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O e-mail como prova no Direito

O e-mail como prova no Direito

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"Um dos maiores freios dos delitos não é a crueldade das penas, mas sua infalibilidade [...] A certeza de que será punido, mesmo com pena branda, causará forte impressão no espírito humano, enquanto que a possibilidade de permanecer impune fortalece-lhe o ímpeto."

Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria [1]


SUMÁRIO: 1.Introdução;2 Do que é o e-mail, 2.1.Das características técnicas do e-mail, 2.2.Do estrutura do endereço do e-mail, 2.3.Das outras visões acerca do e-mail; 3.Da definição de e-mail; 4.Da segurança oferecida pelo e-mail; 5. Da prova no direito positivado, 5.1.Da confissão, 5.2.Da prova documental, 5.3.Da prova testemunal, 5.4.Da prova perical, 5.5.Da inspeção judicial, 5.6.Da certificação digital, 5.7.Da utilização de documentos eletrônicos em processos judiciais, 5.8. Dos outros instrumentos normativos afins à matéria, 6. Da posição da doutrina em relação ao aspecto probatório do e-mail; 7. Da jurisprudência em relação ao uso do e-mail como prova nos processos judiciais, 8. Da legislação relativa ao e-mail em geral em especial a da sua utilização como prova no direito, 8.1. Da legislação existente, 8.2. Da legislação em elaboração; 9.Do e-mail como prova no direito internacional; 10. Dos casos polêmicos; 11. Conclusão; Glossário; Referências Bibliograficas; Notas.


1.Introdução

O homem é produto do meio. Seu espírito gregário levou-o da barbárie à vida em sociedade. Nesse trajeto, criou o direito (a sociedade não prescinde de normas), o conhecimento, a técnica, a tecnologia e o Estado. Incidentalmente, criou [2]: os gestos (e com eles a comunicação), os desenhos (e com eles a imagem), a roda, a voz, a tinta, a contagem (e com ela o cálculo e o ábaco), a correspondência falada, a escrita (e com ela a correspondência escrita), a cifragem da informação, o papel (e com ele o texto e o livro), a eletricidade e o alto-falante (e com eles o telégrafo com fio, e com este a transmissão cifrada da informação e o telex), a onda de rádio (e com ele o telégrafo sem fio), o microfone (e com ele a transmissão da voz), a fotografia (e com ela a reprodução da imagem), o telefone (e com ele a comutação de sinais e com esta as centrais telefônicas), o rádio (e com ele a transmissão aérea da voz), o fax (e com ele a transmissão aérea do texto), a televisão (e com ela a transmissão aérea da imagem), o computador (e com ele a informação digital [3]), o satélite, a criptografia, a fibra ótica, o scaner (e com ele a digitalização), a Internet e, com todos eles, o e-mail [4]. E com este último, várias questões judiciais, face o despreparo do primeiro (o direito) e a inércia dos legisladores que o positivam.

A internet é uma rede digital que interliga computadores, por onde trafega informação digital em diversas feições (texto e/ou voz e/ou imagem) por meio de diversos serviços (hipertexto, e-mail, etc.) e que utiliza como suporte físico um meio transmissão, onde a informação trafega na forma de impulsos elétricos (por terra ou pela água, em linhas ou cabos telefônicos, comutados em centrais telefônicas) ou ondas de rádio (por terra, via repetidora de sinal, ou por ar, via satélite). Foi criada, inicialmente, como uma rede proprietária e com fins militares pelo governo norte-americano, sob outro signo, mas metamorfoseou-se ao longo de 33 anos em uma rede com propósitos diversos, marcadamente comercial e cultural. Invadiu as residências e os escritórios e transformou radicalmente a vida humana a ponto de à sua revolução já se dar a mesma importância histórica que a que se dá à revolução industrial do século XVIII. No direito, essa "sociedade virtual" veio a se constituir em uma nova modalidade de se estabelecer uma relação jurídica entre dois seres humanos.

Pois o e-mail é isso: é um dos serviços da internet [5], e, tal qual esta, corresponde também a uma nova forma de se estabelecer uma relação jurídica entre pessoas. Defini-lo, entretanto, não é tarefa fácil, como se verá adiante, mas pode-se caracterizá-lo, aprioristicamente, como sendo uma "mensagem eletrônica". Tal mensagem, por não ficar registrada em papel, não conter assinaturas, suscita polêmicas. Agrava isso a facilidade de poder alterá-lo:

"Caso envie um e-mail, saiba que antes de lograr seu destinatário ele realiza um enorme percurso, passando, às vezes, por centenas de outros portos na rede, onde pode ancorar e seguir viagem – ¡ou ser saqueado e afundado em seguida! O que queremos dizer é que um e-mail pode facilmente ser adulterado ou apagado" (Silva Neto, in O anonimato na web).

A história da evolução do homem é, portanto, a história da tecnologia, mas também a do direito. Tem sido sempre assim: direito e tecnologia ladeadas. Mas, ao que tudo indica, isso mudou e não mais será, assim, a partir desta época (a própria discussão em torno da matéria deste trabalho é prova disso): o direito foi surpreendido, pois foi muito rápido que a grande rede surgiu (e com ela a correspondência eletrônica), e não acompanhou as transformações tecnológicas, suscitando constantes querelas na justiça como são exemplos o crime de informática, a responsabilidade civil do provedor de acesso, o direito autoral de conteúdo, o spam, a privacidade do usuário, a comercialização de dados das pessoas, a validade dos documentos eletrônicos, a violação de e-mail na internet, e o uso do e-mail como prova no direito.

Desses, o que desperta a momentânea atenção é a utilização do e-mail como prova no direito, face ao fato de ser considerado um documento e inexistir na forma escrita, tal qual esteve acostumada a humanidade até então, pois o suporte de papel sempre conferiu às partes a segurança necessária nas relações jurídicas, protegendo a informação que contém contra deterioração por decurso do tempo e a preservando para consultas posteriores.

E é sobre a utilização do e-mail como prova no direito (em especial no brasileiro), é que trata o presente trabalho. Organizado em três partes, cada uma delas busca desnudar a matéria sob três diferentes óticas: a dos doutrinadores, a dos magistrados e a do legislador. Na primeira, procura-se mostrar quais as diversas correntes existentes entre os doutos no assunto e qual tende a prevalecer. Na segunda, procura-se mostrar o sentido para o qual apontam as decisões judiciais em relação à doutrina. E na terceira, procura-se mostrar o que já existe de normas jurídicas positivadas e o que está porvir em relação ao escopo do presente trabalho.


2.Do que é o e-mail

O e-mail é o serviço da Internet que permite enviar e receber mensagens de forma rápida e barata. Alguns afirmam ser o mais utilizado. Outros o colocam em posição secundária em relação à Web.

2.1Das características técnicas do e-mail

A importância do conhecimento do modo como se dá o encaminhamento de um e-mail, para um jurista, reside na necessidade que se tem de se identificar com segurança todos os perigos que lhe são imanentes. Daí porque que sempre que se põe em discussão a possibilidade ou não do seu uso como prova no direito, sempre é feito um julgamento sobre o seu grau de confiabilidade. Pode-se dizer, assim, que aquela (a possibilidade) depende deste (o grau de confibilidade).

Como toda mensagem, o e-mail tem uma origem e um destino e se processa através de algum meio. Encaminhamento é, pois, o nome técnico que se dá ao processo como um e-mail é criado, transferido a um destinatário através de um meio e por esse destinatário recebido. No encaminhamento de um e-mail, pressupõe-se, à transferência, a existência de [6]:

a) um computador origem, equipado com modem para acesso à internet e um programa de correio eletrônico (tal como nos outros serviços – Web, IRC, etc. – o uso desse serviço internet requer um programa apropriado: o software de comunicação para envio e recepção de e-mail. No momento atual, o programa de e-mail mais popular é o Outlook Express, da Microsoft®.);

b) um computador destino com os mesmos requisitos técnicos do computador origem;

c) um provedor origem;

d) um provedor destino;

e) uma conta (user account) de e-mail no provedor origem;

f) uma conta de e-mail no provedor destino; e

g) uma conexão entre o computador e o provedor origem (a existência de uma conexão entre o computador e o provedor destino é desnecessária no momento da transmissão, pois, ficando a mensagem armazenada no provedor destino, a recepção pode se dar em momento posterior).

O e-mail nasce com a sua feitura através de um programa, no qual se digita o texto da mensagem propriamente e informa-se o endereço do destinatário. Uma vez criado, é transferido (não é requisito para a sua existência o armazenamento de uma cópia sua no computador origem). Se a conexão entre computador e provedor origem já se encontra estabelecida a transmissão tem início imediatamente, caso contrário o próprio programa de e-mail encarrega-se de estabelecê-la.

Como em todo serviço internet, o programa de e-mail utiliza-se do protocolo de comunicação [7] TCP/IP [8] para transmissão da mensagem criada. Na utilização desse protocolo, o programa e-mail é denominado "aplicação". O protocolo se encarrega de acrescer o endereço do destinatário à mensagem da aplicação e decompor o conjunto formado em pequenas pacotes [9], na origem, recompondo-a no destino antes de entregá-la intacta ao programa de e-mail destinatário. No caminho a mensagem passa por diversos outros equipamentos, como o provedor de origem, os roteadores [10] e o provedor de destino.

No provedor de origem encontra-se instalado o servidor SMTP [11] (tem o mesmo nome do protocolo utilizado na transmissão do e-mail, em conjunto com o TCP/IP), que serve para indicar para qual servidor será transmitida a mensagem que se está enviando. "Ele só é ativado quando algum usuário precisa enviar um e-mail. Por isso esse servidor não precisa ficar conectado à Internet o tempo inteiro, já que o seu uso é por demanda". O SMTP não obriga que o computador de origem se comunique diretamente com o computador de destino (pressupõe uma comunicação on line entre eles). A transmissão pode ser feita passando a mensagem de computador em computador até seu destino final. O uso desse protocolo não requer senha de identificação.

Recebida a mensagem, o provedor de origem a examina para identificação do destinatário (vide o item seguinte, neste tópico), enviando-a diretamente ao servidor destino, quando é possível, ou a um roteador, que se encarrega de retransmití-la.

No provedor de destino encontra-se instalado o servidor POP [12] (tem o mesmo nome do protocolo utilizado na recepção do e-mail, em conjunto com o TCP/IP), que serve para armazenar temporariamente a mensagem recebida na conta do destinatário (espaço de armazenamento no servidor destino para posterior e definitiva entrega ao destinatário). Isso só foi possível com a criação do protocolo POP, em face da evolução da Internet e do aumento da utilização do modem. Sua criação e emprego superou a obrigatoriedade imposta pelo SMTP de que houvesse uma comunicação on line entre os computadores envolvidos. Essa dispensa, entretanto, recai sobre o computador destino, não sobre o servidor destino, isto é, "o servidor POP necessita estar on-line o tempo inteiro, já que ele pode receber uma mensagem de e-mail destinada a algum usuário da rede a qualquer minuto. Se o servidor não estiver no ar no momento da chegada da mensagem, a mensagem é retornada ao seu remetente com uma mensagem de erro" (Torres, 2001, p. 634).

Uma vez no servidor de destino, a mensagem pode ser acessada pelo destinatário. Que, para tanto, estabelece uma comunicação com o servidor destino (onde encontram-se armazenadas as suas mensagens), identifica-se através de uma senha e solicita os seus e-mails. Confirmada a senha, o servidor destino transfere as mensagens para o computador do destinatário, desarmazenando-as ou não a requerimento do interessado.

2.2Do endereço do e-mail

Para trocar-se mensagens pela internet é necessário Ter um endereçõ e conhecer o do destinatário, que são disponibilizados pelos provedores de acesso à grande rede. Um endereço de e-mail tem a seguinte forma: [email protected], e a seguinte estrutura: nome do usuário ("esdras.j"), símbolo arroba ("@", que significa "em" ou at em inglês) e o nome do provedor ("terra.com.br") onde o esdras.j tem a sua caixa de e-mail.

2.3Das outras visões acerca do e-mail

Uma grande fonte de problemas oriundos da utilização de e-mail provém do setor de Marketing. Sua visão, conforme poderia se esperar, é puramente comercial, voltada, sobretudo, para a divulgação de produtos. Nesse sentido, seus representantes entendem que seja o e-mail:

"[...] um aplicativo que permite redigir mensagens e anexar imagens, programas, enfim qualquer tipo de arquivo e transferí-los ao seu destinatário utilizando a Internet - entenda-se o protocolo TCP/IP.

Enfim podemos transferir conteúdo, fazer divulgação de um produto ou serviço e até mesmo direcionar através de um link o nosso internauta (visitante do nosso site), para uma página onde ele poderá fechar uma compra através de cartão de crédito ou boleto bancário" (MCT)."

No mesmo sentido atribuem-lhe as seguintes formas de utilização: a) correspondência eletrônica pura e simples, uma maneira muito eficiente, rápida e barata para se relacionar com clientes, prospects e fornecedores; b) boletins informativos; c) comunicados publicitários ou mercadológicos; d) divulgação de promoções; e) listas e fóruns de discussão; f) teasers de websites para aumentar tráfego; e g) pesquisas instantâneas de opinião para desenvolver produtos ou serviços novos ou aperfeiçoar os existentes.


