Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/4574
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

O princípio da isonomia e sua incidência nas isenções extrafiscais

O princípio da isonomia e sua incidência nas isenções extrafiscais

Publicado em . Elaborado em .

Não ofende o princípio da isonomia tratamentos desiguais se baseados em motivações legítimas, razoáveis e lógicas, adequados ao princípio da isonomia. Porém, privilegiar em detrimento de outros em situação semelhante é inconstitucional.

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO;1. PRINCÍPIOS JURÍDICOS E CONSTITUIÇÃO., 1.1 Dos princípios no Direito, 1.1.2 Força normativa dos princípios: jusnaturalismo, positivismo e pós-positivismo, 1.2 Constituição: conceito e conteúdo, 1.2.1 Características dos princípios constitucionais: força normativa e funções; 2. O PRINCÍPIO JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DA ISONOMIA, 2.1 Conteúdo e sentido jurídicos, 2.2 Igualdade material e desigualdades formais permitidas, 2.3 Mecanismos para identificação da inobservância do princípio isonômico, 2.3.1 Isonomia e fator de discriminação, 2.3.2 Correlação lógica entre o fator discriminante e a desequiparação procedida, 2.3.3 Harmonia entre a discriminação e os interesses amparados pela Constituição, 2.4 Isonomia tributária e capacidade contributiva, 2.4.1 Crítica da concepção do princípio da capacidade contributiva como totalizador do princípio da igualdade; 3. ISONOMIA, ISENÇÃO E EXTRAFISCALIDADE, 3.1 Isenção tributária e legalidade, 3.2 Isenção tributária e isonomia, 3.2.1 Isenção correlata à igualdade e não a privilégio ou favor legal, 3.3 Isenção e seus efeitos sobre a hipótese de incidência das normas de tributação; 4. O PAPEL DO PODER JUDICIÁRIO NO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS ISENÇÕES, 4.1 A polêmica questão da lei isencional violadora do princípio da isonomia: omissão parcial; CONCLUSÃO; BIBLIOGRAFIA


Introdução

O poder de tributar e a sujeição pelos tributados, desde que o Estado como ordem política tomou para si a gestão regulamentar das relações sociais, são dois elementos que caminham ao longo dos tempos em constante desconforto, caminho esse, essencial à própria subsistência daquele ente e sem sombra de dúvida, terreno propício na busca da justiça e igualdade.

O tributo se reveste, em sentido ético-jurídico, no interesse social, consistente na possibilidade-capacidade que tem o indivíduo de contribuir com os gastos públicos na medida da sua capacidade econômica, isto é, sem se despojar do mínimo necessário à sua subsistência. Verificada efetivamente essa possibilidade, transforma-se em dever, que determinará em consequência, a medida da sua participação naqueles gastos.

O direito caminha de acordo com o desenvolvimento da sociedade, é seu reflexo, em sendo assim, o direito tributário inserto na atual Constituição é fruto de longa história de lutas contra o arbítrio e a exação opressora. Das tributações pretéritas, evoluímos e hoje nos encontramos inseridos num Estado Democrático de Direito, sob a égide de um regime republicano, que não se coaduna com privilégios desarrazoados nem com exacerbações desmedidamente impostas por este ente gestor da coisa pública.

Identificar o real sentido dos princípios constitucionais e buscar a efetividade dos postulados contidos na Constituição, são tarefas que se impõem a quem vislumbre uma tributação orientada pela justiça. Tentaremos aclarar essas perspectivas, fazendo um estudo analítico do princípio da isonomia, base do Estado Democrático de Direito.

No desenvolver deste trabalho, abordaremos o papel dos poderes instituídos, posto que a observância do princípio isonômico se dirige não só ao feitor dos enunciados prescritivos, mas também, no nosso sistema constitucional, ao Poder Judiciário, guardião dos valores constitucionais.

Faremos uma incursão pelos diversos campos que se entrelaçam com a respectiva matéria, buscando, com amparo da melhor doutrina e moderna visão das cortes de justiça, reforçar a idéia de que não basta somente um apelo aos princípios, sob pena deles se situarem no campo meramente moral, mas, inseri-los com operatividade no seio da prática jurídica, para que haja uma rigorosa e eficaz aplicação das normas constitucionais.


1 - Princípios Jurídicos e Constituição

Como ponto de partida para elaboração deste trabalho procuramos fazer uma abordagem conceitual das categorias sob enfoque, ficando este capítulo com a incumbência de delinear e orientar o vetor finalístico do nosso intento. Será feita a análise dos conceitos de princípios jurídicos e de Constituição, de forma a possibilitar outro que surge dessa junção, a saber, o conceito de princípios constitucionais e sua força irradiante no sistema normativo.

1.1 Dos princípios no Direito

Não podemos perquirir o conteúdo dos princípios constitucionais sem correlacionarmos com a idéia de princípio no direito, haja vista que o direito, enquanto ordem jurídica, é que dá força teórica e normativa aos princípios constitucionais, posto que são princípios jurídicos.

A atividade de conceituar, requer o trabalho por parte do agente cognoscente, de se buscar as significações que o objeto sob exame suscita. No que pertine ao termo "princípio", cabe frizar que o mesmo possui vasta incidência nos mais variados campos do conhecimento. Filosofia, Política, Sociologia, Física, Química, Direito e outros servem-se dele para construir a sistematização ou articulação de conceitos a respeito dos objetos trabalhados na própria área de investigação e de teorização de cada um desses ramos do conhecimento. Cada "princípio", seja ele simples ou complexo em seu enunciado, é sempre passível de expressão em forma proposicional, descritiva ou prescritiva. (v.g; em Física - o princípio segundo o qual " o calor dilata os corpos", "os metais são bons condutores de eletricidade"; em Economia temos a "lei da oferta e da procura" e tantos outros). No campo dos objetos culturais, ao lado de "leis" ou "princípios" descritivos, vamos encontrar as prescrições jurídicas, éticas, religiosas, morais, etc; que ostentam, da mesma forma, o porte de autênticos "princípios".

Essa rápida exemplificação feita acima, serve para mostrar quão rica e diversificada é a significação que a palavra exibe, impondo-nos uma difícil tarefa de delimitar e demarcar o sentido próprio que desejamos imprimir ao vocábulo, dentro de seu plano de irradiação semântica.

O dicionário de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira define princípio em vários sentidos que, conjugados, possibilitam uma incursão inicial no termo princípio:

" Princípio.[Do lat. principiu.] S.m. 1. Momento ou local ou trecho em que algo tem origem (...) 2. Causa primária. 3. Elemento predominante na constituição de um corpo orgânico. 4. Preceito, regra, lei. 5. P. ext. Base; germe (...) 6. Filos. Fonte ou causa de uma ação. 7.Filos. Proposição que se põe no início de uma dedução, e que não é deduzida de nenhuma outra dentro do sistema considerado, sendo admitida, provisoriamente, como inquestionável. [ São princípios os axiomas, os postulados, os teoremas etc.]" (1). (g.n).

Posteriormente, no mesmo dicionário, registra-se o significado de princípios - no plural: " Princípios. (...). 4. Filos. Proposições diretoras de uma ciência, às quais todo o desenvolvimento posterior dessa ciência deve estar subordinado". [2]

Temos portanto que, independentemente do campo científico, a idéia de princípio indica a estruturação de um sistema de idéias, normatizações e posicionamentos que vão buscar amparo e substância numa idéia mestra, num vetor dotado de conteúdo valorativo e material que possibilite a adequação válida entre o objeto que se produz e aquele suporte que lhe dá tonicidade.

Para Cármem Lúcia Antunes Rocha " O Princípio é o verbo (...) No princípio repousa a essência de uma ordem, seus parâmetros fundamentais e direcionadores do sistema normado". (3)

Na Ciência Jurídica tem-se usado o termo princípio ora para designar a formulação dogmática de conceitos estruturados por sobre o direito positivo, ora para designar determinado tipo de normas jurídicas e ora para estabelecer os postulados teóricos, as proposições jurídicas construídas independentemente de uma norma jurídica concreta ou de institutos de direito ou normas legais vigentes. [4]

Ao se tratar de princípio, neste campo das ciências humanas, deve-se distinguir claramente entre a norma e o texto que a contempla; a norma do discurso sobre a norma; as categorias de normas que veiculam princípios [5]. Os princípios constantes nas normas devem distinguir-se dos princípios próprios à interpretação das normas. E ao se realizar esse exercício de distinção, chega-se à conclusão de que a noção de princípio antes apontada é apenas o primeiro momento de uma indagação teórica tendente a dar conta dos grandes problemas que são colocados aos operadores do direito, no momento de lidarem com os "princípios no Direito". [6]

Os princípios se mostram como sendo os alicerces que estruturam todo o sistema normativo, a pedra angular de onde parte todo e qualquer raciocínio normativo. Em termos de direito positivo, princípios são normas jurídicas portadoras de intensa carga axiológica, de tal forma que a compreensão de outras unidades do sistema fica na dependência da boa aplicação daqueles vetores. Com a qualidade de figurar entre os grandes publicistas pátrios, Celso A. Bandeira de Melo tratou com maestria da temática, o que nos faz transcrever em sua literalidade:

" Princípio - já averbamos alhures - é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalização do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo (...). Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou de inconstitucionalidade, confome o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que os sustêm e alui-se toda a estrutura nelas esforçada". (7)

A grande maioria da doutrina já pacificou o entendimento de que os princípios, em comunhão com as regras, são espécies do gênero norma jurídica, com todas as implicações que esta proposição apodítica venha suscitar. Eros Grau assevera que, " um sistema ou ordenamento jurídico não será jamais integrado exclusivamente por regras. Nele se compõem, também, princípios jurídicos ou princípios de Direito". [8] Assim, no Direito, enquanto ordem jurídica, os princípios - agora princípios jurídicos - podem ser tomados, basicamente, em dois sentidos: no primeiro, como princípios positivos do Direito, e, no segundo, como princípios gerais do Direito. [9] Grau fundamentou-se nos ensinamentos de Antoine Jeammaud e Jerzy Wróblewski para adotar essa distinção.

Destarte, na visão de Jeammaud, trabalhada por Grau, distinguem-se os princípios gerais do Direito daqueles que se denominam princípios positivos do direito. Estes últimos não podem ser valorados segundo a posição dicotômica do falso ou do verdadeiro, própria da Ciência Jurídica, mas, sim, segundo as dicotomias analíticas do válido ou inválido, vigente ou não, eficaz ou ineficaz, adequadas à análise do Direito enquanto sistema de normas positivas. Deste modo, os princípios positivos do Direito pertencem à linguagem do Direito. Já os princípios gerais do Direito podem ser valorados segundo a idéia do falso e do verdadeiro, conforme as análises descritivas da Ciência Jurídica. Eles pertencem à linguagem dos juristas. "São posições descritivas (e não normativas), através das quais os juristas referem, de maneira sintética, o conteúdo e as grandes tendências do direito positivo". [10]

1.1.2 Força normativa dos Princípios: jusnaturalismo, positivismo e pós-positivismo

Como já dito, atualmente é pacífico se conferir aos princípios jurídicos o qualificativo conceitual e positivo de norma de direito, de norma jurídica. Posto que eles possuem vinculatividade, positividade, são normas, obrigam e têm eficácia positiva e negativa sobre o comportamento do destinatário. Possuem esse status não só os "princípios positivos do Direito" mas, como já enfocado, os "princípios gerais do Direito". Reconhece-se, assim, normatividade não só aos princípios que são, expressa e explicitamente, contemplados no âmago da ordem jurídica, mas também aos que, defluentes de seu sistema, são anunciados pela doutrina e descobertos no ato de aplicar o Direito. [11]

Paulo Bonavides em seu Curso de Direito Constitucional faz minucioso estudo dos autores e obras que se voltaram para a temática de se conferir o caráter normativo aos princípios, atribuindo a Crisafuli, nos idos de 1952, como sendo o precursor da inclusão dos princípios nesta categoria, donde colhemos: " Princípio é, com efeito, toda norma jurídica, enquanto considerada como determinante de uma ou de muitas outras subordinadas, que a pressupõem, desenvolvendo e especificando ulteriormente o preceito em direções mais particulares (menos gerais), das quais determinam e portanto, resumem, potencialmente, o conteúdo: sejam (...) estas efetivamente postas, sejam, ao contrário, apenas dedutíveis do respectivo princípio geral que as contêm" [12].

