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Parcerias público-privadas

as realidades de um sonho

Parcerias público-privadas: as realidades de um sonho

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O modelo PPP sucede os recentes esforços de conferir às concessões, associadas ao processo privatista, um papel redentor da capacidade de liderança da Administração na alavancagem da atividade econômica.

             "Quando se sonha e se dá precisão ao objeto sonhado, se houver "bancabilidade" ele se converte em uma realização. (...) é o sonho do desenvolvimento com inclusão social e soberania"

Carlos Lessa – Presidente do BNDES


Resumo

            Esta monografia trata da parceria público-privada – PPP, uma política conduzida pela Administração Pública brasileira, do governo Lula, para conferir maior eficiência econômica e justiça social (oferta de serviços e bens públicos) às ações estatais, por meio da atração de investimentos privados (capital, tecnologia e eficiência gerencial), de capitalistas banqueiros, industriais, empreendedores do setor de serviços, construtores e empreiteiros, entre outros, na produção de serviços públicos. O desenvolvimento deste modelo de parceria PPP representa um esforço adicional no movimento de reforma administrativa do Estado brasileiro, sucedendo os recentes esforços de conferir às concessões, associadas ao processo privatista, um papel redentor da capacidade de liderança da Administração na alavancagem da atividade econômica e realocação de recursos na infra-estrutura do país. Um modelo bem apurado de PPP, na visão do governo federal, do governo de Minas Gerais e de São Paulo (estado e município), teria o condão de atrair vultosos investimentos para a área pública, realizando o sonho de acesso de muitos cidadãos a melhores escolas, hospitais mais aparelhados suportando planos de saúde mais eficazes, saneamento básico extensivo, vias públicas mais seguras e capilares e assim por diante. No entanto, um exame mais próximo da situação revela problemas reais que chocam com contundência o sonho da PPP. A questão ético-ideológica da liberdade exigida pelo empreendimento capitalista e as iniciativas de cunho intervencionistas do governo federal (questão do marco regulatório), os problemas de definição de agendas públicas, os níveis de corrupção empresarial e governamental, as dissintonias da agenda pública, as incompatibilidades na convivência de modelos administrativos diversos, as garantias para empreendimentos de longo prazo e a situação de credores já constituídos, o empobrecimento e a inadimplência do Estado bancando estímulos de parcerias (efeito placebo), a insegurança da permanência de investimentos estrangeiros, as contradições dos valores sigilo de projetos tecnologicamente sofisticados (Non-Disclosure Agreements - NDA da iniciativa privada) e a obrigatória publicidade e igualdade de acesso que condicionam a Administração, a flexibilidade de contratos e os critérios de legalidade, transparência e prevalência do interesse público são algumas das realidades que não podem ser desconsideradas, e sim enfrentadas, caso haja sérios propósitos de conferir eficácia à estratégia da PPP no Brasil.

            Palavras-chave: Parceria Público-Privado; PPP; Administração Pública; Bens e

            Serviços Públicos; Investimentos; Marco Regulatório; Sonho;

            Realidade


Introdução

            Desde há algum tempo a atuação burocrática, conservadora e corporativista do Estado tem causado inquietação em toda a sociedade, pois resultou este num organismo voraz no consumo de recursos e ineficiente em suas operações e altamente ineficaz nos resultados apresentados.

            Hoje, limitado em suas realizações o modelo de prestação direta de serviços públicos pelo Estado, seja por autarquias, fundações ou sociedades de economia mista confronta um mundo cada vez mais dinâmico, que demanda volumes crescentes de recursos e gestão ágil para atender à sociedade de massas, em suas padronizações e diferenciações de necessidade e expectativas.

            Esforços legislativos vêm se sucedendo, no Brasil, no sentido de dotar o aparato estatal de instrumentos que permitam viabilizar políticas que atraiam bons volumes de recursos financeiros e capacitações técnicas e gerenciais de elevado nível para projetos de interesse social, em ofertas de bens e serviços públicos. Entre os instrumentos flexibilizadores do Estado, em tempos mais recentes, pode-se colocar em relevo o Decreto-Lei n.º 200, de 26 de fevereiro de 1967, que estabelece a descentralização e delegação de competências para assegurar maior rapidez e objetividade nas decisões da Administração, a Lei Federal n.º 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, sua complementação, a Lei n.º 9.074, de 7 de julho de 1995 e diversas outras legislações que aprimoraram a lei de concessões de obras e serviços públicos e permissões de serviços públicos, compatibilizando tais instrumentos da Administração Pública com o art. 175 da Constituição Federal de 1988 e que visava atrair o dinheiro da iniciativa privada, o espírito empresarial e criar um sistema de competição no mercado ofertante para garantir a transparência dos custos. (WALD et al., 2004).

            Durante o governo Fernando Henrique Cardoso, apostou-se no aprimoramento do modelo de concessões e na reforma administrativa do Estado, além do enxugamento da máquina administrativa e da capitalização da administração, como ações capazes para atrair a iniciativa privada e sua habilidade gerencial no provimento de bens e serviços públicos. No entanto, a mudança de governo, em 2003, e os defeitos apresentados na política de privatização (num ambiente de concessão), fizeram com que o presidente Luís Inácio Lula da Silva e seus colaboradores buscassem outra via de atração de capital e "expertise" da iniciativa privada, optando pela formulação de uma política inspirada na Private Finance Iniciative – PFI (plano nacional) e nas Public Private Partnership – PPP (nível regional), implantada na Grã-Bretanha, pelo governo conservador, na década de 1990, e mantida e aprimorada pelo partido trabalhista que lhe sucedeu.

