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A função sócio ambiental da propriedade na Constituição de 1988

A função sócio ambiental da propriedade na Constituição de 1988

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Esta monografia analisará a propriedade rural quanto à preservação de áreas florestais, do solo, da água e da diversidade biológica, no relacionado à problemática de propriedades inseridas em espaços territoriais especialmente protegidos.

1 INTRODUÇÃO

Esta monografia fará uma análise da propriedade situada em áreas rurais e nas implicações colocadas pela legislação ambiental e pela Constituição Federal, de 05 de outubro de 1988 referentes basicamente à preservação de áreas florestais, do solo, da água e da diversidade biológica, no relacionado à problemática de propriedades inseridas em espaços territoriais especialmente protegidos.

Ao iniciarmos a análise da função social da propriedade destacamos o primeiro capítulo para cuidarmos da evolução histórica do conceito de propriedade privada, iniciando com o entendimento de propriedade privada para São Tomás de Aquino passando pelo conceito de Leon Duguit, e ao final falamos sobre a função social da terra, que comporta nos nossos dias, duas concepções opostas sob a invocação do mesmo objetivo: a concepção democrática que defende a reforma agrária pelos meios pacíficos; e a concepção marxista ou marxista-leninista que, em nome do mesmo princípio, propugna pela expropriação pura e simples.

Na segunda parte deste estudo, analisaremos o conteúdo da função ambiental da propriedade. Considerada esta, como um elemento da função social da propriedade, que é um conceito anterior e de alcance mais amplo que a função atribuída àquele instituto advinda da necessidade de manutenção de um meio ambiente equilibrado, e propicio a sadia qualidade de vida. As duas categorias, em estudo, não são antagônicas - ao contrário, tem seu complemento uma na outra -, tem a função ambiental da propriedade como uma característica marcante da constituição de 1988, que considera a problemática ambiental parte da social e vice-versa.

Na terceira abordagem deste estudo faz-se um rápido exame de como a sociedade contemporânea, com suas necessidades de manutenção de um meio ambiente equilibrado; propicio a sadia qualidade de vida e da implantação de um modelo de desenvolvimento sustentável, vem transformando, aos poucos, a concepção privatista do direito de propriedade em direção à propriedade como sendo um direito-dever.

Em seguida, a construção do conteúdo da função ambiental da propriedade parte dos dispositivos constitucionais contidos no Capítulo I do Título II (dos direitos e deveres individuais e coletivos), do Capítulo I do Título VII (dos princípios gerais da atividade econômica), do Capítulo III do Título VII (da política agrícola e fundiária e da reforma agrária) e do Capítulo VI do Título VIII (do meio ambiente).

Em continuação ao estudo do texto constitucional referente à função ambiental da propriedade, se demonstra na legislação ambiental correlata os vários deveres positivos e negativos inerentes ao direito de propriedade que tem em vista o equilíbrio ecológico, que, uma vez implementados, podem transformar o direito de propriedade em mais um instrumento de garantia de um meio ambiente propicio à sadia qualidade de vida.

Após estas análises, faz-se uma demonstração das limitações da regulamentação civilista do direito de propriedade, que se restringe, após o advento da Constituição Federal de 1988, às relações civis decorrentes deste direito, mas não determina seu regime jurídico, que é constitucional.

Logo a seguir, demonstra-se que, embora a Constituição Federal e a legislação ambiental vigente sejam claras quanto as limitações positivas e negativas inerentes ao direito de propriedade, a ideologia, tem seu reflexo prático em maior incidência principalmente sobre o Poder Judiciário, que insistia em considerar apenas o art. 524 do Código Civil (atual art. 1.288 do novo Código Civil), como se este existisse acima do ordenamento jurídico brasileiro e, portanto, soberano e independente de qualquer disposição constitucional sobre as funções social e ambiental inerentes ao direito de propriedade.

Finalizando, a partir de estudos do art. 1.228 do novo Código Civil, verifica-se como ramos tradicionais do direito vêm absorvendo a preocupação com o meio ambiente. Através, sobretudo, da reforma de seus institutos.


2 A DOUTRINA DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

A doutrina da função social da propriedade não tem outro fim senão o de dar sentido mais amplo ao conceito econômico de propriedade encarando-o como uma riqueza que se destina à produção de bens que satisfaçam as necessidades sociais.

A preocupação com a função social dos bens já existia desde a antiguidade. Foi ARISTÓTELES1, o grande filosofo grego, quem primeiro enunciou a idéia relativa à função social.

Ao contrário de Platão, o qual em A República, entendia que os bens de uma sociedade deveriam pertencer a todos os membros da comunidade, Aristóteles, em sua Política, defendia a apropriação pessoal como a maneira mais eficaz de assegurar a destinação social dos bens – segundo ele, os homens têm direito de usar os bens não só para a sua própria manutenção como para satisfazer a coletividade:

A administração dos bens, dividida entre os respectivos possuidores não provocará queixas reciprocas e eles crescerão porque cada um se dedicara aos mesmos como a um negócio pessoal, só seu; por outro lado, as qualidades dos cidadãos farão com que os bens dos amigos sejam comuns, como diz o provérbio, quanto ao uso [ ], e conclui, [ ] é obviamente melhor, portanto, que a propriedade seja comum quanto ao seu uso" (grifos nossos).

Embora esta preocupação com a destinação dos bens tenha surgido desde a antiguidade, somente com o papel exercido pela Igreja Católica, a função social da propriedade, teve impulso, como princípio que visa a satisfazer as necessidades da coletividade.

Na realidade, este princípio decorre da evolução da concepção de propriedade, pela necessidade histórica que esta teve em adquirir uma feição mais humana.

Segundo PEREIRA2:

a propriedade romana, a qual se firmou como um direito absoluto, exclusivo e perpetuo, exercido através de três jura (juramento): o direito de usar, de fruir e de abusar da coisa (jus utendi, jus fruendi, jus abutendi), passou-se à propriedade medieval, que, embora perdendo o caráter exclusivista – eis que o domínio eminente (Estado), domínio direito (senhor) e domínio útil (vassalo) – ainda manteve o seu poder, pois o que ocorreu neste período foi apenas uma fragmentação do poder político.

Neste momento avultou, em reação à exploração do homem, o pensamento da Igreja, na figura de Santo Tomaz de Aquino, que deu uma perspectiva mais moral e espiritual à doutrina da destinação dos bens formulada por Aristóteles, surgindo conforme diz SANTOS3: "Na noite dos tempos uma luz tão límpida e penetrante que iluminará o direito de propriedade através dos séculos seguintes: a função social da propriedade".

E ainda:

Santo Thomaz de Aquino, na Summa Theológica e na Summa Contra Gentiles, seguindo o pensamento cristão, aperfeiçoou o pensamento Aristótelico, trazendo a idéia de bem comum. Segundo ele o homem, para garantir a sua própria sobrevivência, tem um direito natural ao apossamento dos bens materiais; logo, o direito de propriedade resulta desse direito natural de apropriação dos bens na luta pela sobrevivência, contudo, esse direito de propriedade é limitado pelo bem comum – o bem da coletividade, o direito que todos têm de viver condignamente.

De outro modo SANTOS4: dizia ele: "na Summa Theológica, I – IV, 17 a 2: "Quanto ao nosso direito de usar as coisas é preciso que as consideremos como bens da coletividade, de tal forma que as devemos utilizar, para suprir as necessidades dos outros".

Para São Tomás de Aquino o conceito de propriedade privada é visto em três planos distintos na ordem de valores. Em um primeiro lugar, o homem: em razão de sua natureza específica (animal racional), tem um direito natural ao apossamento dos bens materiais. Num segundo, contempla o problema da apropriação dos bens, qual resulta, em última instância, no direito de propriedade propriamente dito. Por fim, num terceiro plano, São Tomás de Aquino permite o condicionamento da propriedade ao momento histórico de cada povo, desde que não se chegue ao extremo de negá-la.

As encíclicas papais, por sua vez, abordando questões sociais, enfocam o problema sob o prisma tomista. A autenticidade cristã do direito de propriedade privada está reafirmado nas encíclicas "Rerum Novarum", de Lei XIII, e Mater et Magistra, de João Paulo XXIII, embora não deixasse de se fazer menção ao condicionamento representado pelo bom uso da propriedade, como se vê, na Quadragésimo Ano, de Pio X.

Para VITO5, "Ao direito de propriedade sobre os bens estará intrinsecamente inerente uma função social" (Mater et Magistra)". A essa limitação do direito de propriedade, responde VITO6 com o argumento de que esse princípio: "longe de enfraquecer o instituto da propriedade privada, reforça-o porque um regime em que ele satisfaz à função social, torna-o cada vez menos criticável em nome da justiça social".

Pode-se sintetizar tudo na realização do bem comum, entendido o bem da comunidade. Quer isso dizer que o Estado ao ter como seu objetivo precípuo o bem comum, jamais deverá sacrificar nenhum dos direitos considerados fundamentais do ser humano.

Para VIVANCO7:

a função social da propriedade representaria nada mais nada menos que o reconhecimento de todo titular do domínio, de que por ser um membro da comunidade tem direitos e obrigações com relação aos demais membros, de maneira que se ele pode chegar a ser titular do domínio, tem a obrigação de cumprir com o direito dos demais sujeitos, que consiste em não realizar ato algum que possa impedir ou obstaculizar o bem de ditos sujeitos, ou seja, da comunidade.

