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Resposabilidade civil por morosidade do Poder Judiciário

Resposabilidade civil por morosidade do Poder Judiciário

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O presente trabalho versa sobre responsabilidade civil, concretizada na morosidade do atendimento pelo poder público.O objetivo é entender as consequências da demora, as causas e em que medida o Estado deve ser responsabilizado e obrigado a reparar.

1.             INTRODUÇÃO

 

O presente trabalho versa sobre responsabilidade civil, concretizada na morosidade do atendimento pelo poder público.

O objetivo desse trabalho é entender as consequências obtidas pela demora, quais são as causas e em que medida o Estado deve ser responsabilizado e obrigado a reparar.

Na primeira parte serão abordados os fundamentos e requisitos para a atribuição da responsabilidade, e na segunda parte será relacionado com o tema central que é a morosidade no Judiciário.

            Constitucionalmente positivado, todos tem direito de procurar o poder publico, para ver sanado o seu problema, em tempo hábil de restituição do status quo ante, ou seja, todos tem direito a prestação jurisdicional.

            Quando tratamos de tempo hábil, refere-se ao lapso temporal entre a procura do judiciário e a solução do caso, isso deve ser feito dentro de um prazo razoável. A tutela jurisdicional eficaz é tão importante quanto ter acesso a ela.

            Voltando às causas dessa morosidade, trata-se no aumento populacional das cidades somado a migração de pessoas da área rural à área urbana, junto com a campanha de acesso a justiça para a busca dos seus direitos, houve uma procura pela tutela do poder público, que não acompanhou essa evolução e travou os atendimentos, dando consequência até hoje a uma “bola de neve”.

         Pleno século 21 e temos um país judicializado que não possui estrutura para aguentar o volume de demandas judiciais.

Além disso, as condições materiais nos fóruns e tribunais são descompassadas, a organização dos processos é ineficiente. Existem centenas de papéis sendo analisadas, armazenadas, enviadas de um lado a outro, isso quando não acaba se deteriorando graças a condições de tempo e pouca conservação, tudo isso servindo como uma imensa âncora para a velocidade da justiça.

Também se deve colocar nessa análise, a existência de lacunas na justiça, que são abusados por pessoas que tem interesse em ganhar tempo para fugir da punição por seus delitos, um exemplo bom disso seria os políticos abusando de diversos recursos, mesmo não tendo direito, se valendo do fato de que todos tem o direito a ampla defesa.

A lentidão da justiça brasileira gera consequência em todos os setores, consequências consideráveis, tanto do ponto de vista econômico, quanto do político e inclusive no social.

No ponto de vista econômico, segundo o instituto de estudos econômicos, social e políticos de São Paulo, seria possível crescer cerca de 25% a mais no PIB se houvesse uma justiça mais rápida, a lentidão dessa, afeta de forma direta o seu desempenho. Exemplos disso são: questões como abertura e fechamento de empresas, controvérsias entre sócios, controvérsias trabalhistas, controvérsias sobre produtos e etc.. Explicitamente, a lentidão na justiça afeta a quantidade de empresas estrangeiras a se aventurarem em abrir empresas e investir no país, pois essa deficiência jurisdicional causa receio, e com isso, o Brasil perde muitos empregos e investimentos. Em breve resumo, o sistema produtivo inteiro é dependente e vinculado na arbitragem da justiça, e na atual situação, a lentidão da justiça brasileira serve apenas para desacelerar o desenvolvimento econômico do país.

Em quesito político, o sistema atual é bem visto por uma parcela da classe, a dos corruptos, que utilizam a lentidão como vantagem para assegurar a impunidade e para adquirir tempo e conseguir ajuda política, e enquanto isso, na classe honesta, a lentidão traz grandes problemas, pois não conseguem tirar os políticos corruptos.

Já do ponto de vista social, se concentram inúmeros problemas que como consequência se irradiam nas outras esferas. A lentidão da justiça gera a sensação de impunidade, que leva os cidadãos a não contarem mais com a justiça, descrer de seus direitos, preferindo resolver seus problemas com as próprias mãos, ocasionando a vida do crime, sedutora por sua promessa de dinheiro farto e fácil. Com isso, aumento na taxa do crime, o qual desacelera a economia e contribui para a classe política desonesta populista a ganhar o poder e a esperança do povo, prometendo soluções a esses problemas, ocasionando imensa instabilidade social que como relatado, só atrasa o desenvolvimento do país.

A modernização estrutural da justiça brasileira, já esta sendo providenciada, reduzindo de inicio a ineficiência que existe ao se movimentar a grande quantidade de papéis, agilizando o acesso e leitura a todas as partes do processo. Entretanto, tornará o processo atual mais eficiente, mas ainda não resolverá, o ideal seria reduzir a quantidade de recursos possíveis, ou aumentar a dificuldade de se entrar com um recurso.

Ademais, o supremo fica meses parado, em férias e aproveitando dos seus privilégios, os quais são bem distantes na realidade da maioria dos cidadãos, enquanto a população continua tendo problemas que necessitam de ajuda judicial. São necessários mais juízes trabalhando em um prazo maior, possibilitando o atendimento ao cidadão, possibilitando que o mesmo possa procurar seus direitos.

