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Princípio da proporcionalidade e sua aplicação no direito penal brasileiro

Princípio da proporcionalidade e sua aplicação no direito penal brasileiro

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Verifica-se uma tentativa jurisdicional de atenuar as inúmeras disparidades legislativas ocasionadas pela heterogeneidade de valores criminais na elaboração das penas do Código Penal e legislações afins.

RESUMO

Este trabalho monográfico aborda o Princípio da Proporcionalidade na aplicação da lei penal, iniciando com a evolução histórica e a sua conceituação geral, até chegar à sua aplicabilidade prática no ordenamento jurídico brasileiro.

A abordagem principal se dá no estudo dos aspectos práticos de sua aplicação, exemplificando na jurisprudência e nas decisões dos tribunais pátrios.

Parte-se do pressuposto de que o Direito Penal é uma das áreas que mais dá ostentação ao uso dos princípios, pelo motivo do grande valor dos bens jurídicos por ele protegidos. É esse aspecto que dá essência à proporcionalidade, pois, se afrontado, pode ocasionar ofensa ao princípio da legalidade e, consequentemente, ao sistema de direitos e garantias desenhado pela Constituição Federal de 1988.


INTRODUÇÃO

Em uma sociedade organizada, o ordenamento jurídico pode ser considerado um aparelho estruturado de normas. Decorre disso que uma norma para ter validade deve buscar sua fundamentação em preceito superior. Podem, no entanto, existir aspectos controvertidos no entendimento entre estes princípios, exigindo desta forma instrumentos que medeiem os conflitos entre eles. Um destes instrumentos, objeto deste trabalho, é o princípio da proporcionalidade.

No Direito Penal e Processual Penal, o princípio da proporcionalidade é deveras importante e balizador, pois se mostra como uma pauta orientadora da norma jurídica e das decisões judiciais. É um eficaz instrumento de apoio às decisões judiciais, uma vez que oferece uma alternativa de atuação construtiva do Judiciário, resultando em julgamentos mais justos.

O objetivo, com este estudo, é pesquisar e investigar acerca das funções do princípio da proporcionalidade com ênfase na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Tal propositura será delineada através de um estudo sistematizado do histórico dos princípios, bem como demonstrando a estruturação do princípio da proporcionalidade, culminando com a análise da fixação do citado princípio na esfera penal e jurisprudências afins.

Princípios são mandamentos nucleares de um sistema e norteadores da base jurídica de qualquer sociedade. Nesse sentido, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 incrustou em seu arcabouço legal a ideia de princípios constitucionais, fundados entre o conjunto de norma e princípio, tornando tais concepções como fontes do direito.


CAPÍTULO I-PRINCÍPIOS JURÍDICOS

1 CONCEITUAÇÃO GERAL DE PRINCÍPIO

Toda e qualquer forma de edificação deve iniciar na base. A base no mundo jurídico são os princípios, do latim principium, que significa começo, origem de qualquer coisa. Desta feita, seguem determinados conceitos e lições de autores acerca do tema em discussão.

Neste contexto, Silva (1993), aborda os princípios de forma genérica sendo que para ele tais institutos significam as normas elementares ou os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de qualquer coisa.

Conforme ensinamento de Gomes (2005), princípios são as diretrizes gerais de um ordenamento jurídico (ou de parte dele). Seu espectro de incidência é muito mais amplo que o das regras. Entre eles pode haver colisão, não conflito. Quando colidem, não se excluem. Como mandados de otimização que são, sempre podem ter incidência em casos concretos e, às vezes, concomitantemente dois ou mais deles.

Também segundo o dicionário Houaiss (2001), princípio traduz a ideia de início, começo, de noções básicas. Neste sentido princípio seria o primeiro momento de existência de algo, ação ou processo.

A palavra, desse modo, carrega consigo a força do significado de proposição fundamental. E é nessa acepção que ela foi incorporada por distintas formas de produção cultural dos seres humanos, inclusive o Direito. Assim, princípio traduz, de maneira geral, a noção de proposições fundamentais que se formam na consciência das pessoas e grupos sociais, a partir de certa realidade, e que, após formadas, direcionam-se à compreensão, reprodução ou recriação dessa realidade (DELGADO, 2004).

Podemos observar através das palavras de Delgado (2004) que a palavra princípio contempla a ideia de raiz ou razão de ser. Em sentido figurado podemos afirmar que os princípios seriam as colunas de sustentação da construção jurídica, base sobre qual é construída e são interpretadas as normas jurídicas.

Princípios, no plural, significam as normas elementares ou os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa; Conforme Silva (2001), eles revelam o conjunto de regras ou preceitos, que se fixam para servir de norma a toda espécie e ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica; exprimem sentido mais relevante que o da própria norma ou regra jurídica; mostram-se a própria razão fundamental de ser das coisas jurídicas, convertendo-as em perfeitos axiomas; significam os pontos básicos, que servem de ponto de partida ou de elementos vitais do próprio Direito.

Assim todo e qualquer saber filosófico ou científico implica na existência de princípios. A base de qualquer ramo do direito são os princípios, funcionando como base na construção doutrinária, influindo tanto em sua formação como aplicação. Os princípios integram o ordenamento jurídico. Em função destes princípios que a ordem jurídica é um sistema que possui uma vinculação lógica, harmônica e racional. Não se tratam os princípios de meras premissas científicas, mas de autênticas normas jurídicas, sendo, pois, aplicáveis na solução de problemas jurídicos da vida real. Os princípios compõem adequada base imutável de uma ciência, atuando de como informadora da organização jurídica.

Nota-se, que os princípios por serem o alicerce, auferem de maior importância do que a própria norma jurídica. Os princípios por serem mais gerais do que as normas têm por objetivo inspirá-las, valendo-se dizer que isso se aplica em quaisquer circunstâncias.

Reale (apud MAIOR, 2000) trata dos princípios como sendo as “verdades fundantes” de um sistema. Vejamos:

São verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades de pesquisa e da práxis.

Os princípios, ainda segundo Reale (apud MAIOR, 2000), seriam enunciados genéricos que ajudam na compreensão, na elaboração de novas normas bem como, na aplicação e integração das normas jurídicas:

Os princípios do Direito são enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, quer para a sua aplicação e integração, quer para a elaboração de novas normas sendo assim as razões lógicas do ordenamento jurídico.

Segundo Silva (1993), os princípios são o conjunto de regras ou preceitos que se fixam para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando a conduta a ser tida em uma operação jurídica. De outra parte, para Beviláqua (1980), os princípios são elementos fundamentais da cultura jurídica humana.

Conforme ensinamento de Mello (1981) princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, alicerce dele, alinhamento fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo.

Da mesma forma podemos observar a conceituação similar de Sussekind (1995, p.42):

Princípios são enunciados genéricos, explicitados ou deduzidos do ordenamento jurídico pertinente, destinados a iluminar tanto o legislador, ao elaborar as leis dos respectivos sistemas, como o intérprete, ao aplicar as normas ou sanar omissões.

Desta maneira, pode-se constatar a partir das definições apresentadas pelos inúmeros autores citados que princípio é em suma uma verdade fundante, tendo por escopo servir de gênero para a elaboração de outros mecanismos/estruturas. Desta feita, estes institutos possuem a função de informar, agindo como fundamento de determinado ordenamento jurídico, servindo até como função normativa atuando de forma supletiva em caso de ausência de lei.

Assim se faz revelada a gigantesca importância dos princípios no ordenamento jurídico, de maneira que ao referirmos uma norma estamos referindo-se a um princípio, eis que tal norma, direta ou indiretamente, está encravada em sua essência um princípio.

Por conseguinte, Nunes (2004), afirma que os princípios são, dentre as formulações deônticas de todo sistema ético-jurídico, os mais importantes a serem considerados não só pelo aplicador do direito, mas por todos aqueles que, de alguma forma, ao sistema jurídico se dirijam. Sendo assim, ressalta a importância em sua essência e como elemento harmonizador, integrador e de mecanismo de garantia de eficácia da norma jurídica.

Borges (2010) leciona que é inegável, atualmente, a importância dos direitos fundamentais na busca da Constitucionalização do Direito, haja vista a especial previsibilidade de aplicação imediata de suas normas (§ 1º, art. 5º da CF/88), com a imediata irradiação dos seus efeitos para todo o ordenamento jurídico através da inserção de regras e, principalmente, dos princípios, vinculando a atuação de todos os Poderes do Estado, seja na criação de normas infraconstitucionais, na aplicação aos casos concretos pelo magistrado ou na atuação do administrador público.

O ordenamento jurídico brasileiro, por sua vez, normatiza a aplicação dos princípios no artigo 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Dec. Lei nº 4.707/1942): Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito. Nesse sentido, podemos observar a importâncias dos princípios, visto que podem ser considerados delineadores do arcabouço jurídico de determinado povo, pois é a partir deles que se desenvolvem as demais normas norteadoras da estrutura de uma sociedade.

Assim sendo, depois de analisados tais premissas, interessante destacar que os princípios servem de base para inúmeras áreas, e, nesse contexto, especialmente à ciência jurídica. Destarte, considera-se imprescindível o doutrinador, ou até mesmo o operador do direito, quando do uso deste conceito observar que ele pode ser considerado elemento essencial de um determinado sistema - verdadeiro alicerce às normas jurídicas.

1.1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

Fruto da contraposição de determinados governos ao absolutismo, a origem das constituições faz referência ao passado. Por assim dizer, o nascimento das constituições, fundamento almejado pela busca de uma vida mais digna, oposta aos regimes individualistas, pode ser considerado um marco fundamental no desenvolvimento da humanidade, circunda por diversas peculiaridades.

Proporcionando seguir tal acepção, faz-se interessante destacar que com o passar do tempo as constituições foram evoluindo, estruturando-se e ampliando organismos para melhor agregar as ideias e imperativos dos indivíduos. Destarte, e são neste contexto que surgem os princípios constitucionais, considerados balizadores de um organismo político-constitucional.

Gomes (2005) esclarece que os princípios constitucionais, entre todos os princípios, gozam de supremacia incontestável. Exemplos: princípio da ampla defesa (CF, art. 5º, inc. LV), do contraditório (CF, art. 5º, inc. LV), da presunção de inocência (CF, art. 5º, inc. LVII) etc. Mas isso não significa que não existam princípios infraconstitucionais (leia-se: emanados de regras legais),como por exemplo: princípio do tantum devolutum quantum apellatum, que está contemplado no art. 599 do CPP.

Os princípios constitucionais contam com maior valor e eficácia e são vinculantes para o intérprete, para o juiz e para o legislador. Também existem princípios que derivam de regras internacionais. Exemplificando, Gomes (2005),aponta o princípio do duplo grau de jurisdição, que está contemplado na Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José), art. 8º, II, "h". Todo o direito internacional posto em vigência no Direito interno é fonte do Direito e deve ser considerado para a solução de conflitos.

Nesse sentido Bastos (1995) explana: os princípios constitucionais são aqueles que guardam os valores fundamentais da ordem jurídica. Isto só é possível na medida em que estes não objetivam regular situações específicas, mas sim desejam lançar a sua força sobre todo o mundo jurídico.

Não obstante tal definição, Bastos (1995), complementa informando que os princípios constitucionais alcançam esta meta à proporção que perdem o seu caráter de precisão de conteúdo, isto é, conforme vão perdendo densidade semântica, eles ascendem a uma posição que lhes permite sobressair, pairando sobre uma área muito mais ampla do que uma norma estabelecedora de preceitos. Portanto, o que o princípio perde em carga normativa ganha como força valorativa a espraiar-se por cima de um sem-número de outras normas.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 traz todo o fundamento base do ordenamento jurídico pátrio.Influi-se que a constituição brasileira está incrustada de inúmeros princípios esquemáticos da organização legal elaborada pelos constituintes originários, sendo que seus comandos normativos são postos em princípios, que podem estar expressamente enunciados ou implícitos, sem alterar sua força normativa disposta.