Na mesma obra, o mestre pátrio traz a lume o pensamento de Norberto Bobbio do alto de sua autoridade jusfilosófica que em passagem de sua Teoria do Ordenamento Jurídico, fincou lapidar pensamento acerca da normatividade dos princípios, o que nos faz transcrever de forma literal:

" Os princípios gerais são, ao meu ver, normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. O nome de princípios induz em engano, tanto que é velha questão entre juristas se os princípios são ou não são normas. Para mim não há dúvida: os princípios gerais são normas como todas as demais. E esta é a tese sustentada também pelo estudioso que mais amplamente se ocupou da problemática, ou seja, Crisafulli. Para sustentar que os princípios gerais são normas, os argumentos vêm a ser dois e ambos válidos: antes de tudo, se são normas aquelas das quais os princípios gerais são extraídos, através de um procedimento de generalização sucessiva, não se vê por que não devam ser normas também eles: se abstraio de espécies animais, obtenho sempre animais, e não flores ou estrelas. Em segundo lugar, a função para a qual são abstraídos e adotados é aquela mesma que é cumprida por todas as normas, isto é, a função de regular um caso: mas agora servem ao mesmo fim para que servem as normas expressas. E por que então não deveriam ser normas?".(g.n). [13]

Bonavides aponta que a normatividade dos princípios passou por três distintas fases: a jusnaturalista, a positivista e a pós-positivista. Não vamos nos aprofundar neste tópico, por fugir ao intento deste trabalho, mas resumiremos com a ajuda do mestre, os pontos fulcrais dessas três fases.

A fase jusnaturalista posiciona os princípios jurídicos em esfera abstrata e metafísica. Reconhece-os como inspiradores de um ideal de justiça, cuja eficácia se cinge a uma dimensão ético-valorativa do Direito. Assim, a normatividade dos mesmos, se não fora encarada como nula, ao menos era de duvidosa propriedade praxeológica. [14] Seriam eles um conjunto de verdades objetivas derivadas da lei divina e humana. [15]

Na segunda fase, a juspositiva, os princípios entram nos Códigos como fonte normativa subsidiária da inteireza dos textos legais. São encarados como "válvulas de segurança" que "garantem o reinado absoluto da lei", no dizer de Gordillo Cañas. Não são encarados como superiores às leis, mas delas deduzidos, para suprirem os vazios normativos que elas não puderam prever. O valor dos princípios está no fato de derivarem das leis, e não de um ideal de justiça. Apesar disto, ainda torna precaríssima a normatividade dos mesmos, dado o papel meramente subsidiário que essa corrente lhes empresta e o lugar teórico que lhes coloca - são fontes de integração do direito, quando ocorrem vazios legais. [16]

A terceira fase, a do pós-positivismo, se inaugura, nas últimas decádas do século XX, com a hegemonia axiológico-normativa dos princípios, que agora positivados nos novos textos constitucionais, assentam os principais padrões pelos quais se investiga a compatibilidade da ordem jurídica aos princípios fundamentais de estalão constitucional; aos princípios que dão fundamento axiológico e normativo ao ordenamento jurídico. Nesta fase, os princípios jurídicos conquistam a dignidade de normas jurídicas vinculantes, vigentes e eficazes para muito além da atividade integratória do Direito. Bonavides enfoca que isso se deveu, não só ao valioso trabalho teórico de juristas como Ronald Dworkin, mas também aos trabalhos de publicistas alemães, espanhóis e italianos, destacando-se o nome do Alemão Robert Alexy. [17]

Na fase atual em que nos encontramos, os pensadores teóricos-publicísticos foram fundamentais para a consolidação da normatividade dos princípios jurídicos, ‘antes aprisionados a redutoras concepções privatistas’. Os princípios saíram do papel de meros agentes supletivos, quando estavam presos às codificações, como princípios gerais de caráter civilístico e deram um salto para as Constituições, ganhando agora o caráter de fundamento de toda a ordem jurídica, posto que conferem a estrutura e a coesão do sistema jurídico, donde todas as emanações jurídico-normativas se rendem aos seus ditames. Auferem destarte, o status de princípios constitucionais. A constitucionalização dos princípios operou, assim, verdadeira revolução principial. [18] Merece ser colhida a lição de Bonavides:

" Dantes, na esfera juscivilista, os princípios serviam à lei; dela eram tributários, possuindo, no sistema, o seu mais baixo grau de hierarquização positiva como fonte secundária de normatividade. Doravante, colocados na esfera jusconstitucional, as posições se invertem: os princípios, em grau de positivação, encabeçam o sistema, guiam e fundamentam todas as demais normas que a ordem jurídica institui e, finalmente, tendem a exercitar aquela função axiológica em novos conceitos de sua relevância" [19].

1.2 Constituição: conceito e conteúdo

A palavra constituição pode ser utilizada em diversas acepções. Pode exprimir a idéia do "modo de ser de alguma coisa", "compleição física de um corpo", " organização, formação", "constituição de uma assembléia" ou até a de " lei fundamental de um Estado". É nesta última acepção que nos interessa enfocar o termo Constituição.

Dizer somente que a Constituição é o conjunto de normas que organiza os elementos constitutivos do Estado é abordar o conceito de forma parcial, porque a toma como algo desvinculado da realidade social, quando deve ser concebida como uma estrutura normativa, uma conexão de sentido, que envolve um conjunto de valores. [20]

José Afonso da Silva aponta as profundas divergências doutrinárias que surgem do fato de se estabelecer em que sentido se deve conceber as constituições; se no sociológico, no político ou no puramente normativo. Ensina o professor que as correntes que adotam essas posições pecam pela unilateralidade, e registra a tentativa de vários autores em formular um conceito unitário de constituição, concebendo-a em sentido que revele conexão de suas normas com a totalidade da vida coletiva; constituição total. [21]

Desta forma pretende-se formular uma concepção estrutural de constituição, que a considera no seu aspecto normativo, não como norma pura, mas como norma em sua conexão com a realidade social, que lhe dá o conteúdo fático e o sentido axiológico. O sentido jurídico de constituição não se obterá, se a apreciarmos desgarrada da totalidade da vida social, sem conexão com o conjunto da comunidade. [22]

Do escólio de José Afonso da Silva a Constituição é algo que tem, como forma, um complexo de normas (escritas ou costumeiras); como conteúdo, a conduta humana motivada pelas razões sociais (econômicas, políticas, religiosas etc.); como fim, a realização dos valores que apontam para o existir da comunidade; e, finalmente, como causa criadora e recriadora, o poder que emana do povo. Não pode ser compreendida e interpretada, se não se tiver em mente essa estrutura, considerada como conexão de sentido, como é tudo aquilo que integra um conjunto de valores. [23]

Destarte, temos na Constituição, não um mero conglomerado de enunciados políticos-diretivos mas, a fonte basilar, guardiã do conteúdo axiológico vivificado nos anseios dos cidadãos e norma primaz de onde parte todo pensamento jurídico, irradiando validez às demais manifestações estatais que se reproduzem debaixo do seu manto.

Luís Roberto Barroso assevera que uma Constituição não pode ser só técnica. Tem de haver, por trás dela, a capacidade de simbolizar conquistas e de mobilizar o imaginário das pessoas para novos avanços. [24]

1.2.1 Características dos princípios constitucionais: força normativa e funções.

Diante do que já se expendeu, não se pode deixar de conferir, aos princípios constitucionais, o atributo de norma, de lei, de preceito jurídico, ainda que com características estruturais e funcionais bem diferentes de outras normas jurídicas. Os princípios, acentua Bonavides, desde sua constitucionalização, que é, ao mesmo passo, positivação no mais alto grau, recebem, como instância máxima, categoria constitucional, rodeada do prestígio e da hegemonia que se confere às normas inseridas na Lei das leis. Com esta relevância adicional, os princípios se convertem igualmente em norma normarum, ou seja, norma das normas. [25]

A professora Cármem Rocha em Princípios Constitucionais da Administração Pública discorre com precisão:

" Os princípios constitucionais são conteúdos primários diretores do sistema jurídico-normativo fundamental de um Estado. Dotados de originalidade e superioridade material sobre todos os conteúdos que formam o ordenamento constitucional, os valores firmados pela sociedade são transformados pelo Direito em princípios. Adotados pelo constituinte, sedimentam-se nas normas, tornando-se, então, pilares que informam e conformam o Direito que rege as relações jurídicas no Estado. São eles, assim, as colunas mestras da grande construção do Direito, cujos fundamentos se afirmam no sistema constitucional (...)". [26]


2 - O princípio jurídico-constitucional da isonomia

Não se pode pensar em democracia prescindindo a igualdade. Visto que esta constitui o elemento conferidor da força que aquela substancia. Ao vedar a concessão de privilégios descabidos e distinções infundadas, a igualdade - assim concebida como valor ínsito ao Estado Democrático de Direito e positivamente normatizada nas Constituições - se torna a um passo, elemento de limitação dos poderes públicos na elaboração de seus atos políticos, como de outro, norteia e direciona o próprio Estado, finalisticamente, na busca de mecanismos que possibilitem a redução das desigualdades sociais, conferindo aos cidadãos a legitimidade de invocá-la sempre que se encontrarem em situações malferidoras desta, que é sem dúvida o direito e princípio maiores da ordem jurídica.

O art. 1º da Constituição ao fazer a adoção da República e da Democracia, insere os dois baluartes do fundamento do princípio da igualdade, e efetivamente, os demais artigos que qualificam o estado democrático de direito apontam na direção não de uma neutralidade, mas de uma intervenção do Estado, para corrigir as profundas desigualdades sociais existentes.

Não é por outro motivo que a burguesia, como ensina o profº José Afonso da Silva, cônscia de seu privilégio de classe, jamais postulou um regime de igualdade tanto quanto reivindicara o de liberdade. É que um regime de igualdade contraria seus interesses e dá à liberdade sentido material que não se harmoniza com o domínio de classe em que assenta a democracia liberal burguesa. [27]

A conclusão de que todos " os homens nascem iguais em direitos e obrigações e assim permanecem ao longo de suas vidas, enquanto seres humanos" já completou ‘muitos anos de vida’. A igualdade de todos, não só perante a lei, como dentro dela, é postulado básico dos modernos estados, que se revela nas suas Constituições. A par de se revestir em princípio constitucional consolidado, como já observado, a cada reforma do sistema constitucional o legislador sente a necessidade de reescrevê-lo com tintas mais fortes, vale dizer, com maior abrangência, atento a que ‘a idade avançada da isonomia não tem garantido suficientemente a igualdade de tratamento a que se propõe’. Constata-se ao fazermos a leitura da Constituição, que a igualdade se molda como a base estrutural do nosso sistema normativo, e isso já observamos no preâmbulo da Constituição, ao atribui-la como valor constitucional básico. E para reforçar a idéia, o art. 5º do Texto Constitucional em dois instantes menciona, diz que " Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se... o direito... à igualdade... ".(g.n).

