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Ação de alimentos e o Novo Código de Processo Civil.

Paralelo da lei especial e novos ditames processuais

Ação de alimentos e o Novo Código de Processo Civil. Paralelo da lei especial e novos ditames processuais

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O Código de Processo Civil criou dúvidas quanto a certos dispositivos da Lei nº 5.478/1968, conhecida como Lei de Alimentos.

Introdução

Há linear proximidade entre o direito material e processual quando se fala em alimentos.

Por foco específico do nosso estudo nos atentaremos ao aspecto processual.

A inspiração da Lei 5.478/1968 foi veio de bases processuais e procedimentos da legislação justrabalhista.

Pela importância do que trata – alimentos – a Lei tem intenções mais céleres, que, diante do assoberbamento do Judiciário, muitas vezes a promessa de celeridade não é cumprida.

Embora antiga, vê-se que o legislador atual fez questão de mantê-la vigente, tendo em vista o Novo Código de Processo Civil, que entrará em vigor em 2016.

Esses e outros temas serão discutidos ao longo desse trabalho.


O Direito Material e a Lei de Alimentos

Como já dito, nosso foco é o direito processual. Mesmo assim é necessário destacarmos questões importantes do direito material.

A Lei nº 5.478 de 1968 está especificamente associada à relação de parentesco, matrimônio ou união estável.

Yussef Said Cahali, citado por Sérgio Gilberto Porto, aduz que “os alimentos necessários para o sustento, vestuário e habitação são alimentos naturais, ao passo que os alimentos destinados às despesas de educação, instrução e lazer são denominados alimentos civis[1]”.

Na mesma obra, Sérgio Gilberto Porto, inspirado por Eduardo Espínola, transcreve que a dívida alimentar pode ter diversas causas ou fontes, classificadas pela doutrina em três categorias distintas: a) a lei; b) a vontade; e c) o delito.

E assim o autor faz questão ainda de esclarecer:

A distinção não é acadêmica e tem importância prática, porquanto profundas diferenças dividam uma espécie da outra, regulada cada qual por normas especiais. A obrigação de prestar alimentos é regulada no direito de família, pelo artigo 1.694 e seguintes do Código Civil de 2002; a obrigação decorrente do contrato é considerada na parte das obrigações convencionais; a prestação de alimentícia instituída em testamento pertence ao direito das sucessões (art. 1.920 do CC/2002); e os alimentos resultantes do delito, entre as normas reguladoras da liquidação das obrigações ex delicto (artigo 948, II, também do CC/2002).[2]

A nobre magistrada Ana Maria Gonçalves Louzada, logo no início da sua obra[3], destaca que “o instituto jurídico alimentos é um dos que mais importância denota no mundo jurídico, uma vez que está imbricamente relacionado com a sobrevivência, e, por consequência, com a própria vida”.

Citando Orlando Gomes[4], a autora acrescenta que os “alimentos são prestações para que visam satisfazer as necessidades vitais de quem não pode provê-las por si”.

Embora os alimentos sejam conhecidos pelo binômio necessidade-possibilidade, olhamos além. Acreditamos que a fixação dos alimentos é mais adequada num trinômio, como defendem diversos juristas, dentre eles Pablo Stolze.

A autora citada a pouco, Ana Maria Louzada, também faz referência ao trinômio na sua obra, citamos:

Os pressupostos da obrigação alimentar embasam-se no vínculo de direito de família, subsidiado nas necessidades do alimentando e nas possibilidades financeiras do alimentante, respeitado o princípio da proporcionalidade[5].

Em razão da importância dos alimentos entre parentes, Rolf Madaleno faz questão de demonstrar a solidariedade entre parentes, vejamos:

Destaca o artigo 264 do Código Civil em vigor, existir solidariedade quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado à dívida toda. Por sua vez, o artigo 265, do mesmo Diploma Substantivo Civil mostra que a solidariedade não se presume; porque resulta da lei ou da vontade das partes. Essa solidariedade pode ser encontrada no direito familista brasileiro, tanto no instituto do matrimônio, quando considera no inciso III, do seu artigo 1.566, o dever de mútua assistência entre os cônjuges, e acrescenta no artigo 1.694, que os parentes, cônjuges ou companheiros podem pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver[6].