Faz-se interessante aqui, antes de abordar os princípios constitucionais, transcrever o pensamento de Canotilho (apud ESPÍNDOLA, 2002, p.100):

[...] a Constituição é, [...] uma lei, configurando a forma típica de qualquer lei, compartilhando com as leis em geral um certo número de características (forma escrita, redação articulada, publicação oficial etc). Mas também, é uma lei diferente das outras: é uma lei específica, já que o poder que a gera e o processo que a veicula são tidos como constituintes, assim como o poder e os processos que a reformam são tidos como constituídos, por ela mesma; é uma lei necessária, no sentido de que não pode ser dispensada ou revogada, mas apenas modificada; é uma lei hierarquicamente superior – a lei fundamental, a lei básica – que se encontra no vértice da ordem jurídica, à qual todas as leis têm de submeter-se; é uma lei constitucional, pois, em princípio, ela detém o monopólio das normas constitucionais.

Pode-se considerar que a constituição é uma lei distinta das outras, até pelo fato de que possui uma existência e formulação mais rígida. Assim sendo, para que haja modificações em seu corpo é necessário um trâmite mais elaborado e conciso, sendo que ela não pode ser dispensada ou revogada, mas apenas alterada.

Nesse sentido, tal característica é efetiva para destacar a importância da constituição em detrimento às demais normas infraconstitucionais, que apesar de também estarem baseadas em princípios, não possuem o mesmo corpo vinculador. Assim sendo, os princípios compõem a base de um aparelho jurídico, verdadeiras proposições lógicas que motivam e amparam, também regram.

Na concepção de Miranda apud Ferreira (2004), os princípios constitucionais são substantivos e adjetivos ou instrumentais, sendo que podem ser subdivididos em: Princípios axiológicos fundamentais - são os limites transcendentais do poder constituinte, via de positivação do Direito natural. Ex: o direito de defesa; Princípios políticos-constitucionais - são os limites inerentes do Poder Constituinte, os signos específicos de cada Constituição material diante das demais, refletindo as opções de cada regime. Ex: o princípio democrático; Princípios constitucionais instrumentais - constituem a estruturação do sistema constitucional quanto à sua racionalidade e operacionalidade.

Os princípios possuem um grau de abstração elevado, de acordo com Espíndola (2002). Observa, ainda, que é uma tendência predominante no Direito Constitucional brasileiro, e, ao que parece, no Direito Constitucional contemporâneo também: falar de princípios em termos estruturantes – dos princípios mais abertos aos mais densos, chegando-se ao patamar normativo das regras, reconduzindo-se, em via de retorno destas, progressiva e sucessivamente, até os princípios mais abstratos (de maior estrutura e de menos densidade). Essa concepção reforça, como se pode deduzir, a ideia de normatividade dos princípios constitucionais, ao emprestar-lhe um sentido articulado-estruturante, já que torna mais plausível a compreensão, a interpretação e a aplicação dos princípios de maior abertura pelos princípios de maior densidade e pelas regras constitucionais.

Nesse sentido, os princípios constituem a base, o alicerce de um sistema jurídico, essencialmente os princípios constitucionais, até por serem consideradas proposições lógicas que baseiam e amparam um sistema. Assim sendo, os princípios constitucionais têm uma função estruturante dentro do sistema jurídico, como na carta magna brasileira. Destaca-se que nos princípios jurídicos fundamentais, que motivam o Estado Democrático de Direito, encontram-se ferramentas para a interpretação, consistência e aplicação do direito positivo constitucional e infraconstitucional do país.

1.2 CONSIDERAÇÕES ENTRE PRINCÍPIO E NORMA

É essencial destacar de início que a discussão acerca de princípio e norma tem por escopo valorar estes dois importantes integradores do sistema jurídico pátrio. Assim sendo, infere-se que não existem princípios absolutos e nem normas invencíveis, de tal maneira que toda consideração deve ser feita à luz do princípio da proporcionalidade sobre o caso concreto para que possibilite a solução diante da situação concreta.

Inúmeras são os entendimentos que diferenciam normas e princípios. No entanto, tem-se que os critérios diferenciadores, de acordo com inúmeros juristas, são variados. Por conseguinte, aponta-se que há tempos os sistemas jurídicos buscam regrar a coexistência em sociedade, proporcionando, assim, segurança jurídica aos indivíduos. Desta feita, aí surgem às normas e princípios, até como fonte primeira da organização de uma sociedade.

À sua vez, Costa (2006), garante o entendimento de que as normas jurídicas, em geral, e as normas constitucionais, em particular, podem ser enquadradas em duas categorias diversas, quais sejam: as normas-princípios e as normas-disposição. Assim, as normas-disposição têm eficácia restrita às situações específicas às quais se dirigem, ao passo que as normas-princípio, ou simplesmente princípios, têm, maior teor de abstração e uma finalidade mais destacada dentro do sistema.

Os princípios gerais são apenas normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. A palavra princípio leva a engano, tanto que é velha questão entre juristas se os princípios gerais são normas. Conforme Bobbio (1996) não há dúvida: os princípios gerais são normas como todas as outras. Para sustentar que os princípios gerais são normas, os argumentos são dois, e ambos válidos: antes de mais nada, se são normas aquelas das quais os princípios gerais são extraídos, através de um procedimento de generalização sucessiva, não se vê por que não devam ser normas também eles: se abstraio da espécie animal obtenho sempre animais, e não flores ou estrelas. Em segundo lugar, a função para qual são extraídos e empregados é a mesma cumprida por todas as normas, isto é, a função de regular um caso.

Desta feita, pode-se compreender que Bobbio contrapõe a dogmática provocada por Costa, que afirma que norma e princípio são diferentes, visto que a primeira é mais específica ao passo que o segundo possui uma carga jurídica mais ampla.Assim, Bobbio contraria tal declaração enfatizando que princípios são normas como todas as outras, pois, se são normas aquelas das quais os princípios são retirados, através de uma metodologia de generalização, não se vê por que não devam ser normas também eles, pois são oriundos, em certa parte, delas.

Na lição de Guerra Filho (1997), as normas possuem a estrutura lógica que tradicionalmente se atribui a estrutura básica do Direito, com a descrição (ou tipificação) de um fato, ao que se acrescenta a sua qualificação prescritiva, amparada em uma sanção (ou na ausência dela, no caso da qualificação como fato permitido). Já os princípios fundamentais, igualmente dotados de validade positiva e de um modo geral estabelecidos na constituição, não se reportam a um fato específico, que se possa precisar com facilidade a ocorrência, extraindo a consequência prevista normativamente. Eles devem ser entendidos como indicadores de uma opção pelo favorecimento de determinado valor, a ser levada em conta na apreciação jurídica de uma infinidade de fatos e situações possíveis, juntamente com outras tantas opções dessas.

Os princípios não necessitam estar categoricamente expressos num verificado texto legal para possuir alento vinculante, basta estarem incrustados no sistema legal que os rodeia. Observa-se deste modo norma e princípio estariam unidos, não apresentando diferenças. Por outro lado, há doutrinadores que ensinam que os princípios têm um maior teor de abstração e um desígnio mais destacado dentro do ordenamento jurídico.

Consoante Alexy (apud ABOUD, 2008) princípios são normas que ordenam algo que, relativamente às possibilidades fáticas e jurídicas, seja realizado em medida tão alta quanto possível. Princípios são, segundo isso, mandamentos de otimização, assim caracterizados pelo fato de a medida ordenada de seu cumprimento depender não só das possibilidades fáticas, mas também das jurídicas.

Conforme os estudos de Dworkin (apud ÁVILA, 2009), no caso de colisão entre normas, uma delas deve ser considerada inválida. Os princípios, ao contrário, não determinam absolutamente a decisão, mas somente contêm fundamentos, os quais devem ser conjugados com outros fundamentos provenientes de outros princípios. Daí a afirmação de que os princípios, ao contrário das normas, possuem uma dimensão de peso, demonstrável na hipótese de colisão entre princípios, caso em que o princípio com peso relativo maior se sobrepõe ao outro, sem que este perca sua validade.

Por conseguinte, Ávila (2009), expõe que as normas são imediatamente descritivas, primariamente retrospectivas e com pretensão de decidibilidade e abrangência, para cuja aplicação se exige a avaliação da correspondência, sempre centrada na finalidade que lhes dá suporte ou nos princípios que lhes são axiologicamente sobrejacentes, entre a construção conceitual da descrição normativa e a construção conceitual dos fatos. Já os princípios são normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementaridade e de parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma avaliação da correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção.

Nesse sentido, seguindo o entendimento de vários autores, princípio e norma não possuem uma conceituação definida ou área de alcance restrita, visto que não ocorre uma padronização de apreciações. A parte disso, destaca-se que os mesmos podem ser considerados elementos fundamentais de um determinado sistema jurídico, pois servem de base. Esta verificação procede do juízo de que todo arcabouço lícito advém de ideias inaugurais, e é neste ponto que coincidem tais pressupostos, por serem considerados entes primeiros de um sistema.

1.3 PRINCÍPIOS COMO FONTE DO DIREITO

A análise do termo fonte do direito, como sendo a criação, início de determinado ordenamento jurídico, é baseada em pressupostos iniciais. Entende-se que toda premissa advém de conceitos inaugurais e integradores. Assim sendo, os princípios se relevam medidas eficazes para suprir essa necessidade, devido ao fato de ser um mecanismo essencial nesse sentido.

Cumpre instar que o olho-d'água do Direito nada mais é do que o nascedouro do fenômeno jurídico. Desta feita, partindo do pressuposto de que quaisquer ordenamentos são oriundos de construção humana, é evidente que não haja uma doutrina uniforme com relação às fontes constituintes do Direito.

Segundo Gusmão (2002), as fontes estatais do direito são constituídas de normas escritas, vigentes no território do Estado, por ele promulgadas, no qual têm validade e no qual são aplicadas pelas autoridades administrativas ou judiciárias. Assim sendo, as fontes estatais têm sua aplicação notoriamente precisa, partindo-se do pressuposto de que, por ser criada e exercida pelo Estado, ou seja, seus representantes, à conduta contraria ao que a legislação prevê, associar-se-á uma sanção.

À sua vez, Ferraz Júnior (2003) aduz que observamos a chamada hierarquia das fontes, não obstante ocultar uma relação de poder e de exercício de poder, num âmbito circunscrito, tecnicamente é um instrumento importante para o mapeamento formal das competências estatais. O ponto de partida é a Constituição, que, por pressuposto analítico, determina todas as competências normativas do Estado.

Pode-se considerar que são fontes do direito as origens do direito, ou seja, o lugar ou a matéria prima pela qual o mesmo nasce. Por conseguinte, estas fontes podem ser materiais ou formais. E é neste ponto que se encaixam os princípios, como fontes formais mediatas, juntamente com os costumes, a jurisprudência e a doutrina. Inclusive, preleciona o 4º da Lei de Introdução ao Código Civil dispõe que quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

A fonte de uma coisa é o lugar de onde surge, o lugar de onde ela nasce. Com estas palavras Machado (2000) diz que para que se possa dizer o que é fonte do Direito é necessário que se saiba de qual direito. Se cogitarmos do direito natural, devemos admitir que sua fonte é a natureza humana. Aliás, vale dizer, é a fonte primeira do Direito sob vários aspectos.

