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O uso da prova obtida na Lava-jato e a investigação eleitoral

O uso da prova obtida na Lava-jato e a investigação eleitoral

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Tudo quanto se passe perante a Justiça Federal (no processo da Lava Jato) e no TCU (no exame das contas de governo) pode ser trazido à ação de impugnação de mandato eleitoral que corre no TSE.

Noticia-se que a presidente Dilma Rousseff tenta evitar que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) admita como prova, em um dos pedidos de cassação contra ela no tribunal, dados da Operação Lava Jato, que investiga esquema de corrupção na Petrobras.

O material foi encaminhado ao tribunal em dezembro de 2015 pelo juiz Sergio Moro, que atendeu a pedido da corregedoria do TSE.

Entre os documentos estão um relatório da Polícia Federal sobre diálogos do dono da UTC, Ricardo Pessoa, e de um executivo da empreiteira, além de denúncias e sentenças ligadas às investigações.

A imprensa destaca que, em sua delação premiada, Pessoa afirmou que, em 2014, foi persuadido pelo ministro Edinho Silva (Comunicação), então tesoureiro da campanha à reeleição de Dilma, a aumentar as doações. Ele disse que foram acertados R$ 10 milhões, mas foram pagos R$ 7,5 milhões porque ele acabou preso na Lava Jato. O ministro, que é investigado no STF (Supremo Tribunal Federal), nega a pressão.

O fato é que é possível a utilização de prova emprestada obtida no processo na investigação judicial eleitoral.

A prova emprestada é aquela que foi produzida em um processo e transferida para um outro. Aliás, a admissão da prova emprestada encontra amparo na garantia constitucional da duração razoável do processo, do que se lê do artigo 5º, LXXVIII, da Constituição Federal, com a redação que lhe foi dada pela Emenda Constitucional 45/2004, uma vez que se trata de medida que visa a dar celeridade à prestação jurisdicional. Trata-se de meio de prova que quanto à forma é sempre documental. São requisitos:

a) Que tenha sido colhida em processo entre as mesmas partes;

b) Que tenham sido observadas no processo anterior, as formalidades previstas em lei durante a produção da prova;

c)  Que o fato probando seja o mesmo;

d) Que tenha havido o contraditório no processo no qual a prova será transferida.

Por sinal, em respeitável acórdão, o eminente Desembargador Federal Edilson Nobre, na AC 529391/SE, DJe de 6 de setembro de 2012, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região deixou consignado que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça é pacifica no sentido de que os dados obtidos, mediante autorização judicial, em escutas telefônicas ou ambientais podem subsidiar apurações no campo disciplinar e até mesmo instruir ações judiciais de natureza civil, como, por exemplo, a ação de improbidade administrativa.

Aliás, não há óbice a que documentos obtidos em sede de inquérito policial sejam utilizados pelo titular da ação penal pública para ajuizamento de eventual ação de improbidade administrativa tendo por objeto fatos apurados no referido procedimento criminal, aplicando-se o instituto da prova emprestada. Mas alerte-se: eventual condenação será baseada nas provas obtidas em face do principio do contraditório e da ampla defesa e não, por si só, nos documentos apresentados pelo Parquet com sua petição inicial.

No entanto, considero louvável citar importante observação do Desembargador Federal Francisco Barros, no APELREEX 200581010004950, DJe de 10 de fevereiro de 2011, pág. 52, quando se diz que a utilização da prova emprestada é plenamente admissível no ordenamento jurídico pátrio, consistente no acolhimento de algumas das peças que compõem o processo administrativo, oportunizando-se à demandada pronunciar-se sobre as mesmas na esfera judicial.

Inexiste qualquer restrição à utilização de prova emprestada regularmente autorizada no bojo de processo penal, como se vê de entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial 2009.02.128.645, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe de 8 de outubro de 2010. 

Tal é o que se dá ainda com relação a prova emprestada juntada na representação  eleitoral onde se pede a cassação da presidente da república perante o Tribunal Superior Eleitoral, envolvendo denúncias e sentenças ligadas as investigações já realizadas.

Sendo assim autor e réu, nesta ação, podem trazer prova emprestada, isto é, aquela produzida em qualquer outro processo judicial ou administrativo – em qualquer instância, desde que ressubmetidos ao rigor do contraditório e da ampla defesa no seio da ação. Em outros termos, tudo quanto se passe perante a Justiça Federal no processo Lava Jato e no TCU no exame das contas de governo pode ser trazido à Ação de Impugnação de Mandato Eleitoral.

Diga-se que é irrelevante a prova de que a Presidente da República tenha participação direta na prática de ilícitos já noticiados. Basta ter sido beneficiada.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. O uso da prova obtida na Lava-jato e a investigação eleitoral. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4673, 17 abr. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/46450. Acesso em: 28 mar. 2024.