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Competência para fiscalizar na Lei Complementar nº 140/11

Competência para fiscalizar na Lei Complementar nº 140/11

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As atividades de fiscalização e de licenciamento são facetas da mesma competência comum para a proteção do meio ambiente. Não há, contudo, confusão entre as duas atividades e uma não vincula à outra.

Resumo: A monografia trata da competência dos órgãos ambientais para fiscalizar a partir da publicação da Lei Complementar nº 140/2011. Pretende-se responder às dúvidas sobre a competência comum para fiscalizar a partir da regulamentação da novel legislação, focando na atribuição para fiscalização dos órgãos ambientais. A revisão da doutrina e da jurisprudência demonstra que há diversidade de entendimento, mas é adequada a defesa da manutenção da competência comum. A Lei Complementar nº 140/2011 cumpriu o mandamento constitucional do artigo 23 e regulamentou a competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para proteção do meio ambiente. A regulação trazida pela nova lei afetou de modo especial a atribuição de licenciamento ambiental e de fiscalização dos órgãos ambientais, não impondo, contudo, limitação da competência comum para a proteção do meio ambiente.

Palavras-chave: Lei Complementar nº 140, de 2011; competência; fiscalização; meio ambiente; licenciamento.

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO.1. LEITURA INTEGRADA.1.1 INTERPRETAÇÃO DA NORMA.2. COMPETÊNCIA COMUM.3. SISTEMA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL COMUM.3.1 FISCALIZAÇÃO REALIZADA PELO ENTE LICENCIADOR.3.2. INEXISTÊNCIA DA PREVALÊNCIA DO ENTE LICENCIADOR.3.3 FISCALIZAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS LICENCIADOS OU LICENCIÁVEIS. 4. MEDIDAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL EM FLAGRANTE DE DANO.CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.


INTRODUÇÃO

O advento da Lei Complementar nº 140 de 08 de dezembro de 2011 – LC 140/11 (BRASIL) trouxe dúvidas sobre a atribuição para o licenciamento das atividades potencialmente poluidoras e, em especial, sobre a competência comum para fiscalização ambiental. Há grande receio de fragilização da defesa do meio ambiente, com eventual redução da competência comum para fiscalização.

A preocupação maior na fragilização da defesa do meio ambiente resta em suposta redução das competências dos órgãos para fiscalizar, restringindo-se a fiscalização apenas aos órgãos ambientais com atribuição de licenciar.

Portanto, é fundamental estudar esta matéria para poder responder perguntas elementares: a fiscalização ambiental é própria da competência comum e não sofre qualquer limitação? Somente o órgão licenciador pode fiscalizar as atividades licenciadas ou licenciáveis? Há prevalência do órgão licenciador sobre os demais órgãos de proteção ambiental?

E ainda, há contradição do texto da lei quando afirma no art. 17 da LC 140/11 (BRASIL) que a fiscalização é executada pelo órgão licenciador e no § 3º do mesmo artigo informa que não há impedimento do exercício pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização? A solução para esta possível contradição pode ser de três formas: a primeira seria no sentido de que somente pode fiscalizar as atividades licenciáveis ou autorizáveis quem tem atribuição para o licenciamento; a segunda possibilidade seria admitir a fiscalização por todos os entes da federação, mas com preponderância da atividade de licenciamento; por fim, a terceira opção seria a manutenção da competência comum para fiscalizar independente da atividade de licenciamento.

O estudo buscou responder a estas questões e apresentar a solução para esta contradição dentro da melhor interpretação constitucional possível. Ou seja, busca ver até que ponto a lei complementar cumpriu com a função de regulamentar a competência comum para a proteção do meio ambiente, fixando normas para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, com o objetivo do equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional. E ainda, verificar se a regulamentação teria extrapolado o mandado constitucional e importado em alguma inconstitucionalidade ou ofensa a princípio ambiental.

Como se verá no estudo, a matéria é recente e, além das divergências de entendimento, ainda suscita dúvidas entre os doutrinadores.

A jurisprudência construída antes da publicação da LC 140/11 (BRASIL) distinguia a atribuição para fiscalização da atribuição para o licenciamento. O estudo também buscou observar quais são as possibilidades de manutenção deste entendimento ou se há necessidade de alguma inovação neste campo.

Por fim, além de se ter buscado a resposta fundamental se a competência comum foi respeitada na LC 140/11 (BRASIL) e em que parâmetros, o trabalho procurou apresentar a forma como a nova legislação organizou o sistema de proteção do meio ambiente. Pretende-se descrever como se dá o exercício do almejado federalismo cooperativo nos termos da lei complementar.

Ainda, para facilitar o entendimento de artigos da nova lei que possam gerar dúvidas, foram analisadas algumas questões práticas que comumente se encontram nas atividades de licenciamento e de fiscalização.

Para esta tarefa, iniciou-se com o estudo da forma de interpretação da LC 140/11 (BRASIL) e do texto constitucional. Após, procurou-se aprofundar o método de interpretação do texto legal, seguindo a lição de Ronald Dworkin, baseado em leitura da norma com os princípios ambientais e constitucionais, para a tentativa de esclarecer o alcance da instituição constitucional da competência comum.

Estas são as observações que podem ajudar o leitor a entender o caminho percorrido no presente trabalho.


1. LEITURA INTEGRADA

Como diz Dworkin (2010, p. 222), a integridade é nosso Netuno. Antes que os astrônomos pudessem comprovar, já informavam da existência do planeta, porquanto os fenômenos os orientavam neste sentido. A integridade, o respeito aos princípios, é o ideal político na elaboração da norma e na sua interpretação. Os fenômenos indicam que somente pode haver uma explicação adequada quando o direito é visto no todo, partindo dos princípios.

Nada mais adequado para a leitura do direito ambiental do que a leitura a partir dos princípios. Em uma linguagem mais ambientalista, pode-se dizer que é a visão holística da lei e da realidade. Esta é a revolução que o direito ambiental traz para a ciência do direito, uma disciplina que está calcada fundamentalmente em princípios, que busca o objetivo moral final do bem comum. A revolução que o direito ambiental traz para a ciência do direito é de tal ordem e de velocidade tão espantosa que se pode dizer que quem não conhecer as premissas do direito ambiental não será mais capaz de entender a própria ciência do direito.

Primeiro, adota-se uma compreensão sistêmica (=orgânica ou holística) e legalmente autônoma do meio ambiente, determinando um tratamento jurídico das partes a partir do todo, precisamente o contrário do paradigma anterior. Com apoio nas palavras de Pontes de Miranda, empregadas em outro contexto, é possível afirmar que nesses dispositivos constitucionais ‘não se veio do múltiplo para a unidade. Vai-se da unidade para o múltiplo’. (BENJAMIN, 2012, p. 92).

Por estas razões, a feitura e a interpretação da norma não pode se dar de forma isolada. Somente há sentido nas normas se estas buscarem os objetivos mais profundos da comunidade política, o bem comum.

Portanto, a leitura que se deve fazer da LC 140/11 (BRASIL) é uma leitura integrada, holística, respeitando os princípios, como bem esclarece Dworkin (2010, p. 230) na teoria da integridade:

A integridade, pelo contrário, insiste em que cada cidadão deve aceitar as exigências que lhe são feitas e pode fazer exigências aos outros, que compartilham e ampliam a dimensão moral de quaisquer decisões políticas explícitas. A integridade, portanto, promove a união entre a vida moral e política dos cidadãos: pede ao bom cidadão, ao decidir como tratar seu vizinho quando os interesses de ambos entra em conflito, que interprete a organização comum da justiça à qual estão comprometidos em virtude da cidadania.

É interessante observar que a leitura a partir dos princípios é fundamental em direito ambiental. A moral ambiental nasce da crise de um sistema ganancioso, da vantagem a qualquer custo, tanto nas economias capitalistas como nas chamadas economias planificadas. Ainda que não se tenha apontado, a revolução do direito ambiental transforma não só economia, mas muda para sempre a sociedade e a forma como se conhece e se entende o direito.

Nesse complexo quadro de aspirações individuais e sociais, ganham relevo categorias novas de expectativas (e a partir daí, de direitos), cujos contornos estão em divergência com a fórmula clássica do eu-contra-Estado, ou até da sua versão welfarista mais moderna, dos nós-contra-o-Estado. Seguindo tal linha de análise, a ecologização do texto constitucional traz certo sabor herético, deslocando as fórmulas antecedentes, ao propor a receita solidarista – temporal e materialmente ampliada (e, por isso mesmo, prisioneira de traços utópicos) – do nós-todos-em-favor-do-planeta.

(...)

Só em meados da década de 70 – por uma conjugação de fatores, que não interessa aqui esmiuçar – os sistemas constitucionais começaram, efetivamente, a reconhecer o ambiente como valor merecedor da tutela maior; esse, sem dúvida, um daqueles raros momentos, que ocorrem de tempos em tempos, em que o senso de civilização é redefinido, para usar a expressão feliz do geógrafo Carl O. Sauer. Há, em tal constatação, um aspecto que impressiona, pois na história do direito poucos valores ou bens tiveram uma trajetória tão espetacular, passando, em poucos anos, de uma espécie de nada jurídico ao ápice da hierarquia normativa, metendo-se com destaque nos pactos políticos nacionais. (BENJAMIN, 2012, p. 84-85; 86-87).

Esta mudança de paradigma é bem entendida pela teoria da integridade, sempre aberta à mudança orgânica. “Uma comunidade que aceite a integridade tem um veículo para a transformação orgânica, mesmo que este nem sempre seja totalmente eficaz, que de outra forma sem dúvida não teria.” (DWORIN, 2010, p. 229).

A nova perspectiva ambientalista exige que o direito ambiental, e o direito todo, sejam vistos de forma ampla, integral, o que também já era exigido pela teoria da integridade.

Os membros de uma sociedade de princípio admitem que seus direitos e deveres políticos não se esgotam nas decisões particulares tomadas por suas instituições políticas, mas dependem, em termos mais gerias, do sistema de princípios que essas decisões pressupõem e endossam. Assim, cada membro aceita que os outros têm direitos, e que ele tem deveres que decorrem desse sistema, ainda que estes nunca tenham sido formalmente identificados ou declarados. (DWORKIN, 2010, p. 254-255)

Este novo olhar do direito foi possível porquanto a crise ambiental exigiu que houvesse um olhar para o todo, para o mais profundo de nosso sistema econômico, político e jurídico. Esta é a exigência de uma sociedade que ultrapassa os termos mecânicos de uma sociedade positivista baseada apenas em regras.

A integridade exige que as normas públicas de comunidade sejam criadas e vistas, na medida do possível, de modo a expressar um sistema único e coerente de justiça e equidade na correta proporção. Uma instituição que aceite esse ideal às vezes irá, por esta razão, afastar-se da estreita linha das decisões anteriores, em busca da fidelidade aos princípios concebidos como mais fundamentais a esse sistema como um todo. (DWORKIN, 2010, p. 264).

E o fundamental está estampado no art. 225 de nossa Constituição[1], o compromisso com a possibilidade de uma vida digna em comunhão com a natureza.

Figueiredo (2013, p. 31-32) bem descreve esta efervescência cultural que abriu as portas da nova era:

Foi nesse período de efervescência cultural e política que passamos a sentir a necessidade de regulamentação não só do meio ambiente, mas também das relações de consumo, das minorias raciais, das pessoas com deficiência, das mulheres, da comunicação, do desenvolvimento.

Uma nova onda de direitos formava-se num cenário histórico bastante peculiar: os direitos do consumidor constituíram uma importante plataforma política de John Kennedy, então presidente dos EUA; a construção de direitos das pessoas com deficiência teve como pano de fundo as reivindicações dos veteranos da Guerra do Vietnã e de seus familiares; a campanha pela igualdade de gênero foi consequência da emancipação sexual das mulheres; a emancipação dos afro-americanos estava diretamente relacionada com o grande número deles nas fileiras do exército estadunidense e com chocantes atentados racistas; e na nova consciência sobre a qualidade ambiental advinda de uma conjugação de diversos fatos, como as mortes e doenças decorrentes da poluição atmosférica em Londres, os sombrios efeitos da radioatividade nas regiões atingidas pela bomba atômica, o extermínio de aves e animais silvestres em consequência da pulverização de DDT na lavoura.

Ler direito ambiental, portanto, não pode ser tarefa conduzida com os velhos instrumentos da ciência do direito. Há necessidade de profundo entendimento do chamado microssistema de direitos difusos. Nesta perspectiva, o coletivo ganha novo relevo. Não se busca a solução de amplos conflitos, ou de conflitos que afetam a coletividade com a visão privatista dos antigos preceitos jurídicos. Essa nova forma de ver o direito expande-se para toda a ciência do direito e começa a perpassar outros ramos do direito, como, por exemplo, o direito de propriedade, que agora precisa cumprir também sua função social.

Assim, as normas de cooperação ou de colaboração entre os entes federativos devem ter ‘em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional’. Desenvolvimento e bem-estar precisam estar contrabalançados, isto é, nem mais para um, nem mais para o outro. Os dois devem ter realmente peso na vida do País, pois são objetivos fundamentais da República ‘garantir o desenvolvimento nacional’ e ‘promover o bem de todos’ (art. 3º, II e IV da Constituição).

O intérprete do parágrafo único necessita ampliar sua análise do texto para sair da letra e buscar seu espírito (mens legis). Textualmente nem todos os incisos do art. 23 da CF devem obrigatoriamente ser objeto de leis complementares. O parágrafo único mencionado está centrado nos seres humanos, isto é, no equilíbrio entre desenvolvimento e o bem-estar em âmbito nacional que deve ser visado através da cooperação nas matérias dos incisos VIII, IX e X do art. 23 da Constituição. (MACHADO, 2013, p. 181-182).