Os princípios são fontes do direito. Com esta afirmação Gomes (2010) dá ênfase ao tema destacando que os princípios, normalmente, são mais difusos, vagos e indeterminados (que as regras). De qualquer maneira, não compete ao juiz Hércules (criado por Dworkin), que não existe, delimitar (descobrir) o conteúdo de cada um deles. Essa é uma tarefa da qual devem se encarregar os juízes de carne e osso, que devem se esforçar para descobrir quais regras se vinculam (e quais são contraditórias) com cada um dos princípios, procedendo a juízos de ponderação (não de mera subsunção, que é típica das regras).

Complementando, Gomes (2010) enfatiza que os princípios exigem mais dos operadores jurídicos, mesmo porque eles jogam um papel muito relevante na atividade argumentativa (demonstração da sua existência, do seu peso, das suas razões éticas ou morais, dos valores que ele congrega etc.), mas isso não os invalida, porque são normas jurídicas tanto quanto as regras. Fazem parte, por isso mesmo, das fontes do direito (cuja teoria, dessa forma, deve ser totalmente revisada).

Os princípios gerais do direito surgem como elemento integrador do ordenamento jurídico, até por serem ideias jurídicas abrangentes que sustentam, e não necessariamente precisam estar escritas para serem válidas. Não contrariando tal acepção Gabriel (2004) sustenta que os princípios gerais de direito normalmente não estão declarados nas normas jurídicas, por estarem, muitas vezes, implícitos, compondo determinado o ordenamento.

A ideia de princípio como fonte do Direito é materializada quando da análise da essência da Constituição da República Federativa do Brasil, até pelo fato de que há inúmeros deles no texto legal, sejam explícitos ou implícitos. Assim sendo, corrobora-se que a fonte matriz de um ordenamento jurídico parte de princípios inaugurais.

1.4 ESSÊNCIA DOS PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO

Em várias áreas da informação que envolve princípios pode ser verificada a incidência dos princípios, bem assim ocorre na área jurídica, tema ênfase deste estudo. Pode-se observar que os princípios gerais do direito estão dispersos por todas as normas jurídicas, não ficando limitados apenas a um ramo específico. Tais mandamentos inaugurais facilitam a integração das normas aplicadas em sociedade.

Os princípios, conforme Gomes (2010), como normas que revelam as diretrizes do ordenamento jurídico, possuem valor qualificado e funções muito importantes. Apesar de toda essa força, no entanto, em certos âmbitos eles se deparam com barreiras insuperáveis. É o caso do âmbito da tipicidade (restrita, fechada) no Direito penal, da comprovação típica de um fato, da demonstração da esfera do proibido e do castigo etc. Tudo isso, no campo penal, está regido pela legalidade estrita. Essa barreira da legalidade estrita não pode ser transposta por nenhum princípio, por mais relevantes que sejam as suas implicações.

À sua vez, Bevilácqua apud Pessoa (2009), observa que devido ao caráter essencialmente amplo dos princípios gerais do direito, o aplicador, bem como o legislador, que neles se baseiam, devem ter cautela e limites para a atuação, sob pena busca incoerente a solução para uma determinada situação. Ainda, que para utilizar os princípios gerais de direito, há de existir uma perfeita identidade, entre a situação e o princípio utilizado, sob o aspecto da coerência e harmonia.

O artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil (LINDB) permite ao juiz, quando a lei for omissa, decidir o caso concreto que lhe foi submetido de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito. Castro (2013) acrescenta que o artigo 126 do CPC dispõe que o juiz não se exima de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide, caber-lhe-á aplicar as normas legais, não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.

É inegável que os princípios gerais do direito não somente servem de orientação ao juiz, no momento de proferir a sua decisão, mas também constituem um limite ao seu arbítrio, garantindo que a decisão não está em desacordo com o espírito do ordenamento jurídico, e que suas resoluções não violam a consciência social. Bechara (2005) complementa esta afirmação aduzindo que são mais do que um elemento da insegurança jurídica, na medida em que contribuem para dotar o ordenamento jurídico em seu conjunto de seguridade, tanto no sentido de assegurar que condutas que se ajustem à justiça não se vejam reprovadas pela norma positiva, como permitindo resolver situações não contempladas em norma alguma positiva, mas que tenham relevância jurídica.

Guimarães (2003) anota que os princípios gerais do direito se diferenciam dos princípios constitucionais propriamente ditos, porque aqueles dizem respeito a todo ordenamento jurídico, enquanto estes denotam clara conotação com um determinado ramo do Direito, não sendo facilmente aplicados.

Independente da corrente jurídica que se adote, parece acertado que entre as funções possíveis e imagináveis, talvez nos dias atuais, em que o direito privado precisa ser repensado, principalmente após a Constituição Federal de 1988, os princípios surgem como elemento integrador do ordenamento jurídico. Com estas palavras Gabriel (200?) reverencia a importância dos princípios gerais do direito.

Intui-se, dessa maneira, que a conceituação dos princípios gerais do direito tem relevância fundamental na integração das normas jurídicas do ordenamento brasileiro. Assim sendo, para valer-se destes princípios é necessário e possível fundamentar as decisões judiciais de acordo com os mesmos, considerados cernes da cultura jurídica humana. Por conseguinte, vamos analisar a aplicação do princípio da proporcionalidade no direito penal, bem como suas minúcias.


CAPÍTULO II- ORIGEM DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

2 HISTÓRICO

Os princípios são considerados nascedouros, ou ainda, mecanismos que servem de sustentação para determinada área. Nesse sentido, os princípios jurídicos surgiram com o escopo de servir de base para o entendimento e aplicação das normas jurídicas. Por conseguinte, incrustado nesse rol de mandamentos nucleares aparece o princípio da proporcionalidade, avaliado como mediador do Estado Formal de Direito. Assim sendo, é essencial destacar que a elevação deste princípio, até para que fossem respeitados os diretos dos indivíduos, decorre do entendimento de que havia direitos antagônicos ao próprio Estado.

O princípio da proporcionalidade tem sua origem fundada nos anseios do Estado de Direito pós Segunda Guerra Mundial. Conforme Nikitenko e Rampazzo (2010), seu início foi acompanhado da história do Estado de Polícia para o Estado de Direito, no intuito de estabelecer uma limitação do poder de coação do monarca para a garantia da integridade física e moral dos indivíduos que estavam sob sua dominação.

À sua vez, Almeida (2006), aponta que a expressão proporcionalidade tem um sentido literal limitado, pois a representação mental que lhe corresponde é a de equilíbrio. Há nela, a ideia implícita de relação harmônica entre duas grandezas. Mas a proporcionalidade em um sentido amplo é mais do que isso, pois envolve também considerações sobre a adequação entre meios e fins e utilidade de um ato para a proteção de um determinado direito.

Interessante conceituação pode ser observada nas palavras de Marini (2007), quando assevera que o surgimento do Estado de Direito nasce da ideia de a lei limitar a atuação do soberano. De fato, um direito fundamental só poderia ser limitado pela vontade geral, a qual seria expressa por meio de um comando normativo.

Interessante destacar que a partir da década de trinta alguns sistemas políticos começaram a desvirtuar o conceito de vontade geral para legitimar sua tirania. Assim, Marini (2007) leciona que a proporcionalidade surgiu na evolução histórico-jurídica do Estado de Direito para o Estado Democrático de Direito como princípio implícito à leitura da legalidade, do devido processo legal, e do respeito à dignidade da pessoa humana.

Araújo (2006) observa que o princípio da proporcionalidade surge com a Filosofia do Direito, e seu desenvolvimento até os dias atuais segue a história da defesa dos direitos humanos, surgindo como consequência da passagem do Estado de Polícia para o Estado de Direito, com intuito de controlar o poder de coação do monarca, limitando-o quanto aos fins aspirados e os meios aplicados.

Não obstante, Marini (2007), complementa aduzindo que é fundamental dizer que a proporcionalidade surgiu na evolução histórico-jurídica do Estado de Direito para o Estado Democrático de Direito, até como princípio implícito à leitura da Legalidade, do Devido Processo Legal, e do respeito à Dignidade da Pessoa Humana.

A proporcionalidade é uma máxima, um parâmetro valorativo que permite aferir a idoneidade de uma dada medida legislativa, administrativa ou judicial. Desta maneira, conforme as palavras de Cristóvam (2006), pelos critérios da proporcionalidade pode-se avaliar a adequação e a necessidade de certa medida, bem como, se outras menos gravosas aos interesses sociais não poderiam ser praticadas em substituição àquela empreendida pelo Poder Público.

Assim sendo, percebe-se que a proporcionalidade é fundamento base do Estado Democrático de Direito. Tal constatação deriva do entendimento de que nas diversas áreas do Direito existem colisões, e que este mediador é capaz de facilitar a intervenção destas controvérsias.

2.1 IGUALDADE VERSUS PROPORCIONALIDADE

A igualdade e a proporcionalidade são princípios de relevante importância para o campo do Direito. Considera-se que a introdução destes mecanismos na área jurídica seja para que o processo seja mais equânime e proporcional entre as partes, até pelo fato de que aí o Poder Judiciário poderia controlar de maneira mais efetiva a legitimidade dos atos estatais.

Ambos esses princípios têm origem em uma garantia formal que, com o tempo, mostrou-se insuficiente para defender os direitos individuais frente à autoridade estatal. No plano meramente formal, não há uma identificação entre os institutos: garantia de um procedimento adequado e existência de um direito uniforme. Contudo, Costa (200?), lembra que o desenvolvimento de um controle substantivo envolve a avaliação da legitimidade das normas, o que levou os juristas a desenvolverem ambas as garantias como uma espécie de controle de legitimidade.

Igualdade e proporcionalidade são temas bastante amplos, segundo Maciel (2012), pois como é sabido o direito está todo interligado, pois nasce de um mesmo tronco, gerando assim infinitas possibilidades de discussões sobre o tema, ademais, fundamenta-se em diversos princípios norteadores do direito, essenciais para sua aplicação justa, como deve ser, até porque, são frutos diretos do sentimento humano natural de justiça, cuja gênese é o Direito natural.

Na comparação entre equal protection e due process of law, na teoria jurídica norte-americana, e entre os princípios da igualdade e da proporcionalidade, seus correspondentes na teoria jurídica europeia em geral - e alemã em especial -, percebemos que entre essas duas categorias há uma série de pontos em comum, ao menos pontos de convergência. Adverte Costa (200?) que a principal ligação entre esses dois institutos está no fato de que ambos têm como objetivo controlar a legitimidade dos atos estatais e que, para poder efetuar essa operação, traduzem o conceito político de legitimidade pelo conceito jurídico de razoabilidade. Ambos propõem, assim, critérios de razoabilidade que todo ato estatal precisa observar para que seja válido.

Barros (2003), quando da análise da igualdade na lei, reconhece-se que o legislador possui uma ampla liberdade de valorar as situações da vida, as relações entre as pessoas e coisas, estabelecendo regras diversas de distribuição de vantagens e ônus, segundo as notas características colhidas e o fim por ele eleito para a satisfação de necessidades práticas.

O princípio da igualdade, consagrado pela Constituição, opera em dois planos distintos. Conforme Brasil (2011), de uma parte, frente ao legislador ou ao próprio Poder Executivo, na edição, respectivamente, de leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo que possam criar tratamentos demasiadamente distinguidos a pessoas que se localizam em circunstância análoga.

Estruturas diversas podem ser percebidas na análise dos princípios da igualdade e proporcionalidade. Barros (2003) observa que enquanto o primeiro atua separando e individualizando, o segundo funciona harmonizando e conciliando. Ocorre que ambos possuem zona de interseção; melhor esclarecendo: para aferir-se a validade de uma norma legal frente ao princípio da isonomia, necessita-se da ideia de proporcionalidade ou de razoabilidade. Ainda, o princípio da proporcionalidade apresenta-se com caráter meramente instrumental.

