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Metodologia da pesquisa jurídica

aspectos gerais e desafios contemporâneos

Metodologia da pesquisa jurídica: aspectos gerais e desafios contemporâneos

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A teoria, a pesquisa e a prática profissional são aspectos complementares que integram o Direito. Dessa forma, a pesquisa dá suporte à prática, e a prática, por sua vez, serve de instrumento que estimula a pesquisa e, consequentemente, a construção do conhecimento.

INTRODUÇÃO

O conhecimento científico se contrapõe ao mito, à superstição e ao senso comum. Dessa forma, trata-se de instrumento de evolução, que concede ao ser humano uma visão mais ampla da natureza e das relações que o rodeiam e, ao mesmo tempo, permite a investigação profunda de fenômenos e concede ao homem a possibilidade de, sob determinadas circunstâncias, alterar a sua realidade.

De maneira simplificada, pode-se dar o nome de Metodologia Científica ao conjunto de procedimentos adotados pelo pesquisador na construção do conhecimento científico, que segue normas relativamente rígidas para a obtenção e comprovação de resultados diante de um problema.

O Direito tem um dinamismo e uma relação com os fenômenos sociais que o coloca em posição diferenciada de diversas perspectivas, inclusive a da metodologia e pesquisa científica. Como consequência, as dificuldades encontradas para o desenvolvimento da pesquisa jurídica também apresentam peculiaridades, conforme será tratado no presente artigo.


A METODOLOGIA CIENTÍFICA APLICADA AO DIREITO

O conhecimento científico se caracteriza por ultrapassar o senso comum, sendo possível, através do seu método, investigar e conhecer objetos, fatos e coisas. Enquanto o senso comum se limita ao que é tido como verdade e aceito com certa estabilidade, a Ciência promove a investigação e explora possibilidades.

A noção de Ciência surgiu estreitamente ligada à Filosofia. A separação entre os métodos utilizados pelo o conhecimento científico e pelo filosófico só ocorreu, conforme Mezzaroba et al. (2009), de maneira tardia na história da humanidade, com a revolução promovida por Copérnico, Galileu, Descartes e outros pensadores.

O autor supracitado destaca algumas características do conhecimento científico. Primeiramente, ele é objetivo e homogêneo, uma vez que busca analisar o objeto em sua essência universal e as leis gerais que regem os fenômenos. Além disso, tem a capacidade de afastar o homem do medo e da superstição.

Cada grupo social, em cada momento histórico, têm as suas necessidades e peculiaridades refletidas no conhecimento científico. Não obstante, o desenvolvimento do trabalho científico deve, apesar dessas influências, ocorrer de forma paciente e gradativa, mas sem se fechar para mudanças e renovações.

O diferencial entre o conhecimento científico e as outras formas de conhecimento é que naquele é possível identificar com exatidão os processos através dos quais os resultados foram atingidos. Esse caminho seguido pelo cientista até o resultado é o que se pode chamar de método científico.

A investigação científica parte do descobrimento e colocação precisa de um problema ou de uma lacuna em certa área. Avança pela tentativa de solução, pela investigação das implicações das soluções encontradas e pela comprovação da solução.

Nas palavras de Mezzaroba et al. (2009, p.52),

O método representa muito mais uma atitude do que propriamente um conjunto de regras prontas e acabadas para resolver qualquer tipo de problema, ou seja, a melhor forma de investigar, de buscar soluções para os problemas ditos científicos está no estudo e na aplicação dos modelos de pesquisas que já tenham demonstrado consistência teórica e prática.

No que refere especificamente à metodologia científica e pesquisa na ciência jurídica, há algumas singularidades a serem observadas, quando se faz uma comparação com outras áreas do conhecimento.

O conhecimento jurídico é produzido de diversas maneiras. Incialmente, pode-se citar as próprias fontes do Direito, como a doutrina e a jurisprudência. Entretanto, o campo investigativo do Direito é mais extenso. Conforme ensina Gustin et al. (2010), a pesquisa deve envolver outros fatores que influenciam na formação da ciência jurídica, como produções de outras áreas que versam sobre as relações de poder e o Estado, e também aos diversos fatos sociais que refletem no Direito.