A compreensão deste dispositivo não deve se estreitar apenas ao sentido formal da isonomia, mas, deve ser interpretado com outras normas constitucionais e com as exigências da justiça social que conformam o sentido da ordem política do nosso Estado. No decorrer deste capítulo faremos uma abordagem dos aspectos relevantes que circundam e delimitam a juridicidade do princípio da isonomia.

2.1 Conteúdo e sentido jurídicos.

A consolidação da isonomia nos estados modernos é imperiosa. A despeito desta, surge o problema do seu real sentido, da sua conceituação, pois, se há categorias jurídicas de fácil apreensão, que se mostram encobertos por títulos complicados, de pouco uso, com a isonomia verifica-se o oposto. Trata-se de conceito aparentemente simples, posto que isonomia denota igualdade, mas, a real significação do termo apresenta pontos de extrema complexidade e dificuldade, desafiando os doutrinadores a aclará-lo, tarefa esta que não encontrou a devida dedicação dos doutos, talvez pela própria complexidade da matéria, sendo minguado, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello, o auxílio doutrinal efetivo em tema de igualdade [28]. Ainda assim, excelentes juristas já teceram comentários sobre o tema.

A igualdade como valor, encontra sentidos diferentes de acordo com o respectivo momento histórico. É cediço que os sentidos valorativos de um modo geral variam no tempo, isto é, se condicionam pela evolução sócio-cultural de um povo num dado território. Causa espécie verificar que a humanidade ultrapassou séculos tratando os homens de per si desigualmente, discriminando-os em livres e escravos, negando em muitos casos a própria qualidade de pessoa, para aproximá-los dos animais ou objetos.

Passo inicial foi dado no século XVIII, com a revolução francesa e as declarações de direitos humanos, onde os sistemas jurídicos foram instados a conceberem todos os homens como iguais independentemente de qualquer condição, tais como cor, sexo, idade, pensamento político... Essa inserção da igualdade nos textos constitucionais pós-revolução, impregnada pelo pensamento liberal-burguês, a concebeu como uma igualdade jurídica, isonomia formal, isto é, igualdade perante a lei, o que trouxe em verdade, uma desigualdade de fato decorrente das diferentes aptidões pessoais e das condições sócio-econômica dos cidadãos.

A igualdade como norma, isto é, isonomia em termos normativos, é ditada pela norma, mas ela não é igualdade de fato, porque as pessoas são de fato diferentes. Tércio Sampaio Ferraz averbou que " a força valorativa, axiológica da igualdade na esteira das revoluções modernas, no entanto, aponta para uma espécie de neutralização das desigualdades de fato; das desigualdades culturais, como aquelas fundadas em outros aspectos da vida humana em termos fáticos" [29]. O valor atua como elemento neutralizador de discriminações desarrazoadas. Exemplificando: no século XIX o valor igualdade é usado para neutralizar as desigualdades quanto ao trabalho, já no século XX, com a derrocada do nazismo, revelou a importância da neutralização das chamadas desigualdades raciais, e também no mesmo século, possibilitou a equiparação da mulher e a neutralização das desigualdades decorrentes do sexo.

Tércio Sampaio Ferraz aponta que a noção de igualdade na Constituição tem dois usos fundamentais e que por meio deles nós poderíamos chegar a critérios interpretativos diferentes das diversas questões que são atravessadas pelo princípio da igualdade. Numa aproximação negativa, isto é, numa tentativa de definição pela negação, o valor igualdade significaria, portanto, exigência de não-discriminação política, jurídica, religiosa, sexual, etc... Esse sentido pressupõe que de fato os homens são diferentes. Mas numa aproximação então positiva, sustenta o jusfilósofo, o valor igualdade aponta para a igualdade dos pontos de partida enquanto equalização de possibilidades, equalização de oportunidades. Nesse sentido significa um valor social que pressupõe que de fato os homens são, mas podem ser menos diferentes pelo menos. No primeiro sentido seria um uso de bloqueio, no segundo, um uso de realização legitimante, um uso de finalidade. Não é proibir, mas é exigir que se realize, exigir que se atinja certas finalidades. [30]

A isonomia como princípio constitucional, é norma que se dirige quer para o aplicador da lei quer para o próprio legislador. No Direito estrangeiro, aponta José Afonso, faz-se distinção entre o princípio da igualdade perante a lei e o da igualdade na lei. Aquele corresponde à obrigação de aplicar as normas jurídicas gerais aos casos concretos, na conformidade com o que elas estabelecem, mesmo se delas resultar uma discriminação, o que caracteriza a isonomia puramente formal, enquanto a igualdade na lei exige que, nas normas jurídicas, não haja distinções que não sejam autorizadas pela própria Constituição. [31]

Kelsen ressaltava que a igualdade perante a lei não possuiria significação peculiar alguma. O sentido relevante do princípio isonômico está na obrigação da igualdade na própria lei, vale dizer, entendida como limite para a lei. Colocar o problema naquela, afirmava o mestre austríaco, seria nada mais do que ‘afirmar simplesmente o princípio da regularidade da aplicação do direito em geral; princípio que é imanente a toda a ordem jurídica e o princípio da legalidade da aplicação das leis, que é imanente a todas as leis - em outros termos, o princípio de que as normas devem ser aplicadas conforme as normas’ [32].

Afirma José Afonso, que entre nós essa distinção é desnecessária, visto que tanto a doutrina quanto a jurisprudência já pacificaram o entendimento de que a igualdade perante a lei tem o sentido que, no exterior, se dá à expressão igualdade na lei. E sobre o significado do princípio para o legislador, cita Seabra Fagundes: "que, ao elaborar a lei, deve reger, com iguais disposições - os mesmos ônus e as mesmas vantagens - situações idênticas, e, reciprocamente, distinguir, na repartição de encargos e benefícios, as situações que sejam entre si distintas, de sorte a quinhoá-las ou gravá-las em proporção às suas diversidades". [33]

Fechando o raciocínio, temos que a aplicação da lei indistintamente a todos é um mero aspecto da isonomia, talvez o mais desimportante deles. Há que ficar patente que, o princípio da isonomia com residência constitucional, implica que a lei em si considere todos os homens igualmente, ressalvadas as desigualdades que devem ser sopesadas para o prevalecimento da igualdade material em detrimento da obtusa igualdade formal, conforme já asseverado.

Das afirmações sobre a incidência do princípio isonômico já postas, não há de se encontrar resistências. Ao contrário, todos são concordes em aceitar a valia do mesmo, com um cunho de superioridade dentro do ordenamento jurídico. Mas, apesar dessa aceitação, devemos buscar uma objetivação, uma precisão maior, dado que os enunciados, embora enfocados de forma clarividente, travestem-se de excessiva generalidade.

Rui Barbosa reestruturando o pensamento de Aristóteles, inúmeras vezes utilizado pelos que se enveredam nos caminhos da tentativa de delimitar o conteúdo do princípio isonômico, averbou que " A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam (...). Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real". [34]

Apesar dessa brilhante construção e sem lhe retirar o caráter de inquestionabilidade, adotando-a em seu integral teor, ainda persiste uma indagação, que se torna o ponto nodal de tudo o quanto foi exposto nesta dissertação até o momento, a saber: quem são os iguais e quem são os desiguais?

E mais, conforme Celso Antônio, o que permite radicalizar alguns sob a rubrica de iguais e outros sob a rubrica de desiguais? Em suma: qual o critério legitimamente manipulável - sem agravos à isonomia - que autoriza distinguir pessoas e situações em grupos apartados para fins de tratamentos jurídicos diversos? E prosseguindo: ‘afinal, que espécie de igualdade veda e que tipo de desigualdade faculta a discriminação de situações e pessoas, sem quebra e agressão aos objetivos transfundidos no princípio constitucional da isonomia?’ [35]

Se enfrentarmos cada uma dessas indagações, retiraremos a névoa de abstração que envolve a matéria e estaremos contribuindo para a objetividade do princípio, para sua inserção efetiva no cotidiano jurídico. Assim, estaremos "levando a sério o Direito", no dizer de J. J. Gomes Canotilho.

2.2 Igualdade material e desigualdades formais permitidas

Sendo sua característica funcional, a lei discrimina situações para submetê-las à regência de regras específicas. Ao abarcar estas atribuições é preciso que seja feito o questionamento de quais discriminações são juridicamente toleráveis.

Não se põe óbices quanto a assertiva de que as pessoas são, de fato, diferentes, ou seja, possuem traços diferenciadores que as particularizam dentro do grupo social a que pertencem. Já no que pertine à igualdade, proclama Tércio Sampaio Ferraz que: ‘sempre, ainda que não queiramos, a igualdade humana é sempre fruto da norma, ela não é um fato’. O fato, continua o professor, nos mostra o reverso, ‘os homens são desiguais nos mínimos detalhes: o que é igual é sempre fruto da norma, é fruto cultural’ [36]. Em sendo assim, podemos formular o raciocínio no qual a igualdade busca guarida na norma, ou seja, ela é fruto da cultura humana na busca de um objetivo a ser buscado, a saber, a redução das desigualdades verificadas na realidade da vida, nos diversos aspectos que diferenciam os homens dentro da sociedade e que fazem o Estado intervir para reduzi-las.

Para evidenciar o que foi dito, sabemos que aos menores não são conferidas as mesmas atribuições postas aos maiores de idade; já às mulheres são conferidas menos exigências em comparação aos homens no tocante à aposentadoria; a licença maternidade é superior à licença paternidade; os idosos recebem tratamento distinto em relação aos mais jovens; aos deficientes físicos se dispensa tratamento peculiar; os profissionais dos diversos ramos são diferençados nos respectivos misteres; algumas pessoas, física ou jurídica, gozam de privilégios processuais em detrimento das restantes, etc... A lista de exemplos de discrímines admitidos pela cultura jurídica nacional poderia se estender por inúmeras páginas. Então novamente perguntamos. Onde estaria, pois, a linha divisória entre o permitido e o vedado?

Neste assunto, é valiosa a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello em seu livro O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade [37]. A importante contribuição desse jurista se dá na medida em que traz novos critérios, objetivos, segundo os quais se pode aferir em que proporção quaisquer diferenças entre as pessoas, contempladas nas normas, como pressuposto de um tratamento díspar, ferem ou não o princípio da isonomia. A partir daí, formula o conteúdo jurídico do princípio em tela, fixando as regras que ensejam avaliar aquelas distinções contidas na norma, e mais, decidir sobre a existência ou não de constitucionalidade das desigualdades eventualmente consideradas pelo legislador.

Sobre estes pontos, utilizamos a estruturação elaborada pelo publicista referido, para concatenação do sentido do nosso trabalho. Ao tempo em que inserimos valiosas contribuições de outros mestres.

