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Juventude decepcionada: Brasil é dos políticos velhos (e velhacos)

Juventude decepcionada: Brasil é dos políticos velhos (e velhacos)

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Os adolescentes não desistiram do País nem do seu futuro, mas estão desiludidos. E como seria diferente com tantas mentiras, velhacarias, promessas não cumpridas e mordomias daqueles que estão no poder?

Lula disse: “O PT está velho”. Não somente o PT: com raríssimas exceções, todos os partidos políticos envelheceram. O Globo (28/6/15: 3) mostrou a sangria de jovens na vida partidária: de 2009 a 2015 todos os grandes partidos apresentaram queda nas filiações de jovens: PT menos 60%, PMDB perdeu 59%, PSDB 51%, PDT 53%, PP 49%. O número de filiados jovens caiu 56% (no período indicado). A política, mesmo depois da abertura do voto aos 16 anos, continua sendo coisa de velhos. Pior: cada vez mais velhacos (de acordo com a imagem que os jovens fazem dos políticos). Ou seja: os partidos políticos, no Brasil, envelheceram e também envileceram mais (se tornaram mais vis, mais vilões, mais desprezíveis, mais ignóbeis). A política (para o jovem) se transformou em algo asqueroso. Dela ele (em geral) quer distância. A decepção da juventude é incontestável.

Os adolescentes não desistiram do País nem do seu futuro: 84% confiam que as reformas poderiam melhorar a nação; mas, ao mesmo tempo, 63% deles nem sabem que o Congresso está debatendo uma reforma política (veja DataSenado). Grande parcela da juventude continua de costas para a política. Os gregos chamavam essa parcela de idiótes: são os que, podendo, não participam da vida pública. Os políticos, de forma inversamente proporcional, a trata cada vez com mais desrespeito (não preparando seu futuro por meio da educação de qualidade, nem estimulando o senso de responsabilidade ou a cidadania globalizada).

Também os jovens estão desistindo dos políticos e dos partidos. Embora objetos centrais de uma polêmica interminável (redução da maioridade penal), cada vez participam menos das eleições: apenas 1.638.751 adolescentes com 16 e 17 anos votaram nas eleições de 2014 (contra 2.013.591 em 2008, 2.391.352 em 2010).

As mentiras que os adultos contam trazem cada vez mais desilusão aos jovens: praticamente toda mídia do final de semana 26/6 a 28/6/15 massacrou o PT (com razão), depois das revelações feitas pelo delator Ricardo Pessoa (do grupo UTC/Constram). O dinheiro das campanhas eleitorais do PT teria origem na corrupção da Petrobras. Ocorre que o grupo ajudou (em 2010) 14 partidos diferentes: PT, R$ 5,2 milhões; DEM, R$ 1,24 milhão; PSDB, R$ 1,2 milhão; PP R$ 663 mil; PDT 500 mil etc. Na campanha de 2014, 20 partidos receberam “doações” do grupo: PT R$ 10,8 milhões; PSD R$ 700 mil; PSDB R$ 655 mil; DEM R$ 615 mil; PMDB R$ 600 mil; PSB R$ 550 mil etc. Há alguém que acredita que somente o dinheiro para o PT seria sujo, enquanto o dinheiro dado aos demais partidos teria passado primeiro pela depuração da Imaculada Conceição?

Mentiras, velhacarias, decepções, corrupção, promessas não cumpridas, palavras não honradas, mordomias, gastos absurdos, construção de shopping na Câmara dos Deputados etc.: tudo vem contribuindo para a baixa filiação dos jovens de 16 a 24 anos nos partidos políticos (eram 300 mil filiados em 2009, contra 132 mil em 2015). Na faixa etária de 25 a 34 anos houve queda (no mesmo período) de apenas 9,8% (O Globo 28/6/15: 3). Os partidos não se renovaram. O baixo interesse do jovem pelas eleições e pelos partidos confirma a sua descrença com a política institucional. Ele está desistindo da política (o número de eleitores adolescentes caiu 30% de 2010 a 2014). Isso é muito ruim para a cultura cívica.

A educação que os jovens recebem, em geral, não os prepara para a democracia cidadã. A participação nas redes sociais tem sido mais forte. Mas ocorre que nós somos campeões em indignação (veja as manifestações de junho/13 e março/15) e ridículos em ação coletiva. De 167 países, a democracia brasileira aparece na 44ª posição (veja Economist Intelligence Unit,citada por G. Ioschpe). Isso se deve à nossa baixíssima nota no item participação política (somos iguais a Mali, Zâmbia, Uganda e Turquia; estamos abaixo de Iraque, Etiópia, Quênia e Venezuela; campeão é a Noruega e a última colocada é a Coreia do Norte).

Os partidos têm que ser reinventados. Ou novos devem ser inventados.  Em junho/15, 69% dos jovens de 16 a 24 anos afirmaram não ter preferência por nenhum partido político (Datafolha). Não há indiferença com o futuro nem com a democracia, sim, com a política. O mundo ganhou velocidade incrível depois da Terceira Revolução Industrial (que se globalizou). A forma clientelista, corrupta e fisiologista de fazer política no Brasil continua a mesma de dois séculos atrás. O descompasso é imenso. As instituições lentas ficaram para trás diante da vida veloz. O jovem não tem a mínima chance de disputar o jogo político, cada vez mais sujo e imundo, onde os políticos profissionais “são comprados” na cara dura pelos poderes econômico e financeiro. Política, dinheiro e poder se mesclam promiscuamente há séculos. Isso é muito vergonhoso e repugnante. Sobretudo para o desiludido jovem do terceiro milênio.


Autor

  • Luiz Flávio Gomes

    Doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri – UCM e Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – USP. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Jurista e Professor de Direito Penal e de Processo Penal em vários cursos de pós-graduação no Brasil e no exterior. Autor de vários livros jurídicos e de artigos publicados em periódicos nacionais e estrangeiros. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Estou no www.luizflaviogomes.com

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GOMES, Luiz Flávio. Juventude decepcionada: Brasil é dos políticos velhos (e velhacos). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4396, 15 jul. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/40855. Acesso em: 28 mar. 2024.