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Ações Possessórias

Ações Possessórias

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O que é a posse? Quais os seus efeitos? Quais as medidas judiciais que podem ser utilizadas nas ações possessórias?

1. INTRODUÇÃO

As ações possessórias são extremamente comuns no sistema judiciário brasileiro, muito em função do grande volume de concentração de terras e da organização de movimentos de apoio aos movimentos que reivindicam a tão comentada reforma agrária, com destaque para o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra.

Inicialmente, este trabalho buscará conceituar o instituto da posse, bem como seus efeitos práticos, com esteio nos conceitos históricos, na doutrina e na jurisprudência atual dos Tribunais.

Em seguida, será enfrentado o tema principal, à luz das normas vigentes, mormente o Código Civil de 2002 e o Código de Processo Civil de 2015, e a sua abordagem com relação às ações possessórias.

Sendo assim, o objetivo deste trabalho é demonstrar como se dão as ações possessórias, em que se baseiam, quem pode promovê-las, e como devem ser instruídas, além de outros temais essenciais ao estudo da posse e de suas ações defensivas.

2. POSSE

Historicamente, doutrinadores buscam conceituar e classificar juridicamente o instituto da posse, gerando extensa discussão sobre a matéria.

A primeira controvérsia a ser debatida consiste em estabelecer se a posse se trata de fato ou direito.

Não é novidade que Savigny, ao elaborar sua teoria subjetiva sobre a posse, defendeu que esta se constituiria a partir de dois elementos, o corpus e o animus. Seria possuidor, portanto, aquele que, ao mesmo tempo, dispusesse fisicamente da coisa, controlando-a materialmente, e ainda tivesse a intenção de exercer seus direitos sobre a coisa como se proprietário fosse, em outras palavras, vontade de ter a coisa para si.

Nessa esteira, a posse seria um fato na sua concepção, mas um direito em seus desdobramentos, uma vez que possuiria o condão de facultar ao possuidor defender sua posse, não estando, em razão disso, intimamente ligado ao direito real de propriedade.

Noutra sorte, Ihering desenvolveu a teoria objetiva da posse, segundo a qual bastaria o elemento corpus para que fosse constituída a posse. E aqui, cabe ressaltar, que o conceito de corpus diverge um pouco daquele adotado por Savigny, já que Ihering entendia que referido elemento seria não apenas um controle material, mas sim um exercício da propriedade, do qual qualquer pessoa pudesse reconhecer a destinação e exploração econômica da coisa.

Sendo assim, para Ihering a posse seria um direito, tendo em vista que aquela dá ao interesse de explorar economicamente a coisa, a proteção jurídica inerente de um direito propriamente dito.

O Código Civil Brasileiro de 2002 consagrou a teoria objetiva de Ihering quando trata da posse, tendo, contudo, inserido em alguns momentos a teoria subjetiva de Savigny. Neste sentido, o artigo 1.196 do referido Código:

Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.

Quanto à natureza da posse, a maior parte da doutrina entende se tratar de um instituto de natureza híbrida, apresentando ora características de direito real, ora de direito obrigacional.

Com efeito, parece que não foi intenção do legislador classificar a posse como um direito real, uma vez que estes têm caráter numerus clausus, estabelecidos no art. 1.225 do Código Civil de 2002, e a posse, por sua vez, dispõe de Título próprio, inserido no livro Direito das Coisas.

Para Cristiano Farias e Nelson Rosenvald (2012) a posse pode ser dimensionada de três maneiras. A primeira, quando o proprietário é possuidor de seu próprio bem, sendo a posse considerada direito real. A segunda, quando a posse emana de contrato de usufruto, penhor, enfiteuse, locação, promessa de compra e venda ou comodato, situação em que a posse poderá ser tanto direito real quanto obrigacional. Finalmente, a terceira situação se dá quando a posse emana de ocorrência fática e existencial de ocupação da coisa, mesmo sendo contra o proprietário da coisa, daí porque não se confundem posse e propriedade.

É importante fazer ainda uma breve distinção entre os conceitos de posse e detenção.

De acordo com o art. 1.198 do Código Civil de 2002, detentor é todo aquele que conserva a posse em nome de outrem, a quem se acha em relação de dependência:

Art. 1.198. Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas.

Percebe-se, portanto, que a lei trata a detenção como uma posse desqualificada, ou diminuída, em razão de um vínculo de subordinação. Assim, apesar de muito se assemelharem, não se confundem os dois institutos, porquanto a detenção configura uma posse desprestigiada pela própria lei. 

