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Direitos desde a concepção

Direitos desde a concepção

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O presente artigo científico fará alusões sobre nascituros. O propósito deste é apresentar diversas elementares sobre nascituros; mencionando desde fatores históricos, conceitos, teorias, até o modo que o ordenamento jurídico brasileiro faz alusão a estes

Resumo: O presente artigo científico fará alusões sobre nascituros. O propósito deste é apresentar diversas elementares sobre nascituros; mencionando desde fatores históricos, conceitos, teorias, até o modo que o ordenamento jurídico brasileiro faz alusão a estes.

Palavras-chave: Direitos; Teorias; Nascituros; Ordenamento Jurídico.

Abstract: The following scientific paper mentions unborn children. The purpose of this is to present insights regarding unborn children; mentioning historical factors, concepts, theories, and even the way that the Brazilian legal system alludes to them.

Key words: Rights; Theories; Unborn children; Juridical order.

1- Introdução

Não é novidade no mundo jurídico que a questão sobre os nascituros vem sendo debatida por diversos doutrinadores; surgem questões problematizando desde (onde se inicia a vida) até quais direitos este suposto (ser) pode possuir. Tratando-se de questões que acabam gerando grandes querelas, o Supremo Tribunal Federal Brasileiro (órgão máximo do Poder Judiciário), deu um parecer sobre tal assunto.

 

2 – Precedentes Históricos

 

Desde os primórdios da existência da humanidade, o ser humano sentiu que possuía uma (certa vantagem) sobre os animais; muitos para explicar essa (vantagem), buscam diversas fontes, inclusive uma passagem Bíblica para exemplificar tal fenômeno:

(Sejam fecundos, multipliquem-se, encham e submetam a terra; dominem os peixes do mar, as aves do céu e todos os seres vivos que rastejam sobre a terra) Gênesis 1:28.

Seguindo essa corrente, Protágoras menciona:

“O homem é a medida de todas as coisas”

 

Norteando-se por essas teorias como ideias fundamentais, tem-se a noção de que o homem só cria direitos para suas criações (exemplo: Pessoas Jurídicas) e para si mesmo. Uma prova concreta de que tal pensamento, condiz com a realidade é que no ordenamento jurídico brasileiro os animais são denominados como coisas semoventes (Código Civil artigo 82). E em outros ordenamentos jurídicos como o Alemão, os animais não são coisas semoventes, Helena Telino Neves Godinho, escreve sobre isso:

A Alemanha, em 1990, introduziu no BGB o §90a, o qual também afirma que os animais não são coisas, estão protegidos por leis especiais e que se aplicam as disposições acerca das coisas de forma análoga sempre e quando não estiver estabelecido de outro modo.

 

Como já mencionado, o (homem) cria leis para se salvaguardar; contudo a questão que trata sobre qual o momento que este é possuir de direitos, acaba gerando diversas dúvidas e querelas; geralmente coaduna com questões patrimoniais. Seguindo esta linha; desde os Romanos (que contribuíram infinitamente em vários ordenamentos jurídicos) já mencionavam sobre isso (pro iam nato habetur quotiens de eius commodus agitur- Tal passagem menciona sobre direitos patrimoniais); Semião(200,p46) menciona:

“Manifesta-se assim vacilante, o Direito Romano, quanto ao início da existência da pessoa e da personalidade. Em algumas vezes era reconhecida personalidade ao nascituro; em outras, se estabelecia uma personalidade condicional, colocando-se a salvo os seus direitos, sob a condição de que nascesse viável, consoante o brocardo: “ Nasciturus pro jam nato habetur Quoties de ejus commodis agitur ”. Em outras ainda, considerava-se criança não viável como despida de personalidade e finalmente, às vezes, negava-se personalidade aos monstros ou crianças nascidas sem forma humana.

 

3 - Significados

Nascituro:

(Aquele que irá nascer que foi gerado e não nasceu ainda).

(É o ser já concebido e que está pronto para nascer, mas que ainda está no ventre materno).

(O ente que está gerado ou concebido, tem existência no ventre materno: está em vida intrauterina. Mas não nasceu ainda, não ocorreu o nascimento dele, pelo que não se iniciou sua vida como pessoa. Embora o nascituro, em realidade não se tenha como nascido, porque como tal se entende aquele que se separou, para ter vida própria, do ventre materno, por uma ficção legal é tido como, para que a ele se assegurem os direitos que lhe cabem, pela concepção).