2.3 Mecanismos para identificação da inobservância do princípio isonômico

Num primeiro instante, acorre, a quem se dispõe enfrentar a matéria, a idéia de que é no próprio discrímine que se identifica eventual vício contra a isonomia, para em seguida se fazer a catalogação das diferenciações legítimas das vedadas. Isto é, parte-se do pensamento de que determinados elementos ou traços característicos das pessoas ou situações são insuscetíveis de serem colhidos pela norma como raiz de alguma diferenciação, sob pena de se chocarem com o princípio da isonomia.

Deste pensar, acredita-se que não podem ser legalmente desequiparadas as pessoas em razão do sexo, da idade ou da convicção religiosa - art. 5º. caput da Constituição - ou em razão de inúmeros outros fatores residentes nas coisas, pessoas ou situações.

Ledo engano, não são sob estes elementos que se busca aferir a incidência do princípio isonômico [38]. Sendo facilmente demonstrado, pela configuração de algumas hipóteses em que estes caracteres são determinantes do discrímen para se ver que, entretanto, em nada se chocam com o princípio. Por exemplo, nada obsta que sejam admitidas apenas mulheres - desequiparação em razão de sexo - a concursos para preenchimento de cargo de "polícia feminina", outrossim, inexistirá gravame à citada cláusula constitucional na autorização normativa que faculte aos funcionários filiados a credo religioso incompatível com o comparecimento a solenidades pomposas, absterem-se de frequentá-las, ainda que, em razão do cargo, devessem, em princípio, fazê-lo, se lhes atribuir atividades substitutivas proveitosas para a coletividade. [39]

Portanto, qualquer elemento residente nas coisas, pessoas ou situações, pode ser escolhido pela lei como fator de discriminação, visto que a agressão ao princípio da isonomia se mostra mais na relação entre o discrímene e a consequência a ele associada, do que no próprio elemento erigido à condição de diferenciador. Assim sugere Celso Antônio: "as discriminações são recebidas como compatíveis com a cláusula igualitária apenas e tão-somente quando existe um vínculo de correlação lógica entre a peculiaridade diferencial acolhida por residente no objeto, e a desigualdade de tratamento em função dela conferida, desde que a correlação não seja incompatível com os interesses prestigiados na Constituição." [40]

O que o ditame constitucional faz, ao proibir a desequiparação por motivo de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas, é simplesmente colocar evidenciado certos traços que não podem, isoladamente, por razões preconceituosas, ser colocados gratuitamente como razão fundamentadora do discrímen. O art. 5º. caput, colheu na realidade em que vivemos, fatores que possivelmente poderiam se tornar fontes de desequiparações desarrazoadas, e tingiu, com a marca da impossibilidade, de virem a ser em algum momento, por si só utilizados. Isto é, desprovida a desequiparação de uma pertinência lógica, encontra na norma constitucional seu obstáculo intransponível. Os fatores que o constituinte reputou relevantes foram expressamente demarcados, ficando os demais absorvidos na generalidade da regra.

A Constituição pretende com esse mandamento, evitar desequiparações infundadas. Neste aspecto, Pimenta Bueno externou precioso entendimento: "A lei deve ser uma e a mesma para todos; qualquer especialidade ou prerrogativa que não for fundada só e unicamente em uma razão muito valiosa do bem público será uma injustiça e poderá ser uma tirania" [41].

Celso Antônio propõe três questões para o reconhecimento das diferenciações que não podem ser feitas sem quebra da isonomia: 1) primeiramente tem-se que investigar, de um lado, aquilo que é adotado como critério discriminatório, depois, 2) impende seja verificado se há justificativa racional, isto é, fundamento lógico, para, à vista do traço desigualador acolhido, atribuir o específico tratamento jurídico construído em função da desigualdade proclamada. 3) Finalmente, adverte o jurista, cumpre analisar se a correlação ou fundamento racional abstratamente existente é, in concreto, afinado com os valores prestigiados no sistema normativo constitucional [42]. Procura-se assim, verificar se a construção normativa guarda ou não harmonia com tais valores.

Não basta adotar só um dos pontos supra aduzidos para se fazer a análise do problema e verificar no caso concreto a ofensa ou a compatibilidade com o princípio isonômico, impõe-se sejam analisados os três aspectos de forma conjugada, posto que a hostilidade ao preceito pode encontrar residência em qualquer deles, bastando assim, por infração a apenas um ponto, tornar incompatível a regra de direito com o princípio constitucional. A norma jurídica deve satisfazer todas as três exigências para ser compatível com a isonomia constitucionalmente preceituada.

2.3.1 Isonomia e fator de discriminação

Neste ponto a lei não pode estabelecer um aspecto tão específico que singularize no presente e definitivamente, de modo absoluto, um sujeito a ser colhido pelo regime peculiar; o traço diferencial adotado, necessariamente há de residir na pessoa, coisa ou situação a ser discriminada; em decorrência, elemento algum que não exista nelas mesmas poderá servir de base para assujeitá-las a regimes diferentes. [43]

Os objetivos prioritários do princípio da igualdade se encerram em dois, a saber, sob um ângulo visa a garantia individual contra perseguições, e sob o outro, procura impedir favoritismos. Não pode a norma jurídica atribuir um benefício a uma pessoa determinada, sem propiciar a aferição aos demais, nem de outra forma impor um gravame sobre um só indivíduo.

Relevante enfocar que a violação também se configura quando a norma tenta em sua aparência se mostrar amparada pelo preceito constitucional, sendo formulada em termos que permitam, em uma leitura menos rigorosa, pensar que a mesma possui caráter de generalidade e abstração, quando na verdade maquiou um dirigismo particular. A ofensa tanto pode vir em flagrância quanto camuflada, a censura será a mesma.

2.3.2 Correlação lógica entre o fator discriminante e a desequiparação procedida

O ponto crucial, segundo Celso Antônio, para exame da correção de uma regra em face do princípio isonômico reside na existência ou não de correlação lógica entre o fator erigido em critério de discrímen e a discriminação legal decidida em função dele [44].

O reconhecimento da juridicidade de uma norma diferençadora ocorre de modo espontâneo ou até mesmo inconsciente, quando se é possível estabelecer uma congruência entre a distinção de regras estabelecidas e a desigualdade de situações correspondentes. Basta exemplificar que jamais se investiu contra a licença maternidade de 120 dias, diferençada da duração da licença paternidade de muito menor duração; da mesma forma não atenta contra a isonomia a regra que limita a responsabilidade criminal aos maiores de 18 anos; nem a outra que estipula a aposentadoria compulsória aos servidores que conseguem chegar aos 70 anos, e assim, muitas outras regras no sistema normativo.

Da mesma forma, é imediata e espontânea a rejeição de validade quando a regra aparta situações, desequiparando-as, e se embasa em fatores que não guardam pertinência com a desigualdade de tratamento jurídico dispensado. Assim, a igualdade estará agredida, segundo Celso Antônio,"quando o fator diferencial adotado para qualificar os atingidos pela regra não guardar relação de pertinência lógica com a inclusão ou exclusão no benefício deferido ou com a inserção ou arredamento do gravame imposto...a lei não pode conceder tratamento específico, vantajoso ou desvantajoso, em atenção a traços e circunstâncias peculiarizadoras de uma categoria de indivíduos se não houver adequação racional entre o elemento diferencial e o regime dispensado aos que se inserem na categoria diferençada." [45]

2.3.3 Harmonia entre a discriminação e os interesses amparados pela Constituição

Não é qualquer diferença que se presta validamente a ser fator de discriminação legal, mesmo que seja logicamente explicável. Não basta que se possa produzir racionalmente um nexo entre a diferença e o consequente tratamento diferençado. Exige-se que, além disso, o vínculo demonstrável seja constitucionalmente pertinente. Ou seja, o sistema constitucional é quem vai ser o parâmetro para aferição da receptividade da regra criada face ao ordenamento jurídico.

Portanto, além da correlação lógica que se exige entre o critério desigualador e a desigualdade de tratamento procedida, ainda se põe outra exigência para se estabelecer a lisura jurídica das desequiparações, como aponta Celso Antônio, a saber, é mister que se retrate concretamente um bem - e não um desvalor - absorvido no sistema normativo constitucional. [46]

Traz o multicitado autor, um exemplo que muito vem a calhar para o propósito do nosso trabalho. Senão vejamos: poder-se-ia demonstrar existência de supedâneo racional, a dizer, nexo lógico, em desequiparação entre grandes grupos empresariais e empresas de porte médio, de sorte a configurar situação detrimentosa para estas últimas e privilegiada para os primeiros, aos quais se outorgariam, por exemplo, favores fiscais sob fundamento de que graças à concentração de capital operam com maior nível de produtividade, ensejando desenvolvimento econômico realizado com menores desperdícios. A distinção estaria apoiada em real diferença entre uns e outras. Demais disso, existiria, no caso, um critério lógico suscetível de ser invocado, não se podendo falar em discrímen aleatório. Sem embargo a desequiparação em pauta seria ofensiva ao preceito isonômico por adversar um valor constitucionalmente prestigiado e prestigiar um elemento constitucionalmente desvalorado" [47].

A regra concessória do benefício fiscal, apesar de se estabelecer em critério diferencial lógico, encontrou a resistência do interesse amparado no artigo 173, parágrafo 4º da Constituição, que visa à repressão de situações que possibilitem a dominação dos mercados e a eliminação da livre concorrência, haja vista, que do jeito que foi formulada, contraria o real sentido da ordem econômica, qual seja, a busca da justiça social. (art.170, CF, caput).

2.4 Isonomia tributária e capacidade contributiva

Tudo o que foi até agora exposto sobre o conteúdo do princípio da igualdade, numa ótica generalista dentro do sistema normativo, se insere, e ainda mais, ganha em importância e pertinência na seara do Direito Tributário. Os aspectos negativo e positivo, o uso de bloqueio e de finalidade retro enfocados são aqui plenamente inseridos.

Aponta Misabel Derzi que a isonomia, com relação ao Direito Tributário, deve ser formulada também, e com necessariedade, de maneira positiva. Diz a professora que essa é a tormentosa questão. Formular o princípio positivamente, sendo certo que em matéria fiscal, interessa menos saber o que o legislador está proibido de distinguir e mais o que ele deve discriminar. Cita trecho memorável de Ataliba: "Não adianta ter Poder Judiciário, se não houver a exigência de igualdade. Não adianta ter Poder Legislativo democrático. Não adianta representatividade. Não adiantam as balizas para o Poder Executivo. Não adianta o habeas corpus, o mandado de segurança, nada, quando não houver o princípio da igualdade" [48].

Perquirir o sentido concreto de igualdade, como já analisamos anteriormente, arrasta profundas divergências, pois envolve posturas ideológicas, políticas e axiológicas. Novamente Misabel Derzi, com sua costumeira luz, atualizando o primoroso Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar, do saudoso Baleeiro, toma como pressuposto fundamental, a unidade do justo, ou seja, a aproximação da justiça tributária com o princípio da igualdade. Aduzindo que "não pode haver igualdade parcelada, justiça parcelada, pois a Constituição integra as suas partes distintas em um todo harmônico e coerente. Por isso mesmo, generalidade, capacidade contributiva e outros valores, ditados pela política econômica e social do país, são desdobramentos de um mesmo e único princípio, o da igualdade." [49]

O levar dinheiro aos cofres públicos - num Estado Democrático de Direito - dever oriundo de uma relação jurídica obrigacional, que tem como caractere ontológico, a repartição dos encargos financeiros do Estado pelos cidadãos, haja vista que estes detêm uma parcela ideal daquele, gera a postulação, pelos sujeitados à carga fiscal, de invocarem uma igualitária repartição daquele ônus, ou seja, que o sacrifício seja igualmente distribuído para todos os cidadãos. Mas, essa assertiva do jeito que esta posta não satisfaz por completo.

