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A responsabilidade civil pelo fato do produto e do serviço

A responsabilidade civil pelo fato do produto e do serviço

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Neste artigo discutirá hipóteses em que a inobservância de certas condutas previstas no CDC acarretará responsabilidades, tais como na presença de um produto ou serviço viciado (arts. 18, 19 e 20) ou pelo fato do produto ou do serviço (arts. 12, 13 e 14).

O Código de Defesa do Consumidor (CDC) traz em seu diploma protecionista o direito a segurança do consumidor e a boa-fé das partes em uma relação de consumo, no entanto, quando tais pilares, entre outros, são rompidos por parte do fornecedor, é causa geradora de responsabilidades e obrigações, sejam elas em caráter punitivos ou de reparações, esta tanto moral quanto material. Responsabilidade que de acordo com o Código Civil, em seu artigo 927 diz que aquele que por ato ilícito causar dano a outrem, ficara obrigado a reparar, reparação está que no âmbito consumerista tem como regra a solidariedade entre os fornecedores e que deverá ser observada a determinação presente no CDC.

Como já abordado anteriormente, temos em uma relação de consumo o fornecedor como pólo ativo dessa relação, e o consumidor como pólo passivo. Ambos com deveres e direitos em tal relação, o fornecedor com o devendo sempre observar normas e adequações exigidas para a colocação de produtos e/ou serviços no mercado de consumo para um perfeito uso e respeitando a boa-fé, e o consumidor como elo final da cadeia de relação de consumo. Porém, como ensina Ada Pellegrini Grinover (2005, p. 174), nesta hipótese, invertem-se os papéis concernentes aos partícipes, pois, o pólo ativo será representado pelos consumidores na relação de responsabilidade, com vistas à reparação dos vícios de qualidade e quantidade dos produtos ou serviços, bem como aos danos decorrentes de acidentes de consumo.

O Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 12, ao dizer que “O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos”, claramente impõem a teoria do risco, em que pelo simples fato de colocação de produtos e bens no mercado, já enseja o dever de reparar possíveis danos causados a consumidores, diretos ou indiretos, esse fenômeno trata-se da responsabilidade objetiva.

É fixada obrigação ao fornecedor, com base no artigo 8° do CDC, em correspondência simétrica com os direitos básicos dos consumidores, os deveres de não inserir no mercado produtos e serviços que possam implicar em riscos à saúde e à segurança, exceto as havidas por normais e previsíveis em conseqüência de sua natureza e fruição; e, apresentar as devidas informações aos consumidores a respeito do funcionamento e da potencialidade danosa. A inobservância desses deveres resulta na responsabilidade do fornecedor pelo fato do produto. Da infringência desses deveres surge, então, a responsabilidade civil obrigatória do fornecedor com de indenizar consumidores e vítimas do fato (ALMEIDA, 2012, p. 82).

Traz o CDC em seu § 1º artigo 12 determina as causas que ensejam a caracterização do defeito, tais como a segurança que dele se legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais temos: sua apresentação, o uso e os riscos que razoavelmente se esperam, e, a época em que foi colocado em circulação.

Conforme obra de João Batista Almeida (2002, p. 89-90), são elencados em três modalidades os defeitos que geram a responsabilização do fornecedor:

a) defeitos de fabricação: aqueles que decorem de fabricação, produção, montagem, manipulação, construção ou acondicionamento dos produtos; b) defeitos de concepção: os de projetos ou de formular; e c) defeitos de comercialização: por insuficiência ou inadequação de informações sobre sua utilização em riscos. Os primeiros (a e b) são intrínsecos; o último (c), extrínseco.

Três são os pressupostos presentes na relação de consumo adotados para apontarem a responsabilidade civil pelo fato do produto e também do serviço, quais sejam:

  1. Colocação do produto no mercado: é o ato humano, comissivo, de lançar ou fazer ingressar em circulação comercial produto potencialmente danoso que possa causar lesões aos interesses dos consumidores. Se, de um lado, há o dever de não acarretar riscos à segurança ou ao patrimônio de outrem, o que se denomina dever de diligente fabricação e advertência (CDC, art. 8°), resulta, de outro lado, da inobservância dessa conduta, a responsabilidade pelo fato da colocação no mercado de produto defeituoso ou potencialmente danoso (CDC, arts. 12 e 14). Adverte com razões, Paes de Barros Leães que q “fabricação de um produto defeituoso não constitui, por si mesma, um fato antijurídico; é a colocação no mercado do produto defeituosamente fabricado o ato voluntário do fabricante a que se deve ligar, num nexo causal, o resultado danoso”.
  2. Relação de casualidade: para que emerja a obrigação de reparar danos é necessário que exista uma relação de causa e efeito entre a ação do fornecedor de colocação no mercado de produto potencialmente danoso e o dano verificado, ou seja, entre este e um defeito que possa ser atribuído ao fabricante. Acentua Carlos Roberto Gonçalves que, ‘sem ela, não existe a obrigação de indenizar. Se houver o dano, mas sua causa não está relacionada com o comportamento de agente, inexiste a relação de casualidade e também a obrigação de indenizar’.
  3. Danos ressarcível: é o prejuízo causado ao consumidor. Abrange o dano emergente, considerando-se como tal os prejuízos efetivos, diretos e imediatos (CC, art. 1.060) e os lucros cessantes, assim entendidos os que podiam ser previsíveis na data da infração (art. 1.59. parágrafo único). Inclui, assim, tanto a indenização do produto danificado como despesas médico-hospitalares, lucros não auferidos no período em razão de afastamento das atividades normais, indenização de objetos e imóveis danificados, indenização por redução de capacidade laborativa ou lesão incapacitante etc. (ALMEIDA, 2012, p. 85-86, grifo do autor).