            A Public Private Partnership ou, no Brasil a Parceria Público-Privado (PPP), tem forte caráter contratual, sendo minorada a rigidez legal. Daí seu caráter flexível, pois a lei estabelece disposições para a formação de contratos, que permitam configurar as especificidades de cada situação negocial, da natureza técnica ou econômica de cada projeto concreto. Desse modo, por ser um acordo realizado entre os governos, condutores das políticas públicas, e os empresários, detentores do capital privado e da capacidade de geração de valores por meio da produção de bens e serviços, desperta imediatamente a atenção para o exame do contexto de implantação dessa política, do ambiente de negócios e da natureza deste contrato, que traz novidades na relação público-privada.

            Um contrato entre esses setores amalgama complexos cenários administrativos, políticos, sociais, econômicos e jurídicos, através do estabelecimento de direitos e obrigações que consolidarão um projeto de governo, que busca a satisfação da demanda de bens e serviços públicos, ofertados pela iniciativa privada, que tem interesse em auferir ganhos sobre o capital investido.

            A iniciativa dos empresários na produção de bens e serviços públicos, para ser duradoura, deve pautar-se pela incansável busca da eficácia, com eficiência e qualidade. O capital investido pelo empresário deve apresentar a máxima remuneração possível dentro do nicho de oportunidade que está sendo explorado, nicho este que – em última instância – também só está sendo explorado por razões de oportunidade global do capital, considerados os vários setores e atividades econômicos disponíveis à iniciativa privada

            Além disso, não é incomum ao empresário ver-se frente a frente com concorrentes, o que ameaça a continuidade de seus negócios nos níveis desejados de demanda e de preços e o faz buscar formas dinâmicas de criar vantagens competitivas, isto através, entre outras ações, de desenvolvimento de inovações tecnológicas, operando mudanças de processos produtivos e administrativos, reorganizando sua empresa, repensando a logística, exercendo monitoração sincronizada e atualizada das demandas de seus clientes finais ou intermediários etc. O dinamismo empresarial é um dos fundamentos de seu sucesso para manter ou aumentar receitas, lucratividade e fatia de participação de mercado.

            Pode-se, assim, afirmar que a atividade empresarial é pautada pelo dinamismo na sua busca por maiores níveis de eficiência e eficácia, sem descuidar do preço e da qualidade esperados pelo destinatário de seus bens e serviços. Tal condição da atividade empresarial privada consolida um paradigma: a atividade do empresário privado é essencialmente eficiente e eficaz, pois se assim não o fosse não sobreviveria ao seu concorrente.

            Logo, deve-se ter o cuidado no uso de tal assertiva, válida num ambiente de razoável competição entre vários produtores de bens e serviços (condição para gestão autônoma e competitiva de eficiência e de eficácia) e para diversos compradores desses bens e serviços (condição para gestão autônoma e competitiva de preço e de qualidade). É amplamente conhecida a preferência inarredável do empresário pela segurança, qualquer que seja o contexto, logo seu comportamento quando o ambiente de atuação não o pressiona a lutar pela manutenção e crescimento de seu negócio, como atestam as ineficiências dos monopólios e oligopólios e os desestímulos espontâneos pela busca de melhor qualidade verificados em situações de monopsônios.

            Esta monografia busca exercitar os fundamentos da política de PPP levada a cabo pelo governo federal brasileiro, acompanhado de algumas iniciativas estaduais e municipais. Em momento nenhum pretende esgotar qualquer um dos aspectos relacionados a um tema tão amplo e complexo. Como exercício de estudo acadêmico, terá ela cumprido seus propósitos caso sirva para provocar a discussão controvertida e esclarecedora e, quiçá, servir de mapa de oportunidades para futuros trabalhos mais consistentes e reveladores, em nível de mestrado e doutorado.

            O capítulo 1 deste trabalho busca desenhar o cenário histórico, político e econômico, que desemboca nos dias atuais, quando há uma generalidade de ações governamentais, no Brasil e no mundo, em busca de recursos privados para desenvolver projetos de interesse público em regime de parceria. No capítulo 2 é desenhado um esboço da evolução justificativa, objetivos e abrangência da política de PPP no Brasil. O sonho de um país melhor, representado pela PPP no Brasil, pois se apresenta como a grande solução para difíceis problemas do Estado moderno, é delineado no capítulo 3. Mas, como este sonho pode ser perturbado por alguns fatos reais, o capítulo 5 cuida de alguns deles, no sentido de servirem de pontos cardeais para a avaliação e o acompanhamento das implantações dos projetos de PPP no Brasil, nas esferas administrativas, União, Distrito Federal, Estados e Municípios.


1.Capítulo 1: O Cenário

            a-Evolução do capitalismo e as mudanças nas políticas de Estado

            Nas transformações do Estado, ao longo do século XX, cabe ressaltar dois movimentos de macro importância nos países capitalistas ocidentais, apontados, por BIZELLI (2002), quais sejam, o início e o fim do welfare state keynesiano, período entre meados dos anos 40 à metade da década de 70 do século passado.

            Na evolução do capitalismo observa-se uma subsunção dos interesses revolucionários proletários da clássica visão marxista pela democracia partidária competitiva e o welfare state keynesiano - WSK ao longo do século XX. Deste modo, o Estado continua a assegurar as condições gerais de permanência do modo de produção capitalista, garantindo a propriedade privada de fatores de produção, gerenciando os conflitos de classes como conflitos de interesses de grupos políticos de matizes ideológicos mais ou menos diferenciados, numa competição partidária num jogo de democracia. Materialmente, o WSK em sua clássica prescrição da intervenção estatal no domínio econômico, buscando garantir emprego e renda, criando uma atmosfera de bem-estar generalizado, mormente contraposta a clima social de reconstruções sucessivas, num século marcado por duas guerras de repercussão mundial, diversos políticos conflitos regionais e regimes ditatoriais importantes, foi a solução mais significativa para amenizar as tensões, desde de a crise de 1929 até a crise do petróleo da década de 70.