3.Do definição [13] de e-mail

A parca legislação existente sobre informática não define o que é e-mail e nem haverá de defini-lo, afinal isso cabe à doutrina. Entretanto mesmo entre os seus representantes há certa confusão, provavelmente por estar sendo feita por pessoas sem afinidade ao setor (até porque a informática é uma área nova).

Para construir-se uma definição sobre o e-mail, há a necessidade de se recorrer ao material técnico da área e à incipiente doutrina jurídica que começa a se formar para classificar as diversas e usuais existentes. De ambos, apreende-se que se tem procurado defini-lo sobre três diferentes aspectos: um externo, um interno e um decompositivo ou explorativo. Sob o primeiro aspecto, de emprego mais comum, obtém-se uma definição formal [14]. Sob o segundo, uma definição material ou substancial. E, finalmente, sob o terceiro, uma definição analítica, que observa as suas características, função e elementos constitutivos.

Materialmente [15], "o E-MAIL é um conjunto de dados eletrônicos, pois no computador todos os dados são eletrônicos e se traduzem principalmente em bits ou pulsos de energia, que são capazes de serem interpretados e codificados ou decodificados de forma a transmitir ou externar uma informação" (Pires).

Por esse aspecto, o e-mail é, pois, uma informação que é codificada e se constitui imaterialmente sob formas novas de existência (criadas no século XX), diferentes das formas gráficas tradicionais. Essas formas são, principalmente [16]: a eletrônica (sob forma de elétrons), a ótica (sob a forma de luz) e a magnética (sob a forma de dipolos magnéticos).

Uma abordagem a mais que pode ser dada ao e-mail, sob a ótica desse aspecto da sua definição (útil também aos demais), é em relação às formas [17] em que ele pode ser encontrado [18]. Importam três momentos: o da utilização ("manuseio") pelo computador (em seus atos preparatórios ou finais), o da transmissão e o do armazenamento definitivo [19]. O primeiro momento é o único em que o e-mail acha-se, seguramente, na forma de elétrons, pois nos demais (transmissão ou armazenamento), ele pode ser encontrado nessa forma (de elétrons), mas também em outras. No segundo momento, o armazenamento pode ser realizado de duas formas básicas: eletrônica e magnética. No terceiro, a transmissão pode ocorrer na forma eletrônica, mas também na forma ótica.

Formalmente, enuncia-se (como se disse a priori, na introdução) que o e-mail é uma "mensagem eletrônica" ou "correspondência eletrônica". Por essa via, diz-se "eletrônica" no sentido de que: a) a mensagem ou a correspondência origina-se e destina-se a equipamentos eletrônicos; ou b) é transmitida na forma de elétrons entre os dois pontos. Entretanto, há de se fazer três ressalvas à definição sob esse aspecto:

a) Como o e-mail nem sempre é encontrado na forma de elétrons, incabível parece ser a utilização do termo "eletrônica" (para a mensagem ou correspondência). Mais adequado afigura-se o emprego do termo "digital" (relativo a dígitos) [20], pois em qualquer das formas em que se acha (sob a forma de elétrons, luz ou dipolo magnético) será sempre algo digital [21], isto é, acha-se permanentemente na forma de dígitos;

b) o emprego do termo "mensagem" parece ser mais adequado que "correspondência", visto aquela ser o gênero (apresenta-se em várias formas, inclusive a escrita) e esta uma espécie (apresenta-se somente na forma escrita); e

c) os atuais dicionários deverão se adequar à nova forma de comunicação, visto estabelecem como forma de "mensagem" apenas a verbal e a escrita (ainda não consideram a forma digital ou mesmo a "eletrônica").

Pelo exposto, pode-se definir o e-mail, formalmente, como sendo uma "mensagem digital". Entretanto, não obstante utilizar-se essa expressão em trechos próprios, empregar-se-á ora uma ora outra expressão (mensagem eletrônica, mensagem digital, correio eletrônico, etc.), em trechos transcritos ou parafraseados, conforme a opção do autor.

Registre-se, ainda, sob esse aspecto (formal), que é útil entender o e-mail por meio da analogia com a comunicação por correspondência. Entende-se, por meio dela, que: o e-mail está para a carta, assim como o computador está para a caneta e a internet para o serviço de correios.

Analiticamente, define-se o e-mail como sendo "uma mensagem contendo uma informação [22] que é digitalizada, opcionalmente criptografada e transmitida através de um meio físico (a internet [23]), a partir de um computador origem (transmissor) até um computador destino (receptor), via computadores de acesso ao meio físico (provedores [24] na origem e no destino).

Tem-se, pois, como uma boa definição (analítica) a de que o "e-mail é forma digital [25] de mensagens [26] trocadas entre duas pessoas, que é realizada por intermédio de computadores e de uma rede [27] que os interligam".


4. Da segurança oferecida pelo e-mail

Neste tópico deseja-se avaliar, técnica e superficialmente, até que ponto o e-mail é seguro, isto é, responder à seguinte pergunta: o e-mail oferece segurança?

Para responder a essas indagações, recorre-se às anotações de Amaro Silva Neto e Leonardo Pires:

"Entrementes, a par das vantagens apontadas, o correio eletrônico é um meio de comunicação bastante inseguro. Antes de u´a mensagem eletrônica chegar a seu destino ela realiza uma longa e tortuosa viagem. Parte do computador remetente para o computador do servidor de acesso à internet e, na seqüência, passa por incontáveis outros servidores até alcançar o destinatário. Portanto, em primeiro lugar, vemos que os administradores (webmasters) dos provedores de acesso podem, facilmente, vasculhar o conteúdo dos e-mails que retransmitem.

"Além dos que têm acesso direto às mensagens eletrônicas, outros podem interceptá-las em seu curso. É que a mensagem enviada passa por centenas de pontos no Planeta - aleatórios e sempre novos - antes de alcançar seu destinatário. Daí a facilidade de ser adulterada, acrescendo-se-lhe ou excluindo-se-lhe texto ou mesmo a suprimindo. Afinal os bits (aquelas "coisas" que não são "coisas") se misturam sem qualquer esforço ¡e raramente deixam rastros!" (in O e-mail como prova no direito brasileiro)" (Silva Neto, in O e-mail como prova no direito).

"Da mesma forma que existem problemas jurídicos relacionados a emissão e recebimento de cartas e das informações que elas carregam, existem problemas jurídicos relacionados com a emissão e recebimento de e-mail e as informações que eles carregam, [...].

"Existem diferenças gritantes entre uma carta e um e-mail, além do fato de uma ser materialmente visível, principalmente no que se refere à segurança, pois os e-mails são mais facilmente interceptados, perdidos, roubados ou danificados do que as cartas, bem como são muito mais baratos de serem utilizados, pois não precisam pagar despesas como selos, etc." (Pires).

Foi visto que a transmissão do provedor de origem ao de destino pode ser feita com a passagem da mensagem de computador em computador até o seu destino final. É nesse ponto reside a falha potencial de segurança que tanto se menciona, pois um computador no caminho, por mal funcionamento ou má intenção de seu operador, pode fazer cópias dos e-mails que passem por ele, ou simplesmente reter as mensagens. Viu-se também que o emprego do protocolo SMTP na origem não requer senha de identificação, portanto qualquer um pode se identificar como [email protected] e enviar uma mensagem sob este nome, o que representa, também, um risco potencial.

Viu-se também que uma vez recebida pelo servidor de destino, a mensagem pode ser acessada pelo destinatário. Que, para tanto, estabelece uma comunicação com o servidor destino, identifica-se através de uma senha e solicita os seus e-mails. Confirmada a senha, o servidor destino transfere as mensagens para o computador do destinatário, desarmazenado-as ou não a requerimento do interessado. Nesse ponto reside outra falha do processo de transmissão de mensagens por e-mails (aliás, a única vulnerabilidade do protocolo POP utilizado na recepção), pois há a possibilidade de acesso por terceiros às mensagens armazenadas no servidor destino, caso a senha lhe seja revelada ou tenha descoberto criminosamente.

Do exposto, afirma-se, seguramente, que o e-mail é uma forma frágil de se trocar mensagens, face à sua vulnerabilidade diante da estrutura que o suporta. Há, entretanto, uma esperança na criptografia e na certificação digital. A primeira técnica permite que se codifique uma mensagem com uma chave que só é do conhecimento do transmitente e do destinatário. A segunda permite que um terceiro assegure o conteúdo e a procedência da informação (vide o tópico seguinte).


5. Da prova no direito positivado

Como parte das disposições gerais, o Código de Processo Civil brasileiro estabelece (livro I: Do processo de conhecimento, título VIII: Do procedimento ordinário, capítulo VI: Das provas, seção I: Das disposições gerais):

"Art. 332. Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa."

"Art. 335. Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial."

Meios para prova em juízo, os códigos de processo civil e penal estabelecem, basicamente, cinco:

a) confissão;

b) prova documental;

c) prova testemunhal;

d) prova pericial; e

e) inspeção judicial.

5.1Da confissão

Sobre a utilização da confissão como prova no juízo civil, estabelece o Código de Processo Civil (livro I: Do processo de conhecimento, título VIII: Do procedimento ordinário, capítulo VI: Das provas, seção III: Da confissão), verbis:

"Art. 348. Há confissão, quando a parte admite a verdade de um fato, contrário ao seu interesse e favorável ao adversário. A confissão é judicial ou extrajudicial."

No juízo penal, o Código de Processo Penal estabelece (livro I: Do processo em geral, título VII: Da prova), verbis:

"Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado" (capítulo II: Do exame do corpo de delito, e das perícias em geral).

"Art. 197. O valor da confissão se aferirá pelos critérios adotados para os outros elementos de prova, e para a sua apreciação o juiz deverá confrontá-la com as demais provas do processo, verificando se entre ela e estas existe compatibilidade ou concordância" (capítulo IV: Da confissão).

5.2Da prova documental

A prova documental, como o próprio nome indica, baseia-se em um documento (público ou particular). Sobre ela, reza o Código de Processo Civil (livro I: Do processo de conhecimento, título VIII: Do procedimento ordinário, capítulo VI: Das provas), verbis:

"Art. 355. O juiz pode ordenar que a parte exiba documento ou coisa, que se ache em seu poder" (seção IV: Da exibição de documento ou coisa).

"Art. 364. O documento público faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão, o tabelião, ou o funcionário declarar que ocorreram em sua presença" (seção V: Da prova documental, subseção I: da força probante dos documentos).

"Art. 368. As declarações constantes do documento particular, escrito e assinado, ou somente assinado, presumem-se verdadeiras em relação ao signatário" (seção V: Da prova documental, subseção I: da força probante dos documentos).

5.3Da prova testemunhal

Estabelece o Código de Processo Civil (livro I: Do processo de conhecimento, título VIII: Do procedimento ordinário, capítulo VI: Das provas, seção VI: Da prova testemunhal, subseção I: Da admissibilidade e do valor da prova testemunhal), sobre a prova testemunhal, verbis:

"Art. 400. A prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso. O juiz indeferirá a inquirição de testemunhas sobre fatos:

I - já provados por documento ou confissão da parte;

II - que só por documento ou por exame pericial puderem ser provados."

5.4Da prova pericial

Sobre a prova pericial, estabelece o Código de Processo Civil (livro I: Do processo de conhecimento, título VIII: Do procedimento ordinário, capítulo VI: Das provas, seção VII: Da prova pericial), verbis:

"Art. 420. A prova pericial consiste em exame, vistoria ou avaliação."

"Art. 436. O juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos."

5.5Da inspeção judicial

Estabelece o Código de Processo Civil (livro I: Do processo de conhecimento, título VIII: Do procedimento ordinário, capítulo VI: Das provas, seção VIII: Da inspeção judicial), sobre a inspeção judicial, verbis:

"Art. 440. O juiz, de ofício ou a requerimento da parte, pode, em qualquer fase do processo, inspecionar pessoas ou coisas, a fim de se esclarecer sobre fato, que interesse à decisão da causa."

5.6Da certificação digital

Dispõe a Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2001:

"Art. 1º Fica instituída a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, para garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras.

"Art. 2º A ICP-Brasil, cuja organização será definida em regulamento, será composta por uma autoridade gestora de políticas e pela cadeia de autoridades certificadoras composta pela Autoridade Certificadora Raiz - AC Raiz, pelas Autoridades Certificadoras - AC e pelas Autoridades de Registro - AR.

"Art. 3º A função de autoridade gestora de políticas será exercida pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil, vinculado à Casa Civil da Presidência da República e composto por cinco representantes da sociedade civil, integrantes de setores interessados, designados pelo Presidente da República, e um representante de cada um dos seguintes órgãos, indicados por seus titulares:

I - Ministério da Justiça;

II - Ministério da Fazenda;

III - Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior;

IV - Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão;

V - Ministério da Ciência e Tecnologia;

VI - Casa Civil da Presidência da República; e

VII - Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.