A contribuição dos cidadãos na cobertura das necessidades financeiras do Estado, há de vir conjugada com o imperativo contido no princípio constitucional da igualdade, que se mostra em um de seus aspectos, através do princípio da capacidade contributiva. Que exige a conformação da exigência estatal com os ideais de justiça inseridos na Constituição. Donde temos que, igualdade, capacidade contributiva, pessoalidade, vedação do confisco e justiça são os pilares que alicerçam a teoria da tributação.

Tais elementos se constituem em princípios constitucionais, com toda importância já enfocada neste trabalho. Não mais implícitos na atual Constituição, mas expressos e integrantes dos direitos e garantias fundamentais do cidadão contribuinte. Em sendo assim, são auto-aplicáveis, efetivos e voltados à concretização do Estado Democrático de Direito.

Tomando a estruturação formulada por Celso Antônio, a qual adotamos antes, como parâmetro, temos que o elemento ‘riqueza’ se adequa perfeitamente à referida desigualação porquanto apto a acudir ao sistema de repartição da despesa pública, que objetiva satisfazer as necessidades gerais (correlação lógica concreta), harmonizando-se assim, com os interesses amparados pela Constituição, quais sejam, igualdade de oportunidades, desenvolvimento social, redistribuição de renda, etc. O elemento riqueza, que informa a capacidade contributiva, é o critério de discrímen que permite à lei escolher hipóteses que singularizem em diversos momentos os sujeitos visados pela norma de tributação, dependendo das diversas realidades econômicas. É essa situação, o fato gerador da obrigação tributária.

A contribuição do cidadão para os gastos públicos não deve ultrapassar o mínimo necessário para sua subsistência digna. O art. 145 da Constituição, em seu primeiro parágrafo, contém a primeira grande proibição de distinguir entre iguais, específica do Direito Tributário. Ao assegurar a pessoalidade e a graduação segundo a capacidade econômica, esse dispositivo veda a distinção entre aqueles que demonstrem possuir a mesma força econômica. É sobre esta perspectiva que o princípio da capacidade contributiva demonstra sua força. Vedando a tributação arbitrária e atuando, conforme, o profº José Marcos Domingues, quer como pressuposto ético-jurídico da tributação quer enquanto expressão de isonomia, igualando a todos em face do tributo [50].

O referido autor dedicou relevo à matéria, fazendo um minucioso estudo da doutrina pátria e principalmente da doutrina estrangeira. Vejamos:

"GRIZIOTTI chegou a localizar na capacità contributiva a própria causa jurídica do imposto e modernamente MANZONI a concebe como "afirmação da igualdade tributária". SÀINZ DE BUJANDA assevera que o princípio da igualdade em matéria tributária se reduz praticamente, ao princípio da capacidade contributiva. CORTÉS DOMINGUEZ e MARTÍN DELGADO definem o princípio como "a estrela polar do tributarista... FERREIRO LAPTAZA leciona que é uma forma de entender a generalidade e a igualdade tributárias ". [51]

2.4.1 Crítica da concepção do princípio da capacidade contributiva como totalizador do princípio da igualdade.

Palao Taboada, talvez um dos maiores críticos da capacidade contributiva como princípio abarcador da igualdade, quando da sua primeira visita ao nosso país, numa conferência realizada em São Paulo, elaborou importante análise da evolução do referido princípio, traçando o que ele propôs definir como o "apogeu e crise do princípio da capacidade contributiva".

Taboada aponta que numa primeira fase, a capacidade contributiva era tida como uma forma de exprimir um princípio de justiça intuitiva, era concebida como uma idéia deduzida imediatamente do princípio de justiça. Posteriormente, ela é tida como necessária para o conteúdo da igualdade. A doutrina entendia que o único critério válido para a aplicação do princípio de igualdade era o conceito de capacidade contributiva. Esta, delimitava o espaço da igualdade. A fase da crise, surge, ante o distanciamento do princípio da capacidade contributiva da noção de extrafiscalidade. A capacidade contributiva perde, assim, o seu status totalizante. Afirma o autor que, até então, a capacidade contributiva aparecia no frontispício do tratamento doutrinário, como na monografia de Manzoni, por exemplo. Já na obra de La Rosa, a noção da capacidade contributiva desaparece e passa ao primeiro plano o princípio da igualdade [52].

Misabel Derzi, nas atualizações à obra de Baleeiro, também ressalta a influência da doutrina italiana, a qual, na década de sessenta (século passado), operou o apogeu da capacidade contributiva, influênciando vários doutrinadores como Sainz de Bujanda e Cortés Domingues. Colocando-a como critério básico de justiça e legitimidade da imposição, senão o único. Aduz a professora mineira, que é exatamente essa pretensão, a saber, erigir o princípio da capacidade contributiva em critério exclusivo de justiça tributária, que marcará o ponto frágil da teoria, desmentida, segundo ela, em face dos fins extrafiscais dos tributos, cada vez mais frequentes na realidade social e jurídica de nossos dias [53].

A partir de então, observa Misabel Derzi com base em Taboada, instala-se uma revisão ou recomposição de idéias, à vista do fracasso de se eleger o princípio da capacidade contributiva como critério exclusivo de justiça tributária. O referido autor demonstra o giro decisivo que se operou na doutrina, ante a impossibilidade prática do reduzicionismo proposto até então. O que fez o princípio da capacidade contributiva se desvincular da igualdade e cada um passar a ter âmbito diverso de atuação [54].

Importante ficar evidenciado que não estamos diminuindo nem amesquinhando o princípio da capacidade contributiva, apenas e tão só, delimitando seu campo de incidência. Concebemos pois, tal princípio, como um dos reflexos da igualdade tributária constitucionalmente assegurada, e não como a igualdade tributária em sua totalidade.

O conteúdo do princípio da capacidade contributiva, com sede constitucional (art. 145, par. 1º), exerce papel fundamental na construção jurídico-tributária, tendo de fato, posição nuclear dentro do sistema tributário. Confere ainda, suporte a outros, como vedação do confisco, igualdade material e seletividade. Mas, não se pode atribuir a ele, por outro lado, o qualificativo de ser o único a atuar na modelagem das normas que compõem o sistema tributário, esgotando, assim, o conteúdo do princípio da igualdade e da justiça distributiva. A redução drástica e esquemática do sistema ao princípio da capacidade econômico-contributiva, segundo Misabel, falseia a complexidade evidente da realidade e deixa inexplicados diversos fenômenos jurídicos, especialmente a extrafiscalidade [55].


3 Isonomia, isenção e extrafiscalidade

No presente capítulo, faremos uma abordagem objetiva da intrincada correlação que se estabelece entre os institutos da isonomia, isenção e extrafiscalidade.

Temos que o mecanismo de instituição dos tributos, se revela precipuamente, na atividade de investida que o Estado exerce sobre o patrimônio dos particulares, tendo como finalidade o custeio dos gastos públicos. Investida esta, limitada constitucionalmente pelos princípios já aduzidos. A tributação, objetiva em essência, a percepção de receitas para os cofres do Estado.

O legislador ao discriminar fato-situação do mundo relevante, tinge-o com o qualificativo de jurídico, isto é, o torna apto a sofrer a incidência de uma norma. Ocorrendo, ou melhor, se concretizando tal fato no mundo fenomênico, conforme a melhor doutrina, a norma que o regula incide infalivelmente, objetivando gerar os efeitos desejados pelo seu produtor. As normas tributárias seguem esse caminho, não sem passar pela conformação ou pelos limites constitucionais supra enfocados.

Destarte, o elemento riqueza se revela como o fator de discrímen, ou seja, compõe através de seus diversos aspectos, o fato gerador da obrigação tributária. A atividade do legislador, se volta para perquirição de ‘fatos signos presuntivos de riqueza’, na feliz expressão de Becker. Atividade válida, somente, se conformada com a idéia da capacidade contributiva.

O princípio da capacidade contributiva serve de baliza para averiguação da justiça fiscal. O tributo não pode ofender aquele mínimo necessário à subsitência dos contribuintes. Aqui se ergue com imponência o princípio da isonomia que tem naquele outro, um de seus reflexos, com já propomos.

Mas, os objetivos traçados pelo Estado - ente disposto a co-participar na construção de uma sociedade justa e produtiva, e assim neutralizar as desigualdades de fato existentes através do conteúdo material da isonomia - não se restringem só à fiscalidade, ou seja, ao ato de tributar e angariar receitas para cobrir os gastos públicos.

Volta-se o Estado, não pouco frequente, a se utilizar do instituto da extrafiscalidade. Passando, destarte, a agir através das normas tributárias, não no sentido de arrecadar dinheiro para satisfação dos gastos públicos mas, com a finalidade de através delas atingir outros fins também almejados pelo corpo social. Exemplos dessa atuação seriam: a majoração de alíquotas progressivas do ITR e IPTU, o primeiro para impedir o latifúndio improdutivo e o segundo para coibir a especulação imobiliária urbana. Noutro sentido age o Estado através de políticas tributárias visando a implementar incentivos em setores produtivos, no sentido de alavancar o crescimento de determinadas regiões.

Numa e noutra situação, não se permite que aja o poder público, descompassado com aqueles valores principiológicos já aduzidos, que conferem legitimidade à própria atuação estatal. Não se pode impor aos contribuintes gravames que importem na supressão de outros direitos constitucionalmente assegurados como a propriedade e a livre iniciativa, nem também, de outra monta, permitir a concessão de benefícios fiscais direcionados a determinados contribuintes sem se fazer a análise do princípio da isonomia, do fator de discriminação e a correlação lógica entre este fator e a desequiparação adotada como política fiscal.

Na extrafiscalidade, na maioria dos casos, a capacidade contributiva é posta de lado. Nas isenções e demais benefícios fiscais, os destinatários do favor legal podem ser pessoas que detenham grande capacidade econômica. Mas isso não representa quebra do princípio da igualdade formal. Trabalha-se, pois, com novo critério de comparação, utilizando-se de valores distintos, que não a capacidade contributiva. Nas isenções extrafiscais, a pessoa isenta demonstra aptidão maior para realizar os objetivos da política econômica do País, por isso é premiada.

Aliomar Baleeiro, da mesma forma, entendia "que a igualdade de todos perante o imposto se concilia com a aplicação deste aos fins extrafiscais correspondentes às atribuições do Governo, que exercita o poder de tributar [56]. "

Assim, as pessoas atingidas pelas isenções, são tratadas de uma forma especial porque são consideradas da mesma categoria essencial, isto é, se inserem na categoria vista pelo Estado como apta para concretização dos seus planos governamentais. A extrafiscalidade deve se submeter à regra de regularidade e igual tratamento para seres da mesma categoria.

Segundo Misabel, atualizando Baleeiro, "as atividades identicamentes situadas têm de merecer, sem exceções, o mesmo tratamento nos impostos, nos incentivos, nos prêmios, nas isenções. Qualquer critério de exclusão do tratamento igual para pessoas iguais jamais poderá ser arbitrário, mas dele dever-se-á poder aferir a razoabilidade [57]."

