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Resilição unilateral nos contratos de distribuição

Resilição unilateral nos contratos de distribuição

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A intensa evolução da prática mercantil tornou a atividade de distribuição de mercadorias instrumento de grande importância para estabelecimento das relações comerciais, aperfeiçoando o elo de ligação entre a produção de bens e serviços e o público consumidor.

sumÁrio: INTRODUÇÃO ; CAPÍTULO I, AUTONOMIA PRIVADA E A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS CONTRATOS, 2.I Liberalismo clássico: substrato do direito privado, 2.II Século XX: a industrialização e o Estado paternalista, 2.III Autonomia da vontade e a concepção clássica de contrato, 2.IV A moderna abordagem contratual; CAPÍTULO II -CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO, 3.I Terminologia adotada, 3.II Natureza jurídica, 3.III Classificação, 3.IV Características, 3.IV.a Direção técnica do concedente, 3.IV.b Subordinação econômica, 3.IV.c Exclusividade, 3.IV.d Duração do contrato, 3.V Formas de extinção, 3.VI Legislação aplicável, 3.VI.a Código Civil de 2.002, 3.VII Função social do contrato de distribuição; CAPÍTULO III- RESILIÇÃO UNILATERAL NOS CONTRATOS DE DISTRIBUIÇÃO,4.I Considerações gerais, 4.II Qualificação jurídica do instituto, 4.III Juridicidade do exercício da denúncia; CONCLUSÃO; REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


1 INTRODUÇÃO

As profundas modificações observadas na sociedade civil no século XX, essencialmente no que tange àquelas implicadas à economia de mercado pelo incremento industrial e tecnológico, aliadas às duas grandes guerras, tornaram mais complexas as relações jurídicas travadas entre os homens.

Paralelamente à estas transformações, no campo do Direito, a autonomia privada, antes predominante em tais relações, é atenuada pela ingerência do Estado, que passa a disciplinar as matérias de Direito privado, buscando sobrepor a vontade geral da sociedade sobre os interesses particulares.

No campo do direito contratual, essa mudança é sentida com o advento da formulação jurídica que culminou no dogma da função social do contrato, segundo o qual, a relação jurídica contratual deve atender aos anseios da sociedade como um todo, em detrimento da vontade manifestada pelos agentes privados.

A intensa evolução da prática mercantil em escala mundial tornou a atividade de distribuição de mercadorias instrumento de grande importância para estabelecimento das relações comerciais, aperfeiçoando o elo de ligação entre a produção de bens e serviços e o público consumidor.

Neste contrato de colaboração, para que a atividade empresarial acompanhe os parâmetros impostos pela globalização do mercado, é exigida a reunião dos interesses dos contratantes para atingir a finalidade proposta.

Tratando-se daqueles negócios em que o proponente pretende alcançar cada vez maior porção do mercado consumista, a distribuição deve ser consubstanciada em uma relação negocial envolvendo a associação cooperativa de interesses, devendo dispor o produtor de uma rede organizada de distribuidores, estabelecendo estratégias de vendas e planejamento de atividades.

Uma vez que ordena o implemento de uma organização comercial, exigindo investimentos de vulto bastante significativo, as relações comerciais de distribuição tendem a se estender em um intervalo razoavelmente estendido no tempo. Porém, pelas características do direito obrigacional moderno, os negócios jurídicos têm o seu término previsto de maneira implícita, não sendo admitida a vinculação eterna entre os sujeitos de direito.

Ultrapassados os relevantes aspectos históricos que influenciam de maneira direta a atual abordagem da matéria, o presente estudo tem como objeto a análise das formas e modalidades pelas quais esta relação empresarial tende a se findar, especialmente quanto à possibilidade conferida a um dos contratantes em ter por findo o pacto de distribuição.


2 AUTONOMIA PRIVADA E A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS CONTRATOS

2.I LIBERALISMO CLÁSSICO: SUBSTRATO DO DIREITO PRIVADO

O estudo do princípio da autonomia da vontade no presente trabalho demonstra-se de fundamental importância, principalmente em razão da mutação que vem sofrendo no transcorrer do tempo. As transformações econômicas e sociais ocorridas na primeira metade do século XX e conseqüente repercussão no mundo jurídico, ensejam o estudo aprofundado deste princípio, visto apresentar-se como eixo central da discussão das fontes do direito obrigacional.

Seguindo as concepções liberais do século XIX, fundadas no princípio da autonomia da vontade, foram emergindo a maioria das codificações ocidentais, embora o Direito romano e o Direito medieval não adotassem a teoria voluntarista, que via na manifestação da vontade o elemento formador das relações jurídicas. Isto porque, conforme se referia Ulpiano, a lei romana era atribuída à determinada ordem racional, à vontade do príncipe, considerada não como arbitrária, mas como subordinada à razão. Aristóteles, por seu lado, afirmava haver uma associação entre o justo natural e o justo legal, produto da vontade do homem.

Portanto, as construções greco-romana e medieval constituem doutrinas dualistas onde o Direito é produto ora da razão e da vontade, ora da natureza e da vontade, ocupando esta apenas uma posição subsidiária e subordinada.

Verifica-se, então, que o marco inicial para a afirmação e evolução do conceito de autonomia da vontade está na escolástica franciscana do século XIV, quando foi proclamada a supremacia da vontade e sua aptidão para conduzir de maneira mais eficaz do que a razão, as relações interpessoais, rebatendo a soberania do chefe de Estado, o direito natural e o direito de propriedade privada, considerados dogmas históricos arbitrários, jamais fundados no racionalismo, prevalecendo, desta forma, o consentimento do indivíduo na fruição de sua reconhecida liberdade, ressaltando-se o acordo de vontades como única origem das regras de Direito.

Esta concepção voluntarista da formação dos contratos, veio a se firmar, no entanto, somente com o advento do Código de Napoleão, em 1804, principalmente pelas influências dos filósofos individualistas Rousseau, Kant e Fichte.

Aliados a Hobbes, tido como um dos principais defensores do voluntarismo jurídico, estes filósofos introduziram à sociedade o que serviria como pilar do constitucionalismo moderno, colocando a razão à serviço da vontade individual, encontrando o Direito Público sua fonte primeira na intenção: o Estado é produto do contrato. Daí decorre que a lei seria definida como a expressão da vontade geral e será interpretada de acordo com a vontade do legislador.

E este dogma, no campo do Direito Privado, constituiu a base de toda construção legislativa, doutrinária e jurisprudencial até o final do século XIX, trazendo o Code Napoléon a homenagem dos codificadores à liberdade individual do homem criadora de Direito.

O pensamento voluntarista da época pode ser sintetizado, nas palavras de GOUNOT, nestes termos: "na base do edifício social e jurídico se encontra o indivíduo, quer dizer, uma vontade livre. A liberdade faz do ser humano seu próprio mestre, o torna infinitamente respeitável e sagrado, o eleva à dignidade de fim em si mesmo. No sentido mais geral da palavra, o direito não é outra coisa senão esta liberdade inicial e soberana que pertence a todo homem. Da vontade livre tudo procede, a ele tudo converge".

A tendência individualista, em oposição à tradição romana e romanística medieval, se consolidou pela idéia de liberdade e igualdade, segundo as quais os homens não podem se ligar senão voluntariamente.

Ao estabelecermos uma relação entre a evolução dos conceitos de autonomia de vontade, autonomia privada e liberdade contratual, será possível encontrar em comum determinado espaço temporal compreendido na transição entre os sistemas feudalista e capitalista.

Neste sentido, estes se prestaram nesta época de mudanças para garantir a proteção da situação econômico-social emergente do liberalismo político e econômico, aliado à livre-concorrência da economia de mercado.

O período de transição dos referidos sistemas políticos se caracterizou principalmente pela "disputa" entre a classe que pode ser chamada de mercantilista, interessada na utilização dos recursos provenientes da agricultura, e a classe fundiária, detentora dos recursos utilizados para a produção agrária.

Neste panorama surgiu a necessidade de introduzir um elemento que viesse a equilibrar a equação jurídica envolvendo estas classes sociais, tendo como referência o consensualismo como produtor do vínculo jurídico, que, de um lado favorecia a classe mercantil na relação com os proprietários, e ainda, garantia o direito de propriedade destes em face de eventuais tentativas de usurpação.

O liberalismo introduzido pelos dogmas "liberdade, igualdade e fraternidade" da Revolução Francesa, tinha para o campo do direito obrigacional em sua essência a necessidade de se estabelecerem relações jurídicas (possibilidade de contratar), no intuito de fazer circular riquezas.

E isto se tornou válido, como foi visto, por meio da evolução da figura do sujeito de direito, aliada às novas perspectivas na abordagem da autonomia da vontade, autonomia privada e autonomia contratual.

O elemento volitivo, como fator de eficácia jurídica e criação de relações jurídicas, deve estar revestido da forma estabelecida pelo sistema normativo, dividindo a doutrina neste aspecto em duas grandes vertentes: aquela que considerava a vontade como elemento essencial do direito subjetivo e a outra que o tinha no objeto, ou seja, no interesse protegido.

De qualquer maneira, a possibilidade ou faculdade de que dispõe o indivíduo para atuar de acordo com a sua vontade, fundamentalmente para as relações que importem para o direito, pode ser chamada de liberdade jurídica.

No âmbito desta liberdade, ou seja, na criação, modificação, extinção de direitos, ou no poder de regular juridicamente estas relações, dando-lhes conteúdo e eficácia reconhecida e determinada pelo Direito, encontra-se a autonomia, vocábulo grego que significa "dar leis a si mesmo".

