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Questões relevantes sobre a mudança de sobrenome em virtude do casamento: nome de solteira ou nome de casada?

Questões relevantes sobre a mudança de sobrenome em virtude do casamento: nome de solteira ou nome de casada?

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A alteração do sobrenome em virtude do casamento por quaisquer dos nubentes pode suprimir algum dos sobrenomes? Quais as consequências e burocracias envolvidas na troca de nome?

                    Antes da vigência da lei civil em vigor, a mulher era obrigada a acrescentar, ao seu sobrenome, após o casamento, o nome de família do marido. Mais tarde, com a Lei do Divórcio, foi admitido que a inclusão do sobrenome do marido ao da esposa fosse facultativa. Atualmente, o Código Civil autoriza que qualquer dos nubentes acrescente o sobrenome do futuro cônjuge ao seu nome de família. Inclusive, ambos podem acrescer, ao seu sobrenome, o do nome de família do outro.

                    Observe-se que a lei civil permite a inserção de sobrenomes ao nome de solteiro dos cônjuges, mas não trata da supressão deles. Da mesma forma ocorre com a Lei de Registros Públicos, que, também, apenas autoriza expressamente a inclusão de sobrenomes em virtude do casamento. Por conta disso, surge a dúvida sobre a possibilidade de um dos cônjuges (ou ambos) suprimir o seu nome de família (o nome de solteiro), adotando o nome de família do seu consorte, em razão do casamento.

                    Há variações de posicionamento quanto a esse tema em cada estado. Em São Paulo, o provimento 25 da Corregedoria Geral prevê que “qualquer um dos cônjuges poderá acrescer ao seu o sobrenome o do outro, vedada a supressão total do nome de solteiro”. Portanto, em São Paulo, se o nubente possuir mais de um sobrenome antes de se casar, poderá acrescentar o nome de família do cônjuge, suprimindo um (ou mais de um) dos seus nomes de família, desde que reste, em seu nome, pelo menos um de seus patronímicos de solteiro. Por outro lado, se o futuro consorte possuir apenas um sobrenome antes de se casar, não poderá exclui-lo, utilizando apenas o nome de família do seu cônjuge para compor seu nome de casado.

                    O Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) também já vem admitindo a supressão dessa maneira, arguindo que, para isso, é preciso que exista justificativa e que não haja prejuízo de terceiros. No Recurso Especial nº 910094 / SC (2006/0272656-9) julgado pelo STJ, acolheu-se a justificativa da autora da ação, que pretendia suprimir o patronímico materno em virtude de ter sido rejeitada pela família da mãe. Em outro caso (Ac. 3ª T., Resp 662.799, rel. Min. Castro Filho, j, 8.11.05, DJU 28.1.05, p.0279), o STJ manifestou preocupação não apenas com a preservação de direitos de terceiros, mas também com a referência à ancestralidade. Isto é, entendeu socialmente relevante a possibilidade de identificação da origem familiar do indivíduo.

                    Cumpre observar que os nubentes devem decidir sobre a alteração do sobrenome durante a fase de habilitação para o casamento, informando ao Cartório de Registro Civil competente o nome que passarão a usar a partir do matrimônio. Em face disso, uma dúvida que surge é se seria possível que os cônjuges incluíssem os nomes de família um do outro após a fase de habilitação, ou seja, depois da celebração do casamento.

                    Apesar de não haver previsão legal expressa sobre essa possibilidade, a jurisprudência a tem admitido. Porém, nesse caso, não basta que os cônjuges informem sua intenção ao cartório de Registro de Pessoas Naturais como ocorre na fase de habilitação. Para modificação do sobrenome após a celebração do casamento, é necessário mover uma ação para que se obtenha autorização judicial nesse sentido.  Busca-se, assim, identificar justos motivos que embasem a inclusão. Visa-se, ainda, proteger o interesse de terceiros e evitar fraudes. Afinal, alterações sucessivas de sobrenomes poderiam, por exemplo, dificultar a identificação e localização de devedores por seus credores.