Nessa linha podemos ainda acrescentar o pensamento de Marco Aurélio S. Viana:

Há distinção entre obrigação e dever alimentar. É preciso ter presente a noção de família nuclear formada pelo par andrógino e seus filhos, quando existente, e a este núcleo familiar toca um dever de alimentos escorado no vínculo de solidariedade que se mostra muito mais intenso e significativo[7].

Os alimentos, em suma, se baseiam no Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (Art. 1°, III, CF); na Solidariedade social e familiar (Art. 3°, CF); com fundamento na prisão civil por alimentos (Art. 5°, LXVII, CF); e no Pacto San Jose da Costa Rica (Art. 7°, item 7).

Salienta o nobre autor Rolf Madaleno sobre a responsabilidade comum entre os parentes, em razão do poder familiar:

No respeitante à obrigação pensional têm-se em mente os parentes de graus mais distantes, como são os avós e irmãos, aqui também enquadrados os filhos que não mais estão sob o abrigo do poder familiar, porque maiores e capazes. Por fim, também entre cônjuges e conviventes pesa igual obrigação de solidariedade alimentar, sem a imposição de sacrifícios, pois sempre limitados às forças dos recursos de que dispõe o convocado alimentar.

Já na solidariedade familiar entre pais e filhos menores de dezoito anos e, portanto, ainda sob o poder familiar, vige um dever alimentar ilimitado, que vai ao extremo até de exigir a venda de bens pessoais dos pais para assegurar por todas as formas o constitucional direito à vida, onde todos os esforços devem ser envidados pelos genitores para atender toda a sorte de necessidades dos filhos ainda menores e incapazes.

(...)

No entanto, a maioridade civil não obsta que os filhos prossigam como credores de alimentos, agora não mais por vínculo do poder familiar, e da presunção absoluta de necessidade, mas gerando doravante, uma obrigação condicional de alimentos decorrente da relação de parentesco, e da permanência de sua necessidade alimentar, provavelmente, porque prosseguem seus estudos para o seu completo preparo profissional.

São características do Direito à prestação alimentícia:

  1. Incessível;

  2. Irrenunciável;

  3. Imprescritível (exceto prestação já fixada art. 206, § 2º do Código Civil);

  4. Impenhorável;

  5. Incompensável;

  6. Intransacionável;

  7. Atual;

  8. Irrestituível;

  9. Variável;

  10. Divisível.

Para não nos estender demasiadamente, faremos apenas um destaque nesse ponto, a respeito da possibilidade ou não de transacionar sobre os alimentos.

Na interação processual da ação de alimentos, em especial quando há o envolvimento de incapaz, tem a intervenção do Ministério Público. Nesse contexto, quando há contraditório, produção de provas e, por conseguinte, demonstração nos autos da necessidade do alimentando e possibilidade de prover os alimentos pelo alimentante, deve o magistrado, no seu ofício, fixar os alimentos de forma proporcional, em razão do trinômio necessidade-possibilidade-proporcionalidade.

Pois bem.

Ao final, havendo coisa julgada, poderiam as partes transigir sobre o valor já fixado?

Nesse ponto notamos que a doutrina orienta na possibilidade de transacionar sobre o quantum da obrigação, mas não sobre o direito a receber alimentos. Ainda há doutrinadores, em especial ressaltamos Ana Maria Louzada e Maria Berenice Dias, que limitam apenas a transação sobre parcelas inadimplidas, sem margem de negociação para as futuras.

Transportando a problemática para um exemplo prático, o genitor-alimentante poderia negociar o débito acumulado pela inadimplência de três meses, mas, na visão das doutrinadoras, não poderia negociar sobre o quantum que mensalmente deve pagar.

Noutra linha da doutrina, que é majoritariamente exercida na prática, temos a possibilidade de transigir sobre o quantum em qualquer hipótese, pois as partes compreendem melhor suas necessidades, pelos menos em tese. No entanto, repisa-se, que sobre o direito essencial aos alimentos não é possível haver a transação.

A respeito desse trecho citamos Yussef Said Cahali:

Por um lado o reflexo de ordem pública da obrigação, inibindo transação de alimentos futuros e, de outro, são válidas as convenções entre as partes com vista à fixação de alimentos, presente ou futura, se modificada as condições das partes[8].

Daí vem a própria natureza da ação revisional e exoneratória.