Segundo Norberto BOBBIO, a autonomia da vontade pode ser entendida como "outra fonte de normas de um ordenamento jurídico, o poder atribuído aos particulares de regular, mediante atos voluntários, os próprios interesses: trata-se do chamado poder de negociação". Complementa ainda dizendo que "se se coloca em destaque a autonomia privada, entendida como capacidade dos particulares de dar normas a si próprios numa certa esfera de interesses, e se considerarmos os particulares como constituintes de um ordenamento jurídico menor, absorvido pelo ordenamento jurídico estatal, essa vasta fonte de normas jurídicas é concebida de preferência como produtora independente de regras de conduta, que são aceitas pelo Estado".

Deve ser ressaltada ainda, pela pertinência relacionada à matéria em estudo, no campo da autonomia da vontade, a liberdade contratual, consubstanciada na sistemática da livre concorrência da economia de mercado, sendo princípio fundamental do Direito Civil e do Direito Comercial.

A liberdade contratual pode ser dividida na conhecida trilogia adotada modernamente, relacionada à autonomia do indivíduo de decidir-se a realizar o contrato, de escolher o outro contratante e de escolher a figura tecnicamente, o tipo de contrato.

Pode-se se dizer, portanto, que, em conseqüência das profundas mudanças observadas até o final do século XIX, no que pertine ao Direito positivo brasileiro, adotando as concepções liberais, especialmente quanto ao princípio da autonomia da vontade, a liberdade contratual encontra-se fundada na garantia da liberdade de iniciativa econômica, no princípio da força obrigatória dos contratos, e se refletem ainda no campo sucessório, onde há liberdade de testar e de estabelecer o conteúdo do testamento, sempre em conformidade à prevalência da vontade do indivíduo nas relações interpessoais.

2.II SÉCULO XX – A INDUSTRIALIZAÇÃO E O ESTADO PATERNALISTA

O advento do novo século apresentou não menos relevantes transformações na sociedade civil, notadamente causadas pela modificações na economia, em decorrência do incremento industrial e tecnológico, aliado às duas grandes guerras, tornando mais complexas e cada vez mais específicas as relações no campo jurídico.

A mais significante característica deste período, e observada a partir da segunda parte do século XX, é a presença do Estado a disciplinar matérias de Direito privado, por meio de normas cogentes, imperativas, com sensível superação do individualismo soberano do século anterior.

Ao contrário do que fora observado nas Constituições francesas de 1791 e 1793, as quais limitavam-se a assegurar os direitos políticos do homem, a partir de 1848 surgem novas pretensões que posteriormente se apresentariam sob a forma de direitos econômicos e sociais, contando a partir de então com proteção do Estado.

Passam a ser resguardados de maneira imperante os interesses gerais em detrimento dos particulares, tratando as regras constitucionais não apenas das relações de Direito Público, mas também daquelas de Direito Privado.

Os pilares fundamentais da ordem jurídica até então absolutos e inabaláveis, a propriedade, a família e o contrato, são implicados por limitações do poder estatal.

Em síntese, sobreveio moderada substituição da unidade interna do Direito privado pelo direito social e econômico surgido a partir da 2ª Guerra Mundial.

A intervenção estatal passou a ser considerada como a melhor técnica de combate às idéias socialistas, o que foi largamente observado no governo provisório francês de 1848, no socialismo de estado alemão, e ainda, na Constituição mexicana, pela restrição à propriedade privada. A grande maioria das constituições posteriores à Guerra de 1914 passaram a ser influenciadas por estes princípios, sendo notados nos Estados Unidos com o New Deal de Roosevelt, e na França, como o Front Populaire, buscando aumentar a intervenção estatal na vida econômica e social do país.

No entanto, isto não implicou na admissão da completa limitação da autonomia da vontade, mas sim, no seu enriquecimento pela regulação por meio da ingerência Estatal no sentido de proteger determinados interesses, nos quais o aspecto volitivo não apresenta a relevância outrora conferida.

No Brasil, as Constituições de 1934, 1946, 1967, 1969 e 1988 contêm referências especiais à função do Estado na ordem econômica e social, fixando os princípios básicos da legislação trabalhista e adotando uma política nacionalista no tocante às minas, à energia hidráulica e aos bancos.

Especialmente na Constituição da República Federativa do Brasil de 1.988 foi reconhecido expressamente o princípio da liberdade da iniciativa econômica e da dignidade da pessoa humana, garantindo a liberdade de desenvolvimento econômico. Exemplo nacional que pode da mesma maneira caracterizar esta mudança é o Código de Defesa e Proteção do Consumidor - Lei nº 8.078, de 11.09.1990, editado sob a égide da Constituição Federal de 1988, rompendo com o pensamento individualista da concepção liberal clássica, apresentada pelo Código Civil.

Esta utópica harmonia entre a vontade geral e a individual é atualmente perseguida pelo Direito, sendo objeto do presente estudo a abordagem jurídica do princípio da autonomia da vontade face à moderna acepção da teoria contratual.

No período observado após a segunda Guerra Mundial (1939-1945), o intervencionismo alcançou os últimos redutos do liberalismo clássico, sendo na Inglaterra iniciada a nacionalização; na Espanha e Argentina a tentativa de integrar no sistema estatal às grandes forças econômicas nacionais; e ainda a crescente socialização dos países balcânicos.

Nos Estados Unidos, notou-se a pretensão de intensificar a legislação trabalhista, aumentar o controle da economia nacional e das medidas contra os trusts e monopólios, revogando a legislação restritiva da liberdade sindical, através do Fair Deal de Truman. Os franceses recorreram a nacionalização da indústria e do comércio pela criação de sociedades de economia mista e empresas públicas.

O liberalismo econômico passou a ceder espaço à conciliação entre o liberalismo político e o dirigismo econômico, perseguindo a planificação da economia e o equacionamento dos problemas nacionais.

Aumentando cada vez mais a sua interferência na esfera privada, o Estado, na busca de maiores recursos a fim de atender aos interesses nacionais tais como a proteção da moeda, a defesa do plano econômico e a necessidade de impedir o aparecimento de interesses privados que pudessem entrar em conflito com o interesse público, fez emergir o contrato publicizado, ou contrato "dirigido", bem como os contratos de adesão e evolutivo.

Estas medidas tomadas pelo poder público visavam inicialmente estabelecer a supremacia da democracia sobre o monopólio econômico.

Trata-se da pretensa conjugação dos princípios da democracia política com as aspirações sociais, a concentração econômica e o desenvolvimento tecnológico, contando necessariamente com o entendimento entre a iniciativa privada e a administração, perseguindo a democracia tanto no plano econômico, como político, garantindo os interesses individuais e sociais no desenvolvimento da nação.

No cenário nacional, a intervenção estatal se deu a partir de 1930, pela criação de autarquias, empresas públicas, fundações e sociedades de economia mista, atuando nos setores mais variados desde a previdência social até as instituições bancárias, abrangendo a atuação dos órgãos públicos na indústria, geração de energia, organização da produção, contratos de seguros, mercado de capitais, na área habitacional e desenvolvimento de regiões.

Atualmente, em sentido inverso às anteriores pretensões do Estado paternalista, vem sido consolidado no mundo inteiro a partir de 1980, um movimento de privatização da economia, estabelecendo uma nova posição do Estado, restringida à atuação nos setores em que não pode ser admitida constitucionalmente a participação de entes privados no seu comando, aspecto observado em razão da chamada hipertrofia das funções do Estado, ensejando a transferência e delegação de poderes a fim de evitar um possível colapso econômico.

2.III AUTONOMIA DA VONTADE E A CONCEPÇÃO CLÁSSICA DO CONTRATO

Remonta aos primórdios do Direito romano a noção de contrato como instituto jurídico, tendo o contractus a conotação objetiva de instrumento utilizado para designar os acordos reconhecidos como obrigatórios e providos de actio, distintos de outros acordos não obrigatórios nomeados de pacta.

Assim, era entendido como um vínculo objetivo, servindo para designar as conseqüências do acordo, ou seja, a vinculação dele decorrente, e não como manifestação de duas vontades convergentes.

No Código Civil Napoleônico, foram reguladas as condições essenciais à sua validade, conferindo força de lei às convenções pela consagração do princípio pacta sunt servanda, originado na canonística medieval.

Na segunda metade do século XIX, surgiram as primeiras criações doutrinárias no desenvolvimento da teoria do negócio jurídico, concebido como exteriorização da vontade dos particulares, visando um resultado prático reconhecido pelo ordenamento jurídico.

Desta forma, a abordagem mais ampla do dogma da vontade se expressava através do então negócio jurídico, caracterizado por uma declaração de vontade dirigida à produção de efeitos jurídicos. Desta categoria abstrata e generalizada emergiria o contrato propriamente dito.

Em seu caráter subjetivo, o negócio jurídico tem em estima a importância da vontade humana, sendo ela por si mesma a própria lei, criando uma obrigação própria, ou seja, se um determinado sujeito se encontra obrigado por um ato jurídico manifestado livremente, é porque em momento determinado exarou sua vontade individual de assim fazê-lo.

Importante salientar, entretanto, que este vínculo criado pelo próprio sujeito encontra sua validade ligada diretamente à capacidade jurídica, do exercício do direito, a ele próprio inerente.

Este entendimento decorre da filosofia jurídica emergente nos séculos XVIII e XIX, tendo como sua essência o indivíduo capaz de manifestar a sua vontade, detentor do poder criativo na esfera da autonomia privada, conferindo o ordenamento jurídico os efeitos relacionados aos atos por ele externados ao mundo dos fatos no sentido da criação, modificação e extinção de direitos e obrigações.