Na responsabilidade pelo fato do produto, como ensina Luiz Antonio Rizzatto Nunes (2005, p. 260), a regra é a da especificação do agente. Com isso, a sujeição passiva se altera, limitando à escolha do agente, uma vez que na responsabilidade por vicio, cabe o consumidor escolher quem será o responsável. Na hipótese de dano por acidente de consumo com produto, a ação do consumidor tem de se dirigir ao responsável real pelo defeito, seja ele o fabricante, produtor ou construtor, e em caso de produto importado o importador.

Vale-se dizer que o fornecedor não será responsabilizado no caso apontado no § 2°, do artigo 12 do CDC, em que traz em sua redação o seguinte ditame: “O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado”, ou seja, não é por um produto ter melhorias em relação a outro, que este se tornará defeituoso, sendo que o consumidor tem a opção de escolha, cabendo somente a ele decidir por qual dos colocados no mercado atenderá suas necessidades.

Porém o § 2º do artigo 12 encontra-se deslocado da seção, em decorrência de que a proposição aventada da colocação no mercado de outro produto “de melhor qualidade” em detrimento de produto de qualidade inferior apenas suscitar vício, ou, em outros termos, a norma resguarda apenas o vício fortuito de produto antigo. Defeito, como dito, se existir, o será independentemente de ser o produto de pior ou melhor qualidade (NUNES, 2005, p. 267-268).

Quanto às possibilidades que excluem o fornecedor de tal responsabilidade, o CDC em seu § 3° do artigo 12, diz que quando ficar comprovado que, o fornecedor não colocou o produto no mercado (I); Que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste (II); e, no caso de a culpa ser exclusiva do consumidor ou de terceiro (II).  Levando-se em consideração que sempre o ônus da prova será a cargo do fornecedor.

O Mestre João Batista de Almeida (2002, p. 87-88, grifo do autor), elucida em sua obra sobre tais possibilidades de excludente da responsabilidade (§ 3º, artigo 12, do CDC) dos fornecedores, quais sejam:

a)Quando o fornecedor provar que não colocou o produto no mercado (inciso I). Nesse caso, será terceiro estranho à obrigação de indenizar, porque a responsabilidade decorre exatamente da colocação no mercado. A responsabilização deverá incidir, nessa hipótese, sobre o real fornecedor ou sobre quem verdadeiramente tenha colocado o produto ou serviço no mercado.

  1. Quando o defeito inexiste (inciso II). Aqui o fornecedor é o responsável pela colocação do produto ou serviço no mercado; o dano também existe, mas não existe o defeito apontado. Logo, se os danos não decorrem do defeito, não há obrigação de indenizar, pois podem ter origem em causas diversas, mas não em defeito que lhe se atribuiu.
  2. Quando ocorre culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (inciso III). Deixa de existir a relação de causa e efeito entre o defeito de produto (que não causaria de per si[[1]] o dano por má utilização da vítima ou de terceiro) e o dano experimentado. Luiz Gastão Paes de Barros Leães, com suporte na experiência norte-americana, cuida de exprimir o entendimento do que seja ‘culpa da vítima’, nestes termos: ‘Na espécie, cuida-se do uso negligente ou anormal do produto, que causou ou concorreu para causar o evento danoso. Ocorre uso negligente do produto nas seguintes hipóteses: a) inobstante as instruções e advertências, o consumidor ou usuário emprega o produto de maneira inadequada, ou dele faz uso pessoa a quem a mercadoria é contra-indicada; b) à revelia do prazo de validade, o produto é utilizado ou consumido; c) quando não se atenda a um vicio ou defeito manifesto. Ocorre uso anormal quando o produto é utilizado ou consumido de modo diverso do objetivamente previsto’. Atente-se, no entanto, que só a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro exclui a responsabilidade do fornecedor. A culpa concorrente não a exclui e conduz a uma redação do quantum indenizatório, como admitido pela jurisprudência pátria.

Coma já mencionado, na responsabilidade civil dos fornecedores será sempre como regra geral solidária. Quando a norma indica o fabricante, o produtor, o construtor e também o importador, apenas indica o responsável direto e, muito possivelmente, aquele a quem o consumidor ofendido dirigirá seu pleito. No entanto, os demais envolvidos indiretamente não estão excluídos, são todos responsáveis solidários até o limite de suas participações, como determina o artigo 7º, bem como nos §§ 1º e 2º do artigo 25, todos do CDC.



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