De Plácido e Silva

 

 

4 - Teoria

Existem várias teorias, que remetem sobre os nascituros e desde quando estes são possuidores de direitos; algumas destas teorias são:

Concepcionista:

 (Nascituro é aquele que está dentro do ventre materno e ainda não nasceu, mas é considerado ser desde a concepção); existem defensores desta teoria como:

(Ser humano já concebido, em estado de feto, e que ainda, não veio à luz. Aquele que está concebido e cujo nascimento se espera como fato futuro certo).

José Naufel

(o direito de nascer, a proteção jurídica à vida do nascituro existem na sua plenitude, antes do nascimento).

(O nascimento com vida apenas consolida o direito patrimonial, aperfeiçoando-o. O nascimento sem vida atua, para a doação e a herança, como condição resolutiva, problema que não se coloca em se tratando de direitos não patrimoniais. De grande relevância, os direitos da personalidade do nascituro, abarcados pela revisão não taxativa do art. 2º. Entre estes, avulta o direito à vida, à integridade física, à honra e à imagem, desenvolvendo-se cada vez mais a indenização de danos pré-natais, entre nós com impulso maior depois dos Estudos de Bioética).

(Juridicamente, entram em perplexidade total aqueles que tenham de afirmar a impossibilidade de atribuir capacidade ao nascituro ‘por este não ser pessoa’. A legislação de todos os povos civilizados é a primeira a desmenti-lo. Não há nação que se preze (até a China) onde não se reconheça a necessidade de proteger os direitos do nascituro (Código chinês, art. 1º). Ora, quem diz direitos, afirma capacidade. Quem afirma capacidade, reconhece personalidade)

Silmara J. A. Chinelato e Almeida

(Não há como explicar que o nascituro possa ter o direito de estado de filho (artigos 337, 338,353 e 458 C.C.), direito a curatela (artigos 458 e 462 C.C.), à representação (artigos 462 C.C, 383,V, e 385 C.C.) e, ainda, posse em seu nome (artigos 877 e 878 CPC), entre outros, sem que seja considerado pessoa).

Sergio Abdala Semião

 (O nascituro é um ente já concebido que se distingue de todo aquele que não foi ainda concebido e que poderá ser sujeito de direito no futuro, dependendo do nascimento, tratando-se de uma prole eventual. Essa situação nos remete à noção de direito eventual, isto é, um direito em mera situação de potencialidade, de formação, para quem nem ainda foi concebido. É possível ser beneficiado em testamento o ainda não concebido. Por isso, entende-se que a condição de nascituro extrapola a simples situação de expectativa de direito).

Sílvio de Salvo Venosa

 

Natalista:

(O nascituro não pode ser considerado pessoa, pois exige-se o nascimento com vida, com isso, o nascituro não teria direitos, mas mera expectativa de direitos, condicionado ao nascimento com vida). Alguns defensores desta teoria são:

(No útero, a criança não é pessoa, se não nasce viva, nunca adquiriu direitos, nunca foi sujeito de direitos, (...). Todavia, entre a concepção e o nascimento, o ser vivo pode achar-se em situação tal que se tem de esperar o nascimento para se saber se tem algum direito, pretensão, ação, ou exceção lhe deveria ter tido. Quando o nascimento se consuma, a personalidade começa).

Pontes de Miranda

 

(No instante em que principia o funcionamento do aparelho cardiorrespiratório, clinicamente aferível pelo exame de docimasia hidrostática de Galeno, o recém-nascido adquire personalidade jurídica, tornando-se sujeito de direito, mesmo que venha a falecer minutos depois).

Stolze e Pamplona Filho (2007, p.81)

(O nascituro é mera expectativa de pessoa, por isso, tem meras expectativas de direito, e só é considerado como existente desde sua concepção para aquilo que lhe é juridicamente proveitos).

Sérgio Semião Abdala

 

O autor Flávio Tartuce, explana sobre a teoria natalista:

(Do ponto de vista prático, a teoria natalista nega ao nascituro até mesmo os seus direitos fundamentais, relacionados com a sua personalidade, caso do direito à vida, à investigação de paternidade, aos alimentos, ao nome e até à imagem. Com essa negativa, a teoria natalista esbarra em dispositivos do Código Civil que consagram direitos àquele que foi concebido e não nasceu. Essa negativa de direitos é mais um argumento forte para sustentar a total superação dessa corrente doutrinária

 

5 - Artigo 2 do Código Civil de 2002

 

O Código Civil Brasileiro (Lei No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002), menciona sobre o início da personalidade em sua artigo 2.