Na concepção de VIVANCO8:

o direito à coisa se manifesta concretamente no poder de usá-la e usufruí-la. O dever que importa ou comporta a obrigação que se tem com os demais sujeitos se traduz na necessidade de cuidá-la a fim de que não perca sua capacidade produtiva e que produza frutos em benefício do titular e, indiretamente, para satisfação das necessidades dos demais sujeitos da comunidade.

Assim, ao direito do titular implica o poder de usar livremente a coisa, mas por sua vez supõe o dever de utilizá-la de maneira que não se deteriore. Isso em razão de que sua capacidade produtiva interessa por igual a todos os sujeitos da comunidade, e que os elementos essenciais para a manutenção da vida humana, provém de elementos agrários como a terra ou os animais.

Para BORGES9:

"[ ] a função social da terra é conceito que pode ser visto sob ângulos diferentes: Alguns a consideram pelo prisma dos positivistas, como aconteceu no México, em 1917". "[ ] Tal concepção põe o direito de propriedade excessivamente sob o arbítrio do Estado, que pode, inclusive, chegar ao ponto de devorá-lo". "[ ] Melhor responde aos anseios do homem a concepção cristã, na linguagem tomista"."[ ]. De nossa parte, revelando convicção, entendemos que a legislação agrária brasileira optou por esta diretriz, que está na linha de nossa tradição, toda ela embasada no cristianismo".

Concluindo, assevera BORGES10: "que no direito agrário, quanto ao imóvel rural, sentimos ser o direito de propriedade a faculdade que a pessoa tem de possuí-lo como próprio, com o dever correlato de utilizá-lo conforme o exigir o bem estar da comunidade".

Recorda MONTEIRO11: "que entre os romanos, o exercício do direito de propriedade era subordinado às exigências do bem comum".

Quando MONTEIRO12, dá notícia histórica do direito de propriedade preleciona que:

Parece que a propriedade, nos primórdios da civilização, começou por ser coletiva, transformando-se, porém, paulativamente, em propriedade individual. Trata-se, contudo, de ponto obscuro na história do direito e sobre o qual ainda não se disse a última palavra.

A "Declaração dos povos da América" aprovada na reunião de 1961, em Punta del Este, de que se originou a Aliança para o Progresso, consagrou a limitação do direito da propriedade da terra, defendendo a realização de programas de reforma agrária integral tendente à efetiva transformação, onde for necessária, das estruturas e dos injustos sistemas de posse e exploração da terra.

O conceito de Leon Duguit que se veio ampliando com o tempo, é de franca limitação ao direito de propriedade: A propriedade é protegida pelo direito, mas ela não é um direito, é uma coisa. Uma realidade econômica e não uma realidade jurídica. (Trate de Doit Const.).

Foi na Declaração Universal dos Direitos do Homem, com a Revolução Francesa, que surgiu o Princípio da desapropriação por utilidade pública, inserta na Constituição de 1791 e no Código de Napoleão.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem, que foi uma conquista jurídica da vitória das potências democráticas contra os países de regime autoritário, nazista ou facista, aprovada a 10 de dezembro de 1948, por iniciativa da ONU, estabelece em seu artigo XVII:

1 – Toda a pessoa tem direito à propriedade, individual e coletivamente.

2 – Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade.

A desapropriação por interesse social resulta, é bem de ver, do conceito de função social, inserta em constituições modernas, depois da segunda guerra mundial, a mais assinalada delas, a Constituição de Weimar (Alemanha) de 1919.

Essa função social da terra foi admiravelmente definida por Leon Duguit13, ao sustentar que a propriedade:

não é um direito, mas uma função social. O proprietário ou possuidor da riqueza é vinculado a uma função ou dever social. Enquanto ele, detentor da propriedade, cumpre essa missão, seus atos devem ser protegidos. Não o cumprindo ou cumprindo mal ou de forma imperfeita; se não cultiva, deixa que sua propriedade se arruíne, ou não faz uso racional e adequado dos recursos naturais (função sócio ambiental da propriedade), torna legitima a intervenção do poder público para compeli-lo ao cumprimento de sua função social de proprietário, consiste em assegurar a utilização da riqueza conforme o seu destino.

A função social da terra comporta duas concepções opostas sob a invocação do mesmo objetivo: a concepção democrática que defende a reforma agrária pelos meios pacíficos; e a concepção marxista ou marxista-leninista que, em nome do mesmo princípio, propugna pela expropriação pura e simples. Sob tal ponto de vista, vale registrar que as diversas concepções ditam igual número de soluções para a posse da terra: a solução democrática, ou a mais acolhida para os países ocidentais, que considera a função social da propriedade privada, conquanto sujeita à limitações que estabelece com o objetivo de preservar o direito de propriedade, em oposição às concepções socialistas; a solução marxista que considera a terra propriedade do Estado, e que inspirou a reforma russa e a do Código Agrário da China, em 1950, chamada marxista-liberal, porque assegura a propriedade da terra pelos camponeses. Parece ser esta também a solução pela Ioguslávia. A reforma egípcia é um meio termo entre as duas concepções, predominando nesta, certas concessões ao direito individual.

Do exposto, conclui-se que a doutrina da função social da propriedade da terra, inspirou-se, basicamente na concepção tomista (doutrina de São Tomás de Aquino), nitidamente democrática, visando o bem comum, sem sacrifícios dos direitos fundamentais do homem.


3 A FUNÇÃO SÓCIO AMBIENTAL DA PROPRIEDADE NO DIREITO CONSTITUCIONAL

Nos dias atuais o direito de propriedade não mais possui aquele cunho absoluto de antigamente.

É da essência do nosso sistema que o direito de propriedade só é reconhecido pela ordem jurídica do Estado, se for cumprida a função social da propriedade, paralelamente com o proveito pessoal do detentor do domínio.

Assim, a propriedade só existe enquanto direito, se respeitada a função social. Desatendida esta não existe direito de propriedade amparado pela Constituição. O cumprimento da função social é condição sine qua non para o reconhecimento do direito de propriedade.

Tal interpretação decorre do disposto na Constituição da República, que assenta:

Art. 5º, XXII, da C F: É garantido o direito de propriedade.

Art. 5º,XXIII, da CF: A propriedade atenderá à sua função social.

Art. 170, II, III, VI, da CF: A ordem econômica. tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: propriedade privada, função social da propriedade e defesa do meio ambiente.

Art. 186, I, II, da CF: A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: aproveitamento racional e adequado; utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente.

Art. 225, caput da CF: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e a coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Art. 225, § 1º da CF: Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

Art. 225, § 1º, III, da CF: definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção.

Art. 225, § 1º, VII, da CF: proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade.

Art. 225, § 3º, da CF: As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais ou administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Veja-se o pensamento do Prof. SILVA14:

A função social da propriedade não se confunde com os sistemas de limitação da propriedade. Estes dizem respeito ao exercício do direito, ao proprietário; aquela, à estrutura do direito mesmo, à propriedade [ ] Com essa concepção é que o intérprete tem que compreender as normas constitucionais, que fundamentam o regime jurídico da propriedade: sua garantia enquanto atende sua função social, implicando uma transformação destinada a incidir, seja sobre o fundamento mesmo da atribuição dos poderes ao proprietário, seja, mais concretamente, sobre o modo em que o conteúdo do direito vem positivamente determinado; assim é que a função social mesma acaba por posicionar-se como elemento qualificante da situação jurídica considerada, manifestando-se, conforme as hipóteses, seja como condição de exercício de faculdades atribuídas, seja como obrigação de exercitar determinadas faculdades de acordo com modalidades preestabelecidas. Enfim, a função social se manifesta na própria configuração estrutural do direito de propriedade, pondo-se concretamente como elemento qualificante na predeterminação dos modos de aquisição, gozo e utilização dos bens.

E ainda:

O certo, e ninguém hoje nega isso, é que a propriedade privada (e a pública também) sujeita-se a limites que são impostos como pressupostos para seu integral reconhecimento pela ordem jurídica e outros que lhe são agregados casuisticamente, diante de fatos que só se manifestam no instante em que o direito, consolidado e plenamente ajustado ao ordenamento, é exercitado... De uma maneira simplificada, o direito de propriedade dá ao seu titular o poder de exclusão (= reivindicação), uso, gozo, disposição e transmissão. Esses aspectos derivam, genérica e abstratamente, da previsão constitucional da propriedade, mas têm seu conteúdo final definido pela legislação infraconstitucional, fundamentalmente pelo Código Civil e normas extravagantes. Ou seja, a lei é que determina o conteúdo normal do direito de propriedade, excluindo, assim, certas faculdades que teriam fundamento no conceito de propriedade, encarado sob um critério abstrato.

A função social da propriedade foi reconhecida expressamente pela Constituição de 1988, nos arts. 5º, XXIII, 170, III e 186, I.

Quando se diz que a propriedade privada tem uma função social, na verdade está se afirmando que ao proprietário se impõe o dever de exercer o seu direito de propriedade, não mais unicamente em seu próprio e exclusivo interesse, mas em benefício da coletividade, sendo precisamente o cumprimento da função social que legitima o exercício do direito de propriedade pelo seu titular. Nesses termos, ao estabelecer no art. 186, II, que a propriedade rural cumpre a sua função social quando ela atende, entre outros requisitos, à preservação do meio ambiente, na realidade, a Constituição está impondo ao proprietário rural o dever de exercer o seu direito de propriedade em conformidade com a preservação da qualidade ambiental. E isto no sentido de que, se ele não o fizer, o exercício do seu direito de propriedade será ilegítimo.

