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Elementos para reforma do Código de Processo Civil.

Sugestões dos juízes federais

Elementos para reforma do Código de Processo Civil. Sugestões dos juízes federais

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Publicado em . Elaborado em .

Comissão de Reforma do CPC - AJUFE: 
Relator: George Marmelstein Lima
Membros: Reynaldo Soares da Fonseca, Paulo César Conrado, Marcelo Pereira da Silva, Luis Carlos Castro Lugon

AJUFE - Associação dos Juízes Federais do Brasil: 
Presidente: Paulo Sérgio Domingues
Secretário-Geral: José Antônio Maurique
Diretor de Comissões: Luís Praxedes Vieira da Silva
Diretor de Assuntos Legislativos: Flávio Dino de Castro Costa


ÍNDICE: 1. Introdução; 2. Sugestões dos juízes federais, 2.1.Mudança nos processos "em massa", 2.2.Mudanças visando à simplificação do processo, 2.3.Mudança visando à efetividade do processo, 2.4.Mudanças visando à moralidade do processo, 2.5. Mudanças visando à democratização do processo, 2.6. Mudanças visando à informatização do processo, 2.7. Mudanças no processo de execução, 2.7.1.A penhora administrativa e a execução fiscal, 2.8. Mudanças de mentalidade; Conclusão.


1. Introdução

            Poucos temas são defendidos com unanimidade por juristas. A necessidade de reformulação do Código de Processo Civil é um desses temas. Afinal, todos concordam que as regras processuais precisam melhorar.

            Desde o início da década passada, são editadas leis visando ao aperfeiçoamento das normas processuais, com destaque para as leis idealizadas pela comissão instituída pelo Ministério da Justiça, integrada pelos juristas Sálvio de Figueiredo Teixeira, Athos Gusmão, entre outros. Graças a essa comissão, muitas inovações foram introduzidas, como, por exemplo, a possibilidade de antecipação dos efeitos da tutela, o que tem ajudado bastante a transformar o processo civil em um verdadeiro processo de resultados. No entanto, os avanços até agora levados a cabo foram insuficientes para agilizar o trâmite processual, o que é facilmente comprovado na prática. Utilizando as palavras de CAPPELLETTI e GARTH, pode-se dizer que o Código de Processo Civil brasileiro, por mais admirável que seja, é, a um só tempo, lento e caro, que acarreta um imenso sacrifício de tempo, dinheiro e talento (Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Sergio Antonio Fabris Editor, Porto Alegre, 1988, p. 164).

            A Associação dos Juízes Federal do Brasil – AJUFE, consciente da necessidade e urgência em se reformular as leis processuais, objetivando simplificar, racionalizar, acelerar, moralizar e democratizar o processo civil, formou uma comissão entre juízes federais no intuito de debater propostas de reforma das normas processuais que cumpram esses objetivos.

            O presente relatório é o resultado do trabalho da comissão que, com a ajuda de juízes federais de todo o país, conseguiu sistematizar uma série de sugestões de reforma das leis processuais.


2. Sugestões dos Juízes Federais

            Foram inúmeras as sugestões oferecidas pelos Juízes Federais, o que demonstra a existência de um sentimento interno muito forte de mudança.

            As sugestões foram agrupadas nos seguintes tópicos: a) mudanças nos chamados processos "em massa"; b) mudanças visando à simplificação do processo; c) mudanças visando à efetivação do processo; d) mudanças visando à moralidade do processo; e) mudanças visando à democratização do processo; f) mudanças visando à informatização do processo; g) mudanças no processo de execução; h) mudanças de mentalidade.

            2.1. Mudanças nos processos "em massa"

            Os processos "em massas" são aqueles envolvendo direitos individuais homogêneos. São processos cuja controvérsia é unicamente de direito, sendo que a discussão jurídica se aplica a uma enorme quantidade de pessoas na mesma situação fática. As reivindicações de servidores públicos, aposentados e pensionistas, as pretensões contra planos econômicos, as causas objetivando a declaração de inconstitucionalidade de tributos são exemplos de processos "em massa". Esses processos caracterizam-se pela padronização das peças processuais e pela repetição de expedientes forenses. Não existe ainda um tratamento legislativo especial para esses processos (1). Cada um dos processos é tratado autonomamente, exigindo um impulso individual com a repetição dos expedientes forenses.

            O modelo atual, portanto, é totalmente irracional. Gasta papel inutilmente, mecaniza o trabalho do juiz e dos servidores, consome tempo e espaço de forma desnecessária e o pior: dá ensejo a injustiças decorrentes da desigualdade de tratamento em casos semelhantes.

            No âmbito da Justiça Federal, muitas mazelas são ocasionadas pelos processos repetitivos e pela ausência de um procedimento diferenciado para esse tipo de causa. As pilhas de autos que se amontoam nas prateleiras dos fóruns federais versam sobre matérias idênticas, onde se alteram apenas os nomes das partes. O desfecho das causas já é conhecido desde o início, mas a lógica – ou ausência de lógica – do sistema impõe que o processo tramite normalmente, seguindo o longo caminho da primeira instância até as instâncias superiores. Até matérias exaustivamente decididas e pacificadas, como por exemplo, as atualizações das contas do FGTS, o índice de 28,86% dos servidores públicos, a auto-aplicabilidade do art. 201 da CF/88, continuam sendo julgadas como se ainda houvesse dúvida quanto à resposta judicial que será dada.

            Sem um tratamento especial para esses processos, o juiz federal continuará perdendo tempo assinando pilhas e mais pilhas de despachos padronizados ao invés de estar aprimorando seu estudo nas causas que exigem mais atenção.

            Por isso, muitas sugestões para a reforma do CPC envolvem o aprimoramento dos processos em massa.

            Citam-se as seguintes sugestões:

            a) permitir que o Supremo Tribunal Federal ou o próprio juiz de primeiro grau conceda efeito erga omnes/ultra partes às suas decisões nos processos em massa, evitando a repetição de lides em matéria já pacificada;

            Justificativa: sempre que a causa tiver por objeto direito que por sua natureza se qualifique como coletivo ou individual homogêneo é interessante que a solução jurisdicional seja uniforme a todas as pessoas que se encontram na mesma situação. Ao se permitir ao juiz ou aos tribunais a possibilidade de, ao julgar ação individual, imprimir ao decidido uma eficácia "ultra partes" ou "erga omnes", mediante provimento de eficácia potenciada, concilia-se o ideal de celeridade com o de igualdade. A proposta legislativa seria a seguinte, conforme sugestão do Juiz Federal Sérgio Fernando Moro (2): "Art. 461-A. Na ação individual que tenha por objeto direito de natureza coletiva ou individual homogêneo, podendo gerar demandas repetitivas junto ao Judiciário, o juiz poderá, independentemente de pedido da parte e após reiteradas decisões de procedência sobre a matéria [a fórmula aqui é similar a empregada na proposta das sumulas vinculantes], acrescentar ao dispositivo provimento judicial com eficácia ‘ultra partes’ ou ‘erga omnes’, visando tutelar todos que se encontrem em idêntica situação. Parágrafo único. A liquidação e a execução do julgado poderão, quando for o caso e quando for necessário, ser promovidas pelo prejudicado ou seus sucessores no foro de seu domicílio e com base em certidão da sentença". O mesmo magistrado explica sua idéia: "Por exemplo, ao julgar, em ação individual, que, imediatamente após a Constituição de 1988, nenhum benefício previdenciário que substituísse o rendimento do trabalhador poderia ser inferior a um salário mínimo, o juiz - desde que convencido do acerto de sua decisão, daí a exigência de reiteradas decisões -também condenaria o Poder Público a revisar todos os benefícios previdenciários em idêntica situação. A fórmula evitaria novas demandas junto ao Judiciário, satisfazendo ainda todos os que se encontrassem em idêntica situação. A referência a ‘decisões de procedência’ visa evitar a formação de coisa julgada em desfavor da coletividade, já que esta, em demanda individual, pode não estar adequadamente representada. Talvez possam existir alguns questionamentos quanto à não-absoluta correlação entre pedido e sentença, mas acho que é contornável diante das exigências do processo em uma sociedade de massa. Outrossim, o demandado, com a introdução legislativa, fica sabendo de antemão da possibilidade de que seja proferido provimento de eficácia potenciada em uma ação individual". Em seguida, prossegue "para imprimir celeridade à resolução da demanda de massa, poder-se-ia autorizar o juiz a exarar liminarmente o provimento de eficácia potenciada , observados os mesmos pressupostos do caput, em um par. 1 (renumerando portanto o único para 2.), algo assim: ‘Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo situação de urgência, incluída nesta hipótese a necessidade de se evitar a proliferação de demandas individuais, é lícito ao juiz, desde que também observados os pressupostos do ‘caput’, exarar o provimento de eficácia ‘ultra partes’ ou ‘erga omnes’ liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.’ Por força desta alteração, modificaria ligeiramente o par 2. para: ‘A liquidação e a execução do julgado poderão, quando for o caso e quando for necessário, ser promovidas pelo prejudicado ou seus sucessores no foro de seu domicílio e com base em certidão da sentença ou da liminar’."

            b) prever a legitimação ativa do Ministério Público para a defesa de qualquer interesse difuso, coletivo ou individual homogêneo, inclusive em matéria tributária;

            Justificativa: o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 195.056-PR, rel. Min. Carlos Velloso, 9.12.99, entendeu que o Ministério Público não possui legitimidade ativa para propor ação civil pública em matéria tributária. Entendeu-se, basicamente, que apenas nas relações de consumo, onde o Código do Consumidor é expresso, é cabível a atuação ministerial para defesa de interesses individuais homogêneos. Seria interessante, portanto, que fosse editada uma lei autorizando expressamente o Ministério Público a ingressar com ação civil pública para defesa de interesses individuais homogêneos, inclusive em favor dos contribuintes. A necessidade da mudança é mais visível naqueles casos em que o valor do tributo não estimula o ingresso com ações individuais (p. ex., taxas municipais de pequeno valor).

            c) deixar expresso que constitui impossibilidade jurídica do pedido, justificando o indeferimento da inicial, a formulação de pretensão contrária ao posicionamento pacífico do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça ou, nesses mesmos casos, permitir expressamente o julgamento na forma de "improcedência prima facie";