            OFFE (1984, p. 360) comentando a prevalência das questões de solução da vida social pela materialidade dos fundamentos capitalistas, afirma que:

            A lógica da democracia capitalista é de contaminação mútua: infunde-se autoridade à economia através do gerenciamento da demanda global, das transferências e da regulamentação, de forma que ela perde cada vez mais seu caráter espontâneo e auto-regulador; e introduz-se uma contingência de mercado no Estado, comprometendo, assim, qualquer noção de autoridade absoluta ou de bem absoluto. Nem a concepção smithiana do mercado, nem a concepção rousseaniana da política têm qualquer tipo de contrapartida na realidade social. Desta forma, uma das vias pela qual se atinge a compatibilidade parece ser a infusão de parte da lógica de um domínio no outro – i.é., a noção da "competição" na política e a idéia da "alocação autoritária de valores" na economia.

            A democracia competitiva traduz a vontade do povo à medida que esta se canaliza num aparelho institucionalizado pelo Estado, que formalmente cumpre regras padronizantes das demandas sociais, uma vez que tais demandas devem ser comparadas e avaliadas frente a uma realidade técnica de alocação de recursos escassos. OFFE (1984, p. 363) avalia a domesticalização das demandas sociais na democracia capitalista, quando a vontade do povo é transformada em instrumento de dominação política:

            ..., logo que a vontade do povo se expressa através do instrumento de um partido competitivo que luta pelo cargo governamental, o que foi expresso cessa de ser a vontade do povo e se transforma, ao invés num artefato da forma em si mesma e na dinâmica posta em movimento pelos imperativos da competição política.

            Por outro lado, as políticas de bem-estar social adotadas pelos principais países do mundo, economicamente falando, associadas aos custos bélicos, começaram a incomodar as suas contas, afetando-lhes o desempenho econômico. Além disso, o Fundo Monetário Internacional, criado na conferência de Brentton Woods (EUA, 1944), com objetivos entre os quais de dar estabilidade às taxas de câmbio, acabou por render-se às imposições americanas de estabelecer o dólar como unidade de conta internacional e moeda de intervenção. Ocorre que durante a década de 60 até meados dos anos 70, os EUA, diferentemente de países europeus e Japão, se viram envolvidos em fortes déficits de balanço de pagamentos e conseqüentes perdas de reservas do ouro de lastro, o que provocou sucessivas desvalorizações do dólar, encarecendo o ouro em dólares, transferindo seu déficit para o resto do mundo, até que em 1971, suspendeu-se a obrigação da conversão de ouro em dólares. Com a relativa perda da confiança no dólar, a partir de 1973, abandonou-se o sistema de taxa de câmbio fixa e ajustável e adotou-se uma maior flexibilidade dessas taxas.

            Neste contexto economicamente sensível, acirra-se a questão árabe-judáica, com a guerra de Israel contra os países árabes, em outubro de 1973, levando os importantes exportadores de petróleo do Oriente Médio a um posicionamento político e econômico, com a criação da Organização dos Países Exportadores de Petróleo, que retaliou os Estados Unidos e a Holanda pelo apoio dado a Israel, com um embargo, que teve como conseqüências, a quadruplicação do preço do óleo, de US$ 3 para US$ 12 cada barril. Ora, o petróleo como fonte principal de energia manejável para consumidores e empresas, tendo sua escassez agudizada, configurou o denominado "choque do petróleo", pelo efeito recessivo que causou na economia mundial, macroeconomicamente similar ao de aumento de impostos sobre consumidores e empresas, diminuindo consumo e investimento em todos os países do mundo. O mundo foi levado à recessão econômica, os governos se viram em dificuldades sérias para adimplir compromissos. A irreversibilidade da organização do quadro político do mundo árabe, responsável à época pelo suprimento mais significativo da energia mundial, obriga a uma mudança na política econômica de todos os Estados nacionais.

            BIZELLI (2002, p.15) ensina que:

            As mudanças de comportamento, já citadas, em relação ao padrão monetário, somadas à crise do petróleo provocam efeitos devastadores na economia mundial. Acabava a possibilidade de um jogo econômico de soma positiva, tomava contornos nítidos a crise recessiva que abalou as economias capitalistas desenvolvidas colocando fim a um tipo de acumulação capitalista regulada pelos Estados nacionais.

            O papel dos sócios do período anterior – Estado, trabalhadores e empregadores – começa a ser repensado no novo cenário, expondo, de forma clara, os limites da teoria keynesiana para contornar as crises cíclicas do capitalismo. Antes parceiros, agora competidores, trabalhadores e empresários atacam o Estado como responsável pelos descompassos provocados na economia de livre mercado.

            Os déficits do Estado para estimular o emprego oneram o dinheiro, pressionam as taxas de juros acentuando o desemprego que deveriam combater. Segundo argumentos, como o de Margaret Thatcher, políticas de seguridade social, tais como o seguro desemprego, desestimulariam o trabalho, ou pior, acabariam ao longo do tempo com a ética do trabalho.

            Com o perfil crescente da dívida pública, reacende-se, nas arenas decisórias, a disputa política desenfreada pelos parcos recursos públicos. O objetivo econômico do keynesianismo é promover o crescimento e o pleno emprego. O objetivo do modelo do welfare state é proteger os que são afetados pela sociedade industrial capitalista, buscando formas de minimizar a desigualdade social. No entanto, o esforço de proteção depende diretamente do crescimento e do pleno emprego.

            O modelo do welfare state keynesiano vai ser acusado de interferir na "destruição criativa do capitalismo", solapando o incentivo ao investimento e ao trabalho. O setor público não produtivo tornou-se intolerável ao setor produtivo, sufocando a classe média através de impostos e fomentando o processo inflacionário.

