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Breves anotações sobre a eutanásia

Breves anotações sobre a eutanásia

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A eutanásia encontra-se disciplinada em países como Espanha, Alemanha e Portugal. No Brasil, sua tipificação tem sido feita nas disposições do homicídio privilegiado, considerando-a praticada por motivo de relevante valor moral.

1 INTRODUÇÃO

 

A prática de eutanásia tem sido alvo de severas discussões no âmbito do Direito Penal. A sua disseminação pelo mundo, sobretudo em face dos problemas médicos e bioéticos em que implica, tem mobilizado grandes debates acerca da sua licitude.

Derivada dos radicais gregos eu (belo, bom) e thanatos (morte), significando a ação médica de proporcionar uma morte doce e pacífica quando não restam esperanças de vida para o doente, a palavra eutanásia não foi cunhada por Francis Bacon no século XVII, como se pensou durante um bom tempo. Em verdade, ela aparece já, muito antes de Bacon, no livro A Vida dos Doze Césares, do escritor romano Suetônio (69-141 d.C.) que, ao tratar da biografia do segundo césar, Otávio César Augusto, refere-se a sua morte nos seguintes termos:

 

A morte que o destino lhe concedeu foi suave, tal qual sempre desejara: pois, todas as vezes que ouvia dizer que alguém morrera logo e sem padecimentos, almejava para si e para os seu (sic) igual “eutanásia” (conforme a palavra que costumava empregar). Não deu, antes de entregar a alma, senão um único sinal de perturbação mental, em virtude de um susto subitâneo; queixava-se que estava sendo arrebatado por quarenta rapazes. (SUETÔNIO, 198-?, p. 97)

 

Otávio César Augusto, segundo o registro de Suetônio, já utilizava a palavra eutanásia para se referir a uma morte “sem padecimento”, por ele desejada e alcançada, pois morreu apresentando “um único sinal de perturbação”, que foi a visão dos quarenta rapazes que o vinham conduzir para os labirintos da morte...

Somente com o transcurso do tempo, consagrou-se “o uso do termo para indicar a morte provocada, antecipada, por compaixão, diante do sofrimento daquele que se encontra irremediavelmente enfermo e fadado a um fim lento e doloroso” (VILLAS-BÔAS, 2005, p. 78).

Muito em função desse amplo emprego dado à palavra eutanásia, à qual também se associa a tradicional ideia de boa morte (MINAHIM, 2005, p. 178), surge uma grande dificuldade para sua abordagem, haja vista que o seu significado polissêmico gera diferentes compreensões (BINCAZ, 2001, p. 5-6). Tais divergências são consequência direta da interdisciplinaridade do tema, permitindo reflexões de natureza filosófica, médica, jurídica e religiosa. Na visão de Maria Auxiliadora Minahim, esse diálogo, embora útil e necessário, “contribuiu para os múltiplos sentidos dados à expressão, de forma que não constitui tarefa tranquila atribuir-se, ao termo eutanásia, um significado unívoco.”[1]

 


2 DISTANÁSIA, ORTOTANÁSIA E MISTANÁSIA

 

Antes de tratar das classificações possíveis para o fenômeno da eutanásia, se faz necessário apresentar outros termos que a ela são associados e que, em verdade, encerram manifestações diferentes.

O primeiro termo a ser considerado, a distanásia, vem a ser:

 

[...] a tentativa de retardar a morte o máximo possível, empregando, para isso, todos os meios médicos disponíveis, ordinários e extraordinários ao alcance, proporcionais ou não, mesmo que isso signifique causar dores e padecimentos a uma pessoa cuja morte é iminente e inevitável. (BARROSO; MARTEL, 2010, p. 179)                                 

Trata-se de um prolongamento artificial da vida do paciente cuja enfermidade, conforme as perspectivas científicas, não apresenta possibilidade de cura e de melhora, vislumbrando-se sua morte iminente. Segundo Pessini, “nesta conduta não se prolonga a vida propriamente dita, mas o processo de morrer”[2]. Aumenta-se o tempo de agonia do paciente, mesmo que disso lhe resulte mais dor. Villas-Bôas (2005) vai mais longe, ao afirmar que a distanásia corresponde a um “encarniçamento terapêutico”, face aos maus tratos gerados, sem que disso resulte qualquer benefício.