A extrafiscalidade se materializa, nas mais das vezes, através das isenções. O poder de isentar apresenta certa simetria com o poder de tributar. Todos os problemas revelados na área do tributo podem ser estudados na ótica oposta, qual seja, a isenção. Da mesma forma que existem limitações ao poder de tributar, há limites que não podem ser transpostos pelo poder de isentar, haja vista que ambos não passam do verso e reverso da mesma medalha. Ou seja, o poder de isentar é o próprio poder de tributar visto ao inverso [58].

3.1 Isenção tributária e legalidade

Estando a disciplina dos tributos sob reserva de lei, a disciplina das isenções, da mesma forma está igualmente vinculada ao princípio da legalidade. Assim, as isenções constituem matéria sob a regência do princípio da reserva de lei.

O princípio constitucional de legalidade das isenções não está consignado, no Brasil, conforme assevera Souto Maior Borges, como limitação constitucional ao poder de tributar, senão indiretamente, porque constitui mera implicação ou inferência do princípio da legalidade tributária. O princípio da legalidade da tributação (nulum tributum sine lege), continua o mestre recifense, não tem eficácia apenas sob o aspecto positivo do estabelecimento de tributos, mas também sob o prisma negativo da exoneração fiscal, porque, se inexiste tributo sem que a lei o institua, tampouco existe isenção tributária sem lei que a determine. "Na outorga constitucional de competência tributária está necessariamente contida a atribuição da faculdade de isentar. [59]"

3.2 Isenção tributária e isonomia

À exigência do imperativo contido no princípio da legalidade tributária pertinente às isenções, vincula-se outra, ainda mais e ainda antes desta, a saber, a compatibilização da atividade legiferante com o princípio constitucional da isonomia. Ambos se projetam para conferir a valia da norma exonerativa. Ao poder legislativo é vedado, destarte, isentar com violação da regra da igualdade. (v. cap.2).

A razoabilidade é que vai ditar a atuação do legislador quando das isenções. O nosso ordenamento constitucional tributário, alude Souto Maior Borges, excetuados os casos com os quais se pretende substituir a justiça tributária por uma justiça social (isenções extrafiscais), exige que os contribuintes, em idênticas circunstâncias características de capacidade contributiva, se submetam a idêntico regime tributário. Para o recifense, no moderno Estado de Direito, a igualdade e a generalidade são princípios básicos de tributação, com os quais colidem as isenções de pessoas e grupos sociais estabelecidos pura e simplesmente "intuitu personae", isto é, sem nenhuma consideração de justiça fiscal ou de ordem social ou econômica. [60]

As isenções não configuram, portanto, transgressões ao princípio da igualdade tributária. Excetuam, somente, as pessoas isentas, da regra da generalidade da tributação, com o propósito de que, assim fazendo, esteja amparando também outros aspectos do princípio isonômico.

Quanto às isenções extrafiscais, somente encontrarão legitimidade se se destinarem a tutelar valores constitucionalmente objetivados, como a igualdade material, o emprego, o desenvolvimento de determinada região, a proteção ambiental e outros tantos. Nelas, a exoneração da carga tributária não se produz para que esta corresponda à riqueza do contribuinte, mas, para que exerça uma função reguladora alheia à justiça tributária.

De se notar, que não é por outro motivo que sempre se admitiu, e o inciso I do artigo 151 da Constituição Federal consagrou a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País.

García Belsúnce, professor argentino, corrobora esse entendimento. Para ele, não se opõe à garantia constitucional da igualdade do imposto a criação de preferências que impliquem tratamento desigual se elas se conformam a motivações, situações ou circunstâncias razoáveis e lógicas, voltadas verdadeiramente ao cumprimento dos propósitos de interesse nacional, e que conduzam ao bem-estar geral, objetivo supremo da Constituição [61].

As isenções extrafiscais, segundo o profº José M. Domingues de Oliveira, "tanto quanto as isenções fiscais, que preservam o necessário mínimo, quando não iluminadas por critérios como esses, transformam-se em privilégios inconstitucionais e são espúrias; desvirtuadas, informam a ‘possível colisão dos regimes de incentivos com o princípio da igualdade concebido como princípio de capacidade contributiva’". [62]

Para finalizar esse tópico, concordamos com Souto Maior Borges, quando aduz que a isenção extrafiscal, deixando de exercer a função de instrumento da justiça tributária, converte-se em instrumento de uma política social e econômica, a qual, em última análise, será juridicamente inobjetável se exercida não em favor das classes sociais dirigentes, mas a serviço do bem comum. Verifica-se, pois, a concordância da isenção extrafiscal com outro critério de justiça [63].

3.2.1 Isenção correlata à igualdade e não a privilégio ou favor legal

Parcela da doutrina concebe, erroneamente, as isenções como privilégio ou favor legal. Ou seja, seria um mero ato de liberalidade do ente tributante. O erro de tal concepção consiste em não se levar em conta a força dos princípios constitucionais, que estabelecem, como já demonstramos, limitações de ordem formal e material para o exercício da competência tributária. Posto que a disciplina das isenções tributárias está indissoluvelmente vinculada com a exigência de proporcionalidade e equidade da tributação. Conforme Souto Maior " se todos são iguais perante o fisco, mostram-se inadmissíveis as isenções que importem meros favores, porque violatórias das regras constitucionais da tributação [64] ".

Há autores ainda, que se utilizam da expressão por falta de critério científico, nominando as isenções como favor, mas atribuindo a elas o sentido acertado, qual seja, a exigência do interesse público. Contudo, essas impropriedades devem ser corrigidas, pois, formuladas desse jeito, podem induzir os desavisados, a cogitarem que as isenções se inserem na esfera de conveniência e oportunidade, cuja apreciação é discricionariamente objeto de decisão política do ente tributante, sem o mínimo de vinculação jurídica-material, necessária a possibilitar o controle pelo Poder Judiciário.

E não é assim. Os preceitos que isentam constituem, apenas, normas de direito excepcional, pois não tomam a regra da generalidade da tributação. Há de ficar patente que as isenções tributárias estão, atualmente, sob a regência do princípio constitucional da isonomia. Somente por um ‘contagio do direito’, nas palavras de Souto Maior, ainda se fala em doutrina, no privilégio da isenção. "Esse tratamento do problema representa apenas um resíduo de concepções imperantes sob regimes historicamente superados" [65].

3.3 Isenção e seus efeitos sobre a hipótese de incidência das normas de tributação

Neste ponto teceremos breves considerações, não pela esquiva de se enfrentar tema tão complexo, mas e apenas, por fugir aos propósitos delimitantes do presente trabalho. Ao ponto.

Autores de renome, e não poucos, encaram as isenções como uma forma de dispensa legal de pagamento de tributo devido. O que é um erro. O defeito de tal proceder, reside necessariamente na pouca intimidade com a categoria jurídica da incidência. Para esses juristas, dá-se a obrigação e nasce o crédito, mas o credor dispensa o pagamento devido. Assim se manifestaria o fenômeno isencional: num primeiro instante ocorreria o fato gerador fazendo incidir a regra jurídica da obrigação, noutro, o Estado através de uma regra jurídica autônoma de isenção, dispensaria o pagamento do respectivo tributo. O erro reside, pontualmente, no fato de que a isenção não é causa de extinção da obrigação pela dispensa do crédito, pois esta não chega nem a surgir, ela é fenômeno interligado à formação da hipótese de incidência da norma.

Sacha Calmon, aduz outro equívoco, qual seja, ter a isenção como exclusão de incidência, apontando as inaceitáveis falhas da doutrina clássica que é prestigiada até pelo Código Tributário Nacional de 1966. Citando Souto Maior, que com tese mais robusta, prefere ver a isenção de maneira diferente, como excludente da obrigação: " A norma que isenta é assim, uma norma limitadora ou modificadora: restringe o alcance das normas jurídicas de tributação; delimita o âmbito material ou pessoal a que deverá estender-se o tributo ou altera a estrutura do próprio pressuposto de incidência [66] ".

Concordamos com o professor mineiro, quando diz que a norma isencional não é norma específica, diversa portanto da norma de tributação, tese defendida por ninguém menos do que Souto Maior e Pontes de Miranda. Para estes, as normas isencionais teriam a função de suspender a incidência da norma jurídica de tributação, daí porque são denominadas "normas de não-incidência", não juridicizante. Sacha Calmon, com mais propriedade, entende que a hipótese de incidência da norma de tributação é composta de fatos tributáveis, já excluídos os imunes e os isentos. [67]

Alfredo Augusto Becker, embora tenha se posicionado conforme Pontes de Miranda, quanto a autonomia da norma não juridicizante de isenção, discorrendo, agora, sobre a integridade da hipótese de incidência da norma de tributação, firmou preciosa lição:

"Na verdade, não existe aquela anterior relação jurídica e respectiva obrigação tributária que seriam desfeitas pela incidência da regra jurídica de isenção. Para que pudesse existir aquela anterior relação jurídica tributária, seria indispensável que antes houvesse incidência da regra jurídica de tributação. Porém esta nunca chegou a incidir porque faltou ou excedeu um dos elementos da composição de sua hipótese de incidência, sem a qual ou com a qual ela não se realiza. Ora, aquele elemento faltante, ou excedente é justamente o elemento que entrando na composição da hipótese de incidência da regra jurídica de isenção, permitiu diferenciá-la da regra jurídica de tributação [68]..."(g.n).


4 O papel do Poder Judiciário no controle de constitucionalidade das isenções

Constitucionalidade e inconstitucionalidade designam conceitos de relação, conforme Jorge Miranda, para quem seria a relação que se estabelece entre uma coisa, a Constituição, e outra coisa, um comportamento, que lhe está ou não conforme, que com ela é ou não compatível, que cabe ou não no seu sentido. Para o mestre português, não se cuida de uma relação lógica ou intelectiva, mas de uma relação de caráter normativo e valorativo [69].

Uma das mais importantes decorrências da atuação prática dos princípios constitucionais limitadores do exercício do poder tributário, é a possibilidade de controle jurisdicional pleno da compatibilidade das normas de direito tributário com o ordenamento fundamental do país. Decorrência da grande incursão do poder constitucional na seara da respectiva matéria.

Os princípios constitucionais tributários e as vedações ao poder de tributar traduzem reafirmações e garantias dos direitos fundamentais. São portanto cláusulas constitucionais pétreas, perenes e insuprimíveis (art. 60, par. 4º, CF).

Misabel Derzi faz uma importante análise da auto-executoriedade dos princípios constitucionais e convida a nossa Corte Constitucional a exercer sua função com mais vigor, precisamente em situações em que se coloquem em confronto mais de um princípio. O que seria feito com um sopesamento entre eles, sem alijamento de nenhum, mas à luz de uma acomodação razoável de ambos. Já que a Constituição de 88, segundo ela, concede aos direitos fundamentais do contribuinte eficácia imediata e atribui ao Poder Judiciário a função não apenas de coibir as inconstitucionalidades dos atos do Executivo e do Legislativo, como também as omissões que impeçam o exercício desses mesmos direitos. E arremata dizendo que, inexiste lei infraconstitucional regulando a atividade e a natureza dos atos do Supremo Tribunal Federal, o qual pode interpretar e reinterpretar suas funções e limites a partir apenas do texto Fundamental. Para a professora mineira, tudo haverá de depender da "vontade de Constituição", para que se implementem os desígnios nela contidos [70].