O Supremo Tribunal Federal recorre, num número cada vez maior, ao princípio da proporcionalidade para justificar seu posicionamento, contudo algumas questões poderiam ser resolvidas com a evocação do princípio da isonomia. Assim, Araújo (2013), assinala que apesar de haver estreita relação entre a proporcionalidade e a igualdade, há distinção nos seus planos de atuação. O princípio da igualdade atua apartando e individualizando e o da proporcionalidade funciona harmonizando e conciliando, contudo para se aferir a validade de uma norma legal frente ao princípio da isonomia, necessita-se da ideia de proporcionalidade ou de razoabilidade.

Barros (2003) complementa a ideia a diferenciação entre os institutos da igualdade e proporcionalidade apontando que essa relação tão íntima entre a igualdade e a proporcionalidade levou vários autores a tentar unificar ambas as ideias sob um denominador comum. Não é estranho, em face disso, que alguns tenham sustentado em alguma ocasião que o princípio da igualdade consagra o princípio da proporcionalidade, o que não deixa de ser verdadeiro, quando se toma em consideração a necessidade de invocá-la como critério para a aferição da legitimidade da diferenciação de tratamentos a pessoas até então tidas em idêntica posição.

Desta feita, observamos que o uso do princípio da proporcionalidade, definindo melhor seus significados e utilização adequada de cada sentido no contexto do caso concreto, bem como da igualdade, proporciona uma análise criteriosa de determinada situação, favorecendo a integração do Direito, inclusive no tocante a conexão destes institutos para com o ordenamento jurídico pátrio.

2.2 O SENTIDO DA PROPORCIONALIDADE

As variações terminológicas empregadas para mencionar o instituto da proporcionalidade são inúmeras, inclusive até pelo fato da falta de previsão expressa no texto constitucional. Mas, na inevitável colisão entre máximas jurídicas, brota a necessidade da operacionalização, situação que é percebida no campo jurídico. Desta feita, a proporcionalidade para o Direito é empregada para respeitar normas e ponderá-las a fim de aparelhar o arcabouço jurídico de um determinado sistema.

A proporcionalidade concretiza a ponderação de princípios ou interesses constitucionais em conflito no modelo de um Estado que centraliza os direitos fundamentais na sua ordem jurídica. D’Urso (2007) assevera que a dignidade humana consubstancia-se do núcleo essencial desses direitos e é parâmetro, portanto, na avaliação do peso dos princípios em jogo. Ainda, agrega-se à dignidade humana o atributo de unificar o catálogo previsto no art. 5º da Carta Política. O devido processo legal é parte essencial e integrante desse rol, mas representa apenas uma faceta dele.

A ideia de proporcionalidade, segundo a interpretação de Filho (2005), revela-se não só um importante princípio jurídico fundamental, mas também um verdadeiro topo argumentativo, ao expressar um pensamento que, além de aceito como justo e razoável, de um modo geral, é de comprovada utilidade no equacionamento de questões práticas, não só do direito em seus diversos ramos, como também em outras disciplinas, sendo grande exemplo a filosofia, sempre que se tratar da descoberta do meio mais adequado para atingir determinado objetivo.

À sua vez, Barros (2003), emprega seu parecer acerca do tema aduzindo que a razoabilidade enseja desde logo uma ideia de adequação, idoneidade, aceitabilidade, logicidade, equidade, traduz aquilo que não é absurdo, tão somente o que é admissível. Por assim dizer, a razoabilidade tem, ainda, outros significados, como, por exemplo, bom senso, prudência, moderação, entres outros.

O Estado Democrático de Direito favorece o fundamento ao princípio da proporcionalidade. Em outras palavras, D’Urso (2007), quer dizer que o princípio ora estudado decorre da voluntariedade do Estado de Direito ao mínimo ético. Conclui o autor afirmando que a aclamação desse princípio é o devido processo legal.

Ávila (2006) leciona que a proporcionalidade, como postulado estruturador da aplicação de princípios que concretamente se imbricam em torno de uma relação de causalidade entre um meio e um fim, não possui aplicabilidade irrestrita. Sua aplicação depende de elementos sem os quais não pode ser aplicada.

Entende-se, assim, que o sentido da proporcionalidade pode ser compreendido de forma assídua quando da análise de determinado caso em que haja tensão entre direitos constitucionais. Nesse instante surge a necessidade de uso do princípio da proporcionalidade, servindo com instrumento de controle de excesso e compatibilizando os interesses envolvidos entre as partes e situações em geral.

2.3 AS SUBDIVISÔES DO INSTITUTO

A análise do princípio da proporcionalidade possibilita compreender que acaso exista uma relação desarmônica entre duas correspondências jurídicas, utilizamos deste instituto com o meio de solução de controvérsias. Nesse sentido, observa-se que referido mandamento nuclear possui em sua estrutura base subdivisões em outros subprincípios, as quais serão analisadas na sequência.

Conforme Ramos (2011), devido a toda essa complexidade empregada em sua análise, o princípio ora em voga terminou por ser dividido em três subprincípios ou requisitos, como consequência dos avanços doutrinários nessa área, quais foram: a adequação (ou utilidade), a necessidade (ou exigibilidade) e, por último, a proporcionalidade em sentido estrito.

O primeiro subprincípio traz uma regra de compatibilidade entre o fim pretendido pela Administração Pública e os meios por ela utilizados para atingir seus objetivos. Na verdade, assevera Ramos (2011), fere até o bom senso imaginar que a Administração Pública possa utilizar meios ou tomar decisões que se mostrem completamente inúteis a ponto de sequer alcançar os fins para os quais se destinam.

Um juízo de adequação da medida adotada para alcançar o fim proposto deve ser o primeiro passo a ser considerado na verificação da observância do instituto da proporcionalidade, segundo Barros (2003). Por conseguinte, dentro do faticamente possível, o meio escolhido deve se prestar para atingir o fim estabelecido, mostrando-se, assim, adequado ao caso.

Definição interessante é observada nas palavras de Rabelo (2011), quando anota que o subprincípio da adequação impõe que a medida adotada pelo Poder Público deve ser apta à consecução ou, pelo menos, à fomentação do objetivo pretendido. Cinge-se, pois, em analisar a existência de uma relação adequada entre medida e fim. Havendo a destinação de um meio não apropriado, revelando uma desproporção manifesta entre meio e fim, violado está o subprincípio em comento, e esse ato abusivo não pode ser tolerado.

Bortowski (2009) assinala que o subprincípio da adequação – também denominado de idoneidade, conformidade, pertinência – consubstancia-se na investigação da capacidade do meio produzir o resultado pretendido. Cumpre observar, todavia, que somente se o meio escolhido for manifestamente incapaz de contribuir para a consecução do fim pretendido é que ele será desproporcional: o meio deve realizar o fim, ainda que esse meio seja o que menos, pior e com menor certeza promova o fim. Esse subprincípio evita, portanto, escolhas arbitrárias, limitando o Poder ao direcionar o agente político a uma eleição condizente com a realidade pretendida pela retirada, do seu âmbito de escolha, de opções patentemente ineficazes.

É neste cenário, que "[...] a adequação dos meios aos fins traduz-se em uma exigência de que qualquer medida restritiva deve ser idônea à consecução da finalidade perseguida" (BARROS, 2003, p.78). Desta feita, este juízo de ponderação, esclarecido por Barros, comprova a importância da adequação nas medidas de solução de controvérsias de princípios.

Por sua vez, Ávila (2006), durante a apreciação da proporcionalidade, leciona que a adequação exige uma relação empírica entre meio e fim, visto que o meio deve levar a realização do fim. Consequentemente, a adequação do meio escolhido deve ser julgada mediante a consideração das circunstâncias existentes no momento da escolha e de acordo com o modo como contribui para a promoção do fim.

No juízo de apreciação do tema, Batista (2008), faz importante menção ao discorrer sobre a adequação apontando que se trata de regras processuais, as quais devem estar adequadas aos sujeitos que dela vão se valer. Desta feita, torna-se essencial observar as características dos sujeitos envolvidos na discussão, até pelo fato de que pelo princípio da adequação se impõe que as regras processuais sejam adequadas a situação em tela.

Na sequência da subdivisão do princípio da proporcionalidade vamos analisar o princípio da necessidade. Seguindo essa ideia de diferenciação, analisam-se as palavras de Bortowski (2009) que aduz que o subprincípio da necessidade – também denominado de exigibilidade, indispensabilidade, da alternativa menos gravosa – busca o meio idôneo mais moderado, mas igualmente eficaz na consecução do fim colimado. Ele tem relação com os princípios da intervenção mínima, da proibição de excesso e da proibição de proteção deficiente, e apregoa que, entre os meios a disposição, deve-se optar por aquele que seja menos gravoso, quer seja sobre o prisma do excesso (aquele que menos afete os interesses e liberdades em questão), ou da insuficiência (aquele mais proteja os interesses e liberdades em questão). Assim, o meio apenas será desnecessário se for o que, evidentemente, mais afete ou menos proteja os interesses e liberdades para obtenção da finalidade tencionada.

À sua vez, Rabelo (2011) complementa destacando que o subprincípio da necessidade ou exigibilidade, por conseguinte, determina ao Poder Público optar, dentre os meios possíveis para obtenção de determinado fim, por aquele que promova o objetivo pretendido com igual eficiência, mas restrinja em menor intensidade o direito fundamental atingido.

Conceituação interessante é observada nos dizeres de Ramos (2011) ao referir-se ao subprincípio da necessidade ou exigibilidade como a escolha de medida restritiva de direitos indispensável à preservação do próprio direito por ela restringido ou a outro em igual ou superior patamar de importância.

Desta feita, um ato estatal que limita um direito fundamental apenas será necessário quando se concluir que não apenas este ato é o menos danoso ao direito fundamental, após compará-lo com os outros meios capazes de realizar o fim almejado com a mesma eficiência, mas também que tal ato possui delimitações quanto ao seu âmbito de intervenção, aos sujeitos que serão atingidos e o tempo de duração. Rabelo (2011) dá sequência a ideia asseverando que a diferença entre o exame da necessidade e o da adequação é singelo: o exame da adequação é um exame absoluto, enquanto que o exame da necessidade é um exame comparativo.

Nesse sentido, depois de analisados os subprincípios da adequação e da exigibilidade, componentes do princípio da proporcionalidade, delinearemos o terceiro integrador deste instituto, qual seja, o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito.

O subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito determina a realização de um exame da relação custo-benefício do ato estatal avaliado, devendo ficar demonstrado que o benefício proporcionado é superior ao ônus imposto. Ou seja, segundo Rabelo (2011), acaba por proporcionar ao intérprete a realização da técnica da ponderação de interesses, estando de um lado da balança os interesses protegidos com o ato e, do outro, os sacrificados por ele.

Bortowski (2009) traz interessante ensinamento. Conforme ele, o subprincípio da proporcionalidade stricto sensu, diferentemente dos outros dois subprincípios (nos quais a análise é feita in abstracto), é casuístico: atua verificando se, no caso concreto, o custo (intervenção em um direito fundamental) se justifica diante do benefício (realização de outro direito fundamental). Para saber se o meio é proporcional em sentido estrito é essencial responder ao seguinte questionamento: na ponderação entre o custo e o benefício, é sustentável, juridicamente, sofrer esse custo para obter esse benefício.

Nesse sentido, Ávila (2006), quando trata do princípio da proporcionalidade e suas peculiaridades, verifica que o exame da proporcionalidade em sentido estrito exige a comparação entre a importância da realização do fim e a intensidade da restrição aos direitos fundamentais. Ainda, que esse exame complexo depende de variáveis, como o meio adotado para atingir uma finalidade pública e o que sua adoção causa.