Em sentido contrário, na ortotanásia “trata-se da morte em seu tempo adequado, não combatida com os métodos extraordinários e desproporcionais utilizados na distanásia, nem apressada por ação intencional externa, como na eutanásia” (BARROSO; MARTEL, 2010, p. 179). Deixa-se que a vida siga seu curso normal, encontrando a morte ao seu tempo certo. Como bem assinalado por Villas-Bôas (2005, p. 73):

 

A ortotanásia tem seu nome proveniente dos radicais gregos: orthos (reto, correto) e thanatos (morte). Indica, então, a morte a seu tempo, a morte no tempo correto, nem antes nem depois da hora [...] Diz-se que não há encurtamento do período vital, uma vez que este já se encontra em inevitável esgotamento. Tampouco se recorrem a medidas que, sem terem o condão de reverter o quadro terminal, apenas resultariam em prolongar o processo de sofrer e morrer para o paciente e sua família.

 

No que respeita à ortotanásia, tem-se entendido que somente o médico pode provocá-la. Não se constituindo em abreviação da vida, mas sim no seu não prolongamento por meios artificiais, aceita-se a ideia de que o paciente não é obrigado a suportar um tratamento contra a sua vontade, o que desoneraria o médico do dever de impor as medidas tratativas a qualquer custo. A hipótese de ortotanásia ainda é criminalizada no Brasil, nada obstante as controvérsias e os embates jurídicos que tem suscitado.

Na mistanásia ou eutanásia social, fala-se de uma “morte miserável, transcendendo o contexto médico-hospitalar para atingir aqueles que nem sequer chegam a ter um atendimento médico adequado, por carência social, por falta de condições e de oportunidades econômicas e políticas” (VILLAS-BÔAS, 2005, p. 75). No seu âmbito também podem ser incluídas novas categorias, tais como a morte por erro médico, por má prática e por falta de assistência do Estado (MINAHIM, 2005, p. 185)[3].

 


3 ALGUMAS CLASSIFICAÇÕES

 

Apresentados esses três conceitos diferenciais, convém estabelecer um conceito de eutanásia. Costuma-se apresentá-la em diversas feições, conforme classificações que são feitas segundo os seguintes critérios: participação de terceiros (autônoma e heterônoma), motivação do autor (libertadora ou terapêutica, eugênica ou selecionadora e econômica), intervenção do sujeito ativo (direta e indireta), conduta do agente (ativa e passiva) e a vontade do doente (voluntária ou involuntária) (MINAHIM, 2005, p. 184-185; VILLAS-BÔAS, 2005, p. 86-87).  De todas elas, porém, prepondera o destaque dado a esta última classificação, que leva em conta o consentimento da vítima, bem como a que realça a participação de terceiros no desfecho.

No que toca à participação de terceiros, a eutanásia pode ser autônoma, quando dispensa a atuação de uma terceira pessoa, e heterônoma, quando terceira pessoa intervém, causando a morte. Nesta última modalidade é que atua o Direito Penal, com sua força criminalizadora (MINAHIM, 2005, p. 185).

Quanto à vontade do doente, fala-se em eutanásia voluntária e involuntária, a primeira significando o consentimento da vítima, “em gozo pleno de sua capacidade” (VILLAS-BÔAS, 2005, p. 83), e a segunda expressando a ausência desse consentimento, ou seja, sua realização é decidida por outra pessoa que não o interessado.

Assim, o consentimento do doente e o comportamento positivo do agente se mostram presentes na definição de eutanásia apresentada por Barroso e Martel (2010, p. 178), para quem:

 

Compreende-se que a eutanásia é ação médica intencional de apressar ou provocar a morte – com exclusiva finalidade benevolente – de pessoa que se encontre em situação considerada irreversível e incurável, consoante os padrões médicos vigentes, e que padeça de intensos sofrimentos físicos e psíquicos.

 

Os autores consideram a eutanásia como uma ação médica intencional e benevolente, ou seja, somente poderia ser praticada por pessoa regularmente habilitada para o exercício da medicina. Trata-se da chamada eutanásia ativa. Além disso, a ação tem que ser intencional, causada com a intenção de levar à morte do paciente. A motivação benevolente é a que visa libertar o paciente do sofrimento que o abate, do mal causado pela enfermidade.

A doença há de ser irreversível e incurável, sendo certa a morte do sujeito graças a ela. Além disso, é necessário que se padeçam “intensos sofrimentos físicos e psíquicos”, que devem aparecer cumulativamente com a enfermidade incurável.

Conforme alertam os autores, “do conceito estão excluídas a assim chamada eutanásia passiva, eis que ocasionada por omissão, bem como a indireta, ocasionada por ação desprovida da intenção de provocar a morte”. Pela mesa forma, “não se confunde, tampouco, com o homicídio piedoso, conceito mais amplo que contém o de eutanásia” (BARROSO; MARTEL, 2010, p. 178).