A conscientização pela conciliação também levaria a uma maior celeridade da justiça, fazendo com que menos casos entrem em curso, ou pelo menos que não se agravem a maiores instâncias, diminuindo muito os processos e ao mesmo tempo levando à população o principal, que é o sentimento de que a justiça foi feita, de que eles podem confiar no poder judiciário.

Com isso teria uma população que confia no poder judiciário, uma economia que pode crescer sem amarras e de forma justa e uma classe política responsabilizada devidamente por seus maus feitos, levando a sociedade brasileira a o que falta, a harmonia social.

2.             FUNDAMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL NO BRASIL

Desde os primórdios da existência da sociedade, existe a chamada responsabilidade civil, ou seja, a reparação do dano causado a outra pessoa, o que mudou com o passar dos dias, é a forma de reparação desse dano, sofrendo uma evolução, passando da lei do Talião, reparações voluntárias até as reparações impostas pelo poder público.

O cerne dessa discussão é entender o conceito de responsabilidade civil, que é a reparação de danos resultantes da violação de um dever geral de cuidado, por ação ou omissão, com a finalidade de recompor o status quo ante.

No Brasil, de acordo com o Código Civil vigente, o pressuposto para a atribuição da responsabilidade civil a uma pessoa, está na composição de: i) ato ilícito (art. 186); ii) culpa; iii) dano (arts. 927 e 944) ; e iv) nexo de causalidade.

De acordo com a Constituição Federal atual, Estados e prestadores de serviços respondem de forma objetiva pelos atos, sejam eles, comissivos, omissivos genéricos ou omissivos específicos.

Maria Sylvia Zanella de Pietro (p. 792) leciona que, segundo o artigo supramencionado, a regra da responsabilidade objetiva exige:

1. Que o ato lesivo seja praticado por agente de pessoa jurídica de direito publico (que são mencionadas no art. 41 do Código Civil) ou pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço publico (o que inclui empresas publicas, sociedades de economia mista, fundações governamentais de direito privado, cartórios extrajudiciais, bem como qualquer entidade com personalidade jurídica de direito privado, inclusive as do terceiro setor, que recebam delegação do Poder Publico, a qualquer titulo para a prestação do serviço publico);

2. Que as entidades de direito privado prestem serviço publico, o que exclui as entidades da administração indireta que executem atividade econômica de natureza privada; as que prestam serviço publico respondem objetivamente, nos termos do dispositivo constitucional, quando causem dano decorrente da prestação de serviço publico; mesmo as concessionárias e permissionárias do serviço publico e outras entidades privadas somente responderão objetivamente na medida em que os da os por elas causados sejam decorrentes da prestação de serviço publico;

3. que seja causado dano a terceiro, em decorrência da prestação de serviço publico; aqui esta o nexo de causa e efeito; como o dispositivo constitucional fala em terceiros, é inaceitável o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal, pelo voto do Ministro Carlos Velloso, no sentido que a responsabilidade só é objetiva se o dano for causado ao usuário do serviço publico; se for causado a terceiro, a responsabilidade é subjetiva (RE-262.261, 2 turma, e RE-302.622-4, 2 turma); em julgado posterior, no entendo, o STF retomou o seu entendimento de dano causado a terceiro, independentemente da qualidade de usuário de serviço publico; não poderia ser outra a interpretação, tendo em vista que o dispositivo, ao falar em danos causados a terceiros, não distingue entre o usuário e o não usuário; em consequência, não pode o intérprete fazê-lo, sob pena, inclusive, em derrogar o princípio da repartição dos encargos sociais e a ideia de risco que eh inerente à grande parte das atribuições do Estado;

4. Que o dano seja causado por agente das aludidas pessoas jurídicas, o que abrange todas as categorias, de agentes políticos, administrativos ou particulares em colaboração com a Administração, sem interessar o titulo sob o qual prestam serviços;

5. Que o agente, ao causar o dano, aja nessa qualidade; não basta ter a qualidade de agente publico, pois, ainda que o seja, não acarretará a responsabilidade estatal se, ao causar o dano, não estiver agindo no exercício de suas funções.

Nas palavras de Plácido e Silva:

Dever jurídico, em que se coloca a pessoa, seja em virtude de contrato, seja em face de fato ou omissão, que lhe seja imputado, para satisfazer a prestação convencionada ou para suportar as sanções legais, que lhe são impostas. Onde quer, portanto, que haja obrigação de fazer, dar ou não fazer alguma coisa, de ressarcir danos, de suportar sanções legais ou penalidades, há a responsabilidade, em virtude da qual se exige a satisfação ou o cumprimento da obrigação ou da sanção (SILVA, 2010, p. 642).