Ainda mantendo a ideia de diferenciação deste subprincípio em detrimento aos outros dois já citados, Barros (2003), garante que o princípio da proporcionalidade strictu sensu, é de suma importância para indicar se o meio utilizado encontra-se em razoável proporção com o fim perseguido. A ideia de equilíbrio entre valores e bens é exaltada. Isso quer dizer que o juiz, quando considera adequada a relação entre determinada restrição e o fim a que se destina, ou mesmo quando reconhece a inexistência de outro meio menos gravoso que pudesse conduzir ao mesmo resultado, nem por isso está a chancelar uma providência que imponha ônus demasiados ao atingido.

Entendimento parecido é recordado por Bonavides (1993) quando comenta que tal instituto é marcado de sua tríplice manifestação, que coincide com a noção de racionalidade, isto é, com a primeira acepção do princípio da razoabilidade. O teste de razoabilidade envolve a adoção de critérios de proporcionalidade - adequação e exigibilidade, enquanto o teste de razoabilidade, relacionado à questão de proporcionalidade em sentido estrito, configura um método de obtenção de equilíbrio entre os interesses em conflito.

Nos dizeres de Silva (2002) o exame da proporcionalidade em sentido estrito consiste em um sopesamento entre a intensidade da restrição ao direito fundamental atingido e a importância da realização do direito fundamental que com ele colide e que fundamenta a adoção da medida restritiva. Para tanto não é necessário que a medida restritiva aniquile o direito fundamental sacrificado ou atinja o seu núcleo fundamental. Ainda que a restrição seja pequena, se os motivos que fundamentam a adoção da medida não tiverem peso suficiente para justificá-la, será uma medida desproporcional.

Desta feita, a apreciação da proporcionalidade em sentido estrito é essencial para que haja um parâmetro de cautela entre valores e consequentemente tentativa de solução da controvérsia. No entanto, esse não é apenas um dos mecanismos, que, somados aos demais subprincípios, visam constatar se uma decisão normativa, legislativa ou judicial, que diz respeito a um direito fundamental, é adequada, necessária e proporcional.

2.4 CONSTITUCIONALIDADE DO PRINCÍPIO PROPORCIONAL

A organização da estrutura jurídica de determinado Estado é baseada aplicação de regras e normas, as quais visam disciplinar os indivíduos na sociedade. Nesse sentido, cada ordenamento é calcado em institutos inaugurais, também denominados princípios. Estes, por sua vez, estão presentes, como é o caso do Brasil, na carta suprema – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – sendo por vezes expressos ou mesmo implícitos. Desta feita, a constitucionalidade do princípio proporcional é essencial, até pelo fato de ser um importante mediador na colisão de ideias jurídicas.

A garantia dos direitos fundamentais de liberdade e, principalmente, a implementação dos direitos fundamentais sociais, exige uma atuação judicial responsável e comprometida, que, embora reconhecendo os inegáveis limites da reserva do possível, torne viável e efetiva a paulatina realização dos compromissos sociais constitucionalmente afirmados. Cristóvam (2006) aduz que dentre os inúmeros espaços de aplicação dessa máxima, sem dúvida na defesa da justiciabilidade plena da Administração Pública e na concretização dos direitos fundamentais sociais podem ser colhidos os frutos mais significativos à teoria constitucional e à efetiva justiça social.

Segundo a lição de Cardoso (2008), o princípio proporcional possui natureza mista, tendo como conteúdo características de princípio e de regra. A primeira deve-se ao fato de ter um alto grau de generalidade, abstratividade e de fundamentalidade. A segunda advém da possibilidade, diante de um fato concreto, da obrigatoriedade de hierarquizar valorativamente um dos princípios fundamentais conflitantes, para solucionar a questão posta em juízo.

Nesse sentido, até para complementar essa ideia constitucional de princípio da proporcionalidade, Barros (2003), lembra tal instituto num contexto normativo no qual estão inseridos os direitos fundamentais e os organismos de respectiva assistência. Assim, o autor indica que o surgimento dele se dá a título de garantia especial, demonstrada na exigência de que toda intervenção estatal deve ser no sentido de se adequar as necessidades da ocasião ao caso analisado.

Observa-se nas palavras de Rabelo (2011) que apesar da grande divergência doutrinária, dúvida não paira no sentido de que a Constituição da República de 1988 representa um sistema aberto, não se resumindo ao somatório dos seus dispositivos expressos. Existem as normas explícitas e as implícitas, sem qualquer hierarquia entre elas. As normas implícitas, por sua vez, são resultantes não de uma escolha indiscriminada do intérprete, mas de um trabalho de descoberta da jurisprudência e da doutrina. Assim, o princípio constitucional da proporcionalidade é fruto dessa concepção, representando um princípio implícito, oriundo da estrutura dos direitos fundamentais, pois eles dependem da aplicação racional dos subprincípios da proporcionalidade para solucionar os conflitos existentes entre si e coexistirem no ordenamento.

Doutra banda, remetendo o princípio da proporcionalidade à sua origem alemã, vale destacar que o princípio da proporcionalidade- derivado do princípio do Estado de Direito -, estatuído explicitamente na Constituição (art. 20, n.3, da Constituição alemã), tendo em vista que a ideia de que nenhum cidadão deve ser onerado pelo Estado mais do que o necessário e adequado pertence aos princípios constitutivos de uma ordem jurídica. Desta forma, Rabelo (2011) afirma que, em todo caso, o princípio da proporcionalidade poderá reclamar obrigatoriedade, agora aplicado no Brasil, seguindo esta linha, como princípio geral do direito.

Os ordenamentos jurídicos contemporâneos, na visão de Cruz e Gomes (2002), têm importância afinca dos princípios constitucionais, tal que, diante da agilidade em que se operam os avanços tecnológicos e as mudanças em conceitos de categorias clássicas, como soberania, democracia e Estado Democrático de Direito, se apoiam muito mais nos princípios constitucionais do que em qualquer outra espécie de norma jurídica.

Desta feita, depois de levantados estes interessantes pontos acerca do caráter essencial dos princípios, sempre com especial designação ao princípio da proporcionalidade e sua implicação no Direito, passaremos a analisar a sua implicação na problemática do Direito Penal brasileiro. Ou seja, como está sendo utilizado tal princípio, até como forma de se averiguar as situações em que tal instituto se encaixa, sempre respeitando a carta magna.


CAPÍTULO III- PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE NO DIREITO PENAL BRASILEIRO

3 NOÇÕES PRELIMINARES

A necessidade de proteção de interesses e de sobrevivência individual ou coletiva fez nascerem os regramentos e, consequentemente, o Direito. A manutenção desses atos volitivos e a coexistência social têm sido baseada no permitido e proibido, lícito e ilícito, sendo que a transgressão de determinada norma acarreta sanção ao indivíduo.

Nesse contexto, depois de esgotadas todas as vias possíveis de controvérsias, desponta o Direito Penal, como o thelos, ou ainda, um fim em si mesmo. Esta disciplina jurídica que, aliás, se diferencia das demais, até pelo fato de ter o condão de impor sanções mais severas à liberdade, tem a função de instrumentalizar o Estado contra os mais graves abusos das regras de condutas.

Importante salientar aqui a definição de Khaled Júnior (2009), quando assinala que ao estabelecer uma definição de Direito Penal e de Dogmática Jurídico-Penal implica-se em exercer um esforço analítico de considerável envergadura, em função da complexidade da temática envolvida e dos infinitos problemas que envolvem a incidência do poder punitivo desde uma política orientada para a máxima redução de danos em relação aos direitos fundamentais do cidadão. Trata-se de um empreendimento que envolve recurso à enorme pluralidade de fontes e que não pode ser tratado desde uma leitura jurídica que considere somente a produção científica nacional.

Conforme Bitencourt (2008), a pretensão preventiva também distingue o Direito Penal dos demais ramos do ordenamento jurídico, uma vez que objetiva evitar a prática de crimes através de uma prevenção geral genérica, dirigida a todos, que em caso de falha, impõe através do devido processo legal a sanção cominada, sendo esse o seu sentido de prevenção especial, expressão máxima do caráter coercitivo do poder exercido. Com efeito, daí decorre a noção de que a norma penal consiste em um imperativo, onde se atribui à pena a função de motivar contra o delito, ou seja, uma função de prevenção de delitos e de proteção de bens jurídicos.

Desta feita, as características e fundamentos inerentes ao Direito Penal traduzem a noção de bem jurídico. Às instâncias estruturantes do Direito incumbiria, então, a provocação de averiguar, quais interesses e valores devem ser colhidos para efeito de tutela penal. Assim, este campo do Direito traduz a ideia de defesa da intervenção penal mínima.Não obstante, os princípios, que eram apenas uma fonte supletiva, raramente utilizada, tornam-se, gradativamente, a principal fonte do Direito Penal. 

O sistema penal é um sistema garantista de controle formalizado. Apresenta, vantagens que os sistemas de controle informais não dispõem, possibilitando que através da resposta penal sejam afastadas reações incontroladas e espontâneas como a vingança privada. Garcia-Pablos (1995) considera que o Direito Penal, por suas características, é um instrumento mais racional, previsível, limitado e seguro do que outros controles sociais. O próprio critério de proteção a bens jurídicos enquanto garantia será reforçado pelos critérios dos princípios da ofensividade – exigência de lesão ou perigo de lesão concreta ao bem jurídico – e insignificância – desconsideração de ataques insignificantes aos bens juridicamente tutelados.

A divisão do Código Penal em uma Parte Geral e uma Parte Especial consiste na atribuição à primeira das questões centrais da teoria e aplicação do Direito Penal, enquanto a segunda trata da descrição de delitos concretos. Por este motivo, Khaled Júnior (2009), explica que temas como a função e missão do Direito Penal e os fins da pena são tradicionalmente discutidos nos estudos dedicados à Parte Geral. Também merece menção uma série de referências às subdivisões do Direito Penal, como Direito Penal Econômico, Direito Penal Empresarial, Direito Penal do Consumidor, Direito Penal Ambiental e assim por diante, que caracterizam um objeto de estudo mais específico.

O exercício de ponderação, seja de bens e/ou valores a serem protegidos, traduz a complexidade da vida social, e a esperada função limitadora e punitiva do Direito Penal. Por assim dizer, a imposição de um instrumento formal de controle social tão significativo como é o sistema penal, traduz a necessidade de regramento do Estado perante as atitudes do povo.

Tanta a função legislativa quanto à judiciária tem o condão de esculpir determinações, representando a possibilidade de convivência pacífica nas relações das sociedades organizadas em Estados de Direito, situação verificada, exemplificadamente, no ordenamento jurídico brasileiro. Na primeira ocasião apresentada, a avaliação se faz em caráter geral e abstrato, ao passo que na segunda, opera-se na solução do caso a ser apreciado.

A solução para o impasse é o reconhecimento de um dever estatal de punir diante de um crime, uma vez que se fazem presentes os seus requisitos (tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade) o que é muito diferente de um direito. Esta definição permite reconfigurar a já superada dinâmica do jus puniendi e jus persequendi de acordo com pressupostos mais adequados às feições de um Estado Constitucional de Direito. Segundo Ferrajoli (2002), não é por acaso que o funcionamento do sistema penal é um dos indicativos mais seguros do quanto é democrática ou autoritária uma sociedade.

Ramo do direito público, proveniente das normas elaboradas do legislativo, o Direito Penal se configura como meio para reprimir transgressões e delitos, aplicando penas aos indivíduos, sempre com a finalidade de preservar a sociedade. Em uma acepção mais vantajosa, diz-se que tal campo do direito visa proteger os bens jurídicos fundamentais.