De um modo geral, as legislações têm considerado a prática da eutanásia não apenas por médicos, mas por qualquer pessoa que atue conforme os critérios fixados acima, como se depreenderá dos dados apresentados a seguir.

 


4 LEGISLAÇÃO ESTRANGEIRA

 

O primeiro país da América Latina a tratar mais brandamente os casos de eutanásia foi o Uruguai. Já em 1933, o código penal daquele país previu a presença da piedade, por meio de súplicas reiteradas da vítima, como causa de perdão judicial no então chamado “homicídio piedoso” (VILLAS-BÔAS, 2005, p. 155). A Bolívia também admite o perdão judicial, prevendo a possibilidade de substituição por pena alternativa (VILLAS-BÔAS, 2005, p. 157), bem como o código penal da Colômbia, de 1936, também previu causa semelhante, embora a previsão tenha sido posteriormente retirada. Segundo informa Villas-Bôas (2005, p. 156):

 

[...] somente em maio de 1997, em sentença que ultrapassou cento e cinquenta páginas, a corte colombiana decidiu, por seis votos contra três, a exclusão da penalidade para os médicos que cometessem a “eutanásia piedosa, permitindo ao paciente uma morte digna”. Por “eutanásia piedosa” entendeu-se a hipótese de eutanásia passiva voluntária, então traduzida como a suspensão de meios extraordinários de sustentação da vida, em caso de pacientes cuja terapêutica se revela fútil, com sua anuência. Aproximou-se, portanto, da definição de ortotanásia. 

Nos Estados Unidos, as orientações se modificam conforme o estado. Oregon, por exemplo, admite o auxílio a suicídio de pacientes terminais, mas não a eutanásia ativa; a Califórnia reconhece o direito do paciente de recusar tratamento que o mantém vivo; Connecticut, em 1985, passou a aceitar a suspensão de suporte vital.

A legislação portuguesa pune a eutanásia no seu artigo 133º, embora o nomen juris do tipo seja homicídio privilegiado. Eis a dicção do dispositivo legal:

 

Quem matar outra pessoa dominado por compreensível emoção violenta, compaixão, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral, que diminuam sensivelmente a sua culpa, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos.[4]

 

A hipótese de eutanásia se amolda, em Portugal, ao motivo de relevante valor moral, qual acontece no Brasil. Mata-se com a finalidade de libertar o outro da constrição causada pela doença incurável e seu sofrimento atroz, ou seja, atendendo-se a um interesse de caráter pessoal.

Também é possível amoldá-la à figura prevista no artigo 134º, que trata do homicídio a pedido “sério, instante e expresso”. Seria, no caso, o pedido sério, instante e expresso de quem padece de doença incurável e sofrimento intenso que não se possa suavizar. Não se pode esquecer, como já frisado, que a eutanásia pode ser considerada uma modalidade de homicídio a pedido, caracterizada pela motivação específica, mas que pensar assim não atende aos critérios de precisão e de taxatividade da lei penal.

A Espanha trata da eutanásia no item 4 do artigo 143 do Código Penal Espanhol, nos seguintes termos: 

Artigo 143.

 

4. O que causar ou cooperar ativamente com atos necessários e diretos para a morte de outro, atendendo pedido expresso, sério e inequívoco deste, nos casos em que a vítima sofra uma enfermidade grave que conduzirá necessariamente a sua morte, ou que produza graves padecimentos permanentes e difíceis de suportar, será castigado com pena inferior as penas previstas nos números 2 e 3 deste artigo, reduzidas de um a dois terços.[5]

 

O tipo legal incriminador abre espaço para importantes reflexões.

Inicialmente há uma limitação dos casos que devem ser considerados como de eutanásia. O primeiro deles é a presença de “enfermidade grave que conduzirá necessariamente a sua morte”. Trata-se de doença incurável, para a qual a medicina não acena com perspectiva curativa, sendo certo que a pessoa morrerá daquele mal. Pouco importa o tempo de vida que ainda resta ao doente: sendo certo que a enfermidade não possui cura, autoriza-se a morte.

O segundo critério é o grave padecimento permanente e difícil de suportar. Veja-se que não há restrição ao tipo de padecimento, se físico ou psíquico: basta que seja permanente, ou seja, duradouro e irremediável, sem solução de continuidade, e que seja difícil de suportar, que se revele superior às forças do indivíduo. A avaliação quanto à capacidade de suportar é subjetiva, já que cada um sendo um, não é possível estabelecer uma “quantidade de sofrimento” suportável.