Referida diminuição restringe as ações a serem tomadas pelo detentor, que só poderá, por exemplo, promover ação possessória em último e extremo caso, de maneira excepcional.

Finalmente, é essencial para a sequência deste trabalho a conceituação de posse de boa-fé e sua diferenciação quanto à posse de má-fé.

Por sorte, o legislador se encarregou de bem conceituar o possuidor de boa-fé, quando dispôs no artigo 1.201 do Código Civil de 2002:

Art. 1.201. É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa.

Assim, pode-se aferir que o possuidor terá agido de boa-fé quando não conhecer alguma situação que obste a sua tentativa de adquirir a coisa. De maneira contrária, quando mesmo tendo ciência de fator que o impeça de sequer dar início à posse o agente ainda assim a realiza, está-se diante de uma posse de má-fé.

3. EFEITOS DA POSSE

Apesar de o presente trabalho tratar especificamente das ações possessórias, é de bom alvitre fazer uma sucinta análise dos demais efeitos da posse estabelecidos em nosso ordenamento jurídico.

O primeiro deles é o direito à percepção dos frutos. Para Farias e Rosenvald, frutos são “as utilidades econômicas que a coisa periodicamente produz, sem alteração ou perda da substância.” Não se confundem os frutos, portanto, com os produtos. Enquanto aqueles se renovam periodicamente mesmo após sua exploração, estes não o fazem, ao passo que se exaurem à proporção que são extraídos da coisa principal.

Os frutos podem ser naturais, industriais ou civis.

Naturais são os frutos que se extraem da própria coisa principal, provenientes de sua força orgânica e renovados pela própria natureza, como por exemplo, as frutas de uma árvore. Os frutos industriais decorrem de atividade humana, geralmente sobre a natureza, como é o caso das produções fabris. Por fim, frutos civis são aqueles que se originam de uma relação jurídica, sendo por muitas vezes constituídas pelo uso da coisa principal por outrem que não o proprietário, gerando rendas pecuniárias periódicas, como no caso do aluguel de imóvel.

O Código Civil de 2002 estabelece que tem direito a perceber os frutos o possuidor de boa-fé, enquanto esta durar, com a ressalva de que os frutos pendentes ao tempo em que se encerrar a posse de boa-fé deverão ser restituídos ao proprietário, depois de liquidadas as despesas com a produção e o custeio, além daqueles colhidos antecipadamente:

Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.

Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação.

O possuidor de má-fé, por sua vez, deverá responder por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como aqueles que tenham deixado de ser percebidos, por sua culpa, tendo direito apenas de ser restituído quanto às despesas de produção e custeio.

Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio.

Com relação à responsabilidade do possuidor, essa também dependerá da condição de boa ou má-fé deste, conforme os artigos 1.217 e 1.218. Se de boa-fé, o possuidor não responderá pela perda ou deterioração da coisa a que não der causa. Se de má-fé, o possuidor responderá pela perda ou deterioração da coisa, mesmo que decorrentes de acidentes, exceto se restar provado que, estando a coisa na posse do reivindicante, também ocorreria referida perda ou a deterioração.

Art. 1.217. O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da coisa, a que não der causa.

Art. 1.218. O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do reivindicante.

Relevante também são os efeitos da posse no que tange às benfeitorias.

Mais uma vez é de extrema relevância o fato de o possuidor ser ou não de boa-fé, já que, nessa condição, o possuidor terá direito à indenização pelas benfeitorias necessárias e úteis, podendo, inclusive, reter a coisa enquanto não lhe forem pagos os devidos valores. Além disso, quanto às benfeitorias voluptuárias, o possuidor de boa-fé poderá exercer o direito de tolher, ou seja, poderá retirar a benfeitoria e levá-la consigo, se isso não gerar prejuízo à coisa principal.

Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.

É válido ressaltar que a obrigação de indenizar as benfeitorias encontra fundamento nos artigos 884 a 886 do Código Civil de 2002, os quais vedam taxativamente o enriquecimento sem causa.

Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido.

Art. 885. A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.

Art. 886. Não caberá a restituição por enriquecimento, se a lei conferir ao lesado outros meios para se ressarcir do prejuízo sofrido.

De maneira contrária, o possuidor de má-fé somente terá direito à indenização pelas benfeitorias necessárias, não podendo sequer exercer o direito de retenção, ou mesmo o de tolher.

Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.

4. AMEAÇA, TURBAÇÃO E ESBULHO

Para o estudo das ações possessórias é importante ainda distinguir de maneira clara as três formas básicas de agressão à posse, que poderão ensejar a proteção desta por meio de uma ação.