Críticas eram dirigidas a esta concepção no sentido de que, em razão de vontade não exteriorizada pelo agente, jamais conhecida pelo outro contratante, poderia ser anulado determinado negócio jurídico na proteção daquela vontade, conferindo conseqüentemente instabilidade ao desenvolvimento do comércio.

Por este prisma, surgiu, na segunda metade do século XIX, a Teoria da Declaração, podendo ser vista como o marco na tentativa de desconstituição das teorias individualistas e subjetivas até então predominantes.

Segundo os defensores da chamada Erklärungstheorie, tendo LIEBE desenvolvido suas primeiras considerações, a declaração deve ser sobreposta à vontade, uma vez que o efeito criador de direitos e obrigações não teria sido atribuído à vontade, mas unicamente à ordem jurídica positiva. Assim, não seria a vontade interna a formadora do elemento constitutivo do ato jurídico, mas sim a declaração de vontade.

Nesta vertente, a vontade seria apenas uma causa do negócio jurídico, e não elemento, pois ainda que existam defeitos na sua formação, constitui mera circunstância relacionada ao modo como o negócio jurídico se desenvolveu e somente em razão de pressupostos especiais pode prejudicar a validade do pacto.

O Código Civil alemão buscou uma posição intermediária entre a prevalência da vontade ou da declaração, cominando aos casos considerados como de erro substancial, a anulabilidade, mas não a nulidade como assim seria considerado de acordo com a teoria clássica da vontade.

No Brasil, adotou-se ora a teoria subjetivista, ora a objetivista, conforme podemos constatar no artigo 85 do Código Civil de 1.916, como exemplo, dispondo que "nas declarações de vontade se atenderá mais a sua intenção que ao sentido literal da linguagem". No entanto, seguindo a posição tomada no BGB, comina serem anuláveis as declarações de vontade emanadas de erro substancial, no artigo 86 daquele diploma.

2.IV A MODERNA ABORDAGEM CONTRATUAL

Atualmente, a interpretação do contrato como instrumento representativo de interesses antagônicos vem deixando de ser adotada pela doutrina e jurisprudência como axioma jurídico, vindo à tona a sua concepção caracterizada pela afinidade de pretensões, observando-se a existência do affectio contractus.

Outrora entendidos como adversários, os contratantes passaram a ser caracterizados como parceiros pretendendo uma relação mútua, equilibrada e igualitária, tendo como horizonte a realização de justiça social. A doutrina francesa, já no início do século, já desenvolvia o pensamento moderno no sentido de que os contratos serviam como instrumento de cooperação leal, obra de confiança mútua, amparada nas bases do direito administrativo, na busca de equilíbrio e colaboração entre os contratantes.

Esta nova noção da relação contratual tem em vista a moderna acepção da preponderância do consenso formado pelas partes sobre a vontade individual, sendo vedado a qualquer um deles, obter vantagem extravagante no que diz respeito ao que se fazia aceitável no momento da celebração do pacto, bem como na execução de suas disposições.

Na já estudada teoria clássica dos contratos, às partes era conferida a garantia de imutabilidade das prestações convencionadas e a sobrevivência da convenção diante de fatos imprevistos, mesmo quando alteravam substancialmente a equação contratual.

Entretanto, a sua moderna abordagem tornou mais flexível a sua interpretação em face de eventuais desproporções observadas durante o seu cumprimento, estimando pelo interesse social e o interesse comum dos contratantes.

Assim, as intenções das partes antes divergentes no intuito da obtenção da vantagem contratual, agora convergem na direção da manutenção da sobrevivência de um bem maior, caracterizado pela construção de direitos e obrigações que é o novo contrato, ainda que isto implique no sacrifício de determinada vantagem, superando a vontade individual.

Por este prisma, admite-se a anulação do contrato por lesão, a sua resolução ou a sua revisão em virtude da excessiva onerosidade, a cessão do contrato e a assunção da posição contratual, a oponibilidade das cláusulas contratuais a terceiros não contratantes, a relação que se estabelece em contratos conexos e subordinados uns aos outros, inclusive com a eventual substituição de cláusula.

As modificações ora verificadas emergiram da interpretação jurisprudencial e do trabalho doutrinário pela extensão do princípio da boa-fé e pelas obrigações implícitas de leal execução do contrato, significando um dever, imposto às partes, de encontrar uma solução para eventuais impasses que possam surgir. Do mesmo modo influenciaram a nova teoria contratual as normas extravagantes e leis de emergência, e ainda, o surgimento de certos ramos mais recentes da ciência jurídica, como o direito do consumidor.


3 CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO

3.I TERMINOLOGIA ADOTADA

A nomenclatura utilizada para o tratamento da relação jurídica empresarial estudada é matéria enfrentada de maneira controversa, causando, não raramente, significativa confusão na abordagem do instituto pelos tribunais.

Neste passo, as expressões usualmente adotadas são "contrato de distribuição", "concessão comercial", "concessão mercantil" e "concessão de venda", normalmente utilizadas para designar a mesma figura contratual.

Embora parte da doutrina entenda pela distinção entre estas espécies, não há razão para formulação de teorias que servem tão somente para confundir a abordagem do tema, tal como assevera Fabio Ulhoa COELHO, para quem "o importante, por certo, é atentar para as nuanças da proposição conceitual de cada autor, de modo a se evitarem discussões estéreis".

Ressalvada a espécie de contrato de concessão comercial de veículos automotores, regulado pela Lei 6.729/79, as demais hipóteses de distribuição comercial não merecem diferenciações quanto ao seu tratamento terminológico, razão pela qual o presente estudo cuidará da análise do contrato de distribuição ou concessão comercial em sentido lato, permitindo, deste modo, a utilização de qualquer dos nomen juris acima descritos.

3.II NATUREZA JURÍDICA

A distribuição comercial, conforme leciona Orlando GOMES, pode ser considerada como a "atividade de revenda de produtos, mercadorias ou artigos que compra ao fabricante e distribui com exclusividade, comercializando-os em certa zona, região ou área".

Para COELHO, "a distribuição é o contrato de colaboração empresarial por intermediação pelo qual um dos empresários contratantes (distribuidor) tem a obrigação de comercializar os produtos do outro (distribuído). É contrato atípico, regido pelas cláusulas livremente pactuadas pelas partes".

Humberto THEODORO JUNIOR e Adriana Mandim THEODORO DE MELLO, assim qualificam o contrato em estudo:

"(...)os contratos de distribuição lato sensu são aqueles que se destinam a dar forma a relações entre fabricante e distribuidor, regendo as obrigações existentes entre eles, destinados a organizar a atividade de intermediação e venda da produção, levando-a até o consumidor final. São chamados de contratos de distribuição aqueles que estabelecem a obrigação de uma das partes promover a venda dos produtos fornecidos pela outra parte, e cuja execução implica estipulação de regras gerais e prévias destinadas a regulamentar o relacionamento duradouro que se estabelece entre os contratantes(...)".

Assim, extrai-se que para o surgimento destes contratos, é necessária a existência de um comerciante, fabricante ou produtor, que vende produtos a outro comerciante, distribuidor, a fim de efetivar a revenda, em determinada zona.

Esta figura contratual assemelha-se ao contrato de fornecimento, uma vez que o produtor concedente se empenha em fornecer ao revendedor concessionário a quantidade de produtos que este lhe requer, obrigando-se a estocar uma quantidade mínima contratualmente preestabelecida e a executar a venda em uma região determinada, o que permite seja dito que a função social deste contrato é a distribuição de produtos ao mercado consumidor.

São traços característicos dos contratos de distribuição a exclusividade, exclusividade de zona ou territorial e período da relação contratual.

Conforme acentua Waldirio BULGARELLI, pela cláusula de exclusividade, "o concessionário se obriga a não comercializar ou fabricar outro produto do mesmo tipo daquele indicado no contrato".

A exclusividade é recepcionada de maneira relativa na atualidade, tendo caráter acessório neste tipo de contrato, uma vez permitida a realização do pacto ressalvando-se a possibilidade do distribuidor comercializar produtos de diferentes fabricantes, não constituindo prática contrária ao direito, desde que não estipulada a exclusividade contratualmente, conclusão que pode ser aplicada do mesmo modo à exclusividade territorial ou de zona.

Quanto ao período da relação contratual, entende-se que os contratos de distribuição podem ser ajustados tanto por tempo determinado, quanto por tempo indeterminado, sendo exigido, no entanto, seja conferido prazo mínimo de duração suficiente para o distribuidor obter o retorno esperado de seus investimentos, sendo inerente aos contratos de distribuição a durabilidade do pacto.

Podem ser distinguidas duas formas de distribuição a serem adotadas pelo industrial para proporcionar vendas em larga escala e em territórios distantes da empresa fabricante, sendo elas a direta e indireta.

Consiste a distribuição direta no repasse imediato do produto pelo fabricante ao consumidor, por meio de agentes ou representantes comerciais não autônomos que são responsáveis por esta intermediação. Nesta modalidade, observada a dependência jurídica do representante comercial, pode-se dizer, em razão deste aspecto, que a distribuição se dá de forma direta.

Na modalidade indireta de distribuição, o distribuidor, dotado de relativa autonomia econômica, em relação de integração com o fabricante, é responsável pela revenda do produto ao mercado consumidor. Nesta modalidade podemos constatar o feitio de colaboração próprio desta espécie contratual, visto que o produtor alcança de forma ágil o mercado consumidor, por intermédio do revendedor, enquanto este goza do prestígio e bom nome da marca do fabricante.