Tendo em mente as premissas basilares do direito material aos alimentos, além das características do dever de alimentar, dentre elas, condicionalidade, mutabilidade; reciprocidade e periodicidade, podemos seguir em frente e falar sobre a parte processual.


A Lei de Alimentos e Código de Processo Civil de 1973

A Lei de Alimentos tem inspiração em práticas mais simplistas.

As polêmicas que surgem são na interpretação em paralelo com o Código de Processo Civil, como veremos mais adiante.

São questões cotidianas que na prática podem ser superadas. Mas, no viés acadêmico, é interessante a reflexão.

Antes vamos compreender alguns pontos.

A pretensão dos alimentos, no direito brasileiro, pode ser exercida por três ritos processuais distintos:

  1. Procedimento especial constante na Lei 5.478/1968;

  2. Procedimento ordinário, pelo Código de Processo Civil de 1973;

  3. Procedimento cautelar dos alimentos provisionais (arts. 852 a 854, Código de Processo Civil de 1973)

A questão que surge é quando utilizar cada procedimento?

Sérgio Gilberto Porto responde que:

O procedimento especial deve ser usado somente quando tivermos prova formada do parentesco ou da obrigação alimentar, tais como, prova do casamento ou da filiação, o que se faz por meio das certidões dos registros Lessano chama de provas tarifadas, o que, na posição do autor, não havendo a definição da obrigação alimentar, não há como adotar rito célere da Lei 5478/1968 e, por consequência, adotar- se o rito ordinário. O autor é categórico em colocar o requisito da pré-definição da existência da obrigação alimentar[9].

Quanto a cautelar, para Jorge Franklin Alves Felipe[10], “não há critério seguro a distinguir a utilização da ação prevista na Lei 5.478/1968 e da cautelar’’.

Reforça Sérgio Gilberto Porto que:

Embora a prática esteja a demonstrar que no mais das vezes a parte que ajuíza uma ação cautelar de alimentos está a enunciar que entrará com uma ação principal, nada impede esta mesma parte, em vez de adotar este modus operandi, opte pelo ajuizamento de uma ação alimentar em rito especial da Lei de Alimentos e que posteriormente proponha uma ação de separação judicial independente da demanda alimentar[11].

Em síntese, podemos dizer que a ação cautelar, na prática, tem efeitos assemelhados, mas não idênticos.

Para que se possa fazer uso a Lei 5478/68, segundo Ana Maria Gonçalves Louzada, é “Necessário se faz que o requerente possua prova pré-constituída de que é parente do alimentante, ou que é parente do alimentante, ou que é seu marido ou companheiro[12]”.

Continua a autora:

No entanto, a jurisprudência já se tem mostrado receptiva em aceitar em alguns casos o pedido de alimentos pelo rito célere da Lei dos alimentos, mesmo que ainda não declarada em juízo a união estável, desde que nos autos já possua indícios fortes de que efetivamente as partes conviveram por certo tempo e mantiveram o referido relacionamento efetivo por meio de fotografias, convites para o casal, passagens aéreas, conta bancária conjunta correspondente que expressem o mesmo endereço dos litigantes, etc.)[13]

Citado por Louzada, Belmiro P. Wilter[14] fala que é necessário apenas a verossimilhança da união estável para pedir a tutela antecipada da Lei de alimentos, ou seja, não há necessidade de prova sólida.


As Diferenças entre os Alimentos Provisórios e Provisionais

Embora o Novo Código de Processo Civil, de 2015, ponha fim a discussão, durante anos a doutrina discutiu sobre alimentos provisórios e provisionais. Alguns disseram ser sinônimo. Outros que os alimentos provisionais, do Código de Processo Civil, derrogaram os alimentos provisórios, da Lei 5.478/1968. E, por fim, temos aqueles que defendem se tratar de pedidos com finalidades distintas.

Para Sérgio Gilberto Porto os alimentos provisórios e provisionais não são sinônimos, embora tenham finalidades semelhantes, vejamos:

Ambos têm a mesma finalidade, pois são concedidos de forma temporária para que a parte necessitada se assegure dos meios suficientes para sua manutenção no decorrer da demanda; representam os chamados alimentos ‘ad’ litem’ ou ‘ expensa lites’ [15]

E o ilustre autor pontua na sua obra que:

a boa técnica recomenda a aplicação das expressões adequadas nos momentos certos, daí a razão de afirmarmos que uma expressão não pode ser tida por sinônimo da outra, uma vez que, processualmente, embora de efeitos assemelhados, não são idênticas[16].