            Justificativa: apesar de existirem algumas controvérsias em torno do conceito de impossibilidade jurídica do pedido, a noção dada por José Frederico Marques tem sido aceita. Há impossibilidade jurídica do pedido, segundo o famoso processualista, quando há indício macroscópico da inexistência de pretensão razoável. Na prática, poucos juízes têm indeferido petições iniciais quando há fortes indícios de que a pretensão do autor será denegada. Quando a tese jurídica ainda é controvertida, não há mesmo razão para se indeferir a inicial, ainda que o juiz entenda que a postulação é destituída de qualquer fundamento. No entanto, já havendo posicionamento pacífico do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça sobre determinado tema, e sendo esse o mesmo entendimento do magistrado processante, é inútil dar prosseguimento a uma pretensão que vai de encontro a esse posicionamento. Por exemplo, a parte pede a inconstitucionalidade de uma determinada norma, que o Supremo Tribunal Federal já decidiu que é constitucional. Ora, esse é o típico caso de impossibilidade jurídica do pedido que legitima o indeferimento da inicial (art. 295, parágrafo único, III, do CPC) e impedirá que o processo se arraste inutilmente. Por outro lado, deve ser ressaltado que, se o autor trouxer argumentos novos em favor da tese que defende, terá ele o direito a uma resposta jurisdicional (decisão de mérito) sobre esse ponto. Assim, seria interessante uma mudança legislativa que deixasse expressamente consignada essa possibilidade. O Juiz Federal Ricardo Mandarino defende a edição de uma regra que permita que o Juiz profira sentença de mérito, de improcedência do pedido (improcedência "prima facie"), logo quando do recebimento da inicial, quando se trate de matéria exclusivamente de direito e já tenha sido apreciada pelo Juiz. Segundo seu entendimento, se o Juiz já julgou a matéria, não há porque processar o feito. O melhor seria juntar a sentença proferida no outro processo e indeferir o pedido, evitando a longa tramitação, com a  juntada de documentos e um enorme trabalho para o cartório, para chegar onde já se sabe que chegará (3).

            d) autorizar, a critério do juiz de primeiro grau, a suspensão dos feitos unicamente de direito enquanto os tribunais superiores debatem e pacificam a questão;

            Justificativa: essa autorização já existe na Lei do Juizados Especiais Federais, em que o art. 14, §5o, permite a suspensão de todos os processos nos quais a mesma controvérsia jurídica esteja estabelecida enquanto se julgada a uniformização de jurisprudência. A medida é salutar, já que economiza trabalho inútil por parte do juiz e da secretaria, bem como propiciará o tratamento igualitário entre casos semelhantes. É prudente, contudo, que a suspensão seja uma faculdade do juiz. A suspensão teria a vantagem de permitir um acordo no caso de a decisão a ser pacificada for contrária a Fazenda Pública e possibilitar a extinção dos feitos no caso de a decisão ser favorável ao poder público.

            e) permitir o encurtamento, pelo juiz, do prazo de contestação para a Fazenda Pública em matéria unicamente de direito, tornando o prazo flexível (de 15 a 60 dias, por exemplo);

            Justificativa: não é razoável, diante das facilidades que a informática proporciona, que a Fazenda Pública disponha de prazo de 60 dias para contestar uma ação e 30 dias para recorrer. É razoável que o juiz tenha o poder de fixar o prazo, permitindo que, em causas mais complexas, o prazo seja elastecido em até 60 dias. Porém, como regra, o prazo deverá ser de 15 dias, sobretudo quando o feito é unicamente de direito, onde as petições são padronizadas. Vale ressaltar que isso já ocorre na ação popular, em que o prazo é de 20 dias, prorrogável por mais 20, a requerimento do interessado;

            f) possibilitar que, nos feitos padronizados, as sentenças sejam proferidas por simples certidão da secretaria, em que se reporte à sentença do feito "paradigma";

            Justificativa: como explica o Juiz Federal Frederico Valdez Pereira (4), uma boa solução para desafogar o 1o grau de jurisdição seria permitir que o magistrado profira uma "sentença paradigma", que se aplicaria aos processos padronizados que envolvem estritamente a mesma matéria. Assim, nos processos referidos nesta "sentença paradigma", seria colocada uma certidão da secretaria informando a extensão da decisão. Com isso, não se afetaria o mercado de trabalho dos advogados, já que as partes poderiam intentar suas ações individuais, e, ao mesmo tempo, daria uma maior racionalidade ao processo, já que o juiz não precisaria fazer inúmeras sentenças idênticas para cada um dos feitos. A mesma possibilidade poderia ser aplicada aos Tribunais.

            g) criar uma espécie de "sentença padrão antecipada" para os processos em massa, cujo processo seria ultra-simplificado;

            Justificativa: a Juíza Federa Simone Schreiber sugere (5) um procedimento para os processos em massa em que apenas o primeiro processo seguiria o trâmite normal. Os processos seguintes seriam sentenciados independentemente de citação. O julgamento seria liminar, sem mesmo proceder à citação da ré, aplicando-se a decisão padronizada. De tal sentença, caberia apelação com possibilidade de juízo de retratação, ou seja, o juiz poderia se convencer que, na verdade, há peculiaridades na causa que não admitiriam o processo padronizado. Se o juiz não se retratasse, a apelação subiria para o Tribunal. Se, ao final, o colegiado concluísse que o processo é mesmo padrão e foi resolvido em conformidade com a jurisprudência pacificada, estaria concluído o processo. Uma solução semelhante foi fornecida pelo Juiz Federal Walter Nunes Júnior (6): "registrado e autuado o processo que trate de matéria unicamente de direito, sobre a qual  o juiz possui pensamento consolidado, ele poderá julgar antecipadamente improcedente o pedido. Em se tratando da hipótese tratada anteriormente, a parte contrária será citada para contestar e contra-arrazoar o recurso, em uma única peça: a) o juiz, após as contra-razões, decidirá se mantém ou se modifica a sua decisão; b) havendo o juízo de retratação, a parte recorrida poderá, mediante petição, a ser interposta no prazo de dez dias, pedir o reexame pela Tribunal Regional Federal."

            2.2. Mudanças visando à simplificação do processo

            Etimologicamente, o termo "processo" significa caminhar para frente.

            A lei processual, contudo, muitas vezes obriga o juiz a trabalhar "em círculo", fazendo com que o andamento processual torne-se lento, burocrático e complicado.

            Certos dispositivos legais são tão sem lógica que certamente foram escritos por quem jamais pisou em um cartório forense, sobretudo em um cartório abarrotado de processos com uma grande carência de servidores. Exigir, por exemplo, que simples impugnações ao valor da causa e exceções relativas de incompetência sejam autuadas e apensadas aos autos principais é um preciosismo técnico completamente destituído de lógica. São inúmeros os transtornos causados pelo apensamento de autos: necessidade de nova autuação, dificuldade no manuseio dos autos, dificuldade no controle e andamento dos atos processuais, gasto de papel, repetição de expedientes etc. Muito mais simples e racional seria permitir que tais questões fossem alegadas como meros incidentes processuais, nos próprios autos principais, tal como ocorre com as alegações preliminares. É preciso, portanto, acabar com os chamados "penduricalhos" processuais.

            Além disso, é preciso simplificar a linguagem processual. A Justiça deve ser um palco de diálogo e não de demonstração de saber. Não se justificam os arcaísmos ainda hoje encontrados nos textos escritos por operadores do direito. O juiz deve procurar facilitar a vida dos atores processuais (partes, advogados, servidores, peritos etc.) e não escrever em uma linguagem incompreensível e abstrata. O mesmo vale para os advogados. Não se justifica uma petição de mais de cem páginas quando se sabe que, pela quantidade de processos, o juiz somente lerá os fatos e o pedido.

            Por essa razão, a maioria das sugestões apresentadas pelos juízes federais foi no sentido de simplificar o andamento do processo e a linguagem processual. Ei-las:

            a) simplificar a linguagem dos atos processuais, determinando que os atos processuais sejam escritos em linguagem objetiva, simples e auto-explicativa;

            Justificativa: uma mudança legislativa exigindo a simplificação da linguagem forense seria interessante do ponto de vista pedagógico. As decisões devem ou deveriam ser escritas com um texto claro e objetivo, evitando-se o uso de estilos rebuscados e incompreensíveis para o jurisdicionado.

            b) permitir que, havendo abuso quanto ao tamanho de petições, o juiz possa determinar o desentranhamento da petição, intimando o advogado para apresentar um texto mais objetivo;

            Justificativa: muitas vezes, o tamanho excessivo das petições judiciais dificulta o julgamento da causa. O advogado se utiliza das facilidades da informática (copiar/colar) para alongar desnecessariamente as petições e, em alguns casos, o intuito é precisamente o de confundir o julgador, alegando, no meio de várias citações, algum ponto que certamente o juiz não analisará, já que a carga de trabalho é muito grande e conseqüentemente poderá implicar em alguma nulidade do julgamento. Não se pretende com isso inibir o advogado de argumentar. Pelo contrário, o que se quer é aprimorar o debate. A objetividade das alegações é, sem dúvida, a melhor argumentação de um advogado.

            c) acabar com os "penduricalhos processuais", determinando que as exceções e impugnações sejam apresentadas juntamente com a contestação nos mesmos autos processuais e não autuadas em apenso, facultando-se a autuação em apenso em casos especiais, mediante prudente análise do juiz;

            Justificativa: tal medida implicaria em economia de papel, facilitaria o manuseio dos autos e evitaria a feitura de expedientes em duplicidade por parte da secretaria. Somente um preciosismo técnico estéril justifica que as exceções/impugnações sejam autuadas em apenso. Aliás, muitas vezes, as partes se sentem inibidas de alegar algum ponto fundamental, como a competência do juízo, em razão das dificuldades que a autuação em apenso ocasiona. Apenas excepcionalmente, justifica-se a autuação em apenso. Nesses casos, o juiz poderia decidir acerca da oportunidade de se apensar a impugnação ou exceção.

            d) permitir a prática de certos atos processuais pelas partes ou por terceiros, no intuito de acelerar o trâmite processual (p. ex. entrega de ofícios e intimações, trânsito de cartas precatórias, juntada de petições etc). Os atos referidos seriam listados pela Corregedoria do Tribunal a que estiver vinculado o juiz;

            Justificativa: uma boa forma de economizar o trabalho da secretaria é permitir a prática de alguns atos processuais pelas próprias partes envolvidas. Por exemplo, quando é necessário expedir ofícios a certas pessoas jurídicas (bancos, entes públicos, cartórios etc), podem ser distribuídos os encargos com a parte interessada no cumprimento daquele ato. Ou seja: a secretaria elabora o ofício e o entrega à parte interessada. A própria parte ficará encarregada de levar o ofício ao local devido e devolver a contra-fé à secretaria, com o respectivo protocolo de entrega. Economiza-se trabalho para o oficial de justiça, além de permitir o cumprimento mais rápido da determinação judicial, pois a parte está interessada na celeridade. Nessa tendência de se dividir tarefas entre as partes, os advogados e terceiros, louvável a iniciativa do Juiz Federal do Juizado Especial Cível de Blumenau, Antônio Fernando Schenkel do Amaral e Silva, que criou, através da Portaria nº 4, de 8 de julho de 2002, o serviço de auto-atendimento, em que advogados e seus estagiário, partes e peritos podem utilizar um espaço reservado no cartório para agilizar o trâmite processual, realizando procedimentos que normalmente seriam praticados pela secretaria (protocolo e juntada de petições, preenchimento de Requisições de Pequeno Valor – RPV e precatórios), sob a orientação e coordenação de um servidor (7).