            Mais que se falar de recessão, verificava-se em 1974 que a inflação não cedia, ao contrário, acelerava-se na maioria dos países. Esta inflação que afetava o orçamento das economias dos Estados nacionais era devida ao aumento dos preços e custos causados pelo choque do petróleo, às correções salariais, à queda do consumo pelo crescente desemprego, aos custos crescentes das políticas de bem-estar social em seu amparo ao desempregado, à manutenção das margens de ganho do capital e à ação dos especuladores que armazenavam mercadorias à espera de dias melhores (KRUGMAN E OBSTEFELD, 2001, p. 591). A adoção da nova Lei das Sociedades Anônimas (1976), que teve o condão de indicar rumos modernizantes à economia nacional, neste momento, foi insuficiente para provocar alguma dinamização importante na atividade produtiva, embora – posteriormente – tenha permitido a atração de capitais nacionais e estrangeiros.

            Estava, portanto, configurado o quadro de estagflação, pois se combinava, no plano econômico, uma combinação de estagnação da produção e de inflação elevada.

            Na América Latina, os governos expandiram seus gastos para atender às demandas por mais igualdade social e aparelhamento de sua infra-estrutura econômica ao longo de várias décadas do século passado através de captação de empréstimos no exterior. Entre a década de 70 e final dos anos 80 os países em desenvolvimento captaram empréstimos em bancos comerciais de modo extensivo, de modo que em 1981 o montante de financiamento equipara-se ao déficit no ano da conta agregada dos países em desenvolvimento não petrolíferos (KRUGMAN e OBSTEFELD, 2001, p. 170). Em 1979, o Federal Reserve americano adotara uma política antiinflacionária muito robusta, que levou as economias do mundo à forte recessão, entre 1981 e 1983. A ampla crise da dívida dos países em desenvolvimento verificada em 1982, com o anúncio de moratória do México, enxugou a oferta de empréstimos para a América Latina até o início dos anos 90, pois os bancos dos países industrializados, os grandes emprestadores privados para a América Latina, buscaram reduzir seus riscos, cortando crédito e exigindo pagamentos de empréstimos. Ficou seriamente afetado o crescimento econômico dos países em desenvolvimento, que sofreram com o descontrole inflacionário por longos períodos, pois na incapacidade de custear seus gastos por meio de impostos, afetados por uma significativa associação de sonegação, evasão e elisão fiscais, além do crescimento da informalidade na economia, socorreram-se na senhoriagem. O aumento da base monetária pelos governos dos países em desenvolvimento fez com que muitos passassem da inflação para a hiperinflação, como ocorreu no Brasil na década de 80 até 1994, quando do lançamento do Plano Real em que se registrava uma taxa anual de 2.669%.

            A necessidade de equilibrar o orçamento governamental é essencial aos países em desenvolvimento, uma vez que suas economias encontravam-se seriamente afetadas pela falta de recursos, de crédito e por taxas altíssimas de inflação. O Brasil, em oito anos intentou seis planos de estabilização econômica, Cruzado (1986), Bresser (1987), Verão (1989), Collor (1990), Collor II (1991) e Plano Real, em 1994. Como estabilizador da inflação e desindexador da economia, o Plano Real mostrou-se eficaz, embora o crescimento do PIB tenha sido baixo, a carga tributária (1) ter aumentado significativamente nos anos que se sucederam e o déficit público tenha evoluído. Em 1998, no bojo da crise russa, o Brasil firma acordo com o FMI para ter acesso a 41,5 bilhões de dólares para enfrentar o ataque especulativo externo, motivado pelo ceticismo nos mercados na capacidade da manutenção de um modelo de política econômica geradora de forte desequilíbrio externo. O governo brasileiro reduziu as barreiras às importações, promoveu privatizações, operou mudanças fiscais e reformas administrativas, acomodando-se de modo vistoso ao receituário racional de medidas econômicas neoliberais e globalizantes, numa perspectiva abordada no conceito do Consenso de Washington (2), condicionantes do acesso a novos créditos, mas seu progresso foi baixo e seu déficit fiscal decepcionou.

            Na visão de BIZELLI (2002, p. 18):

            O equilíbrio orçamentário dos governos passa a ser condição sine qua non para a manutenção da ordem econômica globalizada. O fulcro da reforma passa a ser imprimir agilidade à administração pautando-a por princípios de eficácia, eficiência e redução de custos operacionais. Subsidiariamente, permanece a indicação de um discurso pela diminuição do tamanho da máquina pública.

            O clima de "reforma" vai ganhando terreno em cada vez maior número de países, tornando-se uma discussão global. Apesar disso, em processos de implantação concreta os princípios utilizados revelam, muitas vezes, contradições. Diminuir custos nem sempre resulta em melhores serviços. Privatizar, terceirizar ou criar estruturas públicas não-governamentais nem sempre ajuda a definir melhor o papel do governo nas sociedades capitalistas modernas. Descentralizar a gerência em níveis subnacionais, desconcentrando o governo central, ou fazer valer mecanismos de mercado, nem sempre melhoram a oferta de serviços e produtos.

            De qualquer forma, nas últimas décadas, forjou-se um consenso de que administradores públicos necessitam de maior flexibilidade para gerenciar processos frente às estruturas burocratizadas do governo. Autores como Howard (1984), defendem a flexibilidade para substituir a rigidez que sufoca a gerência no setor público, buscando um sistema de medida por resultados e não por acompanhamento de procedimentos. O alvo da transformação seria um melhor atendimento dos clientes-cidadãos para substituir os interesses dos funcionários da máquina administrativa do governo.