 A ameaça, como o próprio nome já diz, não consiste em uma ação propriamente dita, mas configura um risco eminente à posse. Não se olvide que apenas a ameaça em si não possibilita a proteção possessória, haja vista que o possuidor deverá comprovar, juntamente com a ameaça, a concreta posse sobre o bem, além do justo receio de ser molestado.

Neste sentido, o seguinte julgado:

APELAÇÃO CÍVEL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. RECEBIMENTO COMO INTERDITO PROIBITÓRIO. FUNGIBILIDADE DAS AÇÕES POSSESSÓRIAS. ÁREA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL. CONSTRUÇÃO IRREGULAR. NOTIFICAÇÃO EXPEDIDA PELA MUNICIPALIDADE QUE NÃO CONFIGURA AMEAÇA À POSSE DA AUTORA. PODER DE POLÍCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

1. Cuida-se de ação de manutenção de posse ajuizada em face do Município de Macaé, na qual a autora sustenta que sua posse sobre imóvel que nele estabeleceu moradia.

2. Correto o juízo a quo ao receber como interdito proibitório a manutenção de posse proposta, na medida em que não há notícias nos autos da existência de lesão concreta à posse da autora, mas tão somente uma notificação expedida pelo réu, informando sobre as irregularidades das construções em área de preservação ambiental, bem como cientificando-a para desocupar a área, sob pena de demolição das benfeitorias.

3. A fungibilidade entre as ações possessórias encontra-se previsão nos arts. 920 e 933 do CPC.

4. Para se obter a proteção proibitória, o possuidor deve comprovar determinados pressupostos, quais sejam: a posse sobre o bem, a ameaça contra essa posse, e o justo receio de ser molestado.

(...)

(Apelação Cível nº 00115485020118190028, Tribunal de Justiça do RJ, Relatora: DES. MONICA MARIA COSTA DI PIERO, Julgado em 29/09/2015)

            Segundo Orlando Gomes (1958), turbação é “todo ato que embaraça o livre exercício da posse”. Em outras palavras, a turbação é a ação praticada por outrem que limita ou dificulta a posse, não chegando a impossibilitá-la. Parece clara a diferença entre a ameaça e a turbação, uma vez que nesta resta configurada uma ação que intenta contra a posse, enquanto naquela ainda não houve ação concreta, mas sim fundado receio de que esta venha a ocorrer.

            Com relação à turbação, cita-se o seguinte julgado:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE MANUTENÇÃO E REINTEGRAÇÃO DE POSSE. TURBAÇÃO.

Reconstitui-se coerente o conjunto de alegações e provas que justificam a procedência da manutenção da posse, considerando a relevância das afirmações do demandante e a existência de elementos de convicção que indiciam que as divisas das áreas sempre foram respeitadas, de modo que, os atos dos demandados de abertura de uma vala apropriando-se de aproximadamente dois hectares na divisa das propriedades, caracterizam turbação à posse. (Apelação Cível Nº 70067173294, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Cini Marchionatti, Julgado em 02/12/2015).

         Já o esbulho, de acordo com Farias e Rosenvald, acontece quando o possuidor é privado do poder físico e da ingerência socioeconômica da coisa. Ressaltam ainda os doutrinadores que não basta, para a configuração do esbulho, o mero incômodo ou perturbação da posse, característicos da ameaça e da turbação, mas sim a total perda de controle e atuação material sobre o bem. Pode ainda o esbulho ser parcial ou total, sendo aquele o caso de o possuidor ver esbulhada apenas uma parcela de sua coisa.

         Em suma, diferencia-se o esbulho em razão do seu caráter de ação permanente, na qual o possuidor é inequivocamente impedido de exercer suas faculdades.

5. AÇÕES POSSESSÓRIAS

            As ações possessórias são o meio judicial pelo qual o possuidor que se sentir ameaçado, turbado ou esbulhado poderá promover a fim de ver sua posse devidamente restituída.

            Quanto à legitimidade para propositura da ação, esta pertence aos possuidores diretos e indiretos. Admite-se, no entanto, em casos de extrema necessidade e excepcionalidade, nos quais haja grave perigo à integridade da coisa e prolongada ausência do possuidor, que o detentor promova a ação a fim de proteger a posse de seu subjugador.