3.1 PROPORCIONALIDADE E DIREITO PENAL

Há tempos o ser humano vem tentando organizar a vida social dos indivíduos. Nesse contexto, o Direito Penal revelou-se um importante solucionador de transgressões de condutas. Mas, significativo destacar aqui a importância dos princípios para a elaboração do sistema jurídico brasileiro, e, em especial, o princípio da proporcionalidade que, aplicado nesta área jurídica, traduz a real essência da ponderação de valores e regras.

Conforme Rabelo (2011) pode-se apontar os princípios como orientadores de todo o sistema normativo, sejam eles expressos ou não. No entanto, complementa articulando que a relação entre Direito Penal e Constitucional é profunda e inegável, visto que a Constituição é o marco fundante do ordenamento jurídico de um Estado Democrático de Direito, e, desta feita, os próprios bens jurídico-penais localizam raízes materiais na Carta superior e cabe ao âmbito penal a empreitada de tutelar os direitos fundamentais nela dispostos.

À sua vez, Eugênio (2012) propõe que é de suma importância de se inclinar de forma analítica sobre os princípios penais constitucionais, pois o Direito Penal como sendo considerado o carro chefe do Direito, carregando o privilégio de principal ramo do direito público e, estando alicerçado em princípios basilares jurídicos essenciais, busca-se com isso, compreender como tais princípios estão sendo empregados na prática em face do poder punitivo do Estado.

Apresenta-se, então, o princípio da proporcionalidade como saudável e imprescindível instrumento a ser manejado em dois momentos, quais sejam:para o legislador, porque teria de mensurar que bens e valores proteger penalmente; e para os juízes e tribunais, para que assim extraiam da lei penal o sentido social do justo, fazendo predominar o benéfico manejo do Direito Penal como disciplina essencial na promoção e defesa dos direitos e garantias fundamentais de todos.

O princípio da proporcionalidade nas palavras de Gomes (2003) desempenha importante função dentro do sistema penal, uma vez que orienta a construção dos tipos incriminadores por meio de uma criteriosa seleção daquelas condutas que possuem dignidade penal, bem como fundamenta a diferenciação nos tratamentos penais dispensados às diversas modalidades delitivas. Além disso, estabelece limites à atividade do legislador penal e, também, do intérprete, posto que estabelece até que ponto é legítima a intervenção do Estado na liberdade individual dos cidadãos.

Ressalta-se, como uma manifestação inequívoca do princípio da proporcionalidade no âmbito do direito penal, a consagração do princípio da liberdade, considerado um valor supremo no ordenamento jurídico; é onde o direito penal atua diretamente, pois cabe a ele proteger bens jurídicos à custa do sacrifício da liberdade das pessoas. Neste sentido, Gomes (2003) completa afirmando que o princípio da proporcionalidade apresenta-se como uma regra dirigida à maximização da liberdade.

Na dúplice ideia de origem e desenvolvimento do instituto da proporcionalidade, instrumento advindo do direito anglo-saxão, o princípio tem origem longínqua, desde a cláusula lawof the land, inscrita no art. 39 da Magna Carta de 1215. E é justamente nesse contexto, e tendo em vista as razões supracitadas, será enfocado o princípio da proporcionalidade no Direito penal brasileiro.

O princípio da proporcionalidade foi adotado pelos Estados Unidos, sendo que o positivaram através da cláusula do devido processo legal, em sua Constituição. A 5ª Emenda, editada em 1791, determina que ninguém será privado da vida, liberdade ou propriedade sem o devido processo legal; ao passo que a 14ª Emenda dispõe que nenhum Estado privará qualquer pessoa da vida, liberdade ou propriedade, sem o respeito do devido processo legal.

Nesse sentido, a trajetória histórica do devido processo legal nos Estados Unidos teve duas grandes fases. Em sua primeira fase atribuía-se à cláusula um significado estritamente processual. Nesta fase, a garantia em contenda articulava respeito apenas à harmonia dos processos, inicialmente penais, e depois também civis e administrativos. Na segunda fase, o princípio se revestiu de caráter substantivo. Agora, essa versão substantiva do devido processo legal se tornou um instrumento respeitável de defesa dos direitos individuais, fazendo com que existisse o controle do arbítrio do legislativo e da discricionariedade do governo.

Entre outras influências, destaca-se a trazida pela França, onde o princípio da proporcionalidade foi esculpido na jurisprudência do Conséil D’État. Esta, por sua vez, permite que seja abolido ato administrativo discricionário, praticado por autoridade competente, quando o mesmo tiver escopo contrário à lei. E, enfim, sob a influência do direito italiano, onde o mesmo é chamado de razoabilidade (ragione volezza), onde lá também há o reconhecimento deste instituto proporcional.

Após análise global da aplicação do princípio da proporcionalidade, atinge-se o direito brasileiro, onde se constata a falta de previsão expressa na Constituição Federal dessa máxima jurídica. Fundamental destacar que é com base nesse princípio que se pode garantir que um sistema penal somente estará explicado quando a totalização das violências que ele pode prever, for superior à das violências formadas pelas penas que ele pode impor.

Utilizado de forma implícita, o princípio da proporcionalidade pode ser verificado, exemplificadamente, em julgamento proferido em 1977, da Representação nº 930. Na oportunidade enfatiza, Lyra(2011), onde o assunto em pauta era a extensão da liberdade profissional e o sentido da expressão condições de capacidade, inscrita no art. 153, § 23 da Constituição de 1967/69 ; o julgamento da Representação nº 1.054, de 4 de abril de 1984, em que o STF discutiu a constitucionalidade do art. 86, da Lei nº 4.215, de 27 de abril de 1963, que estabelecia que os magistrados, os membros do Ministério Público e outras categorias de servidores eram impedidos de exercer a advocacia, pelo prazo de dois anos, a contar da data da aposentadoria ou da disponibilidade; e a decisão proferida na Representação nº 1.077, de 28 de março de 1984, onde o STF julgou inconstitucional a Lei nº 383/80, do Estado do Rio de Janeiro, que estabelecia o aumento da taxa judiciária, por considerá-lo desproporcional à capacidade econômica da população do Estado, e porque isso acarretaria o desrespeito à garantia constitucional do amplo acesso à Justiça.

Este importante princípio foi trazido no corpo do texto da atual Constituição, até pelo fato dos legisladores originários buscarem efetivar toda e qualquer forma de direito.Assim, percebe-se um exemplo no caput do art. 44 que dispõe que a administração pública, direta ou indireta, de qualquer dos poderes obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade, exigindo-se, como condição de validade dos atos administrativos, a motivação suficiente e, como requisito de sua legitimidade, a razoabilidade.

Ressalte-se, porém, que apesar de não ter sido expressamente mencionado nos textos constitucionais de 1946, 1967 e 1969, o princípio em análise foi utilizado, na maioria das vezes de forma implícita, sendo que STF só veio a reconhecer explicitamente o princípio da proporcionalidade na decisão da ADIN nº 855-2, onde se discutia a constitucionalidade de lei do Estado do Paraná, que determinava que os botijões de gás fossem pesados diante dos consumidores, no momento em que os mesmos estivessem sendo vendidos. Lyra (2011), aduz que diante da inviabilidade prática do cumprimento da ordem legal, o STF concedeu a liminar suspendendo a eficácia da norma. Reconheceu-se explicitamente a possibilidade de lesão ao princípio da proporcionalidade.

Nota-se, assim, que o princípio da proporcionalidade é aplicado em todo o Direito, como se acabou de constatar nos exemplos, especialmente, seguindo a ideia deste trabalho, no campo penal. Esse corolário exige que o legislador, quando da elaboração da lei penal, constitua uma relação de proporcionalidade entre a importância constitucional do bem jurídico penal tutelado, a gravidade da ofensa ou ameaça a esse bem, e a seriedade da pena conferida.

Os princípios que estruturam a Carta Magna atuam como orientadores dos diversos ramos do Direito, servindo de base operacional também para o Direito penal. Os princípios penais, segundo ensinamentos de Lyra (2011), também chamados por alguns de princípios penais constitucionais, são extraídos dos princípios constitucionais e dessa forma esses últimos são utilizados pelo direito penal na solução dos conflitos sociais, que de outro modo não seriam adequadamente enfrentados. Sem eles, a legislação penal restaria facilmente vencida pela marcha dos fatos sociais. E dentre esses princípios, encontra-se o da proporcionalidade.

Nesse sentido, Sabino (2003) expõe que o direito penal só pode ser devidamente compreendido e aplicado com um enfoque constitucional. Por conseguinte, os juízos acerca da proporcionalidade de uma restrição de um bem jurídico tutelado por inadequação do meio para se atingir um fim, por sua desnecessidade ou por sua falta de proporcionalidade em sentido estrito são plenamente aplicáveis no âmbito penal. O postulado da razoabilidade do mesmo modo se revela importante na apreciação de aspectos particulares da hipótese concretamente analisada que justificam a não aplicação de uma norma formalmente violada.

O princípio da proporcionalidade exige proporção entre a gravidade do delito e a pena cominada abstratamente pelo legislador (proporcionalidade abstrata), assim como proporção entre a gravidade do delito cometido e a pena exata imposta ao seu autor pelo juiz (proporcionalidade concreta). Nesse aspecto, Lyra (2011) adverte que as atividades do legislador e do juiz se completam, uma vez que ao fixar em abstrato os limites da pena, o legislador deve deixar margem ao juiz para que ele possa buscar aplicar uma pena proporcional à danosidade efetiva ou potencial do delito por ele julgado.

Assim sendo, diante das considerações apresentadas pode-se verificar que o princípio da proporcionalidade tem fundamento constitucional e caráter interveniente do Estado frente à sociedade, fortalecendo a máxima do Estado Democrático de Direito. Não obstante, tal circunstância é fortalecida quando da análise deste instituto em âmbito penal, visto que age como delimitador da vontade das partes, buscando a adequação da pena imposta diante da transgressão estabelecida.

3.2 A IMPORTÂNCIA DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE PARA A COMPREENSÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

O caráter punitivo do Estado remonta há tempos. Nesse contexto, as penas privativas de liberdade constituem essa máxima repressiva. No início o caráter punitivo tinha era exacerbado, sendo que desconfigurava a essencial intenção, qual seja, punir de forma moderada. No entanto, com o passar do tempo, a pena foi adquirindo um status moderador da vontade dos indivíduos, até atingir o estilo atual.

A pena privativa de liberdade já se fazia presente na Antiguidade, época em que não possuía caráter de pena, vez que as penas propriamente ditas resumiam-se a lesões corporais infamantes, que culminavam com a morte. Leciona Bitencourt (2009) que ela continuou existindo durante a Idade Média, momento histórico em que as penas tornaram-se extremamente bárbaras, caracterizando-se principalmente pelos atos públicos de mutilação e humilhação do acusado. Percebe-se que a pena, nestes períodos históricos, foi aumentando ao longo do tempo seu potencial de crueldade, ao passo que o mecanismo de privação de liberdade permaneceu nesse período com a finalidade única de contenção do acusado até a sentença e a execução da (verdadeira) pena.

Cervini (2002) continua o raciocínio de Bitencourt aduzindo que na segunda metade do século XVII, a pena de morte começou a ser questionada, visto que não era um instrumento eficaz contra a criminalidade. Iniciou-se, na Europa, um movimento fundamental para o desenvolvimento da pena privativa de liberdade, com a construção de prisões organizadas que visavam corrigir os apenados, através da implantação do trabalho e da disciplina.

Por conseguinte, complementa Cervini (2002),que é clara a influência do sistema capitalista neste movimento: era preciso adquirir mão-de-obra, e não sujeitá-la à destruição; a pena de morte havia se tornado pouco viável do ponto de vista econômico. Assim, através do exercício do controle da força do trabalho, da educação e da “domesticação” do trabalhador, as penas cruéis perdiam força. Somente no século XVIII a privação de liberdade adquiriu caráter de “pena”, e apenas um século depois a prisão converteu-se em pena principal. A prisão constituiria, então, a denominada pena própria de países civilizados.

