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RPPS-PEC 287/16: a perda da qualidade de dependente e a vedação da reversão da cota individual aos demais beneficiários

RPPS-PEC 287/16: a perda da qualidade de dependente e a vedação da reversão da cota individual aos demais beneficiários

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Quanto mais estudamos o texto da PEC 287/16, mais encontramos curiosidades a respeito de suas disposições. Uma delas é o fato de não ser mais possível a reversão, aos demais beneficiários, da cota individual de quem perder a qualidade de dependente.

Quanto mais estudamos o texto da PEC 287/16, mais encontramos curiosidades a respeito de suas disposições. Em recente reunião com o amigo e grande professor Malcon Robert, ele chamou atenção a um interessante detalhe que envolve o benefício da pensão por morte no texto da PEC.

Trata-se do fato de não ser mais possível a reversão, aos demais beneficiários, da cota individual de quem perder a qualidade de dependente.

Ora, pelo novo critério de cálculo estabelecido na PEC 287/16, a pensão será igual a uma cota familiar de 50%, acrescida de cotas individuais de 10% por dependente, até o limite de 100%.

Para bem nos situarmos na questão, vejamos o que diz o novo texto emprestado ao §7º do art. 40 da CF/88, pela PEC 287/16:

 “§ 7º Na concessão do benefício de pensão por morte, cujo valor será equivalente a uma cota familiar de 50% (cinquenta por cento), acrescida de cotas individuais de 10 (dez) pontos percentuais por dependente, até o limite de 100% (cem por cento), não será aplicável o estabelecido no § 2º do art. 201 e será observado o seguinte:

I - na hipótese de óbito do aposentado, as cotas serão calculadas sobre a totalidade dos proventos do servidor falecido, respeitado o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social;

II - na hipótese de óbito de servidor em atividade, as cotas serão calculadas sobre o valor dos proventos aos quais o servidor teria direito caso fosse aposentado por incapacidade permanente na data do óbito, observado o disposto no inciso I do § 3º, e no § 3º-A deste artigo, respeitado o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social;

III - a identidade do rol de dependentes, as condições necessárias para o enquadramento e a qualificação dos dependentes estabelecidos para o regime geral de previdência social;

IV - as cotas individuais cessarão com a perda da qualidade de dependente e não serão reversíveis aos demais beneficiários; e

V - o tempo de duração da pensão por morte e as condições de cessação das cotas individuais serão estabelecidos conforme a idade do beneficiário na data de óbito do segurado, na forma prevista para o regime geral de previdência social.”

Após detida leitura, abstrai-se do texto legal que, se um servidor aposentado com proventos de R$ 4.000,00, falecer deixando esposa e 2 filhos menores de 21 anos, os dependentes terão direito a uma cota familiar de 50% somada a 3 cotas individuais de 10% cada, ressaltando em 80%.

Assim, teremos uma cota de 80% que deverá recair sobre o valor dos proventos de aposentadoria que o falecido servidor percebia. Destarte, 80% de R$ 4.000,00, corresponde a R$ 3.200. Este valor de R$ 3.200,00 dividido por 3 dependentes resultará em R$ 1.066,66, para cada.

Ocorre que, pelo texto da PEC, na nova redação do inciso IV, §7º do art. 40 da CF/88, as cotas individuais cessarão com a perda da qualidade de dependente e não mais serão reversíveis aos demais beneficiários.

Pois bem, é exatamente neste ponto que reside a questão fundamental abordada no presente artigo e que foi objeto da oportuna advertência feita pelo ilustre professor Malcon Robert, para quem dedicamos este trabalho.

Afinal de contas, o que significa a expressão “cota individual” no contexto da proibição de sua reversão para os demais beneficiários? Seria a cota individual de 10% definida no referido §7º, ou seria a cota individual pertencente a cada dependente após o rateio do valor final da pensão?

O questionamento é de fundamental importância, uma vez que poderemos ter consequências bem distintas a depender da resposta encontrada.

Desta feita, passemos às conclusões ou inconclusões deste curioso e instigado autor:

a) se a cota individual a que se refere o inciso IV do §7º, for a de 10%, então, na medida em que um beneficiário perder a qualidade de dependente, o cálculo terá que ser refeito para a exclusão da sua cota individual de 10%.

Ora, pela forma como vem redigido o texto, o intérprete pode ser levado a esta conclusão, uma vez que o §7º, em seu cabeçalho, define as cotas individuais como aquelas de 10% por dependente. Desta forma, poderá haver aqueles que compreendam que a cota que deverá ser extinta com a perda da qualidade de segurado é esta de 10%, estabelecida no novo critério de cálculo da pensão.                   

Assim sendo, tomando por base o caso concreto apresentado no início deste artigo, com a saída de um dos dependentes, sobrariam uma cota familiar de 50% e duas individuais de 10% cada, integralizando 70% sobre o valor dos proventos de aposentadoria do servidor falecido (R$ 4.000,00 x 70% = R$ 2.800,00). Neste caso, teríamos a quantia de R$ 2.800,00 a ser dividida entre os dois dependentes remanescentes, no valor de R$ 1.400,00, para cada.

Aqui, com a saída de um dos dependentes, a cota individual originária de R$ 1.066,66, aumentaria para R$ 1.400,00. Seria, evidentemente, mais vantajoso para os dependentes e mais caro para o regime.

b) por outro lado, se a cota individual a que se refere o inciso IV do §7º, for interpretada como aquela pertencente a cada dependente já após o rateio do valor final da pensão, aí teremos outro resultado, pois agora seria extinta a parcela final já calculada e rateada para cada dependente.

Aqui, a mordida seria maior e prejudica mais os beneficiários remanescentes, que permaneceriam apenas com suas cotas individuais já rateadas. Seria mais vantajoso para o regime.

Tomando por base, mais uma vez, o caso concreto apresentado no início deste artigo, teríamos que o valor final de R$ 3.200,00 dividido por 3 dependentes resultaria em R$ 1.066,66, para cada. 

E se um dos beneficiários perdesse a qualidade de dependente, a cota individual a ser extinta, seria a do valor de R$ 1.066,66, já definida e rateada.

Neste caso, a economia para o Regime de Previdência seria bem maior, pois se extinguiria aqui um terço do valor da pensão.

Obviamente, nos parece que o objetivo do Governo, embora empregando a expressão “cotas individuais” de forma confusa, é o de aplicar a segunda interpretação.

Assim, a perda da qualidade de dependente cessa a cota individual em acepção ampla, isto é, aquela resultante da pensão já calculada e rateada entre os beneficiários, por trazer maior economia ao regime.

Ademais disso, pelo texto do cabeçalho do §7º, nos parece que a cota individual de 10% por dependente, assim como a familiar de 50%, entram em cena apenas no momento do cálculo original da pensão, nele exaurindo seu papel, não havendo margem para novos ajustes de cálculo a cada 10% extinto, na medida em que cada dependente venha a perder tal qualidade.  

Sem sobre de dúvidas, o governo sempre adotará a compreensão que melhor atender à sua cruel tarefa de mitigar ou extinguir os ganhos sociais.  


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SERTÃO, Alex. RPPS-PEC 287/16: a perda da qualidade de dependente e a vedação da reversão da cota individual aos demais beneficiários. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5048, 27 abr. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/56868. Acesso em: 29 mar. 2024.