                    Verificando os julgados, é possível observar que há dois motivos que mais levam à propositura de ações para inclusão de nomes de família dos cônjuges após a celebração do casamento. O primeiro, refere-se à identificação com o nome dos filhos. Afinal, dependendo do nome de casado adotado na ocasião da celebração do casamento e do nome de família dado aos filhos, o sobrenome dos consortes e dos filhos podem tornar-se muito diferentes, causando inconvenientes relativos à identidade. O segundo motivo costuma ser o casamento no exterior. Após a celebração do casamento em país estrangeiro e sua validação no Brasil, é comum que os cônjuges ingressem com ações judiciais para que possam alterar seus nomes de solteiros, incluindo o nome de família de seus consortes.

                    E se, ao contrário, um dos consortes decidisse adotar o sobrenome do outro durante a habilitação do casamento, e, após a celebração do casamento, pretendesse excluir o nome inserido? Isto seria possível? Esses casos ainda não são tão recorrentes, mas já é possível encontrar alguns julgados sobre o assunto. Em São Paulo, o entendimento majoritário tem sido no sentido de admitir a exclusão. Uma das justificativas mais comuns está relacionada à dificuldade na identificação da pessoa no âmbito profissional depois do início da utilização do nome de casada. Na hipótese de modificação do nome para exclusão do patronímico do cônjuge, também se exige autorização judicial, sendo demonstrada a ausência de prejuízo a terceiros e justo motivo.

                    Na realidade, na prática, não se tem exigido provas contundentes a respeito de justos motivos para a modificação. A preocupação dos julgadores tem sido maior em relação à possibilidade de prejuízo de terceiros. Por essa razão, nos processos que têm a alteração do nome como objeto, é comum a requisição de apresentação de documentos como certidões de protestos de títulos, de distribuidores cíveis, da justiça estadual e federal, eleitorais, trabalhistas, militares e de execuções fiscais

                    É de conhecimento geral a necessidade de atualização do novo nome adotado nos documentos pessoais. A carteira de identidade deve ser atualizada junto ao órgão expedidor. Em São Paulo, é possível realizar a modificação no Poupatempo. Por sua vez, o CPF pode ser alterado em agências do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal, Correios e na Receita Federal. O título de eleitor deve ser alterado em cartório eleitoral, enquanto a CNH deve ser atualizada junto ao DETRAN. Por fim, o passaporte deve ser modificado junto à Polícia Federal. No que se refere ao passaporte, é importante observar que é possível continuar sua utilização mesmo sem que sejam feitas as atualizações pertinentes quanto ao nome de casado (ou nome de casada), desde que apresentada, conjuntamente, a certidão de casamento e que o passaporte ainda esteja válido. Contudo, a partir do momento em que o passaporte perder a validade, será necessária a atualização do sobrenome no novo passaporte expedido. Também é importante que a atualização seja feita em planos de saúde, bancos, cartões de crédito, contas de consumo, apólices de seguro, entre outros. Trata-se de medida de segurança para evitar ações de fraudadores e prejuízo a terceiros. Não é raro que os nubentes, após a celebração do casamento, ao depararem-se com esses trâmites burocráticos, arrependam-se da modificação do nome. Contudo, cumpre destacar que a inconveniência desses procedimentos não é aceita como justificativa para exclusão do nome de família do cônjuge. 


Autor

  • Erika Nicodemos

    Advogada atuante na área cível, sócia do escritório Erika Nicodemos Advocacia, graduada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Especialista em Direito da Propriedade Intelectual pelo Centro de Extensão Universitária, em convênio com a Universidad Austral de Buenos Aires. Pós-graduada em Direito Empresarial e especialista em Direito Digital e Planejamento Sucessório pela Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas. Mestre em Direito Internacional Privado pela Università degli Studi di Roma – La Sapienza. Mestranda em Direito Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Membro efetivo da Comissão de Direito de Família e das Sucessões da Ordem dos Advogados do Brasil, São Paulo.

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