Na esfera penal, faz-se necessário o respeito a uma relação de proporcionalidade entre a importância do bem jurídico-penal tutelado, a gravidade da ofensa ou ameaça a esse bem, e a gravidade da pena imposta pela prática do fato delituoso. Segundo Lyra (2011) exige-se que exista proporção entre a intensidade da pena imposta e a gravidade do delito cometido.

Hamilton apud Barroso (2003) enfatiza que para ser observado o princípio da proporcionalidade, o juiz não pode se comportar-se como um mero aplicador acrítico da lei penal. Cabe-lhe analisar se tal lei está de acordo com as normas e os princípios constitucionais. Ressalte-se, entretanto, que quando se diz que o magistrado deve superar o modelo legalista formalista e buscar no sistema jurídico a solução justa para o caso concreto, não se está defendendo que ele passe por cima da lei ou que simplesmente a ignore.

Não bastasse tal entendimento, Hamilton apud Barroso (2003), considera que o subjetivismo voluntarista do julgador também não seria a melhor companhia. O que se defende é que o magistrado deve se submeter à lei editada pelo legislador penal, desde que seja uma lei coerente com a Constituição Federal, ou seja, ele deve sempre aferir a validade dessa lei. Nisso, aliás, reside a enorme dimensão da função jurisdicional, desde os federalistas americanos.

E, por conseguinte, uma pena proporcional é sempre aquela que não é excessiva. Para tanto, não deve ser desproporcional ao mal causado pelo delito. Nas palavras de Queiroz (2006), vê-se que deve o castigo guardar proporção com a gravidade do crime praticado. Assim, a pena, igualmente, será suficiente, quando se mostrar proporcional ao mal praticado pelo agente. Se ela não respeita a proporcionalidade, torna-se uma violência contra o indivíduo. Isso reflete, por exemplo, na fixação da duração da pena em cada caso.

Primeiramente, pode-se dizer que o estudo do princípio da proporcionalidade no direito penal, por si só, já pressupõe a adoção de alguns pontos de partida, como o vínculo indissociável entre a Constituição e a elaboração/aplicação das normas penais. Enfatiza Rabelo (2011) que o princípio da proporcionalidade, presente na Constituição brasileira, atua em relação ao legislador penal, que deve utilizá-lo para construir um direito penal condizente com os valores e a própria realidade social.

A pena privativa de liberdade deve ser calcada no respeito à proporcionalidade, visto que, acaso isso não seja respeitado, está-se afrontando o intuito moderador do Estado Democrático de Direito. Efetivamente, na busca do justo e moderado, o operador do Direito deve encontrar o correto limite de ressalva de direitos, sem infligir ao indivíduo uma restrição desproporcional a um direito capital.

Sarlet (2005) baliza que na seara do direito penal resulta inequívoca a vinculação entre os deveres de proteção e a teoria da assistência dos bens jurídicos fundamentais, como elemento legitimador da intervenção do Estado, assim como não mais se questiona seriamente, apenas para referir outro aspecto, a necessária e correlata aplicação do princípio da proporcionalidade e da interpretação conforme a Constituição. Com efeito, para a efetivação de seu dever de proteção, o Estado – por meio de um dos seus órgãos ou agentes - pode acabar por afetar de modo desproporcional um direito fundamental (inclusive o direito de quem esteja sendo acusado da violação de direitos fundamentais de terceiros).

Não satisfeito, Sarlet (2005) ressalta que esta hipótese corresponde às aplicações correntes do princípio da proporcionalidade como critério de controle de constitucionalidade das medidas restritivas de direitos fundamentais que, nesta perspectiva, atuam como direitos de defesa, no sentido de proibições de intervenção (portanto, de direitos subjetivos em sentido negativo, se assim preferirmos). O princípio da proporcionalidade atua, neste plano (o da proibição de excesso), como um dos principais limites às limitações dos direitos fundamentais, o que também já é de todos conhecido e dispensa, por ora, maior elucidação.

A aplicação desse princípio vem ganhando expressão no Direito Penal, posto que toda pena limita direitos individuais e só se justifica quando atende aos reclamos de bem estar social. Assim, Lyra (2011) observa que os direitos e garantias fundamentais constituem limites à ação do Estado. Somente a Constituição pode lhes opor restrições. A Carta Magna estabelece no art. 5º, II, que “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Logo, ainda que a intervenção no âmbito dos direitos fundamentais seja permitida pela Constituição, terá que ocorrer através de decisão do legislador, ou seja, através de lei no sentido próprio.

No tocante à utilização do princípio da proporcionalidade importa que, desde logo, seja feito o registro de que a jurisprudência pátria tem feito, em regra, bom uso das perspectivas abertas. Conforme Sarlet (2005), o presente exemplo cuida de decisão do nosso Superior Tribunal de Justiça, proferida por sua Terceira Seção, em 24 de outubro de 2001, que deliberou pelo cancelamento da Súmula 174-STJ e consignou: “O aumento especial de pena no crime de roubo em razão do emprego de arma de brinquedo (consagrado na Súmula 174-STJ) viola vários princípios basilares do Direito Penal, tais como o da legalidade (art. 5o, inciso XXXIX, da Constituição Federal e art. 1o, do Código Penal), do ne bis in idem, e da proporcionalidade da pena”.

Ademais, Sarlet (2005) afinca que a Súmula 174 perdeu o sentido com o advento da Lei 9.437, de 20.02.1997, que em seu art. 10, par. 1o, inciso II, criminalizou a utilização da arma de brinquedo para o fim de cometer crimes. (Recurso Especial n. 213.054-SP, Relator Min. José Arnaldo da Fonseca, voto vencido). O Min. Gilson Dipp, ao distinguir o óbvio – quem porta uma arma de verdade sabe que poderá matar, quem porta uma arma de brinquedo sabe que não poderá fazê-lo –, observou que tratar igualmente situações objetiva e subjetivamente diversas poderia “malferir o princípio da proporcionalidade”.

Assim sendo, partindo do pressuposto de que o direito é uma ciência dinâmica e por sua própria natureza é que se encontra a dificuldade de conceituação do que seja o bem jurídico, depois de analisadas inúmeras lições de autores e juristas acerca do tema proporcionalidade e Direito Penal, constata-se que a essência do assunto evoluciona de acordo com o desenvolvimento humano, bem como da sociedade e do Estado.

3.3 APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO PROPORCIONAL, JURISPRUDÊNCIA NO BRASIL E QUESTÕES

A supremacia da ordem jurídica de determinado Estado reflete a imposição deste perante seu povo. Partindo dessa ideia, elaboraram-se as constituições, até como forma de se evidenciar que direito básicos fossem respeitados. A racionalidade com que tais foram incrustados num texto legal transmite o entendimento de que existiam pressupostos iniciais em que foram calcados, estes, denominados princípios. O Estado, assim, controla os anseios da sociedade impondo sanções acaso necessárias. Tais medidas devem ser balizadas no sentido de serem proporcionais a cada caso. Desta feita, uma vez apresentada a contenda, pode a jurisprudência intervir, caso já tenha sido editada a máxima fundante.

A Jurisprudência brasileira, em especial do STJ e STF, tem, apesar de ainda incipiente no tocante à matéria penal, utilizado o princípio da proporcionalidade. Essas Cortes, segundo Lyra (2011), reconhecem a proporcionalidade como um princípio constitucional implícito, e tendem a não fazer distinção entre ele e o princípio da razoabilidade. Ainda, a autora apresenta algumas ementas de acórdãos desses Tribunais que mencionam o princípio da proporcionalidade como fundamento da decisão, especificadamente em matéria penal:

Ementas do Superior Tribunal de Justiça:

“PROCESSUAL PENAL E PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRISÃO CAUTELAR DECORRENTE DA DECISÃO DE PRONÚNCIA. FUNDAMENTAÇÃO. JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JÚRI. ADIAMENTO. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE.

I - A custódia cautelar suficientemente motivada, com o reconhecimento da materialidade do delito e de indícios de autoria, assim como com a expressa menção à situação concreta que caracteriza a necessidade de garantia da aplicação da lei penal, consistente na evasão do réu do distrito da culpa, não caracteriza coação ilegal.

II - A circunstância de o réu ter residência fixa e atividade profissional, por si só, não tem o condão de revogar a prisão preventiva.

III - A remarcação do julgamento do réu pelo Tribunal de Júri para, aproximadamente, 1 (um) ano e 3 (três) meses depois do respectivo adiamento, cuja causa está sendo objeto de apuração pela Corregedoria Geral de Justiça da Corte a quo, não gera, em atenção ao princípio da razoabilidade, a revogação da prisão cautelar decorrente da decisão de pronúncia. Writ denegado”.

“PENAL. CONDENAÇÃO. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. CONCURSO MATERIAL. FIXAÇÃO DIFERENCIADA DE PENAS-BASE. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE.ARREPENDIMENTO POSTERIOR. CP, ARTS. 16 E 59. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. DECLARAÇÃO DE OFÍCIO.

- Em sede de condenação pela prática de crimes em concurso material, se examinadas as circunstâncias judiciais num só contexto, impõe-se a fixação da pena-base na mesma linha quantitativa, pois a aplicação diferenciada afasta-se do princípio da proporcionalidade, relevante no processo de individualização da pena.

- A causa especial de diminuição de pena prevista no art. 16 impõe a redução da sanção prisional de um a dois terços, configurando erro material a fixação da minorante no percentual de um quarto.

- Transcorrido prazo superior a 8 (oito) anos entre a data do recebimento da denúncia e o dia do julgamento em que foi imposta a condenação a 2 anos e oito meses, ocorre a extinção da punibilidade pela superveniência da prescrição da pretensão punitiva.

- Recurso especial conhecido para reduzir a condenação. Prescrição da pretensão punitiva decretada”.

Ementa do Supremo Tribunal Federal:

“JUSTA CAUSA - INSIGNIFICÂNCIA DO ATO APONTADO COMO DELITUOSO. Uma vez verificada a insignificância jurídica do ato apontado como delituoso, impõe-se o trancamento da ação penal por falta de justa causa. A isto direcionam os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Consubstancia ato insignificante a contratação isolada de mão-de-obra, visando à atividade de gari, por município, considerado período diminuto, vindo o pedido formulado em reclamação trabalhista a ser julgado improcedente, ante a nulidade da relação jurídica por ausência do concurso público”.

Nesse sentido, conforme demonstrado nas Súmulas citadas, o princípio da proporcionalidade deve ser observado não somente pelo Poder Legislativo, mas também pelo Judiciário na concretização do Direito Penal. Segundo Lyra (2011), o Judiciário é pauta orientadora da norma jurídica e das decisões. Por conseguinte, o Direito Penal pode ser considerado um eficaz instrumento de apoio às decisões judiciais, uma vez que oferece uma alternativa de atuação construtiva do Judiciário para produção de julgamentos mais justos. Depois disso, apesar de ainda ser ocasionalmente utilizado como fundamento das decisões pela jurisprudência brasileira em matéria penal, tende a se expandir devido à importância e adequação na defesa dos interesses e valores socialmente significativos.

Verifica-se a partir da análise jurisprudencial que o princípio da proporcionalidade é fundamento de decisões dos julgadores, até por ser instrumento de exame de adequação, exigibilidade. Em outras palavras, pode-se afirmar que o meio escolhido pelo legislador penal deve ser imprescindível para se promover o fim. Assim, observa-se decisão do Tribunal Regional Federal do Estado de São Paulo:

“EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. USO DE DROGAS E PORTE ILEGAL DE ARMADE FOGO. CONDENAÇÃO À PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. DETRAÇÃO DO TEMPO DE PRISÃO PROVISÓRIA.PRETENSÃO DE QUE CADA HORA DE PRISÃO SEJA COMPUTADA COMO HORA DEPRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AOPRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. TÉCNICA QUE ENSEJA IMPUNIDADE.COMPENSAÇÃO DE CADA DIA QUE O SENTENCIADO PERMANECEU CUSTODIADO PROVISORIAMENTE COM CADA DIA DE CONDENAÇÃO À PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA. INTERPRETAÇÃO ADEQUADA DOS ARTS. 42 DO CP E111 DA LEP.