Fernando Noronha identifica os seguintes pontos essenciais:

1. que haja um fato (uma ação ou omissão humana, ou um fato humano, mas independente da vontade, ou ainda um fato da natureza), que seja antijurídico, isto é, que não seja permitido pelo direito, em si mesmo ou nas suas consequências;

2.que o fato possa ser imputado a alguém, seja por dever a atuação culposa da pessoa, seja por simplesmente ter acontecido no decurso de uma atividade realizada no interesse dela;

3.que tenham sido produzidos danos;

4. que tais danos possam ser juridicamente considerados como causados pelo ato ou fato praticado, embora em casos excepcionais seja suficiente que o dano constitua risco próprio da atividade do responsável, sem propriamente ter sido causado por esta (NORONHA, 2010, p. 468/469).

 

O renomado Ministro Celso de Mello no HC 94.016 de 07/04/2008 proferiu que:

O exame da garantia constitucional do due process of law permite nela identificar alguns elementos essenciais à sua própria configuração, destacando-se, dentre eles, por sua inquestionável importância, as seguintes prerrogativas: (a) direito ao processo (garantia de acesso ao Poder Judiciário); (b) direto à citação e ao conhecimento prévio do teor da acusação; (c) direito a um julgamento publico e célere, sem dilações indevidas; (d) direito ao contraditório e à plenitude de defesa (direito à autodefesa e à defesa técnica); (e) direito de não ser processado e julgado com base em leis ex post facto (fazer inclinado); (f) direito à igualdade entre as partes; (g) direito de não ser processado com fundamento em provas revestidas de ilicitude; (h) direito ao beneficio da gratuidade; (i) direto à observância do princípio do juiz natural; (j) direito ao silencio (privilégio contra a autoincriminação) ; (l) direito à prova; e (m) direito de presença e de "participação ativa" nos atos de interrogatório judicial dos demais litisconsortes penais passivos, quando existentes.

 

Sabes que o estado tem uma enorme contingencia de obrigações para com os cidadãos, e para tal lhe foi permitido delegar alguma de suas funções. Ora, quando a Constituição lhe permite algo, isso é facultativo e não obrigatório. Portanto se o Estado opta por de fato delegar as funções que a Constituição permite, os danos causados por essas pessoas delegadas também devem ser de responsabilidade do Estado, lhe restando o direito de ação de regresso contra o ente causador do prejuízo. 

Toda pessoa tem direito a que sua causa seja examinada equitativa e publicamente num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial instituído por lei, que decidirá sobre seus direitos e obrigações civis ou sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal contra ela dirigida.- A preservação de tal direito é propagada na doutrina e jurisprudência de muitos países, como exemplo, os localizados na Europa Ocidental, os quais são signatários da Convenção Europeia para Salvaguardados Direitos e das Liberdades Fundamentais, no artigo 6º, inciso I, como exposto.

A prestação jurisdicional brasileira é assegurada pela Constituição Federal de 1988 (art. 5º, inciso LXXVIII), de forma adequada, real e oportuna, sendo parâmetro de instrumento de garantia e proteção dos direitos humanos. Segue o artigo comentado:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

No ordenamento jurídico brasileiro vigente, essencialmente, dois dispositivos fornecem suporte à responsabilização civil do Estado. Encontram-se no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal de 1988, e no artigo 43, do Código Civil de 2002, sendo que este já se acha superado pela disposição mais abrangente do texto constitucional referido. Frisando a importância de tais dispositivos: 


Constituição Federal, 1988, Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Código Civil, 2002, Art. 43. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros,

 ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.

Não menos importante, deve-se relatar a Convenção Americana de Direitos Humanos, ratificada pelo Brasil em 1992, pelo Decreto 678, de 09.11.1992, que dispõe em seu art. 8º, inciso 1, que:

Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista fiscal ou de qualquer outra natureza.

Com base nos dispositivos, esta nítido que o acesso a ordem jurídica é um direito fundamental assegurado constitucionalmente, entretanto, é preciso entender que esta premissa não serve apenas como o direito de acesso a justiça, mas também necessariamente, à tutela jurisdicional efetiva, adequada e tempestiva.

Assim, o texto constitucional passou a garantir a todos tanto no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que asseguram a agilidade do conjunto de atos, medidas e diligências prescritas para o andamento de um processo. Essa valorização veio com a reforma do judiciário, Emenda Constitucional nº45/04, a qual de um modo geral pareceu bastante apropriada, auxiliando para as reformas processuais se suprirem na busca e na retomada da credibilidade do Judiciário, abalada nos últimos anos pela ineficiência processual.

A dedicação do direito de ver julgado, em prazo razoável, sem demora excessiva ou delongas desnecessárias, é de inegável importância, assim como os litígios submetidos à apreciação do Poder Judiciário e os submetidos à apreciação da Administração Pública, no âmbito dos processos administrativos.

Nesse sentido, advertem Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino (2007, p. 187):


A relevância do reconhecimento do direito a razoável duração do processo, mesmo antes do acréscimo do inciso LXXVIII no art. 5º da Constituição Federal pela Emenda Constitucional 45/2004, vinha sendo assentada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que, em mais de um julgado, teve oportunidade de afirmar a necessidade de acelerar a prestação jurisdicional, de neutralizar retardamentos e abusivos ou dilações indevidas na resolução dos litígios, por parte de magistrados e Tribunais. 