            Assim como o Brasil, na década de 90, os países em desenvolvimento buscaram liberalizar e modernizar seus mercados financeiros para fomentar a compra e venda de seus títulos governamentais e a abrir suas fronteiras comerciais como alternativa para melhorar o influxo de capitais, que servem para financiar seus déficits.

            Incentivos econômicos do Banco Mundial e do Banco Interamericano de desenvolvimento, nos anos 90, estimularam vários países da América Latina a introduzir programas de reforma de seus Estados nacionais.

            Logo após assumir, Fernando Henrique Cardoso, disposto a atrair investimentos privados para projetos de infra-estrutura, promulgou as Leis n.º 8.987/95 e 9.074/95 que objetivaram preparar a Administração para uma nova fase de fluxos de capitais, nacionais e estrangeiros, para projetos de grande magnitude, em regime de parceria via concessão. Segundo o ex-presidente, citado por WALD et al. (2004, p. 80):

            A crescente parceria com o setor privado na propriedade e gestão da infra-estrutura nacional exigirá a redefinição do papel do Estado como instância reguladora, com poder de evitar monopólios e abusos que tendem a ocorrer em situações de concentração do poder econômico. É preciso que o governo tenha realmente a capacidade de regular a prestação de serviços públicos no interesse do cidadão e dos objetivos estratégicos do país.

            A concessão, nessa fase, estava inserida numa política de privatização, que atenderia, segundo seus formuladores, o atendimento dos interesses públicos e privados, recuperaria a infra-estrutura obsoleta e envelhecida, requalificaria os serviços públicos, atrairia os modos gerenciais privados, diminuiria o tamanho e a intervenção direta do Estado na atividade econômica produtiva e proporcionaria a conversão da dívida via participação acionária do capital estrangeiro, tudo isso sem fazer uso dos cofres públicos, uma vez que o capital privado estaria presente. Neste sentido, a concepção de parceria tangenciaria a lealdade e a boa-fé, sem que nenhuma das partes pudesse "beneficiar-se da mora ou da inexecução do contrato, privilegiando-se a estabilidade das relações negociais, sobre os interesses estritamente individuais, mesmo quando legítimos" (WALD, 2004, p.86).

            Os problemas cambiais, tarifários e regulatórios apresentados, bem como a complexidade da modelagem de privatização mais adequada a cada setor da infra-estrutura, como telecomunicações, elétrico, petroquímico, viário, portuário entre outros, associados à ascensão do presidente Luís Inácio Lula da Silva ao poder, fizeram que as privatizações fossem interrompidas, por absoluta incompatibilidade de filosofia de governo e de projeto de país.

            Na visão do governo Lula, a PPP é uma modalidade de contrato em que a Administração Pública e as empresas privadas, com financiamento obtido por estas, compartilham riscos e assumem a realização de serviços ou empreendimentos públicos. Os contratos de parceria devem ficar de acordo com o atual marco legal, a Lei de Licitações e Leis de Concessão de Serviços, com algumas alterações que lhes permitam flexibilidade, como a instituição de órgão gestor, arbitragem, prazo de concessão (riscos versus volume de capital) e garantias.

            b-Evolução do Estado nos séculos XIX e XX

            Segundo BOBBIO et al. (1992), o Estado é um ente jurídico-político, em pleno desenvolvimento, repercutindo as dimensões de suas estruturas jurídico-formal, econômico- material, social e política.

            Numa resenha breve, no final do século XIX e início do século XX, na Europa o capitalismo se organiza com o surgimento dos conglomerados industriais (monopólios), com o novo direito industrial, bancário, comercial, acionário e da Bolsa de Valores. "A tendência estava já esboçada: as formas separadas do capital industrial, comercial e bancário se uniram na forma do capital financeiro [sem grifo no original], que foi a realidade histórica em que se revelou o capitalismo organizado" (BOBBIO et al., 1992).

            De um Estado do século XVIII voltado para a criação da forma-mercado para bens finais e fatores de produção, no século XIX o Estado intervém diretamente no processo de valorização capitalista, protegendo o capital monopolista e operando a gestão monetária desde o Banco Central. A nova complexidade do mercado fracionado em setores monopolísticos e setores concorrenciais, dentro de uma dinâmica de conquistas inéditas de mercados, leva a que regramentos estatais, via emissão de decretos e funcionalizações de agências setoriais da administração, revelem um esvaziamento do processo legislativo, quando analisado o caso emblemático da Alemanha.

            A conhecida "questão social" revela-se à classe dirigente do Estado contemporâneo já na segunda metade do século XIX, conforme afirma BOBBIO et al. (1992):

            A "questão social", surgida como efeito da Revolução Industrial, representou o fim de uma concepção orgânica da sociedade e do Estado típica da filosofia hegeliana, e não permitiu que a unidade da formação econômico-política pudesse ser assegurada pelo desenvolvimento autônomo (grifo meu) da sociedade, com a simples garantia da intervenção política de "polícia".

            O ambiente de fermentação da "questão social" dá-se na esfera do trabalho, surgindo legislações e programas importantes, na Inglaterra e na Alemanha de Bismark, como seguro obrigatório contra doenças, velhice e invalidez, além de disposições pensionistas na Dinamarca (entre 1891 e 1898) e na Bélgica (entre 1894 e 1903), e a organização de um seguro nacional na Suíça, em 1890. Assim, em finais do século XIX surge o Estado, interventivo, paulatinamente mais responsável por viabilizar o financiamento e a administração de programas de seguro social.