Para Sergio Gischkow Pereira[17]a diferenciação entre as duas espécies é apenas terminológica e procedimental”.

Adroaldo Furtado Pereira sustentou a derrogação do art. 4º da Lei 5478/68 pelo Código de Processo Civil de 1973. Em sentido contrário Cahali (3º Ed, p. 551)[18].

Uma distinção absoluta entre os dois gêneros é que os alimentos provisórios devem viger até a sentença. Enquanto os provisionais cessam com a sentença dada no processo principal que fixa alimentos em definitivo.

Em última análise, que põe fim à discussão, Porto fundamenta:

Por seguro que, quando o legislador instituiu a antecipação no art. 273 do CPC, fez a opção de irradiar seus efeitos por todos os institutos jurídicos, dos quais não se excluem aqueles referentes aos alimentos[19].


A Petição Inicial

Uma das curiosidades da Lei nº 5.478/68 está no artigo 2º, que possibilidade à parte credora o jus postulandi, citamos:

Art. 2º. O credor, pessoalmente, ou por intermédio de advogado, dirigir-se-á ao juiz competente, qualificando-se, e exporá suas necessidades, provando, apenas o parentesco ou a obrigação de alimentar do devedor, indicando seu nome e sobrenome, residência ou local de trabalho, profissão e naturalidade, quanto ganha aproximadamente ou os recursos de que dispõe[20].

Sobre esse ponto Sergio Gilberto Porto salienta:

O pedido de alimentos, divergindo de outras postulações ordinárias, pode ser apresentado diretamente pelo credor quando maior e capaz; sendo, no entanto, o alimentado incapaz, seu representante poderá fazê-lo, desde que esteja injustamente arcando com despesas desta natureza. Além destes estão legitimados, por igual, os tutores, curadores, bem como o Ministério Público[21].

É visível por alguns pontos da Lei nº 5.478/68 a sua inspiração da legislação laboral. Notamos, aliás, que jus postulandi da parte é bem próprio da Justiça do Trabalho.

Ademais, o artigo 3º da Lei em comento parecer dar maior simplicidade à peça inaugural em comparação aos ditames do Código de Processo Civil, citamos:

Art. 3º. O pedido será apresentado por escrito, em 3 (três) vias, e deverá conter a indicação do juiz a quem for dirigido, os elementos referidos no artigo anterior e um histórico sumário dos fatos.

Quando a parte vier desacompanhada de advogado, ou seja, tenha promovido o seu pleito sozinha na forma do artigo 2º da Lei, o juízo poderá designar um defensor para assistir a parte, podendo promover em 24 horas da sua nomeação o pedido por escrito, se assim achar conveniente:

§ 1º Se houver sido designado pelo juiz defensor para assistir o solicitante, na forma prevista no art. 2º, formulará o designado, dentro de 24 (vinte e quatro) horas da nomeação, o pedido, por escrito, podendo, se achar conveniente, indicar seja a solicitação verbal reduzida a termo.

§ 2º O termo previsto no parágrafo anterior será em 3 (três) vias, datadas e assinadas pelo escrivão, observado, no que couber, o disposto no "caput" do presente artigo.

A nosso ver, o petitório deve atender os artigos 2º e 3º da Lei de Alimentos, além do art. 282 do CPC.

Ademais, deve ser acompanhada da prova de parentesco ou matrimônio, esclarecer os ganhos e rendimentos do demandado; indicar o valor da causa; etc.

O juiz providenciará a autuação, fixará os alimentos provisórios, designará dia e hora para audiência de conciliação e julgamento, determinará que seja oficiado na forma do § 7º, do art. 5º da Lei 5478/68; concederá, se for o caso, a gratuidade de justiça; tudo na forma da Lei.


O Valor da Causa

Se em primeira análise atribuir valor da causa seja simples, somos enfáticos que o tema não é tão linear quanto parece, pelo menos não na doutrina.

Para pedir os alimentos é simples. É a soma de doze prestações mensais pedidas pelo autor, conforme preceitua o artigo 259, VI, DO CPC.

Sérgio Gilberto Porto[22], por cautela, entende que, no máximo, o valor da ação a ser fixado deve representar doze vezes um terço do que presumidamente perceba o demandado, a fim de se evitar futuros incidentes.

