceito de “Meio Ambiente” há de ser, pois, globalizante, abrangente de toda natureza original e artificial, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a água o ar, a flora, as belezas naturais o patrimônio histórico, paisagístico, turístico, artístico e arqueológico.

            Indispensável ao falar do Meio Ambiente, é classificarmos sua área de abrangência.

            Encontra-se na Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente e que diz que:

“É o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas suas formas” (art 3º,I)

            Tal conceito pareceu adquirir total recepção na Constituição de 1988: e nesta estão protegido o Meio Ambiente do Trabalho, o Meio Ambiente Artificial e o Meio Ambiente Cultural.

            Essa divisão não possui outra função senão a de detalhar o espectro do meio ambiente a que se está referindo.

            Todavia, tal dissociação é meramente expletiva, vez que o conceito de meio ambiente indissocia-se da noção de direito á vida.

            A Constituição Federal, no seu artigo 225, estabelece:

“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial á sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e á coletividade o dever de defende-lo e preserva-lo para as presente e futuras gerações”.

            Barbieri (2007), define meio ambiente como “um conjunto de forças e condições que cercam” e influenciam os seres vivos. Conforme a Resolução nº 307 do CONAMA de 05/07/2002, meio ambiente pode ser definido, também, como o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química, biológica, social, cultural e urbanística, que permite, abriga e rege a vida em suas formas.

            Ao utilizar a expressão “sadia qualidade de vida”, o legislador constituinte optou por estabelecer dois objetos de tutela ambiental: um imediato, que é a qualidade do meio ambiente e outro mediato , que é a saúde, o bem-estar e a segurança da população, que vêm sintetizados na expressão da qualidade de vida.

            Para Santos ( 2006), meio ambiente é antes de mais nada, a formação desse “meio técnico” que hoje é passível de ser apreendido na relação do “lugar” com o mundo, posto que a técnica é a base de realização da mundialidade como totalidade empírica e esta só é alcançada por meio dos lugares, na medida em que os lugares exprimem a funcionalização do mundo.

            Com base na doutrina que melhor explica o assunto, chega-se a conclusão, portanto, de que o conceito de meio ambiente é amplo na medida em que se associa á expressão “sadia qualidade de vida”. Gerando um conceito jurídico indeterminado, visando criar um espaço positivo de incidência da norma, já que, se houvesse uma definição precisa de meio ambiente, uma infinidade de situações surgiriam, e que, normalmente, se inseriram no conceito atual, deixariam de sê-lo pela eventual criação de um espaço negativo inerente á qualquer definição.


2.1 – MEIOS DE ATUAÇÃO DO ESTADO DIANTE A QUESTÃO DO MEIO AMBIENTE

A)        Gestão Ecológica

            Implica uma política de meio ambiente segundo a qual um país determina, organiza e põe em prática diversas ações que visam a preservação e ao melhoramento da vida natural e humana.

B)        Política Nacional do Meio Ambiente

            A Política Nacional do Meio Ambiente foi estabelecida pela Lei nº 6938 de 37 de agosto de 1981, com fundamento no artigo 8º, inciso XVII, alíneas “c”, “h”, e “i”, da Constituição Federal de 1969, que conferiam á União competência para legislar sobre defesa e proteção da saúde, florestas e águas. Essa competência hoje consta dos artigos 22, IV, 24 VI e VIII, 225 da Constituição Federal de 1988.

            No que se refere, explicitamente aos Organismos Geneticamente Modificados, ou Trasngênicos, o artigo 225, incisos II e V, da Carta Magna, estabelece que:

            Para assegurar a efetividade do direito expresso no caput do art. 225:

“Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem comum do povo e essencial a sadia qualidade de vida, é necessário”:

II- “Preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades á pesquisa e manipulação de material genético”;

V- “Controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substancias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”.

 – LEI Nº 8.974, DE JANEIRO DE 1995

“Segundo o regulamentado nos incisos supra-mencionados  do art. 225 da C.F., o Poder Executivo autorizou a criação, no âmbito da Presidência da Republica a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, dando, também outras providencias específicas aos OGMs”.

            A Lei de Biossegurança (Lei nº 8.974) definiu as diretrizes para o controle das atividades e dos produtos originados pela biotecnologia moderna ou tecnologia de DNA recombinante. Estabeleceu:

“Normas de segurança e mecanismos de fiscalização no uso das técnicas de engenharia genética na construção, cultivo, manipulação, transporte, comercialização, consumo, liberação e descarte de organismo geneticamente modificado (OGM), visando proteger a vida e a saúde do Homem, dos animais e das plantas, bem como o meio ambiente”.

            O Decreto nº 1.752/95, que regulamentou a Lei nº 8.974, dispôs sobre a competência e composição da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, definindo as seguintes metas:

“Propor a Política Nacional de Biossegurança; acompanhar o desenvolvimento e o progresso técnico e científico na Biossegurança e em áreas afins, objetivando a segurança dos consumidores da população em geral, objetivando a segurança dos consumidores e da população em geral, com permanente cuidado á proteção do meio ambiente”.

            Todas as atividades de manipulação, transporte, importação, comercialização e liberação no meio ambiente de organismos geneticamente modificados, ou derivados, devem ser autorizadas previamente pela comissão. 

            A comissão não conseguiu desempenhar uma das atribuições que lhe foi conferida pelo Decreto nº 1.752, de 20 de dezembro de 1995: propor a Política Nacional de Biossegurança.