            e) permitir a autenticação de documentos processuais pelos advogados, exigindo-se a autenticação cartorária apenas se houver dúvida quanto à autenticidade do documento e for ele imprescindível ao julgamento da causa;

            Justificativa: várias normas processuais editadas recentemente estão dispensando a autenticação das cópias de documentos apresentados judicialmente. Exemplo disso é a MP nº 1.490/96 (art. 21), que dispensa as pessoas jurídicas de direito público de autenticar cópias reprográficas de quaisquer documentos que apresentarem em juízo. A Lei 10.352/2001, do mesmo modo, trouxe alterações no CPC permitindo que o próprio advogado declare, sob sua responsabilidade pessoal, a autenticidade das peças do processo que instruirão o agravo de instrumento. Seria interessante que a legislação autorizasse expressamente que, em qualquer caso, o advogado poderia, ele próprio, autenticar as cópias de documentos apresentados em juízo, sobretudo quando se trata de documento de que a outra parte tem conhecimento. Não é justo, por exemplo, exigir que um mutuário autentique a cópia de um contrato de financiamento habitacional, quando a parte contrária (instituição financeira) possui uma cópia idêntica e poderá aferir a sua autenticidade com tanta ou mais confiabilidade do que a autenticação cartorária. O mesmo ocorre com cópias extraídas de processos administrativos utilizadas pela parte autora e passível de fácil verificação pelo ente público (réu) que possui o original daqueles mesmos documentos. Também é totalmente desnecessária a autenticação de documentos que não influem no julgamento da lide, como uma cópia carteira de identidade ou CPF, cópia de título de eleitor etc. Em síntese: o juiz somente deveria determinar a autenticação em cartório ou a apresentação dos originais se (a) o documento for necessário ao julgamento da lide, (b) houver dúvidas quanto à autenticidade do documento ou quanto à idoneidade do advogado e (c) a outra parte não tiver uma cópia ou o original do documento. Do contrário, a exigência será inútil burocracia, que, como ressaltou o Ministro Ruy Rosado de Aguiar, a experiência forense mostra desnecessária, além de criar uma desigualdade que não se justifica (STJ, RESP 20244/BA, 4a Turma, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 22/6/1999, DJ 6/9/1999, p. 87).

            f) simplificar o sistema de mandados, autorizando que a simples cópia do despacho sirva como mandado;

            Justificativa: uma das formas mais comuns de cientificação dos atos processuais é o mandado (mandado de citação, mandado de intimação, mandado de notificação etc.). Seria interessante que a legislação autorizasse expressamente que a própria cópia do despacho judicial poderia servir de mandado, sendo desnecessária a elaboração de um documento autônomo para esse fim. Ou seja, ao despachar, o juiz diria que a cópia do despacho servirá como mandado/contra-fé. Assim, o trabalho do servidor seria apenas tirar duas cópias do despacho - uma seria o mandado e a outra a contra-fé. O procedimento é bem mais simples e econômico do que o atual.

            g) permitir a citação de ofício, quando houver dúvida acerca da legitimidade passiva do réu, sem necessidade da intimação do autor para promovê-la. Deve-se permitir também que o juiz corrija a indicação errônea da pessoa jurídica que comporá o pólo passivo da demanda, dispensando a intimação do autor para fazê-lo, em caso de erro compreensível;

            Justificativa: é relativamente comum, sobretudo no âmbito da Justiça Federal, a parte indicar incorretamente a pessoa jurídica que deve estar no pólo passivo da demanda. Pede-se, por exemplo, a citação da Polícia Federal ou outro órgão despersonalizado (Ministérios, Exército, Tribunais etc), quando o correto seria pedir a citação da União. Nesses casos, a praxe – por imposição da jurisprudência – é determinar que o autor peça a citação da pessoa jurídica que deve compor o pólo passivo ("intime-se o autor para promover a citação da pessoa jurídica que possui capacidade para ser parte"). Tal prática, contudo, acarreta serviço desnecessário à secretaria. É óbvio que o autor, ao pedir a citação de um órgão despersonalizado, se equivocou e, na verdade, quer litigar com o ente personalizado. Assim, a legislação deveria autorizar expressamente que o juiz corrija a falha cometida e determine desde logo a citação da pessoa jurídica com capacidade para ser parte. Se o autor não aceitar a mudança, deve alegar seu inconformismo no primeiro momento em que falar nos autos; do contrário, ficará configurada a aceitação tácita.

            h) regulamentar mais claramente a participação do Ministério Público no processo civil, dispensando a sua atuação em feitos padronizados, inclusive mandados de segurança;

            Justificativa: infelizmente, muitos processos ainda são anulados por ausência de participação do Ministério Público nos casos em que é obrigatória a sua presença. Seria interessante que a legislação esclarecesse melhor em quais causas é obrigatória a participação do Ministério Público. No caso do mandado de segurança, grande parte dos feitos é padronizada. Não há, portanto, necessidade de participação do Ministério Público em cada caso. Basta que ele seja intimado da sentença e possa atuar no segundo grau.

            i) acabar os recursos contra decisões interlocutórias, salvo as concessivas de liminares e antecipações de tutela;

            Justificativa: a experiência da Justiça do Trabalho e dos Juizados Especiais tem mostrado que não se justifica permitir a impugnação de toda a qualquer decisão. Seria interessante, portanto, acabar com todos os recursos contra decisões interlocutória, salvo as concessivas de liminares e antecipações de tutela.

            j) prever expressamente a fungibilidade nas diversas modalidades de intervenção de terceiros;

            Justificativa: os institutos processuais de intervenção de terceiros trazem dificuldades de manejo e compreensão para todos os operadores do direito. Desse modo, para que as imposições da técnica não tornem o direito material "escravo" das formalidades processuais, seria interessante que a lei processual previsse expressamente a fungibilidade entre as diversas modalidades de intervenção de terceiros.

            k) acabar com a citação por edital;

            Justificativa: a citação por edital é inútil, trabalhosa e não cumpre a sua finalidade. Portanto, não há razão para existir.

            l) acabar com as formalidades exigidas para as procurações judiciais, dispensando expressamente, por exemplo, o reconhecimento da firma, salvo para o exercício dos poderes especiais, e o contrato social de pessoas jurídicas, salvo fundada dúvida acerca da regularidade da representação. As procurações dos incapazes também devem ser simplificadas, dispensando-se as formalidades da lei civil na hipótese de não haver prejuízo ao incapaz;

            Justificativa: vários processos "emperram" por problemas na procuração judicial. Processos já ficaram parados inúmeros meses ou até anos porque o juiz reputou irregular o fato de a procuração não conter o reconhecimento da firma do outorgante ou, no caso de pessoas jurídicas, a cópia do contrato social da empresa. Quanto ao reconhecimento de firma, o Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento de que "o art. 38, CPC, com a redação dada pela Lei 8.952/94, dispensa o reconhecimento de firma nas procurações empregadas nos autos do processo, tanto em relação aos poderes gerais para o foro (cláusula ad judicia), quanto em relação aos poderes especiais (et extra) previstos nesse dispositivo. Em outras palavras, a dispensa do reconhecimento de firma está autorizada por lei quando a procuração ad judicia et extra é utilizada em autos do processo judicial. A exigência ao advogado do reconhecimento da firma da parte por ele representada, em documento processual, quando, ao mesmo tempo, se lhe confia a própria assinatura nas suas manifestações sem exigência de autenticação, importa em prestigiar o formalismo em detrimento da presunção de veracidade que deve nortear a prática dos atos processuais e o comportamento dos que atuam em juízo. A dispensa da autenticação cartorária não apenas valoriza a atuação do advogado como também representa a presunção, relativa, de que os sujeitos do processo, notadamente os procuradores, não faltarão com os seus deveres funcionais, expressos no próprio Código de Processo Civil, e pelos quais respondem" (STJ, RESP 264228, Processo: 200000619582/SP, 4ª Turma, j. 5/10/2000, DJ 2/4/20001, p. 298, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira). Portanto, mesmo que a procuração contenha poderes especiais, não é necessário determinar o reconhecimento de firma. Em último caso, na hipótese de utilização dos poderes especiais, o magistrado pode exigir o reconhecimento de firma, desde que haja motivo para tanto. No que se refere ao contrato social das pessoas jurídicas, o entendimento deve ser semelhante, conforme já decidiu o STJ. Veja-se que toda vez que o magistrado pára o processo a fim de determinar que a parte regularize sua procuração, mesmo estando ela regular, são praticados inúmeros atos desnecessariamente (conclusão ao juiz, elaboração do despacho, remessa à secretaria, publicação, juntada de petição "regularizando" a representação e nova conclusão ao juiz).