Portanto, a lei não pode ser lida fora do arcabouço jurídico existente e deve estar calcada nos princípios constitucionais. Somente uma interpretação que respeite os princípios constitucionais pode ser aceita como adequada. A norma não tem sentido fora do sistema jurídico e sua interpretação correta somente se pode dar a partir dos princípios, como se apreende dos ensinamentos de Dworkin. (AZEVEDO, 2013, p. 22).

O direito não pode ser visto por partes, não se pode ler cada lei, cada norma, de forma isolada. A leitura somente faz sentido adequado em uma leitura integrada da norma. O direito precisa ser visto em sua integridade, e a integridade da leitura da lei parte dos princípios mais fundamentais do sistema jurídico, e muitos destes princípios elementares também estão previstos em nossa Constituição.

Cuidando-se da leitura de lei que trata da seara ambiental é ainda mais importante uma leitura principiológica da lei. O direito ambiental trata do direito fundamental de proteção da vida e possui princípios que perpassam os fundamentos do direito e possuem aplicação universal.

Em países conhecidos por prestarem obediência à norma ordinária e ignorarem ou desprezarem a norma constitucional (como o Brasil), mais relevante ainda é essa busca dos fundamentos remotos do Direito Ambiental, pouco importando que ele, na superfície, transmita uma falsa aparência de consistência e consolidação. Evidentemente, a diligência e a configuração teóricas devem começar e terminar pela norma constitucional, pois não é papel da Constituição confirmar, em juízo posterior, o Direito Ambiental aplicado (e, infelizmente, amiúde mal-aplicado), mas determinar, de forma preambular, seus rumos e até existência. (BENJAMIN, 2012, p. 91).

Além dos princípios ambientais fundamentais, a lei toca também em princípios basilares da formação do Estado na divisão de competências, porquanto a lei complementar veio cumprir o mandamento do parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal de 1988 – CF/88 (BRASIL), que determinava a expedição de normas para a cooperação.

Assim, não é correta uma leitura fragmentada da lei. Qualquer leitura solta acabará por levar o leitor a interpretações equivocadas. Leitura isolada pode muito bem estar a serviço do desenvolvimento a qualquer custo, mantendo o velho paradigma que desconsidera a relevância dos novos direitos, da proteção à vida como fundamento de nossa sociedade. A leitura da lei não é neutra. O objetivo do intérprete, sua ideologia, tem forte importância no produto de sua leitura.

(...) há muitas décadas, a jurisprudência norte-americana vem enfatizando: o fato de que a convicção política desempenha papel na decisão judicial, e que, em qualquer época, a forma do direito reflete ideologia, poder e aquilo que é erroneamente chamado de “lógica”. (DWORKIN, 2010, p. 323).

Pode-se observar que o art. 225 da CF/88 (BRASIL) traz o princípio fundamental da defesa do meio ambiente. Ayala (2012, p. 418) defende a existência de um princípio do direito humano ao meio ambiente saudável. Guilherme Purvin de Figueiredo (2013, p. 138) diz que não se trata de princípio, visto que as normas estão definidas em tratados internacionais reconhecidos pelo Brasil e têm para nós força de norma constitucional, por isso, de aplicação imediata:

Estas evidências, contudo, não são suficientes para que possamos concluir que exista um “princípio do direito humano fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”. Levam-nos, na verdade, muito além: possibilitam a utilização de todos os mecanismos internacionais e internos de tutela dos Direitos Humanos (com todos os princípios que lhes são inerentes) em defesa do meio ambiente.

De qualquer forma, não se pode negar a força do direito humano ao meio ambiente saudável, que é direito/dever a ser defendido por todos. A obrigação de proteção é dever de todos os entes federativos, previsto no art. 23 da CF/88 (BRASIL). O art. 225 da CF/88 (BRASIL) prescreve que não apenas o Estado seja encarregado da defesa do meio ambiente, mas toda a sociedade. Enfim, além da possibilidade der ser considerado um direito humano fundamental, a sua defesa é obrigação de todos, o que resulta na previsão da máxima proteção para esta e para as futuras gerações.

Esta é a interpretação adequada segundo os princípios constitucionais da defesa do meio ambiente. É a interpretação da norma na sua integridade, como explica Azevedo (2013, p. 22) a respeito dos ensinamentos de Dworkin:

O direito seria uma interpretação contínua e em permanente desenvolvimento, tal qual um romance em construção. O processo de interpretação consiste em recuperar o trajeto desse romance e produzir a melhor interpretação possível com os dados e informações de que se dispõe. Essa interpretação será tanto melhor quanto maior for sua capacidade de expressar o significado do direito em sua integridade e não apenas o significado de certas normas, pois o significado destas deve ser coerente com os princípios revelados pela leitura de todo o ordenamento.

Há, portanto, como diz Dworkin, uma resposta correta para as questões difíceis. Não pode o leitor ou o juiz interpretar da forma que melhor lhe aprouver. Este é o erro que frequentemente se comete ao ler as normas ambientais. Como direito extremamente novo, ainda há dificuldades no trato de todos os novos princípios que emergem deste campo. No Brasil, que possui uma das mais profundas e avançadas constituições em matéria ambiental, será necessário ainda um longo tempo para apreender tudo o que se deve extrair de proteção ambiental do texto constitucional.

Estas dificuldades podem explicar os possíveis desvios cometidos na leitura da LC 140/11 (BRASIL). A norma deve ser lida tendo como base a Constituição, carregada de princípios e fundamentos ambientais específicos. Elemento primordial a orientar a leitura da norma é justamente a previsão da competência comum. Qualquer leitura que não preserve esta função específica da norma estará fugindo do objetivo imposto pelo parágrafo único do art. 23 da CF/88 (BRASIL).

Estes são os cuidados que devem ser tomados na interpretação das normas ambientais. São inúmeros interesses contraditórios em jogo e cabe ao juiz buscar os princípios jurídicos que informam a chave de leitura. Na lição de Dworkin, não se deve buscar a resposta que atenda a interesses políticos, deve-se buscar o fundamento jurídico correto. No caso, a lição mais fundamental é a defesa do meio ambiente sendo exercida por todos, sem imposição de limites, muito menos limites infraconstitucionais e que, por contrários à carta maior, seriam também inconstitucionais. “Contudo, insisto que, mesmo nos casos difíceis, é razoável dizer que o processo tem por finalidade descobrir, e não inventar, os direitos das partes interessadas que a justificação política do processo depende da validade dessa caracterização.” (DWORKIN, 2011, p. 430).

A busca da leitura integrada da norma calca-se na procura do fundamento do direito. Afirma Dworkin que o juiz não está descobrindo ou inventando o direito, ainda que possa fazer as duas coisas juntas. As afirmações jurídicas são opiniões de interpretação, que olham para o passado, para os princípios do direito, e interpretam a prática jurídica em contínuo processo de desenvolvimento.

O princípio judiciário de integridade instrui os juízes a identificar direitos e deveres legais, até onde for possível, a partir do pressuposto de que foram todos criados por um único autor – a comunidade personificada -, expressando uma concepção corrente de justiça e equidade. (...) As proposições jurídicas são verdadeiras se constam, ou se derivam, dos princípios de justiça, equidade e devido processo legal que oferecem a melhor interpretação construtiva da prática jurídica da comunidade. (DWORKIN, 2010, p. 271-272).

A busca da leitura integrada, holística, da LC 140/11 (BRASIL) deve procurar trazer estes pressupostos criados pela comunidade, que arduamente construiu os princípios de defesa do meio ambiente como direito fundamental, de extrema importância para todos.

1. 1. INTERPRETAÇÃO DA NORMA

Interpretar não é um ato neutro. A interpretação, portanto, deve ser feita com cuidado, sabendo-se que há enorme responsabilidade no ato de interpretar. Não se pode interpretar de forma descompromissada. A leitura deve sempre levar em conta qual o objetivo do escritor, que não é neutro.

A interpretação repercute na prática, alterando sua forma, e a nova forma incentiva uma nova interpretação. Assim, a prática passa por uma dramática transformação, embora cada etapa do processo seja uma interpretação do que foi conquistado pela etapa imediatamente anterior. (DWORKIN, 2010, p. 59).

Esta reinterpretação é extremamente presente na prática jurídica. Por esta razão a aplicação do direito deve ser muito cautelosa, buscando sempre a interpretação correta. A interpretação não terá efeitos apenas para o caso em que está sendo aplicada, mas será também matéria prima para a construção coletiva do direito, terá efeitos no presente e no futuro. “Um juiz que decide o caso Mcloughlin ou Brown introduz acréscimos na tradição que interpreta; os futuros juízes deparam com uma nova tradição que inclui o que foi feito por aquele.” (DWORKIN, 2010, p. 275)

Para entender a responsabilidade do juiz, do intérprete, Dworkin sugere que se imagine a criação de um romance em cadeia, em que cada juiz (intérprete) recebe os capítulos anteriores e deve interpretar da melhor forma possível para escrever a sua parte.

Cada um deve escrever seu capitulo de modo a criar da melhor forma possível o romance em elaboração, e a complexidade dessa tarefa reproduz a complexidade de decidir um caso difícil de direito como integridade. (...) Em nosso, exemplo, contudo, espera-se que os romancistas levem mais a sério suas responsabilidades de continuidade; devem criar um conjunto, até onde for possível, um só romance unificado que seja da melhor qualidade possível. (DWORKIN, 2010, p. 276).

A norma positivada sozinha não tem efeito prático, a sua aplicação se dá com a interpretação. Deve-se, portanto, interpretar para buscar a aplicação dos princípios do direito e, no caso, aplicação do objetivo fundamental de nossa Carta que é o ambiente ecologicamente equilibrado.

Observados os pressupostos para leitura das normas em direito, deve-se verificar qual a forma correta de interpretação. Busca-se interpretar norma complementar à Constituição, portanto sua compreensão somente se pode dar a partir da própria Constituição. Pode parecer curial, mas é importante repetir, a norma infraconstitucional é que deve ser lida a partir da Constituição, e não o contrário. Interpretar a Constituição a partir das normas infraconstitucionais não é valido. O texto da Carta Maior somente deve ser interpretado pelos seus próprios dispositivos e pelos pressupostos mais profundos dos princípios jurídicos.

Importa dizer que a lei complementar sujeita-se à Constituição e que para ser aprovada requer maioria absoluta (art. 69 da CF). Não se há de servir das leis complementares para ‘interpretar a Constituição ou qualquer de suas normas’, sendo ‘leis integrativas de normas constitucionais de eficácia limitada’, na lição de José Afonso da Silva. (MACHADO, 2013, p. 182).

Repete-se apenas para que não paire dúvida. Não se deve cair na tentação de interpretar a Constituição conforme as leis complementares. O princípio básico da competência comum é o exercício conjunto do poder, previsto na Carta. Não se pode assim, em norma de hierarquia inferior querer limitar este poder. O que não foi limitado na Constituição não pode ser limitado pelo legislador infraconstitucional. A atribuição restante é acessória, o parâmetro está na Carta, somente pode dizer como as unidades da Federação podem expressar seu poder de forma comum, mas sem criar limitação que não foi prevista no texto constitucional.

Não se pode fugir à interpretação hierárquica da lei. O entendimento da lei complementar não pode ultrapassar os limites do texto constitucional, pois é norma meramente integrativa, para dar completude ao texto e não deve informar instrumento novo, em especial fundamento que não esteja adstrito aos ditames constitucionais fundados no respeito ao meio ambiente.

Ao tratar das leis complementares, diz o professor José Afonso da Silva que ‘sendo inferiores a Constituição, sua validade afere-se segundo o princípio da compatibilidade vertical. Por isso, estão sujeitas ao controle de constitucionalidade, como outra lei qualquer. Sua função é de mera complementariedade, disso não pode transbordar’.

A edição dessa parte da Lei Complementar 140/2011 não pode perder o rumo da manutenção de um Estado Democrático de Direito, em que a preservação ambiental harmoniosamente leve em conta as liberdades públicas civis e socais. (MACHADO, 2013, p. 191).

Esta é também a lição de Benjamin, que informa que qualquer interpretação que não seja conforme a Constituição não é valida. Há, portanto, uma firme diretriz para a leitura da lei complementar, e qualquer afastamento deste marco sinaliza erro no trabalho interpretativo da norma.

A preeminência normativa da norma constitucional ocasiona, na palavra de Canotilho e Moreira, três consequências jurídicas imediatas. Inicialmente, a interpretação das normas constitucionais deve ser feita da forma mais concordante com a Constituição – é o princípio da interpretação conforme a Constituição; além disso, tais normas, se desconformes com a Constituição, serão inválidas, não podendo ser aplicadas pelos tribunais. (BENJAMIN, 2012, p. 103).

Retornando à lição da leitura integrada, não podemos desistir de encontrar a melhor interpretação, a interpretação correta que mantém a defesa do meio ambiente, como previsto nos artigos 23 e 225 da CF/88 (BRASIL) e no fundamento último do direito que é a defesa da vida.

Dworkin (2010, p. 107) faz uma grande exposição para concluir que é possível ter uma interpretação correta, ainda que os céticos não queiram acreditar:

Subi e desci a colina somente porque a impugnação cética, percebida como impugnação do ceticismo exterior, exerce poderosa influência sobre advogados. A propósito de qualquer tese sobre a melhor maneira de avaliar uma situação jurídica em algum domínio do direito, eles dizem: ‘Essa é a sua opinião’, o que é ao mesmo tempo verdadeiro e inútil. Ou perguntam: ‘Como você sabe?’, ou ‘De onde provém essa pretensão?’, exigindo não um caso que possam aceitar ou rejeitar, mas uma demonstração metafísica avassaladora à qual não possa resistir ninguém que a consiga compreender. E, quando percebem que não estão diante de nenhum argumento dotado de tal força, resmungam que a doutrina é tão-somente subjetiva.