Digno de nota é a alternatividade entre os dois critérios acima referidos. A lei espanhola diz: “nos casos em que a vítima sofra uma enfermidade grave que conduzirá necessariamente a sua morte, ou que produza graves padecimentos permanentes e difíceis de suportar”. Foi destacada a conjunção alternativa ou que, no texto, expressa que a eutanásia pode ser praticada em um ou outro caso, quando é frequente condicionar a sua aceitação à presença dos dois critérios: doença incurável e sofrimento insuportável. Desta forma, o legislador espanhol foi inovador, admitindo a necessidade de um só desses motivos, associado aos demais requisitos do tipo, para autorizar a prática.

O terceiro requisito legal é a presença de um pedido expresso, sério e inequívoco. A vontade do que padece tem de estar claramente demonstrada, sem que haja margem para dúvida quanto ao que realmente se deseja – a morte –, bem como o pedido deve emanar de pessoa capaz de compreender o alcance da autorização que presta. Perceba-se que o consentimento do ofendido, aqui, é ponto fulcral da conduta, sem o que pode se enquadrar em outra forma de homicídio.

Em verdade, o número 4 deste artigo foi tratado, pelo legislador espanhol, como uma privilegiada, embora com feições de causa de diminuição de pena, das modalidades dos números 2 e 3 que tratam, respectivamente, das chamadas cooperação com o suicídio e cooperação executiva ao suicídio. Caso o autor pratique quaisquer daquelas condutas em relação a quem se ajuste à hipótese do número 4, serão aplicadas as penas da mera cooperação ou da cooperação executiva, respectivamente, sempre reduzidas de um a dois terços. Trata-se de norma penal em branco de complementação homóloga homovitelina, pois a identificação do comportamento criminoso somente se faz com o recurso a outros dispositivos do próprio Código Penal Espanhol, bem como norma penal incompleta ou imperfeita, já que remete às penas dos referidos tipos para se encontrar a aplicável ao caso.

Atente-se, ainda, que a redução de pena se dá não apenas em função do motivo privilegiador, mas também do consentimento do ofendido. A solicitação para morrer é reflexo deste, constituindo-se em elemento indispensável da definição típica.

Na legislação alemã, como visto no tópico anterior, o artigo 216 trata da hipótese de homicídio a pedido, uma fórmula genérica, que costuma ser aplicada ao aqui considerado como eutanásia desde que, como na legislação portuguesa, a motivação da vítima seja o padecimento insuportável ou a doença incurável.

Na Suíça, “a eutanásia não é beneficiada por norma absolutória, constituindo um tipo de homicídio privilegiado, desde que praticado para abreviar os sofrimentos de um doente agonizante, movido pela caridade, a piedade ou sob efeito de confusão mental” (MINAHIM, 2005, p. 203). O tratamento dado à eutanásia, naquele país, é o mesmo conferido no Brasil.

 


5 LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

 

A prática de eutanásia não encontra expressa criminalização no Brasil. Maria Auxiliadora Minahim (2005) noticia a existência de quatro tentativas de reforma legislativa para tratar do assunto, em 1984, 1994, 1998 e 1999. Contudo, todas elas foram infrutíferas, esbarrando ou na burocracia legislativa, ou na natural dificuldade de enfrentamento do assunto, pela pressão de diversos segmentos sociais e políticos.

Na atual sistemática do CPB, quem mata outrem, ainda que a pedido, comete o crime de homicídio (art. 121), não havendo maiores considerações no que respeita ao consentimento de quem morre. A única hipótese que poderá configurar homicídio privilegiado (art. 121, §1º) é o motivo de relevante valor moral, dentro do qual se pode enquadrar a eutanásia.

Considera-se a piedade ou a compaixão com a situação de sofrimento alheia como motivo de relevante valor moral, que é sempre voltado para as razões de um indivíduo considerado em si. Assim, aquele que mata a outrem atendendo a seu pedido, por piedade ou compaixão diante de sua doença incurável e que lhe proporciona sofrimento insuportável, pratica homicídio privilegiado.

Entretanto, o ajustamento da eutanásia ao homicídio privilegiado não se coaduna com o princípio da taxatividade. É, em verdade, um enquadramento que merece ser revisto, reformulado.