            Com relação aos incapazes, o que se observa é um total desvirtuamento da necessidade da assistência ou da representação. Muitas vezes, o incapaz está lutando por um direito reconhecido constitucionalmente – por exemplo, o benefício assistencial -, mas seu pleito fica prejudicado por problemas formais na procuração. Seria interessante, portanto, que a legislação permitisse expressamente ao juiz suprir os defeitos de representação nos casos em que não houver qualquer prejuízo ao incapaz.

            m) acabar com os prazos favorecidos para a Fazenda Pública, em especial o prazo para contestar, já que o prazo de 60 dias é excessivo. O prazo seria de 15 dias, podendo o juiz aumentar esse prazo se a complexidade da causa o exigir;

            Justificativa: conforme já foi frisado, nada justifica que o prazo para a Fazenda Pública contestar a ação seja de 60 dias. Aliás, em feitos cautelares e em mandados de segurança, o prazo é bem mais exíguo, e mesmo assim a Fazenda Pública tem conseguido oferecer sua defesa a contento.

            n) deixar expresso que, nos processos unicamente de direito, tão logo seja apresentada a contestação poderá o juiz proferir a sentença;

            Justificativa: se o processo é unicamente de direito e o direito é indisponível (não há possibilidade de conciliação), o juiz deve julgar a causa tão logo seja apresentada a contestação. Não é necessário o famoso despacho "digam as partes se ainda há provas a produzir", já que se trata de discussão unicamente de direito. Mesmo assim, alguns tribunais têm anulado sentenças de juízes que, sem perguntar às partes se ainda há provas a produzir, proferem logo o julgamento. É importante, portanto, que fique expresso que a sentença pode ser proferida logo após a contestação nos feitos unicamente de direito, em que não há controvérsia fática a ser dirimida.

            o) dispensar o relatório das sentenças, em especial nos processos unicamente de direito;

            Justificativa: conforme defende o Juiz Federal Luís Praxedes da Silva Vieira, "o art. 458, do CPC estabeleceu os requisitos essenciais da sentença que são: a) o relatório, que conterá os nomes das partes, a suma do pedido e da resposta do réu, bem como o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo; b) os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito; e c) o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões, que as partes lhe submeterem. O relatório deverá ser o mais sucinto possível, contendo em breve parágrafos os principais pontos do processo. Nos Juizados Especiais (art. 38, da Lei 9.099/95) o relatório é dispensado. Acho que no processo civil comum, por modificação na lei, o relatório também poderia ser dispensado, partindo-se a sentença direto no fundamento e depois o dispositivo. Entendemos que a sentença não precisa compreender necessariamente um silogismo partindo do relatório".

            p) acabar com o processo cautelar autônomo nas hipóteses em que não há necessidade de instrução probatória diversa, de tal modo que a medida cautelar seria concedida nos próprios autos principais, como ocorre com a antecipação de tutela;

            Justificativa: não é lógica a existência de dois feitos (cautelar e ordinário) quando a matéria pode ser discutida, com vantagens, em uma só demanda. A duplicação de feitos acarreta uma série de inconvenientes, por exemplo: (a) dificuldade no manuseio dos dois autos, (b) consumo irracional e antiecológico de papel, (c) necessidade de elaboração de expedientes repetidos por parte dos servidores, (d) ocupação desnecessária de espaço nas estantes dos cartórios; (e) pagamento dobrado das custas processuais etc. Assim, deve-se permitir que os pedidos cautelares sejam requeridos nos próprios autos principais, especialmente se não houver necessidade de dilação probatória própria.

            q) regular a relação entre a suspensão de liminar/agravo de instrumento e a sentença, dando prevalência à sentença mesmo quando o agravo de instrumento ou a suspensão de liminar ainda estiver pendente de julgamento;

            Justificativa: é caótica a situação atual entre as decisões liminares de primeiro grau, as suspensões de liminares e os agravos de instrumento. O juiz concede a liminar (ou antecipação de tutela), o relator do Agravo ou o Presidente do Tribunal cassa a decisão e, posteriormente, é proferida sentença contrária à decisão do Tribunal. Ou então, o juiz nega a liminar (ou antecipação de tutela), mas o relator do Agravo a concede e, posteriormente, é proferida sentença contrária à decisão do Tribunal. É preciso, portanto, uma resposta legislativa a esses problemas institucionais entre os juízes e o Tribunal. Seria interessante que a solução legislativa contemplasse uma solução favorável ao juiz de primeiro grau, já que ele está, em regra, mais próximo aos problemas discutidos no processo.

            r) uniformizar ao máximo os prazos processuais, sobretudo os recursais;

            Justificativa: com a uniformização, simplifica-se o sistema recursal e facilita-se a vida dos advogados e operadores do direito de um modo geral.

            s) permitir a citação e intimação da União, dos Estados, dos Municípios e de suas entidades autárquicas e empresas públicas, que possuam serviço regular de busca de processo, através da simples vista dos autos;

            Justificativa: de acordo com o Juiz Federal Walter Nunes Júnior (8), essa medida desafoga bastante a secretaria, pois, ao invés de fazer o mandado, após o despacho do juiz, o servidor apenas abre vista do processo.  Como essas entidades possuem servidor com trânsito diário nas secretarias, isso desburocratiza a citação (confecção do mandado, distribuição ao oficial de justiça, entrega do mandado no órgão, certificação no mandado, devolução do mandado e, finalmente, sua juntada) e a agiliza o serviço forense.

            t) determinar expressamente que a petição inicial, nos casos em que há necessidade de dilação probatória, indique o rol de testemunhas, bem assim as provas documentais e, se for o caso, pericial, com a apresentação dos quesitos;

            Justificativa: segundo o Juiz Federal Walter Nunes Júnior, a idéia é a concentração de atos, a fim de simplificar o processo e, ademais, diminuir o trabalho da secretaria. No modelo atual, não é obrigatório que a petição inicial, desde logo, especifique as provas que o autor pretende produzir, o que finda emperrando o andamento do processo, uma vez que durante o seu curso é que ele indica as provas com as quais tem a intenção de comprovar o alegado.  Muito embora se tenha o cuidado de anexar à petição inicial os documentos, geralmente não é apresentado o rol de testemunhas, nem muito menos já se traz laudo pericial e os quesitos.

            u) estabelecer como requisito da inicial a quantificação do valor, quando isso não demandar provar fato novo;

            Justificativa: com isso, acabaria a tormentosa demora na liquidação do julgado, bem como seriam resolvidos problemas em torno da competência em razão do valor da causa.

            v) eliminar a obrigatoriedade do uso de toga nas audiências;

            Justificativa: embora a obrigatoriedade do uso de toga na audiência esteja prevista na LOMAN e não no Código de Processo Civil, é interessante que uma reforma da legislação processual que almeje a simplificação preveja a faculdade do uso desta indumentária.

            2.3. Mudanças visando à efetividade do processo

            Foi-se o dia em que a sentença judicial era o ato último do processo. Pelo menos no âmbito da Justiça Federal, a sentença é um dos primeiros atos. Após a sentença, ainda existe uma infinidade de recursos e, por fim, a tormentosa fase executória.

            A introdução do instituto da antecipação dos efeitos da tutela no sistema processual pátrio foi um grande avanço para a efetividade do processo. Porém, fez com que a decisão provisória sobre a antecipação dos efeitos da tutela seja mais importante do que a própria decisão final sobre o mérito da controvérsia.

            É preciso, portanto, redimensionar a importância da sentença, criando-se mecanismos de solução rápida e definitiva dos conflitos.

            Além disso, é necessário tornar mais efetiva a tutela jurisdicional contra a Fazenda Pública. A desobediência às ordens judiciais pelo Poder Público tem-se tornado praxe. Urge, pois, restaurar a força das decisões judiciais, sob pena de frustrar qualquer tentativa de efetividade do processo.

            Assim, apontam-se as seguintes sugestões para melhorar a efetividade do processo:

            a) criar um novo parágrafo ao art. 14 do CPC, possibilitando ao juiz aumentar a multa imposta pelo descumprimento da decisão, caso reste frustrada a primeira aplicação da multa com base no parágrafo antecedente;

            Justificativa: a Lei 10.358/2001 deu um grande avanço ao permitir a punição do responsável pelo descumprimento de decisões judiciais através de aplicação de multa. No entanto, a multa em apenas 20% sobre o valor da causa ainda é bastante tímida, sobretudo nos casos em que o valor é inestimado, como, por exemplo, os mandados de segurança. É preciso, portanto, permitir que o juiz aumente a multa se o valor fixado com base no parágrafo único do art. 14 do CPC for insuficiente para inibir o descumprimento.

            b) permitir expressamente a antecipação de tutela de ofício;

            Justificativa: em muitos casos, a antecipação da tutela de ofício torna-se não apenas útil como também fundamental. Seria interessante, portanto, que fosse excluída a expressão "a requerimento da parte" do art. 273 do CPC, para permitir que o juiz possa conceder a antecipação da tutela independentemente de requerimento, sobretudo nos casos de despreparo do advogado ou quando não há interesse, por parte do advogado, em que seja concedida a antecipação da tutela, em detrimento dos interesses do cliente.

            c) permitir a filtragem da apelação no juízo de primeiro grau, determinando que, quando a questão de mérito for unicamente de direito, não caberá apelação da sentença que estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente (no caso, o único recurso cabível seria o recurso extraordinário, tal como ocorre atualmente nos Juizados Especiais);

            Justificativa: a presente mudança seria uma espécie de súmula impeditiva de recurso. Se o juiz proferisse sentença de acordo com o entendimento firmado pelos tribunais superiores, não caberia apelação, mas apenas o recurso extraordinário.

            d) estimular a não-interposição de recurso, autorizando, por exemplo, que o juiz aplique dois valores de honorários sucumbenciais: um valor menor, se a parte sucumbente não recorrer da sentença, e outro valor maior, se houver recurso e este for improvido;

            Justificativa: o tempo de duração da causa é um dos fatores que o juiz deve levar em conta ao fixar os honorários de sucumbência (art. 20, §3o, c, do CPC). Logo, como a causa terá uma maior demora se interposto recurso, é justo que o juiz possa fixar uma sucumbência maior se a parte sucumbente apelar da sentença.

            e) permitir a tentativa de conciliação após a sentença;

            Justificativa: a sentença pode servir como um eficaz instrumento de barganha para facilitar a conciliação. Assim, por exemplo, nos pedidos de indenização por danos morais, caso não haja conciliação, o juiz proferiria a sentença, fixando o valor que arbitraria e, logo em seguida, conclamaria as partes para uma nova tentativa de conciliação. Assim, a conciliação deixaria de ser algo incerto, já que, antes da sentença, nenhuma das duas partes saberá de quanto será a condenação. Uma vez conhecido o valor, as partes poderão entrar em acordo mais facilmente.

            f) incentivar o cumprimento espontâneo das decisões, prevendo, por exemplo, que, se a parte cumprir espontaneamente a decisão, ficará isento de custas e honorários advocatícios;

            Justificativa: o incentivo ao cumprimento espontâneo das decisões pode ser também uma boa maneira de se agilizar o processo. Exemplo de estímulo ao cumprimento espontâneo das decisões ocorreu com a introdução da ação monitória. Nela, se a parte cumprir desde logo o mandado, ficará isento de custas e de honorários advocatícios (art. 1.102c, §1o, do CPC). A mesma medida poderia ser estendida aos demais casos.

            g) prever a prisão por descumprimento de decisão judicial;

            Justificativa: importante segmento da doutrina nacional tem defendido a possibilidade de se aplicar a prisão como medida coercitiva inominada, com fundamento no §5o, do art. 461, do CPC, nos casos em que outros meios não forem suficiente (nesse sentido, MARINONI, Luis Guilherme. Novas Linhas do Processo Civil, p. 87/88; GUERRA, Marcelo Lima. Execução Indireta, p. 242/246). Seria interessante que o Código de Processo Civil contemplasse expressamente essa hipótese, deixando à jurisprudência o papel de aferir-lhe a constitucionalidade.