No plano jurídico, como analisa GRAU15,

a admissão do princípio da função social (e ambiental) da propriedade tem como conseqüência básica fazer com que a propriedade seja efetivamente exercida para beneficiar a coletividade e o meio ambiente (aspecto positivo), não bastando apenas que não seja exercida em prejuízo de terceiros ou da qualidade ambiental (aspecto negativo). Por outras palavras, a função social e ambiental não constitui um simples limite ao exercício do direito de propriedade, como aquela restrição tradicional, por meio da qual se permite ao proprietário, no exercício do seu direito, fazer tudo o que não prejudique a coletividade e o meio ambiente. Diversamente, a função social e ambiental vai mais longe e autoriza até que se imponha ao proprietário comportamentos positivos, no exercício do seu direito, para que a sua propriedade concretamente se adeqúe à preservação do meio ambiente.

O direito à propriedade e seu uso ficou constitucionalmente condicionado à sua função social. Há, portanto, disposição específica na Constituição estabelecendo condições limitantes ao seu uso. Na medida em que o proprietário queira fazer dela uso anti-social, encontrará vedação na ordem constitucional.

Em suma, a propriedade não possui caráter absoluto e intangível. Ao contrário, esse direito só existe como tal se atendida a função social. Só há efetiva propriedade rural no mundo jurídico se atendida sua função sócio ambiental. (CF, art. 186, II).


4 DIREITO DE PROPRIEDADE E AS NECESSIDADES DA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

Uma breve síntese da evolução do quadro normativo do uso da propriedade privada parece ser nesse estágio possível. O direito de propriedade clássico atribuía ao titular a faculdade de agir ou não agir segundo as suas conveniências.

Preleciona o jurista MATTOS NETTO16 que:

A compreensão tradicional do direito de propriedade da terra carrega a noção de domínio exclusivo, absoluto e perpétuo, atributivo de valor econômico de mercado. A propriedade dentro desse modelo, é mercadoria: expressão de valor de troca, de circulação de riqueza. [ ] Sendo considerada valor de troca, a propriedade passa a ser também, objeto de reserva de valor.

A função social da propriedade amenizando esse poder impõe ao titular o uso do bem de produção para fins sociais. Os dispositivos constitucionais que regulam o meio ambiente introduzem uma nova perspectiva e determinam o não uso econômico do bem quando em risco o direito ao meio ambiente equilibrado.

A impossibilidade do uso intolerável do meio encarta-se no amplo e generoso conceito do direito à vida digna. Nesse quadro o meio ambiente é um direito fundamental.

O não uso do bem em decorrência de motivos ambientais, não o transforma em propriedade improdutiva e por conseqüência, também não é suscetível de desapropriação para fins de reforma agrária. É relevante considerar que o fato do não uso em dadas circunstâncias liga-se à preservação da vida e funciona como garantia para as gerações presentes e futuras.

A ordem jurídica brasileira contém normas sancionadoras ao proprietário que não exerce a função social.

Ensina MATTOS NETT017 que: "Assim é que a desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, usucapião agrário, o aumento progressivo do imposto territorial rural, o direito de prelação do arrendatário são exemplos dessas implicações jurídicas".

A dogmática infra constitucional regulou e. g., a questão das florestas nativas na lei 8.629/1993. As áreas cobertas por florestas essenciais ao equilíbrio ambiental são áreas que integram os critérios de utilização e eficiência consignados na lei.

Esses critérios são marcos referenciais para determinar se um bem imobiliário rural é produtivo ou não. Um absurdo lógico seria considerar que um espaço territorial insuscetível de utilização no processo produtivo seja destinado à reforma agrária que tem entre outros fins a finalidade de desenvolver a produção.

É de se destacar por fim que o não uso do bem objeto de apropriação é a determinante constitucional apenas nos casos em que se põe em risco o equilíbrio ambiental.

O meio ambiente equilibrado projeto de uma civilidade não de todo descartado se encontra inelutavelmente ligado à garantia de uma vida digna. É necessário compartilhar. A ética da solidariedade sócio-ambiental deve ser implementada, pois a pressão é imensa e o planeta não suporta o grau de consumo atual.

O meio ambiente conceituado como res nullius no sistema clássico, transforma-se num relevante componente econômico no neoliberalismo, essa mudança, entretanto, privilegia apenas o aspecto econômico.

A função social da propriedade sem esquecer a possibilidade de a utilizar-mos com uma doutrina de combate, no Brasil tornou-se uma doutrina tranqüilizante do Estado e da sociedade. É preciso um novo Direito repersonalizado, onde, o Homem seja o móvel do sistema. A natureza passa a se comportar como sujeito exigindo direitos.

O direito de propriedade em sua concepção clássica tem-se mostrado muitas vezes inoperante para os anseios da sociedade atual. Com a evolução dos direitos e a emergência de categorias como os direitos coletivos e difusos, os interesses da sociedade como um todo, mesmo que seus titulares não possam ser individualizados, devem prevalecer sobre os interesses dos particulares que, desta maneira, precisam ser adaptados às características do momento atual.

Com a edição de uma legislação que visa proteger o meio ambiente do desequilíbrio provocado principalmente pelas atividades humanas sobre a Terra, muitos direitos individuais estão sendo colocados, e há a necessidade de terem seus conceitos revistos e de se conformarem às exigências para que a proteção do meio ambiente seja garantida, para toda a coletividade.

A propriedade é um dos institutos jurídicos que mais claramente é afetado pela legislação ambiental, estando seu conceito clássico necessitando de sofrer alterações para que o exercício deste direito seja compatível com a garantia de proteção ao meio ambiente.

No entanto, muitos doutrinadores e principalmente a jurisprudência ainda não têm claro quais são as características do direito de propriedade incompatíveis com a proteção do meio ambiente; muitas vezes pela formação eminentemente civilista que receberam. Outros não são sensíveis às necessidades da sociedade contemporânea e insistem em seguir atribuindo aos proprietários as faculdades que eles tinham nos dois últimos séculos (XVII e XIX). Ou têm consciência sobre a inadequação do exercício do direito de propriedade como está disposto no Código Civil Brasileiro, mas não se sentem seguros sobre o que e como redefinir para atender ao interesse difuso de proteção ambiental.

Leciona MATTOS NETO18: "[ ] no Código Civil brasileiro a propriedade é estudada no Livro do Direito das Coisas. A propriedade rural, assim, é coisificada como objeto da relação jurídica, sendo bem a ter circulação econômica no mercado como outro qualquer".

Com a promulgação da Constituição de 1988 o direito de propriedade deixa de ter sua regulamentação exclusivamente privatista, baseada no Código Civil, e passa a ser um direito privado de interesse público, sendo as regras para o seu exercício, determinadas pelo Direito Público e também pelo Direito Privado. Este processo de publicização do direito de propriedade é fundamental para a implementação da legislação referente à garantia da proteção ao meio ambiente, que impõe limites ao exercício daquele direito.

Anton Menger, que no século passado, na sua obra "L’Etat Socialiste", depurou a natureza econômica dos bens, os classificou em bens de produção, bens de uso e bens de consumo.

MATTOS NETO19 diz que: "baseado nesta tripartição, León Duguit, em sua decantada obra Les Transformations du Droit Privé depuis le Code Napolén [ ] viu a terra rural como bem de produção econômica, porque serve de instrumento para produzir outras riquezas".

E acrescenta : "Nesta visão, o direito de propriedade imobiliária rural deixa de ser um direito subjetivo exclusivo, perpétuo, estático e assume papel dinâmico, participante, ou seja funcional".

Dessa funcionalidade adveio o elemento jurídico encontrado para acomodar a visão privada do direito de propriedade dentro da concepção social do mundo contemporâneo.

Por esse elemento a propriedade privada comporta não só faculdades, porém também passa a ter atribuições, limitações e deveres para com a coletividade. Coloca-se ao proprietário uma função, um papel social, sobre o seu direito de propriedade privada.

Conforme MATTOS NETO20:

Por exercer esta função social, a propriedade exige que seu titular empreenda racional e adequado cultivo do solo e de seus recursos naturais renováveis, em obediência à legislação ambiental e trabalhista, desenvolvendo empreendimentos agrário que traga bem-estar e estabilidade à comunidade.

Para SILVA21, a visão civilista:

não alcança a complexidade do tema, que é resultante, por isso mesmo, de um complexo de normas jurídicas de direito público e de direito privado, e que pode interessar como relação jurídica, como situação jurídica e como instituto jurídico.

Na prática de atos os proprietários fazem-no baseados na autonomia da vontade, com o intuito de satisfazer interesses apenas individuais. A Administração por sua vez, na prática de seus atos, age no exercício de uma função, que deve visar à realização de interesses públicos. Os atos regulados pelo Direito Civil resultam meramente da vontade individual, e podem freqüentemente contrapor-se ao ato administrativo, que resulta da função do Estado de atender a interesses públicos.

Segundo ROXANA BORGES22:

A autonomia privada do proprietário pode chocar-se com a função do Estado de garantir a todos o direito a um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. Por ser este um interesse público e por ser uma função do Estado, a propriedade passa a estar vinculada a interesses outros que podem não corresponder exatamente aos do proprietário. O princípio de utilidade pública está na base do direito administrativo.