As dúvidas começam a surgir quando a ação pretende revisar o valor dos alimentos fixados. Entende a maior parte da doutrina que o valor atribuído à ação deve representar as doze prestações do quantum almejado, ou seja, doze vezes da diferença entre o que é pago e o que se pretende pagar, conforme art. 259, VI , CPC [23].

Há, por sua vez, quem defenda que são as doze prestações do valor pretendido, que é posição minoritária na doutrina, como salienta Ana Maria Louzada.

Na exoneração o valor da causa é a soma das doze prestações que o autor paga habitualmente.


O Foro Competente

É competente o foro do credor de alimentos (regra conhecida do inciso II do artigo 100 do CPC), ainda que advenha de ação cumulada com investigação de paternidade, por exemplo. Citamos súmula 01, STJ art. 100, II, CPC e art. 24 da Lei 5478/1968.

Há presunção de fragilidade do credor de alimentos, que teria, ao menos em tese, maior dificuldade em deslocar-se do foro do seu domicilio para outro.

Sérgio Gilberto Porto destaca:

De outro lado, vale registrar que a hipótese de foro concorrente, portanto, se o alimentante preferir poderá litigar no domicílio do obrigado sem que este possa excepcionar, pois cabe ao primeiro a escolha do uso ou não do benefício legal[24].

Dessa forma, o credor tem a liberdade de promover a ação onde lhe é mais interessante.


As Provas

Outro tema que não deveria ter grandes dilemas é a respeito das provas. Contudo, em razão de interpretação literal da Lei algumas polêmicas surgem.

A ação de alimentos baseada na Lei especial não deve sofrer nenhuma restrição na apresentação das provas.

Sérgio Gilberto Porto faz belíssima citação a respeito do direito da parte elaborar sua prova, com amplo contraditório:

Tema de tamanha envergadura não poderá ser contaminado em homenagem a uma eventual celeridade processual. Não pode e não deve o juiz julgar sem esgotar os meios aptos a demonstrar a realidade e a formar seu convencimento. Não há qualquer razão para a exigência da célere formação de coisa julgada, visto que, enquanto perdurar a lide, poderá a poderá a pretensão estar sendo satisfeita com o alcance dos alimentos ‘ad litem[25].

A juntada de documentos pela Lei de alimentos deve ser na inicial, pelo autor, e com a defesa pelo réu, salvo as exceções dos incisos I e II da Lei 5.478/1968.

Evidente a possibilidade de juntada posterior de documento novo e a contra prova deste.

O STJ, por sua vez, prestigia o principio da instrumentalidade (Resp. 114. 312/ MG).

As testemunhas, pela Lei especial, são três ( art. 8º Lei 5.478/1968), sem necessidade de prévia apresentação do rol.

Já no rito ordinário segue a regra do art. 407 do CPC, com prévia apresentação de rol de, no máximo, dez testemunhas.

Nesse ponto surge a discussão.

Por um lado há quem defenda expressa previsão de três testemunhas, não podendo ultrapassar tal limitação em razão da pretendida simplicidade da Lei Especial.

Contudo, no contexto de uma audiência de instrução em que o magistrado tenha a necessidade de aferir as provas, tendo a parte mais de três testemunhas e sendo imprescindível a oitiva – até porque a prova desnecessária deve ser rechaçada de imediato pelo Juízo – acreditamos veementemente que o juízo deve produzir todas as provas em direito admitidas, corroborando, inclusive, o pensamento do nobre doutrinador Sérgio Porto.


A Citação

A Lei 5.478/1968 especificou a citação postal como regra.

A dúvida emerge nesse item, já que o Código de Processo Civil, em tese, fala o contrário.

Vejamos.

Assim dispõe o §2º do artigo 5º da Lei 5.478/1968:

§ 2º. A comunicação, que será feita mediante registro postal isento de taxas e com aviso de recebimento, importa em citação, para todos os efeitos legais.

Os parágrafos subsequentes traz a preferência, na impossibilidade da citação postal:

§ 3º. Se o réu criar embarações ao recebimento da citação, ou não for encontrado, repetir-se-á a diligência por intermédio do oficial de justiça, servindo de mandado a terceira via da petição ou do termo.