O Anteprojeto de Código Penal apresentado ao Congresso Nacional em 2012 e assinado por juristas como Gilson Dipp e Luiz Flávio Gomes, apresenta uma proposta de tipificação da eutanásia em seu artigo 122, com a seguinte redação:

 

Eutanásia

Art. 122. Matar, por piedade ou compaixão, paciente em estado terminal, imputável e maior, a seu pedido, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável em razão de doença grave:

 

Pena – prisão, de dois a quatro anos.

 

§ 1º O juiz deixará de aplicar a pena avaliando as circunstâncias do caso, bem como a relação de parentesco ou estreitos laços de afeição do agente com a vítima. 

Exclusão de ilicitude

§ 2º Não há crime quando o agente deixa de fazer uso de meios artificiais para manter a vida do paciente em caso de doença grave irreversível, e desde que essa circunstância esteja previamente atestada por dois médicos e haja consentimento do paciente, ou, na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão.[6]

 

Os elementos que definem a proposta de tipificação da eutanásia não fogem ao que se encontra em legislações estrangeiras. Pune-se a forma direta, presentes a doença grave e o sofrimento insuportável, privilegiando-se o consentimento da vítima ao se requerer a presença do seu pedido. A pena aplicada é consideravelmente menor do que a atual previsão do homicídio privilegiado, cujo mínimo pode chegar a 04 (quatro) anos e o máximo, a 13 (treze) anos e 04 (quatro) meses de prisão.

Quanto ao sujeito ativo do crime, não há previsão de que somente o médico possa praticá-lo. Fala-se em “matar”, sem a especificação de qualidade especial para o agente. Trata-se de crime comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa, independentemente de quaisquer condições.

Digna de transcrição é a justificativa dos autores do Anteprojeto para os termos da criminalização proposta, retirada da sua Exposição de Motivos:

 

Não se discrepou, portanto, da solução encontrada na maior parte dos ordenamentos jurídicos ocidentais: reconhecer que é crime, mas merecedor de sanção distinta e mais branda do que a reservada ao homicídio. Inovação de maior espectro é permitir o perdão judicial, em face do parentesco e dos laços de afeição entre autor e vítima. Saberá a prudência judicial sindicar quando a pena, nestes casos, a exemplo do que pode ocorrer no homicídio culposo, é mesmo necessária.[7]

 

Assim, optou-se pela criminalização, mas não sem a abertura de uma “janela” para deixar impune o agente: a hipótese de perdão judicial do parágrafo único. Trata-se da possibilidade de deixar de aplicar a pena avaliando-se “as circunstâncias do caso, bem como a relação de parentesco ou estreitos laços de afeição do agente com a vítima”.

A leitura atenta da disposição do parágrafo primeiro revela que não é somente quando presente a relação de parentesco ou a afeição estreita entre vítima e agente que o perdão tem lugar. Abre-se margem ao livre alvedrio do juiz na análise da situação específica e sua conveniência, haja vista que prevê a avaliação das circunstâncias do caso concreto, bem como da afeição e do parentesco.

A expressão “bem como” significa “e também”, “além de”, “da mesma forma que”. Em verdade, a proposta cria duas possibilidades de perdão judicial: a existência de parentesco ou afeto estreito com a vítima e qualquer outra circunstância, cuja relevância será aferida pelo juiz no caso concreto. Ao que parece, este detalhe não foi devidamente observado pelos autores do Anteprojeto, que parecem sugerir haver perdão judicial apenas na primeira situação.

Quanto à exclusão de ilicitude prevista no parágrafo segundo, a Exposição de Motivos apresenta a seguinte justificativa:

 

Ortotanásia não é eutanásia. Prática médica aceita pelo Conselho Federal de Medicina, a ortotanásia não implica na prática de atos executórios de matar alguém, mas no reconhecimento de que a morte, a velha senhora, já iniciou curso irrevogável. Convém citar a Resolução 1.805/2006, daquele Conselho: “Art. 1º É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal. § 1º O médico tem a obrigação de esclarecer ao doente ou a seu representante legal as modalidades terapêuticas adequadas para cada situação.§ 2º A decisão referida no caput deve ser fundamentada e registrada no prontuário. § 3º É assegurado ao doente ou a seu representante legal o direito de solicitar uma segunda opinião médica. Art. 2º O doente continuará a receber todos os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, assegurada a assistência integral, o conforto físico, psíquico, social e espiritual, inclusive assegurando-lhe o direito da alta hospitalar”. Refrear artificialmente o falecimento, nestes casos, é retirar da pessoa o direito de escolher o local e o modo como pretende se despedir da vida e dos seus. Não há espaço para o Direito Penal, nesta situação. Impede-o a dignidade da pessoa humana, aqui num sentido despido da vulgarização que se dá a este essencial conceito. Morrer dignamente é uma escolha constitucionalmente válida. A proposta da Comissão é torná-la também legalmente válida.[8]

 

O parágrafo segundo prevê a exclusão de ilicitude nos casos de ortotanásia. Visa àquelas situações em que se reconhece a presença de doença grave e irreversível, cujo tratamento apenas teria o efeito de prolongar a vida do paciente. Constitui a atitude de deixar a morte chegar “no tempo certo”, com a suspensão dos meios artificiais tendentes a promover o seu retardamento.