Por isso, este trabalho busca fazer a descoberta da forma correta de ler a LC 140/11 (BRASIL). A interpretação adequada que parte dos princípios do direito, dos princípios constitucionais, e em especial da perspectiva comprometida com a defesa do meio ambiente.

O exercício em questão é de descoberta, pelo menos neste sentido: descobrir qual ponto de vista das questões importantes que discutimos se ajusta melhor às convicções que, juntos ou individualmente, temos e conservamos a propósito da melhor avaliação de nossas práticas comuns. (DWORKIN, 2010, p. 108).

A interpretação como integridade busca coerência com os princípios. Não é uma coerência estanque, que mantenha congelado o direito, que obrigue a repetir hoje o que se entendeu correto no passado, mas uma coerência com os fundamentos próprios do direito.

Não exige que os juízes tentem entender o direito de um século antes, já em desuso, ou mesmo de uma geração anterior. Exige uma coerência de princípio mais horizontal do que vertical ao longo de toda a gama de normas jurídicas que a comunidade agora faz vigorar. Insiste em que o direito – os direitos e deveres que decorrem de decisões coletivas tomadas no passado e que, por esse motivo, permitem ou exigem a coerção – contém não apenas o limitado conteúdo explícito dessas decisões, mas também, num sentido mais vasto, o sistema de princípios necessários a sua justificativa. (DWORKIN, 2010, p. 273).

Dworkin (2010, p. 277), por fim, propõe como prova da correção da interpretação dois elementos: o primeiro é que a interpretação apresentada pode ter sido escrita por outro juiz, ou seja, deve estar em linha com o pensamento jurídico da comunidade. E também que a interpretação deve dar uma explicação completa para a questão, sem deixar um elemento importante sem resposta.

Enfim, a interpretação que não explique de forma adequada a aplicação e manutenção da competência comum na LC 140/11 (BRASIL), em especial que não esclarece qual o sentido do § 3º do art. 17 da referida lei, não é aceitável. Sem explicar este elemento essencial da LC 140/11 (BRASIL) não se atende ao segundo princípio da interpretação com integridade.

Ele prossegue dizendo que o juiz não pode se deixar vencer quando achar que mais de uma interpretação pudesse se ajustar ao contexto. “A segunda dimensão da interpretação vai exigir-lhe então que julgue qual dessas leituras possíveis se ajusta melhor à obra em desenvolvimento, depois de considerados todos os aspectos da questão”. (DWORKIN, 2010, p. 278).

Assim, ainda que houvesse mais de uma explicação plausível para a LC 140/11 (BRASIL), qual delas se ajusta melhor à obra geral de proteção do meio ambiente? Sim, esta pergunta é fundamental. É, aliás, o tema central a ser respondido em função do disposto no art. 23 da CF/88 (BRASIL). O objetivo geral da lei é a proteção do meio ambiente, feita de forma conjunta. Uma interpretação que fragilize esta atividade não se ajusta ao conjunto da obra, está em caminho oposto. Uma interpretação que restrinja o poder de fiscalização do meio ambiente não é constitucional, porquanto não atende aos pressupostos básicos dos artigos 23 e 225 da CF/88 (BRASIL). Uma interpretação que não busque a defesa do meio ambiente não pode ser aceita, visto que não trilha no caminho que a comunidade brasileira está construindo, de proteção crescente do meio ambiente.

Agora se pretende partir para essa interpretação, aquela voltada para a defesa da competência comum, da proteção do meio ambiente. Qualquer outra interpretação que se apresente contrária aos princípios do direito ambiental e contrária aos princípios constitucionais será rejeitada, pois não seria válida, não se ajustaria à melhor avaliação de nossas práticas comuns.


2. COMPETÊNCIA COMUM

Visto como deve ser feita a leitura da norma, pode-se passar agora para a interpretação da competência comum na Constituição brasileira. Dispõe o artigo 23 do texto:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...)

III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; (...)

VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;

VII - preservar as florestas, a fauna e a flora; (...)

Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006).

Ler e interpretar não são tarefas descompromissadas ou simples, por isso é importante que se busque extrair do texto o seu significado mais preciso.

Nos manuais de direito (SILVA, 1993, p. 419), logo se descreve que a competência comum se caracteriza pelo seu exercício comum, de forma cumulativa, pela União, Estados, Municípios e o Distrito Federal. Não há subordinação ou proeminência de um ente sobre o outro. A competência comum é cumulativa, ou seja, mais de um ente pode exercer a mesma atividade.

Antonio Henrique Lindember Baltazar (2012, p. 2108) assim descreve a competência comum:

A competência comum, cumulativa ou paralela é modelo típico de repartição de competências do moderno federalismo cooperativo, nela distribuem-se competências administrativas a todos os entes federativos para que a exerçam sem preponderância de um ente sobre o outro, ou seja, sem hierarquia.

Em nosso ordenamento jurídico-constitucional sua delimitação foi estabelecida no art. 23 da Constituição Federal, onde se apresentam as atividades administrativas que podem ser exercidas de modo paralelo entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, onde todos os entes federativos atuam em igualdade, sem nenhuma prioridade de um sobre o outro.

Deste modo, a atuação de um ente federativo não depende da atuação de outro, e, da mesma forma, a atuação de um ente federativo não afasta a possibilidade de atuação de outro. A competência comum, ou paralela, se expressa na possibilidade da pratica de atos administrativos pelas entidades federativas, onde esta pratica pode ser realizada por quaisquer delas, em perfeita igualdade, de forma cumulativa (CF, art. 23).

Portanto, com o objetivo de fomentar o cooperativismo estatal, dispôs o Legislador Constituinte que, no âmbito da competência comum, lei complementar deverá fixar normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional (CF, art. 23, parágrafo único).

Importante é assinalar que a competência comum não se refere a atividades legislativas, sob pena de os entes da federação legislarem diferentemente sobre o mesmo assunto, com a possibilidade de imperar o caos social.

Andreas Joachim Krell (2003, p.70), por sua vez, entende que a competência comum deve ser interpretada sistematicamente: “A proteção do meio ambiente prevista como competência comum a todos os entes federados há de ser interpretada sistematicamente, à luz do que dispõe o art. 225, para que o interesse primordial seja sempre a proteção do meio ambiente.”

Edis Milaré (2009. p. 881) também se manifesta no mesmo sentido:

A competência para fiscalizar está igualmente prevista no art. 23 da Constituição de 1988 e se insere, portanto, dentro da competência comum de todos os entes federados. A interpretação do referido artigo, no tocante à fiscalização ambiental, deve ser feita de forma ampliativa, no sentido de que a atividade seja exercida cumulativamente por todos os entes federativos.

A descentralização administrativa vertical diz respeito à divisão de competências dentro de um Estado. É a divisão de poder dentro do território, com a divisão política, estabelecendo diferentes entes políticos que partilham as competências com o Poder Central.

Trata-se de divisão vertical, pois a descentralização não ocorre no mesmo nível. Distinta da descentralização que ocorre quando um ente público cria entidades como autarquias para a execução de atividades próprias, de forma horizontal. Neste caso, a descentralização ocorre no mesmo nível de poder, sendo que apenas se descentraliza as funções.

Na federação não se admite tratamento diferenciado entre os diversos Estados. Diferentemente do que ocorre em estados regionais, como a Espanha, que tem forma especial de descentralização vertical, instituindo regiões autônomas.

O federalismo pode ser centrípeto ou centrífugo. No primeiro há maior centralização de poder na União, no segundo há mais autonomia aos Estados Membros. Contemporaneamente busca-se o federalismo de cooperação que consiste em equilibrar a distribuição de competências, sem que haja concentração ou descentralização excessiva. (MARTINS, 2013, p. 16).

O modelo de federalismo de cooperação é o pretendido pela Constituição de 1988. Para tanto previu no artigo 18 da CF/88 (BRASIL) a autonomia de todos os entes políticos e colocou no art. 60, § 4º a federação como cláusula pétrea[2].

Martins (2013, p. 17) descreve dois modelos clássicos de divisão da competência. O modelo clássico Americano, que dispõe o rol de competências para a União e a competência residual para os Estados e o modelo do pós-guerra, constitucionalismo social, que prevê a repartição de competências.

A Constituição de 1988 contempla ambos os modelos de repartição de competências, daí o seu caráter complexo, apontado por José Afonso da Silva, acima citado. A partir de agora, consideraremos o modelo de repartição de competências em nossa atual Constituição, focando a análise no âmbito das competências em matéria político administrativa. De acordo com o modelo clássico de repartição de competências, a Constituição de 1988 estipula competências enumeradas para União (artigos 21 e 22) e Municípios (artigo 30) e atribui aos Estados a competência residual (artigo 25, §1º). De acordo com o modelo moderno de repartição de competências, a Constituição de 1988 estabelece, por um lado, um amplo rol de competências administrativas comuns, ou seja, de execução (artigo 23), entre todos os entes federados e, de outro lado, estipula um grande número de competências legislativas concorrentes entre todos os entes federados, excluídos os Municípios (artigo 24).

Enfim, o que caracteriza a descentralização vertical é a existência de competências exclusivas dos diversos entes. A Constituição previu a divisão de competências política, administrativa e financeira. Com a divisão de competências constitucionais, não há, no federalismo, subordinação entre os entes políticos, devendo exercer o poder e as funções conforme as competências estabelecidas na Carta Magna.

A ausência de subordinação e controle entre os Entes Políticos é a essência do federalismo. Os critérios políticos de divisão de competências são estabelecidos na Constituição para que se exerça o poder da melhor forma, conforme interesse nacional, regional ou local. Trata-se do estabelecimento primário das competências, sem que haja hierarquia entre as unidades.

A atuação conjunta sem que haja hierarquia entre os vários entes pode suscitar inúmeras dificuldades. Ainda que o objetivo constitucional seja a existência de um federalismo de cooperação, a atuação conjunta pode tornar-se conflituosa e gerar um verdadeiro federalismo de competição. Para reduzir este risco o texto constitucional prescreveu a existência de lei complementar para regular a cooperação. Diante do rol amplo de matérias do art. 23 da CF/88 (BRASIL), a Emenda Constitucional 53/2006 permitiu que mais de uma lei complementar regulasse a cooperação entre os entes federados, o que, provavelmente, irá permitir leis complementares especiais para cada matéria, a exemplo da LC 140/11 (BRASIL) que regula a cooperação em matéria ambiental.

Os inúmeros embates que ocorrem no exercício da competência comum para a proteção do meio ambiente são realçados pela divergência entre os doutrinadores na matéria.

Paulo Leme Machado entende que a competência comum deve ser exercida de forma plena e que não pode haver qualquer restrição para o exercício do poder de proteção do meio ambiente. As normas previstas para a cooperação podem apenas regular a atuação conjunta, mas jamais reduzir a competência originária do texto constitucional.

As leis complementares do parágrafo único do art. 23 da CF não têm por finalidade modificar o caput do próprio artigo, isto é, não podem pretender transformar competências privativas, únicas e especializadas. Se fossem esses os objetivos do parágrafo único, seria preciso uma transformação radical no texto do caput do art. 23.

A competência “comum” estabelece uma comunhão na gestão das matérias apresentadas no art. 23. A Constituição não quer que o meio ambiente seja administrado de forma separada pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. É razoável entender-se que a competência comum, os entes federados devam agir conjuntamente.

As matérias que devam ser tratadas separadamente pela União estão tratadas no art. 21 da CF. Os Estados têm competência reservadas pelo art. 25, §1º (...).

O art. 23 não exclui qualquer ente federativo do exercício da competência. A “competência comum” é aglutinadora e inclusiva, somando os intervenientes e não diminuindo ou tornando privativa a participação. A competência comum não é excludente. É de ser ressaltado que a primeira competência comum do art. 23 é a de “zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas”.

Com razão, afirma o professor José Afonso da Silva que “competência comum significa que a prestação do serviço por uma entidade não exclui igual competência de outra – até porque aqui se está no campo da competência-dever, porque se trata de cumprir a função pública de prestação de serviços à população”. (MACHADO, 2013, p. 182-183).

Em posição diametralmente oposta está a lição de Toshio Mukai. Comentando artigos da LC 140/11 (BRASIL) ele defende que apenas um ente deve licenciar e que este efetivamente não tem obrigação de acatar as manifestações dos demais entes da Federação.

O artigo 13 dispõe norma da maior importância retirando confusões que se fazem com base na competência comum (artigo 23 da Constituição Federal) ao serem exigidas duas ou três licenças ambientais de entes federativos diferentes.

Diz o artigo 13: “Os empreendimentos e atividades são licenciados ou autorizados, ambientalmente, por um único ente federativo, em conformidade com as atribuições estabelecidas nos termos desta Lei Complementar” (na verdade, em conformidade com as competências constitucionais em matéria ambiental).

O § 1º desse artigo 13 reza: “Os demais entes federativos interessados podem manifestar-se ao órgão responsável pela licença ou autorização, de maneira não vinculante, respeitados os prazos e procedimentos do licenciamento ambiental.”

Essa disposição é constitucional, pois que não há a obrigação para o órgão responsável de acatar as referidas manifestações dos outros entes federativos. (MUKAI, 2012, p. 37-38).

Toshio Mukai limita extremamente a competência comum. Procura, em todo momento, identificar as competências privativas e legislativas para delimitar as competências de licenciamento ambiental. Parece não identificar o licenciamento como parte da competência comum para a proteção do meio ambiente prevista no art. 23 da CF/88 (BRASIL).

Essa norma é bem vista, pois esclarece um ponto que os órgãos ambientais não respeitam: impõe multas altíssimas em relação a empreendimentos ou atividades que foram licenciadas pela competência constitucional de outros órgãos ou entes federativos. Só quem tem competência para licenciar pode aplicar sanções. (...)