1. A detração penal está prevista, expressamente, para a pena privativa de liberdade e para a medida de segurança apenas (arts. 42do CP e 111 da Lei n. 7.210/1984). Isso não significa que o instituto não possa ser aplicado às penas alternativas, uma vez que substituem a reprimenda privativa de liberdade pelo mesmo lapso de sua duração.

2. A aplicação do instituto da detração, no entanto, na forma como pretende a impetração, esbarra no princípio da proporcionalidade,pois a transformação em horas do tempo em que o paciente ficou provisoriamente preso, para fins de detração do tempo de prestação de serviços à comunidade a ser adimplido, enseja o cumprimento integral da pena imposta, mesmo que o acusado tenha permanecido custodiado apenas pelo lapso de 1 mês e 14 dias.

3. Mostra-se adequada e proporcional a detração penal em que se desconta o período em que o paciente permaneceu custodiado cautelarmente na proporção de 1 dia de prisão provisória para 1 díade condenação à pena privativa de liberdade substituída.

4. Ordem denegada.”.

Quando da análise desta jurisprudência, vê-se a importância do princípio da proporcionalidade. Tal afirmação decorre do fato de que se constata seu uso na denegação do recurso de habeas corpus em virtude que a aplicação do instituto da detração, como pretendia o impetrante, esbarrava no princípio da proporcionalidade, pois a transformação em horas do tempo em que o paciente ficou provisoriamente preso, para fins de detração do tempo de prestação de serviços à comunidade a ser adimplido, enseja o cumprimento integral da pena imposta.

A importância do princípio da proporcionalidade para o Direito e, em especial, o Direito Penal que Sarlet (2005), clareia que o princípio da proporcionalidade não pode deixar de ser compreendido – para além de sua função como critério de aferição da legitimidade constitucional de medidas que restringem direitos fundamentais – na sua dupla dimensão como proibição de excesso e de insuficiência, já que ambas as facetas guardam conexão direta com as noções de necessidade e equilíbrio. A própria sobrevivência do garantismo (e, com ele, do Estado Democrático – e proporcional - de Direito) está em boa parte atrelada ao adequado manejo da noção de proporcionalidade também na esfera jurídico-penal e na capacidade de dar respostas adequadas (e, portanto, sempre afinadas com os princípios superiores da ordem constitucional) aos avanços de um fundamentalismo penal desagregador, do qual apenas podemos esperar a instauração do reinado da intolerância.

A demonstração da utilização do princípio em apreço pode ser verificada também em jurisprudências dos Tribunais Regionais Federais, como se observa:

“DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ARTS. 33, CAPUT, C. C. O ART. 40, I E V, DA LEI 11.343/06. ARTS. 289, § 1º, E 180, CAPUT, DO CP; ART. 244-B, CAPUT, DA LEI 8.069/90. ART. 69 DO CP. DOSIMETRIA. PENA-BASE. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Embora se considere que o motivo aduzido pela MM. Juíza sentenciante, de "busca pelo lucro fácil", seja parte inerente ao tipo previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, nota-se não terem sido constatadas outras circunstâncias judiciais desfavoráveis em relação ao réu e que a pena-base, globalmente considerada, se encontra condizente com a natureza a quantidade de entorpecente (14,7kg de cocaína).

2. Embora também se repute que a "busca pelo lucro fácil" seja elemento ínsito ao tipo penal do crime de moeda falsa, observa-se que o número de cédulas apreendidas e seu valor nominal - dezessete cédulas de R$ 50,00 (cinquenta reais) - autorizam majoração da pena-base acima do mínimo legal.

3. As penas-base estabelecidas para ambos os crimes foram adequadamente dosadas, respeitando-se o princípio constitucional (implícito) da proporcionalidade, previsto no art. 5º, XLVI, da Constituição Federal.

4.Apelação desprovida”.

No entanto, apesar da demonstrada importância do princípio da proporcionalidade em matéria penal, ocorre na legislação penal brasileira a sua insuficiente observância.Esse fato pode ser corroborado quando da análise sistêmica do Código Penal brasileiro e demais normas, visto que há o emprego de penas exacerbadamente desproporcionais em sua quantificação em comparação a outras. Anota-se que o instituto da proporcionalidade em Direito Penal deve ser observado desde a aplicação da quantidade de pena in abstrato, até sua aplicação no caso concreto, sob pena de afrontarmos os direitos individuais e coletivos.

Discorrendo sobre tais diferenciações, por vezes absolutamente desproporcionais, Lyra (2011) apresenta exemplos, como o caso da pena do crime de falsidade ideológica, previsto no art. 299 do Código Penal, que é de 1 a 5 anos de reclusão no caso de documento público ou de 1 a 3 anos de reclusão se documento particular, é desproporcional se comparada à pena cominada a igual conduta, prevista na Lei 8.137/90, conforme Lyra (2011), que define os crimes contra a ordem tributária, econômica e relações de consumo (art. 2º, I), que é de 6 meses a 2 anos de detenção.

Não obstante, prossegue Lyra (2011) criticando a legislação como o caso do art. 302 do Código Penal que estabelece que o médico que der, no exercício de sua profissão, atestado falso será apenado de 1 mês a 1 ano de detenção. Por outro lado, o art. 299 do mesmo diploma legal, que diz respeito ao crime de falsidade ideológica, estabelece que a falsidade ideológica de documento particular é punida com reclusão de 1 a 3 anos. Ora, a falsificação de um documento qualquer, por qualquer pessoa, não poderia ensejar pena superior àquela estabelecida para o médico que emite o falso atestado.

Esses exemplos demonstram que são vários os casos em que se observa incongruência das cominações, posto que, por diversas vezes, o legislador estabelece uma pena maior a um delito que causa menor dano social que um outro ao qual ele atribui pena menor. Outras vezes, leciona Lyra (2011), prevê penas extremamente diferentes a delitos que ferem bens jurídicos de igual relevância e que foram violados com o mesmo grau de lesividade.

Medeiros (2010), inconformado com tais diferenciações, coloca que há no ordenamento jurídico penal brasileiro algumas incongruências normativas, verdadeiras aberrações legislativas que acarretam grandes prejuízos para aqueles indivíduos diretamente afetados por essas normas.A título de ilustração, exemplifica, que existe uma disparidade entre a pena cominada para os crimes de furto qualificado (art.155, § 4º do Código Penal) com aquela estabelecida para os crimes de lesões corporais gravíssimas (art.129, § 2º do Código Penal), visto que ambos os delitos possuem a mesma sanção, qual seja, pena de 2 a 8 anos de reclusão.

Com estas palavras pode-se compreender que não há dúvidas que existem disparidades incomensuráveis entre as espécies de pena aplicadas no Brasil e que talvez uma reforma no atual Código Penal seria interessante. Cita-se que o atual quadro da legislação penal brasileira em sua relação com o princípio da proporcionalidade tem fatores positivos e negativos. Positivos pois a sua utilização é muito importante para o Direito como um todo; e negativo pois ainda há inúmeras lacunas a serem preenchidas a fim de se evitarem tamanhas disparidades.

Proporcionalidade e Direito Penal são mecanismos que devem andar juntos, até por ser este o thelos do Estado perante seus indivíduos. Desta feita, mesmo com a aplicação deste instituto de forma tímida no ordenamento jurídico brasileiro em algumas questões que deveriam ser melhor esclarecidas, como é o caso da desproporção na fixação espacial da quantificação das penas, revela-se como essência na tentativa de se afastar as possíveis injustiças ocasionadas por um possível processo ou situação injusta.


CONCLUSÃO

A base sustentável de todo sistema jurídico são os princípios, visto que servem de amparo as disposições legais que organizam e disciplinam as relações em sociedade. Nesse contexto, dentre os inúmeros princípios dispostos na legislação brasileira, sejam expressos ou implícitos, desponta o principio da proporcionalidade, tema ênfase deste trabalho, com foco especial no Direito Penal.

Princípio implícito, o instituto proporcional é considerado verdadeira norma jurídica, sendo que o mesmo tem um destaque em todo o organismo constitucional brasileiro, sendo que a Constituição confere especial proteção, como a mencionada no artigo 60, § 4º, IV do citado diploma legal, que ao dispor com relação às cláusulas pétreas e direitos fundamentais, acaba por complementar o Princípio da Reserva Legal(art. 5º, II da CF), convertendo-se no Princípio da Reserva Legal Proporcional.

Assim sendo, quando da aplicação do princípio da proporcionalidade no campo penal, o juiz deve balizar a sanção in abstrato ao caso in concreto, buscando uma resposta jurisdicional mais equânime, pelo fato de que o poder de punir do Estado não deve ser no sentido unicamente repressivo, mas também moderador, com efeitos de recuperação do indivíduo.

Partindo do pressuposto de que o Direito Penal é uma das áreas que mais dá ostentação ao uso dos princípios, pelo motivo do grande valor dos bens jurídicos por ele protegidos, é que se dá essência à proporcionalidade, pois, se afrontado, pode ocasionar ofensa ao princípio da legalidade e, consequentemente, ao sistema de direitos e garantias desenhado pela Constituição Federal de 1988.

Conclui-se com o estudo do tema, a importância de seu aprofundamento no ordenamento jurídico brasileiro, pois o princípio da proporcionalidade tem merecida evidência pelos estudiosos, que o revelam presente em um ou outro ramo do Direito. Deste modo, sua aplicação no Direito Penal tem sido muito comum por se tratar de uma estrutura que soluciona conflitos de interesses fundamentais.

Desta feita, constata-se que o uso deste instituto, com o intuito de amainar a sanção penal, não impõe prejuízo as demais garantias tuteladas pelo Direito Penal, pois não há prejuízo ao jus puniendi estatal. Por conseguinte, haverá uma avaliação no uso da quantidade de pena para ver se esta cumprirá com o seu dever social, até porque uma duração da pena além da necessária e imprescindível só lhe será prejudicial, dada a crise atual do sistema penitenciário vivenciado.

A aplicação jurídica do princípio proporcional tem um papel importante na jurisprudência brasileira, sendo observado desde disposições dos Tribunais de Justiça e Federais, até o Supremo Tribunal Federal. Verifica-se, assim, uma tentativa jurisdicional de atenuar as inúmeras disparidades legislativas ocasionadas pelas heterogeneidades de valores criminais na elaboração das penas do Código Penal e legislações afins.

O Direito Penal como um todo não se basta em utilizar normas jurídicas positivadas e/ou emanadas do Estado, para que se configure uma ordem jurídica legítima. É necessário que se busque implementar igualdade equitativa de acesso nas prestações jurisdicionais, pois a legislação penal que permite o tratamento igual de situações diferentes e o tratamento diferente de situações iguais não é aceitável, muito menos proporcional, visto que fere o significado democrático do Direito.


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Autor

  • Gelson Tomiello

    Advogado OAB/SC 45.295, ex-Analista Jurídico do Tribunal de Justiça de Santa Catarina; especialista em Direito pela FIE/Esmesc (Escola Superior da Magistratura de Santa Catarina); especialista em Direito Processual Civil pela Uninter e Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Estácio de Sá.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TOMIELLO, Gelson. Princípio da proporcionalidade e sua aplicação no direito penal brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4597, 1 fev. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/34030. Acesso em: 29 mar. 2024.