Trata-se de instrumento dotado de evoluída técnica comercial, beneficiando a todos os integrantes da cadeia produtor-revendedor-consumidor, mormente este último, sendo o alvo de todos os melhoramentos e estratégias formuladas pelos comerciantes no sentido de aperfeiçoar o atendimento à clientela e buscar redução de custos, atingindo o público consumidor com a qualidade e abrangência necessários para a prosperidade do negócio.

Embora sobressaiam características próprias e exclusivas inerentes aos contratos de distribuição, alguns autores consideram a não existência de distinção entre esta modalidade e o contrato de concessão mercantil e contratos de franquia, compartilhando desta opinião Rubens REQUIÃO. Em sentido contrário BULGARELLI.

Admitindo a autonomia destas espécies contratuais, Fábio KONDER COMPARATO, esclarece ser a concessão de venda, exclusivamente, "contrato de distribuição de produtos; a licença de uso de marca ou a eventual prestação de serviços do concedente ao concessionário são meros acessórios ao pacto principal, que estipula a exclusividade na distribuição de produtos, ou seja, bens fabricados pelo concedente. Na franquia, o essencial é a licença de utilização de marca e a prestação de serviços de organização e métodos de venda pelo franqueador ao franqueado. A finalidade da distribuição da frachise não abrange, pois, apenas produtos, mas também mercadorias (isto é, revenda de comerciante atacadista e retalhista) e serviços, como a hotelaria, por exemplo. Por conseguinte, na concessão de venda, o concessionário é simples intermediário entre o concedente e o público consumidor; enquanto na franquia, o franquiado pode ser, ele próprio, produtor de bens ou prestador de serviços".

Portanto, inobstante as peculiaridades de cada figura contratual, respeitadas as opiniões divergentes, possuem todos como finalidade econômica a distribuição mercantil.

3.III CLASSIFICAÇÃO

Tendo-se em vista seus elementos constitutivos, os contratos de distribuição podem ser classificados em: consensuais, comutativos, de trato sucessivo, principais, nominados, empresariais e de colaboração.

Também merecem ser incluídos na categoria dos contratos onerosos e formais, uma vez que envolvem prestações recíprocas e exigem determinada forma para originar os efeitos jurídicos inerentes.

São reconhecidos como contratos consensuais tendo-se em vista que passam a surtir efeitos jurídicos a partir do consentimento manifestado pelas partes.

O caráter de comutatividade é perceptível ao passo que ao momento de seu surgimento, as partes têm conhecimento relativo das vantagens e desvantagens que este acordo de vontades trará para cada contratante. Deste modo, as prestações contratuais serão sempre recíprocas, independentemente de qualquer eventualidade.

Os contratos de distribuição são tidos como de trato sucessivo em razão de que o acordo de vontades faz com que tragam em seu bojo prestações a serem cumpridas em um espaço de tempo normalmente prolongado, diferentemente dos contratos de execução imediata.

Por existirem por si mesmos, não exigindo para tanto a existência qualquer outra figura contratual, são classificados como contratos principais.

Embora até a vigência do Código Civil de 2.002 os contratos de distribuição não encontrassem regulamentação legal ampla, passa agora a tratar-se de contrato nominado, visto que a nova lei civil trouxe, em seus artigos 710 a 721, as normas que estabelecem alguns de seus caracteres, obrigações dos contratantes, enfim, a forma pela qual deverá ser conduzido de acordo com a nova interpretação legislativa, como poderá ser visto em tópico futuro.

Podem ser incluídos os contratos de distribuição entre os chamados empresariais. Isto porque na atividade de distribuição participam comerciantes, de forma organizada, contando com a colaboração um de outro, dedicadas a produção, comercialização, administração de bens e\ou serviços, tendo sempre inerente o intuito econômico.

A especialidade das prestações devidas pelas partes nos contratos de distribuição constitui um diferencial em relação regular comutatividade como presente na maioria dos contratos comerciais.

Neste ponto, são contratos classificados como de colaboração, visto que o principal interesse econômico neles vigorante é a formação de uma clientela regular em determinado território, no intuito de aumentar a lucratividade e consolidar a marca do fabricante. Assim, constituem uma reunião de interesses para a consecução de uma finalidade comum. As prestações contratuais são voltadas para o benefício de ambas as partes, exigindo competência e lealdade pelo distribuidor, não se restringindo tão somente à aquisição de mercadorias do produtor.

3.IV CARACTERÍSTICAS

3.IV.a DIREÇÃO TÉCNICA DO CONCEDENTE

O intento do empresário em expandir a comercialização de seu produto por intermédio de uma rede de distribuidores leva em consideração principalmente a estrutura ágil e profissionalizada que deve ser inerente a este tipo de empreendimento, a fim de lhe agregar competitividade para atingir a maior porção possível do mercado pretendido.

Desse modo, é do interesse da empresa que a política geral de direção técnica dos distribuidores seja ditada de forma concisa, sempre tendo-se em vista, dentre outros elementos, a homogeneidade e disciplina.

Tal condição demonstra-se essencial para o funcionamento da organização empresarial como um todo, sendo certo que deve haver a coordenação entre o seu setor comercial e as demais atividades desenvolvidas.

Para tanto, o produtor deverá tomar as cautelas necessárias no momento em que o mercado exigir decisões para manter o rumo da empresa no sentido da economia predominante, tanto em situações desfavoráveis como em ciclos expansivos de demanda.

Assim, no caso de queda do poder do mercado consumista, orienta-se que a empresa diminua o fornecimento de mercadorias aos seus distribuidores, tendo-se em vista a possibilidade de lhes ocasionar perdas econômicas em face da baixa rotatividade dos produtos e o seu custo.

Neste ponto, dependendo do ramo da atividade desenvolvido, seria mais adequado que a cláusula contratual que regula a aquisição dos produtos pelo distribuidor seja proporcionalmente variante em relação à procura do destinatário final pelo bem de consumo.

De outro modo, quando a demanda do mercado estiver em alta, o empresário deve contemplar o aumento da produção, para que a escassez do produto não cause a perda da clientela habitual de seus distribuidores pela impossibilidade de abastecer seus estoques.

Este poder de decisão deverá analisar de maneira constante o interesse do consumidor, modificações econômicas, tributárias, e todas aquelas que interfiram de algum modo no desenvolvimento do negócio e exijam medidas a serem instituídas e repassadas aos distribuidores.

O êxito e o fracasso das políticas adotadas contribuirá diretamente para o êxito ou o fracasso do distribuidor.

Este é o fundamento da necessária direção técnica presente na relação entre fabricante e distribuidor, que deve ser mantida ordenada e disciplinadamente, procurando atender com igualdade os interesses dos partícipes do empreendimento.

3.IV.b SUBORDINAÇÃO ECONÔMICA

Embora a independência jurídica da empresa distribuidora permaneça incólume nos modernos negócios de distribuição, visto tratar-se de ente jurídico distinto da empresa fabricante, a dependência econômica encontra-se como elemento fundamental para o desenvolvimento deste tipo de empreendimento.

O fundamento desta exigência paira sobre a necessidade da uniformização e busca pela eficiência, sendo certo que a padronização e imposição de metas se faz necessária na medida em que mantém coesa a organização na pretensão de satisfazer os objetivos idealizados.

Assim, o contrato de distribuição cria uma espécie de vínculo econômico entre fabricante e distribuidor, no qual o segundo passa a integrar e adotar padrões de qualidade de bens e serviços fixados pelo primeiro, formando uma sociedade unitária dentro da qual o distribuidor se encarrega de comercializar os produtos fabricados pelo fornecedor.

Outro aspecto desta relação que justifica a ingerência do controle econômico pelo produtor pode ser constatado na agravante de que o distribuidor, ao estabelecer a atividade comercial no adimplemento de suas prerrogativas contratuais, o fará transmitindo ao consumidor a marca e o nome do fornecedor, de modo que a qualidade da prestação dos serviços afetará diretamente a sua imagem.

Deste modo, por tratar-se de estratégia comercial com finalidade que obedece aos princípios gerais da atividade econômica contidos na Constituição Federal, não há repúdio pelo direito quanto a esta forma negocial.

A relação de subordinação existente entre os contratantes nos pactos de distribuição e concessão está diretamente ligada à recente problemática discutida pela doutrina e jurisprudência no tocante às condições tidas como leoninas, enfrentadas pelo concessionário ao celebrar o acordo negocial.

3.IV.c EXCLUSIVIDADE

Esta característica, já analisada de maneira sucinta anteriormente, diz respeito principalmente à esfera de atuação do distribuidor, visto que, existindo pacto de exclusividade dentre as cláusulas contratuais, estará impedido de desenvolver suas atividades no mesmo ramo para outras marcas e prover-se de outra fonte que não seja oriunda da concedente, ainda que este possa designar outros distribuidores ou vender diretamente na zona designada a um dos concessionários.

O pacto de exclusividade configura-se como mais uma das características que confirmam a subordinação econômica exercida pela parte dominante no contrato.

Por esta cláusula, presente na grande maioria dos contratos de distribuição, o fabricante e o distribuidor estipulam a exclusividade de venda dos produtos daquele por este, adquiridos por preço preferencial e a título pessoal para proceder logo a sua revenda a seus próprios clientes.

3.IV.d DURAÇÃO DO CONTRATO

Nesta classe de negócios, a duração do contrato é o aspecto fundamental que define a certeza do retorno do investimento realizado pelos contratantes.

Como assevera THEODORO JUNIOR, "da própria natureza da atividade de distribuição, enquanto sistema organizado, conclui-se que o tempo é fator relevante para a execução do contrato que há de viger por um prazo suficientemente longo para que as partes possam alcançar os fins a que o contrato se dispõe. Daí porque enquadra-se também no conceito de contrato de duração, uma vez que sua execução não se faz em um único ato, mas em atos sucessivos que se protraem no tempo".