Quanto mais distante da ocasião for proferida a sentença, mais fraca e ilusória será sua eficácia, e, com isso, mais frágil e fantasioso será o direito reconhecido. Aduz Danielle Annoni (2008, p.122), diz:

o resultado de um processo não apenas deve se preocupar em garantir a satisfação jurídica das partes, mas principalmente, para que esta resposta aos jurisdicionados seja justa, que se faça em um lapso temporal compatível com a natureza do objeto litigado.

 

Ilustrando o que aqui se tem defendido, o julgamento proferido pelo Superior Tribunal Federal, em 21/06/1966, do Recurso Extraordinário nº 32.518, quando, embora vencido, o Ministro Aliomar Baleeiro expôs:


Dou provimento ao recurso, porque me parece subsistir, no caso, responsabilidade do Estado em não promover adequadamente o bom funcionamento da Justiça, ocasionando, por sua omissão de recursos materiais e pessoais adequados, os esforços ao pontual cumprimento dos deveres dos Juízes. Nem poderia ignorar essas dificuldades, porque, como consta das duas decisões contrárias ao recorrente, estando uma das comarcas acéfala, o que obrigou o Juiz a atendê-la, sem prejuízo de sua própria – ambas constitucionais de serviço – a Comissão de Disciplina declarou-se em regime de execução, ampliando os prazos. (RDA, 90/141)

 

No mesmo julgamento, o Ministro Odaício Nogueira acompanhou o voto do Ministro Aliomar Baleeiro. Destaca-se, em sua manifestação, a parte seguinte:

O Estado não acionou, convenientemente, a engrenagem do serviço público judiciário. Não proporcionou à parte a prestação jurisdicional que estava obrigado. Houve falta de serviço público. Não preciso atingir as alturas do risco, que é o ponto culminante da doutrina objetiva, para decretar-lhe a responsabilidade. Basta-me invocar o princípio da culpa administrativa, ocorrendo na espécie e que não se confunde com a culpa civil, porque procede, precisamente, do mau funcionamento de um serviço. (Aguiar Dias, ob. Vit. Vol II. Pág. 156/160 e Orosimbo Nonato, acórdão citado, in RT 147/333).

Ratificando, prestar a tutela jurisdicional de forma efetiva, adequada e tempestiva é tão importante quanto ter o acesso a justiça. Pois a maior ameaça aos direitos fundamentais do cidadão encontra-se, na incapacidade do Estado em garantir ao cidadão uma prestação jurisdicional efetiva e no menor tempo possível, justificado como um lapso temporal razoável.

Assim, a responsabilização do Estado pela morosidade na prestação jurisdicional configura-se como instrumento de garantia e proteção aos direitos humanos, ou seja, é o meio de assegurar o cidadão o direito à jurisdição, a tutela jurisdicional efetiva, à prestação jurisdicional em tempo razoável ou sem dilações indevidas.

Apesar de todas essas queixas e irregularidades, seria precipitado afirmar que o Estado nada faz para reverter esse estado de lástima do sistema judiciário atual, todavia, as ações e os projetos vão caminhando lentamente, ainda que insuficientes para resolver a problemática da morosidade na prestação jurisdicional no Brasil.

Ou seja, o ordenamento jurídico brasileiro traz claramente no texto da Constituição Cidadã de 1988 (preocupação com os direitos do cidadão, como uma resposta ao período histórico diretamente anterior ao da promulgação da constituição, a ditadura militar) os princípios da inafastabilidade da jurisdição e o da razoável duração do processo (art. 5º, XXXV e LXXVIII, respectivamente), sentenciando a todos que tiverem algum direito reprimido, ou em ameaça de ser prejudicado, o acesso ao Poder Judiciário, observando que esta prestação jurisdicional, deve-se dar de forma efetiva, adequada e tempestiva, para que seja justa e atenda aos anseios da parte lesada.

Distante do que dispõe a nossa atual Carta Magna (A Carta Magna brasileira estabelece, em seu artigo 5º, § 2º que: “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.), o que se encontra no Brasil é um Poder Judiciário ineficiente para prestar uma tutela jurisdicional efetiva e em um lapso temporal sem dilações indevidas.

A partir da atual situação, a qual se encontra o judiciário brasileiro, analisando a existência de previsão tanto no texto constitucional quanto no Novo Código Civil (artigo 37, § 6º, CF/88 e artigo 43 do Novo Código Civil), oportunamente, há o aparecimento da obrigação do Estado de ressarcir aos cidadãos os danos por estes suportados, diante de sua imperfeita atuação estatal na prestação jurisdicional, pois a partir do momento em que o Estado monopolizou a jurisdição, o mesmo deve prestá-la de forma a não prejudicar nenhum jurisdicionado.

Todo o exposto até o momento foi com base em dispositivos constitucionais e legais, garantias e promessas de um bom funcionamento. Afinal, se foi dado um direito e esta explícito seu dever, o mesmo deve ser exigido e cumprido de forma justa, mas isso na teoria, quanto a prática, as observações são diferentes.

