Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/31608
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Guardas municipais na prevenção e repressão ao crime

Brevíssimas considerações acerca da atuação dessas corporações face ao contexto social e à luz da legislação vigente

Guardas municipais na prevenção e repressão ao crime. Brevíssimas considerações acerca da atuação dessas corporações face ao contexto social e à luz da legislação vigente

Publicado em . Elaborado em .

Texto se propõe a discutir, ainda que simploriamente, o controvertido processo de municipalização da segurança pública. Nesse contexto, as guardas municipais passariam, então, a integrar o rol de instituições incumbidas da segurança dos cidadãos.

Em face dum conturbado - porém, inevitável - processo de municipalização da segurança pública, pelo qual as guardas municipais, a partir de então, exercerão atribuições para além daquelas meramente patrimoniais ínsitas na Carta Maior e integrarão, efetivamente, o rol de instituições incumbidas da segurança dos cidadãos, exsurgem questionamentos diversos, dentre os quais pinçamos alguns deles para, de modo bastante simplório, traçarmos as breves linhas que se seguem.

As guardas municipais devem ser legalmente investidas do poder para atuar preventiva e repressivamente no combate à violência e criminalidade?

Evidentemente que SIM, e por razões óbvias.

Primeiro, pela escassez dos efetivos policiais que, face ao incremento da violência e criminalidade, apresentam-se cada vez mais exíguos e, em corolário, ineficientes.

Segundo, em face da lógica de municipalização dos serviços públicos essenciais, tal como já ocorreu com a saúde e a educação, por exemplo.

Terceiro, porque isso apenas ratificaria e legitimaria o que já vem sendo realizado por diversas guardas municipais de várias cidades dos Estados de São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro, etc.

Por fim, devido à possibilidade de formulação de políticas públicas de segurança adequadas à realidade dos municípios, de acordo com as peculiaridades e demandas regionais.

Todavia, há quem persista na ideia de que às GM’s cumpre tão-somente executar a segurança patrimonial no âmbito dos municípios, contrariando uma tendência naturalmente imposta pelo contexto social.

Ora, o artigo 144 da Constituição Federal refere os órgãos através dos quais a segurança pública será exercida e, em seu parágrafo 8º, mencionado dispositivo constitucional prescreve a faculdade de que dispõem os municípios para constituírem guardas municipais destinadas à proteção de bens, serviços e instalações, ao que subjazem as seguintes questões, dentre outras tantas:

1ª) É possível exercer a segurança de bens, serviços e instalações sem exercer, concomitantemente, a segurança de pessoas?

2ª) Os prefeitos dos municípios podem, no exercício do poder de polícia, através das respectivas Guardas Municipais, executar atividades de segurança pública preventiva e repressiva visando à manutenção da ordem e consectariamente o bem da coletividade?

Bem, relativamente à primeira questão, basta proceder a um raciocínio lógico simples para percebermos que, na prática, a segurança de patrimônio e a segurança de cidadãos são indissociáveis, haja vista que bens, serviços e instalações municipais compreendem seres humanos a usufruírem e ou a desempenharem atividades profissionais no âmbito dos órgãos públicos. Evidente, pois, que, diante de quaisquer condutas atentatórias à integridade física ou à vida dos usuários ou funcionários que, dalgum modo, utilizam ou laboram no âmbito dos bens, serviços e instalações municipais, o guarda civil agirá no sentido de repelir o agressor, pois é fato que não há maior patrimônio a ser salvaguardado do que a vida humana. Outra não poderá ser a conduta do guarda civil municipal, compelido pelo DEVER legal de efetuar a prisão de quem quer que seja encontrado em flagrante delito, consoante o disposto no artigo 301 do Código de Processo Penal, sob pena de responder por prevaricação.

Donde, conclui-se, a resposta à primeira questão é: NÃO.

Para responder a segunda questão, recorremos ao escólio do mestre Hely Lopes Meirelles (1996, p. 115), o qual nos ensina que poder de polícia “é a faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar ou restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado”. Ora, no Estado politicamente organizado, o Poder de Polícia, atributo da Administração Pública, é exercido por pessoas específicas, a saber: na esfera federal, pelo Presidente da República e seus ministros; na estadual, pelos governadores e secretários; e, na municipal, pelos prefeitos. Estes, por seu turno, transferem-no (o poder de polícia) aos respectivos órgãos executores para que estes, adequadamente, através de seus agentes, restrinjam, em prol da coletividade, a atuação de pessoas que tenham por escopo alterar, por meio de práticas delitivas e antissociais, o bem-estar e a paz social.

Portanto, é competência e prerrogativa dos prefeitos exercerem o poder de polícia através das guardas municipais, que devem atuar de forma preventiva, visando, principalmente, a garantir a segurança das pessoas e à preservação da vida, que constitui-se no principal bem jurídico a ser tutelado pelo Estado em sentido lato (União, Estados e Municípios).

Consequentemente, a resposta à segunda questão suscitada é: SIM.

Saliente-se, ainda, que, recentemente, foi aprovado no Congresso Nacional o Projeto de Lei da Câmara n.º 39, que, após sanção presidencial, transmutou-se na Lei Federal n.º 13.022, de 8 de agosto de 2014 – intitulada de Estatuto Geral das Guardas Municipais­ – que definitivamente põe fim à celeuma, ao positivar as atribuições gerais e ao legitimar, destarte, as ações preventivas já desempenhadas por essas corporações em prol da segurança dos munícipes.

Outro projeto de lei que merece destaque, a PEC 534/2002, de autoria do senador Romeu Tuma - que, como se percebe, tramita há nada menos que 12 anos no Congresso Nacional -, propõe alteração do texto constitucional no sentido de inserir as guardas municipais entre as organizações incumbidas do enfrentamento à criminalidade e à violência.

Além disso, o advento da Lei Federal Nº 10.826 (Estatuto do Desarmamento), vem corroborar essa tendência municipalizante da segurança pública, quando prevê, em seu artigo 6º, incisos III e IV, porte de armas para as guardas municipais.

Decerto que estas instituições, com seus efetivos devidamente equipados e qualificados, atenderão com agilidade e eficiência aos chamados de emergência da população dos municípios.

As guardas municipais não pretendem disputar espaço com as demais corporações policiais, mas com estas cooperar, visando, como elas, a proteção dos bens, serviços, instalações e, principalmente, dos cidadãos, principais destinatários dos serviços públicos essenciais.

Paulo Sérgio Lemos

É Subinspetor da Guarda Civil Municipal do Jaboatão dos Guararapes, presidente do Sindicato dos Guardas Civis municipais do Jaboatão dos Guararapes/PE (SINDGUARDAS/JG), bacharelando em Direito pela UNICAP.

LEGISLAÇÃO DE REFERÊNCIA

Constituição Federal, art. 144, 8º.

Código de Processo Penal, art. 301.

Estatuto Geral das Guardas Municipais, Lei 13.022/2014, de 8 de agosto de 2014.

Estatuto do Desarmamento, Lei 10.826/2003.

BIBLIOGRAFIA

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 25ª Edição. São Paulo: Malheiros, 1996.


Autor


Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelo autor. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.