            Para fazer frente às demandas sociais, o Estado necessitou rever a questão da fiscalidade, uma vez que, segundo observação de Goldscheid, o ele empobreceu financeiramente, pois depende das concessões da burguesia, diferentemente do Estado absoluto, quando o poder era exercido na confusão da riqueza pessoal com a desse mesmo Estado. Inaugura-se no começo do século XX o debate do Estado fiscal, como aquela função estatal de obter e acumular poupança para responder às exigências sociais crescentes, limitado pelas conseqüências gravosas que o tributo causa nas corporações produtivas e no equilíbrio dos preços de mercado, afetando a eficiência e a concorrência Além disso, desde então, reconhece-se, conforme ensinou Schumpeter, que as demandas sociais crescem mais rapidamente que a capacidade de gerar valor na economia, o que anuncia um colapso na capacidade fiscal do Estado quando do enfrentamento das demandas públicas (ad tempora).

            KOTLER e ARMSTRONG (2003, p. 541) afirmam que na "medida em que os bens privados aumentam, exigem mais serviços públicos, que geralmente não estão previstos para o futuro próximo". Mais ainda, conforme ensina NOGUEIRA (2001, p.86) que "muitos grupos e indivíduos congelam-se em seus particularismos, desistindo do coletivo, do ‘geral’, da busca de soluções acordadas para os problemas comuns. Passam a viver o todo apenas como recurso para viabilizar os próprios interesses. Tornam-se indiferentes, fechados em si, autocentrados".

            Os bens públicos e os recursos comuns diferem dos bens privados à medida que não são excluíveis, ou seja, não se pode impedir seu uso por qualquer pessoa. As pessoas podem consumi-los sem que as demais pessoas deles se privem. Deste modo, para garantir o suprimento e eficácia de serviços públicos e evitar a "tragédia dos comuns", devem os governos "gerenciar" as fontes e modos de usos eficazes e contínuos dos recursos e meios disponíveis aos e necessários aos cidadãos. Se bem público, regulamentar ou tributar seu uso e oferta; se recurso comum, regulamentar, taxar ou privatizar sua oferta para fins de uso rival, uma vez que no sistema de mercado, compradores e vendedores não se preocupam com os efeitos externos de suas atividades ou decisões. Assim, pode-se estabelecer o equilíbrio entre bens privados e bens públicos ou recursos comuns, seja por regulamentação de oferta ou demanda, por tributação ou, exclusivamente para os bens comuns, por exploração econômica de produtores ou de consumidores; desestimulando-se assim a geração e desenvolvimento de "caronas". Neste sentido, pode-se focar a distinção clara que se deve estabelecer entre consumidor e cidadão, conceitos distintos, mas confundidos no jargão mercadológico da vida política brasileira atual, sempre buscando reduzir este naquele (MANKIW, 2001, p. 229).

            c. A Dicotomia Cidadão–Consumidor:

            Pode parecer absurdo, mas não é incomum, nos dias atuais a confusão conceitual entre cidadão e consumidor, de forma a dar uma dinâmica mercadológica e operacional nas relações políticas entre candidato a cargo eletivo e eleitor ou entre administrador público e munícipe, por exemplo. Esta ótica mercadológica da cidadania coisifica a prestação de serviços públicos, conferindo ao administrador público um status de fornecedor, delimitando as ofertas para o "consumo" dos cidadãos, que devem se conformar com a lógica da Lei de Say, com as demandas públicas precificadas no avanço tributário. O serviço público de direito do cidadão é embalado como um bem privado a ser comprado por ele, convertido a cidadão-consumidor, sujeito a lógica do lucro e da reificação de sua relação com seu representante constituído. A restrição da oferta dos serviços públicos como produtos de mercado, neste contexto, justifica a uma lógica tecnicista de alocação de recursos que desorganiza o pleito dos direitos inalienáveis da cidadania, por sua escassez declarada. Nas palavras de NOGUEIRA (2001, p. 97) o "...Estado chegou ao final do século XX ameaçado em sua própria natureza pelo processo de globalização. Com isso, tumultuou-se ainda mais o campo da cidadania. Afinal, de que adiantam tantos direitos se são declinantes as condições para a sua efetiva proteção? O grande risco dos movimentos que demandam novos direitos é o de não ter como lutar pelo fortalecimento das instituições capazes de garantir direitos."

            Consumidora é a pessoa que contrata ou compra bens ou serviços de um profissional, comerciante, industrial ou profissional liberal. Tais bens ou serviços especificamente "comprados" são retirados do mercado para sua utilização final, para o consumo ou esgotamento de sua utilidade.

            Por outro lado, o fornecedor é aquele que presta um serviço ou entrega um produto. Na relação da esfera pública com a privada há o estabelecimento do dipolo consumidor-fornecedor, quando se trata de bens ou serviços de natureza privada ou oriundos de monopólio natural, não se aplicando a oferta bens de natureza pública ou a disponibilização de recursos comuns, por conta das propriedades da exclusivibilidade e da rivalidade.

            Não se enquadram como bens de "comerciais" de mercado os bens públicos, pois nada pode impedir que as pessoas deles desfrutem e tal desfrute está ao alcance de várias pessoas, sem prejuízo de nenhuma delas. Os recursos comuns, não escassos, também podem ser usufruídos por várias pessoas, como os peixes do oceano ou estradas de alto tráfego não pedagiadas. Assim, os recursos comuns, para a racionalidade de seu desfrute, podem ser "privatizados", o que não ocorre com os bens públicos.

            Os monopólios naturais, caracterizados como um bem excluível, mas não rival, uma vez que se pode impedir que as pessoas se beneficiem deste bem, mas que pode ser desfrutado por várias, sem que uma prejudique à outra, como no caso de uma única empresa oferecendo bens ou serviços para todo o mercado a um custo menor do que seria caso mais que uma empresa os fornecessem, por razões de economia de escala, também, deve ser regulamentado e, mesmo, privatizados, como no caso das redes de telecomunicações e de energia elétrica. O tamanho diminuto do mercado também pode determinar um monopólio natural.