No entanto, apesar do aspecto de longevidade insculpido na distribuição comercial, há de se ressaltar que sua duração deverá ser sempre definida, necessariamente constando no corpo do contrato a cláusula temporal estabelecendo limites de duração.

Isto porque o exercício da atividade do concessionário demanda, não raramente, vultuoso investimento, que deverá estar calcado, de acordo com a prática comercial moderna, em três premissas, quais sejam a segurança, liquidez e rentabilidade.

A segurança diz respeito à certeza de que o capital investido não se perca quando da execução do negócio. Certamente esta segurança se vislumbra de maneira relativa, visto que a instabilidade é elemento onipresente na economia moderna nacional e internacional, sendo prudente a escolha de maneira sensata daquele negócio que apresenta maior capacidade de suportar os altos e baixos submetidos pela economia.

Por liquidez entende-se a virtude do investimento em ser transformado, de maneira efetiva, em dinheiro, em um curto intervalo temporal.

A rentabilidade, por sua vez, está ligada a capacidade do investidor em, além de manter íntegro e atualizado o capital inicialmente investido e devidamente recuperado, extrair dividendos permanentes pela consecução do negócio.

Assim, inexistindo prazo fixo para a vigência do pacto, será a primeira incógnita a ser enfrentada pelo distribuidor, impossibilitando-o de avaliar previsões de investimento.

Por outro lado, estipulado prazo fixo para a duração da concessão, será conferido ao investidor maior capacidade e tranqüilidade para estabelecer um cronograma com vistas aos parâmetros da segurança, liquidez e rentabilidade.

Na prática comercial, existem três alternativas possíveis de duração: contratos com prazo breve, renováveis expressa ou tacitamente; contratos com prazos prolongados e contratos sem prazo estabelecido.

Conforme poderá ser constatado na continuidade deste trabalho, esta circunstância é fonte dos maiores conflitos envolvendo os contraentes na distribuição comercial. A resilição unilateral antecipada; o fim do contrato pelo alcance do término e a expressa negativa pela sua renovação; a resolução logo após vencido o término por uma das partes sem culpa pela outra parte e o direito ou não a exigir o ressarcimento pelo prejudicado, são as questões reiteradamente submetidas à apreciação pelo Poder Judiciário.

Independentemente da conclusão a ser alcançada, é pacífico que a controvérsia seria amenizada caso a economia fosse mais estável e não existissem períodos econômicos recessivos.

Neste sentido a afirmação de Heriberto S. HOCSMAN: "la realidad es que nadie puede aseverar com um grado inportante de certeza este tipo de cuestiones, razón por la cual, quanto más prolongado sea el prazo del contrato, más posibilidades tendrá el concessionário para obtener el retorno de su inversión y su rentabilidad estimada. También podemos decir que serán inversamente proporcionales al plazo, las chances de logralo em períodos menores, pues habrá menos tiempo para obtener cualquier recupero".

Neste passo, naqueles contratos em que não haja prazo de duração ou naqueles em que se verifica a prorrogação expressa ou tácita, será de extrema importância a figura da notificação a ser formulada pelo contratante que não mais deseje permanecer na relação comercial.

Para tanto, a interpretação da execução destes contratos, terá a boa-fé como principal princípio norteador, devendo prevalecer sobre qualquer perspectiva de ganância ou benefício pelos empresários.

3.V FORMAS DE EXTINÇÃO

Tendo em consideração as disposições usualmente contidas nos pactos de distribuição acerca do encerramento da relação contratual, são conhecidas usualmente pela doutrina cinco modalidades de extinção.

Álvaro Villaça AZEVEDO entende ser possível a extinção destes contratos por imperfeição a ele anterior, e que cause sua nulidade ou anulabilidade; pela execução, com o cumprimento de todas obrigações contratuais; pela inexecução culposa, quando ocorre rescisão unilateral ou bilateral; pela inexecução não culposa involuntária, quando se trata de resolução, ou, finalmente, pela inexecução não culposa voluntária, no caso de resilição unilateral e bilateral.

No que pertine à primeira possibilidade, temos que o contrato pode surgir no mundo jurídico já gravado por uma causa de nulidade ou de anulabilidade, podendo provocar sua extinção. É o caso em que os contratos deixam de apresentar os requisitos mínimos para sua formação, tais como o consentimento, capacidade das partes, objeto, forma e prova.

Quanto à extinção pelo cumprimento de todas as obrigações nele assumidas, não há grande preocupação, pois, cumprida a finalidade a que foi destinado, resta aos contratantes, tão somente, encerrar a relação jurídica.

Tratando-se de extinção por inexecução das obrigações, entretanto, faz-se necessária a apuração de culpa por algum dos contratantes, que ocasione o evento extintivo do contrato.

Isto porque, inexistindo conduta culposa, a regra é que os contraentes voltem ao estado anterior à avença travada. Por outro lado, constatada a culpa, vislumbra-se o caso de indenização por eventuais danos causados ao outro contratante pelo inadimplemento, podendo se dar de maneira unilateral ou bilateral, no caso de inadimplemento por uma ou ambas as partes, respectivamente.

Ocorre a extinção do contrato pela resolução quando, pela inexecução das obrigações sem culpa dos contraentes, se tem por finda a relação contratual, como pode ser observada quando há perecimento do objeto contratado.

A resilição unilateral, conforme será explanado com maior profundidade em tópico futuro, é a maneira da extinção do vínculo pela qual um dos contratantes manifesta o seu desinteresse no prosseguimento da relação contratual, sendo bilateral quando este objetivo é visado por ambos.

3.VI LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Até o advento do Código Civil vigente, o contrato de distribuição não encontrava no ordenamento jurídico positivado o regramento geral estabelecendo a equação jurídica aplicável à sua existência, tratando-se, portanto, de contrato atípico.

Para determinados contratos que guardam alguma semelhança com os contratos de distribuição, tais como o de concessão comercial de veículos automotores e o de representação comercial, o legislador pátrio fez editar a Lei nº 6.729/1979, conhecida como a Lei Ferrari, aplicável àquela espécie contratual, e a Lei nº 4.886/1965, de representantes comerciais. Ainda, com relativa similitude, foi instituída a Lei 8.955/1994, tratando dos contratos de franquia empresarial, não trazendo, no entanto, regras enfrentando de maneira abrangente o tipo contratual, reservando-se a estabelecer normas tão somente incidentes sobre especificidades alheias ao modelo da relação comercial.

Parte da doutrina considera viável a aplicação analógica destas normas ao contrato de distribuição, posição esta adotada por Leonardo Sperb de PAOLA e José Alexandre Tavares GUERREIRO, que, com amparo no artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil, entendem ser necessária a superação do dogma de que apenas as normas gerais de um dado sistema jurídico ensejam integração analógica, vedada às normas especiais.

Em sentido contrário, Eros Roberto GRAU e Paula Andréa FORGIONI acreditam ser prejudicial à livre concorrência a aplicação extensiva da Lei 6.729/1979 aos contratos de distribuição, explicando que "o art. 3º da Lei 6.729/1979 não pode ser interpretado extensivamente, de forma a não abranger a restrição pretendida pelo fabricante".

A jurisprudência nacional, em oposição ao entendimento supramencionado, consolidou os princípios gerais do direito das obrigações como parâmetros para interpretação no intuito de fixar as regras básicas atinentes à extinção dos contratos de distribuição, posicionamento que pode ser observado no seguinte acórdão exarado pelo Superior Tribunal de Justiça no agravo de instrumento nº 43329/SP, publicação no DJ de 16.05.94, p. 11766:

Contrato de distribuição relativo à informática. Impossibilidade de aplicação análoga de disposições contidas na Lei 6.729/79 a estabelecer uma regulamentação especialíssima para as relações pertinentes ‘a concessão mercantil entre produtores e distribuidores de veículos automotores de via terrestre’. Trata-se de diploma que estatui conjunto normativo particularmente distinto do direito comum, criando significativas restrições à autonomia da vontade, que não se hão de estender a situações nele não previstas.

Vale trazer a lume, por oportuno, o projeto de lei do Senado nº 164 de 2.002, que, com base nos artigos 710 a 721 do Código Civil de 2.002, regula o contrato de distribuição de bebidas em geral, projeto este que ainda encontra-se em discussão no Senado Federal.

Neste projeto de lei, o legislador estabeleceu a forma e o conteúdo dos referidos contratos, determinando as obrigações de cada contratante, dispondo, em seu artigo 8º, acerca da cláusula de exclusividade. Neste dispositivo, está contida a vedação ao distribuidor em efetuar vendas fora da sua zona de atuação, bem como comercializar produtos similares ou concorrentes àqueles fabricados pelo fornecedor.

Destaca-se, do mesmo modo, a proteção a marca do fabricante, conforme rege o inciso IV do mesmo artigo 8º, vedando ao distribuidor "denegrir o conceito e o nome da marca do fabricante perante o mercado consumidor local, de modo a causar prejuízo ao fabricante".

Embora os contratos de distribuição apresentem características próprias do pacto de compra e venda, franquia, mandato mercantil, comissão, representação comercial, agência e empreitada, dentre outros, é singular no conjunto de seus elementos, razão pela qual foi tratado como instrumento atípico até a edição do código civil de 2.002.

3.VI.a CÓDIGO CIVIL DE 2.002

Transcorrido o período em que se discutia acerca das normas jurídicas a serem aplicadas aos contratos de distribuição, foi sancionada em 10 de janeiro de 2002 a Lei nº 10.406, positivando o Código Civil que veio a substituir aquele surgido no início do século passado.