Aduz-se também que esta Lei Complementar no que diz respeito às competências ambientais, em especial é apenas interpretativa, eis que não é ela que estabelece as competências dos entes federativos, mas sim a própria Constituição. (MUKAI, 2012, p. 35-36 e 41-42).

Na verdade, o que se observa é que Mukai atrela a competência comum para proteção do meio ambiente à competência legislativa. Parece misturar a competência material com a competência legislativa.

Como já escrevemos, o poder de polícia é o fundamento jurídico para a atuação legislativa e administrativa do Estado na proteção e preservação do meio ambiente. (MUKAI, 2012, p. 18)

(...)

O que cabe enfatizar, neste ponto, é que evidentemente, para atuar administrativamente em relação às atividades previstas no art. 21, pelo princípio da legalidade, fundamental em Direito Público, a União terá de antes legislar sobre esses assuntos. A nosso ver, a separação entre atuação administrativa (art. 21) e atuação legislativa (art. 22) não tem nenhum sentido. (MUKAI, 2012, p. 17).

Mukai reduz de tal forma a competência comum que acaba por ver esta inovação da Constituição Federal apenas como possibilidade de atuações conveniadas dos vários entes federativos. Seria como uma permissão constitucional para estabelecimento de convênios e parcerias para permitir instrumentos administrativos de atuação conjunta. “Esse tipo de competência, portanto, destina-se a servir de instrumental jurídico para a concretização efetiva do denominado federalismo cooperativo entre nós.” (MUKAI, 2012, p. 17).

Ora, não parece ser adequada esta redução. Não estaria a Constituição apenas abrindo a possibilidade de acordos administrativos a serem firmados pelos entes federados. A divisão das competências constitucionais diz respeito à fundação própria do Estado. Diz respeito à formação do Estado Nacional. É pedra basilar do Estado, que distribui o poder entre os entes da Federação.

As matérias elencadas no art. 23 da CF/88 (BRASIL) são de tanta relevância que determinou o constituinte que todos os entes da federação ficassem responsáveis pela sua proteção. Observe-se que é um poder dever, começa pela previsão da defesa da própria Constituição. Ora, não faria o mínimo sentido que a defesa da Constituição fosse feita através de convênios ou qualquer outro ato administrativo. O mesmo ocorre com a matéria ambiental e todas as outras previstas no art. 23 CF/88 (BRASL). O legislador não quer a inoperância. A previsão é para atuação de todos justamente para que em hipótese alguma seja descuidado o assunto. Todos devem agir. Agir significa empregar os meios administrativos disponíveis, em todas as ações devem ser protegidas aquelas áreas relevantes. Essas ações devem ser entendidas em sentido amplo, na aplicação de recursos, nas definições de políticas públicas, na operação de todo aparato estatal, enfim, em expressão do poder de Estado.

Os temas apresentados no art. 23 da CF/88 (BRASIL) são os que o constituinte considerou de relevância máxima, que todos os entes da federação devem se empenhar e colocar as suas forças administrativas para a defesa dos interesses apontados. Por este motivo esta competência comum é conhecida como competência material, que não está adstrita às competências legislativas.

Para que fique mais claro, pode-se ver o exemplo de licenciamento municipal. Nesta atividade administrativa material deverão ser obedecidas as normas constitucionais, federais, estaduais e municipais que digam respeito à atividade a ser exercida. Quando for delimitar a área do empreendimento, o órgão licenciador municipal deverá impedir o uso de áreas de proteção permanente estabelecidas na legislação federal. Ou seja, mesmo não sendo o ente legislador da matéria, exerce sua atuação administrativa de proteção ambiental. Não há obrigatoriedade de que apenas quem legisle sobre a matéria seja o competente para a licença.

Prossegue Mukai (2012, p. 21) limitando a competência comum para a proteção do meio ambiente à competência legislativa, citando Hely Lopes Meirelles e defende:

Em princípio, tem competência para policiar a autoridade que dispõe de poder de regular a matéria. Assim sendo, os assuntos de interesse nacional ficam sujeitos a regulamentação e policiamento da União; as matérias de interesse regional sujeitam-se às normas e à polícia estadual, e os assuntos de interesse local subordinam-se aos regulamentos edilícios e ao policiamento administrativo municipal.

De outro lado, o poder de polícia se difunde entre todas as Administrações interessadas, provendo cada qual nos limites de sua competência territorial.

A regra, entretanto, é a exclusividade do policiamento privativo. A exceção é a concorrência.

Caso se queira tratar a proteção comum do meio ambiente como exceção, pode-se dizer que nas matérias do art. 23 da CF/88 (BRASIL) quis o constituinte estabelecer justamente esta exceção. Ou seja, as matérias são tão importantes que todos os entes da federação são incumbidos de protegerem, iniciando com a guarda da Constituição.

Paulo Leme Machado leva o entendimento paro o extremo oposto. Não apenas defende que todos os entes da federação tem competência para a proteção do meio ambiente, como defende que cada ente da federação deve exercer a proteção preventiva, no licenciamento, e repressiva na fiscalização. Entende que é inconstitucional a previsão de um licenciamento único, e que cada ente pode verificar em licenciamento próprio a regularidade dos empreendimentos para permitir o exercício da atividade em seu território.

Na instituição do licenciamento ambiental somente por um ente federativo, foi apontado o interesse em evitar-se a “sobreposição de atuação entre os entes federativos”. No federalismo podem existir interesses públicos de vários aspectos em que a simultaneidade do exame administrativo não leva, necessariamente, a um estado de conflito entre os entes federativos. O exame conjunto, não apenas opinativo, mas vinculante por diversos entes federativos pode propiciar o aporte de um maior e melhor conhecimento sobre o empreendimento a ser licenciado ou autorizado e a utilização de tecnologias não degradadoras do meio ambiente.

(...)

O licenciamento ambiental obrigatório por um único ente federativo, além de contrariar a Constituição da República, representa a supervalorização da rapidez em empreender-se no País, valorizando somente a geração presente, obedecendo ao “capitalismo voraz” e não levando em conta a possibilidade de um “capitalismo equilibrado”. As gerações futuras – protegidas pelo art. 225, caput, da Constituição – podem perder a sua chance de sobrevivência, pois os licenciamentos ambientais únicos poderão ser danosos aos seus legítimos interesses. (MACHADO, 2013, p. 325-326).

Não se pode, portanto, querer limitar a competência comum à competência legislativa ou privativa. As matérias de atuação prevista no art. 23 da CF/88 (BRASIL) devem ser exercidas por todos os entes da Federação.

A disposição do art. 23 da CF/88 (BRASIL) determina a instituição de um federalismo de cooperação. Havendo previsão de atuação conjunta há sempre a possibilidade de divergência e de competição. A possibilidade de divergência e de competição, contudo, não pode ser resolvida com a anulação completa do poder dado aos entes federados pela norma constitucional. A solução não pode estar em negar a competência comum restringindo-se às competências legislativas e exclusivas.

Para solucionar eventuais conflitos de atuação cumulativa, comum, previu o constituinte que a matéria fosse disciplinada por leis complementares. O conflito entre os entes da federação não é desejado, mas a solução é a disciplina dos meios de cooperação e solução do conflito. A resposta para o problema determinada pela Constituição é a regulação da atividade comum e não sua anulação.

Na seara ambiental quis o legislador criar regras de aumento de eficiência, redução de conflito e normas de solução para duplicidades de autuação. Assim, começou por separar as fases da atividade administrativa de proteção do meio ambiente.

O legislador complementar separou a proteção do meio ambiente em duas fases, compondo um mesmo processo. Na primeira fase, preventiva, do licenciamento, relacionou as matérias e incumbiu um único órgão para condução do processo. Observe-se que os demais entes não estão impedidos de análise e de manifestação, mas a condução do processo é feita exclusivamente por um único ente. Na segunda fase, repressiva, da fiscalização, não relacionou matérias e realçou que incumbe a todos o entes a fiscalização comum, no art. 17, § 3º, da LC 140/11 (BRASIL).

Fundamental realçar que é a primeira vez que o legislador ordinário cuida de tratar da competência comum e resolve distribuir as etapas da atividade administrativa sem atingir o poder dos vários entes da Federação. Para se alcançar a melhor aplicação dos recursos públicos e a eficiência na atividade, organizou as etapas de controle ambiental sem retirar, o que seria inconstitucional, o poder final de fiscalização de todas as atividades por todos os entes da federação.

O art. 13 da LC 140/11 (BRASIL) prevê o licenciamento por um único ente: “Os empreendimentos e atividades são licenciados ou autorizados, ambientalmente, por um único ente federativo, em conformidade com as atribuições estabelecidas nos termos desta Lei Complementar.”

Além desta previsão de licenciamento por um único ente, a lei complementar também distribui várias outras atividades de regulação e disciplinas das atividades potencialmente poluidoras, bem como informa os instrumentos jurídicos de cooperação entre os entes federados. Entendido como distribuição das atividades administrativas dos entes federados, para evitar sobreposição de atividades e otimização do uso dos recursos públicos, não fere a competência comum para a proteção do meio ambiente. Isto ocorre porquanto ao distribuir as atividades e manter o poder geral de fiscalização há racionalização dos meios e aprimoramento da defesa do meio ambiente, objetivo do próprio dispositivo constitucional.

Visto, portanto, o alcance da competência comum na CF/88 (BRASIL) pode-se ver agora como a LC 140/11 (BRASIL) organizou a atuação administrativa dos vários entes federativos.


3. SISTEMA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL COMUM

A competência comum para a proteção do meio ambiente prevista no art. 23 da CF/88 (BRASIL) é expressão da autonomia dos vários entes federativos e ocorre em diversos momentos e inúmeros atos administrativos. Trata-se de atividade complexa sujeita a análise multidisciplinar e que pode ser fonte de divergências e conflitos de atuação dos atores envolvidos.

De forma a organizar a atividade de proteção do meio ambiente, o legislador complementar optou por definir com precisão os conceitos de atuação administrativa no Capítulo I, disciplinou instrumentos de cooperação no Capítulo II e distribuiu ações de cooperação no Capítulo III (BRASIL, 2011). Observe-se que o legislador teve o cuidado de não tratar de competências, porquanto a competência para proteção do meio ambiente é comum, única, e é atribuída a todos os entes federados pela Constituição. O objetivo do legislador, pela forma de redação, é esclarecer e organizar os meios como se deve exercer a competência comum. Não há alteração da competência comum, o que não poderia ocorrer, visto que é outorgada pela CF/88 (BRASIL).

Para cumprir com a delegação de organizar a atividade de proteção comum, a LC 140/11 (BRASIL) institui um sistema de atuação cooperada. Para o funcionamento deste sistema buscou o legislador definir com precisão os conceitos, distribuir as ações de cooperação e instituir formas de solução de conflitos.

Organizar em sistemas a atividade comum é tradição do sistema federativo cooperativo brasileiro. Nessa tradição, o legislador já instituiu na área ambiental o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), criado pela Lei nº 6.938 (BRASIL, 1981) e o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), trazido pela Lei nº 9.985 (BRASIL, 2000), que regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal. Na mesma tradição, tem-se o Sistema Único de Saúde (SUS), instituído pela Lei nº 8.080 (BRASIL, 1990), que teve determinada sua organização em forma de sistema pela própria Constituição no art. 198.

Ainda que não haja na lei complementar descrição expressa da instituição de um sistema de proteção ambiental comum, esta interpretação é perfeitamente extraída da leitura integrada da norma. Há uma separação clara entre a atividade preventiva e repressiva na proteção do meio ambiente. No momento preventivo, as ações de cooperação são organizadas e distribuídas, o que permite otimizar o trabalho e melhor empregar os recursos públicos. A atividade repressiva, corolário final da verificação de adequação das atividades às normas ambientais, foi realçada como atividade cumulativa para implementação plena da competência comum. Essa atividade de fiscalização, que resume a expressão comum do poder/dever de proteção ambiental, foi reafirmada como atividade de todos os entes para que não houvesse ofensa à competência comum instituída pela Constituição, art. 17, § 3º da LC 140/11 (BRASIL).

Deve-se responder se esse sistema de proteção integrado respeita a competência comum para proteção do meio ambiente ou se há necessidade de licenciamentos múltiplos, como defende Paulo Afonso Leme Machado.

A grande maioria da doutrina e da jurisprudência defende a instituição de um licenciamento único. Neste sentido: “A competência específica para o licenciamento ambiental deve recair, no caso concreto, apenas ao ente federado competente, tendo em vista não haver possibilidade de licenciamento ambiental simultâneo.” (SILVA, 2012, p. 60).

E ainda:

De acordo com a doutrina de Hamilton Alonso Jr., já citado, ‘é inadmissível mais de um licenciamento a respeito de um empreendimento’.

(...)

A partir do advento da LC 140/2011, a regra do licenciamento único foi consagrada em seu art. 13, que assim, dispõe: ‘Os licenciamentos e atividades são licenciados ou autorizados, ambientalmente, por um único ente federativo, em conformidade com as atribuições estabelecidas nos termos desta Lei Complementar’. (FIGUEIREDO, 2013, p. 250-251).

Colhe-se de recente sentença proferida no processo nº 0800223-07.2013.4.05.8400:

EMENTA: DIREITOS AMBIENTAL E ADMINISTRATIVO. IBAMA. COMPETÊNCIA. FISCALIZAÇÃO. PROPORCIONALIDADE. MULTA. PROCEDÊNCIA PARCIAL.

I – O IBAMA é competente para fiscalizar empreendimento licenciado por órgão municipal ou estadual.

II - Validade do auto de infração. (BRASIL, 2013).