 

Cujo seu conteúdo é formado por querelas, inicialmente adere a teoria natalista (nascimento com a vida), e em sua parte final a teoria concepcionista, quando menciona em seu texto (Mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro).

Mas antes de nascerem com vida (para analisar se o indivíduo nasceu com vida ou não, é feita a Docimasia hidrostática de Galeno)

(Trata-se de medida pericial, de caráter médico-legal, aplicada com a finalidade de verificar se uma criança nasce viva ou morta e, portanto, se chega a respirar).

Os nascituros possuem os direitos de personalidade civil, logo estes possuem alguns direitos como: vida, higidez física, proteção, nome, sepultura, alimentos gravídicos;

 Sergio Abdala Semião menciona:

(Os direitos do nascituro, para não afrontarem o caráter universal dos direitos do nascido, para não contradizerem a 1ª parte do Artigo 2° do C., e para protegerem seus prováveis interesses durante o período da gestação, restringem-se e limitam-se àqueles que são especificadamente previstos na lei. É a taxatividade dos direitos do nascituro).

 

Silmara A. Chinelato tece o seguinte comentário:

(Direito à vida, à integridade física, à saúde – direitos absolutos, erga omnes – e o direito a alimentos).

Maria Helena Diniz discorre:

 

(Se o embrião ou feto, desde a concepção, é uma pessoa, tem direito à vida, (...). Se o feto pudesse falar, perguntaria: porque não tenho direito de nascer? Urge que a humanidade progrida, caminhando na direção de princípios que permitam ao homem ser cada vez mais homem, vendo respeitado o seu direito fundamental, intocável e inalienável à vida e, consequentemente, o seu direito de nascer).

 

Silvio Rodrigues, ensina:

(Dentre os direitos subjetivos de que o homem é titular pode-se facilmente distinguir duas espécies diferentes, a saber: uns que são destacáveis da pessoa de seu titular e outros que não o são. Assim, por exemplo, a propriedade ou o crédito contra um devedor constituem direito destacável da pessoa de seu titular; ao contrário, outros direitos, há que são inerentes à pessoa humana e, portanto, a ela ligados de maneira perpétua e permanente, não se podendo mesmo conceber um indivíduo que não tenha direito à vida, à liberdade física ou intelectual, ao seu nome, ao seu corpo, à sua imagem e àquilo que ele crê ser sua honra. Estes são os chamados direitos de personalidade. Tais direitos, por isso que inerentes à pessoa humana, saem da órbita patrimonial, portanto são inalienáveis, intransmissíveis, imprescritíveis e irrenunciáveis).

 

Em outros artigos, o Código Civil, também faz alusões ao direito de personalidade civil dos nascituros; alguns exemplos podem ser encontrados nos artigos 1609 e no 1779:

Art. 1.609. O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito:

I - no registro do nascimento;

II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório;

III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;

IV - por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.

Art. 1.779. Dar-se-á curador ao nascituro, se o pai falecer estando grávida a mulher, e não tendo o poder familiar.

Parágrafo único. Se a mulher estiver interdita, seu curador será o do nascituro.

A lei de Alimentos Gravídicos (Lei 11.804 De 5 DE NOVEMBRO DE 2008) , e o Estatuto da Criança e Adolescente, mencionam:

 Art. 2o  Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes. 

        Parágrafo único.  Os alimentos de que trata este artigo referem-se à parte das despesas que deverá ser custeada pelo futuro pai, considerando-se a contribuição que também deverá ser dada pela mulher grávida, na proporção dos recursos de ambos.

 Art. 6o  Convencido da existência de indícios da paternidade, o juiz fixará alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da criança, sopesando as necessidades da parte autora e as possibilidades da parte ré. 

        Parágrafo único.  Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão. 

 

Estatuto da Criança e Adolescente:

Art. 8. É assegurado a gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendimento pré e perinatal.

Art. 26. Os filhos havidos fora do casamento poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou separadamente, no próprio termo de nascimento, por testamento, mediante escritura ou outro documento público, qualquer que seja a origem da filiação.

        Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou suceder-lhe ao falecimento, se deixar descendentes.