................................................."

"Art. 4º Compete ao Comitê Gestor da ICP-Brasil:

I - adotar as medidas necessárias e coordenar a implantação e o funcionamento da ICP-Brasil;

II - estabelecer a política, os critérios e as normas técnicas para o credenciamento das AC, das AR e dos demais prestadores de serviço de suporte à ICP-Brasil, em todos os níveis da cadeia de certificação;

III - estabelecer a política de certificação e as regras operacionais da AC Raiz;

IV - homologar, auditar e fiscalizar a AC Raiz e os seus prestadores de serviço;

V - estabelecer diretrizes e normas técnicas para a formulação de políticas de certificados e regras operacionais das AC e das AR e definir níveis da cadeia de certificação;

VI - aprovar políticas de certificados, práticas de certificação e regras operacionais, credenciar e autorizar o funcionamento das AC e das AR, bem como autorizar a AC Raiz a emitir o correspondente certificado;

VII - identificar e avaliar as políticas de ICP externas, negociar e aprovar acordos de certificação bilateral, de certificação cruzada, regras de interoperabilidade e outras formas de cooperação internacional, certificar, quando for o caso, sua compatibilidade com a ICP-Brasil, observado o disposto em tratados, acordos ou atos internacionais; e

VIII - atualizar, ajustar e revisar os procedimentos e as práticas estabelecidas para a ICP-Brasil, garantir sua compatibilidade e promover a atualização tecnológica do sistema e a sua conformidade com as políticas de segurança."

5.7Da utilização de documentos eletrônicos em processos judiciais

Dispõe a Lei nº 9.800, de 26 de maio de 1999:

"Art. 1o É permitida às partes a utilização de sistema de transmissão de dados e imagens tipo fac-símile ou outro similar, para a prática de atos processuais que dependam de petição escrita.

"Art. 2o A utilização de sistema de transmissão de dados e imagens não prejudica o cumprimento dos prazos, devendo os originais ser entregues em juízo, necessariamente, até cinco dias da data de seu término.

Parágrafo único. Nos atos não sujeitos a prazo, os originais deverão ser entregues, necessariamente, até cinco dias da data da recepção do material.

"Art. 3o Os juízes poderão praticar atos de sua competência à vista de transmissões efetuadas na forma desta Lei, sem prejuízo do disposto no artigo anterior."

5.8Dos outros instrumentos normativos afins à matéria

Relaciona-se a seguir alguns instrumentos normativos que possuem relativa afinidade ao tema do presente trabalho:

a) Portaria Interministerial MDIC/MCT/MPOG nº 47, de 03.08.2000: que criou o Comitê Executivo de Comércio Eletrônico com o propósito de promover o desenvolvimento do comércio eletrônico, de suas tecnologias e infra-estruturas associadas, em face da necessidade de integrar e coordenar as iniciativas desse campo de atividades; e

b) Lei modelo da UNCITRAL sobre comércio eletrônico (Resolução 51/162 da Assembléia Geral Das Nações Unidas – ONU – Nova York, de 16 de dezembro de 1996) [28]: estabelece "uma minuta de lei sobre as relações comerciais por meio da Internet como suporte de aconselhamento para que os diversos países possam seguir uma única diretriz. No projeto, a UNCITRAL sugere que as leis nacionais sejam aproveitadas ao máximo, com o uso das leis civis que dão validade e reconhecem a existência dos atos jurídicos, bem como a questão da sua prova" (Brasil in O documento físico e o documento eletrônico).


6.Da posição da doutrina em relação ao aspecto proba-tório do e-mail

Aqui, o que se quer é expor são as diversas correntes doutrinárias nacionais a respeito da matéria em comento, isto é, responder às seguintes perguntas: o que pensam os doutos sobre a utilização de e-mail como provas nos processos judiciais brasileiros? Qual a tendência? Que corrente preponderará no país?

No Brasil, a doutrina tem-se posicionado, basicamente, em torno de duas correntes: a) da admissibilidade indireta e incondicionada; e b) da admissibilidade direta e condicionada. À primeira corrente filiam-se, dentre outros: Amaro Moraes e Silva Neto, Ângela Bittencourt Brasil, Leonardo Gurgel Carlos Pires e Itamar Arruda Júnior. À segunda: Maria da Conceição Barreto Gonzalez e Patrícia Regina Pinheiro Sampaio / Carlos Affonso Pereira de Souza.

Pela primeira, sustenta-se que o e-mail por si só não prova sua existência e sua integridade original. Há a necessidade de realização de uma perícia técnica que o ateste: "apenas um laudo decorrente de uma perícia pode, em tese, comprovar a existência da autoria, do destinatário, do momentum e dos endereços I.P.s (protocolo de comunicação ou Internet Protocol) por onde passou a transmissão" (Silva Neto, in O e-mail como prova no direito).

Pela segunda, o e-mail pode ser usado diretamente como prova (embora também como apoio a outros meios de provas conhecidos), desde que algumas condições sejam atendidas. Por essa corrente, tal qual a anterior, a admissibilidade do e-mail como prova não é absoluta.

6.1Da posição de Amaro Moraes e Silva Neto

Silva Neto também entende não ser possível considerar-se o e-mail como uma confissão, uma prova documental, uma prova testemunhal ou objeto de uma inspeção judicial. Entende ele que "a prova da existência e da autoria de um e-mail somente pode ser alcançada através de exame pericial" (in O e-mail como prova no direito brasileiro). E que: "A perícia [...] é o mais eloqüente e adequado meio de se fazer a prova judicial de um e-mail, des´que observadas as formalidades de procedimentos cautelares próprios" (Ibidem).

À luz dos arts. 348, 364, 368, 400, 420, 436 e 440, do CPC, e arts. 158 e 197 do CPP, o ilustre doutrinador defende que (in O e-mail como prova no direito brasileiro):

a) a confissão por si só não é suficiente e nem absoluta, visto que ela não dispensa o exame de corpo de delito e que somente se prestará para a condenação do réu se existirem outras provas. E que uma vez que se utilize um e-mail em um processo, o que será reconhecido como prova não é ele, mas a confissão nele implícita;

b) um e-mail não pode ser considerado um documento porque "é desprovido de assinatura (nos moldes em que a convencionamos materialmente) como, outrossim, compreende o mais vagos dos corpos";

c) "sempre que um fato não for provado documentalmente, por confissão ou por perícia, é admissível a prova testemunhal";

d) "a perícia [...] é o mais eloqüente e adequado meio de se fazer a prova judicial de um e-mail, des´que observadas as formalidades de procedimentos cautelares próprios"; e

e) "uma vez que um e-mail não é pessoa nem coisa, ¿como se admitir que venha a ser objeto de inspeção judicial?".

Posições essas sobre as quais constrói sua tese:

"[...] Para se provar a efetiva existência de um e-mail e de sua necessária integridade original necessária se faz uma perícia no local [grifo nosso] onde ela se originou, qual seja, no computador remetente.

"Logo é conditio sine qua non que seja proposta u´a medida cautelar de busca e apreensão do computador daquele que suposta, virtual ou presumivelmente enviou o e-mail para que se constate se nele se encontram os bits nos quais se apoia a ação e que, por sua vez, serão objeto de perícia. Em lá existindo a mensagem gravada, ¡bingo! - pode ser deduzido, a priori, que provavelmente o e-mail talvez tenha existido. Mas... ¿e se ele houver sido efetivamente apagado? Aí dificilmente poderá ter alguma validade o eventual e-mail como evidência de prova no processo, vez que sequer pode ser objeto de um exame judicial...

"Um e-mail nada prova, eis que podem ter sido introduzidas mudanças em seu texto original, durante a sua trajetória na grande rede de comunicações até o computador destinatário.

"Se os grandes sistemas governamentais, financeiros e institucionais podem ser atacados por hackers (os piratas da informática), ¿o que dizer em relação ao usuário comum que não se vale da encriptação para o envio de suas mensagens e que não possui meios de defesa (firewalls) contra ataques promovidos por terceiros de má-fé?

"Caso um usuário da grande rede de computadores não possua um eficiente sistema de proteção, um dos aludidos invasores poderá colocar, em seu disco rígido, a mensagem que bem lhes aprouver. Posto que essa hipótese é de fácil ocorrência, ¿como se admitir a eficácia de uma prova pericial?" (Ibidem).

Postulado isso, Silva Neto conclui então:

"Até que uma normatização seja feita relativamente à troca de correspondência eletrônica, não disporemos de nenhum meio seguro para determinar a efetiva origem e a inequívoca integridade de um e-mail.

"Na legislação pátria já existem diversas leis (notadamente as relativas ao Mercosul) que aludem a documentos eletrônicos. Entretanto, até a presente data, não é de nosso conhecimento que sequer uma delas, ao menos, tenha sido regulamentada.

"Com o tempo advirão a certificação digital, a assinatura digital e outros quejandos, certamente apoiados na biometria. Contudo, mesmo nesses casos, se eventualmente uma das partes não tiver uma identidade digital, de nada valerão os esforços envidados pelos legisladores.

"Atenta Leitora e arguto Leitor: não mais imprimimos com as prensas de Gutemberg, como, tampouco, fazemos contas com os geniais ábacos. Conseqüentemente devemos atentar para a nova realidade que voluptuosamente se impõe, sob pena de naufragarmos não nos mares da internet, mas nos densos oceanos que são os processos judiciais" (Ibidem).

6.2Da posição de Ângela Bittencourt Brasil

Ângela Brasil, sustentando-se na aplicação do art. 420 do Código de Processo Civil, posiciona-se no sentido de que o e-mail não pode servir de prova em processos judiciais, mas tão somente servir ao propósito de fornecer indícios. Mesmo assim, mediante perícia:

"Em função [...] [da] viagem pelo espaço cibernético, em que a mensagem passa por muitos pontos, ela se torna vulnerável de adulteração sem deixar rastros, o que a torna ao mesmo tempo uma prova frágil para o processo, não perdendo no entanto o seu caráter indiciário [grifo nosso].

"Os procedimentos judiciais que hoje vemos como os mais plausíveis de serem aplicados na investigação quando o objeto investigado é o e-mail é a perícia técnica [grifo nosso] feita por experts em computadores, especialização que urge ser criada para dar apoio à Informática Jurídica.

"Esses técnicos é que farão a melhor prova da existência da mensagem, seu conteúdo e sua veracidade, para que o Juiz forme a sua convicção com outros elementos trazidos aos autos [...]

"No entanto, e-mail, por ser de natureza etérea e não ser pessoa, entendemos não poder ser objeto de inspeção judicial em si, mas um laudo pericial pode comprovar a sua existência e a autoria do destinatário [grifo nosso], através de pesquisa nos IPs por onde ele tenha transitado (IP: Internet Protocol ou protocolo de comunicação)" (Brasil in O e-mail e a prova judicial).

São, ainda, pontos relevantes da sua defesa:

a) da natureza do e-mail, que entende ser um "documento", em face de ser representativo de um fato e exigir capacidade de compreensão pelo intérprete: "Partindo-se do conceito conhecido de que o documento é uma coisa representativa de um fato, no ensinamento de Moacyr Amaral Santos, não se pode dizer que o documento eletrônico é um Documento [grifo nosso], porque ele não é uma coisa e portanto não pode ser representativa de um fato. Mas se olharmos pelo prisma do registro do fato [grifo nosso], veremos que ele se adequa perfeitamente a este conceito, porque como uma sequência de bits ele pode ser traduzido por meio de programas de informática que vai revelar o pensamento ou a vontade daquele que o formulou, exigindo do intérprete uma concepção abstrata para compreendê-lo [grifo nosso] [...] Diante dessas colocações temos que o documento eletrônico é a representação de um fato concretizado por meio de um computador e armazenado em programa específico [grifo nosso] capaz de traduzir uma sequência da unidade internacional conhecida como bits" (Brasil in O documento físico e o documento eletrônico);

b) da forma de se realizar a perícia em um e-mail: "[...] a perícia judicial deve ser prima facie ser feita na máquina do remetente da mensagem e para isso é preciso que haja uma ordem judicial de Busca e Apreensão de natureza cautelar [grifo nosso] para averiguar se se encontra em seus arquivos o objeto da investigação, ou seja, os e-mails arquivados[. Se] [...] o investigado tiver sido apagado, será quase impossível a verificação de sua existência. Então, caso a mensagem tenha sido apagada, vai-se ao Administrador [grifo nosso] com a ordem judicial para que este entregue o texto do e-mail enviado, desde que este seja nacional" (Brasil in O e-mail e a prova judicial);

c) das dificuldades de se realizar a perícia: "[...]. Circula hoje na rede Internet um sem número de administradores de mensagens virtuais alienígenas [...] de origem estrangeira [grifo nosso] [...]. Assim, não há como a Justiça brasileira alcançar com facilidade os arquivos do administrador, e mesmo que o faça por meio de Carta Rogatória, a identificação do usuário é dificultada pelo uso dos apelidos ou nicks [grifo nosso] que são usados pela maioria dos que usam essa caixa postal" (Ibidem);

d) da possibilidade da adulteração de um e-mail (da sua fragilidade como prova): "Além desta dificuldade ainda há os piratas da informática, os conhecidos Hackers e mesmo terceiros de má fé que podem com algum conhecimento transcrever, modificar e divulgar as mensagens enviadas virtualmente. O e-mail, ao ser enviado ao seu destino, faz uma viagem com muitos caminhos e atalhos, indo primeiramente para o provedor responsável pelo envio da correspondência, para daí seguir em direção a outros servidores, até o seu destino final que é o destinatário. É uma viagem com paradas em vários pontos e sem a garantia de sua inviolabilidade. Em função dessa viagem pelo espaço cibernético, em que a mensagem passa por muitos pontos, ela se torna vulnerável de adulteração sem deixar rastros, o que a torna ao mesmo tempo uma prova frágil para o processo [grifo nosso], não perdendo no entanto o seu caráter indiciário" (Ibidem); e

e) da conclusão (da posição e das perspectivas para o futuro): "Em síntese, não existe ainda um modo seguro em relação as comunicações virtuais [grifo nosso] e entendemos que a escrita criptografada poderá melhorar sensivelmente a proteção [grifo nosso] a este tipo de correspondência e, em conseqüência a prova da existência de um e-mail, como verdade real, se torna extremamente frágil, servindo apenas como indícios da existência do fato [grifo nosso], sem falar na premência de legislação que normatize a comunicação virtual, como garantia de seus usuários, tanto para consigo próprios quanto para todas as relações interpessoais e mesmo empresariais" (Ibidem).