§ 4º. Impossibilitada a citação do réu por qualquer dos modos acima previstos, será ele citado por edital afixado na sede do juízo e publicado 3 (três) vezes consecutivas no órgão oficial do Estado, correndo a despesa por conta do vencido, a final, sendo previamente a conta juntada aos autos.

Ana Maria Louzada[26] ousa na possibilidade da citação, afirmando que na impossibilidade de citar encontrar o réu deverá o alimentado requerer que a citação se dê na pessoa dos avós (se for o caso), pois demonstra que o genitor não foi localizado.

A Lei prevê a citação por registro postal, sendo sua eficácia comprovadamente demonstrada na seara laboral (onde a lei de alimentos foi inspirada), como salienta Sérgio Porto[27].

Criticam tal modalidade os doutrinadores Sergio Gischikow Pereira e João Claudio de Oliveira e Cruz.

Destaca- se que o CPC de 1977, artigo 222, “a”, CPC, restringiu na hipótese de ações de estado, o que, na visão desses doutrinadores impossibilitaria a citação postal nas ações de alimentos.


O Prazo Para Resposta do Réu

João Claudino de Oliveira e Cruz, citado por Sérgio Porto, traz o prazo de 15 dias (art.297 do CPC). No mesmo sentido Nelson Carneiro[28].

Essa linha defende que a omissão da Lei é coberta pelo Código de Processo Civil, que traz previsão específica.

Por sua vez, Jorge Franklin Alves Felipe e Sidney Sanches[29] salientam que a defesa poderá ser apresentada até a data da audiência.

Nesse ponto Sérgio G. Porto, apoiado pela lição de Recasens Siches, faz questão de destacar que “não é possível desconhecer a intenção do legislador que deixou ao prudente arbítrio do juiz a fixação do prazo para resposta ou, por conseguinte, tal prazo tornou-se judicial e não legal[30]”.

Na hipótese da decisão não fixar prazo para defesa, esta poderá ser apresentada em audiência (e não até a data da audiência) são partidário dessa posição Sergio Gischkow Pereira, Paulo Furtado e Sérgio G. Porto[31].

Dessa forma, em apenas um ponto rotineiro, como é a defesa do réu, temos, ao menos, três posições.

Por certo, acreditamos que o legislador deixou ao critério do magistrado, e não omissa a Lei. Por isso, se não houver fixação de prazo na citação, acreditamos que a defesa deva ser apresentada na até a audiência. Vale ressaltar que atual realidade dos processos eletrônicos a apresentação acabe ocorrendo antes da audiência, já que a prática levará a esse fim.


A Audiência

A Lei de Alimentos, tanto na produção das provas como na manifestação em audiência, traz momentos processuais estáticos às partes, tendo cada qual o momento oportuno de se manifestar.

A Lei de Alimentos traz “ordem processual tanto para o autor quanto para o réu. Todavia, na aplicação deste dispositivo deve se ter presente a possibilidade de que a audiência pode decorrer de motivo de força maior (...). Nessa hipótese, quer nos parece não ser ponderada a aplicação sumária da sanção’’. Pondera que a justificativa deve chegar até a abertura da audiência (art. 453, § 1º, CPC)[32].

A objetividade da Lei de Alimentos em relação à importância da audiência é tamanha que os efeitos são um tanto inusitados.

Para Lei de Alimentos a ausência importa em revelia.

Na opinião de Sergio Gischkau[33], no qual descreve uma situação excepcional, onde, por um acidente gravíssimo, a parte não conseguiu chegar a tempo na audiência, nessa hipótese, na visão do autor, não há que se falar em revelia.

Mas veremos outros efeitos da audiência, em tópicos próprios.

Vale dizer ainda que a ausência de uma das propostas de acordo conciliação (artigos 9º e. 11 da Lei 5.478/1968) importa em nulidade do feito.

Necessária a audiência de conciliação inclusive em revisional (TJRS AC 599287356) [34].

Outro efeito interessante da audiência é na desistência do autor.

A desistência da ação, tratada no atual Código de Processo Civil pelo artigo 267, § 4º, CPC, difere na ação de alimentos, pois pode ocorrer independentemente da concordância do réu (TJSP A.C. 272.135[35]).


A Revelia

Segundo o art. 7º da Lei de Alimento a “A ausência do réu importa em revelia”.

Porém, “a revelia da ação não leva por si só à fixação da pensão pedida na inicial”, conforme entende Cahali[36].