No âmbito do direito obrigacional, bem como nas demais relações alcançadas por seus dispositivos, o Código Civil de 2.002 trouxe em seu âmago maior relevo ao princípio da boa-fé e, especificamente em relação ao direito contratual, o novo dogma da função social do contrato.

Maria Helena DINIZ, comentando os novos dispositivos do codex, delineou:

(...) O princípio da probidade e da boa-fé está ligado não só à interpretação do contrato, pois, segundo ele, o sentido literal da linguagem não deverá prevalecer sobre a intenção inferida da declaração de vontade das partes, mas também ao interesse social de segurança das relações jurídicas, uma vez que as partes têm o dever de agir com lealdade e confiança recíprocas, isto é, proceder com boa-fé tanto na conclusão do contrato como em sua execução, impedindo que uma dificulte a ação da outra (...).

(...) A liberdade de contratar não é absoluta, pois está limitada não só pela supremacia da ordem pública, que veda convenção que lhe seja contrária e aos bons costumes, de forma que a vontade dos contratantes está subordinada ao interesse coletivo, mas também pela função social do contrato, que o condiciona ao atendimento do bem comum e dos fins sociais. Consagrado está o princípio da socialidade (...).

Neste sentido, conforme assevera Adriana Mandim Theodoro de MELLO, "o princípio da boa-fé é entendido como dever de cada contratante conduzir-se de forma a permitir que a relação contratual atinja os seus fins socioeconômicos respeitada a equação econômica instituída pelas partes em convenção livre".

Desta maneira, estende-se aos contratos de distribuição a aplicação do princípio da boa-fé contratual, bem como a necessidade do cumprimento de sua função social, devendo a intenção dos contratantes vinculá-los ao cumprimento de suas obrigações contratuais, sempre dentro da realidade observada tanto na própria relação comercial como na esfera econômica e social que a cerca.

Quanto às disposições específicas relacionadas aos contratos de distribuição, encontram-se elencadas nos artigos 710 à 721 do Código Civil de 2.002, inseridas no Título V, Livro I, da parte especial, em capítulo intitulado "da agência e distribuição".

A aproximação dos institutos da agência e da distribuição implantada pelo legislador levou em consideração algumas semelhanças entre eles constatadas, principalmente no que diz respeito à natureza da relação comercial tida entre as partes, apresentando como elemento característico comum a realização da venda pelo agente/distribuidor, dos produtos adquiridos ou fabricados pelo representado/fabricante.

Pretendendo definir estas figuras contratuais, o Código Civil de 2.002 dispõe em seu artigo 710, que, "pelo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada, caracterizando-se a distribuição quando o agente tiver à sua disposição a coisa a ser negociada".

Contudo, o conceito proposto não abrange, como deveria, a principal característica do contrato de distribuição, qual seja a aquisição de produtos para revenda pelo distribuidor. Na definição do Código, este foi diferenciado do agente comercial tão somente por estar em poder da mercadoria a ser negociada, elemento superficial para a abordagem da relação jurídica.

Os demais dispositivos tratam das cláusulas gerais que passam a delimitar a atuação dos contraentes, especialmente no que concerne à exclusividade, despesas com a distribuição, remuneração, inadimplemento, resolução e resilição unilateral do pacto.

O artigo 711, regulando a exclusividade, determina a impossibilidade do fabricante em constituir, concomitantemente, mais de um distribuidor em uma mesma zona de atuação, para um mesmo gênero de negócios, salvo ajuste expresso. Esta restrição é imposta na mesma proporção ao distribuidor, uma vez que não poderá estabelecer negócios com fornecedores distintos, do mesmo ramo, em zonas iguais.

Quanto às despesas decorrentes da execução do contrato, tais como transporte, impostos, funcionários, dentre outros, correrão por conta do distribuidor, salvo estipulação contratual em contrário.

Existe grande controvérsia, no entanto, no que diz respeito aos investimentos realizados pelo distribuidor no decorrer do contrato, tais como propaganda, aquisição de imóveis para estocagem de produtos e demais dispêndios no sentido de ampliar o negócio, discutindo-se acerca da possibilidade de restituição destes valores ao distribuidor após findo o pacto, questão que será tratada adiante com maior profundidade.

Na seqüência, o artigo 715 determina que o distribuidor deverá ser indenizado por eventuais prejuízos ocasionados pela diminuição ou cessação do fornecimento dos produtos pelo proponente, sem motivo justificado, caracterizando inadimplemento capaz de tornar inviável a continuação do negócio.

As possibilidades e condições de resilição unilateral do pacto são reguladas pelo artigo 720 do diploma em comento, tema que será tratado no próximo capítulo.

Finalmente, o artigo 721 remete à legislação especial o tratamento dos contratos de agência e distribuição, conferindo legitimidade implícita às referidas Leis nº 8.420/1992 e 6.729/1979, bem como às normas que regem os pactos de mandato e comissão, dispostas nos artigos 653 à 709 do Código Civil de 2.002.

3.VII FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO

A análise dos efeitos e conseqüências imprimidos à sociedade pelas relações comerciais travadas mediante contrato, deve considerar a contraposição do princípio da justiça concreta, disposto no artigo 160 da Constituição Federal, e o dogma da liberdade de contratar.

Nesta perspectiva, busca-se o equilíbrio entre a liberdade conferida às partes para escolherem o objeto do contrato, suas cláusulas e o parceiro em sua empreitada, e a necessária preservação da justiça social que deve reger tais relações.

Alvo de grande debate entre os juristas na atualidade, a função social do contrato tem como escopo a atribuição segundo a qual a existência do contrato deve beneficiar de algum modo a sociedade como um todo.

Neste ponto, Theodoro de MELLO entende que "a regulação das relações contratuais é relevante instrumento de política econômica, monetária e financeira, e se justifica em face dos interesses supremos do Estado na condução do governo, na distribuição de riquezas e na realização da justiça social e, mesmo, na preservação e defesa da soberania nacional".

Hodiernamente, o contrato de distribuição é o instrumento mais moderno e avançado dentro de um sistema de comercialização de produtos. Por suas características, a repercussão e materialização de sua função social é observada, principalmente, no campo da economia e no mercado de consumo. É de sua natureza, do mesmo modo, promover o bem estar social do homem, levando ao seu alcance os produtos necessários a sua sobrevivência.

Nas palavras de Claudineu de MELLO, "o contrato de distribuição tem como função precípua promover o abastecimento social, estabelecendo vários vínculos de responsabilidade contratual entre fabricantes e distribuidores; vínculos de responsabilidade extracontratual, entre fabricantes e consumidores; e vínculos de responsabilidade por danos ao meio ambiente entre fabricante, distribuidores e a comunidade em geral."

Assim, são aspectos que envolvem a função social do contrato de distribuição, no estabelecimento da relação jurídica que promove o abastecimento de bens à população, o cumprimento das obrigações e deveres contratuais pelas partes e sua responsabilidade perante o mercado consumidor e o meio ambiente na hipótese de eventual dano ocasionado pela prática comercial.


4 RESILIÇÃO UNILATERAL NOS CONTRATOS DE DISTRIBUIÇÃO

4.I CONSIDERAÇÕES GERAIS

Tratando-se o contrato de distribuição de pacto de colaboração, os interesses das partes buscam uma mesma finalidade. Porém, esta relação de cooperação se rompe ao momento da extinção, oportunidade na qual os interesses podem entrar em colisão.

A grande controvérsia que surge a partir de então, é quanto a remanescência de deveres e obrigações ou o surgimento do dever de indenizar conseqüente da extinção da relação.

O direito das relações obrigacionais apresenta como característica fundamental a transitoriedade, no sentido de que as obrigações contraídas têm o seu desenvolvimento previsto a ser efetivado em um determinado intervalo de tempo. Não há lugar, no direito contratual, para a pactuação de obrigações perenes ou infinitas, reservando-se o caráter permanente aos direitos reais, tal como a propriedade.

Não há que se cogitar, pois, na submissão à obrigações eternas ou vitalícias, sem que haja imposição legal ou manifestação voluntária neste sentido, conforme assegura a Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso II, revestindo-se tal hipótese em violação à liberdade do ser humano.

Ainda que não seja estabelecido o termo final do contrato de maneira específica, possui o seu implemento temporal previsto de maneira implícita, uma vez atingidos os objetivos econômico-sociais visados na relação negocial.

Especificamente nos contratos de distribuição, as mudanças experimentadas pela economia nacional, transformações nos padrões de circulação de mercadorias, relativização e desmembramento de conceitos de marketing, produção e venda, dentre outros aspectos econômicos e sociais, interferem de maneira direta na relação fabricante-fornecedor.

Paralelamente a este aspecto, a integração de interesses, traço característico dos contratos de colaboração, deve permanecer incólume, visto que fortalece a união empresarial, impedindo a possibilidade de eventual ruptura.

Nenhuma conseqüência drástica será auferida pelos contratantes caso estejam interagindo com as referidas mutações extrínsecas, principalmente, dentro da própria relação comercial, estabelecendo um vínculo equilibrado de aspirações mercadológicas.