Como já dissemos, a Constituição veda a neutralidade e quer o oposto, a efetividade. Sobre o princípio da isonomia, o Supremo Tribunal Federal se pronunciou no sentido de que ele "se reveste de auto-aplicabilidade, não é - enquanto postulado fundamental de nossa ordem político-jurídica - suscetível de regulamentação ou de complementação normativa. Esse princípio - cuja observância vincula, incondicionalmente, todas as manifestações do poder público - deve ser considerado, em sua precípua função de obstar discriminações e de extinguir privilégios" [71].

Tradicionalmente, o controle de constitucionalidade dirige-se a atos positivos do legislador ou de outro órgão estatal, não se ocupando de eventual silêncio ou omissão. Mas, com o desenvolvimento da dogmática constitucional, como já tratamos no cap.1, voltam-se as preocupações no intuito de se elaborar mecanismos efetivos no sentido de obstar a inércia ilegítima dos órgãos legislativos, através da concretização dos princípios contidos na Constituição. É a inconstitucionalidade da inércia. Não se trata, conforme Gilmar Mendes, de reduzir a omissão legislativa inconstitucional a um simples não-fazer, mas de identificar uma exigência constitucional de ação [72].

4.1 A polêmica questão da lei isencional violadora do princípio da isonomia: omissão parcial

A inconstitucionalidade por omissão pode ser caracterizada pela eventual incompletude de determinado estatuto jurídico, ensejando a declaração de inconstitucionalidade de todo o diploma ou, apenas, da chamada lacuna inconstitucional. Quando o próprio complexo normativo, e não a omissão, afronta a Constituição, é dada a inconstitucionalidade total.

Gilmar Mendes assevera que, "não raras vezes, porém, a impugnação se volta contra a própria lacuna. Cuida-se, fundamentalmente, da extensão de direito a situação não prevista expressamente, ou da chamada exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade (gleichheitswidriger Begunstigungsaushluss)" [73].

Gilmar Mendes, analisando a jurisprudência alemã, no tocante ao reconhecimento dos obrigados ao tributo, buscarem remédios não só contra ações mas também contra omissões do Estado que infrinjam as garantias individuais, especificamente quanto às limitações constitucionais ao poder de tributar. Registra a importância da reflexão pelos juristas brasileiros da identificação, no juízo da constitucionalidade, da exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade, criticando

" o desprezo votado ao princípio na elaboração das leis, o deferimento de vantagens exclusivas a determinados segmentos da sociedade ou do funcionalismo, a concessão de tratamento tributário diferenciado a pessoas e entidades" que "parecem estar a exigir o estudo mais atento dessa omissão parcial... (podendo tais vícios) " ser reparados com base na técnica da divisibilidade das leis, reconhecendo-se o direito dos segmentos eventualmente discriminados". [74]

Tomemos um exemplo para aclarar nosso raciocínio. O art. 6º do Decreto-Lei nº 2.434, de 19.05.1988, tratou da isenção do imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, títulos e valores mobiliários (IOF), que atingiu apenas "as operações de câmbio realizadas para pagamento de bens importados com guia emitida a partir de 01.07.1988".

O CTN, art. 63, II, e o Decreto-Lei nº 1.783/80 dizem que o fato jurídico do IOF se consuma no momento da liquidação do contrato de câmbio, ou seja, da entrega da moeda nacional ou estrangeira, ou documento que a represente, ou de sua colocação à disposição do interessado. O critério temporal escolhido pela norma isentante - guia de importação emitida a partir de 01.07.1988 - é estranho à hipótese do IOF e irrelevante para sua configuração.

Tem-se, então, as circunstâncias que apontamos no capítulo 2, com base em Celso Antônio, como indicativas de ofensa ao preceito isonômico. Posto que a norma adotou como critério discriminador, para fins de diferenciação de regimes, elemento não residente nos fatos, situações ou pessoas por tal modo desequiparadas. Tomando o fator "tempo" - ‘que não descansa no objeto’ - como critério diferencial.

Pelo mandamento do art. 6º, conforme analisou Geraldo Ataliba, poderia ocorrer que dois contribuintes, importariam, no mesmo dia, do mesmo país, nas mesmas condições, a mesma mercadoria, pelo mesmo preço, pagando, entretanto, 0% ou 100% do IOF, ao adquirirem a moeda estrangeira para cobertura do contrato de importação [75]. Sendo claro o tratamento desigual a situação igual, estando a presença do arbítrio e irracionalidade, incompatíveis com o sistema valorado na Constituição.

Aqui se volta tudo o quanto dissemos sobre as isenções extrafiscais, que são válidas se respeitarem os princípios constitucionais. Mas, tendo como arbitrário o critério temporal - guia de importação emitida a partir de 01.07.1988 - fica a indagação: a norma de isenção como um todo deve ser invalidada ou se deve abolir o critério arbitrário e estende-la aos iguais.

O Supremo Tribunal Federal já se posicionou no sentido de que não pode atuar como legislador positivo, isolando parte da norma, a fim de viabilizá-la frente à Constituição. Só lhe cabe o papel de legislador negativo, para recusar validade e aplicação integral à norma que contraria requisitos constitucionais. (RE nº 102.553-1, RJ).

Felizmente já se acendeu uma lanterna neste ponto escuro. Embora em posição ainda minoritária, mas já demonstrando a tendência evolutiva, sustenta o Ministro Carlos Velloso que " poderia o Judiciário, afastada a norma inconstitucional, estender a todos quantos estão em situação idêntica a norma concessória da isenção (...) O meu entendimento a respeito do tema é minoritário na Corte. Não devo insistir em sustentá-lo, pelo menos por ora". (MI nº 58-DF).

Misabel Derzi, atualizando Baleeiro, faz profunda análise da doutrina e jurisprudência estrangeiras, especificamente a alemã, a qual adota nestes casos a declaração de inconstitu-cionalidade sem a pronúncia de nulidade. Para a professora, o entendimento majoritário do Supremo se choca com a Constituição brasileira de 88, porque essa questão envolve um princípio fundamental básico - o da igualdade - esteio do Estado Democrático de Direito, que trabalha com exigências jurídicas concretas [76]. Não é por outro motivo que o princípio da igualdade é auto-aplicável.

E lembrando Canotilho afirma: "Ao princípio da igualdade é caríssima a igualação de oportunidades. Estendendo a isenção a todos os que se encontrarem em igual situação, haverá simples obediência ao imperativo constitucional de "compensação de oportunidades’" [77]. Posto que não se pode conviver com as normas constitucionais vigentes a omissão do Poder Judiciário, comodamente acobertada de neutralidade. Já que o papel deste poder é justamente o oposto.

Conforme Sampaio Dória, evidenciada a arbitrariedade da discriminação, é diretriz de boa hermenêutica que o magistrado procure alçar ao plano do tratamento fiscal mais benévolo a pessoa ou atividade contra as quais indevidamente se discriminou. No que pertine ao exemplo supra utilizado, Souto Maior Borges alude: "o que então o Judiciário estará fazendo, ao restaurar a isonomia onde, ex vi do art. 6º, ela havia sido erradicada, é aplicar uma norma constitucional que a Constituição Federal determinou tivesse imediata aplicação. É assegurar o primado da Constituição Federal do qual ele - o Poder Judiciário - é o principal garante, o responsável mais imediato." [78]

É patente que a Constituição de 88 justifica a adoção de uma nova posição pelo Supremo Tribunal Federal, que não pode se manter como simples legislador negativo. Entendimento que encontra eco em doutrinadores de escol, como Misabel e Souto Maior.

Friza a autora mineira que, diante de ofensa intolerável à igualdade, em norma concessiva de benefícios arbitrários, a supressão pura e simples da isenção significa, sem dúvida, a outorga da pedra ao invés do pão pleiteado pelo contribuinte lesado. Aduz que a solução do Tribunal Constitucional alemão é bastante razoável, porque concilia a Constituição com a margem de discricionariedade do legislador, que tem, a partir da declaração da inconstitucionalidade, o dever de corrigir a norma. O que não é razoável, finaliza Misabel, "é ‘fingir’ que é constitucional a norma discriminatória para não se ter de enfrentar o problema, ou reconhecer a inconstitucionalidade mas declarar-se o Tribunal ‘impotente’, ou cassar a isenção ou outro benefício, interferindo em plano de governo. [79]"

Consequências diversas surgem da decisão judicial cuja lide tem como ‘causa remota’ a exclusão de um contribuinte de idêntica categoria em face de uma norma isencional violadora do preceito isonômico, vejamos seus reflexos: no plano financeiro se alegaria prejuízo de caixa com a redução das receitas tributárias; no plano político se alegaria violação ao princípio da separação dos poderes; de outra monta, a declaração de inconstitucionalidade da lacuna com a supressão total da norma afetaria a própria pretensão do autor-contribuinte; e o judiciário estaria, assim, interferindo negativamente nas políticas públicas e nos planos do governo; e se o judiciário observar a ofensa e não agir conforme sua elementar função, estará contrariando frontalmente a Constituição.

Temos, pois, que na atual fase pós-positivista dos princípios constitucionais, como já discorremos, não se cabe mais aduzir a ‘ingerência do judiciário’ no caso supra referido. A outorga do benefício ao contribuinte injustamente excluído, é a solução mais coerente que se extrai do espírito da Constituição. Que não quer neutralidade, e sim efetividade.


Conclusão

Chegando ao fim desta dissertação, depois de percorrermos a complexa, mas facinante categoria principiológica, podemos, então, formular um raciocínio construtivo, que nos leve a um ‘constitucionalismo moralmente reflexivo’, dotado da força capaz de conferir ao Direito a substância transformadora dos sonhos em realidade concreta, conforme impõe a Constituição.

Destarte, temos na Constituição, não um mero conglomerado de enunciados políticos-diretivos mas, a fonte basilar, guardiã do conteúdo axiológico vivificado nos anseios dos cidadãos e norma primaz de onde parte todo pensamento jurídico, irradiando validez às demais manifestações estatais que se reproduzem debaixo do seu manto. Temos nos princípios constitucionais, as funções de especificarem aqueles valores supremos, conferindo ao ordenamento jurídico estrutura e coesão.

Os princípios dispostos na Constituição se mostram como sendo os alicerces que estruturam todo o sistema normativo, a pedra angular de onde parte todo e qualquer raciocínio normativo. Em termos de direito positivo, princípios são normas jurídicas portadoras de intensa carga axiológica, de tal forma que a compreensão de outras unidades do sistema fica na dependência da boa aplicação daqueles vetores.

Esse entendimento é fruto do desenvolvimento teórico-jurídico que se acelerou a partir da última metade do século passado, que supedaneado pelo moderno pensamento filosófico, constitucional e político, centra os princípios constitucionais na teoria da justiça, na busca de um direito que se volte verdadeiramente para os anseios dos cidadãos.

O princípio da isonomia revela-se como o grande elemento valoroso que estabelece o equilíbrio necessário para identificação da legitimidade ou perversão institucional, verificada na relação Estado-cidadão. A Lei deve regular a vida social, visando sempre a satisfação do bem comum, não atribuindo privilégios nem malferindo situações que não encontrem amparo legítimo.

O princípio da isonomia tributária impõe sejam observadas não só na aplicação das leis mas, também, na feitura delas, as normas constitucionais quem exprimem uma única finalidade, a saber, a justiça fiscal. Esta, embora programática, tem, conjugada com o princípio positivo isonômico, força de preceito, dotado de eficácia jurídica própria de dupla natureza: uma tutela negativa de recusa de validade aos atos do poder público que se desvirtuem da sua finalidade; e outra positiva, de exigir do Estado determinada conduta, qual seja, a de produzir norma jurídica que preencha a omissão legislativa violadora do princípio. Ambos os casos, restabelecendo o fim constitucionalmente visado.