A lentidão, mais conhecida como morosidade da justiça brasileira, ocorre pelos mais diferentes motivos, um deles, aproveitando todo o exposto ate agora, é o fato da nova constituição, a constituição cidadã, ser excepcionalmente concentrada na pessoa em si, em outras palavras, oferece chance do povo procurar seus direitos. Somado a esse motivo, temos o marco do crescimento populacional nas cidades grandes, o fato da população ter migrado em massa dos campos para a cidade, o que gerou um enorme número de pessoas procurando seus direitos, sendo que antes nem os conheciam, abarrotando a justiça, a qual não se adiantou aos fatos para se preparar as novas demandas, não conseguiu acompanhar essa evolução populacional.

O fato de a lei não acompanhar as mudanças sociais, ficando defasada para representar os anseios da população, gera muitas ineficiências, a justiça foi e ainda é lenta para se modificar, porém a sociedade é muito dinâmica.

3.             RESPONSABILIDADE CIVIL POR MOROSIDADE DO JUDICIÁRIO

                                              

O Estado, através do poder judiciário, tem o papel de aplicar as leis no caso concreto, sendo representado pelos juízes e desembargadores, mas o Estado além de prestar a atividade jurisdicional, deve fazê-lo com celeridade e eficiência.

Os princípios que norteiam a Constituição Federal se conectam uns com outros, sendo que um princípio não poderá ultrapassar o outro.

No artigo 5º, inciso LIV, a Constituição Federal dispõe que:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

E nesse momento, em que o Estado tem que prestar a atividade judiciária, que surge um dos problemas mais comuns no nosso sistema judiciário, a demora nessa prestação. E a partir dessa perspectiva que surge uma controvérsia, se é possível o Estado ser responsabilizado civilmente pelos danos causados as partes pela morosidade na solução do litígio.

A duração razoável do processo e da celeridade processual é uma garantia constitucional prevista no artigo 5º, LXXVIII da nossa Carta Magna, a Constituição Federal.

Artigo 5ª da CF: [...]

LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

A inserção do inciso, acima mencionado, trouxe maior eficácia às garantias que já se encontrarem na Constituição Federal, tais como: o direito de petição aos poderes públicos (art. 5º, XXXIV); a inafastabilidade de jurisdição (art. 5º, XXXV); o contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV) e o devido processo legal (art. 5º, LIV).

A doutrina aponta algumas variáveis para analisar a razoabilidade da duração do processo, sendo elas: a) a complexidade do assunto; b) o comportamento dos litigantes; c) a atuação do órgão jurisdicional.

Cada caso concreto possui suas peculiaridades, mas a duração razoável do processo seria o tempo suficiente para a adequada instrução processual, ou seja, é o tempo prudente e justo para que a prestação jurisdicional renda a eficácia esperada.

Destarte fica evidente que a própria Constituição Federal assegura explicitamente que os processos devem ser eficientes e céleres com prazo razoável de duração. Acreditamos que a partir dessa asseguração, o Estado tem o dever de ser o mais célere possível não apenas no âmbito do processo jurídico mas também em qualquer prestação jurisdicional. Quando os cidadãos dispõe de sua liberdade para que o Estado venha a gerir visando o bem comum, não seria plausível que determinada ação do Estado demorasse tanto, e infelizmente é o que acontece no Brasil.

Ressalta o Ilustre Ministro Celso de Mello no RTJ 187/933-934:

"O JULGAMENTO SEM DILAÇÕES INDEVIDAS CONSTITUI PROJEÇÃO DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

- O direito ao julgamento, sem dilações, indevidas, qualifica-se como prerrogativa fundamental que decorre da garantia constitucional do due process of law. O réu (...) tem o direito publico subjetivo de ser julgado, pelo Poder Publico, dentro do prazo razoável, sem demora excessiva nem dilações indevidas. Convenção americana sobre Direitos Humanos (Art. 7, números 5 e 6). Doutrina. Jurisprudência.

- O excesso de prazo , quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário - não derivando , portanto, de qualquer fato procrastinatório causalmente atribuível ao réu - traduz situação anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio , sem dilações indevidas e com todas as garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional. (...).”

O Supremo Tribunal Federal, o órgão máximo do Poder judiciário, já declarou que, não ser responsabilidade estatal, exceto quando expressa em lei, pelo fato de ser o Judiciário um órgão detentor de imunidades. Fora dos casos específicos, a responsabilidade caberia tão‐somente ao juiz. 

 

No acórdão objeto do recurso extraordinário ficou acentuado que o Estado não é civil‐mente responsável pelos atos do Poder Judiciário, a não ser nos casos expressamente declarados em lei, porquanto a administração da justiça é um dos privilégios da soberania. Assim, pela demora da decisão de uma causa responde civilmente o Juiz, quando incorrer em dolo ou fraude, ou ainda sem justo motivo recusar, omitir ou retardar medidas que deve ordenar de oficio ou a requerimento da parte (RE 70.121‐MG, RTJ 64/689 – Ementa)

Ao contrário, a doutrina entende que o Estado deve ser responsabilizado pelo atraso no exercício da jurisdição.