E ainda:

A função ambiental da propriedade é, assim, uma atividade do proprietário e do Poder Público exercida como poder-dever em favor da sociedade, titular do direito difuso ao meio ambiente. O direito subjetivo, desta forma, deve conciliar-se com a função da propriedade. É a função administrativa que obriga o Estado a intervir em situações jurídicas individuais, e a função ambiental está aí incluída.

A instituição da função ambiental provocou alterações nas funções do Estado, passando a repartir as responsabilidades pela proteção ao meio ambiente, excluindo a função ambiental do âmbito essencialmente público, e consequentemente os deveres passaram a ser também do particular, como da coletividade como um todo.

O necessário cotejo entre a legislação ambiental esparsa e o Direito Administrativo, Constitucional, Econômico e Civil poderá evidenciar como podem ocorrer os rearranjos dos novos direitos (sobretudo o direito do meio ambiente equilibrado) com os direitos preexistentes, principalmente o direito de propriedade.

Diante desta questão, tem-se a necessidade de se esclarecer sobre o conteúdo clássico do direito de propriedade e sua inadequação para a atual sociedade; é preciso se demonstrar como os direitos, sendo historicamente determinados, vêm sendo afetados pela evolução da sociedade; torna-se urgente apontar como a legislação ambiental determina que o exercício do direito de propriedade atenda aos requisitos de proteção ao meio ambiente, sob pena, inclusive, de a propriedade não merecer proteção.

Esses esclarecimentos se fazem necessários para uma sociedade presa às concepções individualistas de direito de séculos passados, mas que tem um grande problema a enfrentar: a urgência na proteção do meio ambiente, para a garantia da sadia qualidade de vida para as presentes e futuras gerações.


5 O MEIO AMBIENTE COMO BEM DE INTERESSE PÚBLICO

A Constituição Federal, no caput do art. 225, caracteriza o meio ambiente ecologicamente equilibrado como um bem de uso comum do povo. Ocorre que, na doutrina clássica e para o Código Civil, bem de uso comum do povo é um tipo de bem público.

A natureza jurídica do patrimônio ambiental vem sendo estudada cuidadosamente pelos doutrinadores. Os bens ambientais são considerados como bem difuso por FIORILLO e RODRIGUES23. Eles identificam três categorias de bens na ordem jurídica brasileira: bens públicos, bens privados e bens difusos. Para eles. "efetivamente, existe em nosso ordenamento jurídico positivado, uma terceira categoria de bem, que é o difuso, cuja titularidade difere daquela própria do bem publico".

Outra parte da doutrina, posição adotada por SILVA24:

entende ser o patrimônio ambiental um bem de interesse público, categoria que sofre variações, mas que surge também para superar a bipartição entre bem público e bem particular, teorização que permite uma maior proteção ao bem ambiental no sentido de que seu gozo seja ampliado para toda a sociedade.

Também este e o entendimento de MACHADO25, para quem: "o bem de propriedade privada pode adquirir institucionalmente a finalidade de interesse publico [ ], como, também, a um particular regime de polícia de intervenção e de tutela pública".

SANDULLI, citado por MACHADO26, classifica como na categoria de bem de interesse público: "os bosques e florestas privadas, os bens tutelados pela natureza natural, os bens privados de interesse histórico, artístico arqueológico [...]".

Assim, o patrimônio ambiental é concebido como um bem de interesse público, pertence a todos e a ninguém individualmente, nem mesmo ao Estado. O meio ambiente não constitui patrimônio público, enquanto compreendido como a propriedade estatal. Patrimônio ambiental e Patrimônio público não se confundem. O meio ambiente não é propriedade estatal.

Para MEIRELLES27, o meio ambiente pode ser considerado bem de domínio público se este for entendido como:

o poder de dominação ou de regulamentação que o Estado exerce sobre os bens do seu patrimônio (bens públicos) ou sobre os bens do patrimônio privado (bens particulares de interesse público), ou sobre as coisas inapropriáveis individualmente, mas de fruição geral da coletividade (res nullius).

Nem se confundem o Patrimônio Nacional de que fala a Constituição Federal no art. 225, § 4 e o patrimônio público. Patrimônio Nacional, ai trata-se de uma nomenclatura que identifica como espaços territoriais especialmente protegidos a Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira.

Segundo explica LEITE28:

não resta dúvida de que o bem ambiental de interesse público deve ser separado da definição de bens públicos e privados do Código Civil Brasileiro. Outrossim, a concepção da lei civil é destoante do estipulado na Constituição Federal, que trata o meio ambiente como bem da coletividade e não como res nullius.

Assim, de acordo com o art. 98 do CC: "são bens públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem".

E o art. 99, I, II e III, dispõe sobre os três tipos de bem público:

I - Os de uso comum do povo, tais como os rios, mares, estradas, ruas e praças; II - os de uso especial, tais como os edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias; III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.

Acontece que há bens de uso comum do povo como os mares, rios, os quais já não são mais considerados bens públicos, pois constituem elementos fundamentais ao equilíbrio ambiental, integrando um bem maior, o bem ambiental, que não é público, porém de interesse público, produto de um conjunto de elementos que se inter-relacionam, e que são interdependentes.

Para FIORILLO e RODRIGUES29 aquilo que está prescrito no inc. I do art. 99, é exatamente o bem previsto, por exemplo., nos arts. 225, 215, 216, 200, 6º, 182 da CF, entre outros dispositivos constitucionais e normas inferiores relativas ao meio ambiente".

E ao se referirem à norma contida no artigo 99 do CC mencionam que:

Há que se considerar, portanto, que o art..[ ], não se adequou em sua inteireza pela Constituição Federal. Isto equivale dizer que não há mais espaço em nosso ordenamento jurídico atual, para esta modalidade de bem público. O patrimônio público compõem-se, hodiernamente, pelos bens dominiais e de uso especial.

A própria Constituição faz referencia a patrimônio público e a meio ambiente como objetos distintos. E o que menciona quando trata da ação popular, no art. 5.° :

LXXIII - qualquer cidadão e parte legitima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.

Quando o texto constitucional se refere a patrimônio público, significa o conjunto de bens públicos, nos quais não está inserido o meio ambiente. O bem ambiental tem como titular a coletividade, não o Estado.

Outro artigo onde está clara essa distinção constitucional é o art. 129, da CF/88:

São funções institucionais do Ministério Público:

III - promover o inquérito e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

Desta maneira a bipolaridade rígida entre bens públicos e particulares é questionável tanto no antigo Código Civil, como no Novo, face ao surgimento de bens que não se submetem nem ao regime de uns nem ao de outros, como o bem cultural, o bem turístico, o bem ambiental.

No entender de CAPPELLETTI30:‘’a summa divisio aparece irreparavelmente superada diante da realidade social de nossa época, que é infinitivamente mais complexa, mais articulada, mais sofisticada do que aquela simplista dicotomia tradicional’’.

Segundo SILVA31:

a doutrina vem procurando configurar outra categoria de bens: os bens de interesse público, na qual se inserem tanto bens pertencentes a entidade públicas como bens dos sujeitos privados subordinados a uma particular disciplina para a consecução de um fim publico.

Para ele:

"os atributos do meio ambiente [a qualidade satisfatória, o equilíbrio ecológico] não podem ser de apropriação privada, mesmo quando seus elementos constitutivos pertençam a particulares". Para ele, "significa que o proprietário, seja pessoa pública ou particular, não pode dispor da qualidade do meio ambiente a seu bel-prazer, porque ela não integra sua disponibilidade".

E também há elementos físicos do meio ambiente que também não são suscetíveis de apropriação privada, com o ar, a água, que são, já por si, bens de uso comum do povo. Por isso, quanto à qualidade ambiental, não são bens públicos nem particulares. São bens de interesse público, dotados de um regime jurídico especial, enquanto essenciais à sadia qualidade de vida e vinculados, assim, a um fim de interesse coletivo.

De acordo com LEITE32, o meio ambiente, bem de uso comum do povo, é um: "bem jurídico autônomo de interesse público". E, no dizer deste autor, o legislador constitucional inseriu o meio ambiente como res communes omnium, separando-o de uma visão de bem público estrito senso e ‘’elencou o bem ambiental como disciplina autônoma e a título jurídico autônomo’’, superando a tradicional classificação dos bens ambientais como res nullius".

Por isso não há dúvida que a concepção de bem ambiental de interesse público deve ser separado da definição de bens públicos e privados do Código Civil Brasileiro.


6 A FUNÇÃO AMBIENTAL DA PROPRIEDADE NA LEGISLAÇÃO: OS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS E SEUS REGIMES

É com a Constituição que se inicia o estudo dos instrumentos de proteção ambiental que, mais diretamente, vão delimitar a função ambiental da propriedade rural, a partir da criação de espaços territoriais especialmente protegidos. O art. 225 diz que:

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

III - definir, em todas as Unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção.

Esta norma, ao lado de outras, que tratam especificamente de função ambiental da propriedade fundamenta toda a legislação sobre espaços públicos e privados que devem ser submetidos a regimes especiais de proteção, como o Código Florestal (Lei nº. 4.717/65), a Lei nº. 6.902/81, o Decreto nº. 99.274/90, a Lei 9.985, de 18 de julho de 2000, para mencionar apenas alguns dos principais documentos que regulamentam espaços territoriais especialmente protegidos como as áreas de reserva legal, áreas de preservação permanente, parques, reservas biológicas, estações ecológicas, áreas de proteção ambiental, florestas públicas e particulares, patrimônio nacional e outros.

Toda esta legislação se encontra dispersa, o que pode provocar dificuldades no momento de se identificar um espaço territorial específico e seu regime.