A excludente somente se aplicaria quando a doença incurável e irreversível fosse assim atestada por dois médicos. A opinião de pelo menos dois garantiria maior segurança em relação ao diagnóstico, o que não afastaria a possibilidade de o paciente requerer outras opiniões.

Além disso, deve estar presente o consentimento do paciente ou, na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão. Tal consentimento deverá ser expresso, claro e devidamente consciente, alcançando a plena compreensão das consequências da doença e dos efeitos irremediáveis da suspensão do seu tratamento.

Conforme justificam os autores do Anteprojeto, não haveria, em sua opinião, execução da morte, mas tão somente o reconhecimento de que essa “velha senhora” teria iniciado seu curso irrevogável. Justifica-se, ainda, com base no direito de “morrer dignamente”, constitucionalmente garantido, embora sem um maior detalhamento do que seria dignidade “num sentido despido da vulgarização que se dá a este essencial conceito”.

Tal previsão do Anteprojeto, conquanto se proponha inovadora, se revela polêmica e sem uma fundamentação sólida e inatacável. Primeiramente, por não se ajustar plenamente à cultura social e legal do país. O tema não foi suficientemente discutido nos diversos segmentos sociais, o que contribui para a confusão de conceitos e, consequentemente, para sua rejeição. Ademais, a legitimação da ortotanásia com base na dignidade da pessoa humana foi feita de forma frágil e sofrível na Exposição de Motivos, não oferecendo um adequado lastro dogmático, doutrinário e axiológico.

Outra crítica pode ser lançada em face da justificativa apresentada: o fato de ter se baseado em uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM). Toma-se uma recomendação de classe, um mero ato administrativo, como se tivesse força descriminalizante da prática pelo fato de recomendar aos médicos o respeito à vontade dos pacientes. Ainda que se considere válido o respeito à autonomia individual neste caso, o argumento mais adequado não é o fato de ser recomendado em uma resolução do CFM, cuja força normativa não é a mesma de uma lei, mas sim em atenção à vontade do paciente.

No que tange à resolução nº 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina, seu objetivo é dar um mínimo de suporte jurídico à conduta médica diante da recusa dos pacientes ao tratamento na fase final de enfermidades graves e incuráveis. Em função disso, propôs uma disciplina da ortotanásia. Trata-se de um instrumento normativo de natureza deontológica. O objetivo da Resolução, conforme texto de sua ementa, é garantir que:

 

Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal.[9]{C}

 

Sem fazer qualquer menção à eutanásia, a Resolução, como dito, tratou da limitação de tratamento e dos cuidados paliativos[10] de enfermos terminais, sem dispensar a devida autorização do próprio doente ou, na sua impossibilidade, de quem pudesse decidir por ele.

No entanto, das suas previsões ficam algumas dúvidas, que permanecem insolúveis: que se deve entender por “procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente”? A administração de alimentação e soro devem ser considerados cuidados paliativos ou procedimentos que prolongam a vida? Tais questionamentos vão ao encontro do cuidado que se deve ter com os mais vulneráveis, que tendem a ficar cada vez mais expostos a interpretações que levam em conta fatores econômicos, como escassez de recursos e falta de leitos nas UTI’s.

Ainda no âmbito da deontologia médica, o Conselho Federal de Medicina publicou, em 09 de agosto de 2012, a Resolução nº 1.995, que dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade dos pacientes[11]. Tais diretivas são definidas como o “conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade”[12]. Trata-se de garantir que a autonomia de sua vontade seja respeitada, ainda que no momento da tomada de decisão, encontre-se incapacitado de manifestá-la.

Com base em sua normatização, mais uma vez privilegia-se a possibilidade de aceitação da ortotanásia, já justificada pela resolução anterior.


6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A eutanásia encontra-se disciplinada em países como Espanha, Alemanha e Portugal. No Brasil, sua tipificação tem sido feita nas disposições do homicídio privilegiado, considerando-a praticada por motivo de relevante valor moral.