Ainda que o entendimento de Paulo Afonso Leme Machado fosse efetivamente o mais seguro, visto que a instituição de múltiplos licenciamentos resguardaria ao máximo a competência comum para proteção ambiental e garantiria um amplo cuidado, a doutrina, a jurisprudência e, sobretudo, o legislador optaram pela regra do licenciamento único. O grande embate era entre a segurança do licenciamento múltiplo e a eficiência (rapidez e redução de dispêndio) do licenciamento único. Pode-se entender que mantida a atribuição para que todos os entes possam fiscalizar e verificar a adequação das atividades com as normas ambientais, resta garantida a competência comum, ou seja, a expressão do poder do ente federado proteger o meio ambiente sem que haja hierarquia, sobreposição ou precedência de qualquer órgão ou ente.

Assim, somente pode-se admitir a instituição de um licenciamento único desde que este seja entendido apenas com parte da atribuição de um sistema único de proteção ambiental. Sistema que não macule o poder e a autonomia dos entes federados outorgados pela Constituição em matéria ambiental. Essa foi a opção do legislador complementar. Distribuiu as ações de cooperação e resguardou o poder de todos os entes em fiscalizar, para verificarem que tudo esteja sendo feito com respeito às normas e à garantida da proteção ambiental.

A LC 140/11 (BRASIL), portanto, institui um sistema de divisão das atividades administrativas, especialmente as ações preventivas, e mantém a atividade fiscalizatória repressiva de forma cumulativa. O legislador optou por organizar as atribuições administrativas enumerando, de forma mais precisa possível, as ações administrativas. Especialmente nos art. 7º, 8º e 9º da LC 140/11 (BRASIL) há uma enumeração pormenorizada das atribuições de cada ente, com o fito de evitar a sobreposição de atividades e de otimização dos recursos públicos.

Por certo, não se pode admitir qualquer ilusão positivista de que seja possível a lei prever todas as situações futuras. Desta forma, o legislador estabeleceu formas de solução de conflito, bem como criou fóruns administrativos para o estabelecimento conjunto de regras de definição futura de divisão de atribuições, como o caso as comissões tripartites, o que também se pode entender como solução adequada.

Passa-se agora a analisar essas formas de funcionamento do sistema de proteção comum.

3.1. FISCALIZAÇÃO REALIZADA PELO ENTE LICENCIADOR

As atividades de fiscalização e de licenciamento são facetas da mesma competência comum para a proteção do meio ambiente. Não há, contudo, confusão entre as duas atividades e uma não vincula a outra e, também, não há qualquer subordinação. Ora, como a competência é comum para proteger o meio ambiente, não poderia a fiscalização estar limitada às atribuições de licenciamento. Esta limitação importaria em significativa redução da competência comum e importaria afronta à Constituição.

Nada disso é novo e não deve ser de difícil compreensão. Conforme exposto acima, o texto do § 3º do art. 17 da LC 140/11 (BRASIL) não apenas não limitou a competência comum como reafirmou que todos os entes da federação devem fiscalizar em todos os casos em que houver dano ao meio ambiente. A lei complementar não poderia efetivamente limitar/reduzir a competência comum. Ela pode apenas delimitar, regulamentar a atuação, dar contorno, informar como se dá a cooperação e o trabalho comum dos diversos entes. Ou seja, o disciplinamento da competência comum não pode ser feito com a redução de nenhum poder de fiscalização. Somente a Constituição poderia impor qualquer redução da competência comum ou dispor de forma diversa. A lei complementar somente pode organizar a atuação comum para dar maior eficiência à atividade administrativa, nos exatos termos do art. 3º, III, da LC 140/11 (BRASIL). Assim a LC 140/11 (BRASIL) deu contornos para evitar o conflito de atribuições e harmonizar as políticas e ações administrativas.

Para o leitor apressado, o caput do art. 17 e o art. 7º, XIII, que se repetem nos arts. 8º, XIII, e 9º, XIII, da LC 140/11 (BRASIL), poderia parecer limitar a fiscalização ao ente responsável pelo licenciamento. Não é, contudo, o que se apreende da leitura integrada do texto. Entender daquela forma seria fazer letra morta do texto do § 3º do art. 17 LC 140/11 (BRASIL) e limitaria, inapropriadamente, a competência comum, bem como limitaria a defesa do meio ambiente, patrimônio indisponível da coletividade. Dispõem os referidos textos da lei:

Art. 7º São ações administrativas da União:

XIII - exercer o controle e fiscalizar as atividades e empreendimentos cuja atribuição para licenciar ou autorizar, ambientalmente, for cometida à União;

(...)

Art. 17. Compete ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização, conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo para a apuração de infrações à legislação ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada.

(...)

§ 3º O disposto no caput deste artigo não impede o exercício pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o caput.

A interpretação do texto leva à conclusão de que não existe limitação dos demais entes quando se descreve as ações administrativas do responsável pelo licenciamento. Quer o texto reafirmar que cabe ao ente licenciador “exercer o controle”. Ou seja, ele não pode apenas autorizar, mas deve ter mecanismos e instrumentos adequados e eficientes para o controle contínuo das atividades potencialmente poluidoras. Este controle se faz também pelo instrumento da fiscalização. Mas é obrigação do órgão licenciador organizar o aparato estatal para o controle contínuo e não episódico. O controle não pode se restringir ao momento do processo de licenciamento. Deve-se observar que aqui a LC 140/11 (BRASIL) foi extremamente cautelosa em prever expressamente esta obrigação, sem afastar, em nada, a obrigação de fiscalização comum e geral que cabe aos demais entes da federação.

Assim, o ente licenciador tem a obrigação de manter o acompanhamento contínuo das atividades que licencia. Por este motivo, a lei previu esta obrigação de fiscalização expressamente ao ente licenciador. É um plus, é uma obrigação expressa que não exclui o dever dos demais entes de proteger o meio ambiente. Não diz a lei que somente o ente licenciador fiscaliza, pelo contrário, realça no § 3º do art. 17 da LC 140/11 (BRASIL) que fica mantida a obrigação de fiscalização comum de todos os órgãos estatais. Quem licencia e autoriza se torna também responsável pelo funcionamento da atividade potencialmente poluidora. Deverá o licenciador manter o acompanhamento constante, cobrando relatórios, realizando vistoria, estabelecendo prazos para renovação de licenças, tudo para evitar ou mitigar qualquer possibilidade de dano. A lei prevê dessa forma, porquanto, ainda que a atividade seja licenciada e todos os estudos tenham sido realizados, sempre há a possibilidade da atividade não ocorrer conforme planejado, seja por execução em desacordo com a licença, erro nos projetos ou estudos, ou mesmo pela ocorrência de evento inesperado.

A atividade de licenciamento é típica atividade preventiva, que busca evitar a ocorrência do dano ou, ainda, sua mitigação ou compensação. A lei, portanto prevê que o órgão licenciador mantenha o acompanhamento contínuo da atividade licenciada, por isso prescreve expressamente essa função de fiscalizar (BRASIL, 2011). Fiscalizar aqui quer dizer acompanhar, verificar se a licença está sendo respeitada, bem como se o desenvolvimento do projeto impõe outra exigência que porventura não foi prevista. Não se deve confundir essa fiscalização continuada com a obrigação comum a todos os entes de fiscalização ambiental. A falta de cumprimento dessa obrigação específica de acompanhamento da atividade pelo órgão licenciador o torna corresponsável direto por qualquer dano que a atividade possa gerar ao meio ambiente.

Portanto, a fiscalização de que fala a LC 140/11 (BRASIL) nos seus arts. 7º, 8º, 9,º e caput do art. 17 é a fiscalização específica, continuada e obrigatória a ser exercida sobre todas as atividades licenciadas. Atividade de fiscalização inerente ao próprio processo de licenciamento, em atividade tipicamente preventiva. Essa tarefa é diferente da atividade repressiva da competência comum de fiscalização ambiental. Assim, quem licencia deve exercer minucioso acompanhamento, dentro dos limites do processo administrativo. A atribuição aqui é limitada, especificada, sem que haja multiplicidade de órgãos ambientais atuando em um mesmo processo de licenciamento.

A atividade de fiscalização da competência comum, reafirmada no art. 17, § 3º da LC 140/11 (BRASIL) é atividade típica de repressão a eventuais danos ou ameaças. Ainda que a fiscalização também exerça função preventiva, porquanto pode interromper uma atividade antes que se efetive o dano, não se confunde com a atividade de prevenção do licenciamento. Portanto, mesmo que um ente não seja competente para licenciar, ele é competente para fiscalizar, podendo, inclusive, autuar todos os responsáveis por qualquer dano que vier a ser causado, em atividade licenciada ou não.

A natureza das atividades de licenciamento e de fiscalização é distinta. A fiscalização por ser geral e repressiva não pode ser especificada ou limitada como ocorre com a atribuição para licenciar. Esta impossibilidade de limitação da fiscalização decorre da previsão da competência comum do art. 23, VI e VII, da CF/88 (BRASIL).

Não há, portanto, qualquer contradição entre o § 3° do art. 17 LC 140/11 (BRASIL) e seu caput e os artigos citados acima. A obrigatoriedade de fiscalização do ente licenciador é específica e não se confunde com a competência geral de fiscalização.

Neste sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ):

O nosso pacto federativo atribuiu competência aos entes da Federação para a proteção do meio ambiente, o que se dá mediante o poder de polícia administrativa (art. 78 do CTN). Esse poder envolve vários aspectos, entre eles, o poder de permitir o desempenho de certa atividade (desde que acorde com as determinações normativas) e de sancionar as condutas contrárias à norma. Anote-se que a contrariedade à norma pode ser anterior ou superveniente à outorga da licença, portanto a aplicação da sanção não está necessariamente vinculada àquele ato administrativo. Isso posto, não há que se confundir a competência do Ibama de licenciar (caput do art. 10 da Lei n. 6.938/1981) com sua competência para fiscalizar (§ 3º do mesmo artigo). Assim, diante da omissão do órgão estadual de fiscalização, mesmo que outorgante da licença ambiental, o Ibama pode exercer seu poder de polícia administrativa, quanto mais se a atividade desenvolvida pode causar dano ambiental em bem da União. (BRASIL, 2009).

E em recente decisão:

Ademais, a atribuição do IBAMA para a fiscalização de atividades potencialmente causadoras de degradação ambiental mesmo nas hipóteses em que a atividade tenha sido licenciada por órgão ambiental estadual ou municipal decorre do art. 2º da Lei 7735/89, em vista da competência constitucional concorrente atribuída à União, Estados, Distrito Federal e Municípios para proteger o meio ambiente e combater a poluição, em qualquer de suas formas, e preservar as florestas, a fauna e a flora (Constituição, art. 23, VI e VII e Lei 9605, art. 70, § 1º) (BRASIL, 2013).

Do Supremo Tribunal Federal (STF) também se colhe o mesmo entendimento:

É preciso destacar que não há dúvida de que existe uma fiscalização inerente ao exercício de licenciamento ambiental por parte do órgão competente para tanto. O que se espera, nesse sentido, é que o órgão competente para licenciar exerça amplo controle e fiscalização nos limites do processo administrativo de licenciamento ambiental, sem interferências de outros órgãos integrantes do SISNAMA, ressalvadas eventuais exceções previstas em lei.

Entretanto, o artigo 23 da Constituição e a legislação federal como um todo apontam como dever de todos os entes integrantes do SISNAMA a fiscalização de descumprimento das normas ambientais e o impedimento de degradações ambientais indevidas, fornecendo-lhes instrumentos adequados para a prevenção e a repressão de eventuais infrações contra a ordem ambiental.

Esse é o entendimento que está disciplinado, por exemplo, nos artigos 70 a 76 da Lei n.º 9.605/98, que tratam da definição das infrações administrativas e do dever de todos os órgãos do SISNAMA em preveni-las e reprimi-las mediante o exercício do seu poder de polícia ambiental, sob pena de sua omissão configurar, inclusive, corresponsabilidade, como dispõe o art. 70, §3º, da Lei n.º 9.605/98: ‘A autoridade ambiental que tiver conhecimento de infração ambiental é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante processo administrativo próprio, sob pena de co-responsabilidade.’

(...)

Contudo, cabe destacar que, se há um dever comum de fiscalização dos órgãos do SISNAMA quanto a infrações e crimes ambientais, isso não significa que se possa interpretar o seu poder de polícia ambiental a ponto de se incitar, em último caso, uma inoperância da preservação ambiental a partir da divergência de entendimentos dos órgãos de fiscalização ambiental e da ação de uns em prejuízo dos outros e da coletividade.

Por isso, o parâmetro mínimo que pode ser considerado aqui é exatamente se a fiscalização em análise decorreria diretamente do exercício regular do licenciamento ambiental (para a concessão de uma licença, para a discussão quanto a condicionantes e requisitos necessários à licença), o que evidenciaria, em princípio, possível superposição da atuação do IBAMA sobre a competência do órgão municipal/estadual para o licenciamento, o que não está permitido, provisoriamente, pelas decisões desta Presidência.

Há, entretanto, situações que evidenciam uma zona de penumbra para a aferição do cumprimento do mencionado critério, o que demonstra que a análise caso a caso deverá ser realizada. (BRASIL, 2010).

Distinta é, portanto, a atividade de fiscalização, a ser realizada de forma contínua pelo ente licenciador, da atividade de fiscalização geral, a ser efetivada por todos os entes em seu território, como poder/dever originário constitucionalmente da competência comum para proteção do meio ambiente.

3.2. INEXISTÊNCIA DA PREVALÊNCIA DO ENTE LICENCIADOR

A atribuição de fiscalização preventiva para os entes licenciadores no inc. XIII dos art. 7º, 8º, 9º e caput do art. 17 da LC 140/11 (BRASIL), bem como a previsão de prevalência do auto de infração do ente licenciador no art. 17, § 3º da LC 140/11 (BRASIL), tem gerado enorme confusão. São inúmeros os autores que defendem haver prevalência, ou proeminência do ente licenciador. Entendem que a LC 140/11 (BRASIL) teria criado um vínculo entre o licenciamento e fiscalização ambiental.