            h) disciplinar o cumprimento de decisões judiciais proferidas contra a Fazenda Pública por terceiros, mediante a compensação fiscal dos gastos efetuados pelo particular;

            Justificativa: uma interessante forma de se obter a efetividade das decisões contra o poder público que impliquem em gastos públicos é permitir que o Judiciário autorize que particulares cumpram a obrigação de fazer, mediante a compensação fiscal dos custos efetuados pelo particular. Assim, por exemplo, o magistrado pode determinar que um hospital particular execute um determinado tratamento cirúrgico em um paciente coberto pelo SUS, autorizando que o hospital faça a compensação dos gastos efetuados no tratamento com tributos de responsabilidade do ente demandado.

            i) determinar, como regra, o recebimento dos recursos apenas no efeito devolutivo, ressalvando-se o efeito suspensivo apenas para hipóteses excepcionais;

            Justificativa: o cumprimento imediato das sentenças deve ser regra. Apenas em casos especiais, devem ser exigidas garantias para o imediato execução da sentença. Nesse sentido, assim defende MARINONI: "pretende-se transformar a ‘execução provisória’ da sentença em regra, dando-se ao juiz a possibilidade de, a partir de requerimento, atribuir à apelação, total ou parcialmente, o efeito suspensivo, para evitar lesão grave e de difícil reparação" (Questões do Novo Direito Processual Civil Brasileiro, p. 42).

            j) acabar com o duplo grau de jurisdição obrigatório;

            Justificativa: conforme defende o Juiz Federal Francisco Barros Dias, o duplo grau obrigatório é um "instituto criado em priscas eras, o qual não guarda similar nos ordenamentos jurídicos alienígenas e servia para dar guarida a um processo inquisitorial. Somente sob esse ângulo, já se pode constatar que a sua senilidade aliada a sua origem autoritária e unilateral do provecto processo das inquisições, seriam suficientes para extirpá-lo, por completo, de nosso ordenamento jurídico, o qual exige, nos dias atuais, um processo em que a bilateralidade da audiência é o seu ponto maior, e a celeridade e eficácia são exigências que a sociedade reclama da Justiça. O instituto deve ter servido muito bem a um período autoritário onde não existia a igualdade das partes. Hoje, não se compadece o instituto com os princípios da democracia, liberdade, celeridade, economia processual e o não privilégio de uma das partes. Pela forma como está redigido o artigo do Código, é fácil perceber que os seus incisos II e III servem apenas como meio de privilegiar a Fazenda Pública, como parte na relação jurídica processual, o que é um escárnio nos dias atuais. O inciso I só pode ser entendido como um resquício medieval em que os juízes de segundo grau conservavam a curiosidade em saber as razões ou os motivos da nulidade dos casamentos. Outra finalidade prática, infelizmente, não tem esse famigerado duplo grau obrigatório" (A Busca da Efetividade do Processo, p. 7/8).

            k) alterar o art. 515, §3o, do CPC, para permitir que o Tribunal julgue desde logo a lide não apenas nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito, mas também de sentença anulada por vícios verificados nesta ou no curso do procedimento, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento;

            Justificativa: de acordo com a Juíza Federal Joana Carolina Lins Pereira (9), "o legislador poderia ter ido mais longe, de modo a permitir o julgamento do mérito pelo tribunal não apenas quando cassar sentença terminativa, mas também nos casos em que anular a sentença (seja terminativa ou definitiva) por vícios verificados na mesma ou no curso do processo. Destarte, no § 3o do artigo 515, acrescentado pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001, onde se estabelece que, ´´Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento´´, poderia constar: ´´Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267) ou de sentença anulada por vícios verificados nesta ou no curso do procedimento, o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento´´". E mais "a menção, de um lado, aos casos de anulação da sentença e, de outro, aos casos de reforma da sentença meramente terminativa, não significa que não se possa classificar este último caso também como sendo de anulação do decisum. Nada obstante, a distinção faz-se necessária para fins de evitar dubiedade na interpretação da norma (poderiam alguns entender, por exemplo, que o tribunal somente estaria autorizado a examinar o mérito se a sentença anulada o tivesse julgado)".

            l) possibilitar expressamente a expedição imediata do precatório, assim que os embargos forem julgados improcedentes ou parcialmente procedentes, com a restrição de que o levantamento do dinheiro ficasse condicionado ao trânsito em julgado dos embargos;

            Justificativa: com essa medida, a execução das sentenças proferidas contra a Fazenda Pública seria agilizada, permitindo à parte o recebimento dos valores a que tem direito com mais rapidez.

            m) alterar a redação do art. 241, inc. III, do CPC, para permitir que possa o juiz determinar que sejam contados individualmente os prazos de resposta dos réus, para o fim de permitir celeridade processual ou outro fator relevante expressamente fundamentado e constante do ato de citação;

            Justificativa: de acordo com o Juiz Federal Euller de Almeida Silva Júnior (10), algumas vezes por causa de um réu (o último a ser citado) o complemento da citação comum poderá durar vários anos. A antecipação da resposta dos réus de fácil citação poderá ser útil,  para que o juiz possa ter condição de proceder ao desmembramento processual ou mesmo indefir a citação do réu ainda não citado por justa causa (ilegitimidade passiva ad causam ou outro fator relevante).

            n) revogar o artigo 15 da Lei 1.533/51, que prevê o prazo decadencial de 120 dias para a propositura do mandado de segurança;

            Justificativa: é pacífico o entendimento de que o prazo de 120 dias para a propositura do mandado de segurança não possui qualquer utilidade, a não ser dificultar a proteção de direito líquido e certo. É interessante, portanto, a revogação do dispositivo.

            o) criar o recurso "per saltum", permitindo que, em matérias unicamente de direito, o recurso "salte" um grau de jurisdição, ou até mais de um, caso pretenda o recorrente buscar diretamente no STF ou no STJ o respaldo da sua jurisprudência, para uma sentença a ela afeiçoada;

            Justificativa: de acordo com Carreira Alvim, "com isso, elimina-se, no mínimo, uma apelação, um recurso especial, um recurso extraordinário, e, eventualmente, dois agravos de instrumento; e, em conseqüência, toda uma carga de trabalho que pesa sobre os desembargadores (ou juízes), presidente e vice-presidente dos tribunais de origem, ministros do STJ, e ministros do STF, para que se alcance um objetivo que parece muito simples: manter a sentença como está, ou seja, de conformidade com a orientação dominante do STF. Na verdade – prossegue o jurista -, o recurso ‘per saltum’ não é uma especial modalidade de recurso, diverso dos tantos que povoam o universo jurídico-processual, senão uma especial modalidade de processamente de um recurso, que faz com que este recurso – a apelação, o agravo -, saltem um grau de jurisdição, que seria um obstáculo ao atingimento do seu objetivo, de buscar o apoio da jurisprudência dominante no tribunal superior" (Recurso "Per Saltum" – sugestão par a Justiça do Terceiro Milênio. Revista Direito Federal, n. 71, p. 191/199).

            2.4. Mudanças visando à moralidade do processo

            O princípio da boa-fé tem renascido em todos os campos do direito. Na área processual, também tem sido assim. Existe, na atualidade, uma preocupação em estimular a lealdade processual e em punir comportamentos de chicana processual, em que advogados utilizam-se de ardis torpes no intuito de obter vitória a qualquer custo.

            Algumas fraudes são cometidas através da manipulação da livre distribuição. É preciso impedir todas as formas de burla à livre distribuição.

            As sugestões visando à moralização do processo são, em síntese, as seguintes:

            a) facilitar a condenação do advogado por litigância de má-fé, permitindo a condenação por litigância de má-fé ao advogado independentemente da ação autônoma prevista no Estatuto da OAB;

            Justificativa: a punição de advogados por litigância de má-fé esbarra, muitas vezes, nas dificuldades impostas pelo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil. A referida Lei, por exemplo, exige ação própria para responsabilizar o advogado em caso de lide temerária. Veja-se que a grande maioria dos atos caracterizadores da litigância de má-fé são praticados sem o conhecimento dos clientes dos advogados. Na prática, é inviável a propositura da referida ação própria. O melhor seria a condenação nos próprios autos tão logo seja praticado o ato configurador da lide temerária. Urge, portanto, facilitar a condenação do advogado por litigância de má-fé, até porque o advogado é um "técnico habilitado e conhecedor do Direito pela presunção que o diploma lhe proporciona e pela aprovação no exame de ordem, tem o dever de atender e orientar o seu cliente de acordo com o que a lei efetivamente assegura e dentro dos parâmetros do seu código de ética, sendo que pode recusar o patrocínio se assim desejar" (11). Veja-se que o PL 6870/02, que altera a redação do parágrafo único do art. 14 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, excluindo todos os advogados, públicos e privados, da pena processual por causarem embaraço ao bom andamento da prestação jurisdicional, tendo em vista já estarem sujeitos às penalidades contidas no Estatuto da OAB, é em sentido totalmente contrário a essa sugestão, razão pela qual merece expresso repúdio por parte da Associação dos Juízes Federais do Brasil.

            b) tornar expresso que a simples semelhança de teses jurídicas não é suficiente para determinar a distribuição do processo por dependência ou prevenção;

            Justificativa: um dos meios mais comuns de se viciar a distribuição, escolhendo-se o juiz da causa, é indicar, no rosto da inicial, uma suposta prevenção existente com outro processo que tramita no cartório (Vara) do magistrado escolhido, dirigindo a petição inicial àquele juízo. É preciso que fique expresso que a simples coincidência entre teses jurídicas não tem não tem o condão de determinar a modificação da competência originária do processo. Se o mérito de uma lide consiste em uma questão de direito e esta é uma das questões que se apresentam na outra, isso não basta para alterar em relação a uma delas a competência; a esse efeito é necessário que as questões comuns se refiram ao mesmo título ou ao mesmo objeto (CARNELUTTI, Francesco. Instituições do Processo Civil. Vol. I, ed. Servanda, São Paulo, 1999, p. 296). A atual redação do art. 103 do CPC, ao falar que se reputam conexas duas ações quando lhes for comum o objeto ou a causa de pedir, pode dar margem a abusos.

            c) proibir expressamente a formação de litisconsórcio facultativo posterior à distribuição do feito;

            Justificativa: outra fraude à livre distribuição bastante utilizada é a admissão de litisconsórcio facultativo ativo em momento posterior à distribuição. Nesse caso, a aceitação do ingresso de outros litisconsortes fere a livre distribuição, pois as novas partes estarão escolhendo o juiz da causa, o que é vedado pelo nosso sistema processual. A Jurisprudência, aliás, já se manifestou nesse sentido (entre outros: STJ, RESP 24743/RJ, Corte Especial).