            Há na doutrina certa divergência com relação à classificação destas ações. Isso porque uma corrente defende um sistema de proteção da posse mais abrangente, no qual se incluiriam algumas ações que visam proteger também o direito à propriedade, além da imissão de posse, que não visa a defesa da posse, mas sim a investidura de um sujeito como possuidor. São elas: a ação de nunciação de obra nova, os embargos de terceiro, senhor e possuidor, a ação de dano infecto e a já citada imissão de posse. Estas serão comentadas apenas a título ilustrativo.

            A imissão de posse trata-se, na verdade, de ação petitória, e não possessória, já que não foi classificada como tal nem no Código de Processo Civil de 1973, nem no de 2015. Esta ação visa, em síntese, prover a posse ao proprietário que não a tenha. É comumente utilizada nas arrematações de bens em leilões e na forma de mandado, nos processos executórios.

            A nunciação de obra nova visa embargar uma construção nova em terreno vizinho, se esta prejudicar-lhe ou se estiver em desrespeito às normas legais, ou ainda para obstar que um condômino realize obra que prejudique ou modifique o bem comum. É importante ressaltar que referida ação não foi disposta no novo Código de Processo Civil de 2015, restando ao interessado que se utilize do procedimento comum, podendo cominar um pedido de tutela provisória nos casos de urgência.     

         Os embargos de terceiro prestam à defesa da posse ou da propriedade turbada ou esbulhada por apreensões judiciais, seja penhora, depósito, arresto, sequestro, dentre outras. Dispõe o art. 674 do Código de Processo Civil de 2015:

Art. 674.  Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro.

§ 1o Os embargos podem ser de terceiro proprietário, inclusive fiduciário, ou possuidor.

         Na exordial, o embargante deverá provar tanto sua posse quanto a sua qualidade de terceiro no processo.

         Por fim, a ação de dano infecto, que também não se trata propriamente de uma ação possessória, mas segue o rito ordinário. Visa exigir que o proprietário de um imóvel vizinho garanta-lhe indenização, reparação ou mesmo a demolição em caso de ruína de sua coisa, que possa causar prejuízo ou dano ao demandante. Na prática, é pouco utilizada, porquanto outros meios demonstram-se mais eficientes.

6. INTERDITO PROIBITÓRIO

            O interdito proibitório é a ação possessória utilizada quando o possuidor estiver na iminência de ter sua posse prejudicada. Consiste, portanto, na hipótese já comentada de ameaça à posse. Farias e Rosenvald a conceituam como a “defesa preventiva da posse, diante da ameaça de iminentes atos de turbação ou esbulho, objetivando impedir a consumação do ato de violência temido.” Possui caráter preventivo, e está previsto nos arts. 567 e 568 do Código de Processo Civil de 2015:

Art. 567.  O possuidor direto ou indireto que tenha justo receio de ser molestado na posse poderá requerer ao juiz que o segure da turbação ou esbulho iminente, mediante mandado proibitório em que se comine ao réu determinada pena pecuniária caso transgrida o preceito.

Art. 568.  Aplica-se ao interdito proibitório o disposto na Seção II deste Capítulo.

            Dos dois artigos, podemos inferir duas conclusões básicas.

            A primeira é que, para a proposição de interdito proibitório, o autor da ação deverá demonstrar o justo receio de ser molestado, não podendo o magistrado conceder o mandado proibitório ao possuidor que não consiga provar que há fundamento sua aflição quanto a um possível ato de turbação ou esbulho. A segunda é que, conforme o artigo 568, o rito adotado para o interdito proibitório será o mesmo das ações de manutenção e reintegração de posse, dispostas nos artigos 560 a 566 do Código de Processo Civil de 2015.

         A pretensão judicial deve atingir o iminente turbador ou esbulhador, devendo o juiz, ao conceder a proteção possessória através do mandado proibitório, estabelecer também pena pecuniária para o caso de desobediência da ordem judicial. A doutrina diverge quanto à exigência ou não da vontade, de fato, de o sujeito turbar ou esbulhar a coisa, o chamado animus turbandi. Para Orlando Gomes, parece desnecessária tal pretensão, bastando apenas que o receio do possuidor seja devidamente fundado, para que faça jus ao mandado proibitório.

         Na jurisprudência recente dos Tribunais, é comum ver a figura do interdito proibitório, principalmente em caso de greves, nas quais o estabelecimento sente-se ameaçado ante a possibilidade de turbação ou esbulho do imóvel por parte dos grevistas.

            Neste sentido:

AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. INTERDITO PROIBITÓRIO. MULTA POR DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL.