Assim disposto, é possível observar que o nascituro, é pessoa desde a sua concepção; logo o mesmo deve possuir condições dignas desde o ventre materno. Tratando-se de condições dignas de vida, o artigo 7 do Estatuto da Criança e Adolescente relata:

(A criança e o adolescente têm direito à proteção à vida e a saúdo, mediante a efetivação de políticas públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência).

O Pacto de San José da Costa Rica, ratificado no Brasil em setembro de 1992, estabelece no Capítulo 2, artigo 4:

{C}(1.     Toda pessoa tem direito a que respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente).

 Como mencionado, no Pacto de San José da Costa Rica, ninguém pode privar-se da  vida arbitrariamente; seguindo essa atenuante, surge a questão do aborto; questão que gera muitos debates tórridos. Sobre o aborto(como já mencionado, questão que gera uma grandes debates), surgem várias correntes citando, algumas razões para este ser permitido ou não; os que tendem mais para um lado religioso, mencionam algumas palavras para explicarem porque são contrários, e um exemplo dessas passagens são:

(Vocês não sabem que são templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vocês? Se alguém destrói o templo de Deus, Deus o destruirá. Pois o templo de Deus é santo, e esse templo são vocês).

1 Carta aos Coríntios capítulo3, versículos 16 e 17.

 

O aborto é tipificado como crime, e em algumas circunstâncias a realização de tal ação é permitida; alguns artigos do Código Penal Brasileiro dizem respeito sobre.

 Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: Pena - detenção, de um a três anos.

Art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de três a dez anos.

Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da gestante

        Pena - reclusão, de um a quatro anos.

        Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou debil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência

Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas      causas, lhe sobrevém a morte.

        Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico

        Aborto necessário

        I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;

        Aborto no caso de gravidez resultante de estupro

        II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

Sobre esta questão, alguns autores ainda mencionam:

“O bem jurídico protegido na incriminação do aborto é a vida do ser humano em formação. O objeto material do crime é o feto humano vivo.”

Aníbal Bruno

O artigo 128 do Código Penal menciona que o aborto pode ser permitido em duas hipóteses; quando o feto for vítima de estupro ou quando este gerar grande risco de saúde a gestante, essas duas hipóteses são permitidas baseando-se na seguinte premissa; se um feto é proveniente de estupro, sua mãe (genitora) não possui esse feto de boa vontade, de agrado, de alvedrio, logo obriga-la a manter este durante todo o período da gestação( normalmente nove meses) e posteriormente (para a vida toda) causará grandes desagrados a esta, pois aquele ser, foi proveniente de uma violência, e por vias das dúvidas, caso esta não pudesse retirar esse feto; será que o princípio da Dignidade da Pessoa Humana presente no artigo 1, inciso 3 da Constituição Federal Vigente( CF/88) não seria ignorado, desrespeitado de uma forma gravíssima?.

Em relação a segunda hipótese, quando tal tratamento terapêutico (o aborto, não possui, mas nome de aborto e nem é tipificado como crime); é autorizado pois o feto gera riscos de saúde a gestante, parte da seguinte premissa; a gestante já é uma (vida formada), e o feto ainda não, logo se este, causa risco de saúde a sua gestante, preferencialmente é realizada a escolha pela vida da gestante e retirada do feto.

Vale ressaltar que no dia 13 de Abril de 2012, foi votado no Supremo Tribunal Federal (STF), que a retirada de um feto anencéfalo com o acompanhamento de um médico não é tipificada como crime; esta foi uma decisão do STF com oito (8) votos condizentes com o parecer favorável; a decisão do STF é baseada na seguinte premissa:

(O feto sem cérebro, mesmo que biologicamente vivo, é juridicamente morto, não gozando de proteção jurídica e, principalmente, de proteção jurídico-penal). 

 O relator do caso o Ministro Marco Aurélio Mello menciona algumas palavras sobre a decisão:

(Nesse contexto, a interrupção da gestação de feto anencefálico não configura crime contra a vida – revela-se conduta atípica)

(No ponto, são extremamente pertinentes as palavras de Padre Antônio Vieira com as quais iniciei este voto. O tempo e as coisas não param. Os avanços alcançados pela sociedade são progressivos. Inconcebível, no campo do pensar, é a estagnação. Inconcebível é o misoneísmo)

Padre Antônio Vieira disse-nos: 'E como o tempo não tem, nem pode ter consistência alguma, e todas as coisas desde o seu princípio nasceram juntas com o tempo, por isso nem ele, nem elas podem parar um momento, mas com perpétuo moto, e resolução insuperável passar, e ir passando sempre'.