6.3Da posição de Leonardo Gurgel Carlos Pires

Pires entende ser possível considerar-se o e-mail diretamente como prova ou servir de base para outros meios probantes.

À luz dos arts. 332, 335, 348 a 351, 364, 366, 368, 369, 371, 373 a 377, 383, 384, 400, 420, 429, 436, 437, 440 e 441, do CPC, o doutrinador defende que:

a) a confissão pode servir para provar a autoria, o conteúdo e o envio de um e-mail, mas, regra geral, um juiz não pode nele aceitar uma confissão escrita, dada a sua grande facilidade para falsificação, fraude, interceptação ou adulteração, bem como pela inexistência de uma assinatura. Essa regra, entretanto, comporta exceções, como a utilização da confissão por e-mail no setor comercial, onde pode-se empregá-la como prova direta de negócios firmados pela internet;

b) um e-mail pode ser considerado um documento porque, mesmo imaterial, pode ser impresso, datado e assinado. A assinatura, muito importante para o direito e que nele inexiste, poderá ser dispensada no futuro, visto que os dados já costumam ser, hoje, criptografados [29] e, em alguns casos, dotados de códigos de segurança (equivalentes a assinaturas), para maior segurança das transações que guarnecem;

c) "a admissibilidade da prova testemunhal de um e-mail é extremamente plausível, se não houver como se utilizar os outros meios de prova", muito embora limitada, dada a incapacidade técnica da testemunha e da necessidade da sua presença no momento do recebimento e leitura do documento eletrônico;

d) "o exame, a vistoria e avaliação, consistem a base do exame pericial", que é feito por um perito nomeado pelo juiz. Ao perito de informática, o magistrado pode requerer o parecer para, v.g., identificar a autoria ou autenticidade de um e-mail; e

e) "pessoa" o e-mail não é, mas é coisa. Nesse sentido o juiz pode inspecionar o e-mail.

Posições essas sobre as quais constrói sua tese:

"A Lei fez por bem, com o interesse na mais absoluta correspondência da sentença com a justiça aplicada entre as partes e ao fato jurídico, de munir o juiz com todas as formas de por seus próprios olhos pesquisar e investigar sobre determinado assunto; com o e-mail isto não seria diferente [...]" (Pires).

"[...] Entendemos que para o e-mail ser apresentado como documento, o mesmo deve ser impresso datado e assinado por quem deseje apresentá-lo em juízo, se a questão versa sobre a veracidade do e-mail, então a mera apresentação deste não é suficiente, podendo ser acrescida da necessidade de outros meios de prova em relação a seu conteúdo, tais quais a prova pericial, a testemunhal, etc...

"É bom lembrar que o e-mail verificado por tabelião pode ser impresso e autenticado quanto a seu contéudo, atestando apenas o que o tabelião ver, valendo como certidão se portar fé de conformidade com o original" (Ibidem).

"Questão problemática é a de se verificar que determinada pessoa mandou um e-mail a outra, sendo que o emissor apagou todos os rastros de seu ato, como poderia ser ele acusado pela emissão, pois uma inspeção em seu computador não encontraria nenhum vestígio? Basicamente a prova seria mais pericial e testemunhal, dá-se o exemplo, uma pessoa presenciou o envio, no caso da prova testemunhal, ou o perito consegue rastrear através do provedor os acessos ou de programa específicos capazes de desfazer ações do tipo deletar ou formatar em um determinado computador, a exemplo do ´unformat´ comando para restaurar dados formatados.

"Caberia ao juiz dar ao perito plenos poderes e autorizações específicas para operar os registros dos provedores da internet, as ligações telefônicas e os computadores das partes, tanto o do autor quanto o do réu, estabelecendo a conexão entre o envio e o recebimento do e-mail" (Ibidem).

"A perícia, portanto é capaz de suprir a falta que a materialidade faz para com o e-mail, dando de acordo como o parecer a solução para as dúvidas relacionadas aos aspectos jurídicos daquilo a que com o e-mail se propõe a provar. Realmente a prova pericial é a mais completa em relação aos e-mails, sendo capaz de provar sua existência, autoria e veracidade" (Ibidem).

"Como ´coisa´, o e-mail pode ensejar a inspeção a mando de um juiz. Para tanto, o magistrado pode requerer a liberação dos registros de um provedor para fins de identificação da origem e da autoria de um e-mail ou requerer a inspeção do computador de um réu para descobrir vestígios que possam vir provar a emissão ou a recepção de um e-mail" (Ibidem).

Postulado isso, Pires conclui então:

"Constatamos que sobre o e-mail pode-se incedir bem ou mal todos os meios de prova admitidos em direito, mas quanto a [sic] utilização deste como prova, fica o mesmo sob a condição da prova de sua autenticidade e autoria, pois o mesmo é um meio extremamente frágil de comunicação, no que se refere a possibilidade de ser forjado, fraudado, danificado ou subtraído.

"A sociedade avançou e o direito não pode ficar na contra-mão da história, não deveríamos utilizar de hermenêutica quando podemos muito bem regular a correspondência eletrônica através de leis. Deveríamos pois estudar os aspectos jurídicos dos e-mails criando normas específicas para facilitar a identificação de sua autoria e autenticidade, bem como de froma [sic] a aumentar a segurança de sua transmissão

"É certo que o tempo traz a resposta para tudo, [sic] a cinquenta anos não pensavamos [sic] ter um computador em cada casa, [sic] no futuro talvez o e-mail seja abolido por uma forma de gravação visual, hoje ela já existe, ou a internet seja substituída por outra infovia, mas até lá continuaremos a regular nossas relações por leis antigas interpretadas de forma a trazer o máximo de justiça possível para a comunidade" (Ibidem).

6.4Da posição de Itamar Arruda Júnior

Em seu artigo Documentos eletrônicos, autoridades certificadoras e legislação aplicável, esse doutrinador avalia a matéria em espécie relativamente a:

a) a relação entre o documento tradicional e o documento eletrônico;

b) os requisitos de validade dos contratos eletrônicos;

c) a ausência de regulamentação da certificação digital; e

d) a aplicação da legislação vigente.

No que concerne à relação entre o documento tradicional e o documento eletrônico, Itamar Júnior sustenta que:

"É inegável que com o avanço da informática e o uso da Internet, inúmeros institutos jurídicos passaram por uma reformulação, ganhando uma nova roupagem de forma a se adequar ao mercado moderno. Nesta esteira, uma das mais importantes transformações se deu na conceituação de Documento.

"A expressão ´documento´, sempre veio atrelada a idéia de um escrito oficial que identifica uma pessoa. No meio jurídico, representa um escrito que faz fé daquilo que atesta, de forma que se apresentado em juízo, prova o que o litigante alega.

"Com efeito, observa-se que a idéia de documento sempre esteve ligada a imagem de algo escrito, com a perfeita identificação da pessoa, ou no caso de um contrato, dos contratantes.

"Com o advento da Internet e a sua rápida expansão pelo mundo, o conceito de documento teve que passar por uma adequação, de forma a se tornar viável a sua aplicação no meio virtual, tendendo a alcançar os mesmos objetivos já consolidados no meio tradicional.

"Dentro dessa nova conjuntura, surgiu então a conceituação do Documento Eletrônico, que guarda as principais características do Documento Tradicional, excetuando-se o meio no qual é celebrado e a questão atinente a identificação da pessoa.

"Dessa forma, podemos conceituar o Documento Eletrônico como sendo a representação não material de um fato, tendente a alcançar segurança jurídica.

"Em um paralelo entre as duas conceituações, poderíamos dizer que a principal diferença se dá no meio em que são celebrados, haja vista que os documentos tradicionais representam-se por escritos em papéis, enquanto o documento eletrônico se representa por bits."

Em relação aos requisitos de validade dos contratos eletrônicos, postula que:

"Verificado que um documento foi firmado em meio eletrônico, cumpre perquerir sua validade a fim de que se possa apurar sua segurança jurídica.

"Nesta apuração, para que um documento eletrônico tenha validade jurídica e possa servir, por si só, de meio probatório em juízo, mister a ocorrência de dois requisitos; impossibilidade de alteração do seu conteúdo e perfeita identificação das partes.

"Sabe-se que o meio virtual, apesar de representar um comércio promissor que movimenta milhões em cifras todos os dias, não é um meio totalmente seguro.

"Recebendo ou enviando uma proposta comercial, por exemplo, pelo computador, não se tem a real certeza de que as pessoas que estão negociando são quem de fato, dizem que são. Desta forma, caso um indivíduo fizesse uma compra em um site de vendas, e utilizasse o computador e nome de outra pessoa, não haveria como o real proprietário do computador e pretenso comprador, provar que de fato não foi ele quem realizou as compras, e sim um terceiro de má-fé.

"Visando solucionar estes problemas, vem ganhando espaço a figura da assinatura digital. Esta, pode ser entendida como um conjunto de códigos cifrados, que é atribuído a uma pessoa, como se fosse um senha bancária, e que se denomina chave privada.

"Associada a esta chave, há a chave pública, de conhecimento do destinatário do documento e que, associada a chave privada do emissor irá garantir que aquele documento foi realmente enviado pelo autor.

"Assim, para darmos um exemplo, sempre que o emissor terminar de redigir uma proposta comercial colocará ao final sua assinatura digital, e informará ao destinatário a sua chave pública, que é um outro conjunto cifrado de números que, associado aquela chave privada irá abrir a mensagem com a certeza de sua autoria.

"As mensagens enviadas eletronicamente, podem ser facilmente interceptadas e adulteradas por internautas de má-fé, de forma que ao alcançarem o seu destinatário podem não mais representar o que foi expresso pelo emissor, gerando assim, uma grande instabilidade comercial e jurídica.

"Foi buscando solucionar este problema, que vem surgindo a criptografia assimétrica.

"O recurso acima, pode ser entendido como uma técnica que identifica quando há adulteração na mensagem, de forma que, quando o destinatário final for associar a chave pública com a privada, esta não mais aparecerá no documento, demonstrando assim, que aquele conteúdo foi modificado no caminho até o destinatário.

"Com estes recursos, inegável que há total segurança jurídica nos documentos firmados no meio virtual, valendo estes como meio de prova em juízo, por si só."

Em relação à ausência de regulamentação da certificação digital, defende que:

"Na prática, a aplicação destes requisitos que concedem segurança jurídica aos documentos eletrônicos esbarram em questões burocráticas, e encontram limites à sua aplicação face a ausência de lei que regulamente à matéria.

"Como dito anteriormente, para que se tenha a segurança jurídica nas transações efetuadas pela Internet, mister a aplicação e uso da assinatura digital e da criptografia.

"A certificação digital seria a maneira pela qual se colocaria em prática tais requisitos visando a garantia de segurança no meio virtual, sendo a autoridade certificadora a responsável pela entrega dessas chaves, com a emissão de certificados eletrônicos, garantindo assim, autenticidade dos emissores e destinatários dos documentos firmados no meio virtual.

"Em outras palavras, poderia se dizer que a certificação digital é a tecnologia que, utilizada no comércio eletrônico, emitirá documentos de identidade eletrônicos para que pessoas e empresas se identifiquem na Internet.

"Não existe em nosso país, nenhuma legislação vigente que regule tal matéria, de forma que não se pode considerar os documentos eletrônicos, hoje, firmados em nosso país, como meio de prova por si só.

"Existem, entretanto, alguns projetos e anteprojetos de lei, que tramitam pelo Congresso Nacional, visando a regulamentação da matéria.