Neste aspecto, THEODORO JUNIOR e MELLO, bem esclarecem o fenômeno:

Não é raro que, ao final do período de vigência de um contrato de distribuição, todo conceito da rede possa ter-se modernizado, o que exigiria novos e vultuosos investimentos do distribuidor. Em outras hipóteses, mudanças de estratégias, incluindo-se o abandono do sistema de franquia ou concessão, são necessárias para adaptar a distribuição à nova realidade do mercado consumidor. Muitas vezes pode ocorrer que até mesmo o perfil do distribuidor não tenha se mostrado devidamente adequado às exigências e necessidades do fornecedor. Não é raro que arestas e divergências surjam ao longo do relacionamento, vindo a retirar a confiança, o espírito de colaboração, a cooperação e união de esforços que marcam o contrato de integração. Esse juízo de conveniência sobre a manutenção de uma parceria é privativo das partes que hão de livremente optar em renovar ou não o contrato, mantê-lo vigente por prazo indeterminado ou encerrar o relacionamento duradouro.

4.II QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DO INSTITUTO

Fixadas estas considerações, dentre as formas de extinção dos contratos de distribuição estudadas no capítulo II do presente trabalho, importa com maior relevo a resilição unilateral contratualmente prevista, e as conseqüências do seu exercício pelas partes, especialmente no que tange a juridicidade, modo, prazo, e eventual direito à indenização pelo findar do negócio jurídico.

A resilição unilateral é admitida somente nos contratos por prazo indeterminado, nos quais não há previsão contratual para o término da relação, característica geralmente constatada naqueles de execução continuada, tal como a grande maioria dos contratos de distribuição.

O instrumento utilizado para promover a resilição unilateral do contrato é a denúncia, normalmente efetivada mediante correspondência encaminhada através do cartório de títulos e documentos, a fim de conferir maior segurança e eficácia à manifestação de vontade.

Na lição de Sílvio de Salvo VENOSA encontramos a definição de resilição nos contratos:

O termo resilição é importado do direito francês. Advertimos, porém, que não é expressão consagrada em nosso meio negocial. Com muita freqüência, as partes, e mesmo a lei, usam a palavra rescisão, para significar a mesma coisa (Lopes, 1964, v. 3:199). A resilição é a cessação do vínculo contratual pela vontade das partes, ou, por vezes, de uma das partes. A resilição é, portanto, termo reservado para o desfazimento voluntário do contrato.

Seguindo o posicionamento de GOMES, admitindo como bilateral a extinção do contrato pela resilição, mesmo que manifestada por apenas um dos contratantes, Arnaldo RIZZARDO assim analisa o instituto:

Prevendo uma das cláusulas a faculdade de qualquer dos sujeitos exercer o direito de extinguir a avença, através de um ato de manifestação de vontade posterior, mantém-se o rompimento bilateral, porquanto introduzida esta faculdade por ambos os participantes. Este acerto prévio conduz, na expressão de ORLANDO GOMES, à resolução convencional, verificada "quando no próprio contrato se atribui a faculdade de resilir a qualquer dos contratantes. Se eles estipulam que pode ser dissolvido antes da expiração do termo, assim o deseje uma das partes, como se verifica, por exemplo, no contrato de trabalho por tempo determinado em que se reservam ao direito de resilir ‘ante tempus’, mediante aviso prévio, a resilição, apesar de se efetuar em virtude da declaração de vontade de um só dos estipulantes é, em verdade, convencional, porque resulta de acordo feito no momento da conclusão do contrato".

Darcy BESSONE, qualificando o instituto, assim leciona:

Em geral, nos contratos por tempo indeterminado, e de execução continuada, qualquer dos contratantes pode unilateralmente desvincular-se dissolvendo-os. A indeterminação do tempo de duração do contrato ocasionaria a permanência infinita do vínculo, se não fosse facultado a qualquer das partes, através do ius poenitendi, desligar-se, quando lhe aprouvesse. Assiste, assim, a cada um dos contratantes o direito potestativo de desvincular-se.

Nas palavras de VILLAÇA, encontramos a seguinte definição:

Na resilição unilateral, as partes, no momento da contratação, autorizam-se, mutuamente, a pôr termo à contratação, por mera comunicação à outra desse intento resilitivo. Trata-se do exercício do direito de não continuar a contratação, seja por autorização legal ou contratual. É legal, quando a própria lei admite essa possibilidade de resilição, como na legislação inquilinária (no caso da denúncia vazia ou cheia – motivada ou imotivada).

Assim, verifica-se que existe resilição unilateral do contrato por tempo indeterminado quando, fabricante ou distribuidor, exercendo um direito previsto em cláusula contratual, põe termo à relação, seja qual for o motivo pelo qual optou por romper o vínculo negocial.

A desnecessidade da motivação para o estabelecimento do fim da relação por um dos contratantes é justificada pela máxima de que ninguém deve ser compelido a contratar eternamente, e ainda, pela permissão contida no próprio contrato. Vale ressaltar, no entanto, que tal regra aplica-se tão somente ao caso cogitado, ou seja, tratando-se de pacto de execução continuada com prazo de duração indeterminado.

4.III JURIDICIDADE DO EXERCÍCIO DA DENÚNCIA

Inicialmente, cumpre esclarecer que a análise do tema será direcionada exclusivamente aos pactos nos quais não há inadimplemento contratual, permitindo o exaurimento da matéria. Isto porque o descumprimento de cláusulas como a de exclusividade e fornecimento e aquisição de quantidades mínimas de mercadorias, dentre outras, ensejam, salvo acordo entre os contratantes, a rescisão do contrato com conversão em perdas e danos.

Nos contratos de distribuição, a previsão de término do acordo pode ser determinada ou indeterminada pelos contratantes ao seu início.

Conforme já dito, tratando-se de contrato por prazo determinado, deve ser repelida a resilição unilateral, sendo que a ruptura contratual nestes termos caracteriza, em tese, abuso de direito.

Isto porque, acordado entre os contraentes certo termo para o findar do negócio jurídico, exige-se que tal termo seja cumprido de maneira inequívoca, não apenas pelo dispositivo contratual, mas principalmente pela natureza dos investimentos que envolvem o contrato de distribuição e as conseqüências que seriam geradas pelo rompimento do vínculo.

Agregados à condição do prazo contratual, outros elementos subjetivos são determinantes para possibilitar ou não o rompimento unilateral do contrato de distribuição.

Neste sentido, o princípio da boa-fé contratual deve ser considerado como fator moderador do exercício do poder de extinção da relação comercial, atuando da mesma maneira no seu desenvolver.

A função do princípio da boa-fé nos contratos é impor aos contratantes a condição de agir de maneira não arbitrária e moderada no exercício de suas prerrogativas contratuais, impedindo que façam uso de seus direitos de forma desequilibrada, gerando benefícios ou encargos e prejuízos desproporcionais à parte contrária.

Acerca do tema, THEODORO DE MELLO:

Ora, se o contrato encerra, substancialmente, uma operação econômica que se desenvolve no tempo e com o objetivo de satisfazer os legítimos e razoáveis interesses dos contratantes, todas as condutas que, independentemente de não terem sido impostas pela lei ou pelo contrato, são indispensáveis ao alcance desse fim social e econômico justificam-se pelo princípio da boa-fé (...)

(...) No âmbito do contrato, o princípio da boa-fé sustenta o dever das partes de agirem conforme a economia e a finalidade do contrato, de modo a conservar o equilíbrio substancial e funcional entre as obrigações correspectivas que formaram o sinalagma contratual.

A importância da observância do princípio da boa-fé contratual nos contratos atípicos é bem ressaltada por PAOLA, dizendo ser "nos contratos atípicos que as grandes coordenadas axiológicas do sistema jurídico, dentre as quais o princípio em comento, adquirem maior relevância. À falta de um modelo regulativo legal, boa parte das soluções precisa ser encontrada em nível de princípios".

Embora o Código Civil de 2.002 traga dispositivos regulando o contrato de distribuição, a conclusão acima citada aplica-se a este contrato em razão da insuficiência do tratamento dado pela codificação civil, não alcançando de maneira exaustiva a complexidade desta relação.

Assim, seguindo os ditames estabelecidos pelo princípio da boa-fé contratual, devem ser ponderadas a fim de se apurar a possibilidade de resilição unilateral do contrato de distribuição, além da previsão temporal, segundo PAOLA, a "existência e duração do aviso prévio; antiguidade da relação entre as partes; conduta anterior, ativa ou omissiva, da parte denunciante; oportunidade da denúncia".

Analisaremos em conjunto estes elementos.

Importante ressaltar, neste tópico, o grande passo dado pelo legislador quando da redação conferida ao artigo 720, no Código Civil vigente, que assim disciplina o exercício da denúncia contratual em estudo:

Art. 720. Se o contrato for por tempo indeterminado, qualquer das partes poderá resolvê-lo, mediante aviso prévio de 90 (noventa) dias, desde que transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto do investimento exigido do agente.

Parágrafo único. No caso de divergência entre as partes, o juiz decidirá da razoabilidade do prazo e do valor devido.

A regra insculpida no dispositivo supra mencionado acompanha o entendimento que inspirou a formulação do mandamento contido no artigo 473 do mesmo código, inovação legislativa trazida pela reforma da codificação civil, assim redigida:

Art. 473. A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte.

Parágrafo único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos.

Caio Mário da Silva PEREIRA, analisando a solução jurídica dada pelo legislador assevera:

O legislador poderia ter determinado apenas o pagamento das perdas e danos sofridas pela parte que teve prejuízos com a dissolução unilateral do contrato. Preferiu lhe atribuir uma tutela específica, transformando o contrato que por natureza poderia ser extinto por vontade de uma das partes, em um contrato comum, valendo essa nova regra pelo prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos. Caberá ao juiz determinar, com a ajuda da perícia técnica, se necessário, o prazo em que fica suspenso o direito da parte de resilir unilateralmente o contrato sem qualquer motivação específica.