Gustin et al. (2010) afirma que a inclusão ou não das ciências jurídicas entre as Ciências Sociais Aplicadas é debate superado. Assim, é neste campo do conhecimento que o Direito busca os fundamentos da metodologia científica aplicada na sua produção de conhecimento.

Para o mesmo autor, a Metodologia da Pesquisa no campo jurídico pode desenvolver seu objeto de estudos através de dois aspectos principais. O primeiro, o aspecto teórico, através do qual se busca debater os próprios fundamentos científicos do Direito. O segundo aspecto, o prático, através do qual se objetiva aprimorar as bases para a própria pesquisa científica, no sentido material da sua elaboração.


OS DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS DA PESQUISA JURÍDICA

Fragale Filho et al. (2004) afirma que a pesquisa no Direito está em um "atraso relativo". O autor atribui esse atraso principalmente ao isolamento da ciência jurídica em relação às outras áreas do conhecimento relacionadas e a uma confusão entre a pesquisa acadêmica e a prática profissional.

O autor destaca que, de maneira geral, a pesquisa no Brasil atingiu patamares compatíveis com os internacionais em diversas áreas. Apesar de certa evolução, entretanto, a pesquisa no ramo do Direito não acompanhou tal avanço.

No que se refere à citada confusão entre a pesquisa acadêmica e a prática do profissional do Direito, o que se nota é uma tendência a se priorizar ou a formação científica ou a profissional, como duas abordagens distintas. Como consequência, a academia se torna um ambiente pouco estimulante para a pesquisa. A experiência da aprendizagem, assim, coloca o estudante, potencial pesquisador, em posição de passividade, alheio à construção do conhecimento, o que reflete diretamente no desenvolvimento e na qualidade da pesquisa jurídica.

Se referindo a esse cenário, Fragale Filho et al (2004, p. 68) aponta que

não se trata de rejeitar o mundo judicial e sustentar que a academia é um locus que não comporta a presença de práticos, mas, sim, de evidenciar que os critérios de legitimidade acadêmica devem ser igualmente aplicados tanto à área jurídica quanto aos demais espaços universitários. Não se trata de construir um mundo ideal isolado, contaminado pelos critérios judiciais de legitimidade, mas de sedimentar um diálogo entre a reflexão e a prática a partir dos parâmetros estabelecidos pelo mundo acadêmico.

O mesmo autor sugere que a mudança desse cenário envolve o desenvolvimento da compreensão, na graduação e nas diversas espécies de pós-graduação, de que ensino e pesquisa não são atividades conflitantes. Pelo contrário, são atividades complementares, e como tal devem ser tratadas.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa no Direito segue as mesmas regras metodológicas das demais Ciências Sociais Aplicadas. A busca pela solução de problemas e o desenvolvimento do conhecimento dentro da ciência jurídica torna-se importante quando se considera a grande relevância do Direito, sobretudo a sua relação estreita com diversos fenômenos sociais.

A pesquisa jurídica no Brasil, não obstante a sua mencionada importância, ainda não atingiu o mesmo patamar de outras ciências, inclusive daquelas com objeto semelhante. Conforme demonstrou-se, uma das principais razões desse paradigma é a separação entre o ensino dos aspectos científicos e da prática.

Na realidade, a teoria, a pesquisa e a prática profissional são aspectos complementares que integram o Direito. Dessa forma, a pesquisa dá suporte à prática, e a prática, por sua vez, serve de instrumento que estimula a pesquisa e, consequentemente, a construção do conhecimento. O reconhecimento desse fato no ambiente da academia pode ser apontado como o início da mudança de paradigma na pesquisa jurídica.


REFERÊNCIAS

FRAGALE FILHO, Roberto; VERONESE, Alexandre. A pesquisa em Direito: diagnóstico e perspectivas. Revista Brasileira de Pós-Graduação. CAPES. Brasília. v. 1. n. 2. nov. 2004, p. 53-70.

GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa. DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)pensando a pesquisa jurídica: teoria e prática. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010.

MEZZAROBA, Orides. Monteiro. Cláudia Servilha. Manual de Metodologia da Pesquisa no Direito. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.


Autor


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MAGALHÃES, Jairo Farley Almeida. Metodologia da pesquisa jurídica: aspectos gerais e desafios contemporâneos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4553, 19 dez. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/45380. Acesso em: 19 abr. 2024.