"Ocorre, que nenhum deles trata da matéria como deveria, deixando inúmeras margens de dúvidas quanto à aplicação prática e procedimento destas entidades certificadoras, havendo em alguns deles a compatibilização de duas formas de certificação de documento eletrônico; a por entidades privadas e a por tabelião, havendo a ressalva da lei de que não se confundem em seus efeitos. Também apresentam certa omissão quanto ao procedimento, controle e forma desta certificação."

Relativamente à aplicação da legislação vigente, sustenta que:

"Na ausência de lei que regulamente a matéria em nosso país, é necessário que busquemos dentro de nosso ordenamento jurídico, dispositivos legais que sejam aplicáveis a esta matéria, a fim de que possa o Judiciário solucionar as demandas que envolvam questões atinentes a estes documentos eletrônicos.

"Neste sentido, não resta dúvida de que a legislação vigente, em especial as disposições que tocam aos meios probatórios, podem e devem ser utilizados para comprovar a celebração de um negócio em meio virtual.

"Cumpre ressaltar, que o documento eletrônico aqui continua servindo de meio de prova, mas não por si só, sendo necessário que se junte a ele outros meios de prova admitidos em direito, a fim de que se possa proteger um eventual direito lesado."

Itamar Júnior, então, conclui que:

"De todo o exposto, ressai que há, indubitavelmente, uma necessidade de leis que regulamente as entidades certificadoras de documentos eletrônicos, quer sejam públicas, privadas, ou ambas coexistindo, a fim de que se possa dar segurança ao documentos eletrônicos de forma a que possam valer como meio de prova, por si só.

"Entretanto, enquanto não há a edição de leis neste sentido, podem e devem ser utlilizados todos os meios de prova admitidos em direito, em associação com o documento eletrônico, a fim de que se possa provar o alegado."

6.5Da posição de Maria da Conceição Barreto Gonzalez

A doutrinadora, em seu trabalho sobre Contratos eletrônicos: estudos básicos, também discorre sobre os Aspectos probatórios do e-mail, pela sua própria afinidade com o tema. Nele, entende ter, o e-mail, a natureza de um contrato eletrônico (um "novo mecanismo de realização dos contratos, que vêm somar-se aos tradicionais, como o verbal e o escrito"), e o avalia sob dois aspectos: o da segurança e o da validade jurídica do seu contrato (sustenta que o e-mail tem valor probatório somente se utilizar a técnica da criptografia):

Sustenta a autora que não há amparo legal a contratos dessa natureza (eletrônico), donde decorre a preocupação geral com a ineficiente segurança proporcionada pelo e-mail. Citando Angela Bittencourt Brasil (in Contratos Virtuais), lembra a criptologia ("ciência que estuda maneira mais segura e secreta para a realização das comunicações virtuais"), composta da criptografia [30] e da criptoanálise, como capaz de oferecer os recursos necessários a essa segurança, "sem a qual a relação jurídica está fadada ao fracasso". Para ela, a Criptografia, é o meio eficaz procurado, pois "pode ser usada para conferir assinaturas eletrônicas", dada "a certeza de que ele não foi alterado de alguma maneira pelos caminhos que percorreram até chegar ao destinatário". Mais ainda, "caso isso não ocorra, o documento perde o seu valor probante".

Quanto à validade jurídica, a despeito das controvérsias, entende que o contrato eletrônico se consubstancia num negócio jurídico, "vez que não podem ser tratados efetivamente como documentos jurídicos". Atenta a autora às seguintes questões: identidade das partes (falsidade ideológica, incapazes, etc), integridade do conteúdo do contrato (possibilidade de alterações), e falta de assinatura de próprio punho dos contratantes, talvez um dos maiores problemas envolvendo os contratos eletrônicos. Afinando-se a outros doutrinadores e citando Chiovenda, concorda a autora no sentido de que o e-mail enquadra-se no conceito amplo de documento: "O art. 332 do CPC preceitua que são hábeis para provar a verdade dos fatos, ainda que não nominados, todos os meios legais e moralmente legítimos. Assim, a admissibilidade e aproveitamento de meios de prova atípicos deflui, também, do princípio da livre apreciação dos elementos de convicção: Justamente admissão destas provas realça o critério mais seguro para saber se um sistema processual trilha o princípio da livre apreciação judicial da prova [31]".

Ao final, conclui pela admissibilidade condicionada do e-mail como prova, condicionando-o à autenticidade de sua autoria, face à possibilidade de forja, fraude, dano ou subtração:

"Em decorrência da popularização da internet, o meio utilizado pelos indivíduos para interagirem que inicialmente era tão somente a linguagem falada, posteriormente veio os telegráfos e cartas, atualmente tem sido o e-mail, um importante instrumento para tal.

"Ao inscrever-se numa conta de e-mail estamos realizando um Contrato Eletrônico. Há cláusulas, há necessidade de aceitação destas, enfim existem uma infinidade de características de um contrato. De outro modo o e-mail é um instrumento pelo qual se realizam outros contratos. Ele pode enviar propostas e receber a aceitação das mesmas.

"O e-mail fisicamente não existe, ele envia mensagens, que correspondem à tradução de dados codificados. De modo que uma computador ligado à internet pode transmitir e receber essas mensagens escritas de outros computadores também conectados à rede.

"Essa impossibilidade de torná-lo algo palpável, físico, dificulta a sua utilização como meio de prova num processo.

"Além dessa carência de ser materialmente possuido, o e-mail tem um outro grande problema que é a identificação do destinatário. Em decorrência dessa possibilidade de existirem sites que oferecem e-mails gratuitos, e da falta de exigência na caracterização pessoal na inscrição, qualquer indivíduo pode mandar um e-mail.

"Segundo o entendimento hermenêutico do art. 332 há possibilidade de o e-mail ser obejto de prova vez que é ´moralmente legítimo´.

"Entretanto, subsiste o problema da materialidade do e-mail. Aos autos do processo anexam folhas de papel de modo que o e-mail enquanto dado eletrônico que é não pode ser anexado como forma nenhuma. Se tem que ser apresentado como documento deve ele está impresso, datado e assinado por quem deseje apresenta-lo em juízo [32].

"O e-mail, como já foi dito, pode ser objeto de prova. Entretanto, está condicionado à prova da autenticidade de sua autoria, vez que é possível de ser forjado, fraudado, danificado ou subtraído" (Gonzalez).

5.6Da posição de Patrícia Regina Pinheiro Sampaio e Carlos Affonso Pereira de Souza

Os doutrinadores, citando José Setti Diaz, e fundamentando-se no art. 332, do CPC, postulam que "o meio digital é forma capaz de fornecer validade ao contrato eletrônico, em respeito ao princípio da liberdade das formas negociais", visto que o direito prevê que o contrato poderá adotar qualquer das formas não vedadas pela lei (CPC). Mas vinculam, ainda, o valor probante de um documento eletrônico ao atendimento da seguinte condição: existência de uma assinatura digital (por meio dela o e-mail "encontra-se protegido contra modificações em seu conteúdo").

6.7Da corrente preponderante

Das teses sustentadas pela doutrina pesquisada, percebe-se a admissibilidade como ponto comum. Divergem, entretanto, no que diz respeito à forma como o e-mail como prova pode ser levado aos autos de um processo judicial: se mediante uma perícia, ou se mediante a fácil constatação de determinadas condições (certificação digital, criptografia, etc.). Das duas correntes, percebe-se, na doutrina, a predominância da primeira sobre a segunda.

6.8Da tendência na doutrina

Viu-se no tópico anterior que há, atualmente, uma prevalência da posição que entende ser a mensagem digital admissível como prova em processos judiciais mediante a realização de uma perícia técnica. Entretanto, face ao avanço tecnológico no sentido de dar-se mais segurança ao contrato eletrônico do e-mail, percebe-se uma tendência na direção da segunda tese, qual seja a admissibilidade mediante constatação de determinadas condições, como consequência da tendência de acentuar-se o uso da criptografia e da certificação digital.


7.Da jurisprudência em relação ao uso do e-mail como prova nos processos judiciais

Aqui, deseja-se tão somente expor em que sentido segue o Poder Judiciário brasileiro com suas decisões, relativamente à matéria ora trazida à baila, isto é, responder às seguintes perguntas: o que se tem decidido nos tribunais sobre a validade probatória do e-mail em processos judiciais? Em que sentido apontam as suas decisões?

A seguir, exibe-se algumas das sentenças prolatadas em tribunais brasileiros sobre a utilização de e-mail como provas nos processos judiciais. Não obstante desejar-se utilizar na seleção de casos o critério da relevância jurídica e dos graus de repercussão na mídia eletrônica, fez-se tão somente filtrar os que se apresentaram, dada a ainda pouca disponibilidade de decisões em relação à matéria ora abordada no presente trabalho. Ressalva-se, aqui, que não se encontrou decisões judiciais sobre os casos polêmicos citados em tópico adiante.

a) caso 1 – STF (MS-23514 / DF): que refere-se à servidor público federal, lotado na Secretaria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União, impetra mandado de segurança, com pedido de liminar, contra ato do Presidente daquela Corte, alegando que foi excluído do rol de usuários do sistema de correio eletrônico (e-mail), sem abertura de processo administrativo;

b) caso 2 – STJ (Apelação Cível n 51884-7/188): que refere-se à ofensa à imagem através da internet; e

c) caso 3 – STJ (Agravo de Instrumento 70000708065): que refere-se à ofensa à imagem através da internet por meio de mensagens anônimas de correio eletrônico.

7.1Da decisão do caso 1 – STF (MS-23514 / DF)

Embora a decisão do Tribunal tenha sido no sentido de arquivar o Mandado de Segurança por incompatibilidade de pedido com a via judicial eleita, percebe-se, do seu texto, a posição do relator (Ministro Maurício Corrêa) no sentido de que o atendimento ao pleito acarretaria dilatação no rito processual, donde se supõe a necessidade imperiosa que vê o Ministro no sentido de realizar-se alguma diligência (tal como a perícia técnica):

"18. Demais, o impetrante contesta o fundamento fático que teria levado a autoridade impetrada a praticar o ato impugnado, alegando possíveis adulterações do texto do e-mail, o que demandaria dilação probatória [grifo nosso], incompatível com a via eleita" (Brasil, in Mandado de Segurança nº 23.514 – DISTRITO FEDERAL).

Chama-se atenção, na mesma decisão, o rumo que toma a defesa do réu no sentido de explorar a falta de credibilidade no e-mail face à sua facilidade de adulteração.

7.2Da decisão do caso 2 – STJ (Apelação Cível n 51884-7/188)

"Ementa: DANO MORAL. INTERNET. PROVA. ÔNUS. 1. O ônus da prova cabe a quem alega, devendo o interessado dilingenciar a respeito e não esperar que o judiciário cumpra diligência que lhe compete [grifo nosso]. Se a parte nada providencia e se conforma com a inércia judicial perante a diligência requerida, deve arcar com o ônus de sua inapetência. Cerceamento de defesa não configurado. 2. Responde por dano moral aquele que faz veicular, via Internet, mensagem ofensiva de imagem de outrem [grifo nosso], associando-o a crime ainda não desvendado judicialmente. Ofensa evidente que prescinde de prova contundente [grifo nosso], ainda mais em face da gravidade da denúncia e da sua repercussão. 3. Mantém-se o quantum estabelecido a título de indenização, uma vez que, para sua fixação, foram consideradas as circunstâncias do fato e a condição financeira do ofensor. Apelo conhecido e improvido. DECISÃO: Conhecido e improvido, à unanimidade" (Brasil, in Apelação Cível nº 51884-7/188 - GOIÁS).

7.3Da decisão do caso 3 – STJ (Agravo de Instrumento 70000708065)

"Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO – CAUTELAR INOMINADA – DIVULGAÇÃO, VIA INTERNET, ATRAVÉS DO SERVIÇO DE CORREIO ELETRÔNICO HOTMAIL, DE MENSAGENS DIFAMATÓRIAS ANÔNIMAS – MEDIDA DIRIGIDA CONTRA O PRESTADOR DO SERVIÇO DE CORREIO ELETRÔNICO E OBJETIVANDO, ENTRE AS PROVIDÊNCIAS, A IDENTIFICAÇÃO DA ORIGEM – CABIMENTO – Demonstrada a ocorrência de propagação de mensagens ofensivas a terceiros, difamando e caluniando o agravante, divulgadas através da Internet, via serviço de correio eletrônico, e anônimas, caracterizada a fumaça do bom direito e risco de lesão irreparável, é de ser concedida medida liminar [grifo nosso] dirigida ao prestador de serviço para que proceda a identificação do remetente, seu usuário, inviabilizada pelos meios comuns, e que bloqueie a fonte. Agravo provido" (Brasil, in Agravo de Instrumento nº 70000708065).

Chama-se atenção, na decisão, a posição do desembargador de considerar o e-mail como meio de satisfação de um dos dois pressupostos da concessão de medida liminar em Mandado de Segurança, qual seja o fumus boni iuris, e não como uma fiat (algo passível de ter sido criado).