A parte agravante não apresenta argumentos novos capazes de desconstituir a juridicidade da decisão agravada, no sentido de que no recurso de revista não houve demonstração de violação de dispositivos da Constituição Federal (arts. 9º, -caput- e 150, IV) e de lei federal (arts. 1º da Lei 7.783/89; e 295, V, do CPC). O Tribunal Regional firmou convicção de que não atenta contra o direito de greve a decisão judicial que reconhece a turbação do sindicato e desrespeita ordem de desobstrução do acesso aos locais de trabalho, impedindo a passagem de veículos e de trabalhadores que não aderiram à greve, que não pode ser exercida de forma abusiva. Agravo a que se nega provimento.

(Agravo de Instrumento Nº 616006420115160002, Primeira Turma, Tribunal Superior do Trabalho, Relator: Walmir Oliveira da Costa, Julgado em 28/05/2014).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. INTERDITO PROIBITÓRIO. ENCERRAMENTO DA GREVE. CARÊNCIA DE AÇÃO SUPERVENIENTE. ART. 267, VI, DO CPC.

Diante de potencial violação ao art. 267, VI, do CPC, dá-se provimento ao agravo de instrumento. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. INTERDITO PROIBITÓRIO. ENCERRAMENTO DA GREVE. CARÊNCIA DE AÇÃO SUPERVENIENTE. ART. 267, VI, DO CPC. C om o encerramento do movimento paredista, cujo direito é legítimo (art. 9º, CF), não subsiste o interesse da parte autora à tutela estatal sobre o bem jurídico ameaçado, uma vez que desapareceu o interesse processual motivador da propositura da ação de interdito proibitório, não mais justificando seu prosseguimento, ante a perda de seu objeto. Tal circunstância autoriza concluir pela perda superveniente de interesse de agir, que, nos moldes do art. 267, VI, do CPC, redundará na extinção do feito sem resolução o mérito. RECURSO DE REVISTA CONHECIDO E PROVIDO.

(Agravo de Instrumento Nº 14836220115020046, Terceira Turma, Tribunal Superior do Trabalho, Relatora: Vânia Maria da Rocha Abensur, Julgado em 21/10/2015).

7. MANUTENÇÃO DE POSSE

A ação de manutenção de posse tem como principal objetivo conceder a proteção possessória a quem tenha sua coisa turbada por outrem, através de mandado judicial que ordene a cessação do embaraço à posse. A lei impõe alguns requisitos para a sua concessão, os quais estão dispostos no art. 561 do Código de Processo Civil de 2015, e valem tanto para a manutenção, quanto para a reintegração de posse:

Art. 561.  Incumbe ao autor provar:

I - a sua posse;

II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;

III - a data da turbação ou do esbulho;

IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração.

O autor poderá ainda cumular ao pedido de proteção possessória o de reparação por eventuais danos causados pelos atos de turbação, além de estipulação de pena para o caso de o turbador praticar novos atentados contra a posse do autor, conforme se extrai da leitura do art. 555, do Código de Processo Civil de 2015:

Art. 555.  É lícito ao autor cumular ao pedido possessório o de:

I - condenação em perdas e danos;

II - indenização dos frutos.

Parágrafo único.  Pode o autor requerer, ainda, imposição de medida necessária e adequada para:

I - evitar nova turbação ou esbulho;

(...)

            No que cabe ao réu, este poderá promover reconvenção, nos termos do art. 556 do Código de Processo Civil de 2015:

Art. 556.  É lícito ao réu, na contestação, alegando que foi o ofendido em sua posse, demandar a proteção possessória e a indenização pelos prejuízos resultantes da turbação ou do esbulho cometido pelo autor.

            Ressalte-se ainda que, ao contrário do que acontece na ação de reintegração de posse, na qual a sentença prolatada pelo magistrado terá tanto efeitos de reintegração e execução, na ação de manutenção de posse a determinação ordenada pelo juiz se revestirá de caráter persuasivo e coercitivo, fazendo com que o turbador sinta-se compelido a cessar os atos de turbação.

8. REINTEGRAÇÃO DE POSSE

A ação de reintegração deve ser utilizada por possuidor que tenha sido esbulhado de sua posse, com o objetivo de recuperar para si o poder sobre a coisa.

De acordo com o art. 1.212 do Código Civil de 2002, o possuidor poderá promover a ação de reintegração de posse não só contra quem promova o esbulho, mas também contra o terceiro que a receba tendo ciência de que fora esbulhada, configurando, assim, um possuidor de má-fé, pois não ignorava vício que o obstava a aquisição da coisa:

Art. 1.212. O possuidor pode intentar a ação de esbulho, ou a de indenização, contra o terceiro, que recebeu a coisa esbulhada sabendo que o era.