Assim, verifica-se que a Lei Complementar trouxe avanços no que diz respeito à fiscalização ambiental, em especial quanto à definição de que prevalecerá a competência do órgão ambiental que licencia ou autoriza a atividade. Entretanto, a Lei deixou dúvidas que poderão causar insegurança jurídica, caso não sejam devidamente regulamentadas. (WALCACER e outros, 2013, p. 71).

E ainda:

O art. 17 contém norma de maior importância, pois, como já escrevemos em outros lugares, o exercício do poder de polícia administrativo em matéria ambiental (como ocorre em outros setores) se dá em duas fases sucessivas e indissociáveis (a primeira fase, a do licenciamento e a segunda de repressão), o que leva à conclusão de que somente quem licencia pode aplicar sanções. (...)

Portanto, acaba aqui aquela confusão: um órgão competente é que licencia e outro qualquer aplica sanções, que tem ocorrido na prática. (MUKAI, 2012, p. 40).

Como visto acima, a fiscalização do ente licenciador é distinta da fiscalização geral a ser realizada por todos os entes da federação. Diz o art. 17, § 3º da LC 140/11 (BRASIL) que prevalece o auto de infração do ente licenciador quando houver duplicidade de autuação. Não se trata aqui, como já dito, de qualquer limitação do poder de fiscalização. O que prevalece é apenas e tão-somente o auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização. Observe-se que não prevalece a atividade do órgão licenciador ou autorizador, não há concentração ou prevalência da atividade do ente licenciador. Existe simplesmente uma regra de solução para duplicidade de autuação, caso contrário se estaria reduzindo inconstitucionalmente o poder de fiscalização dos demais entes da federação.

Neste sentido, com algumas nuances:

Não obstante tenha causado grande apreensão, esta nova regra, por si só, à primeira vista, não parece padecer de qualquer vício, desde que adotemos uma interpretação conforme à Constituição Federal. O ente responsável pelo licenciamento ambiental deve estar capacitado para também exercer o poder de polícia sobre o empreendimento ou atividade que licenciou (ou não licenciou).

Ademais, o § 3º de referido dispositivo reafirma a atribuição comum dos demais entes federativos para o exercício da fiscalização da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais com a legislação ambiental em vigor. Nesta hipótese, em se omitindo o órgão licenciador do dever de fiscalização, o poluidor poderá ser autuado por outro órgão ambiental. E, em havendo duplicidade de autuações, prevalecerá auto de infração lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização. (FIGUEIREDO, 2013, p. 253).

A solução para duplicidade de autuação já existia no art. 76 da Lei nº 9.605/98 (BRASIL):

Art. 76. O pagamento de multa imposta pelos Estados, Municípios, Distrito Federal ou Territórios substitui a multa federal na mesma hipótese de incidência.

O texto da Lei nº 9.605/98 (BRASIL), contudo, não respondia a todos os problemas concernentes à duplicidade de autuação. Observe-se que a solução era exclusivamente financeira, não havia preocupação quanto aos demais efeitos da autuação. Como se sabe, a questão financeira, nem de longe é a questão mais importante de uma autuação ambiental. A pena pecuniária cumpre função pedagógica e não arrecadatória. Mesmo que se defendesse a função arrecadatória da pena, esta estaria em último plano. Além do mais, a solução anterior informava que a multa federal era substituída sem qualquer critério, e não resolvia sequer o conflito entre uma multa estadual e municipal. O mais grave de tudo era o fato de não informar qual ente deveria seguir com as exigências administrativas e legais para recuperação do dano ambiental.

A solução do art. 17, § 3º, da LC 140/11 (BRASIL) é mais equânime, completa e adequada. A lei complementar adequadamente informa que não há prevalência de qualquer ente. A multa federal não será sempre substituída. Aliás, não havia qualquer razão para esta previsão anterior da substituição financeira da multa federal. Com a nova disposição, quis o legislador concentrar a atividade administrativa em um único ente e usou como critério o ente que já concentrava a atividade de licenciamento, porquanto é atividade contínua e preventiva. Adequado o critério, e quando a atividade for licenciada pelo ente federal, ainda que o ente estadual lavre multa, o auto de infração federal persistirá.

Deve-se, contudo, analisar com precisão para saber quando realmente há duplicidade de autuação. Somente há duplicidade quando o fato, o sujeito passivo e o tipo infracional forem absolutamente idênticos. Faltando algum elemento de identidade, não se estará diante de duplicidade de autuação e não há incidência da regra do art. 17, § 3º da LC 140/11 (BRASIL).

Por exemplo, em um mesmo empreendimento pode haver multa por atividade sem licença e por agressão a área de preservação permanente (APP). Caso outro órgão também lavre multa por atividade sem licença, prevalecerá em relação a esta multa dúplice a multa do órgão licenciador. Mas, se não houver duplicidade em relação à multa por dano à APP, a multa já lavrada, ainda que não seja pelo órgão licenciador terá seu curso, mantidas todas as exigências ambientais e administrativas.

O mesmo ocorre se o sujeito passivo for distinto. Assim, caso a multa seja lavrada contra o construtor e, posteriormente, o órgão licenciador lavre outra multa contra o empreendedor, que pode ser diverso, também não haverá duplicidade. Sendo o sujeito passivo distinto, cada um responderá nos termos de sua responsabilidade, conforme art. 2º da Lei 9.605/98 (BRASIL).

A necessidade de aplicação do mecanismo de solução de duplicidade de autuação, previsto no § 3º do art. 17 da LC 140/11 (BRASIL), ocorre apenas se a autuação for pelo mesmo fato, pelo mesmo tipo infracional e contra o mesmo sujeito passivo. Faltando um elemento de identidade, a nova multa do órgão licenciador não terá o condão de impedir o prosseguimento das apurações em razão dos danos ou vícios já autuados.

Cabe aqui fazer um pergunta fundamental: Por que a prevalência apenas do auto de infração do ente licenciador não fere a competência comum e, ao contrário, a prevalência da atividade do ente licenciador (como querem ler alguns) seria inconstitucional?

A prevalência do auto de infração é mera regra de solução para duplicidade de autuação. É norma de proteção do cidadão. Não pode uma mesma pessoa ser apenada duplamente pela mesma falta. O duplo apenamento contraria vários princípios jurídicos e constitucionais.

Por outro lado, a prevalência do auto de infração não significa que a infração ficará impune ou que não será corrigida. Somente quando o ente licenciador autuar absolutamente pelo mesmo motivo é que estará legitimado para prosseguir nos trâmites administrativos para aplicação da pena e exigir a recomposição do dano.

Além de ser regra de proteção do cidadão, a prevalência de auto de infração também é regra de proteção do meio ambiente. Observe-se que somente outro auto é que tem o condão de prevalecer. Portanto, não há prevalência da atividade de licenciamento. Ou seja, não pode o ente licenciador fiscalizar um empreendimento e certificar que está em conformidade com a lei para que a multa anterior seja anulada. Não havendo nova multa, não há incidência da regra e o autuado deverá demonstrar no processo administrativo do ente fiscalizador que corrigiu o dano ou que não havia razão para a multa.

Por fim, mesmo que haja novo auto de infração e prevalência do ato administrativo do ente licenciador, o dano detectado será devidamente apurado e exigida a correção. Ou seja, como regra de eficiência e como regra protetiva do meio ambiente, a solução para duplicidade importa em controle absoluto da atividade. O mesmo não se pode dizer se apenas um ente tivesse a palavra final sobre a matéria ou competência exclusiva de fiscalização. A omissão do ente licenciador em fiscalizar não poderia ser suprida por outro órgão, em completo descompasso com as normas do art. 23 e 225 da CF/88 (BRASIL).

Portanto, a regra da prevalência do auto de infração do ente licenciador não fere a competência comum. É regra protetiva do meio ambiente. Prevê a possibilidade de mais de um auto de infração, e a prevalência somente ocorre com a lavratura de novo auto de infração. Assim, reduz-se muito a possibilidade de um dano ambiental permanecer impune.

Caso o ente licenciador não autue, a multa lavrada por outro órgão terá seu curso normal. Dessa forma, a competência comum para a proteção do meio ambiente está preservada. Exemplificando, em um empreendimento licenciado pelo ente Federal, caso o Estado-Membro aplique uma multa por dano ocorrido na atividade, ainda que o licenciador não entenda da mesma forma, estará mantido o direito/dever de proteção do meio ambiente como expressão do poder originalmente conferido pela Constituição Federal a todos os partícipes da federação.

A interpretação equivocada de prevalência do ente licenciador, e não apenas do auto de infração, que levaria a uma concentração da fiscalização no ente licenciador, é completamente contrária à competência comum e por isso inconstitucional e deve ser rejeitada. Caso houvesse esta prevalência da atividade de licenciamento, não mais poderiam os membros da federação exercer sua competência constitucional de proteção do meio ambiente. Haveria redução da competência constitucional, o que não pode ser feito por lei complementar.

Deve-se, portanto, atentar para a correta interpretação do texto do § 3º do art. 17 da LC 140/11 (BRASIL). O texto é apenas uma regra de solução de duplicidade de autuação, e não se pode fazer leitura ampliativa para incluir significado inexistente e, pior ainda, inconstitucional.

Essa preocupação parece ter sido o motivo da emenda de redação feita pelo Senado Federal no texto deste § 3º da LC 140/11 (BRASIL). O texto recebido da Câmara falava que era nula a autuação feita por ente diverso, caso novo auto de infração fosse lavrado pelo ente licenciador. Aquele texto poderia levar ao entendimento de que a competência comum estaria reduzida apenas à atividade do licenciamento, concentrada em um ente da federação. Essa possibilidade de interpretação equivocada parece ter sido a razão de a alteração feita no Senado ser entendida apenas como emenda de redação. Ou seja, apenas mudou a redação para facilitar o correto entendimento, sem haver alteração do conteúdo da norma. (BRASIL, 2014).

A preocupação em apresentar uma emenda de redação era justamente porque não se poderia limitar a competência comum, o que afrontaria o texto infraconstitucional. O texto foi emendado para expressar apenas aquilo que era permitido pela Constituição, ou seja, que não há limitação para a proteção ao meio ambiente por qualquer ente da federação. O parágrafo único do art. 23 da CF/88 (BRASIL) não permite restrição da competência comum, o mandado constitucional é tão somente para que a lei complementar explicite as formas de cooperação e de otimização da autuação administrativa na defesa do meio ambiente. Nada mais poderiam dispor os legisladores complementares.

Imaginar que possa haver uma preponderância ou prevalência do ente licenciador seria inconstitucional. Por essa razão, pode-se entender a preocupação de Paulo Afonso Leme Machado quando defende a multiplicidade de licenciamentos. É o temor que a unicidade de licenciamento leve a uma interpretação reducionista da competência comum, de retirar dos entes federados o poder constitucional de proteção do meio ambiente.

O risco da concentração em matéria ambiental é grande, visto que a matéria é multidisciplinar e extremamente complexa, onde a precaução deve estar sempre presente. Concentrar pode não ser adequado, visto que sequer o Estado é detentor da resposta final, porquanto não é o titular único do direito e também não pode se entender como representante ímpar da sociedade. Essa é a novidade dos direitos difusos que precisa ser profundamente entendida. Como muito bem lembra Paulo Machado (2013, p. 331) da lição de Garcia de Enterría e Fernandez:

A Administração Publica não é representante da comunidade, senão uma organização posta ao seu serviço, o qual é, em essência, distinto. Seus atos não valem, por isso, como próprios da comunidade (...) senão como próprios de uma organização dependente, necessitada de justificar-se, em cada caso, em seu serviço à comunidade, para a qual está ordenada.

Não há fundamento constitucional para o entendimento de prevalência da atividade do licenciamento, pois é contrário a qualquer princípio ambiental e constitucional. Caso houvesse a prevalência do ente licenciador, os demais entes da federação estariam impedidos de proteger o meio ambiente em relação àquela atividade licenciada. Houvesse dano, que muitas vezes pode ser da responsabilidade do próprio ente licenciador, este poderia passar impune. Pode haver inclusive conflito de interesse entre quem autorizou a obra e que pode ao mesmo tempo ser também responsável pela infração. Não poderia a lei encarregar exclusivamente para fiscalizar quem pode ter interesse que a fiscalização não ocorra. É uma interpretação que fugira à máxima proteção ambiental que se extrai dos arts. 23 e 225 da CF/88 (BRASIL).

Não pode norma infraconstiuticional retirar qualquer parcela de poder originalmente dado pela Constituição. A combinação dos arts. 23 e 225 da CF/88 (BRASIL) é justamente para garantir essa ampla proteção. Essa interpretação de prevalência do ente licenciador não está prevista na lei complementar e não é permitida pela Constituição, e nem mesmo os defensores do progresso a qualquer preço conseguiram impor no texto final da lei complementar.

A organização/distribuição das atividades administrativas prevista na LC 140/11 (BRASIL), portanto, não reduz a competência comum e não padece de qualquer vício de constitucionalidade. A fiscalização pode ser feita por qualquer ente da federação e não está adstrita ao órgão licenciador. Como visto, até em muitos casos, o próprio agente do órgão licenciador deverá ser responsabilizado pelo dano e a fiscalização de outro ente da federação normalmente é mais eficaz, neste caso, por estar apartada do processo de licenciamento.

Essa regra de solução de duplicidade de autuação é uma grande e importante inovação da LC 140/11 (BRASIL). Substitui com vantagens a previsão anterior do art. 76 da Lei 9605/98 (BRASIL) e, sobretudo, respeita a competência comum para atuação de todos os entes da federação na defesa do meio ambiente.

3.3. FISCALIZAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS LICENCIADOS OU LICENCIÁVEIS

A fiscalização, portanto, não se confunde com o licenciamento. É importante, contudo, discorrer sobre situações diversas que podem advir em fiscalização de empreendimentos licenciados ou licenciáveis.