6.1 Áreas de preservação permanente

Estas áreas de preservação permanente podem ser áreas de preservação permanentes legais ou áreas de preservação permanentes administrativas.

Segundo SILVA33:

quer constituam bens de propriedade privada quer bens de domínio público, ficam eles sujeitos a um regime jurídico de interesse público pela relevância dos atributos naturais de que se revestem, postulando proteção especial.

A Lei nº. 4.771/65 (Código Florestal) menciona a reserva legal e as áreas de preservação permanente, dois instrumentos para a proteção do meio ambiente. Em seu art. 1º, caput, diz que os direitos de propriedade poderão sofrer limitações para que a proteção ambiental possa ser implementada:

Art. 1º. As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem.

As áreas de preservação permanente são relacionadas nos arts. 2º e 3º. As primeiras são as áreas de preservação permanente legais, ou ope legis, expressão utilizada por BENJAMIM34 para diferenciá-las das áreas de preservação permanente administrativas, em que a criação se fundamenta no art. 3º da lei. As florestas de preservação permanente do Código Florestal não são disponíveis para exploração.

Leciona MACHADO35:

o espírito do Código Florestal, a sua interpretação teleológica nos leva a afirmar que as florestas de preservação permanente não são suscetíveis de exploração. Aliás essa a correta interpretação do art. 16 do Estatuto Florestal, quando prevê como ressalva para a exploração da floresta de domínio privado, o fato da mesma ser de preservação permanente.

Em seu art. 2º através da proteção às florestas e demais formas de vegetação natural localizada nos lugares relacionados se visa mediatamente, a proteção de outros elementos naturais, como a água, e a qualidade do solo. Neste sentido é que a alínea a considera de preservação permanente a vegetação natural localizada: "ao longo dos rios ou de qualquer curso d''água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será: [...]".

As alíneas b e c, que se referem à vegetação: "ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d''água naturais ou artificiais" e "nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados ''olhos d''água'', qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 (cinqüenta) metros de largura;.

Estes preceitos citados acima deixam claro que o fim último é a proteção das águas.

As demais alíneas têm por objetivo a proteção da qualidade do solo, pois ensejam evitar a erosão que pode ser causada se a vegetação localizada em determinadas áreas da superfície natural for retirada. Assim, relacionam de preservação permanente as formas vegetais situadas em locais como: "topo de morros, montes, montanhas e serras", "nas encostas ou partes destas com declividade superior a 45º", "nas restingas", "nas bordas dos tabuleiros ou chapadas", "em altitude superior a 1.800 metros, qualquer que seja a vegetação".

As áreas de preservação permanentes administrativas de que fala o art. 3º são declaradas pelo Poder Público. Criadas através de ato da administração e pelo mesmo modo suprimidas total ou parcialmente, neste caso desde que autorizado previamente pelo Poder Executivo Federal, dependendo da destinação que se quiser dar ao uso de tais áreas.

MACHADO36 entende que:

os novos caminhos legislativos da política florestal hão de levar à adoção da obrigatoriedade do estudo de impacto ecológico antes do início da supressão parcial ou total da floresta de preservação permanente.

Este ato administrativo vem se caracterizar como atividade modificadora do ambiente, que afeta a qualidade dos recursos naturais, conforme os arts. 1º e 2º da Resolução 001/86 do Conselho Nacional de Meio ambiente, e, devido a isso, deve se submeter a estudo prévio de impacto ambiental.

As áreas de preservação permanente do art. 2º, uma vez criadas por lei, apenas por lei podem ser submetidas à modificação ou supressão.

Embora o art. 2º anteveja a preservação da vegetação natural nas áreas relacionadas, existem também florestas de preservação permanente plantadas. O art. 18 obriga o florestamento e o reflorestamento de preservação permanente, que deve se realizar mesmo que na área nunca tenha havido floresta. Se não o fizer o proprietário, deverá fazê-lo o Poder Público Federal, sem necessidade de desapropriação.

De acordo com MACHADO37:

na constituição das florestas compreendidas no art. 2º não interveio a discricionariedade da Administração: são imperativas. Assim, parece-me que há uma obrigação para a Administração de arborizar ou reflorestar as áreas de preservação permanente abrangidas no art. 2º do Código Florestal.

MIRRA38, tratando do princípio da função social e ambiental da propriedade entende que:

o principio em tela dá o fundamento constitucional da imposição coativa ao proprietário, inclusive pela via judicial, da obrigação de recompor a área de vegetação de preservação permanente, independentemente de ter sido ele o responsável ou não pelo desmatamento e ainda que jamais tenha existido vegetação na área em questão. Há uma obrigação legal de manterem-se as áreas de preservação permanente com vegetação e os proprietários devem se sujeitar a ela, em qualquer circunstância, por força do principio da função social e ambiental da propriedade, que lhes impõe o exercício do direito de propriedade em conformidade com as diretrizes de proteção do meio ambiente vigentes.

A manutenção da área de preservação permanente legal não leva à indenização. O que pode ensejar indenização é a criação de área de preservação permanente administrativa, que não tem caráter geral, dispondo o § 1º do art. 18 do Código Florestal que: "se tais áreas estiverem sendo utilizadas com culturas, de seu valor deverá ser indenizado o proprietário".

6.2 Reserva legal

Nem mesmo a reserva legal é indenizável. Sua regulamentação é feita pelos arts. 16 e 44 do Código Florestal. Constitui-se por áreas de cobertura arbóreas, delimitadas territorialmente em propriedade, sejam privadas ou públicas. Corresponde a 20% da área de cada propriedade com cobertura arbórea localizada, a critério da autoridade competente, onde não é permitido o corte raso, nas regiões Leste Meridional, Sul e parte sul da região Centro-Oeste e 50% na região Norte e na parte norte da região Centro-Oeste.

A reserva legal, em ambos os casos, conforme o artigo 16, § 2º e art. 44, parágrafo único, do Código Florestal:

deverá ser averbada à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua destinação nos casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento da área.

A existência das Reservas Legais tem como finalidade a preservação de diversidade florística e faunística (na Amazônia por exemplo e preservação do pirarucu) e o equilíbrio ecológico da localidade. Nesta região conforme se depreende do art. 16, caput e § 2º, e 44 do Código Florestal não se poderá realizar o corte raso, ou seja, onde deve ser mantida a cobertura arbórea e vegetal existente. De acordo com a Portaria P/1986 do IBDF, esse é o: "tipo de corte em que é feita a derrubada de todas as árvores, de parte ou de todo um povoamento florestal, deixando o terreno momentaneamente livre de cobertura arbórea".

A Lei 9.985, de 18 de julho de 2000, regulamentado o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, veio instituir o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC).

Essa Lei estabelece critérios e normas para a criação, implantação e gestão das unidades de conservação (art. 1º, da Lei 9.985/00).

Para isso conceituou esta unidade como:

o espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (art. 2º, I, da Lei 9.985/00).

O SNUC é constituído pelo conjunto das unidades de conservação federais, estaduais e municipais. Sendo que estas unidades dividem-se em dois grupos com características específicas: as Unidades de Proteção Integral (Estações Ecológicas, Reservas Biológicas, e Parques) e as Unidades de Uso Sustentável (Áreas de Proteção Ambiental, e Áreas de Relevante Interesse Ecológico, Florestas). O objetivo básico das Unidades de Proteção Integral é preservar a natureza, admitindo-se apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos na Lei. Enquanto que o objetivo básico das Unidades de Uso Sustentável é compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela de seus recursos naturais.

6.3 Parque

O art. 11, § 4º da Lei do SNUC prevê a criação, por parte do Poder Público, de Parques Nacionais, Estaduais e Municipais. A sua posse e domínio são públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a Lei. São destinados a visitação pública, mas resguardando atributos excepcionais da natureza. Assim, busca-se conciliar a proteção da natureza nestas áreas e a sua utilização para objetivos educacionais, recreativos e científicos. A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas. Por outro lado as áreas de preservação permanentes são dever legal e devem existir dentro dos parques.

Os recursos naturais dos parques não são suscetíveis de exploração econômica, sendo feita uma única ressalva à cobrança de ingressos a visitantes, com vinculação de pelo menos 50% de sua receita a manutenção, fiscalização e obras de melhoramento.

MACHADO39 disserta que: "não se veda o controle da abertura dos parques, para que a presença do público não venha a significar deterioração da qualidade de acolhimento do local".

Não obstante o regime jurídico dos parques seja diferente do regime das áreas de preservação permanente; estas são dever legal, devendo existir mesmo dentro dos parques. O Parque público é incompatível com o domínio privado.

6.4 Florestas públicas

No art. 17, § 6º da Lei n. 9.985 está prevista a criação de Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais. Estas são de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seu limites devem ser desapropriadas de acordo com o que dispõe a Lei.

Nas Florestas Nacionais é admitida a permanência de populações tradicionais que a habitam quando de sua criação, em conformidade com o disposto em regulamento e no Plano de Manejo da Unidade. A visita pública é permitida, condicionada às normas estabelecidas para o manejo da unidade pelo órgão responsável por sua administração.

A pesquisa é permitida, sujeitando-se à prévia autorização do órgão responsável pela administração da unidade, às condições e restrições por este estabelecidas e àquelas previstas em regulamento.

6.5 Estações ecológicas

O artigo 9º da Lei n. 9.985 trata das Estações Ecológicas que tem como objetivo a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas.