Sermão da Primeira Dominga do Advento.

“[O aborto do feto anencéfalo] é um direito que tem a mulher de interromper uma gravidez que trai até mesmo a ideia-força que exprime a locução ‘dar à luz’. Dar à luz é dar à vida e não dar à morte. É como se fosse uma gravidez que impedisse o rio de ser corrente”.

Ministro: Ayres Britto

 

Celso de Melo menciona:

  Que a gravidez de anencéfalo: "não pode ser taxada de aborto". "O crime de aborto pressupõe gravidez em curso e que o feto esteja vivo. E mais, a morte do feto vivo tem que ser resultado direto e imediato das manobras abortivas. [...] A interrupção da gravidez em decorrência da anencefalia não satisfaz esses elementos."

(No feto anencefálico, o cérebro sequer começa a funcionar. Então não há vida em sentido técnico e jurídico. De aborto não se trata)

Luís Roberto Barroso, advogado defensor da interrupção da gravidez de anencéfalo no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF)

(No caso de extermínio do anencéfalo encena-se a atuação avassaladora do ser poderoso superior que, detentor de toda força, infringe a pena de morte a um incapaz de prescindir à agressão e de esboçar lhe qualquer defesa).

Ministro Cezar Peluso

 

                                 6-Personalidade Jurídica

Como já citado no artigo, os nascituros desde a sua concepção passam a gozar de alguns direitos; estes como mencionados, muitas vezes acabam gerando grandes querelas nas doutrinas. Porem no ordenamento jurídico brasileiro, principalmente no Código Civil(LEI No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002.); fica claro em seu artigo segundo(A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro), que os nascituros possuem desde sua concepção os direitos de personalidade civil; mas é necessário que este (ser) venha a ser concebido com vida para que possa ser (digno) de direitos patrimoniais. Mas surgem questões, de qual o momento ou a partir de quando é comprovada a vida e assim os nascituros podem gozar inteiramente da personalidade; porem o Direito não é o responsável por aferir qual é esse momento; o responsável para aferir este momento é a Medicina.

Esta vai dizer a partir de quando o ser nasceu com vida, para isso nos dias atuais a Medicina utiliza do procedimento da Docimásia Hidrostática de Galeno; essa menciona:

"A palavra docimasia tem origem no grego dokimasia e no francês docimasie (experiência, prova).
  

(Trata-se de medida pericial, de caráter médico-legal, aplicada com a finalidade de verificar se uma criança nasce viva ou morta e, portanto, se chega a respirar.

Após a respiração o feto tem os pulmões cheios de ar e quando colocados num vasilhame com água, flutuam; não acontecendo o mesmo com os pulmões que não respiram. Se afundarem, é porque não houve respiração; se não afundarem é porque houve respiração e, consequentemente, vida. Daí a denominação docimasia pulmonar hidrostática de Galeno.

No âmbito jurídico a docimasia é relevante porque contribui para a determinação do momento da morte, pois se a pessoa vem à luz viva ou morta, as consequências jurídicas serão diferentes em cada caso).

(Docimásia hidrostática de Galeno, que consiste em colocar o pulmão da criança morta em uma solução líquida; se flutuar é sinal que a criança chegou a dar pelo menos uma inspirada e, portanto, nasceu com vida; se afundar, é sinal que não chegou a respirar e, portanto, nasceu morta, não recebendo e nem transmitindo direitos. Atualmente a medicina dispõe de técnicas mais modernas e eficazes para tal constatação).

Em determinados casos, o procedimento da Docimásia Hidrostática de Galeno é ineficaz para analisar se o nascituro nasceu com vida ou não; logo para resolver tal eventualidade é adotado outro procedimento. 