A demora do Estado na prestação judiciária faz com que se inicie a responsabilidade objetiva, ou seja, quando o Estado, por meio de seus agentes, tinha o dever de agir e de impedir a ocorrência de um dano, mas, por inércia, não o fez.

No caso de ato omissivo praticado pelo Estado, por serviço que não funcionou ou funcionou de forma tardia ou ineficaz, deve-se enquadrar a responsabilidade estatal como subjetiva, mormente não ter sido o autor do dano, sendo necessário, para tanto, a comprovação do comportamento ilícito praticado pela Administração Pública (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 2005a).

1. A responsabilidade civil que se imputa ao Estado por ato danoso de seus prepostos é objetiva (art. 37, § 6º, CF), impondo-lhe o dever de indenizar se verificar dano ao patrimônio de outrem e nexo causal entre o dano e o comportamento do preposto.

2.  Somente se afasta a responsabilidade se o evento danoso resultar de caso fortuito ou força maior ou decorrer de culpa da vítima.

3. Em se tratando de ato omissivo, embora esteja a doutrina dividida entre as correntes dos adeptos da responsabilidade objetiva e aqueles que adotam a responsabilidade subjetiva, prevalece na jurisprudência a teoria subjetiva do ato omissivo, de modo a só ser possível indenização quando houver culpa do preposto. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 2005b).

Assim, se o atraso decorrer da inobservância pelos agentes públicos, inclusive os magistrados, de quaisquer prazos processuais fixados pelo Código de Processo Civil, seja para realização de diligência, atos ou decisões, o Estado responderá objetivamente.


DIREITO ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - MOROSIDADE DO PODER JUDICIÁRIO - DEVER DE REPARAR OS PREJUÍZOS DECORRENTES DA DEMORA INJUSTIFICADA - DANOS MATERIAIS - AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL ENTRE OS PREJUÍZOS ALEGADOS E A CONDUTA DO AGENTE ESTATAL - DANOS MORAIS CONFIGURADOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DIREITO Á DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO. - O inciso LXXVIII do art. 5º, da C.Federal assegura a duração razoável do processo. - O Estado responde objetivamente pelos danos morais causados em decorrência da morosidade do Juiz monocrático em dar cumprimento à decisão deste Tribunal, que determinou a reintegração do postulante na posse do bem. - A responsabilidade objetiva do Estado não dispensa a demonstração da conduta do agente estatal, dos danos sofridos pelo administrado e da relação de causalidade entre ambos. - Inexistindo nexo causal entre os prejuízos materiais alegados e o descumprimento da decisão que determinou a reintegração do autor na posse do imóvel, resta afastada a indenização por danos materiais. - Demonstrados os danos morais sofridos pelo autor, deve ser indenizado. - Sendo a verba honorária insuficiente para remunerar o trabalho desempenhado pelo causídico, cabível a sua majoração. - Apelação principal provida em parte. - Apelação adesiva provida.(TJ-MG - AC: 10016130008507001 MG , Relator: Heloisa Combat, Data de Julgamento: 03/07/2014, Câmaras Cíveis / 4ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 11/07/2014)

 

Nesse sentido Francisco Fernandes de Araújo (1999, p.385) entende ser objetiva a responsabilidade do Estado. Vejamos:

 

A teoria da responsabilidade objetiva do Estado pelo dano decorrente da morosidade da prestação jurisdicional é a única que satisfaz ao sentimento de justiça que se revela no seio da sociedade moderna, como contrapartida dos tributos gerais pagos por ela, dentre os quais as taxas judiciárias que igualmente lhe são impostas, e também pelo fato de o Estado deter o monopólio da jurisdição, não permitindo a realização da justiça pelas próprias mãos dos particulares. Responsabilizar objetivamente o Estado pelo dano decorrente da morosidade da justiça é necessidade que se impõe, para que os preceitos constitucionais em vigor sejam efetivamente respeitados, dentre os quais os princípios da igualdade, da legalidade, da moralidade, da eficiência e da boa qualidade do serviço público e do acesso substancial à justiça. A medida também atuará como pressão efetiva para que o Estado cuide melhor da estrutura judiciária e da eficiência de seus juízes, e, portanto, servirá de alavanca para o aprimoramento geral da justiça do País, melhorando a qualidade de vida do seu povo, ideal permanente pelo qual todos têm o dever de lutar.

Contudo, percebemos que os Tribunais ainda se mostram resistentes em reconhecer a responsabilidade do Estado pela demora na prestação judiciária, ou quando reconhecido a controvérsia se a responsabilidade do Estado é objetiva ou subjetiva, em que se há necessidade de se provar a culpa do Estado, a que ser comprovada pela pessoa que sofre o dano, ou se apenas mostrar a relação de causalidade entre o ato do agente e o dano causado a vítima.