Estas são de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a Lei. É proibida a visita pública, exceto quando com objetivo educacional, de acordo com o que dispuser o Plano de Manejo da unidade ou regulamento específico.

A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como àquelas previstas em regulamento.

Nessa só podem ser permitidas alterações dos ecossistemas no caso de: a) medidas que visem a restauração de ecossistemas modificados; b) manejo de espécies com o fim de preservar a diversidade biológica; c) coleta de componentes dos ecossistemas com finalidades científicas; d) pesquisas científicas cujo impacto sobre o meio ambiente seja maior do que aquele causado pela simples observação ou pela coleta controlada de componentes dos ecossistemas, em uma área correspondente a no máximo três por cento da extensão total da unidade e até o limite de um mil e quinhentos hectares.

Existem Estações Ecológicas federais, estaduais e municipais. É a propriedade pública cumprindo sua função ambiental.

6.6 Reservas biológicas

As Reservas Biológicas, previstas no artigo 10 da Lei n. 9.985, tem como objetivo a preservação integral da biota e demais atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência humana direta ou modificações ambientais, excetuando-se as medidas de recuperação de seus ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e preservar o equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos ecológicos naturais.

Essas são de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a Lei.

É proibida a visita pública, exceto aquela com objetivo educacional, de acordo com regulamento específico

A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas.

Dessa forma, naqueles espaços passam a ser proibidas as atividades de utilização, perseguição, caça, apanha, ou introdução de espécimes na fauna e flora silvestres e domésticas, bem como modificações do meio ambiente a qualquer título, ressalvadas as atividades científicas devidamente autorizadas pela autoridade competente.

6.7 Áreas de proteção ambiental

Já as Áreas de Proteção Ambiental, de que fala o artigo 15 da Lei n. 9.985 é uma área em geral extensa, com um certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.

Essas Áreas são constituídas por terras públicas ou privadas. Respeitando os limites constitucionais, podem ser estabelecidas normas e restrições para a utilização de uma propriedade privada localizada em uma Área de proteção ambiental.

A condição para a realização de pesquisa científica e visita pública nas áreas sob domínio público serão estabelecidas pelo órgão gestor da unidade. Por outro lado, nas áreas sob propriedade privada, cabe ao proprietário estabelecer as condições para pesquisa e visita pelo público, observadas as exigências e restrições legais.

Embora a lei disponha genericamente sobre Poder Executivo. Este regime, embora imprima ao exercício do direito de propriedade muitas limitações não dá ao proprietário o direito de ser indenizado. E como se a propriedade se sujeitasse a um planejamento, comparável a um plano diretor urbano.

A Área de proteção ambiental disporá de um Conselho presidido pelo Órgão responsável por sua administração e constituído por representante dos órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e da população residente, conforme se dispuser no regulamento desta Lei.

Assim, verifica-se o dever de colaboração entre poder público e esfera privada na efetivação da proteção ambiental. Ao mesmo tempo, embora a legislação não se manifeste expressamente assim neste momento, tal disposição faz parte do principio de que todos são responsáveis pela manutenção de um meio ambiente equilibrado: "impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações" (conforme art. 225, caput, da Constituição Federal).

Além disso, está demonstrado que, mesmo com as limitações impostas pelo decreto que declarar a Área de Proteção Ambiental, a propriedade não deixa de ser economicamente explorável. Admite-se exploração de acordo com regime de manejo sustentável dos recursos naturais ali presentes. Pode ocorrer, inclusive, aumento no retorno econômico para o proprietário, dependendo da atividade à qual ele destinar a propriedade, propagandeando seus produtos ou serviços através da menção do nome da Área de Proteção Ambiental.

6.8 Ás áreas de relevantes interesses ecológicos

A área de relevante interesse ecológico, conforme o artigo 16 da Lei n. 9.985, é uma área em geral de pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, com características naturais extraordinárias ou que abriga exemplares raros da biota regional.

O objetivo de sua criação é manter os ecossistemas naturais de importância regional ou local e regular o uso admissível dessas áreas, de modo a compatibiliza-los com os objetivos de conservação da natureza.

Essa área é constituída por terras públicas ou privadas. E respeitados os limites constitucionais, podem ser estabelecidas normas e restrições para a utilização de uma propriedade privada localizada em uma área de relevante interesse ecológico.

6.9 Reserva extrativista

A Reserva extrativista, prevista no artigo 18 da Lei n. 9.985, é uma área utilizada por populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na agricultura de subsistência a na criação de animais de pequeno porte, e tem como objetivos básicos proteger os meios da vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade.

Ela é de domínio público, com uso concedido às populações extrativistas tradicionais conforme o disposto no artigo 23 da Lei e em regulamentação específica, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas, de acordo com o que dispõe a Lei.

Sendo gerida por um Conselho Deliberativo, presidido pelo órgão responsável por sua administração e constituído por representantes de órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e das populações tradicionais residentes na área, conforme se dispuser em regulamento e no ato de criação da unidade.

A visita pública é permitida, desde que compatível com os interesses locais e de acordo com o disposto no Plano de Manejo da área.

A pesquisa científica é permitida e incentivada, sujeitando-se à prévia autorização do órgão responsável pela administração da unidade, às condições e restrições por este estabelecidas e às normas previstas em regulamento.

O plano de manejo deverá ser aprovado pelo Conselho Deliberativo.

Proíbe-se a exploração de recursos minerais e a caça amadorística ou profissional. Por lado, a exploração comercial de recursos madeireiros só será admitida em bases sustentáveis e em situações especiais e complementares às demais atividades desenvolvidas na Reserva, conforme o disposto em regulamento e no Plano de Manejo da Unidade.

6.10 Patrimônio Nacional

Além das diversas nomenclaturas que a legislação ambiental ordinária atribui a espaços territoriais especialmente protegidos de diferentes regimes, como parques, estações ecológicas, áreas de preservação permanente, áreas de proteção ambiental, há ainda o Patrimônio Nacional, que, de acordo com o art. 225, § 4º da CF, abrange a Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira.

Este Patrimônio Nacional, nos termos constitucionais, não se confunde com patrimônio público, conforme visto acima.

Estes espaços de que fala a Constituição no art. 225, § 4º, são considerados por SILVA40 como Espaços de Manejo Sustentável, pois: "submetidos a uma proteção parcial dos atributos naturais, admitida a exploração de partes dos recursos disponíveis em regime de manejo sustentado, sujeito às limitações legais".


7 CRÍTICA AO TRATAMENTO DADO POR UMA PARTE DOS OPERADORES JURÍDICOS A ALGUMAS AÇÕES QUE QUESTIONAM A FUNÇÃO AMBIENTAL DA PROPRIEDADE

Muitas são as ações que chegam ao Poder Judiciário em busca de solução para os "conflitos" entre proteção ambiental e direito de propriedade. Questionam, sobretudo, o dever de se cumprir - e os limites de - a função ambiental da propriedade e o direito de indenização pelo que se entende serem ingerências do poder público na esfera privada, em forma de limitações administrativas ou de desapropriações indiretas.

Ocorre que muitos operadores, principalmente os do Judiciário, estão despreparados para julgar pedidos de indenização por expropriação (a chamada desapropriação indireta) em matéria ambiental, embora grande parte dos membros do Ministério Público tenha incorporado a iniciativa que lhe é atribuída pelo art. 129, III da Constituição - segundo o qual é função institucional do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

O avanço que existe entre promotores esbarra no entendimento retrógrado de uma parte dos juízes e dos advogados em relação ao ordenamento jurídico e no distanciamento e desinformação sobre a realidade das áreas sob litígio (preço, dimensão da área, localização, características do terreno, economicidade, etc.).

Além do manuseio inadequado do direito brasileiro, tais operadores jurídicos ainda não desenvolveram a necessária consciência ecológica para a ponderação sobre os maiores problemas sociais e econômicos do fim do século.

Neste sentido, a crítica de BIRNFELD41 citado por ROXANA BORGES:

[...] uma contestação que não pode deixar de ser feita no que tange à proliferância da legislação ambiental é a que diz respeito à sua escassa aplicação pelos operadores jurídicos em geral, a qual pode ser justificada em parte pela existência de um conjunto às vezes confuso de disposições, em parte pela existência de lacunas importantes no próprio conjunto normativo, mas principalmente e em grande parte pelo escasso grau de importância que os operadores jurídicos destinam geralmente questões atinentes à legislação ambiental, demonstrando um lamentável desconhecimento dos valores críticos que estão nela inseridos, quando não demonstram (o que é pior ainda), um pleno desconhecimento das próprias normas ambientais.

Esse desconhecimento das normas ambientais - e também constitucionais - e visível quando a processualização do conflito entre o interesse público e o interesse do proprietário se concentrava em tomo do art. 524 do antigo Código Civil: "Art. 524. A lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-los do poder de quem quer que injustamente os possua".

A atual redação e dada pelo art. 1.228 do atual Código Civil: O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha".

Muitos operadores, em destaque os do judiciário, apegavam-se a este dispositivo do Direito Privado, como se esse fosse o único a dispor sobre o regime jurídico da propriedade. Mas essa norma não existe isoladamente. Ela está inserida no ordenamento jurídico, de forma que sua interpretação deve ser feita a partir do texto constitucional.

Neste sentido é a crítica feita por SILVA43:

Os juristas brasileiros, privatistas especialmente, mas também publicistas, concebem o regime jurídico da propriedade privada como subordinado ao direito civil, considerado como direito real fundamental. Olvidam as regras de direito público, especialmente de direito constitucional, que igualmente disciplinam a propriedade.