Para Farias e Rosenvald, referido artigo apenas reforça a tese de que a posse não se caracteriza exclusivamente como um direito real, uma vez que, se o fosse, teria jus persequendi em caráter erga omnes, e não condicionada em certos casos à boa ou má-fé do agente.

Com relação à ação contra terceiros de má-fé, os seguintes julgados:

PROCESSO CIVIL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ESBULHO. POSSE PRECÁRIA E CLANDESTINA. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. AUSENCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. NÃO CONHECIMENTO DA APELAÇÃO DO RÉU. INDENIZAÇÃO CONTR/A O TERCEIRO QUE RECEBEU A COISA ESBULHADA CIENTE DO VÍCIO.

1. Apelação que não ataca os fundamentos da sentença fere o princípio da dialeticidade, correlato do requisito extrínseco de admissibilidade dos recursos, qual seja a regularidade formal. Não conhecimento do recurso da ré. Precedentes TJPE, STF e STJ.

2. No caso dos autos, configurou-se a posse injusta do apelado, tendo em vista sua clandestinidade e precariedade por saber que os bens móveis pertenciam ao apelante.

3. Assim, verificado o esbulho com a posse precária e clandestina da ré, configurado está o ilícito e consequentemente o dever de indenizar os prejuízos sofridos pelo apelante tendo em vista de que não pode o apelado enriquecer-se ilicitamente à custa do apelante.

4. Nesse sentido, ressalte-se que o art. 1212 do CC autoriza expressamente o apelante a requerer a indenização contra o terceiro que recebeu a coisa esbulhada sabendo que o era. Precedentes Tribunais Pátrios.

(Apelação Nº 2702396, 5ª Câmara Cível, Tribunal de Justiça de Pernambuco, Relator: Stênio José de Sousa Neiva Coelho, Julgado em 13/11/2013).

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ARRENDAMENTO MERCANTIL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. VEÍCULO ENCONTRADO EM PODER DE TERCEIRO. NÃO-CUMPRIMENTO DA LIMINAR PELO OFICIAL DE JUSTIÇA. POSTERIOR DETERMINAÇÃO, AO TERCEIRO, DE ENTREGA DO AUTOMÓVEL OU DO DEPÓSITO DE SEU VALOR EM DINHEIRO, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA. INEFICÁCIA. NECESSIDADE DE PRÉVIA INCLUSÃO FORMAL DESSA PESSOA NO PROCESSO. LEGITIMAÇÃO PASSIVA QUE PRESSUPÕE A CIÊNCIA DO ESBULHO PELO POSSUIDOR DERIVADO. LIMITES SUBJETIVOS DOS ATOS JUDICIAIS. DEVIDO PROCESSO LEGAL. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 1.212 DO CÓDIGO CIVIL E 472 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

I - Se a sentença, a teor do art. 472 do Código de Processo Civil, não atinge terceiros, a decisão interlocutória, um minus em relação àquela, com muito mais razão também não pode afetar pessoa estranha à relação processual, máxime porque ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal.

II - A oposição erga omnes do direito perseguido em juízo não implica menoscabo das regras processuais, sujeitando alguém a ter sua situação jurídica objeto de intervenção judicial, sem que observadas as formalidades legais.

III - A ação de reintegração de posse pode ser intentada não apenas contra quem praticou o esbulho, mas também contra o terceiro, que adquiriu a coisa do esbulhador, desde que ciente do vício, conforme exigência do art. 1.212 do Código Civil.

(Apelação Nº 184982007, 2ª Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Maranhão, Relator: Marcelo Carvalho Silva, Julgado em 07/01/2008).

É sabido que em muito se assemelham as ações de manutenção e reintegração de posse, uma vez que estão dispostas na mesma seção do capítulo do Código de Processo Civil de 2015 que versa sobre as ações possessórias.

Por isso mesmo que, conforme comentado no tópico anterior deste trabalho, também na reintegração de posse o autor terá que cumprir os requisitos dispostos no art. 561, bem como também lhe será facultada a cumulação de perdas e danos e a indenização dos frutos, nos termos do art. 555, ambos do Novo Código de Processo Civil.

9. AUTOEXECUTORIEDADE

A despeito da possibilidade de se promover ação possessória visando defender sua posse, o possuidor poderá, cumpridos alguns requisitos básicos, promover a chamada autoexecutoriedade.

Consiste, em suma, em defender a posse turbada ou esbulhada com seus próprios meios, sem depender para isso do poder estatal. Encontra-se fundamentado no §1º do art. 1.210, do Código Civil de 2002:

Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.