            d) melhorar a redação do art. 253 do CPC, determinando que a distribuição de ação idêntica a outra ação, mesmo já extinta por desistência ou por qualquer outra causa extintiva (p. ex. ausência de procuração ou cancelamento da distribuição por não pagamento das custas), deve ser feita ao juiz a quem foi distribuída a primeira, caso fique evidenciado o intuito de burla à livre distribuição, excluindo-se, na ação posterior, os litisconsortes facultativos estranhos ao feito originário;

            Justificativa: recentemente, foi publicada a Lei 10.358, de 27 de dezembro de 2001, que, entre outras mudanças, alterou o art. 253, do Código de Processo Civil, ora transcrito na parte em que interessa: "art. 253. Distribuir-se-ão por dependência as causas de qualquer natureza: I – omissis; II – quando, tendo havido desistência, o pedido for reiterado, mesmo que em litisconsórcio com outros autores". A mudança, sem dúvida, é salutar, pois deixa expresso que o primeiro juízo a quem a causa foi distribuída ficará sempre prevento para o seu julgamento, independentemente de haver proferido sentença homologatória da desistência, evitando, com isso, fraudes à livre distribuição que vinha ocorrendo em todas as grandes comarcas. Antes mesmo da alteração legislativa, os Tribunais pátrios, seja no exercício de seu poder regulamentar, seja no julgamento de casos concretos, vinham adotando a tese de que, ao verificar que a parte ajuizou ações sucessivas com o intuito de iludir a distribuição, o juiz (seja o distribuidor, seja o da causa), visando reprimir esse ato atentatório à dignidade da justiça, teria o poder-dever de reconhecer a prevenção em relação àquele juízo a quem primeiro foi distribuída a ação, mesmo que já existisse sentença homologatória de desistência. A alteração foi importante, mas a redação da lei não é a melhor, pois ainda é possível a existência de burlas à livre distribuição, inclusive utilizando a própria alteração legislativa. Por exemplo, um sujeito X ingressa com uma ação onde seria possível o litisconsórcio ativo facultativo; a ação é distribuída precisamente ao juízo que ele desejava; objetivando burlar a livre distribuição, a parte pediria a desistência da ação e, em seguida, ingressaria com uma nova ação com outros litisconsortes ativos; por força da nova redação do art. 253, do CPC, esta nova ação deveria ser distribuída por dependência ao juízo a quem foi distribuída a primeira ação; desse modo, os novos litisconsortes estariam "escolhendo" o juiz para a sua causa, o que configura burla ao juízo natural e à livre distribuição. Como se observa, a lei merece ser aplicada com bastante cautela para que não seja utilizada exatamente para proporcionar a burlar à livre distribuição, que ela própria almeja banir. Outro ponto omisso (ou falho) na nova redação diz respeito às ações extintas por outra causa diversa da desistência. Imagine-se a seguinte situação: a parte ajuíza várias ações, todas sem procuração e/ou sem pagamento das custas; se uma é distribuída ao juiz de sua ‘preferência’, o advogado não precisaria nem pleitear a desistência das demais, que serão extintas por falta de pressuposto processual, qual seja, a regularidade da representação ou terão suas distribuições canceladas por ausência de pagamento das custas. A nova redação do art. 253, do CPC, não deixa expresso que, nesses casos, a distribuição também deve ser feita por dependência.

            e) deixar expresso que os Juízes Distribuidores não deverão processar a distribuição da petição inicial de ação, ou de intervenção litisconsorcial, cujas partes não estejam jurisdicionadas às Seções Judiciárias dos Estados respectivos, se ficar configurado o intuito de burla ao juiz natural, permitindo ainda que, uma vez distribuída a ação, possa o juiz processante do feito decretar a incompetência de ofício;

            Justificativa: o Provimento nº 001, de 31 de janeiro de 2001, da Corregedoria Regional da 2a Região, estipula, em seu art. 126, que "os Juízes Distribuidores não processarão a distribuição da petição inicial de ação, ou de intervenção litisconsorcial, cujas partes não estejam jurisdicionadas às Seções Judiciárias dos Estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo". A regra é interessante, pois, caso perceba a tentativa de fraude à distribuição, o Juiz Distribuidor, mesmo sem estar investido em suas funções jurisdicionais, mesmo se se tratar de incompetência relativa, tem a obrigação (poder-dever) de impedi-la, sob pena de se tornar um mero carimbador de toga. O mesmo vale – e com mais razão – para o próprio juiz da causa. É absurdo considerar que o juiz não pode reconhecer de ofício casos de incompetência relativa, mesmo sendo patente a tentativa de burla ao juiz natural.

            f) permitir que o juiz declare de ofício a prescrição em favor da fazenda pública;

            Justificativa: a regra de indisponibilidade do patrimônio público exige que o juiz possa reconhecer de ofício, a favor da Fazenda Pública, a prescrição de direitos, ainda que patrimoniais. É preciso, portanto, modificar o §5o, do art. 219, do CPC, para reconhecer a possibilidade de o juiz conhecer, de ofício, da prescrição em favor da Fazenda Pública.

            g) prever um prazo para a validade das procurações judiciais para o exercício de poderes especiais;

            Justificativa: é preciso que as procurações judiciais tenham prazos de validade. Em alguns casos, os advogados se utilizam de procurações firmadas há vários anos para utilizar direitos especiais, como por exemplo, o levantamento de quantias. Como informa o Juiz Federal Alessandro Diaferia (12), "trata-se de um ponto que costuma gerar confusão entre advogados e juízes, por ser propiciador de fraudes, como o caso do segurado  do INSS que falece antes do fim do processo disso e o advogado deixa o feito correr por anos sem informar o Juízo, acumulando um valor de atrasados indevidamente. Com a exigência de procuração atualizada e/ou o levantamento feito diretamente pela parte, acho que esses problemas podem ser evitados".

            h) possibilitar o controle judicial do exercício dos poderes especiais das procurações;

            Justificativa: embora pareça óbvio que o juiz possa controlar o exercício dos poderes especiais contidos nas procurações, vários advogados têm conseguido nos Tribunais decisões a eles favoráveis no sentido de que o exercício de tais poderes é absoluto, não podendo o juiz restringir ou embaraçar esse exercício. Com isso, tem havido bastante fraude praticada por advogados, especialmente em feitos previdenciários. É interessante, pois, que a legislação autorize expressamente o controle do exercício dos poderes especiais se o juiz verificar a presença de indícios de fraude.

            2.5. Mudanças visando à democratização do processo

            O Código de Processo Civil de 1973 ainda guarda uma visão de processo estritamente individual. Conceitos como o de coisa julgada, interesse de agir, legitimação processual, ainda são marcados pelo individualismo.

            A intervenção de terceiros, por exemplo, dificulta bastante a ampliação do rol de participantes do desenrolar processual. O processo é tradicionalmente um ambiente fechado à participação popular. Somente as partes podem argumentar. O assistente deve demonstrar um interesse jurídico na causa para poder ser admitido como tal.

            Além disso, é preciso diminuir os riscos e os custos do processo.

            A onda democrática que cresce a cada dia exige um processo judicial mais aberto à participação popular. Nesse sentido, propõe-se as seguintes mudanças:

            a) prever a intervenção processual de "terceiros" que, a rigor, não teriam interesse jurídico, mas apenas de fato (por exemplo, associações de moradores, conselhos de classe, ONG´s etc), sobretudo em temas envolvendo matéria constitucional (amicus curiae);

            Justificativa: é fundamental ampliar ao máximo a possibilidade de participação dos diversos segmentos sociais interessados nos resultados do julgamento, a fim de legitimar e democratizar cada vez mais o processo. Embora tratando do controle concentrado de constitucionalidade, o Min. Celso de Mello, ao relatar a ADIn 2130/SC, compreendeu adequadamente a necessidade de se ampliar o rol de participantes do processo decisório, conforme se pode observar no seguinte trecho: "A admissão de terceiro, na condição de amicus curiae, no processo objetivo de controle normativo abstrato, qualifica-se como fator de legitimação social das decisões da Suprema Corte, enquanto Tribunal Constitucional, pois viabiliza, em obséquio ao postulado democrático, a abertura do processo de fiscalização concentrada de constitucionalidade, em ordem a permitir que nele se realize, sempre sob uma perspectiva eminentemente pluralística, a possibilidade de participação formal de entidades e de instituições que efetivamente representem os interesses gerais da coletividade ou que expressem os valores essenciais e relevantes de grupos, classes ou estratos sociais. Em suma: a regra inscrita no art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99 - que contém a base normativa legitimadora da intervenção processual do amicus curiae - tem por precípua finalidade pluralizar o debate constitucional". Ao longo de seu voto, o Ministro Celso de Mello argumenta que a pluralização do debate constitucional permitirá ao julgador dispor de todos os elementos informativos possíveis e necessários à resolução da controvérsia, garantindo, assim, uma maior efetividade e legitimidade à decisão, que será enriquecida pelos elementos e pelo acervo de experiências que os participantes do processo poderão fornecer.

            b) introduzir um novo inciso ao art. 927, que estabelece os requisitos específicos das ações possessórias, a serem atendidos pelo autor, para que seja exigido também que o autor prove o cumprimento da função social da propriedade;

            Justificativa: de acordo com o Juiz Federal Leonardo Resende Martins (13), trata-se de uma tentativa de densificar o princípio constitucional da função social da propriedade, projetando-o no específico âmbito das ações possessórias. Com efeito, dispõe a Constituição de 1988, em seu art. 5o, inc. XXII, que "é garantido o direito de propriedade" e, logo no inciso seguinte, que "a propriedade atenderá a sua função social". O Constituinte foi insistente, talvez por temer a inefetividade de tais dispositivos, e os repetiu no art. 170, inc. II e III, quando tratou dos princípios da ordem econômica. Ora, não é preciso empregar uma hermenêutica sofisticada para entender que "é garantido o direito de propriedade, desde que esta cumpra sua função social". Em outras palavras, não há proteção estatal alguma à suposta propriedade que não cumpra sua função social, que não vise a assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Assim, para auferir do Estado a tutela possessória, deve o autor comprovar, mesmo que sumariamente, que vem dando destinação sócio-ambiental ao bem que diz possuir. A introdução do novo dispositivo teria finalidade retórica, porquanto a exigência já poderia ser extraída de uma interpretação constitucional construtiva.

            c) tornar obrigatória a conciliação prévia nos casos de conflitos coletivos pela posse da terra urbana ou rural, com a participação do Poder Público, do Ministério Público, facultada a participação de entidades da sociedade civil;

            Justificativa: os conflitos envolvendo a posse da terra urbana ou rural exige do juiz a efetiva tentativa de buscar uma solução definitiva para o litígio. Portanto, é interessante prever uma obrigatória tentativa de conciliação antes de proceder a uma cômoda decisão formal sobre o caso.

            d) prever a possibilidade de concessão do benefício da justiça gratuita às pessoas jurídicas que demonstrarem, cabalmente, a insuficiência de recursos para as despesas do processo;

            Justificativa: o Superior Tribunal de Justiça já tem reconhecido que "pelo art. 5º, LXXIV, da CF/88, é de se estender à pessoa jurídica o benefício da justiça gratuita, ante a comprovação de que o titular da microempresa de minguados recursos, independentemente de ter ou não família, encontra-se em periclitante penúria, incapaz de arcar com os antecipados ônus processuais" (Precedentes citados: REsp 161.897-RS, DJ 10/8/1998, e REsp 70.469-RJ, DJ 16/6/1997. Resp 200.597-RJ, Rel. Min. Ruy Rosado, julgado em 18/5/1999). É necessário que a lei processual regulamente a matéria, até para que se evitem abusos.