A LC 140/11 (BRASIL) prevê que o ente licenciador deve manter a fiscalização contínua da atividade que licenciou ou autorizou, ou da atividade que é responsável pelo licenciamento ou autorização. Mas a fiscalização pode ocorrer por outro ente, por falha do ente fiscalizador ou porque este também é responsável pelo erro ou conivente com o dano ambiental. Qualquer ente da federação pode fiscalizar as atividades potencialmente poluidoras, ainda que não seja responsável pelo licenciamento. Anota-se decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), neste sentido:

A fiscalização, por sua vez, se perfaz na possibilidade de se verificar a adequação de atividades ou empreendimentos às normas e exigências ambientais, sancionando aquelas que estejam em desacordo. Tal fiscalização pode ocorrer em atividades sujeitas ou não ao licenciamento e em momento anterior, concomitante ou posterior à emissão da licença. (BRASIL, 2009).

E no mesmo sentido do TRF4:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. INFRAÇÃO AMBIENTAL, MULTA E EMBARGO. PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE, LEGITIMIDADE E VERACIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. LICENCIAMENTO ESTADUAL. ATUAÇÃO DO IBAMA. ATRIBUIÇÃO CONCORRENTE.

O auto de infração atende aos requisitos de validade, a descrição da infração é claro, há motivação e expõe a fundamentação legal em que se baseia.

Na ausência de produção de prova capaz de afastá-la, o ato administrativo goza da presunção de ser legal, legítimo e veraz.

O auto de infração expedido no exercício do poder de polícia ambiental, atribuição concorrente dos órgãos ambientais estaduais, municipais e federal é consequência da competência administrativa comum de preservar o meio ambiente (art. 23, VI da CF/88) e característica do federalismo cooperativo (art. 24 da CF/88).

Apelação Improvida. (BRASIL, 2012).

Em razão desta complexidade, é importante analisar algumas situações práticas para facilitar a compreensão. O dano ambiental pode ocorrer em área que o infrator não requereu a licença devida. Neste caso, a autuação não traz maiores dificuldades. Após a lavratura do auto de infração cabe a comunicação ao órgão licenciador, que poderá também autuar. Havendo nova autuação do órgão licenciador, esta prevalece sobre as anteriores desde que haja duplicidade de autuação caracterizada pela identidade de fato, tipo e sujeito passivo. A cobrança das obrigações pecuniárias, administrativas e ambientais passa para a responsabilidade exclusiva do órgão licenciador.

Pode haver, porém, situação mais complexa quando o dano ocorre em empreendimento licenciado. Neste caso, o dano pode ocorrer por vários motivos. O dano pode existir porque o empreendedor extrapolou os limites da licença ou, ainda, tendo respeitado a licença, pode ser causado por fato não previsto. Pode, ainda, na pior das hipóteses, ocorrer porque a própria licença possui vício. Nesta última situação, a autuação deve ter como sujeito passivo não apenas o empreendedor, mas também os responsáveis pelo vício na emissão da licença.

Havendo licença ou sendo licenciável a atividade, e tendo ocorrido dano ou na sua iminência, qualquer ente pode autuar e deverá comunicar ao órgão licenciador, conforme o art. 17, § 2º, da LC 140/11 (BRASIL). Caso o dano ocorra em razão de desrespeito à licença concedida ou por fato não previsto nos estudos, é provável que o órgão licenciador lavre multa própria e passe a acompanhar o processo, prevalecendo sobre eventuais multas do órgão ambiental comunicante.

A competência comum para fiscalização é mantida ainda que tenha a atribuição para o licenciamento seja de um ente específico. Milaré (2011, p. 1135) destaca:

Acresce, ainda, que todos os entes federativos têm competência comum para proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; isso envolve atribuições na esfera administrativa, com fulcro no poder de polícia ambiental.

Por outro lado, como aos Municípios compete legislar sobre assuntos de interesse local, suplementando, neste particular as legislações federal e estadual, cabe afirmar que a polícia ambiental pode (e deve) ser exercida cumulativamente por todos os entes federativos, genericamente referidos como Poder Público; isso, aliás, decorre claramente do art. 225, caput, da Carta Magna.

Contudo, quando a multa for dada por dano em razão de licença viciada a situação torna-se bem mais difícil. Neste caso, é possível que órgão licenciador não tenha agido com as cautelas devidas, ou pode haver vícios de diferentes ordens, como autorização de atividade em local proibido ou fora dos padrões exigidos pela legislação ambiental. A fiscalização, neste caso, não significa interferência na competência do órgão licenciador. O que o ente federativo estará coibindo é a atividade contrária às normas ambientais em seu território, não importando quem executa ou licencia. A fiscalização não deverá efetivar novo processo de decisão sobre o licenciamento. É apenas a verificação da adequação das atividades com as normas ambientais. Mas, é muito importante que sejam reunidos elementos de prova suficientes para sustentar a autuação, porquanto deve ficar devidamente demonstrado que, apesar da licença, a atividade afronta a legislação ambiental.

O vício da licença emitida, contudo, não pode ser confundido com situações limites de decisão do órgão licenciador. A matéria ambiental é complexa e multidisciplinar. As decisões, no processo administrativo de licenciamento, dependem da análise de técnicos de diversas áreas do conhecimento e não há respostas simples. É sempre necessário sopesar ganhos e perdas de diferentes áreas e de interesses distintos. É comum que haja opiniões distintas sobre determinado elemento técnico, se é possível ou não o empreendimento. Sempre podem surgir divergências se a situação se enquadra ou não na legislação ambiental. Neste caso de zona cinzenta, cabe ao órgão licenciador a atividade administrativa para correta solução. Por isso, os licenciamentos são procedimentos administrativos abertos e participativos, inclusive com previsão de audiências públicas[3]. Quanto mais aberto e participativo for o processo administrativo de licenciamento, mais segura será a decisão do ente licenciador e poderá minorar as possibilidades de divergências ou erros. O verdadeiro processo de licenciamento deve ser entendido apenas como um ato presidido pelo ente licenciador, em que os vários atores técnicos, sociais e políticos interagem para encontrarem a melhor escolha possível da comunidade.

O § 1º do art. 13 da LC 140/11 (BRASIL) prevê a manifestação dos demais entes federativos no processo de licenciamento. Essa manifestação não é vinculante, pois o processo de licenciamento é aberto e participativo, deve reunir a contribuição de todos os interessados. Contudo, ainda que a manifestação não seja vinculante, havendo desrespeito a normas ambientais, os entes da federação não estão impedidos de atuar para proteção de seu território, conforme dispõe o art. 23 da CF/88 (BRASIL). O adequado, contudo, é que o processo de licenciamento seja o mais aberto e participativo possível para permitir a atuação harmoniosa prevista no art. 3º, III, da LC 140/11 (BRASIL).

A multa, portanto, para os casos de constatação de vício na própria licença deve ter as cautelas acima apresentadas. Deverá ser bem fundamentada e deve ser expedida contra todos os responsáveis pelo dano. Conforme o caso, pode se responsabilizar os empreendedores, os responsáveis pelos laudos e estudos e até mesmo os responsáveis pela licença, tudo na medida de sua culpabilidade, conforme prevê o art. 2º da Lei nº 9.605/98 (BRASIL). Devem ser lavradas tantas multas quanto forem os responsáveis. Não há bis in idem, mesmo que o fato seja único, e se possa repetir o tipo infracional, o infrator é distinto para cada multa. O tipo infracional também pode ser diferente, dependendo da atividade de cada agente. Um pode ser responsabilizado pelo estudo falso, outro por licença falsa[4], etc. É importante que fique devidamente esclarecida a participação de todos os agentes.

Após a lavratura da multa, deve-se comunicar ao órgão licenciador. Contudo, como a multa, neste caso, detectou que há vício na própria licença, é possível que o órgão licenciador discorde e não lavre multa própria. Assim, a multa já expedida terá seu curso normal, com julgamento pelo órgão que a lavrou. Todos os agentes envolvidos na infração terão oportunidade de defesa, bem como poderão provar no processo administrativo que a conduta era adequada.

Dessa forma, não há interferência na competência para licenciar. Esses exemplos permitem entender mais facilmente a distinção entre a atividade de licenciamento e a atividade fiscalizatória. A Constituição levou a proteção ambiental a um patamar de tamanha relevância a ponto de prever a atribuição de todos os cidadãos e de todos os entes da federação na sua proteção, não limitando a proteção à atividade preventiva do licenciamento ambiental, conforme art. 23 e 225 da CF/88 (BRASIL).


4. MEDIDAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL EM FLAGRANTE DE DANO

Por fim, vista a distinção entre licenciamento e fiscalização, e demonstrado o funcionamento da regra de solução de duplicidade de autuação, é importante esclarecer a norma do § 2º do art. 17 da LC 140/11 (BRASIL), que também pode gerar confusão ou dificuldade de interpretação.

§ 2  Nos casos de iminência ou ocorrência de degradação da qualidade ambiental, o ente federativo que tiver conhecimento do fato deverá determinar medidas para evitá-la, fazer cessá-la ou mitigá-la, comunicando imediatamente ao órgão competente para as providências cabíveis.

A responsabilidade pela fiscalização e a exigência de atuação efetiva já era prevista pela Lei nº 9.605/98 (BRASIL), que inclusive responsabiliza o agente público em caso de omissão.

Prevê a Lei nº 9.605/98:

Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.

(...)

§ 3º A autoridade ambiental que tiver conhecimento de infração ambiental é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante processo administrativo próprio, sob pena de co-responsabilidade.

A LC 140/11 (BRASIL) em nada alterou a aplicação desta regra. A Lei nº 9.605/98 (BRASIL) informa quais autoridades administrativas têm o dever de fiscalização, bem como prevê que o servidor que deixar de apurar será corresponsável pela infração. Mais importante, exige apuração imediata e abertura de processo administrativo próprio.

O § 2º art. 17 da LC 140/11 (BRASIL) determina que, na iminência ou ocorrência de degradação, o ente que tiver conhecimento deve determinar as medidas para evitá-la, fazer cessá-la ou mitigá-la, comunicando ao órgão competente para as providências cabíveis.

Não informa o texto legal se as medidas importam em autuação ou apenas medidas acautelatórias.

Em comentário ao art. 72 da Lei nº 9.605/98, Edis Milaré (2011, p. 1164) afirma:

Nos dizeres do regulamento, ditas medidas ‘tem como objetivo prevenir ocorrência de novas infrações, resguardar a recuperação ambiental e garantir o resultado prático do processo administrativo’ (art. 101, § 1º).

Neste sentido, tal qual uma medida de urgência do processo civil, só devem ser aplicadas em caráter excepcional, nos casos em que sua procrastinação (periculum in mora) importar em iminente risco de agravamento do dano ambiental ou de graves riscos à saúde.

Não bastasse a previsão do art. 70 da Lei nº 9.605 (BRASIL), a própria leitura do texto parece determinar que a medida seja mesmo a autuação imediata. A obrigação de comunicação, que poderia levar a uma interpretação mais limitada, aparece apenas na sequência do texto. Caso o legislador pretendesse apenas medidas acautelatórias, e em seguida a comunicação para que autuação fosse efetivada pelo o órgão licenciador, bastaria prosseguir o texto do § 1º, que já prevê a comunicação por qualquer cidadão. Mas o § 2º é mais incisivo e determina que sejam procedidas todas as medidas devidas. Segue ainda a previsão do § 3º informando que não há impedimento de autuação de todos os órgãos (BRASIL, 2011). Aliás, não havendo limitação do poder geral de fiscalização, qual seria a razão para impedir a autuação imediata, salvo algum elemento que necessite de apuração complementar?

O § 3º do art. 70 da Lei nº 9.605/98 (BRASIL) não foi revogado e leva à idêntica conclusão. A responsabilidade pela proteção ambiental alcança a todos e a autuação deve ser imediata. Por óbvio, pode a administração iniciar a apuração com a comunicação ao órgão licenciador para a fiscalização pertinente, mas somente nos casos em que não haja iminência ou não haja ocorrência do dano. Para não caracterizar a omissão deve sempre ser sopesado o efeito que o tempo da comunicação ao órgão licenciador poderá ter em relação ao dano ambiental.

A aplicação de medidas acautelatórias, antes da lavratura de auto de infração, deve ser reservada para as situações em que há necessidade de prosseguir nas apurações para determinação de elemento necessário à lavratura do auto. Somente para estes casos é que a autuação não deve ser expedida incontinente.

Deve-se registrar que o § 2º do art. 17 da LC 140/11 (BRASIL) diz que nos casos de “iminência” ou “ocorrência” as medidas para interromper o dano devem ser aplicadas. O texto leva para os casos de flagrante ou de risco iminente do dano. No caso de denúncias ou informações que não se configurarem em iminência ou efetivação do dano, poderá ser feita a comunicação ao órgão licenciador. Nestes casos, o tempo despendido na comunição não importará em agravamento do dano e o órgão licenciador estará mais munido de informações para exercer sua atividade, conforme dispõe os art. 7º, XIII, 8º, XIII e 9º, XIII LC 140/11 (BRASIL). Mesmo neste caso, porém, após a comunicação, ainda não estaria afastada a competência comum para fiscalizar e remanesce a responsabilidade do órgão comunicante. Acaso o órgão licenciador permaneça inerte, deve-se lavrar o auto de infração, inclusive apurando-se a inércia do órgão licenciador.

Portanto, tendo a autoridade ambiental se deparado com degradação ou sua iminência deve expedir de forma imediata o auto de infração e comunicar ao órgão licenciador. Deixar de autuar e apenas comunicar ao órgão licenciador, mesmo que se lavre embargo, não parece ser a forma mais segura de atividade administrativa. O próprio embargo, sem a multa, somente pode ser lavrado em condições excepcionais, quando não se tem certeza do dano ou quando se notifica para apresentar documentação pertinente, ou, ainda, quando há necessidade de apuração de algum elemento necessário à autuação, como o caso de necessidade de laudo técnico prévio.