Conforme constatado pelo jurista, observa-se na previsão do artigo a faculdade constitucional única (art. 5º, II, CF) de compelir determinada pessoa a adotar conduta contrária a sua vontade, uma vez que, caso seja entendido como adequada a solução pelo órgão jurisdicional, o contrato deverá ser cumprido até o termo final fixado pela decisão, ao revés dos interesses da parte denunciante.

No que pertine aos demais aspectos da denúncia, a construção jurídica delineada nos dispositivos acima transcritos já vinha a tempo sendo alvo de discussão entre os doutrinadores pátrios.

Neste sentido, GOMES assevera que, "via de regra, a denúncia deve ser acompanhada de aviso expedido com certa antecedência, a que se dá o nome de aviso prévio ou pré-aviso".

Também PAOLA, com igual razão, entende que, "em primeiro lugar, e ainda que à mingua de qualquer previsão contratual, a denúncia do contrato por tempo indeterminado deve ser precedida de aviso prévio, de modo a se evitar a surpresa da parte contrária".

A exigência da concessão do aviso prévio é justificada por dois aspectos principais:

- a necessidade de conferir ao distribuidor a possibilidade de auferir neste intervalo temporal, parte do retorno do investimento realizado no decorrer da contratação;

- propiciar ao revendedor tempo para readaptação ao mercado, redirecionando a sua atividade empresarial.

Isto porque o rompimento brusco do vínculo contratual é capaz de ensejar conseqüências irreversíveis ao comerciante que se encontra despojado de sua principal atividade econômica, o que torna inquestionável o direito à indenização por perdas e danos decorrentes da arbitrariedade e abuso de direito manifestado pelo outro contratante.

Portanto, é questão incontroversa a obrigatória notificação do término do vínculo e concessão de razoável prazo para o efetivo encerramento do contrato de revenda e distribuição mercantil.

Este é o entendimento unânime da doutrina pátria, que nas palavras de PAOLA, assegura que:

Em primeiro lugar, e ainda que à mingua de qualquer previsão contratual, a denúncia do contrato por tempo indeterminado deve ser precedida de aviso prévio, de modo a se evitar a surpresa da parte contrária. Esse particular, constata-se, no Direito forâneo, confluência de soluções aviltradas pela legislação, jurisprudência e doutrina. Aviso prévio não só evita o brusco rompimento da relação contratual, defraudatório da confiança depositada pelo contratante passivo, como também possibilita a busca de outras alternativas econômicas para a parte prejudicada.

Com a mesma clareza, PEREIRA ensina que "o critério legal é o de proporcionar à parte prejudicada pela resilição unilateral a obtenção do objeto previsto no contrato, de acordo com a natureza do contrato e dos investimentos realizados".

Idêntica é a orientação de MELLO, no sentido de que "sendo, porém, o contrato celebrado por prazo indeterminado, ela se dá mediante denúncia justificada de uma parte à outra".

Estabelecidas estas conclusões, importa analisar os demais aspectos que envolvem a resilição unilateral dos contratos em apreço.

Assim como a forma pela qual a denúncia é praticada, são relevantes para a apuração da legalidade da resilição do pacto os elementos inerentes à relação subjetiva observada entre as partes no decorrer do cumprimento do contrato.

Deste modo, a faculdade de romper o vínculo unilateralmente no contrato sem prazo determinado e as suas conseqüências para cada um dos contratantes serão diversas de acordo com a duração e expectativas comerciais observadas em cada caso.

Em certos casos, a conduta manifestada pelo fornecedor anteriormente à resilição demonstra-se incompatível, gerando surpresa ao concessionário o rompimento do pacto. Considerando, como exemplo, uma relação na qual o produtor emite sinais de que pretende dar continuidade ao contrato, ou de que o atendimento a certas condições garantiria a permanência do distribuidor, tais como os "planos de excelência" normalmente observados nestes contratos, pode-se constatar a abusividade da denúncia. Neste caso, a conduta do fabricante está absolutamente desvinculada da necessária boa-fé contratual.

Para PAOLA, "se o distribuidor atingiu as metas estabelecidas, tem justificada confiança na continuidade do contrato. Nesse contexto, é irrazoável a sua denúncia imediata ou dentro de um breve período de tempo. Trata-se, aqui, de uma das concretizações mais notórias do princípio da boa-fé".

Nos contratos de distribuição em grande escala, os investimentos realizados pelo distribuidor alcançam valores vultuosos, uma vez que exigem constituição de armazéns e depósitos, veículos para transporte, contratação de funcionários, dentre outras exigências necessárias ao regular desenvolvimento do negócio.

Nestas espécies, a boa-fé contratual orienta que o contrato tenha duração tal que proporcione ao distribuidor oportunidade de no mínimo recuperar tais investimentos.

Por outro lado, espera-se que o empresário, ao engendrar uma possibilidade de negócio, imagine as previsões de gastos e a possibilidade de sua amortização no decorrer da relação. Ainda, na moderna economia de mercado, não há garantia de lucratividade a nenhum dos contratantes.

O que se entende por apropriado, é a razoabilidade a ser observada na duração do contrato, de acordo com os usos e costumes comerciais de cada região, levando em consideração às legítimas expectativas de lucro do distribuidor e os investimentos por ele constituídos.

Assim, a denúncia unilateral, desde que promovida de forma regular, nos termos supra aduzidos, não se demonstra abusiva, visto tratar-se de exercício lícito de direito decorrente de cláusula contratual.

Esta é a conclusão de THEODORO JUNIOR e THEODORO DE MELLO:

Nesse contexto, pode-se concluir que, segundo as regras gerais do direito privado, aplicáveis aos contratos atípicos ou aos atípicos que não tenham regra específica sobre a sua extinção, os contratos de distribuição em geral podem ser denunciados na forma prevista na avença, exigível apenas um pré-aviso razoável conforme os ditames da boa-fé e dos usos e costumes comerciais, sem necessidade de declinar a justa causa, e a qualquer tempo, depois de escoado o termo inicialmente fixado, ou depôs depois de transcorrido o prazo em tese suficiente para o retorno dos investimentos exigidos, quando a sua duração for indeterminada.

A apreciação da matéria de maneira parcial tende a induzir o aplicador do direito a conclusões desvirtuadas da realidade nesta espécie contratual, especialmente tratando-se de relação que envolve um fabricante de porte economicamente elevado em relação ao distribuidor. Não raro, postula-se em juízo a aplicação ao caso do Código de Defesa do Consumidor, entendendo-se pela ingerência dos institutos da hipossuficiência e inversão do ônus da prova, embora seja inadmissível cogitar-se em relação de consumo in casu, pois o distribuidor é revendedor e não destinatário final dos produtos do fabricante.

Cuidando-se de contrato entre empresários, o tratamento de eventual discórdia deve ser equânime neste aspecto.

A lição de Miguel REALE traduz a essência deste pensamento:

Nada se divorcia tanto da eminente imparcialidade da Justiça como a negação do direito que cabe ao poderoso, a pretexto de amparo ao mais débil, não obstante a debilidade de suas pretensões jurídicas. Isto é, ainda que se reconheça injusta a forma como tem sido distribuída a renda nacional, ninguém pode ser penalizado num país capitalista, onde teoricamente prevalecem, no campo econômico, a liberdade de iniciativa e as regras do livre jogo do mercado, pelo fato de ser mais abastado que outrem.

Mas, se de um lado é verdade que se reconhece eficaz o princípio constitucional da livre iniciativa, donde decorre o dogma da liberdade de contratar, não menos verdadeiro, por outro lado, é o reconhecimento da necessidade da intervenção estatal, no livre jogo da iniciativa privada, com o fim específico de "resguardar o desenvolvimento nacional e a justiça social".


5 CONCLUSÃO

O crescente desenvolvimento das atividades comerciais observado no decorrer dos tempos exigiu a atuação do Estado no sentido de resguardar os interesses comuns da sociedade, evitando a prática do abuso no exercício dos poderes inerentes à autonomia privada.

Como a grande maioria dos acordos comerciais, o pacto de distribuição conta com o elemento do risco negocial, elemento este segundo o qual o empresário, tanto fornecedor quanto distribuidor, deve realizar um planejamento prévio à concretização do negócio jurídico, a fim de evitar o insucesso de sua empreitada.

Até o advento do Código Civil de 2.002, o contrato de distribuição foi tratado como instrumento atípico, sendo que as disposições da nova codificação trouxeram soluções jurídicas adequadas para o seu estabelecimento, principalmente no que tange ao tema principal deste estudo.

Respeitando a natureza das obrigações e dos negócios jurídicos na teoria contratual moderna, assim como no desenvolver histórico destas relações, o contrato de distribuição tem o seu término previsto no tempo ainda que seja contraído pelas partes por tempo indeterminado.

Neste aspecto, a denúncia formulada por um dos contratantes, ou seja o intento de ter por finda a relação mercantil, deve ser promovida de maneira a não provocar lesão desproporcional ao outro contratante, ressalvado o risco inerente ao negócio.

Deste modo, a resilição unilateral do contrato de distribuição deve ser exercida mediante razoável aviso prévio, previsto no instrumento contratual ou compatível com o vulto do empreendimento e a duração do relacionamento das partes, respeitando-se os princípios da boa-fé e da lealdade entre os contratantes.

Sendo legítima a conduta do denunciante, não há que se cogitar em pleito indenizatório com fundamento na resilição unilateral do pacto, sendo certo tratar-se de faculdade contratual permitida pelas normas jurídicas aplicáveis.


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DULEBA, Alessandro. Resilição unilateral nos contratos de distribuição. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 206, 28 jan. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4762. Acesso em: 29 mar. 2024.