7.4Da tendência no Poder Judiciário

No Brasil, a jurisprudência tem indicado uma tendência no sentido de seguir a posição dominante da doutrina, qual seja a da admissibilidade indireta e incondicionada, pela qual entende-se ser a mensagem digital admissível como prova em processos judiciais mediante, porém, a realização de uma perícia técnica.


8.Da legislação relativa ao e-mail em geral, e em especial a da sua utilização como prova no direito

Por fim, intuita-se expor o que já existe de normas jurídicas sobre a matéria tema do trabalho e o que está porvir no Brasil, isto é, responder às seguintes perguntas: o que já se encontra positivado sobre a utilização de e-mail como provas nos processos judiciais brasileiros? E em que sentido aponta o espírito do Poder Legislativo pátrio?

8.1Da legislação existente

Não obstante o meio virtual já negociar expressivos valores em seu mercado, ainda não se tem, no Brasil, uma verdadeira legislação que regule as suas atividades. Invariavelmente recorre-se à analogia para adequar a normas de direito já postas (por similitude), questões que dele (o meio virtual) decorrem. Especificamente, tem-se tão somente algumas miríades de instrumentos normativos, tais como (vide alguns trechos desses documentos em tópico anterior: Da prova no direito positivado):

a) a Lei nº 9.800, de 26 de maio de 1999: permite às partes a utilização de sistema de transmissão de dados para a prática de atos processuais; e

b) a Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2001: instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil e transformou em autarquia o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação – INT.

Quanto à Medida Provisória, surgiu sob críticas. Embora tenha trazido alguns ganhos, pecou por algumas omissões. Ela criou o ICP-Brasil, um supercartório digital monopolista, atribuiu ao Instituto Nacional de Tecnologia – INT, autarquia federal, "a autoridade certificadora raiz da Infra-Estrutura ICP", cuja incumbência é a de conferir autenticidade, integridade e validade jurídica de documentos eletrônicos às aplicações de suporte e aplicações habilitadas, bem como de realizar transações eletrônicas seguras, por meio do seu processo de certificação (presunção de verdade em relação aos signatários). Em relação à transformação do INT em autarquia, alguns doutrinadores enxergam uma tendência à criação de uma agência reguladora para o setor. Observam eles, ainda, que: "Essa reserva de mercado impede a competitividade e inviabiliza a participação de empresas privadas no vasto ambiente da certificação. Melhor faria ao mercado se a atividade fosse desempenhada segundo os critérios da livre concorrência, proporcionando aos certificados emitidos pelas empresas particulares, validade jurídica idêntica àqueles concedidos pela ICP" (Ferreira).

Gonzalez ainda acrescenta: "A medida provisória [...] nada fala dos mecanismos que irão substituir as assinaturas de punho, ou das garantias que as implementações de tais mecanismos devam oferecer aos titulares das chaves. Pela MP, um documento só terá sua validade jurídica comprovada se possuir assinatura digital certificada por uma autoridade que, por sua vez, deve ser licenciada pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil. ´Essa estrutura ainda não existe e não há como se precaver em caso de problemas na Justiça´, disse Blum. Antes da MP, as empresas podiam apresentar documentos eletrônicos simples ou contratar uma certificadora privada. Caso não haja acordo para fundir os termos de cada texto e aprovar uma lei só, espera-se que o substitutivo continue em tramitação e, quando aprovado, revogue a medida provisória nos itens que forem conflitantes."

8.2Da legislação em elaboração

Para suprir a deficiência da legislação já existente e ajustar o Brasil à nova conjuntura mundial, vem sendo elaborado uma grande variedade de Projetos de Lei no país, todos com o propósito de regulamentar a validade do documento eletrônico (através da certificação digital e da criptografia assimétrica), mas, sobretudo, o próprio comércio eletrônico, os crimes a ele inerentes e os efeitos jurídicos decorrentes das relações jurídicas que lhes são afetas.

A partir de pesquisa pela palavra chave "correio eletrônico" no site do Senado Federal, encontrou-se as seguintes matérias em tramitação nas casas legislativas:

Tipo de Matéria

Quantidade

PLS

-

PROJETO DE LEI DO SENADO

1

Total (Senado e Congresso):

1

a) o PLS 228 2000 DE 19/10/2000: ementa: dá nova redação ao art. 1º da Lei nº 9.800, de 26 de maio de 1999, que permita às partes a utilização de sistema de transmissão de dados para a prática de atos processuais. Situação: aguardando designação do relator.

Pesquisa pela palavra chave "internet":

Tipo de Matéria

Quantidade

PLC

-

PROJETO DE LEI DA CÂMARA

5

PLS

-

PROJETO DE LEI DO SENADO

12

PRN

-

PROJETO DE RESOLUÇÃO (CN)

1

PRS

-

PROJETO DE RESOLUÇÃO DO SENADO

3

RQS

-

REQUERIMENTO (SF)

1

Total (Senado e Congresso):

22

a) o SF PLS 137 2000 DE 11/05/2000: ementa: estabelece nova pena aos crimes cometidos com a utilização de meios de tecnologia de informação e telecomunicações. Situação: matéria com a relatoria;

b) o SF PLS 151 2000 DE 24/05/2000: ementa: dispõe sobre acesso a informações da Internet, e dá outras providências. Situação: remetido à câmara dos deputados;

c) o SF PLS 228 2000 DE 19/10/2000: ementa: dá nova redação ao art. 1º da Lei nº 9.800, de 26 de maio de 1999, que permita às partes a utilização de sistema de transmissão de dados para a prática de atos processuais. Situação: aguardando designação do relator;

d) o SF PLC 65 2001 DE 23/08/2001: ementa: altera a Lei nº 9.800, de 26 de maio de 1999, para permitir o uso da Internet na transmissão de dados em atos processuais e dá outras providências; e

e) o SF PLC 95 2001 DE 08/10/2001: ementa: altera o parágrafo único do artigo 541 do Código de Processo Civil - Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, para admitir as decisões disponíveis em mídia eletrônica, inclusive na Internet, entre as suscetíveis de prova de divergência jurisprudencial, para os fins do artigo 105, III, c, da Constituição Federal. Situação: pronto para a pauta na comissão.

A partir de pesquisa no site http://www.direitonaweb.adv.br, encontrou-se as seguintes matérias em tramitação nas casas legislativas:

a) o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 1.483, de 1999: institui a fatura eletrônica e a assinatura digital nas transações de "comércio" eletrônico. (Incluído o Parecer do Deputado Federal Júlio Semeghini favorável à aprovação do Projeto de Lei);

b) o Substitutivo ao Projeto de Lei nº 1.483, de 1999 (Apensado ao Projeto de Lei nº 1.589/1999): dispõe sobre a validade jurídica do documento eletrônico e da assinatura digital, regula a certificação digital, institui normas para as transações de comércio eletrônico e dá outras providências. (Incluído o Parecer do Deputado Federal Júlio Semeghini favorável à aprovação do Projeto de Lei);

c) o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 1.589, de 1999: dispõe sobre o comércio eletrônico, a validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital, e dá outras providências;

d) o Projeto de Lei do Senado Federal nº 672, de 1999: dispõe sobre o comércio eletrônico (Incluído o Parecer do Senador José Fogaça favorável à aprovação do Projeto de Lei); e

e) o Anteprojeto de Lei sobre Comércio Eletrônico apresentado pela OAB-SP ao Deputado Michel Temer: dispõe sobre o comércio eletrônico, a validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital, e dá outras providências. (Anteprojeto que deu origem ao Projeto de Lei da Câmada dos Deputados nº 1.589/1999).

São, ainda, iniciativas que tramitam nas casas legislativas:

a) o anteprojeto de lei sobre a informatização do processo judicial da AJUFE - Associação dos Juízes Federais do Brasil, acolhida pela Comissão de Legislação Participativa da Câmara Federal, que propõe, dentre outros pontos: 1. a regulamentação da informatização do processo judicial, admitindo o recebimento, o intercâmbio e o envio de documentos por meio exclusivamente eletrônico, incluindo não apenas as comunicações relativas ao processo, mas também a transmissão de peças processuais entre órgãos do Poder Judiciário. O uso do meio eletrônico dispensaria a apresentação dos documentos originais; e 2. o emprego da tecnologia de gravação de som, imagem ou reconhecimento de voz para fins da redução a termo de atos processuais;

b) o Projeto de Lei nº 76, de 2000, de autoria do Senador Renan Calheiros, que define e tipifica os delitos informáticos. Na sua justificação da Lei, esclarece que "entre as condutas ilícitas mais comuns que constituem os chamados ´delitos informáticos´ estão: o acesso não autorizado a computadores e sistemas eletrônicos, a destruição e alteração da informações, a sabotagem por computadores, a intercessão de correio eletrônico [grifo nosso], a fraude eletrônica e a transferência ilícita de fundos"; e

c) o Projeto de Lei da Casa Civil, que dispõe sobre a autenticidade e o valor jurídico e probatório de documentos produzidos, emitidos ou recebidos por órgãos públicos federais, estaduais e municipais, por meio eletrônico.

De todos as propostas anteriores, merecem destaque o Projeto de Lei de autoria da Casa Civil e o Projeto de Lei nº 1.589/99. Para comentar o primeiro deles, recorre-se às anotações de Aldemário Castro. Em seu artigo Validade jurídica de documentos eletrônicos: considerações sobre o projeto de lei apresentado pelo governo federal, apresenta os seus defeitos e aponta as suas virtudes, que podem ser assim resumidas: a) limita-se ao setor público; b) não contempla a produção e a circulação de documentos particulares, mas tão somente o seu arquivamento por meio magnético ou similar; c) adota a diretriz de não consagrar determinada tecnologia por edição de norma de direito; d) "comete um erro inaceitável na definição da abrangência de seus efeitos"; e) "deixa de regular inúmeros aspectos cruciais relacionados com os documentos eletrônicos"; e f) "afasta a validade jurídica, hoje presente, dos documentos eletrônicos quando não asseguradas, por meio hábil, a autenticidade e a integridade". Observa, ainda, o autor:

"[...] alguns países, notadamente na América Latina, iniciaram a normatização dos documentos eletrônicos por intermédio de diplomas legais restritos à Administração Pública. Nesta tendência se inclui o Brasil com a edição do Decreto n. 3.587, de 5 de setembro de 2000. Portanto, o próximo passo a ser dado consiste justamente em regular o assunto para todas as relações jurídicas (públicas e privadas) ocorridas na sociedade. Aparentemente não tem sentido continuar a trilhar este caminho apenas nos domínios públicos" (Castro).

"Existe [...] um aspecto do uso da assinatura digital que a nosso ver não poderia ser deixado ao regulamento: a definição do sistema de certificação e credenciamento, processos cruciais para garantia das pretendidas autenticidade e integridade. Entre outros razões, a polêmica doutrinária acerca da extensão da atividade notarial (art. 236 da Constituição Federal) reclama tratamento legal. Afinal, a Lei n. 8.935, de 18 de novembro de 1994, estabelece que os serviços notariais destinam-se, entre outras finalidades, a garantir a autenticidade dos atos jurídicos [33].

"Por fim, deve ser ressaltado que atualmente, antes da edição de qualquer lei sobre a matéria, a validade jurídica dos documentos eletrônicos não pode ser recusada, em função do disposto nos arts. 82, 129, 136 e 1.079 do Código Civil e dos arts. 131, 154, 244, 332 e 383 do Código de Processo Civil. O projeto, tal como posto, terminaria por subtrair a validade dos atuais documentos eletrônicos. Afinal, somente seria reconhecido valor jurídico e probatório aos documentos eletrônicos onde fossem assegurados a autenticidade e a integridade (art. 1o. do Projeto). Estes condicionamentos não condizem com a tradição de liberdade de forma dos atos jurídicos no direito brasileiro, onde se admite até o contrato verbal ou por manifestação tácita de vontade" (Ibidem).

O Projeto de Lei nº 1.589/99 teve por autor o Deputado Luciano Pizzato e origem no anteprojeto de lei da OAB para o comércio eletrônico, que dispunha sobre o comércio eletrônico, a validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital. Traz apensado o Substitutivo ao Projeto de Lei nº 1.483, de 1999, que teve por autor o Deputado Dr. Hélio, e por relator o Deputado Júlio Semeghini. Para comentá-lo, recorre-se a Itamar Arruda Júnior. Em seu artigo Considerações ao PL n. 1589/99 esclarece que o documento é "baseado no modelo da UNCITRAL e na diretriz da União Européia, dispõe sobre o comércio eletrônico, a validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital". Mais ainda que:

"No tocante a validade jurídica do documento eletrônico, as disposições daquele instituto são expressas ao considerar sua originalidade, sempre que for assinado pelo autor, utilizando-se da assinatura digital e do sistema de criptografia assimétrica, havendo, nestes casos, a presunção de veracidade do conteúdo do documento, em relação ao autor.