Não se pode esquecer que a ação de alimentos deriva do estado de família e depende do seu reconhecimento.

Assim, independe de ser o réu revel ou não, a prova do direito do autor é ônus que não se desvencilha pela simples revelia.

Lourenço Mário Prunes[37] ensina que “a condição ficta não cobre a matéria do direito substantivo, assim, por exemplo, quem não é obrigado a alimentar, por não ser parente, não poderá ser declarado responsável simplesmente porque não compareceu”.


Ponderações sobre o Novo Código de Processo Civil e a Lei de Alimentos

a) Ponderações sobre a gratuidade:

Antes de voltarmos à Lei de Alimentos novamente, apenas a título de oportunidade perdida pelo Novo Código, salientamos que a Lei de Alimentos traz reiterações da Lei 1060/1950 (Lei de assistência judiciária ao necessitados).

O Novo Código de Processo Civil, que entrará em vigor em 2016, revogou os artigos 2º, 3º, 4º, 6º, 7°, 11°, 12 e17 da Lei 1060/50, prevendo por sua vez, regras nos artigos 98 a 102 no Novo Código de Processo Civil.

Já na Lei de alimentos foram revogados os artigos 16 a 18.

Por sua vez, o Legislador poderiam ter igualmente revogado os § 2, § 3, §4 do artigo 1º da Lei 5478/68, tendo em vista que os dois primeiros estão previstos no NCPC, de forma semelhante enquanto o § 4º está contrariamente o disposto no art. 100 do NCPC.

O § 3º do art. 1º da Lei de Alimentos está previsto no § 3º, do art. 99 do NCPC, e o § 2º daquela Lei está igualmente reproduzido no art. 98 e parágrafo único do art100, ambos no NCPC.

b) A exclusão do termo “provisionais” do NCPC:

Ao que tudo indica, houve a revogação dos alimentos provisionais, uma vez que o NCPC não utiliza o termo em nenhum dos seus artigos.

Ou seja, não há mais medida cautelar do atual artigo 852 do CPC 1973. Portanto, resta apenas dois tipos de alimentos: os provisórios e os definitivos.

Inclusive o NCPC faz referência expressa à Lei de Alimentos.

c) Revogação dos artigos 16 a 18 da Lei 5.478/68:

Na execução de alimentos, os artigos 16 a 18 da Lei 5.478/68, foram revogados pelo artigo 1.072, inciso V, do Novo CPC, trazendo na Parte Especial, Livro I, Título II (Do cumprimento de sentença), Capítulo IV (Do cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de prestar alimentos), os artigos 528 a 533. Ressalta-se que o artigo 528, §8°, prevê que o exequente pode optar por promover o cumprimento de sentença conforme o capitulo antecedente, caso em que não será admitida a prisão do executado.

d) Execução de título extrajudicial que contenha obrigação alimentar.

Há previsão de prisão (artigos 911 a 913 N.CPC);

e) Necessidade do requerimento do exequente para haver o desconto em folha.

Não é, portanto, de ofício (arts. 529 e 912 do N.CPC) Observação: Crime de desobediência (§1° do Art. 529 ou art. 22 da Lei de Alimentos?)

Nesse ponto Araken de Assis e Guilhere Rizzo Amaral[38] posicionam-se contrários a “necessidade de requerimento do exequente para que o juiz determine o desconto em folha para pagamento da divida dos alimentos”. Fundamentam que há incompatibilidade com o interesse público de que se revestem as regras relativas aos meios executivos.

Por sua vez, entendemos que o juiz ainda pode agir de ofício, por uso da interpretação hermenêutica do mencionado dispositivo, uma vez que o legislador não vedou, mas apenas possibilitou.

f) Possibilidade de protestar o pronunciamento judicial

em hipótese do inadimplemento dos alimentos (art. 528, §1° do N. CPC c.c. art. 517 do N. CPC);

g) Regulamentação do entendimento da Súmula 309 do STJ:

O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.”) no Art. 528, §7°, N. CPC;

h) Previsão expressa do dever de oficiar o MP acerca de indícios na prática de delitos de abandono material,

conforme artigo 532 N.CPC c.c. art. 244 do Código Penal;

i) Possibilidade de transferir o foro da execução,

conforme o endereço do devedor ou onde se localize os bens, ou seja, uma execução itinerante, na forma do artigo 516 N.CPC;

j) Limite de provisionamento de 50% dos ganhos líquidos do devedor,

considerando parcelas atuais e vencidas. Observa-se que a lei não traz o percentual dos alimentos atuais, podendo superar os 50%, sendo que, nesta hipótese, não haverá espaço para a execução do débito pretérito via desconto em folha.