Há julgados controversos nesse sentido, vejamos:

 

Responsabilidade Objetiva do Estado. Ato do Poder Judiciário. A orientação que veio a predominar nesta corte, em face das Constituições anteriores à de 1988, foi a de que a responsabilidade objetiva do Estado não se aplica aos atos de Poder Judiciário a não ser nos casos expressamente declarados em lei. Precedentes do STF. Recurso extraordinário não conhecido.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATO JUDICIAL. PRESCRIÇÃO. AFASTAMENTO. DOLO OU CULPA GRAVE NO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE JURISDICIONAL PELO MAGISTRADO. NÃO VERIFICADAS. NÃO COMPROVAÇÃO DA CAUSA EFICIENTE NA CONSECUÇÃO DOS DANOS MORAIS. [...]. De forma excepcional, é de ser admitida a responsabilidade civil do Estado por ato judicial. Para tanto, mister seja comprovado o dolo ou a culpa grave do magistrado no exercício de sua jurisdição, bem como a relação direta entre a decisão e os danos suportados pela parte. No caso em concreto, inviável sustentar a presença de dolo ou de culpa grave na interpretação do magistrado a propósito da decisão imutável proveniente do Tribunal de Justiça. Outrossim, não há como estabelecer relação de causalidade direta entre a impossibilidade da satisfação do crédito pela autora e a demora na prestação jurisdicional, uma vez que a devedora já se encontrava em processo falimentar em momento anterior à decisão judicial (Tribunal de Justiça do Rio Grande do SulApelação Cível n° 70020334504, 26 de setembro de 2007)

 

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. MOROSIDADE JUDICIAL. MAIS DE 09 (NOVE) ANOS DE TRAMITAÇÃO PROCESSUAL. PRAZOS. INOBSERVADOS. INJUSTIFICADOS. DEVERES DO MAGISTRADO. LOMAN. DESATENDIDOS. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA EFICIÊNCIA. INOCORRÊNCIA. CULPA. NEGLIGÊNCIA. DEMONSTRAÇÃO. ACESSO À JUSTIÇA. CIDADANIA. NEGAÇÃO. PRESTAÇÃO JURISDICIONAL INTEMPESTIVA. DANO MORAL. PEDIDO. PROCEDÊNCIA.(Processo nº 200.2008.038.705-9
Juiz prolator : Aluízio Bezerra Filho, 30 de março de 2009)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO, POR ATO JUDICIAL. DEMORA NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. MOROSIDADE DA JUSTIÇA. DEVER DE INDENIZAR DO ESTADO. INOCORRÊNCIA.

1. O reconhecimento da responsabilidade objetiva do Estado pelos atos judiciais está subordinado à demonstração de ocorrência de dolo ou fraude do Magistrado. Aplicação do disposto no art. 5º, inc. LXXV da Constituição Federal. (AC 70057939928 RS, Paulo Roberto Lessa Franz, 30/01/2014)

 

DIREITO ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - MOROSIDADE DO PODER JUDICIÁRIO - DEVER DE REPARAR OS PREJUÍZOS DECORRENTES DA DEMORA INJUSTIFICADA - DANOS MATERIAIS - AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL ENTRE OS PREJUÍZOS ALEGADOS E A CONDUTA DO AGENTE ESTATAL - DANOS MORAIS CONFIGURADOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DIREITO Á DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO. (Apelação nº Nº 1.0016.13.000850-7/001, Heloisa Combate)

 

APELAÇÃO. AÇÃO ORDINÁRIA DE REPARAÇÃO DE DANOS. MOROSIDADE NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. EXTRAVIO DOS AUTOS. SENTENÇA CONCISA. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. REJEIÇÃO DAS PRELIMINARES. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO ESTADO PARA RESPONDER AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS EM RAZÃO DA DESÍDIA DOS SEUS AGENTES. PREAMBULAR LIGADA À FALTA DE INTERESSE DE AGIR. POSSIBILIDADE DE INSTAURAÇÃO DA RESTAURAÇÃO DOS AUTOS DE OFÍCIO. INTUITO DA AÇÃO. REPARAÇÃO DO DANO EM FACE DA DEMORA NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL E NÃO A RESTITUIÇÃO DOS AUTOS. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. INOCORRÊNCIA. NECESSIDADE DE ANUÊNCIA DO RÉU AO PEDIDO DE DESISTÊNCIA DO AUTOR APÓS O PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DA DEFESA DAQUELE. REJEIÇÃO DO PLEITO. PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO. MÉRITO (Apelação n.º 0047486-56.2006.8.05.0001, Emílio Salomão Pinto Resedá)

 

4. CONCLUSÃO

 

Conforme o exposto ao longo desta pesquisa é possível constatar inúmeros fatores agravantes da lentidão jurisdicional brasileira. Dentre eles, o grande aceleramento populacional em descompasso com as previsões jurídicas e disposições de órgãos é, de fato, uma constatação sob a qual não é possível reverte-la. Tendo em vista que, as previsões são estáticas e grande parte dos direitos referentes à morosidade se encontra na Constituição Brasileira de 1988, em contraponto, temos o fato de a sociedade ser complexa, evoluir e expandir em curto tempo, causando imensa irregularidade em acompanhar a evolução social juntamente com a evolução jurídica.