            2.6. Mudanças visando à informatização do processo

            A informatização do processo é uma tendência inevitável e veloz. Rapidamente, o Judiciário começa a se acostumar com o peticionamento eletrônico, com o sistema push, com a audiência virtual, com o acompanhamento processual on-line ou via celular (WAP), com banco de dados superalimentados com jurisprudência, legislação e doutrina, com intimação por correio eletrônico, com diário da justiça virtual, com automação de rotinas, com digitalização dos autos etc.

            É óbvio que a legislação processual não está preparada para regulamentar esse novo processo que surge. São necessárias muitas mudanças contemplando a automação das rotinas e das decisões judiciais, a digitalização dos autos, a expansão do conceito espacial de jurisdição, a segurança e autenticidade dos dados processuais, os poderes "cibernéticos" dos juízes, a validade das provas digitais e por aí vai.

            Em 2002, houve um saudável debate entre a AJUFE – Associação dos Juízes Federais e a OAB no campo da informatização do processo.

            A AJUFE apresentou, através de parlamentar (Deputada Federal Luisa Erundina), projeto de lei tratando da informatização do processo judicial. Nesse projeto, consolidam-se, em nível legal, algumas iniciativas que já vinham sendo implementadas pelos tribunais, como, por exemplo, a validade da intimação do advogado pelo sistema push ou o peticionamento eletrônico mediante prévio credenciamento do advogado. Em síntese, prevê o referido projeto: (a) que o uso de meio eletrônico na comunicação dos atos processuais será permitido, considerando como data da publicação a da disponibilização dos dados no sistema eletrônico para consulta externa (diário oficial virtual), (b) que a transmissão eletrônica de peças processuais independe da apresentação dos documentos físicos "originais", (c) que intimação pessoal dos advogados poderá ser feita por correio eletrônico com aviso de recebimento eletrônico; (d) que as comunicações entre os órgãos judiciários será feita por meio eletrônico.

            Alguns setores da OAB manifestaram-se contra o projeto, apontando algumas falhas e possíveis inconstitucionalidades, e apresentaram sugestões no sentido de se adotar o sistema de assinatura digital, através do conceito de chaves públicas e privadas.

            O debate é interessante, mas as propostas não se anulam; pelo contrário, complementam-se.

            Em termos legislativos, o ideal é que a autorização para o uso de meios eletrônicos para a prática de atos processuais seja genérica, sem mencionar qualquer sistema, técnica ou método.

            Nesse sentido, em carta aberta sobre a regulamentação de procedimentos digitais, o IJURIS – Instituto Jurídico de Inteligência e Sistemas sugere que a lei processual apenas autorize a utilização de meios eletrônicos na prática de atos processuais e procedimentais e disponha sobre os requisitos mínimos de segurança no trânsito de documentos e informações.

            Desse modo, seria adotada, num momento inicial, a proposta da AJUFE, ou seja, o credenciamento, que já vem funcionando em diversos tribunais e, posteriormente, com a consolidação do sistema de chaves públicas e privadas, passaria a ser adotada a proposta da OAB. E se, posteriormente, viesse uma solução melhor, adotava-se essa solução sem precisar a toda hora estar mudando a lei.

            Portanto, em termos de informatização do processo, sugere-se o seguinte:

            a) autorizar a utilização de meios eletrônicos na prática de atos processuais e procedimentais, devendo a lei dispor sobre os requisitos mínimos de segurança no trânsito de documentos e informações;

            Justificativa: em relação ao aspecto virtual do processo, sugere-se a retomada do Projeto de Lei da Câmara nº 71, de 2002 ( nº 5.828/2001, na casa de origem), que dispõe sobre a informatização do processo judicial , já aprovado na Câmara dos Deputados e, atualmente, sob o crivo da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania no Senado Federal. No referido Projeto de Lei, são traçadas as linhas básicas da informatização do processo judicial, legitimando, inclusive, a prática de atos processuais virtuais, em todas as esferas do mundo jurídico (processo civil, processo penal, processo trabalhista, etc.). No momento, é importante tal legitimação inicial, a fim de ser extirpada toda e qualquer dúvida quanto à possibilidade e regularidade jurídica do processo virtual, sobretudo para a atuação dos Juizados Especiais Federais e para as Varas de Execuções Fiscais, que têm dado passos concretos rumo à informatização dos feitos judiciais ( uso de meio eletrônico nas comunicações de atos e transmissão de dados; certificação virtual e credenciamentos; envio e recebimento de petições, recursos e demais peças processuais; citações/intimações/notificações virtuais, etc.). Quanto às especificidades das Varas de Execuções Fiscais e dos Juizados Especiais Federais, e seus envolvimentos com a temática processual, recomenda-se a constituição de uma Comissão específica, uma vez que o trabalho virtual existente nas 1ª e 3ª Regiões ainda está incipiente e necessita de verificação técnica e de resultados. No âmbito da Primeira Região, por exemplo, somente a Seção Judiciária do Distrito Federal já tem um projeto piloto em execução há pouco mais de um mês.

            b) expandir o conceito espacial de jurisdição, permitindo que o juiz pratique determinados atos mesmo fora de sua jurisdição territorial (por exemplo, a ouvida de testemunhas em outros Estados ou mesmo outros países, através da vídeo-conferência);

            Justificativa: a internet é um ambiente sem fronteiras. Não possui limite territorial. Não possui espaço geograficamente delimitado. Por isso, o conceito processual de Jurisdição vai sofrer sérias modificações. Atualmente, o Código de Processo Civil informa que os atos processuais realizam-se de ordinário na sede do juízo (art. 176). Com a internet, inúmeros atos processuais serão realizados neste ambiente "digital", que não tem fronteira. Um juiz no Rio Grande do Sul poderá ouvir, pessoalmente, uma testemunha na Amazônia ou até mesmo em outro lugar do mundo. As regras de competência territorial e internacional deverão ser revistas. As relações jurídicas praticadas na internet não terão nacionalidade. Muitos problemas surgirão com essa expansão do conceito espacial de jurisdição, sobretudo se permanecer a mentalidade tradicional de espaço físico. É preciso, pois, que a legislação esteja atenta a essas mudanças.

            c) disciplinar as chamadas provas digitais, reconhecendo-lhes expressa validade;

            Justificativa: já são realizadas pela internet inúmeras transações, que vão desde o comércio eletrônico (e-commerce, e-business, e-banking etc.) até relações afetivas. Obviamente, essas transações possuem conseqüências jurídicas e freqüentemente acarretam conflitos. É vasta a influência da tecnologia da informação no campo probatório. Desde simples mensagens de e-mail até complexas fórmulas matemáticas certificadoras da autenticidade de documentos digitais tornam-se comuns nas discussões forenses.Já se aceitam como válidas as certidões negativas de débitos fornecidas, on-line, nas páginas dos órgãos públicos.O STJ reconhece como autêntica a cópia do inteiro teor dos acórdãos disponível na Revista Eletrônica de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (cf. STJ, RESP 327687/SP, 4a Turma, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 21/02/2002). Seria interessante que a legislação também previsse e regulamentasse a validade de tais provas.

            d) autorizar a prática automatizada de atos processuais, dispensando a assinatura de próprio punho em favor de outras formas de autenticação e identificação do signatário;

            Justificativa: os servidores "burocráticos" estão sendo substituídos, com vantagens, por sistemas inteligentes, capazes de dar impulso processual e elaborar os expedientes necessários com uma rapidez inigualável. O mecanismo de intimações pelo sistema push, onde o advogado é informado automaticamente de qualquer movimentação processual, é exemplo disso, pois não há necessidade de nenhum servidor para fazer funcionar o sistema, a não ser um especialista em informática que analisará eventuais problemas técnicos. A tendência, portanto, é automatizar boa parte do impulso processual, sobretudo a comunicação dos atos processuais. Veja-se que o Código de Processo Civil não contempla a hipótese de atos processuais praticados por máquinas. Além disso, o art. 164, do CPC, exige que os despachos, decisões, sentenças e acórdãos sejam redigidos, datados e assinados pelos juízes e que quando forem proferidos, verbalmente, o taquígrafo ou o datilógrafo os registrará, submetendo-os aos juízes para revisão e assinatura, o que impediria, em princípio, despachos automatizados.

            e) uniformizar, em nível nacional, as rotinas e as linguagens de informática utilizadas pelo Poder Judiciário, inclusive os endereços eletrônicos;

            Justificativa: atualmente, cada Tribunal tem autonomia para criar suas próprias "linguagens" de informática. É preciso a uniformização de rotinas e linguagens em âmbito nacional, sob pena de dificultar bastante o acesso às informações e serviços on-line. Especialmente no que se refere aos endereços de e-mail e da chamada Wide World Web (WWW), a situação atual é caótica.

            f) regulamentar os "poderes cibernéticos do juiz";

            Justificativa: atualmente, a autoridade judicial tem poderes que vão desde de penhorar um automóvel até autorizar escutas telefônicas e determinar quebras de sigilo bancário. Tradicionalmente, essas atividades são feitas mediante ofícios enviados pelo juiz. Com a tecnologia da informação, essas atividades serão realizadas diretamente pelo juiz, sem intermediários. Por exemplo, se o juiz determinar a penhora de um automóvel, ele próprio (ou um servidor a seu mando) irá efetuar o bloqueio do referido veículo de seu computador. Outros poderes, ainda mais assustadores, vão surgir. Com o Bacen Jud, que é um sistema de solicitação de informações via internet, o magistrado pode enviar ordens judiciais ao Sistema Financeiro Nacional com uma facilidade impressionante. Com isso, as quebras de sigilo bancário e os bloqueios de contas correntes de pessoas físicas e jurídicas poderão ser efetivados com alguns cliques. O juiz será uma espécie de hacker oficial, com poderes para invadir sistemas de computadores, interceptar mensagens eletrônicas e obter livre acesso aos mais sigilosos bancos de dados, compartilhando informações com órgãos como a Polícia Federal, a Interpol, a Receita Federal, o INSS etc. Sem uma regulamentação com base na chamada ciberética, haverá inúmeros abusos dos poderes cibernéticos do juiz.