Não ofende o princípio da isonomia a criação de preferências que importem tratamentos desiguais se elas se conformam a motivações legítimas, razoáveis e lógicas, que adequando-se ao princípio da isonomia, se fundamentem em propósitos que levem a um ganho social efetivo. Agora, privilegiar indivíduo ou categoria em detrimento de outros que se encontrem em situação semelhante é violação expressa ao postulado constitucional.

Destarte, cabe ao Poder Judiciário, guardião dos valores inseridos na Constituição, fazer valer estes, através da edição de normas concretas (sentenças), quando a atuação dos poderes públicos enveredarem por caminhos contrários aos ditames constitucionais. E defendemos que não há de se dizer que ocorrerá violação ao princípio da separação de poderes, mas e tão somente, compatibilização entre o ato de poder observado e o espírito constitucional que se prosta ao judiciário.

O princípio da isonomia, há de ser considerado não só sob o prisma da igualdade perante a lei, mas também da igualdade na lei, aplicando-se assim toda teoria da auto-aplicabilidade dessa garantia constitucional.

Por fim, temos no princípio da isonomia, a pedra de toque para buscarmos uma tributação que se coadune com os valores refletidos pela Constituição, ao passo que serve de fundamento para correção através do judiciário dos descaminhos tomados pelo poder público quando da feição de preceitos isentivos extrafiscais, que violem pessoas e situações, sem a devida correlação com a observância dos postulados constitucionais.


Bibliografia

ATALIBA, Geraldo. Capacidade contributiva e igualdade. V Congresso Brasileiro de Direito Tributário. Revista de direito tributário, nº56, ano 15, abril/junho de 1991, p.168-171.

BALEEIRO, Aliomar. Atualizado por Misabel Derzi. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. 7ª ed. Forense. Rio de Janeiro. 1997.

BARROSO, Luís Roberto. Dez anos da Constituição de 1988 (Foi bom pra você também?). Cidadania e Justiça. Revista da Associação dos Magistrados brasileiros. Ano 2. nº 5. 2º semestre. 1998.

___O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 2ª ed. Rio de Janeiro, Renovar, 1993.

BOBBIO, Norberto. Dicionário de Política. Brasília, UNB, 11ª ed., 1998.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo. Malheiros, 1994.

BORGES, José Souto Maior. Isenções Tributárias. 2ª ed. São Paulo. Sugestões Literárias. 1980.

BOTTALLO, Eduardo. Capacidade contributiva e igualdade. V Congresso Brasileiro de Direito Tributário. Revista de direito tributário, nº56, ano 15, abril/junho de 1991, p.165.

CANOTILHO, J. J. Gomes. Rever ou romper com a constituição dirigente? Defesa de um constitucionalismo moralmente reflexivo. Revista dos Tribunais, nº 15, ano 4, abril/junho de 1996.

CARVALHO, Paulo de Barros. Sobre os Princípios Constitucionais Tributários. Revista de Direito Tributário, nº 55, ano 15, jan/mar-1991.

___Limitações constitucionais ao poder de tributar. Revista de Direito Tributário, nº 46, ano 12, outubro/dezembro de 1988.

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 5ª ed. Rio de Janeiro. Forense, 2000.

DERZI, Misabel Abreu Machado. A isonomia, a propriedade privada e o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. Revista de Direito Tributário. ano 5. nº 15/16. jan/jun de 1981.

___Capacidade contributiva e igualdade. V Congresso Brasileiro de Direito Tributário. Revista de direito tributário, nº56, ano 15, abril/junho de 1991, p.162-165.

ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de Princípios Constitucionais. 1. ed., 2. tir. - São Paulo: RT,1999.

FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Princípio da igualdade no sistema tributário. Revista de Direto Tributário, nº 58, ano 15, outubro/dezembro de 1991.

___Capacidade contributiva e igualdade. V Congresso Brasileiro de Direito Tributário. Revista de direito tributário, nº56, ano 15, abril/junho de 1991, p.159-162.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1975.

GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (interpretação e Crítica). São Paulo: RT, 1990.

LACOMBE, Américo. Capacidade contributiva e igualdade. V Congresso Brasileiro de Direito Tributário. Revista de direito tributário, nº56, ano 15, abril/junho de 1991, p.171-172.

LOPES FILHO, Osíris Azevedo. Princípios da capacidade contributiva e da isonomia. V Congresso Brasileiro de Direito Tributário. Revista de direito tributário, nº56, ano 15, abril/junho de 1991, p.154-6.

MALERBI, Diva. Legalidade e igualdade em matéria tributária. Revista de direito tributário nº 58, ano 15, outubro/dezembro de 1991.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 14ª ed., São Paulo, Malheiros, 2002.

___Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3ª ed. Malheiros. São Paulo.

MELLO, José Eduardo Soares de. Capacidade contributiva e igualdade. V Congresso Brasileiro de Direito Tributário. Revista de direito tributário, nº56, ano 15, abril/junho de 1991, p.167.

MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de Constitucionalidade: aspectos jurídicos e políticos. São Paulo, Saraiva, 1990.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 12ª ed. São Paulo, Atlas, 2002.

PAIVA, Ormezindo. Princípios da capacidade contributiva e da isonomia. V Congresso Brasileiro de Direito Tributário. Revista de direito tributário, nº56, ano 15, abril/junho de 1991, p.153-4.

PALAO TABOADA, Carlos. Isonomia e Capacidade Contributiva. São Paulo. Revista de Direito Tributário. ano II. abril/junho de 1978.

PEREZ, Marcos Augusto. O papel do Poder Judiciário na efetividade dos direitos fundamentais. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política. nº 11. 1995.

SILVA, Edgar Neves da. Isenção - natureza jurídica - lei autorizativa ou prescritiva. Revista de Direito Tributário. ano 4, nº 13, outubro-dezembro de 1995.

___ Princípios da capacidade contributiva e da isonomia. V Congresso Brasileiro de Direito Tributário. Revista de direito tributário, nº56, ano 15, abril/junho de 1991, p.156-159.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo. ed. Malheiros. 16ª ed. 1998.


Notas

01. Cf. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1975. p. 1138.

02. Idem, p.1139.

03. Apud Rui Samuel Espíndola. Conceito de Princípios Constitucionais. 1. ed. 2. tir. São Paulo: RT,1999. P.47.

04. Espíndola. Conceito de princípios....p. 49. v. Eurico Marcos Diniz de Santi. Lançamento Tributário. p.30-36.

05. Espíndola. Conceito de princípios.... p. 50.

06. Ibidem

07. Curso de Direito Administrativo, 14ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2002, p. 808.

08. Cf. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (interpretação e Crítica). São Paulo: RT, 1990. p.95

09. Idem, p.95.

10. Cf. Grau, ob. cit., p.95

11. Espíndola. Conceito de princípios... p. 55.

12. Cf. Bonavides. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo. Malheiros. p.230.

13. Cf. Bonavides. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo. Malheiros. p.236.

14. Cf. Bonavides. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo. Malheiros. p.234.

15. Ibidem.

16. Idem, p. 235-236.

17. Idem, p.237.

18. Cf. Bonavides. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo. Malheiros. p.262.

19. Idem. p.263.

20. Silva, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo. ed. Malheiros. 16ª ed. 1998. p.40.

21. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo. ed. Malheiros. 16ª ed. 1998. p.41.

22. Ibidem.

23. Cf. Curso de Direito... p.41

24. Cf. Dez anos da Constituição de 1988 (Foi bom pra você também?). Cidadania e Justiça. Revista da Associação dos Magistrados brasileiros. Ano 2. nº 5. 2º semestre. 1998. p. 113.

25. Cf. Curso de Direito Constitucional. p. 260-261.

26. Apud Rui Samuel Espíndola. Conceito de Princípios Constitucionais. p.76.

27. Curso de Direito Constitucional Positivo. p. 214.

28. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3ª ed. Malheiros. São Paulo. p. 12.

29. Princípio da igualdade no sistema tributário. Rev. de Direto Tributário. nº 58. ano. 15. out/dez. 1991. p.205

30. Idem, p.206.

31. Curso de Direito Constitucional Positivo. p. 218.

32. Apud Celso Antônio B. Mello. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. p. 10.

33. Curso de Direito Constitucional Positivo. p. 218.

34. Apud José Marcos Domingues de Oliveira. Capacidade Contributiva... p. 57.

35. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. p. 11.

36. Princípio da igualdade no sistema tributário. p. 206.

37. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3ª ed. São Paulo. Editora Malheiros. 2000.

38. Mello, Celso A. Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. p. 15-19.

39. Exemplos trazidos pelo autor. Idem, p. 17.

40. Conteúdo Jurídico... p. 17.

41. Apud Celso Antônio B. M. ob. cit. p.18

42. Cf. Celso Antônio. Conteúdo Jurídico.... p.p 21-22.

43. Idem. p. 23.

44. O Conteúdo Jurídico... p. 37

45. Idem, ibidem. p.p. 38-39.

46. O Conteúdo Jurídico... p. 42

47. Idem, p. 43.

48. A isonomia, a propriedade privada e o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. Revista de Direito Tributário. ano 5. nº 15/16. jan/jun de 1981.

49. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. 7ª ed. Forense. Rio de Janeiro. 1997. p. 523

50. Capacidade Contributiva... p. 11.

51. Capacidade Contributiva... p. 18.

52. Isonomia e Capacidade Contributiva. São Paulo. Revista de Direito Tributário. ano II. abr/jun. 1978. p.131

53. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. p. 723.

54. Ibidem.

55. Idem, p.724.

56. Limitações... p. 543.

57. Limitações... p. 381.

58. Borges, José Souto Maior. Isenções Tributárias. 2ª ed. São Paulo. Sugestões Literárias. 1980. p. 2.

59. Idem. p. 31.

60. Cf. Souto Maior Borges. Isenções Tributárias. p. 41.

61. Apud José Marcos Domingues de Oliveira. Capacidade Contributiva. p. 120.

62. Idem. p.121.

63. Isenções Tributárias. p. 71.

64. Idem, p. 60.

65. Isenções Tributárias. p. 66.

66. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 5ª ed. Rio de Janeiro. Forense. 2000. p. 164.

67. Idem. p. 165.

68. Apud Calmon, Sacha. ob.cit. p. 166.

69. Apud Gilmar Ferreira Mendes. Controle de Constitucionalidade: aspectos jurídicos e políticos. São Paulo Saraiva. 1990. p. 6.

70. Limitações... p. 39.

71. Mandado de Injunção nº 58-DF, in Revista Trimestral de Jurísprudência, nº 140, pp. 747-750.

72. Controle de Constitucionalidade... p. 55.

73. Idem, p. 61.

74. Controle de Constitucionalidade.... p. 333.

75. Apud Derzi, Misabel. Limitações... p. 550.

76. Limitações... p. 351.

77. Limitações... p. 551

78. Apud Misabel Derzi. Limitações... p. 551

79. Limitações... p. 553.



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODRIGUES, Flávio Marcondes Soares. O princípio da isonomia e sua incidência nas isenções extrafiscais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 150, 3 dez. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4574. Acesso em: 26 abr. 2024.