            Consumidor é cidadão no ato da compra e do usufruto do bem ou serviço privado ou privatizado. Assim, nem todo cidadão é um consumidor, embora todo consumidor seja um cidadão. O cidadão, ao comprar e usufruir um bem ou serviço privado ou privatizado, desempenha nesses atos o papel de consumidor. Ele não é consumidor por usufruir um bem público, mas fundamentalmente um cidadão no exercício de seus direitos sociais. Por seu turno, não é o administrador público um fornecedor na oferta do bem público, mas um servidor no exercício de suas obrigações sociais.

            d. Economia, Mercado e Sociedade de Consumo

            A Carta Constitucional brasileira é profusa em seu rol de direitos individuais e coletivos em seu art. 5o. Porém é interessante ressaltar, sem a pretensão de exaurir, os bens e serviços públicos de competência da União, no art. 21. Assim podem ser realçados os seguintes serviços e bens públicos, os recursos comuns e os monopólios naturais de competência do governo federal:

            Serviços públicos:

            - Provimento do serviço postal (inc. X)

            - Informações estatísticas, de geografia, de geologia e cartografia (inc. XV)

            - Desenvolvimento habitacional, saneamento básico e transportes urbanos (inc. XX)

            Os bens públicos:

            - A defesa nacional (inc. II)

            - Desenvolvimento nacional, econômico e social (inc. IX)

            - A atuação da justiça, materializada no Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública (inc. XIII)

            - A segurança pública, pela organização e manutenção das polícias civil e militar e o corpo de bombeiros (inc.XIV), além das polícias marítimas, aeroportuária e de fronteiras (inc. XII)

            - A defesa contra calamidades públicas (inc. XVIII)

            Os bens de monopólio natural:

            - Provimento dos serviços de telecomunicações (inc. XI)

            - Serviços de radiodifusão (inc. XII a)

            - Hidroeletricidade (inc. XII b)

            - Transporte aéreo (inc. XII c), ferroviário e aquaviário (inc.XII d) e transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros (inc. e)

            - Portos marítimos, fluviais e lacustres (inc. XII f)

            Os recursos comuns:

            - Os recursos hídricos (inc. XIX)

            - A exploração das áreas de garimpagem associativa (inc. XXV)

            No entanto, visitando todo o Título II da Constituição nacional é possível delimitar-se a abrangência de demandas sociais definidas pelos direitos e garantias individuais e coletivas.

            Juridicamente, poderia definir-se Serviço Público como qualquer atividade estatal, desempenhada de forma direta ou indireta, com o fim de satisfazer necessidades essenciais dos cidadãos, da coletividade e do próprio Estado.

            Segue abaixo alguns dos Serviços Públicos classificados pelo respeitável doutrinador do Direito Administrativo, Hely Lopes Meirelles (MEIRELLES, 1989):

            - Propriamente Ditos: são os serviços essenciais, imprescindíveis que sejam prestados pelo estado, sem outorga ou delegação, como polícia, saúde pública e defesa nacional.

            - Utilidade Pública: são úteis, mas para a sua prestação não é indispensável o Estado, como transporte coletivo, telefonia, energia e correios.

            - Industriais: geram renda para quem os produz, por serem cobrados segundo tarifa ou preço público, devendo ser prestados por terceiros e pelo Estado, supletivamente;

            - Gerais: não possuem usuários ou destinatários específicos e são remunerados por tributos, como iluminação pública, calçamento público e praça pública;

            - Individuais: possuem usuários conhecidos e predeterminados, como telefonia e energia elétrica domiciliar;

            Assim, têm-se Serviços Públicos delegáveis (serviços destinados ao cidadão ou de utilidade pública) e indelegáveis (serviços gerais, essenciais, pró-comunidade) pelo Estado.

            Tal classificação importa quando se questiona da possibilidade de interrupção dos serviços públicos pelo seu inadimplemento, pois os serviços essenciais não podem sofrer paralisação por falta de pagamento.

            Também, na seara jurídica, define o art. 98 do Novo Código Civil brasileiro que são públicos os bens do domínio nacional que pertençam às pessoas jurídicas de direito público interno, sendo particulares todos os outros, independentemente a quem pertençam.

            Em seu art. 99 estão enumerados os Bens Públicos:

            Art. 99. São bens públicos:

            I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;

            II - os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;

            III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.

            Parágrafo único. Não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado.

            Desse modo, pela gama de bens públicos abrangidos pela legislação, é bastante ampla a possibilidade de projetos, produções, explorações e manutenções de bens públicos pela iniciativa privada, contratada para tais serviços.

            e. Demandas Sociais e Seletividade da Agenda Pública

            Neste sentido cabe tratar da questão das demandas sociais e da seletividade da agenda pública que acaba por ter seu conteúdo expressando uma filtragem de demandas sociais pelos aparelhos institucionais partidário e governamental do Estado capitalista, uma vez que este intrinsecamente tem natureza de classe. O aparelho estatal capitalista utiliza critérios de seleção em dois sentidos:

            1.Da formação da vontade, seleção e integração numa estruturação burocrática, "a partir dos interesses estreitos, efêmeros, contraditórios e imperfeitamente formulados de uma política pluralista de influências" (OFFE, 1984, p. 149), mas de interesse global do capital, por meio da dominação política como dominação de classe;

            2.Pela seletividade complementar negativa (não escolhas), que protege o capital global contra os interesses e conflitos anticapitalistas, ou mesmo contrários aos interesses de uma elite dominadora do aparato do Estado.