            Durante esses dez anos de sua existência, tal proposta não foi elaborada, e tampouco foram estabelecidos critérios mínimos para avaliação das solicitações de elaboração ambiental das OGMs.

            Soma-se a isso o fato de que nessa época, já havia uma decisão judicial proibindo a liberação dos transgênicos.

            Em consequência, decisões em desacordo com a legislação vigente acabaram por provocar uma série de ações judiciais, tentando evitar a importação do milho modificado geneticamente, numa contínua realimentação da polêmica instaurada.

            A atuação dos Ministérios é fundamental no cumprimento da legislação de biossegurança. Além da responsabilidade pela fiscalização, embora a CTNBio fosse a encarregada de elaborar o parecer técnico sobre os cultivos transgênicos, a decisão final caberia aos Ministérios da Agricultura, Meio Ambiente, Saúde. Essa fiscalização, no entanto, não ocorreu de maneira satisfatória. Nenhum dos Ministérios cumpriu adequadamente o papel previsto na lei.

            O Ministério da Saúde mostrou-se omisso, no que tangeu a suas atribuições legais sobre os transgênicos. A Agencia Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, além de eximir-se de sua função fiscalizadora, não tomou providências diante das inúmeras denuncias de entidades, como IDEC e o Greenpeace, sobre a comercialização de diversos produtos com ingredientes transgênicos no país.

            A deficiência no controle e monitoração das plantas transgênicas vem de todos os órgãos de fiscalização segundo relatado pelo diretor do Programa Nacional de Conservação de Biodiversidade e Recursos Genéticos, uma das grandes dificuldades da fiscalização é que não se consegue, no campo, distinguir o que é e o que não é transgênico.

            A Própria CTNBio admite que a fiscalização dos OGMs no país é deficiente e que algumas empresas e laboratórios desrespeitam as normas de biossegurança.

            Embora não se conheça o real volume de soja clandestina cultivada, o que reflete o descontrole sobre a questão pelos órgãos responsáveis por seu encaminhamento, observa-se que todas as fontes apresentam números extremamente altos. Não existe certeza da origem dessa soja, se é contrabandeada da Argentina, se disseminada pelas empresas à revelia do governo, ou mesmo com o seu aval, diante das inúmeras liberações para “ Demonstração”.

- LEI Nº 11.105, DE 24 DE MARÇO DE 2005.

“Dita lei regulamenta ademais dos incisos II e V, do art. 225 da C.F. (já mencionados anteriormente), também os incisos IV do mesmo art; sendo que este reza que”:

 IV- “ Exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade”.

            Por ser a lei nº 11.105/05 mais ampla que a anterior, a revoga; uma vez que trata, também, a regulamentação dos incisos II e V do art. 225 parágrafo 1º da C.F., ademais, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam Organismos Geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio; dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança, e revoga a Medida Provisória nº 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5º, 6º, 7º. 8º. 9º, 10º e 16º  da Lei 10.814 de 15 de dezembro de 2003, dando também outras providências cabíveis ao assunto.


REFERÊNCIAS

ANTUNES, Paulo de Bessa: Direito Ambiental. 12ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009.

BARBIERI, J. C. Gestão ambiental empresarial: conceitos, modelos e instrumentos. 2.ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva 2007.

BRASIL. Constituição (1988) Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Diário Oficial da União, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 19 mar. 2014.

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BRASIL. DECRETO Nº 1.752, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1995: Diário Oficial da União, 1995. Disponível em: < www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D1752.htm‎>. Acesso em: 22 mar. 2014.

BRASIL. LEI Nº 11.105, DE 24 DE MARÇO DE 2005: Diário Oficial da União, 1995. Disponível em: < www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004.../2005/lei/l11105.htm‎‎>. Acesso em: 22 mar. 2014.

CONAMA. Resolução nº 307 do CONAMA de 05/07/2002. Disponível em: www.mma.gov.br/estruturas/a3p/_.../36_09102008030504.pdf  Acesso em: 20/05/2014.

DIAS, José de Aguiar. Responsabilidade Civil. V. I e II. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 16 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012.

MAXIMILIANO, Carlos; Hermenêutica e Aplicação do Direito – 20ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2011

SANTOS, M. A questão do meio ambiente: Desafios para a construção de uma perspectiva transdisciplinar. INTERFACEHS – Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente, v.1, n.1, Trad 1, 2006. Disponível em: <http://www.interfacehs.sp.senac .br/br/traducoes.asp?ed=1&cod_artigo=12>. Acesso em 20/05/2014.

PERELMAN, Chaim.Ética e Direito. Editora Martins Fontes. São Paulo, 2000

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS. Pró-Reitoria de Graduação. Sistema de Bibliotecas. Padrão PUC Minas de Normalização: normas da ABNT para apresentação de trabalhos científicos, teses, dissertações e monografias. Belo Horizonte, 2011. Disponível em: http:// www.pucminas.br/biblioteca.


Autor

  • Andre Vicente Leite de Freitas

    Advogado em MG. Professor da Universidade Católica de Minas Gerais ( PUCMINAS). Professor de Direito em curso de Graduação e Pós Graduação. Prof. de Graduação em Sistemas de Informação. Relator da Comissão de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil (pela OAB/MG); Pós-graduado lato sensu em Direito Processual pela Universidade Gama Filho - UGF; Mestre em Direitos Humanos, Processos de Integração e Constitucionalização do Direito Internacional pela Universidade Católica de Minas Gerais.

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