A forma como o julgamento dos pedidos de desapropriação eram feitos demonstrava nada mais que o desconhecimento do ordenamento jurídico por parte de alguns juízes, para não falar em hipótese de "descaso para com o patrimônio público", usando as palavras de BENJAMIM44 citado por ROXANA BORGES.

Este autor denuncia que:

os degradadores descobriram que, em vez de procederem com atos frontais de desrespeito às normas ambientais existentes, lhes era mais fácil e lucrativo espoliar o meio ambiente simplesmente brandindo seu direito de propriedade, fazendo uso da técnica - no mais, absolutamente legítima - da desapropriação indireta.

O maior fator para a não aplicabilidade adequada das normas constitucionais e ambientais é o limitado entendimento por parte de seus executores acerca das mesmas. Em relação especificamente à função social/ambiental da propriedade como requisito para garantia do direito de propriedade e como função atribuída ao Estado e ao particular, o que se alega para justificar a não aplicação da norma constitucional é que não existe regulamentação que de o conceito de função ambiental da propriedade, mesmo frente ao art. 186 da CF. Ora, este artigo é claro quanto aos requisitos a serem atendidos pela propriedade rural e a legislação ambiental é específica quanto às obrigações do proprietário em relação aos elementos naturais e à forma como devem ser protegidos.

Neste sentido, em avaliação específica de legislação ambiental - referente principalmente à proteção das águas - nos casos do Tribunal da Água45, uma das conclusões a que se chegou foi: "a clara vigência da Constituição em todos os seus dispositivos, naquilo em que possam ser aplicados, ainda que inexista a legislação infraconstitucional correspondente".


8 A FUNÇÃO AMBIENTAL DA PROPRIEDADE NO CÓDIGO CIVIL

Há mais de vinte e cinco anos em discussão, no Congresso Nacional o Projeto do novo Código Civil foi aprovado no dia 15 de agosto de 2001. Este projeto foi elaborado por uma comissão de juristas, coordenada pelo professor Miguel Reale; José Carlos Moreira Alves (Parte Geral), Agostinho Alvim (Direito das Obrigações), Sylvio Marcondes (Atividade Negocial), Ebert Chamoun (Direito das Coisas), Clóvis do Couto e Silva (Direito de Família) e Torquato Castro (Direito das Sucessões).

Segundo o Jurista, paraense, ZENO VELOSO46: "muitas dessas inovações já estão vigorando em nosso Direito, por força, sobretudo, das transformações e conquistas determinadas pela Constituição de 1988, especialmente [...] a função social da propriedade".

O novo Código Civil teve o mérito de antecipar algumas dessas mudanças e, agora, de ratificá-las e confirmá-las, para que não restassem dúvida, vacilações e interpretações reacionárias e passadistas.

As modificações propostas pela comissão que elaborou o Projeto de Código Civil, no que tange ao direito de propriedade, trazem a função ambiental como elemento marcante deste direito.

O § 1º do art. 1.229, que disciplina a propriedade conforme os avanços e necessidades sociais, prescreve:

§ 1º. O direito de propriedade deve ser exercitado cm consonância com suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

Além de inserir a função social da propriedade, traz a função ambiental explicitada através do desdobramento de vários de seus componentes, como a proteção à flora e à fauna, a preservação das belezas naturais, a manutenção do equilíbrio ecológico, a preservação do patrimônio histórico e artístico, prescrevendo, por fim, que o uso da propriedade não provoque a poluição do ar e das águas, submetendo a propriedade às determinações presentes em legislação ambiental.

Assim prescrita, a propriedade no Código Civil está mais em conformidade com a sociedade atual que a propriedade nos termos do Código Civil de 1916, inadequada mesmo para a época em que o Código em vigor foi publicado.

No entanto como foi demonstrado; os dispositivos (sobretudo o art. 1.228) do Código Civil não são empecilho para que se cumpra a função ambiental da propriedade nem garantia da manutenção da propriedade que não atende a sua função sócio ambiental.

Com o advento da Constituição Federal de 1988 e vasta legislação ambiental esparsa, afirmou-se a função ambiental como elemento interno da propriedade, o que reduziu o âmbito de incidência do Código Civil às relações civis decorrentes deste direito, não incidindo sobre seu regime jurídico, que passou a ser constitucional.

Para MATTOS NETO47:

Os princípios jurídicos cristalizam os valores sociais, conformando o quadro axiológico cultuado pela sociedade. Os princípios podem estar explícitos na Constituição ou convivem implicitamente no sistema constitucional democrático-social. Os princípios constitucionais informam e influenciam a elaboração das normas e servem de mediadores entre os valores sociais e as normas jurídicas. E o juiz funciona como administrador dos direitos naturais incorporados constitucionalmente na sociedade.

E ainda: "Na sociedade contemporânea, a finalidade natural, ‘sumo bem’ no dizer de Aristóteles, da propriedade imobiliária é sua finalidade social, expressa na função social".

O conteúdo social da propriedade vai além dos limites do Direito Civil. O direito de propriedade deve ser positivamente exercido, não podendo abster-se de utilizar o imóvel à finalidade adequada a natural a que se destina: a função social

Embora toda a doutrina civilista e publicista tenham caminhado nesta direção, os aplicadores do direito, principalmente os do Judiciário, não compartilharam deste entendimento, apegando-se fortemente aos dispositivos do Código Civil.

Segundo MATTOS NETO48:

A Constituição Federal de 88 foi sábia ao inserir, entre os direitos individuais e coletivos, o da propriedade, mas onerado com a função social (CF, art. 5º, XXIII). [ ] O direito de propriedade somente é eticamente válido se cumprida sua função social.

A propriedade rural exerce a sua função sócio ambiental se cumprir com o manejo e utilização adequados dos recursos da natureza.

Concebe MATTOS NETO49 analisando a função ética da propriedade no novo Código que: "O novo Código Civil traz inovações que denotam a preocupação do legislador civil em reconhecer os reclamos sociais da sociedade atual, aperfeiçoando deontologicamente a ética das transformações sociais".

O legislador colocou o conteúdo ético na norma ambiental ao exigir que o proprietário preserve, ou seja, não danifique, não ofenda, não espolie a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico, o patrimônio histórico e artístico e evite poluir a água e o ar.

Para MATTOS NETO50: "A propriedade privada deve estar em harmonia com os princípios sociais pertinentes aos interesses difusos, exigindo assim, não só o tradicional respeito aos interesses públicos".

Conforme MATTOS NETO51:

inovou a lei trazendo a desapropriação judicial (art. 1.228, § § 4º e 5º ). É uma desapropriação, sem interferência do Poder Executivo, promovida diretamente pelo juiz, em caso de interesse social revelado pela posse coletiva do imóvel. Aqui a lei prestigia o apossamento coletivo quando economicamente e socialmente útil.

Nos dá notícia MATTOS NETO52 que hoje na Amazônia está sendo implantado um modelo alternativo de aquisição de propriedade imobiliária rural, diferente do que reza o Código Civil, pelo qual deve ser feita por escritura passada e registrada em cartório: "O novo modo de aquisição de propriedade imobiliária tem sido realizado, quantitativamente, através da invasão".

Por isso, muito oportuna - embora não tecnicamente necessária - a inserção no Código Civil da função ambiental da propriedade. Espera-se que, assim colocada, facilite o entendimento dos operadores no sentido de que a sociedade do século XXI não pode conviver com uma propriedade napoleônica, sob pena de a base natural desta mesma sociedade desaparecer.


9 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A propriedade privada reconhecida na Constituição Federal vinculada à função social recebe um toque que a empurra para uma direção distinta daquela que se encontra no Código civil Brasileiro. O titular do domínio deverá agora utilizar o seu bem para uma finalidade produtiva.

Em consonância com isso, o novo Código Civil, aprovado no Congresso Nacional, acabou por contemplar a função sócio ambiental como elemento marcante do direito de propriedade, ao prescrever que tal direito "deve ser exercitado em consonância com suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. Neste sentido a propriedade sem deixar seu cunho privatista, se socializou, com isso significando eu deve oferecer à coletividade uma maior utilidade, dentro da concepção de que o social orienta o individual.

O direito de propriedade clássico atribuía ao titular a faculdade de agir ou não segundo as suas conveniências. A função social da propriedade amenizando esse poder impõe ao titular o uso do bem de produção para fins sociais.

Os dispositivos constitucionais que regulam o meio ambiente introduzem uma nova perspectiva e determinam o não uso econômico do bem quando em risco o direito ao meio ambiente equilibrado e a sadia qualidade de vida. A impossibilidade do uso intolerável do meio encarta-se no amplo e generoso conceito do direto à vida digna. Nesse quadro o meio ambiente equilibrado é um direito fundamental.

O não uso do bem em decorrência de motivos ambientais, não o transforma em propriedade improdutiva e por conseqüente suscetível de desapropriação. É relevante considerar que o fato do não uso em dadas circunstâncias liga-se à preservação da vida e funciona como garantia para gerações presentes e futuras. E de se destacar que o não uso do bem objeto de apropriação é a determinante constitucional apenas nos casos em que põe em risco o equilíbrio ambiental. A natureza passa a se comportar como sujeito exigindo direitos.