O Conselho Federal de Medicina, através das resoluções 1.805/2006 e 1.995/2012, vem tentando disciplinar, no âmbito da deontologia médica, a ortotanásia e as diretivas de vontade do paciente, buscando-se respeitar o seu direito de não receber tratamentos que prolonguem demasiadamente suas vidas, nos casos em que a morte seja inevitável. Entretanto, a hipótese específica da eutanásia, em que se causa a morte de alguém que padece intenso sofrimento ocasionado por doença grave e incurável e pede para morrer, permanece repercutindo na esfera do Direito Penal, reclamando sua tipificação.

Assim, reconhece-se a necessidade premente do Direito Penal brasileiro debruçar-se, de forma mais detida, a eutanásia, a fim de oferecer disciplina jurídica adequada, retirando certas hipóteses, como a ortotanásia, do âmbito de regulamentações meramente administrativas para uma disciplina legal efetiva.


REFERÊNCIAS

 

 

ANTEPROJETO DE CÓDIGO PENAL. Disponível em: <http://s.conjur.com.br/dl/anteprojeto-codigo-penal.pdf>. Acesso em: 10 jul. 12.

 

BARROSO, Luís R.; MARTEL, Letícia de C. V. “A morte como ela é: dignidade e autonomia individual no final da vida”. In BARBOZA, Heloísa H.; MENEZES, Rachel A.; PEREIRA, Tânia da S. Vida, morte e dignidade humana. Rio de Janeiro: GZ Ed., 2010.

 

BINCAZ, Maria Beatriz Azzolini. “Invervención en la eutanasia: ¿participación criminal o colaboracion humanitaria?” In ARANDA, Enrique D.; LIZALDE, Eugenia M. de; VALLE, Fernando C. Eutanasia: aspectos jurídicos, filosóficos, médicos y religiosos. México: Universidad Nacional Autonoma del México, 200, p. 5-15.

 

CÓDIGO PENAL ALEMÃO. Disponível em: <http://www.juareztavares.com/textos/leis/cp_de_es.pdf>. Acesso em: 08 nov. 12.

 

CÓDIGO PENAL BRASILEIRO. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em: 12 mar. 12.

 

CÓDIGO PENAL ESPANHOL. Disponível em: http://pdf.rincondelvago.com/codigo-penal-espanol-de-1995.html.

 

CÓDIGO PENAL PORTUGUES. CÓDIGO PENAL PORTUGUÊS. Disponível em: <http://www.hsph.harvard.edu/population/domesticviolence/portugal.penal.95.pdf>. Acesso em: 10 jul 2012.

 

MINAHIM, Maria A. Direito Penal e biotecnologia. São Paulo: RT, 2005.

 

PESSINI, Léo. “Distanásia: até quando investir sem agredir?”. Disponível em: <http://www.ufpel.tche.br/medicina/bioetica/DISTAN%C1SIA%20-%20AT%C9%20QUANDO%20INVESTIR%20SEM%20AGREDIR.PDF>. Acesso em: 05 nov. 12.

 

RESOLUÇÃO CFM Nº 1.805/2006. Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2006/1805_2006.htm>. Acesso em 05 nov. 12.

 

RESOLUÇÃO CFM Nº 1.995/2012. Disponível em: http://www.legisweb.com.br/legislacao/?legislacao=244750. Acesso em: 10 nov. 12. 

SUETÔNIO, A Vida dos Doze Césares. Rio de Janeiro: Ediouro, [198-?].

 

VILLAS-BÔAS, Maria Elisa. Da eutanásia ao prolongamento artificial: aspectos polêmicos na disciplina jurídico-penal do final de vida. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

 

 


Notas

[1] A esse respeito, ainda esclarece Maria Auxiliadora Minahim, na mesma página da referida obra: “A multiplicidade de significados classicamente atribuídos está, sobretudo, vinculada tanto aos fundamentos quanto aos limites da ‘boa morte’, ou seja, a que fins ela deve servir, quando pode ser praticada, havendo certo consenso quanto ao fato de que tal morte deva apresentar-se como alternativa digna a uma vida dolorosa, razão por que a analgesia ganha destaque em certos conceitos. Não existe, no entanto, precisão sobre o que se deve entender como alternativa digna, já que a interpretação será feita pelo ouvinte à luz de seus valores. Isto significa que as características, que devem estar presentes para que um fato seja considerado como eutanásia, podem resultar de convicções particularizadas. Por isso mesmo, a expressão já foi usada pelos nazistas para justificar a eliminação das vidas sem alma ou indignas de serem vividas (as dos doentes mentais).” (MINAHIM, 2005, p.178)

[2] PESSINI, Léo. “Distanásia: até quando investir sem agredir?”. Disponível em: <http://www.ufpel.tche.br/medicina/bioetica/DISTAN%C1SIA%20-%20AT%C9%20QUANDO%20INVESTIR%20SEM%20AGREDIR.PDF>. Acesso em: 05 nov. 12.