Conclusão

O presente trabalho trouxe as questões mais salutares da Lei de Alimentos em paralelo ao ordenamento processual.

Sem a pretensão de esgotar o tema, justamente pela amplitude que tem, solvemos as polêmicas processuais que Lei de Alimentos suscita.

Por sua vez, o Novo Código de Processo Civil parece sanar a maior das controvérsias PC, que é justamente a respeito dos alimentos provisionais.

Por certo, tanto o legislador de antes como o de hoje tiveram a intenção de deixar a Lei de Alimentos com as simplicidades inerentes dos seus dispositivos, a fim de possibilitar o amplo acesso à Justiça e com anseio de uma Justiça célere.


Bibliografia

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[1] PORTO, Sérgio Gilberto. Doutrina e Prática dos Alimentos. Editora RT, 4ª Edição. Página 20.

[2] Porto. Idem. Página 21.

[3] LOUZADA, Ana Maria Gonçalves. Alimentos – Doutrina e Jurisprudência. Editora Del Rey, 2012. Página 01.

[4] LOUZADA. idem. Página 01.

[5] LOUZADA. idem. Página 02.

[6]MADALENO.Rolf. Artigo Extraído do site http://www.rolfmadaleno.com.br/novosite/conteudo.php?id=37. Disponível em 10.10.2015, às 10h20min

[7] VIANA. Marco Aurélio S. . Dos alimentos, Del Rey: Belo Horizonte, 1994, p.22. – citado por Rolf Madaleno: http://www.rolfmadaleno.com.br/novosite/conteudo.php?id=37#sthash.VHpc6ueN.dpu. Disponível em 10.10.2015, às 10h20min.

[8] CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos. Editora Revista dos Tribunais. 6ª Edição. Página 91.

[9] Porto. Idem. Página 80.

[10] FELIPE, Jorge Franklin Alves (Prática das Ações de Alimentos, Forense, 1984, pg.37):

[11] Porto. Idem. Página 80.

[12] LOUZADA. Idem. Página 121.

[13] LOUZADA. Idem. Página 121.

[14] LOUZADA. Idem. Página 122..

[15] PORTO. Idem. Página 13.

[16] PORTO. Idem. Página 83.

[17] PEREIRA, Sérgio Gischkow. Ação de Alimentos. Porto Alegre. Fabris. 3ª Edição. Página 49.

[18] Porto. Idem. Página 83

[19] PORTO. Idem. Página 83.

[20] PLANALTO. Site consultado http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5478.htm, em 10.10.2015, às 20h30min.

[21] Porto. Idem. Página 73.

[22] PORTO. Idem. 43

[23] No mesmo sentido Fabio Luiz Gomes, Comentários ao CPC, vol 3,p. 126 e Julgado p. 75 e 76- TJ-SP, Agin 231.437-1, 3º com. Civil, Alfredo Migliore

[24] Porto. Idem. Página 82.

[25] Porto. Idem. Página 85.

[26] Louzada. Idem. Página 126.

[27] Porto. Idem. Página 90 e 91.

[28] Porto. Idem. Página 93.

[29] Porto. Idem. Página 93.

[30] Porto. Idem. Página 94.

[31] Porto. Idem. Página 94.

[32] PORTO. Idem. Página 93.

[33] PORTO. Idem. Página 93.

[34] DIAS, Maria Berenice. Direito das Famílias. Página 96.

[35] CAHALI. Idem. Página 97.

[36] CAHALI. Idem. Página 528

[37] PRUNES, Lourenço Mário. Ação de Alimentos. 2ª Edição. São Paulo. Sugestões Literarias.

[38] AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às Alterações do Novo CPC. Editora Revista dos Tribunais. 2015. Página 646.


Autor

  • Adriano Ialongo

    Advogado sócio do escritório ialongo advocacia. Graduado na Faculdade de Direito de Santos (UniSantos). Especializado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera. Pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil pela Escola Paulista de Direito. Formado em cursos de PNL e Coaching pelo Instituto Vencer. MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas.

    www.ialongo.com.br

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