Sérgio Abdalla Semião, menciona que:

"[…] na eventual impossibilidade da utilização desse método principal de investigação (se por acaso o pulmão do neonato já vier impregnado de líquido), outras técnicas são aplicáveis, como a docimasia pulmonar histológica (verificação dos alvéolos pulmonares, pois, se houve respiração, apresentarão dilatação uniforme e, caso contrário, as paredes alveolares estarão coladas), docimasia óptica de Icard (exame microscópico de fragmento de pulmão, esmagado em uma lâmina, quando, ao observar pequenas bolhas de ar na película esmagada deduz-se a respiração), docimasia química de Icard (passagem rápida de fragmento do pulmão em álcool absoluto, a seguir, mergulhado em solução alcoólica de potássio cáustico a 30%, que dissolve o estroma pulmonar, liberando bolhas de ar, no pulmão que respirou, docimasia radiográfica de Bordas (exame radiográfico dos pulmões, que se mostrarão opacos - se não respiraram - ou transparentes - se receberam oxigênio), docimasia epimicroscópica pneumo-arquitetônica (exame da superfície externa dos pulmões) e as docimásias respiratórias indiretas (verificação de outros órgãos, como estômago, intestinos, fígado e ouvidos - trompas de Eustáquio - conjuntamente com os pulmões, para tentar constatar se houve ar circulando no corpo do nascituro)".

Tendo a noção de que a Medicina é a ciência responsável por aferir em qual momento o nascituro, nasceu com vida ou não; cabe a esplêndida ciência do Direito afirmar que se estes nasceram com vida, são possuidores da personalidade jurídica. Logo além dos direitos que já são concedidos desde sua concepção, os nascituros podem gozar dos direitos patrimoniais; estes que por inúmeras vezes acaba sendo o (problema) das coisas.

Em alguns momentos alguns indivíduos querem saber se o nascituro nasceu com vida, apenas pelas questões patrimoniais que este ser vai possuir; pois em alguns casos e em algumas pessoas as questões patrimoniais acabam falando mais alto do que a existência da própria vida. Norteados por essa questão, de um mundo com cada vez mais com um pensamento individualista, egoísta, globalizado apenas em sentidos econômicos; pois os motivos sociais, de compreensão e respeito a outros (modelos) de culturas estão sendo cada vez mais sucumbidos pelo capital.

A história nos mostra que em determinados momentos, que ocorreram catástrofes por causa de interesses econômicos; e ainda nos dias atuais isso vem ocorrendo. Cada dia mais os possuidores de maiores capitais acabam dominando os instrumentos de dominação e aplicando sobre os menos favorecidos, assim por consequência, cada vez mais desigualdades.

Como já mencionado no artigo, o dinheiro acaba falando mais alto e superando a noção e alguns princípios como fraternidade, igualdade, liberdade, compaixão com o próximo; e pensar que alguns dos princípios mencionados já foram (bandeiras) de um grande movimento revolucionário (Revolução Francesa), que lutou bravamente para defendê-los. Ou será que este também não foi mais uma forma de uma classe que possuía capital e não conseguia crescer, se (dar bem), e passar a ter (prestígio).

Sendo assim, o Direito utópico com a noção de justiça que tantos sonham, acaba caindo por terra. Karl Marx chega a dizer que o Direito é um instrumento de dominação das classes dominantes.

Thomas Hobbes menciona:

(O homem é o lobo do homem).

Rousseau, diz:

(O homem é bom por natureza, mas a sociedade o corrompe; Rousseau ainda menciona que o conceito do Bom Selvagem acaba quando surge a propriedade privada).

(Que a conduta de vocês não seja inspirada pelo amor ao dinheiro. Cada um fique satisfeito com o que tem, pois Deus disse: Eu nunca deixarei você, nunca o abandonarei).

Hebreus, capítulo 13, versículo 5

Porém, isso é uma questão mais filosófica; uma questão mais para reflexão do ser humano do que para o ordenamento jurídico. Este apenas vai mensurar a partir de quando e quais os direitos podem e devem ser atribuídos aos nascituros.

  

7 - Conclusão

Norteando-se pelas considerações apresentados, chaga-se a conclusão de que o Código Civil de 2002, em seu artigo 2°, deixa salvo os direitos e garantias que os nascituros possuem desde a sua concepção.

Que estes possuem alguns direitos como a vida, higidez física; que são salvaguardadas desde a concepção dos nascituros, que se forem violadas (exceto quando o ordenamento jurídico permite) são tidas como típicas e puníveis.

Contudo por mais que haja polêmicas e controvérsias; fica claro que o ordenamento jurídico visa proteger a vida a cima de todas as coisas; dando assim uma incrível importância ao princípio da dignidade da pessoa humana.

 

 Referências Bibliográficas

Brasil. Código Penal Brasileiro. Vade Mecum. 21. ed. Atual e ampliada. São Paulo: Saraiva 2016

Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil. Vade Mecum. 21. ed. Atual e ampliada. São Paulo: Saraiva 2016

Disponível em:

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