[3] É ainda a mesma autora quem aduz, na mesma página: “Se, no entanto, a atenção necessária para manter a vida não é prestada porque há uma recusa deliberada em investir recursos no tratamento de certas enfermidades, denomina-se o fato como eutanásia eugênica, cujo sentido etimológico está ligado a aperfeiçoamento da espécie ia seleção genética e controle da reprodução”.

[4] CÓDIGO PENAL PORTUGUÊS. Disponível em: <http://www.hsph.harvard.edu/population/domesticviolence/portugal.penal.95.pdf>. Acesso em: 08 nov. 12.

[5] “4. El que causare o cooperare activamente con actos necesarios y directos a la muerte de otro, por la petición expresa, seria e inequívoca de éste, en el caso de que la víctima sufriera una enfermedad grave que conduciría necesariamente a su muerte, o que produjera graves padecimientos permanentes y difíciles de soportar, será castigado con la pena inferior en uno o dos grados a las señaladas en los números 2 y 3 de este artículo.” (CÓDIGO PENAL ESPANHOL. Disponível em: http://pdf.rincondelvago.com/codigo-penal-espanol-de-1995.html).

[6] ANTEPROJETO DE CÓDIGO PENAL. Disponível em: <http://s.conjur.com.br/dl/anteprojeto-codigo-penal.pdf>. Acesso em: 10 nov. 12.

[7] ANTEPROJETO DE CÓDIGO PENAL. Disponível em: <http://s.conjur.com.br/dl/anteprojeto-codigo-penal.pdf>. Acesso em: 10 nov. 12.

[8] ANTEPROJETO DE CÓDIGO PENAL. Disponível em: <http://s.conjur.com.br/dl/anteprojeto-codigo-penal.pdf>. Acesso em: 10 nov. 12.

[9] RESOLUÇÃO CFM Nº 1.805/2006. Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2006/1805_2006.htm>. Acesso em 05 nov. 12.

[10] Segundo Barroso e Martel, o cuidado paliativo é “voltado à utilização de toda a tecnologia possível para aplacar o sofrimento físico e psíquico do enfermo. Evitando métodos extraordinários e excepcionais, procura-se aliviar o padecimento do doente terminal pelo uso de recursos apropriados para tratar os sintomas, como a dor e a depressão. O cuidado paliativo pode envolver o que se denomina duplo efeito: em determinados casos, o uso de algumas substâncias para controlar a dor e a angústia pode aproximar o momento da morte. A diminuição do tempo de vida é um efeito previsível sem ser desejado, pois o objetivo primário é oferecer o máximo conforto possível ao paciente, sem intenção de ocasionar o evento morte”. (BARROSO; MARTEL, “A morte como ela é...”, p. 179-180)

[11] RESOLUÇÃO CFM Nº 1.995/2012. Disponível em: http://www.legisweb.com.br/legislacao/?legislacao=244750. Acesso em: 10 nov. 12.

[12] RESOLUÇÃO CFM Nº 1.995/2012. Disponível em: http://www.legisweb.com.br/legislacao/?legislacao=244750. Acesso em: 10 nov. 12.


Autor

  • Pedro Camilo de Figueirêdo Neto

    Mestre em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia (2012). Graduado em DIREITO pela UFBA (2006) e especialista em Ciências Criminais pela UFBA (2008). Advogado. Ex-diretor do Centro de Observação Penal, da Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Estado da Bahia (2007-2009). Ex-membro suplente do Conselho Penitenciário do Estado da Bahia (2011). Professor Auxiliar da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Professor convidado do Programa de Pós-graduação "latu sensu" da Faculdade de Direito da UFBA, da FTC da cidade de Itabuna, Bahia e das Faculdades Maurício de Nassau. Professor da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Campus V. Professor da Faculdade Ruy Barbosa e das Faculdades Maurício de Nassau, em Salvador, Bahia. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Penal, atuando principalmente nos seguintes temas: direito penal e processual penal.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FIGUEIRÊDO NETO, Pedro Camilo de. Breves anotações sobre a eutanásia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4741, 24 jun. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/50027. Acesso em: 29 mar. 2024.