§ 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.

É válido ressaltar que a ameaça à posse não configura possibilidade de defesa extrajudicial, apenas os atos de turbação e esbulho.

Como dito, alguns critérios haverão de ser respeitados para que se possa praticar a autoexecutoriedade, ou autotutela.

O primeiro deles é o caráter imediato da ação, ou seja, o possuidor deverá agir tão logo tenha ocorrido a agressão à posse. Além disso, os atos defensivos adotados deverão sempre respeitar o princípio da proporcionalidade, não podendo o possuidor se exceder em suas ações, mas podendo valer-se do auxílio de outrem.

Costuma-se dividir os atos defensivos em legítima defesa e desforço imediato, já que, enquanto este visa proteger a posse de um esbulho, aquela é utilizada quando se turba uma posse.

Quanto à legitimidade, entende-se que tanto o possuidor indireto quanto o direto a têm, porquanto ambos possuem interesses relacionados à coisa, sejam materiais ou econômicos.

Neste sentido, os seguintes julgados:

Posse. Turbação. Direito do PROPRIETÁRIO em utilizar-se da própria força para manter a posse de imóvel. Aplicação do art. 1.210, § 1º, do Código Civil. Sentença de primeiro grau reformada. Recurso provido.

É fato incontroverso que a autora construiu uma cerca no terreno vizinho a sua residência, cuja propriedade está em nome do espólio de Eugênio José dos Santos, constando os herdeiros no pólo passivo.

A autora diz que teria construído a cerca por precaução, sem sequer justificar o motivo pelo qual deveria se precaver.

Conclui-se, pois, que o imóvel sofreu turbação. Não resta dúvida, portanto, da ilicitude na conduta da autora da demanda.

Trata-se de caso em que se aplica o art. 1.210, § 1º, do Código Civil, que dispõe: “O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.”

Portanto, a derrubada da cerca pelos demandados está legitimada, tratando-se de exercício regular do direito.

Cabe salientar que, segundo a autora, a construção da cerca teve início em 01 de abril e foi derrubada já no dia 07 do mesmo mês, restando preenchido o requisito temporal apontado no dispositivo do Código Civil.

Ademais, ressalto que o valor gasto pela autora na construção da cerca não diz respeito aos proprietários do imóvel turbado. A eles cabe apenas usar dos meios necessários para manterem-se na posse do imóvel, sendo imprescindível a derrubada da cerca, com a inevitável quebra de algumas madeiras, conforme se observa nas fotografias anexadas às fls. 21/35.

Portanto, estando a conduta dos demandados legalmente protegida, não há que se falar em direito à indenização em favor da autora.

(Recurso Inominado Nº 71002945673, 2ª Turma Recursal Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relatora: Vivian Cristina Agonese Spengler, Julgado em 28/09/2011).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. INVASÃO DE MOVIMENTO AGRÁRIO. LEGÍTIMA DEFESA DA POSSE. INEXISTÊNCIA DE ILICITUDE NA CONDUTA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO IMPROVIDO.

A propriedade é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela pode penetrar sem consentimento do morador ou do legítimo dono, estabelece o artigo 5º, caput e incisos XI e XXII, da Constituição Federal, sendo que a função social da propriedade e a desapropriação por necessidade e utilidade pública somente poderão ser definidas por lei mediante ordem judicial, nunca por vontade de grupos ou movimentos.

A defesa legítima do direito de propriedade, rural ou urbana, isenta de pena quando são usados os meios necessários para repelir agressão atual ou iminente. Portanto, o legítimo proprietário de terra ou o terceiro por ele contratado para guardar o direito de propriedade encontra-se devidamente amparado por lei.

(Apelação Nº 3711, 1ª Turma Cível, Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, Relator: Joenildo de Sousa Chaves, Julgado em 13/05/2008).

10. ASPECTOS PROCESSUAIS

Algumas questões processuais são de suma relevância quando se trata das ações possessórias.

A primeira delas é a fungibilidade dos interditos, que ocorre quando o autor ao propor determinada ação possessória, troque por outra que não a adequada, sem que isso acabe lhe prejudicando, pois o magistrado poderá conhecer e prover o pedido possessório referente à pretensão correspondente, de acordo com o art. 554, caput, do Código de Processo Civil de 2015:

Art. 554.  A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos pressupostos estejam provados.

A ação possessória será convertida nas hipóteses de errônea denominação da ação, descrição equivocada da agressão à posse, e quando os fatos narrados sofrerem modificações ao longo da ação.