            2.7. Mudanças no processo de execução

            A execução, sobretudo contra a Fazenda Pública, tem-se tornado o calcanhar de Aquiles do Judiciário brasileiro. É quase unânime a opinião de que a Lei 8.898, de 29/06/94, ao alterar a redação do art. 604, do CPC, eliminando a liquidação da sentença por cálculo do contador, piorou bastante a execução contra a Fazenda Pública, ao transferir a liquidação dos cálculos para os embargos à execução. Não há racionalidade em criar-se um novo processo (os embargos) para solucionar algo que pode, com vantagens, ser resolvido nos autos já formados (14).

            As execuções nos feitos coletivos também devem ser simplificadas. Não é razoável que cada pessoa favorecida com a sentença ingresse com uma execução autônoma. O mais racional, para todas as partes, é determinar que o réu da ação coletiva adote, administrativamente, as providências para o cumprimento da decisão, devendo o Judiciário apenas fiscalizar o seu cumprimento. Podem ser feitas, inclusive, audiências públicas para tentar melhor solucionar o problema.

            Desse modo, entre as propostas de melhora do processo de execução, citam-se:

            a) acabar com a ação de embargos à execução, permitindo que a discussão sobre cálculos de liquidação seja feita no próprio processo principal;

            Justificativa: é muito mais prático permitir que a discussão sobre o valor da execução seja feita nos próprios autos principais. Assim, ao invés de ser citado, o devedor seria intimado e, querendo, impugnaria a conta. O juiz decidiria através de decisão interlocutória agravável, prosseguindo-se a execução provisória (e pelo incontroverso) nos autos principais com o juiz de 1º grau (15).

            b) limitar a regra de impenhorabilidade de bens do devedor, inclusive o bem de família;

            Justificativa: para permitir uma maior efetividade do processo de execução é preciso estipular regras limitando a penhorabilidade de certos bens. Não é justo, por exemplo, que mansões sejam impenhoráveis apenas porque são bens de família. É preciso acabar com as brechas de que se valem os devedores para tornar o processo executivo ineficaz.

            c) regulamentar a execução de sentença em ações coletivas pelos substituídos;

            Justificativa: caso não seja viável a execução coletiva na via administrativa, seria interessante permitir que cada pessoa favorecida com a sentença coletiva ingressasse com execuções individuais, que seriam distribuídas paritariamente entre os juízes com a mesma competência territorial. Com isso, a execução nos feitos coletivos seria extremamente facilitada.

            2.7.1. A penhora administrativa e a execução fiscal

            O Projeto de Lei 608/1999 prevê a penhora administrativa para aperfeiçoar a cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública.

            A penhora administrativa seria executada pelas Procuradorias Fiscais ou da Fazenda Nacional da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas autarquias (art. 1º).

            Os artigos 3º e 5º tratam do processamento dessa nova forma de cobrança:

            "Art. 3º. Inscrito o crédito tributário ou não-tributário, a respectiva Procuradoria ou órgão jurídico competente notificará o devedor, para pagá-lo, no prazo de cinco dias, amigavelmente, sob pena de proceder à penhora de seus bens, tantos quantos bastem para garantia da dívida, na forma dos arts. 7º, IV, 8º, 9º, 10 e 11 da Lei n. 6.830, de 1980, no que couber.

            Parágrafo único. A penhora será realizada por servidor habilitado, na forma do regulamento.

            (...)

            Art. 5º. Realizada a penhora, o devedor poderá oferecer embargos, na forma da Lei 6830, de 1980, perante o Juiz competente para a execução judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública, o qual requisitará, de ofício, o processo administrativo em que se tiver efetivado a ordem de inscrição e a respectiva penhora administrativa".

            É inquestionável que a penhora administrativa, tal como prevista no referido projeto de lei, esvaziará bastante a importância das Varas de Execução Fiscal e, por essa razão, deve merecer atenção especial por parte dos juízes federais.

            Do ponto de vista institucional, é ponto pacífico que, ao invés de se cogitar a transferência de parte da execução fiscal para o Executivo, os juízes federais devem defender a ampliação do número de varas federais, bem como um maior aparelhamento das já existentes.

            2.8. Mudanças de mentalidade

            De nada adianta mudar as leis, se os juristas não estiverem conscientes de que o processo é apenas um instrumento para a realização da justiça e não um fim em si mesmo. A técnica é importante, mas não se confunde com formalismo estéril.

            Seria interessante uma mudança legislativa que já se firmasse como uma verdadeira transformação da mentalidade. Daí a importância de que sejam enunciados expressamente princípios voltados a orientar a mentalidade dos juristas. É necessário que o ordenamento, sobretudo no que se refere às leis processuais, seja menos "enclausurado", permitindo uma maior liberdade para os operadores do direito. Essa abertura somente os princípios podem oferecer, sobretudo em face do incremento da força jurídica que, hoje, se reconhece a essa categoria normativa.

            É inegável que a moderna teoria processual reconhece que princípios, como a efetividade, já estão positivados, embora implicitamente. Mesmo assim, a positivação expressa é importante, pois implicará em uma maior aceitação por parte dos operadores jurídicos, além de permitir o desenvolvimento de soluções processuais inteligentes pelos doutrinadores que poderão ser aplicadas imediatamente, independente de regulação legal. Daí, ser importante que se declare expressamente que o processo civil será pautado pelos princípios da efetividade, da simplicidade, da boa-fé, da celeridade, da racionalidade e da democratização processuais.

            Também é importante que fique expresso o papel processual do juiz. O magistrado, na condução do processo, deverá buscar o resultado prático equivalente, com o mínimo de atos processuais e com o menor gasto de tempo possível no intuito de otimizar o desempenho do processo. Afinal, foi-se o tempo em que o magistrado era apenas uma figura passiva sem qualquer iniciativa processual. Uma vez proposta a demanda, a inércia do juiz acaba, e ele passa a ser o responsável pelo impulso processual. É preciso reforçar o papel do magistrado na condução do processo, possibilitando o surgimento de um processo "inteligente", onde a criatividade do magistrado deverá suprir as deficiências materiais comumente presentes.


3. Conclusão

            O presente relatório apresentou as diversas sugestões oferecidas pelos juízes federais para a melhora do processo civil brasileiro, entre as quais destacamos as que objetivam racionalizar os chamados feitos "de massa", as que visam desestimular a interposição de recursos, sobretudo quando a decisão recorrida estiver de acordo com a jurisprudência remansosa dos tribunais superiores e do STF, a que propõe o fim do processo cautelar autônomo nos casos em que não há necessidade de instrução processual específica, a que permite o recurso "per saltum", a que pretende suprimir os "penduricalhos" processuais, permitindo que exceções e impugnações diversas sejam manejadas no corpo da própria contestação, as que visam a democratização do processo, com a ampliação do instituto da assistência, para admissão de quem dispuser de interesse não essencialmente jurídico e, finalmente, as que objetivam positivar e incentivar o processamento eletrônico de dados processuais

            Algumas propostas são inegavelmente polêmicas e não necessariamente refletem o ideal da magistratura federal como um todo. Outras propostas sequer necessitariam de mudança na lei para serem desde já adotadas. Há ainda algumas propostas que se excluem; outras que se complementam.

            O certo é que existe um sentimento geral de inconformismo. Os juízes federais não querem continuar sendo meros carimbadores de toga. O papel que a Constituição lhes conferiu é muito mais nobre.

            As soluções oferecidas, obviamente, não são definitivas. São apenas elementos para uma possível melhora das leis processuais civis. Espera-se que tenham alguma utilidade. Se pelo menos uma das dezenas de propostas for aproveitada, o trabalho não terá sido em vão.


Notas

            01. O Projeto de Lei n. 2.813/1997 oferece um tratamento bem interessante para esse tipo de causa, a despeito da má-redação e dos problemas de ordem processual que poderia suscitar, ao pretender acrescentar os seguintes parágrafos ao art. 262, do CPC: "§1º. Quando, por sentença transitada em julgado, o Poder Público Federal, Estadual ou Municipal for condenado a devolver quantias cobradas indevidamente, a decisão valerá para todos os que sofrerem desfalque em seu patrimônio, independentemente de ajuizamento de novas ações pelos interessados. §2º. Bastará aos interessados, de que trata o §1º, simples requerimento, com a prova do fato e cópia da sentença irrecorrível, ao órgão que procedeu à cobrança indevida para que este a devolva num prazo máximo de 90 dias".

            02. A referida sugestão foi enviada através da Lista da Ajufe, pelo correio eletrônico.

            03. Mensagem eletrônica enviada em 2 de abril de 2003.

            04. Mensagem enviada por correio eletrônico em 1o de abril de 2003.

            05. Mensagem enviada por correio eletrônico em 1o de abril de 2003.

            06. Mensagem enviada por correio eletrônico em 1o de abril de 2003.

            07. Para maiores informações sobre o serviço , vale visitar o site da Justiça Federal de Santa Catarina- http://www.jfsc.gov.br.

            08. Mensagem eletrônica enviada em 1o de abril de 2003.

            09. Mensagem enviada através de correio eletrônico em 9 de março de 2003.

            10. Mensagem eletrônica enviada em 17 de março de 2003.

            11. Mensagem enviada pelo Juiz Federal Alessandro Diaferia em 3 de abril de 2002.

            12. Mensagem eletrônica enviada em 3 de abril de 2003.

            13. Mensagem eletrônica enviada em 3 de abril de 2003.

            14. O Projeto de Lei 765/1999 pretende retornar à sistemática anterior nas execuções contra a Fazenda Pública: "art. 604. (...) § 1º. As disposições do caput não se aplicam às execuções movidas contra a Fazenda Pública, que continuam a ser processadas por simples cálculo do contador judicial. §2º. Fica ressalvado ao exeqüente o direito de apresentar o demonstrativo do cálculo, sujeita à conferência do contador".

            15. Sugestão enviada pela Juíza Federal Simone Schreiber, através de mensagem eletrônica (1º de abril de 2003).



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, George Marmelstein; FONSECA, Reynaldo Soares da et al. Elementos para reforma do Código de Processo Civil. Sugestões dos juízes federais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 186, 8 jan. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4664. Acesso em: 29 mar. 2024.