         Além da imensa propositura de ações decorrentes da sociedade complexada, há o que se falar também na prestação do judiciário para com os litigantes. O que teoricamente aparenta ser trabalho simples, os funcionários público demonstram dificuldades ao atendimento das ações de forma imediata. Sabendo da inúmera quantidade de demanda aos órgãos públicos, é previsão legal que se determinem prazos em dobro para tais órgãos, para que, de fato sejam atendidos os pedidos jurisdicionais.

         Em razão do exposto, no que tange a evolução social, de fato, não seríamos capazes de igualar o crescimento populacional com o crescimento jurídico-brasileiro. Todavia, a prestação do judiciário através de instruções ao funcionário público pode de certa forma passar por mudanças significativas nas ações jurisdicionais. Tais instruções podem ser realizadas através de uma melhor preparação ao estudante de direito e, futuro profissional representante do Estado. Prepará-los como conciliadores e pacificadores para que grande número de ações passe a ser resolvidas antes mesmo de entrar na “fila” da justiça.

         A realização de debates entre as partes, através de instruções do profissional do direito já seria uma alternativa para que muitos dos casos não tivessem ao menos necessidade de abertura para instrução de nova ação. Não havendo resposta aos debates realizados entre os litigantes, seria interessante buscar meios mais evoluídos para solucionar sem adentrar de fato no judiciário, através, por exemplo, do uso da mediação e arbitragem, que de fato demonstram uma resolução mais simples, rápida e com o mesmo valor legal e fundamentação técnica que uma ação judicial.

         Além disso, buscar meios de diminuir a entrada de ação aos Tribunais, como a propositura de criação de órgãos capazes de acelerar os julgamentos que tenham causas de matérias semelhantes, tornando-se assim Câmaras Especializadas, que de fato impeçam o adentramento de mais ações reduzindo o tempo e a apreciação que seriam tomados dos Tribunais em si.

         Em suma, a morosidade da Justiça brasileira é fato e embora haja previsão legal de que embora haja direitos previstos como meio de assegurar ao cidadão o direito à jurisdição, a tutela jurisdicional efetiva, à prestação jurisdicional em tempo razoável ou sem dilações indevidas. Porém, estas são disposições teóricas defendidas tanto pela doutrina como pelos tribunais. É fato que a demonstração de morosidade demasiada deve ser responsabilizada, há quem defenda que seja o próprio Estado, como quem diga que o Juiz do caso deve ser responsabilizado. Todavia, os abusos devem de qualquer forma gerar responsabilização a quem de fato dificultou a celeridade processual, porém, há muito que pode ser feito para que os casos de responsabilidade e morosidade processual sejam diminuídos na jurisdição atual.

         Por fim, no que tange a morosidade abusiva e ilegal por parte do Estado e funcionários, destaca Rui Barbosa em seu célere discurso em “Oração aos Moços”:

Justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta. Porque a dilação ilegal nas mãos do julgador contraria o direito escrito das partes, e, assim, as lesa no patrimônio, honra e liberdade. Os juízes tardinheiros são culpados, que a lassidão comum vai tolerando. Mas sua culpa tresdobra com a terrível agravante de que o lesado não tem meio   de reagir contra o delinqüente poderoso, em cujas mãos jaz a sorte do         litígio endente. Não sejais, pois, desses magistrados, nas mãos de quem os autos penam como as almas do purgatório, ou arrastam sonos esquecidos como as preguiças do mato. (BARBOSA, 1997. P.40)

  

REFERÊNCIAS

 

MELLO, Celso Antonio Bandeira. Curso de Direito Administrativo.32 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2015

PIERRÔ, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 28 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2015

PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 12 ed. São Paulo: Editora Método, 2014

ANNONI, Danielle. Responsabilidade do Estado pela não duração razoável do processo. Curitiba: Juruá, 2008

CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça (Tradução por Ellen Gracie Northfleet).Milão: Sergio, 1988.

JUCOVSKY, Vera Lúcia R. S. Responsabilidade civil do Estado pela demora na prestação jurisdicional. Curitiba: Juarez de Oliveira, 1999.

ARAÚJO, Francisco Fernandes. Responsabilidade Objetiva do Estado pela Morosidade da Justiça. Campinas: Copola, 1999.

LASPRO, Oreste Nestor. A responsabilidade civil do juiz. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

ZANFERDINI, Flávia. Prazo Razoável – Direito à Prestação Jurisdicional sem Dilações Indevidas. Porto Alegre: Síntese, 2003.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1988.

BRASIL. Lei 10.406 (2002). Código Civil. Brasília, DF, Senado, 2002

BRASIL. Lei 5.869 (1973). Código de Processo Civil. Brasília, DF, Senado, 1973

BRASIL. Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992. Brasília, DF, Senado, 1992.

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Em < http://www.stj.jus.br/SCON/> acesso em 21/10/2015.

JUSBRASIL. Em < http://www.jusbrasil.com.br/> acesso em 21/10/2015.

MOROSIDADE DO PODER JUDICIÁRIO: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO E DO JUIZ. Em < http://adilsonclayton.jusbrasil.com.br/artigos/233934245/morosidade-do-poder-judiciario-responsabilidade-civil-do-estado-e-do-juiz> acesso em 23/10/2015.


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