No curso de operação, o flagrante leva à autuação, visto que a comunicação ou simples notificação, além de poder importar em omissão, torna a atividade administrativa menos eficiente. Isto porque, em momento futuro, caso haja necessidade de autuação, poderá ser custoso e difícil encontrar os responsáveis ou reconstituir os elementos de prova do dano. Nova atividade administrativa posterior importará sempre em mais custos aos cofres públicos, o que contraria os princípios da LC 140/11 (BRASIL) da eficiência na aplicação dos recursos públicos, princípio que também advém do texto constitucional.

Deve-se considerar ainda que, com a autuação imediata, cabe ao autuado trazer aos autos a prova de que foi autuado pelo mesmo fato e pelo mesmo tipo infracional, o que facilita a instrução do processo e torna mais eficiente a atividade administrativa. Neste caso fica bem mais simples a aplicação da regra do § 3º do art. 17 da LC 140/11 (BRASIL) de prevalência do auto do ente licenciador, visto que o autuado trará aos autos do processo administrativo os elementos necessários para decisão. Esta forma dispensa ainda a necessidade de consultas constantes entre os órgãos para verificar os atos e fundamentos de reprimendas administrativas aplicadas em cada caso.

Tal, força convir, não se dá, pois o próprio Decreto, em seu art. 124, § 1º, cuidou de deixar claro que ‘as medidas administrativas que forem aplicadas no momento da autuação deverão ser apreciadas no ato decisório, sob pena de ineficácia’. Ademais, não custa relembrar que a Lei 9.784/1999, atenta à matéria, averbou que, ‘em caso de risco iminente, a Administração Pública poderá motivadamente adotar providências acautelatórias sem a prévia manifestação do interessado’ (art. 45) (...) Vale dizer, não se subtrai do autuado a possibilidade de defesa, a qual, embora se protraindo no tempo, dar-se-á no momento azado, no âmbito do procedimento sancionatório, ressalvado sempre o possível acertamento das responsabilidades do agente autuante e do próprio Estado, nos casos de abuso ou desvio de poder. (MILARÉ, 2011, p. 1164-1165).

Na hipótese de se lavrar apenas o embargo e a comunicação, seria necessária análise posterior da atividade de fiscalização do órgão licenciador, visto que deveria ser verificada se foram reprimidas todas as pessoas e as condutas objetos da comunicação. Esta necessidade de análise dos fatos autuados pelo órgão licenciador e hipóteses infracionais tornaria ainda mais complexa e ineficiente a atividade de fiscalização. Acaso se entendesse por eventual omissão do órgão licenciador, haveria necessidade de apuração futura. Esta forma de proceder tornaria a atividade de fiscalização mais complexa, acrescida da conhecida dificuldade em receber informações de outros órgãos. Por fim, a análise a posteriori da atividade do órgão licenciador, com possível lavratura de multa, poderia mais facilmente configurar interferência em outro órgão do SISNAMA.

Por outro lado, deve-se ter em vista que as medidas acautelatórias, ainda que possam ser aplicadas antes da autuação, são sempre efetivadas em preparação ao processo principal de autuação. O mais recomendado é que as medidas acautelatórias sejam acompanhadas da respectiva autuação. Em regra o acessório sempre segue o principal.

Pelo exposto, diante da iminência ou degradação deve-se autuar e aplicar as medidas acautelatórias. Não é aconselhável aplicar apenas as medidas acautelatórias, visto que estas são preparatórias do processo principal, bem como é no processo que se decidirá sobre a correção ou não das medidas aplicadas. A unificação dos procedimentos agiliza a atividade administrativa, facilita a defesa do autuado e torna mais eficiente a atividade estatal.

Por fim, a decisão sobre o momento da autuação ou comunicação ao órgão ambiental licenciador deve ser sempre sopesada na situação fática. Caso haja dano ou iminência de degradação, o aconselhável é a autuação imediata, mesmo porque o mero acompanhamento administrativo dos efeitos da comunicação ao órgão licenciador pode não ser eficiente e levar a futura responsabilização por omissão.

O procedimento mais adequado diante do dano ou iminência de degradação é a autuação imediata, com a comunição ao licenciador, encaminhando-se, inclusive, cópia do auto de infração e todos os documentos pertinentes. A comunicação com o auto de infração irá inclusive beneficiar o ente licenciador, que poderá analisar o exato alcance dos fatos informados e quais medidas ainda possam ser necessárias.

A comunicação é para que o órgão licenciador possa cumprir com sua obrigação de controle contínuo da atividade, conforme dispõem os art. 7º, XIII, 8º, XIII, 9º, XIII e caput do art. 17 da LC 140/11 (BRASIL). Ele é informado para que adote as providências cabíveis para o caso específico. A lei não prevê que o ente licenciador, ao ser informado, será obrigado a autuar. Recebida a comunicação, pode-se simplesmente entender que a autuação já foi adequada e apenas aplicar as demais providências a cargo do licenciamento, como suspender a licença, exigir estudos e provas complementares, intensificar a fiscalização, verificar a regularidade dos controles próprios do licenciamento ou mesmo emitir novos e distintos autos de infração, porquanto a análise pode detectar outras infrações que não foram possíveis de identificação no momento da fiscalização anterior. Tendo o órgão licenciador todos os documentos relacionados à atividade, com mais facilidade poderá observar infrações que não seriam percebidas com uma fiscalização de rotina, como, por exemplo, a apresentação de documentação falsa ou propositalmente insuficiente.

Assim, a melhor política administrativa é emitir nova multa apenas quando a primeira não foi adequada e necessitar de correções. Há multas, como no caso de poluição, que exigem laudo prévio, que serão difíceis de substituição, visto que pode não haver mais oportunidade para realização de novo laudo. Assim, caso o laudo seja de outro órgão que já tenha fiscalizado, mesmo que não seja o licenciador, não há razão, salvo erros, de nova autuação. Pelo contrário, nova autuação poderá levar inclusive a impunidade por falta de laudo prévio adequado.

O sentido da cooperação entre os diversos órgãos do SISNAMA é justamente poder exercer, com a máxima eficiência, a competência comum do poder de fiscalização. Este parece ser o objetivo da LC 140/11 (BRASIL) que acabou por instituir, ainda que não de forma expressa, um sistema de proteção comum do meio ambiente, conforme detalhado no item anterior.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Vistas e revistas algumas implicações da LC 140/11 (BRASIL) é importante destacar que a proteção do meio ambiente é o objetivo constitucional.

A competência para fiscalizar é comum: todos os entes da federação podem e devem proteger o meio ambiente e combater a poluição em todas as suas formas, conforme o texto do art. 23 da CF/88 (BRASIL), e devem autuar sempre que necessário.

Por ser competência comum e cumulativa, previu o parágrafo único do art. 23 da CF/88 (BRASIL) que lei complementar iria disciplinar a cooperação. A Constituição busca a aplicação eficiente dos recursos públicos e a máxima proteção ambiental. Não quer a Constituição que nenhuma agressão ao meio ambiente fique impune. O art. 225 da CF/88 (BRASIL) também prescreve neste sentido e coloca a proteção ambiental não apenas como dever do Estado, mas como responsabilidade de todos. O direito ao meio ambiente saudável é tão fundamental que quis o constituinte premiá-lo com a máxima possibilidade de defesa.

Não poderia o legislador infraconstitucional, portanto, limitar essa máxima proteção conferida ao meio ambiente pelo constituinte originário. A máxima proteção, contudo, não é alcançada quando falta eficiência administrativa. Por isso, havia necessidade de lei complementar que regulamentasse a atividade de todos os responsáveis pelo controle ambiental, de modo que as atividades administrativas fossem mais amplas e eficazes.

Seguindo a tradição do federalismo cooperativo brasileiro, observa-se que o texto da LC 140/11 (BRASIL) acaba por instituir um sistema comum de proteção do meio ambiente. Mesmo que não tenha de forma expressa chamado de sistema, o que se vê com a distribuição das atividades é a formação de um típico sistema de cooperação. Procurou definir os conceitos de atuação administrativa, disciplinou instrumentos de cooperação e distribuiu ações administrativas. Criou um verdadeiro sistema de atuação conjunta, com momentos de comunicação, atividades preventivas, repressivas, sistema de solução de controvérsias e fóruns de decisão.

Essa era a necessidade da lei. Caso não houvesse regulamentação do trabalho cooperativo, cerne da competência comum, certamente se reduziria a eficiência da administração. Poderia haver excessos e contradições de controle em algumas atividades e lugares e ausência em outros. A escassez de recursos públicos exige que sua aplicação seja a mais proveitosa possível. Nesse sentido, a norma complementar regulamenta como se dará o exercício da competência comum, bem como informa quais soluções e prazos para as atuações comuns ou divergentes dos diversos órgãos ambientais.

Não há, como visto, qualquer subordinação da atividade de fiscalização à atividade de licenciamento. Na competência comum não há subordinação dos entes federados. Trata-se de distribuição originária de competência dada pela Constituição aos entes federados. Assim, ainda que o licenciamento de uma atividade seja atribuído a um determinado ente da federação, os demais entes, dentro de seu território, podem e devem fiscalizar a atividade. Cabe a todos os entes da federação a responsabilidade pela fiscalização. Não se confunde a atividade de licenciamento com a atividade de fiscalização. A jurisprudência sempre foi tranquila no sentido de que as atividades são distintas. Qualquer ente da federação pode fiscalizar as atividades potencialmente poluidoras, ainda que não seja responsável pelo licenciamento. Cabe trabalhar para manter esse correto entendimento tanto na doutrina como na jurisprudência vindoura.

Conforme anotado anteriormente, recentes decisões judiciais parecem demonstrar que, apesar de algumas dúvidas, a jurisprudência deve caminhar no mesmo sentido da tradição anterior. Aliás, não seria crível a opção por decisões judiciais que fragilizassem a defesa do meio ambiente. Decisões que importem em redução da proteção não estariam trilhando o brilhante caminho percorrido pelo direito ambiental brasileiro.

Aqui se ressalta a grande importância de manter uma interpretação fundada nos princípios constitucionais. Apreender das lições do direito como integridade e dos princípios fundamentais do direito constitucional e ambiental para ler as inovações legislativa na tradição de evolução do direito ambiental brasileiro.

A LC 140/11 (BRASIL) não reduziu, portanto, a competência comum dos entes da federação. Pelo contrário, confirmou o poder de fiscalização de todos os entes para toda e qualquer situação. Previu expressamente, no § 3º do art. 17 da LC 140/11 (BRASIL), que a competência do órgão licenciador para fiscalizar não impede a competência comum dos demais entes. Ressalta-se que é a primeira vez em texto infraconstitucional que competência comum é tratada e veio de forma expressa e taxativa.

E não poderia ser diferente, essa foi a grande preocupação do constituinte originário, que não apenas previu a competência comum para o cuidado ambiental no art. 23 da CF/88 (BRASIL), como dispôs no art. 225 da mesma Constituição que a defesa do patrimônio ambiental é dever de todos e obrigação do poder público.

O texto constitucional é claro: a competência para proteger o meio ambiente é comum a todos os entes da federação. A LC 140/11 (BRASIL), portanto, não poderia reduzir um milímetro sequer da competência para fiscalização de qualquer ente federado, e não o fez. O mandado constitucional é para fixação de normas de cooperação em vista do equilíbrio do desenvolvimento. Caso houvesse redução da competência comum, o texto estaria eivado de inconstitucionalidade.

O próprio Senado Federal parece ter tido este cuidado ao alterar o texto do art. 17, § 3º, da LC 140/11 (BRASIL) retirando qualquer expressão que pudesse importar em interpretação equivocada de redução da competência comum. O texto final é afirmativo em dizer que a competência do órgão licenciador para fiscalizar, encontrada em outros dispositivos da mesma lei e no caput do art. 17, não retira a competência dos demais entes federados para fiscalizar. O texto é desta forma justamente porque a lei complementar não poderia contrariar a letra da Constituição.

Estas conclusões e muitas outras que podem ser retiradas do texto constitucional e da LC 140/11 (BRASIL) são mais facilmente compreendidas quando se tem o cuidado de fazer uma leitura integrada do texto. A norma só tem sentido no seu contexto.

Interpretar não é tarefa neutra, e a urgência ambiental não permite que se faça uma leitura descompromissada de matéria de tamanha relevância para o direito ambiental brasileiro.


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Notas

[1] Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

[2] § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais.

[3] Resolução Conama nº 9/1987. Art. 1º - A Audiência Pública referida na RESOLUÇÃO/CONAMA/N.º 001/86, tem por finalidade expor aos interessados o conteúdo do produto em análise e do seu referido RIMA, dirimindo dúvidas e recolhendo dos presentes as críticas e sugestões a respeito.

[4]   Art. 67. Conceder o funcionário público licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obras ou serviços cuja realização depende de ato autorizativo do Poder Público:

Pena - detenção, de um a três anos, e multa.

(...)

Art. 69-A. Elaborar ou apresentar, no licenciamento, concessão florestal ou qualquer outro procedimento administrativo, estudo, laudo ou relatório ambiental total ou parcialmente falso ou enganoso, inclusive por omissão: (Incluído pela Lei nº 11.284, de 2006)

 Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. (BRASIL, Lei 9.605/98)

 



Informações sobre o texto

Monografia apresentada ao Centro de Educação a Distância – CEAD, da Universidade de Brasília – UnB, como requisito parcial à obtenção do grau de Especialista em Direito Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Henrique Albino. Competência para fiscalizar na Lei Complementar nº 140/11. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4116, 8 out. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29730. Acesso em: 28 mar. 2024.