"Entretanto, não se trata de presunção absoluta, sendo mister a observância de determinados requisitos, também elencados no anteprojeto, tais como; de que seja a assinatura digital única e exclusiva para o documento que foi firmado, seja possível a identificação de sua validade, que o acesso a assinatura eletrônica seja exclusivo do signatário, que esteja vinculada a totalidade do texto do documento, e que não tenha sido gerada após o prazo para a sua expiração, que segundo o instituto, será de 2 (dois) anos, na ausência de sua estipulação, quando, então, caberá a parte a quem a assinatura beneficiar comprovar que foi a mesma gerada em período anterior a expiração ou a revogação.

"No concernente ao comércio eletrônico, o anteprojeto possui várias disposições que regulamentam a oferta de produtos e serviços por meio eletrônico, assegurando direitos e deveres individuais e coletivos dos consumidores.

"Também merece destaque, as disposições atinentes aos provedores de acesso e armazenamento, que regra geral, ficam isentos da responsabilidade pelo conteúdo das informações movimentadas pelos seus usuários ou clientes.

"Um dos pontos mais controvérsos do anteprojeto, é indubitavelmente a questão da regulamentação da certificação digital.

"As entidades certificadoras foram divididas em dois grupos; entidades certificadoras privadas, de natureza comercial, e as certificações eletrônicas por tabelião, havendo uma clara distinção entre os efeitos dos serviços prestados por elas, que teriam suas atividades sujeitas ao controle do Poder Judiciário e do Ministério da Ciência e Tecnologia.

"A distinção nos efeitos das atividades das duas autoridades certificadoras, pode ser constatada a partir de um paralelo entre as disposições dos arts. 24 e 25, do anteprojeto:

"O art. 24 dispõe, in verbis:

´Os serviços prestados por entidades certificadoras privadas são de caráter comercial, essencialmente privados e não se confundem em seus efeitos com a atividade de certificação eletrônica por tabelião, prevista no Capítulo II deste Título.´

"Rege o caput do art. 25, in verbis:

´O tabelião certificará a autenticidade de chaves públicas (grifo nosso) entregues pessoalmente pelo seu titular, devidamente identificado; o pedido de certificação será efetuado pelo requerente em fichá própria, em papel, por ele subscrita, onde constarão dados suficientes para identificação da chave pública, a ser arquivada em cartório.´

"Assim, resta claro que a certificação realizada por entidades certificadoras particulares, embora legítima, não gera presunção de autenticidade perante terceiros, ficando a cargo exclusivo do tabelião a atividade garantidora da identidade do signatário de documento digital.

"Ao conceder exclusividade ao tabelião para autenticar chaves públicas, nota-se uma clara e inequívoca contradição entre as disposições do anteprojeto e a finalidade do mesmo. Isto porque, se o objetivo é regulamentar um mercado moderno, veloz e de alta tecnologia, sendo mister que a certificação feita pelas autoridades particulares possuísse os mesmos efeitos da certificação por tabelião, haja vista que tais entidades possuem um volume de recursos muito maior do que as entidades públicas, que dificilmente conseguirão montar o aparato tecnológico necessário para acompanhar a rapidez do mercado eletrônico e seu rápido e constante desenvolvimento.

"Assim, limitar a competência para autenticar a chave pública ao tabelião, consagrando o velho hábito do cartorialismo, é como criar uma barreira ao fluxo natural do próprio comércio eletrônico, o que implicaria de maneira inconteste, no afastamento do Brasil deste tão relevante mercado.

"De todo o exposto, pode-se dizer que o anteprojeto é, indubitavelmente, uma obra bem elaborada, visando a disciplinar um mercado carente de regulamentação, e cuja expansão se dá a uma velocidade cada vez maior.

"Entretanto, se faz necessária a modificação de algumas disposições, em especial as que tocam às autoridades certificadoras, a fim de que se possa contar com uma legislação em perfeita consonância com o mercado eletrônico e seus novos institutos."

Do exposto, vê-se que o legislador brasileiro não se encontra afinado com a doutrina nacional e, não raro, tem importado soluções do direito alienígena que não se adequam à realidade pátria. Carece o país, vale repetir, da necessária regulamentação do setor. É muito incipiente o que foi feito até o presente momento e incompletas as propostas apresentadas ao Poder Legislativo.


9.Do e-mail como prova no direito internacional

No direito internacional, a Lei modelo da UNCITRAL sobre comércio eletrônico (Resolução 51/162 da Assembléia Geral Das Nações Unidas – ONU – Nova York, de 16 de dezembro de 1996) tem servido de parâmetro para muitos países regulamentarem o comércio eletrônico. No que interessa à presente matéria, Ângela Brasil (in O documento físico e o documento eletrônico) anota:

"A UNCITRAL estabelece que para que o documento eletrônico tenha o mesmo valor probatório dos documentos escritos é preciso que eles tragam o mesmo grau de segurança contido nestes, sendo que para que isto aconteça é necessário o uso de recurso técnicos, que logo vemos que se trata do método cifrado.

"Diz a Comissão que para que o documento virtual tenham a mesma função e considerada como documento escrito, tal qual o documento convencional é preciso que ela fique disponível para consultas posteriores, sendo que o objetivo desta norma é a possibilidade de reprodução e leitura ulterior.

"Para o reconhecimento da assinatura no documento eletrônico a UNCITRAL prescreve que ela deve estar de modo a identificar a pessoa por algum método, e é obvio que esse método a que se refere é a Criptografia, pois é a única forma segura de garantir a autenticidade do assinante. Vários países já adotaram o modelo da UNCITRAL, como os Estados Unidos, a Alemanha, a França, a Argentina, Colômbia e outros que estão ultimando as suas legislações. O Brasil, ainda que seja um dos países que mais utiliza a Internet, ainda não tomou a iniciativa de legislar sobre o assunto.

"Reconhecemos que no documento eletrônico não há como distinguir o original da cópia e para contornar este óbice, a regra da Comissão afirma que um documento eletrônico será original quando houver a garantia de que ele chegou íntegro ao destinatário e aqui da mesma forma, temos o problema da segurança. Aliás esta é a chave para resolver a grande maioria das questões cibernéticas e o passo que está faltando para que as questões jurídicas, no seu passo, também sejam solucionadas."

Nos Estados Unidos, diversos Estados-federados vem promulgando leis para o reconhecimento jurídico das assinaturas eletrônicas. Conferindo, assim, validade jurídica às certificações eletrônicas no respectivo território. Entretanto o clima à nível nacional ainda é de indefinição, pois esses instrumentos normativos não indicam qual sistema irá prevalecer (não há uma uniformização nacional dos instrumentos normativos relativos ao comércio eletrônico ou se as entidades certificadoras serão privadas, públicas ou mistas).

Na Europa, há a Diretiva Européia 1999/93/CE, de 13 de dezembro de 1999, que trata, especificamente, das assinaturas eletrônicas e de seu reconhecimento legal e processual, inclusive como meio de prova. Tal documento admite a existência de instituições privadas autenticadoras habilitadas junto ao respectivo Estado-Membro da Comunidade Européia.

Conforme Gozalez, o Ante-Projeto de Lei Uniforme que vem sendo desenvolvido por grupo de trabalho para a Organização dos Estados Americanos baseia-se nos seguintes instrumentos normativos:

a) na Lei Modelo da UNCITRAL;

b) na Diretiva Européia 1999/93/CE e seus Anexos;

c) em alguns princípios constantes da Inter-American Convention on the Law Applicable to International Contracts, particularmente com referência à autonomia das partes.


10.Dos casos polêmicos

A fim de ilustrar o ponto a questão se encontra no Brasil, relata-se a seguir dois casos polêmicos, para os quais, ressalva-se, não se encontrou decisões judiciais em pesquisas realizadas pela internet:

a) Delfina Maria Figueira de Mello Nevares e Reginaldo de Castro; e

b) estudante anônima e ex-colega de colégio.

10.1Do caso Delfina Figueira de Mello Nevares versus Reginaldo de Castro

O caso entre esses dois advogados, que resultou em ação judicial no Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ/DF), foi noticiado pela imprensa brasileira em duas matérias de Heitor Shimizu para a revista Época On-line, com os seguintes títulos: "Roupa suja na rede" e "O e-mail da discórdia - Tribunal proíbe internauta de enviar mensagens a ex-marido e exige que provedor faça a censura".

Na primeira reportagem, mais curta, o profissional relata:

"Delfina de Mello Nevares teria enviado um e-mail a diversas pessoas acusando o ex-marido de subornar autoridades. Ela não dá entrevistas nem se deixa fotografar.

"Reginaldo de Castro, o ex-marido, nega as acusações e pediu à Justiça a censura dos e-mails enviados por Delfina" (Shimizu).

Na segunda, mais longa, Heitor Shimizu explica a origem do embate e o desenrolar da questão no Poder Judiciário: a) Delfina Nevares teria enviado mensagens de conteúdo calunioso, em março de 1997, à Reginaldo de Castro, presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); b) o TJ/DF proibiu a dvogada de enviar e-mails e determinou a censura, pelo provedor Zaz Brasília, dos que forem enviados; c) Delfina Nevares, negou as acusações e "entrou com um mandado de segurança no Superior Tribunal de Justiça (STJ) por entender que a sentença do TJ agride seu direito ao sigilo de correspondências, garantido pela Constituição", sustentando, ainda, que: "o e-mail, legalmente, não pode ser considerado documento e, portanto, não pode ser usado como prova [grifo nosso]. ´Um e-mail é apenas um monte de bits digitais que pode ser facilmente interceptado e adulterado em seu curso´"; d) a Associação Brasileira dos Provedores de Internet (Abranet) manifestou-se no sentido de que "os provedores não devem censurar o conteúdo das mensagens de seus usuários", mas a decisão judicial deverá cumprida; e) o "provedor usado pela advogada, alega não ter condições técnicas de controlar o conteúdo dos e-mails de seus usuários. ´Nenhum provedor dispõe de formas eficazes de controle de dados e informações transmitidas por meio da rede´"

10.2Do caso Estudante versus Ex-colega do colégio Nossa Senhora Aparecida (SP)

O caso entre esses estudantes foi veiculado na internet (em página de reputada revista nacional – Isto É Dinheiro) com o título "E-mail como prova?" e o seguinte conteúdo:

"Um caso inédito pode ganhar jurisprudência em São Paulo. Depois de ser insultada em e-mails por um ex-colega, uma estudante do colégio Nossa Senhora Aparecida, no bairro de Moema, entrou na Justiça para acabar com a brincadeira de mal-gosto. De acordo com o processo, foram 56 ofensas em três mensagens, entre elas: inútil, espinhuda, "desprezada" e "sem calcinha". A ação pode vingar. As mensagens foram recebidas por outros colegas, o que pode atestar que os textos são originais. Além disso, algumas ofensas partiram de um provedor pago, o que pode confirmar a identidade do autor, que tem 17 anos. A advogada está pedindo R$ 30 mil a título de indenização. Quem pode pagar a conta é o pai do engraçadinho. E o rapaz pode arcar com serviços para a comunidade" (Isto É Dinheiro).

10.3Do caso Microsoft

À título ilustrativo, convém registrar a ocorrência do seguinte episódio em um país da América do Norte em que o e-mail figura como centro de uma questão judicial:

"Nos Estados Unidos, uma das principais armas dos promotores do caso Microsoft, acusada de promover práticas ilegais para prejudicar os concorrentes, são milhares de e-mails enviados e recebidos por funcionários, obtidos por ordem judicial. Vários deles têm como remetente Bill Gates, o mandachuva da Microsoft. Os advogados da empresa alegam que os e-mails não constituem prova legal. Os promotores não concordam. Lembram que mensagens eletrônicas têm importante papel legal há tempos, como no caso Irã-contras, em 1985, em que os e-mails encontrados no computador do coronel Oliver North foram fundamentais para provar que o governo americano vendeu armas ao Irã e usou o dinheiro para financiar guerrilheiros na Nicarágua" (Shimizu).


11.Conclusão

Fruto da evolução do homem, a internet tornou-se um fenômeno social, constituiu-se em uma nova modalidade de se estabelecer uma relação jurídica entre os seres humanos, trouxe o comércio eletrônico, que alcançou níveis significativos da economia mundial na última década (a tendência é de incremento constante das suas operações, inclusive nos países em desenvolvimento como o Brasil) e, com ele, o surgimento contratação eletrônica, que cresce em ritmo progressivo e notório no país. Em decorrência disso, a grande rede e as operações dela advindas necessitam de amparo jurídico para a solução de conflitos que já começam a ganhar proporções consideráveis em face do aumento dos choques de interesses que dela emergem.

O e-mail, o serviço de troca de mensagens digitais da internet, é apenas uma das suas diversas facetas. Por não ficar registrado em papel e não conter assinaturas e ser de fácil alteração (os freqüentes ataques dos hackers e crackers ainda é muito presente, o que demonstra que a criptografia não atingiu o ponto de segurança satisfatória), é controversa a sua utilização como prova no direito.