Se historicamente, conceito e estrutura do direito de aquisição, uso e gozo dos recursos naturais – objeto de estudo de direito de propriedade, tem sofrido modificações no sentido de ajustar-se às exigências de novas configurações econômicas, políticas e sócio ambientais, apresentando-se sob nova disciplina e limitações que por vezes, converge para os fins da política conservacionista, necessário que Estado e Sociedade Civil, consolidem a concepção da propriedade enquanto poder-dever, atendendo as modernas relações jurídicas.

O uso da propriedade pode e deve ser judicialmente controlado, impondo-se-lhe as restrições que forem necessárias no sentido de salvaguarda dos bens maiores da coletividade, de modo a conjurar, por comandos prontos e eficientes do Poder Judiciário, qualquer ameaça ou lesão à qualidade de vida. É com base nisso que os doutrinadores têm sustentado a possibilidade de imposição ao proprietário rural do dever de recomposição em áreas de preservação permanente e reserva legal, mesmo não tenha sido ele o responsável pelo desmatamento. Na certeza que tal obrigação possuí caráter – Propter rem -, isto é, uma obrigação que se prende ao titular de direito real, seja ele quem for, bastando para tanto sua simples condição de proprietário ou possuidor. Com efeito, não se pode falar, na espécie, em qualquer direito na exploração dessas áreas, pois, com a Constituição de 1988, só fica reconhecido o direito de propriedade quando cumprida a função sócio ambiental, como seu pressuposto elemento integrante, sob pena de impedimento do livre exercício ou até de perda desse direito.

A função sócio ambiental da propriedade é cumprida quando a propriedade atende ao requisito de preservação do meio ambiente. Se a função social significa o exercício do direito em benefício de outrem, se visa comprometer a propriedade com as complexas relações sociais e com o progresso humano, isto se efetiva com muito mais razão quando o exercício da propriedade atende á preservação do meio ambiente, que é bem de uso comum do povo, garantido às presentes e futuras gerações.

Em relação a doutrina da função social da propriedade da terra, uma das motivadoras do Estatuto da Terra, observamos que teve inspiração, na concepção tomista (doutrina de são Tomás de Aquino), de visões democrática, visando o bem comum, sem sacrifício dos direitos fundamentais do homem.

Embora ainda não seja este o entendimento da ideologia dominante, o direito de propriedade, após o advento da Constituição Federal de 1988, que, além de trazer dispositivos expressos sobre a função ambiental da propriedade, fundamenta a legislação ambiental infraconstitucional, passa a se configurar um direito-dever ou uma propriedade-função, cujo regime jurídico extrapola a disposição civilista sobre o tema.

Tal posicionamento dominante, em desacordo com a teorização apresentada, é, em parte, fruto do manuseio inadequado do ordenamento jurídico brasileiro, que desconsidera as normas constitucionais, ao lado do apego da maioria dos juristas, principalmente dos que compõem o Poder Judiciário, a concepções de direito impróprias para o atendimento das necessidades da sociedade contemporânea, como a necessidade de manutenção de um meio ambiente equilibrado. De outro lado está grande parte da sociedade, ainda alheia às modificações nos direitos individuais que a época faz necessário reconhecer.

Enquanto esta atitude frente às normas constitucionais e ambientais não mudarem, a manutenção de um "meio ambiente ecologicamente equilibrado [...] essencial à sadia qualidade de vida", conforme art. 225 da CF, estará cada vez mais longe, e o processo de degradação ambiental será cada vez mais irreversível.

A legislação ambiental traz instrumentos suficientes para um começo de política no sentido da proteção do meio ambiente. Com a sua implementação, a propriedade não apenas cumpriria sua função ambiental, mas ela mesma, sendo desta forma utilizada, configurar-se-ia como mais um instrumento voltado para a necessária manutenção do equilíbrio ecológico e do desenvolvimento sustentável.


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NOTAS

1 ARISTÓTELES. POLÍTICA. Brasília : Universidade de Brasília, 1985.

2 PEREIRA, Rosalina Pinto da Costa. Reforma Agrária: um estudo jurídico. Belém : Cejup, 1993.

3 SANTOS, Arthur Pio dos. Desapropriação e Direito Agrário. Brasília : Fundação Petrônio Portela, 1982.

(Curso de Direito Agrário, 3).

4 SANTOS, op. cit.

5 VITO, Francisco. A Encíclica Mater et Magistra e a hodierna questão social. São Paulo, Ed. Paulinas, 1999.

6 VITO,op. cit.

7 VIVANCO, Antonino, C. Teoria de Derecho Agrário. La Plata : Ediciones Libreria jurídico, 1967, v.1.

8 VIVANCO, op. ct.

9 BORGES, Paulo Tormin. Institutos básicos do direito agrário. 11 Ed. rev. São Paulo, Saraiva, 1998.

10 BORGES, op. cit.

11 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. 35. ed., rev. e atual. São Paulo : Saraiva, 1999.

12 MONTEIRO, op. cit.

13 DUGUIT, León. Las transformaciones generales del Derecho privado desde el Condigo de Napoleón", trad. Castelhana. Buenos Aires : Edit. Farncisco Beltrán :, s.d.

14 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo : Malheiros, 1995.

15 GRAU, Eros Grau. Princípios fundamentais de direito Ambiental. Revista de Direito Ambiental, São Paulo : Ed. Revista dos Tribunais, n. 02., 1997.

16 MATTOS NETO, Antônio José. Função social da propriedade: uma revisão crítica. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário, e Empresarial, São Paulo, v.20, n. 76, 1996.

17 MATTOS NETO, Antônio José. Função social da propriedade: uma revisão crítica. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário, e Empresarial, São Paulo, v.20, n. 76, 1996.

18 MATTOS NETO, Antônio José. Função social da propriedade: uma revisão crítica. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário, e Empresarial, São Paulo, v.20, n. 76, 1996.

19 MATTOS NETO, Antônio José. Função social da propriedade: uma revisão crítica. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário, e Empresarial, São Paulo, v.20, n. 76, 1996.

20MATTOS NETO, Antônio José. Função social da propriedade: uma revisão crítica. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário, e Empresarial, São Paulo, v.20, n. 76, 1996.

21 SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico brasileiro. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1998.

22 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função ambiental da propriedade. Revista de Direito Ambiental, São Paulo : Ed. Revista dos Tribunais, v. 3, n.9, jan./mar., 1998.

23 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco; RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Ambiental e Legislação Aplicável. São Paulo : Max Limonad, 1997.

24 SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico brasileiro. 2. ed. rev. e atual. São Paulo : Malheiros, 1997.

25 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1989.

26 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1989.

27 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 19º ed. São Paulo : Malheiros, 1994.

28 LEITE, José Rubens Morato. Introdução ao conceito jurídico de meio ambiente. Mimeo, 1997.

29 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco e RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Ambiental e Legislação Aplicável. São Paulo : Max Limonad, 1997.

30 CAPPELLETTI, Mauro. Formações sociais e interesses coletivos diante da justiça civil. Revista de Processo. São Paulo, n. 5, 1977.

31 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo : Malheiros, 1995.

32 LEITE, José Rubens Morato. Introdução ao conceito jurídico de meio ambiente. Mimeo, 1997.

33 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo : Malheiros, 1995.

34 BENJAMIM, Antônio Herman V. Reflexões sobre a hipertrofia do direito de propriedade na tutela da Reserva Legal e áreas de preservação permanente. In: Congresso Internacional de Direito Ambiental, 2., 1995. Anais. São Paulo : Instituto "O direito por um Planeta Verde", 1997.

35 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1989.

36 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1989.

37 MACHADO, op. cit.

38 MIRRA, Álvaro Luiz. Princípios Fundamentais do Direito Ambiental. In: _. Cidadania Coletiva. Florianópolis : Paralelo 27, 1996.

39 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1989.

40 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo : Malheiros, 1995.

41 BIRNFELD, Carlos André Sousa. A emergência de uma dimensão ecológica para a cidadania - alguns subsídios aos operadores jurídicos. 1997. Dissertação (Mestrado em Direito) - Curso de Pós Graduação em Direito, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1997.

43 SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico brasileiro. 2. ed. rev. e atual. São Paulo : Malheiros, 1997.

44 BIRNFELD, Carlos André Sousa. A emergência de uma dimensão ecológica para a cidadania - alguns subsídios aos operadores jurídicos. 1997. Dissertação (Mestrado em Direito) - Curso de Pós Graduação em Direito, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1997.

45 CAUBET, Christian Guy (org.). O Tribunal da água: casos e descasos. Florianópolis : Imprensa Universitária da UFSC, 1994.

46 VELOSO, Zeno. Há mais de 25 anos em discussão, projeto aprovado reflete novas realidades. O Liberal, Belém, 19 ago. 2001. Caderno Cartaz.

47 MATTOS NETO, Antônio José de. Função ética da propriedade imobiliária no novo Código Civil. Revista Jurídica Consulex, Brasília, v. 6, n. 129, maio 2002.

48 MATTOS NETO, op. cit.

49 MATTOS NETO, Antônio José de. Função ética da propriedade imobiliária no novo Código Civil. Revista Jurídica Consulex, Brasília, v. 6, n. 129, maio 2002.

50 op. cit.

51 op. cit.

52 MATTOS NETO, Antônio José de. Função social da propriedade e trabalho rural na Amazônia. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região, Belém, v.29, n.57, jul./dez. 1996.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DECASTRO, Rui Afonso Maciel. A função sócio ambiental da propriedade na Constituição de 1988. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 466, 16 out. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5765. Acesso em: 27 abr. 2024.