Neste sentido, os seguintes julgados:

APELAÇÃO CÍVEL. POSSE (BENS IMÓVEIS). AÇÃO DE MANUTENÇÃO DE POSSE CONVERTIDA EM AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE DAS AÇÕES POSSESSÓRIAS. POSSE ANTERIOR NÃO DEMONSTRADA. IMPOSSIBILIDADE DE REINTEGRAÇÃO.

É tempestivo o recurso interposto no último dia do prazo, considerado o feriado forense (08 de dezembro, Dia da Justiça), que prorrogou o prazo judicial. Preliminar contrarrecursal rejeitada. Já tendo havido esbulho, não há se falar em ação de manutenção de posse, mas sim, em ação de reintegração de posse. Aplicação do princípio da fungibilidade das ações possessórias. Para o deferimento do pedido de reintegração de posse, mister sejam atendidos os requisitos do art. 927 do CPC. Requisitos não preenchidos, no caso concreto. Parte autora que não comprovou, de modo satisfatório, a sua posse anterior sobre o imóvel objeto do litígio, ônus que lhe cabia, a teor do disposto no art. 333, inc. I, do CPC. Improcedência do pedido. REJEITARAM A PRELIMINAR CONTRARRECURSAL E NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME.

(Apelação Cível Nº 70041518259, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Elaine Maria Canto da Fonseca, Julgado em 28/08/2014.)

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. AREA INVADIDA POR MUNICÍPIO. NECESSIDADE DE AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE DAS AÇÕES POSSESSÓRIAS. EMBARGOS ACOLHIDOS. OMISSÃO SANADA. SEM ALTERAÇÃO DO JULGADO.

1. Segundo Hely Lopes Meireles, "Consumado o apossamento dos bens e integrados no domínio público, tornam-se, daí por diante, insuscetíveis de reintegração ou reivindicação, restando ao particular espoliado haver a indenização correspondente, da maneira mais completa possível, inclusive correção monetária, justos moratórios, compensatórios a contar do esbulho e honorários de advogado, por se tratar de ato caracteristicamente ilícito da Administração." 2. Impossibilidade de aplicação do princípio da fungibilidade das ações possessórias, porquanto a ação cabível não se amolda a qualquer das ações possessórias. 3. Embargos de declaração acolhidos para sanar a omissão apontada, sem alteração de resultado.

(Embargos de Declaração na Apelação Cível Nº 200001000019410, Quarta Turma Suplementar, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, Relator: Marcio Barbosa Maia, Julgado em 09/07/2013.)

Outra questão processual importante diz respeito à concessão de tutela antecipada, que também deverá atender a alguns requisitos.

Com efeito, estabelece o art. 562 do Novo Código de Processo Civil que o magistrado poderá conceder a proteção possessória, inaudita altera pars, se o autor apresentar petição inicial devidamente instruída, conforme já comentado, quando analisados os requisitos constantes do art. 561:

Art. 562.  Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração, caso contrário, determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada.

Ressalte-se que referida liminar tem caráter provisório, podendo o juiz reformá-la em sede de sentença.

Questionável é o assunto com relação à concessão de tutela antecipada em ações de força velha, ou seja, em que já decorreram mais de um ano e um dia desde a data da agressão. Farias e Rosenvald posicionam-se contra, uma vez que tal prática ensejaria em burla à sistemática das ações possessórias.

Com relação ao presente assunto, a seguinte jurisprudência:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LIMINAR DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO PRÉVIA. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO. INCIDÊNCIA DA SEGUNDA PARTE DO ART. 928 DO CPC. 1. "Se a petição inicial não traz provas suficientes para justificar a expedição de mandado liminar de posse, deve o juiz cumprir o que dispõe a segunda parte do art. 928 do CPC e determinar a realização de audiência de justificação prévia com o fim de permitir ao autor a oportunidade de comprovar suas alegações" (REsp 900.534/RS, Quarta Turma, Superior Tribunal de Justiça, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJe de 14/12/2009). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.

REFERÊNCIAS

GOMES, Orlando, 1909-1988. Direitos Reais. 21ª edição ed. rev. e atual. / por Luiz Edson Fachin. Rio de Janeiro. Forense. 2012.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil, v. 4: Direito das Coisas. 6ª edição revista, atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2014.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil, Volume 5: Direitos Reais. 8ª edição. Salvador. JusPodivm. 2012.

BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF. 11 jan. 2002. <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>.

BRASIL. Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015. Institui o Código de Processo Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF. 17 mar. 2015. <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>.



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