Como toda inovação, esse serviço de mensagens carece da normatização adequada. Entretanto, ao contrário do que muitos imaginam, a Internet não é um mundo sem leis, já existem algumas regras que a controlam. Incipientes, porém. Urge, pois, a necessidade de uma legislação mais adequada para regular esse instrumento tão útil e prescindível que é o e-mail às modernas sociedades, de forma tal que possa ser utilizado sem prejuízo dos princípios da estabilidade e da ordem social e jurídica. Não só ele, todas as novas tecnologias, sobretudo a internet e todos os seus produtos, não podem mais passar ao largo do direito. É imperioso que o legislador consagre especial atenção às novas formas contratuais que pretendem regê-los, pois as questões judiciais que já se afiguram estão a forçar isso.

Em relação à questão da prova processual, o direito tem que, Igualmente, aprimorar-se. Entretanto, até que isso ocorra, os juizes deverão utilizar-se dos princípios gerais de direito e dos costumes internacionais que paulatinamente se vão fixando para reger as controvérsias oriundas dos contratos internacionais, em conformidade com o que estabelece o art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil.

Alguns avanços já foram realizados, como as conquistas da controvertida Medida Provisória nº 2.200/2001, que criou os mecanismos básicos para a implantação da certificação digital no Brasil. Tal lei, criou uma reserva de mercado que, mantida, impedirá a competitividade e inviabilizará a participação de empresas privadas no setor. A participação do governo é importante, mas com limitação de escopo semelhante às das recém criadas agências reguladoras. Acredita-se, não se deve repetir a experiência da estatização.

Um ponto de partida para qualquer nação que pretenda editar legislação que vise regular as atividades da internet, é o direito comparado. Sem pretender copiar as leis alienígenas, muito podem ser úteis como subsídios. Igualmente importante é a uniformidade com os modelos já consagrados no exterior, como o da UNCITRAL.

Resultado das implicações jurídicas desse novo fenômeno social, que é a internet e seus produtos, sobretudo o e-mail, não se pode excusar de emitir uma opinião sobre o uso do e-mail como prova no direito. Acredita-se que ele pode e deve ser utilizado como instrumento probante, à luz da legislação existente. Entretanto recorrendo-se sempre à perícia que o ateste.


Glossário

Protocolo é um conjunto de regras pelo qual os computadores se "entendem". Por meio dele, v.g., estabelecem o modo de transmissão e recepção dos dados que trocam entre si.

Provedor de Acesso à Internet "é organização que provê acesso à Internet. Pequenos provedores (ISPs) fornecem o serviço via modem e ISND, ao passo que os grandes provedores também oferecem conexão através de linhas privativas (T1, T1 fracionado, etc.) Os usuários são normalmente obrigados a pagar uma taxa mensal, mas outras podem ser as formas de pagamento. Mediante o pagamento de uma taxa, pode-se criar um site e mantê-lo no servidor do provedor, o que permite que mesmo uma pequena organização possa estar presente na rede com o seu próprio nome de domínio" (http://eon.law.harvard.edu/property/introtech/glossary.html – tradução livre, apud Sampaio e Sousa).

Servidor "é um computador em uma rede compartilhado por vários usuários. O termo pode se referir a ambos hardware e software ou apenas ao software que realiza o serviço. Por exemplo, Servidor da Rede pode se referir ao software do servidor da rede em um computador que também roda outros aplicativos, ou pode referir-se a um sistema de computador dedicado apenas a rodar o aplicativo do servidor da rede. Deve haver alguns servidores dedicados à rede em um grande site. Harvard Technical Glossary" (http://eon.law.harvard.edu/property/introtech/glossary.html – tradução livre, apud Sampaio e Sousa).

Roteador (do inglês Router) "é um dispositivo que envia pacotes de informação de uma área local da rede (LAN) ou área longínqua da rede (WAN) para outra. Baseado em tabelas de rotas e protocolos de rotas, os routers lêem o endereço eletrônico de cada mensagem transmitida e decidem como enviá-la de acordo com a melhor rota disponível (tráfego, custo, velocidade, qualidade das linhas, etc.). Harvard Technical Glossary (http://eon.law.harvard.edu/property/introtech/glossary.html – tradução livre, apud Sampaio e Sousa).

SMTP (do inglês Simple Mail Transfer Protocol) é o protocolo de entrega de e-mails mais antigo e é baseado na arquitetura de rede em que todas as máquinas estão ligadas o tempo todo.


Referências bibliográficas

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Notas

1. Em sua obra máxima Dos delitos e das penas.

2. A lista não pretende ser exaustiva, mas tão somente sequenciadora da sucessão de criações.

3. Diz-se "digital", genericamente, da representação de dados ou quantidades físicas na forma numérica. Diz-se "binária", da notação interna que os computadores e outros dispositivos correlatos utilizam para representar os caracteres na forma de números 0 (zero) e 1 (um). Diz-se "digital", em informática, da representação de dados na forma binária, isto é, da que faz uso de um sistema binário para representar caracteres.

4. 1. Do inglês electronic mail ou email ou e-mail, ou, no português, correio eletrônico = mensagens enviadas entre usuários de um sistema de quadro de avisos eletrônicos ou rede de computadores. 2. "Ray Tomlinson, em 1972, foi o primeiro a criar o correio eletrônico, mas não desfruta do resultado de sua criação, porque inadvertidamente, não registrou a patente do invento, mas deixou para o mundo digital talvez o mais poderoso e eficaz meio de comunicação eletrônica até hoje existente" (Brasil in O e-mail e a prova judicial).

5. Atente-se que existem transmissões de e-mail em redes internas de computadores que não partilham da internet. Dá se aqui esse tratamento apenas pelo foco da matéria, qual seja o "e-mail na internet".

6. Muito embora existam outras formas de se criar, enviar e receber e-mail (tal qual por meio de um editor de texto ou de páginas internet, como permitem os serviços oferecidos pelo portal BOL e pelo portal/provedor TERRA), por questões didáticas as explicações desse tópico focam unicamente a utilização de programa específico para e-mail, suficiente aos propósitos de compreensão do fenômeno.

7. 1. Vide o glossário. 2. O jurista não precisa conhecer o funcionamento detalhado dos protocolos de comunicação, pois os programas existentes fazem esta interface com os servidores.

8. Do inglês: transmission control protocol/internet protocol, traduzido como: protocolo de controle de transmissão/ protocolo internet.

9. A divisão da mensagem em pacotes não será objeto deste trabalho, entretanto explica-se que é a técnica que permite à internet reduzir os custos de transmissão.

10. Vide o glossário.

11. 1. Vide o glossário. 2. Do inglês Simple Mail Transfer Protocol.

12. 1. Vide o glossário. 2. Do inglês Post Office Protocol.

13. Tem-se evitado empregar o termo "conceito" porque a palavra "definição" é, vocabularmente, mais adequada à presente abordagem.

14. A definição formal é, vocabularmente, a mais própria de um conceito para e-mail.

15. Materialmente em relação ao seu conteúdo e não em relação à forma em que pode ser encontrado.

16. Além das já existentes, nada impede que outras formas de armazenamento e transmissão ainda possam surgir no futuro.

17. O próprio termo "forma", para o e-mail, soa estranho, pois "forma" refere-se tão somente à figura ou aspecto exterior dos corpos materiais. Coisa que o e-mail não é, isto é, ele não é material, não pode ser visto. Igualmente, o uso da palavra "aparência" mostra-se inadequado visto ser relativo à exterioridade. Por motivos semelhantes, descarta-se o uso dos vocábulos "perceber", "sentir", "experimentar" ou outros a que se tenta recorrer. Por isso (pela falta do adequado) opta-se pelo uso do termo "forma", mesmo que impróprio gramaticalmente.

18. O e-mail pode ser encontrado em diversos suportes físicos diferentes, mas ainda assim sua existência continua sendo imaterial.

19. Diz-se definitivo porque no momento da utilização do e-mail pelo computador há de se falar em um armazenamento, mesmo que temporário.

20. Aqui, não há de se concordar com o emprego impróprio do termo "eletrônica", por que existe um outro mais adequado ("digital"), diferentemente da opção que se fez, anteriormente, para a palavra "forma".

21. Não há de se falar em e-mail escrito porque "escrever" significa "representar por meio de caracteres ou sinais gráficos". Isso pressupõe que a escrita tem existência material (ao menos na forma de uma tinta sobre um suporte físico, que pode ser o papel), enquanto a existência do e-mail é imaterial (ele não pode ser visto, apenas é imaginado existir). Mais ainda, a sua impressão em papel é apenas uma forma de exteriorização e não a sua forma original (como foi criado e é armazenado).

22. Pode ser um texto e/ou voz e/ou imagem – reproduzidos ou criados no computador.

23. Na qual se pressupõe a existência de: a) um provedor transmissor, dotado dos softwares necessários, onde a informação se origina e onde, opcionalmente, armazena-se uma cópia; b) um provedor receptor, dotado dos softwares necessários, onde a informação é armazenada definitivamente; c) um meio físico (fios, cabos ou ondas eletromagnéticas, etc.), por onde a informação trafega; d) endereços para cada um deles, para direcionar ("endereçar") a mensagem corretamente; e) um protocolo (SMTP), para que ambos se "entendam"; e f) diversos equipamentos intermediários capazes de dar seguimento à mensagem (tais como os roteadores).

24. Vide o glossário.

25. O e-mail é digital porque existe na forma dígitos (ver nota 2). É imaterial como a forma verbal, mas não é verbal, não é escrito e não se encontra somente sob a forma de elétrons. É encontrado sob a forma magnética, eletromagnética, ótica (sob a forma de luz visível), não ótica (infravermelho, por exemplo) ou muitas outras formas ainda não inventadas ou a serem descobertas.

26. O nome dessa espécie especial deriva da forma como é sempre encontrada, isto é, na forma digital. Se a informática, no futuro, criar uma nova forma de representação da informação no interior dos computadores e equipamentos correlatos, que não seja a binária e, consequentemente, e-mails nessa nova forma; e se a nova forma de representação der-se também por meio de dígitos, mas não somente com dois, a atual modalidade "digital" transforma-se-á na espécie "binária" e o termo "digital" será tomado por gênero. Mas, por outro lado, se a nova forma de representação for outra inimaginária (não se der por meio de dígitos), haverá a necessidade de se criar, também, uma nova categoria que contemple as duas espécies, isto é, a digital (usada atualmente) e a nova modalidade.

27. Igualmente digital.

28. São as seguintes as consideranda da ONU ao elaborar o instrumento normativo: "A Assembléia geral; Recordando sua resolução 2205 (XXI), de 17 de dezembro de 1966, pela qual estabeleceu a Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional com o mandato de fomentar a harmonização e a unificação progressivas do direito comercial internacional e de ter presente, a esse respeito, o interesse de todos os povos, em particular o dos países em desenvolvimento, no progresso amplo do comércio internacional; Observando que um número crescente de transações comerciais internacionais se realiza por meio do intercâmbio electrônico de dados e por outros meios de comunicação, habitualmente conhecidos como "comércio electrônico", nos que se utilizam métodos de comunicação e armazenamento de informações substitutivos dos que utilizam papel; Recordando a recomendação relativa ao valor jurídico dos registros computadorizados [...]; Convencida de que a elaboração de uma lei modelo que facilite o uso do comércio eletrônico e seja aceitável para Estados que tenham sistemas jurídicos, sociais e econômicos distintos poderia contribuir de maneira significativa ao estabelecimento de relações econômicas internacionais harmoniosas; Observando que a Lei Modelo sobre Comércio Eletrônico foi aprovada [...]; Estimando que a aprovação da Lei Modelo sobre Comércio Eletrônico pela Comissão ajudará de maneira significativa a todos os Estados a fortalecer a legislação que rege o uso de métodos de comunicação e armazenamento de informações substitutivos dos que utilizam papel e a preparar tal legislação nos casos em que dela careçam".

29. Encrypt, no inglês.

30. "A Criptografia corresponde a um conjunto de princípios e técnicas de matemática, utilizando algoritmos e funções poderosas capazes de codificar uma mensagem, baseadas em grandes números primos com centenas de dígitos e outras técnicas de escrever cifras" (Brasil apud Gonzalez).

31. "Os meios Moralmente Legítimos de prova – Ajuris" (nota de Gonzalez)

32. "Informação retirada do artigo ´O e-mail e os aspectos probatórios no direito brasileiro´ – Leonardo Gurgel" (nota de Gonzalez).

33. A segunda perspectiva é de que se transfira, para o momento e para o opaco foro da regulamentação da lei, o embate relativo à atribuição da prerrogativa de registro de certificados eletrônicos - se aos cartórios ou, como ocorre hoje, a empresas especializadas e escolhidas pelas partes para reconhecer e garantir veracidade a documentos transmitidos pela rede.´ ORSI, Ricardo. O comércio eletrônico e um novo direito da prova: questões jurídicas e o projeto em tramitação no Senado Federal. Revista Direito em Ação. Universidade Católica de Brasília. Volume 1. N. 1. Dezembro de 2000. Pág. 146" (Nota de Castro).


Autor


Informações sobre o texto

Trabalho apresentado à disciplina Informática Aplicada ao Direito, no curso de bacharelado em Direito do Instituto Camillo Filho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEITÃO JÚNIOR, Esdras Avelino. O e-mail como prova no Direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 57, 1 jul. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3025. Acesso em: 28 mar. 2024.