            A agenda pública traduz o rol de demandas sociais filtradas e priorizadas pela burocracia estatal instrumentalizada, de modo a conduzir a operacionalidade dos interesses de classe do capital global. Resta às demandas sociais negadas a condição de "não acontecimentos", vivos e presentes, manifestados em formas de violência, como ensina SEIBEL (2004, passim): "Vimos que todas as formas institucionais produzem igualmente seletividades. Isto não quer dizer que não expressam os ‘não-acontecimentos’. Se definirmos que estes não-acontecimentos vão se expressar no conteúdo das formas da violência, então teremos através da cobertura da mídia e da imprensa uma dimensão desta esfera. Sugerimos a investigação dos fatos políticos e sociais que encontram visibilidade pública na mídia e na imprensa. Estes fatos obviamente serão objeto de seletividades (principalmente ideológica) conferindo um status público positivo ou negativo (violência)."

            Um aspecto que devem governos, que sempre têm intenção de perenizar-se no poder por suas realizações, permanecerem atentos é quanto ao "paradoxo do voto", pois as agendas públicas (mesmo que democraticamente consolidadas) podem ser definidas de modo equivocado, sacrificando políticas de forte apelo e interesse social, dependendo da ordem em que são apresentadas para priorizações em suas implementações, pois a ordem de apresentação induz a escolhas que são de preferências de poderes burocráticos constituídos (WESSELS, 2003, p. 439).

            A tecnoburocracia da Administração Pública, em suas tecnicidades, pode ordenar as ações operacionais, segundo seus interesses, desmobilizando realizações políticas e causando frustrações como a da reforma administrativa tratada por BIZELLI (2002), em sua tese de doutorado, relatando as "armadilhas" preparadas na Prefeitura Municipal de Araraquara.

            Complementar a essa distorção de agenda, quando SENN (1992, p.61) comenta a análise dos processos decisórios na interação público-privado para o desenvolvimento urbano, fica clara a introdução, pela a Administração, de "adaptações" (aspas do texto original) de objetivos pré-definidos, segundo ordem de preferência (grifo meu), em busca de um resultado minimamente "satisfatório" (aspas do original). Isto se dá em face das metas de desenvolvimento social, definidas pelo governo – reconhecidamente incapaz de gerir, de modo racional e lógico, problemas complexos -, e os lucros desejados pelo empresários.

            No Brasil, a agenda pública, a despeito das grandes transformações sociais e políticas que vêm ocorrendo desde a década de 80, com o fim da hegemonia vintenária de governos militares, com a redemocratização e o novo pacto social de 1988, o re-amadurecimento com o impeachment de Fernando Collor, a evolução ideológico-partidária e da máquina administrativa, a depuração institucional da corrupção e as legítimas e pacíficas eleições e sucessões executivas e legislativas, não tem sido eficaz, ainda assim, para atender as demandas da sociedade, pois basta mapear o quadro espantoso de exclusão social, política e econômica e constatar o recrudescimento, ano a ano, da violência.

            Nas palavras de SEIBEL (2004, passim):

            O Brasil e a América Latina vêm assistindo a partir da década de oitenta, o aparecimento de novas práticas sociais e formas de ação coletivas, assim como a difusão de uma série de idéias e propostas em relação à tarefa política e à ação social (Coraggio, 1987, apud Felicíssimo, 1994), sem se constituir necessariamente em novos paradigmas. Telles (1994) afirma que, mesmo tendo os movimentos políticos e sociais apontado para uma nova institucionalidade através de espaços de representação, interlocução e negociação, permanecem a violência cotidiana, a violação dos direitos humanos e a incivilidade nas relações sociais.

            A violência permanece como expressão da ausência de esferas públicas necessárias ao encaminhamento das conflitividades e mais, da ausência de conteúdo ético nas relações políticas. É necessário não somente conhecer os mecanismos que (re)produzem a cada momento os movimentos políticos e sociais, mas também, a própria dinâmica interna dos aparatos públicos governamentais que repõem, igualmente, as formas autoritárias e excludentes no conteúdo e gestão das políticas públicas.


Capítulo 2: A Política de PPP

            a) Raízes da política de PPP

            Comentar sobre as raízes da PPP é remeter-se à Europa continental do século XVIII, quando o Estado absolutista realiza as grandes intervenções de infra-estrutura para o desenvolvimento da indústria e da agricultura. De modo considerado cíclico (LODOVICI, 1992, p. 158), entre os séculos XVIII e XIX, as idéias liberais pregam a diminuição do Estado e sua retirada da seara econômica, o que ocorreu via privatizações e cooperações (parcerias), cabendo à Administração Pública uma importante tarefa reguladora.

            Mais recentemente, a necessidade de recursos para que o Estado pudesse levar adiante seus projetos, diante do quadro de escassez internacional de recursos verificado, desde a crise dos anos 70 do último século, fez com que este, o Estado, ampliasse seu campo de busca de tais recursos. Desse modo, por meio de reformas administrativas (racionalização de atividades e enxugamento de seu tamanho para diminuir despesas com a diminuição de obrigações e redução do quadro de funcionários públicos) ou realizando reformas tributárias (para ampliar a captação aumento de tipos de tributos, alíquotas e expansão da base tributária).

            Porém, de modo importante por suas implicações políticas, jurídicas, administrativas e econômicas, buscou, o Estado, de modo mais sistematizado (3), atrair o dinheiro do capital privado, para levantar e alocar tais recursos em seus projetos, numa proposição de parceria com o capital privado, para que juntos pudessem, Estado e empreendedores capitalistas, desenvolverem projetos de interesse social. Estado e capitalistas desenvolvendo, fornecendo e preservando serviços e bens públicos, produzindo o bem-estar social e criando um ambiente favorável para o desenvolvimento material, educacional, cultural, social e político da sociedade.

            Internacionalmente, muitos países lançaram e lançam mãos da PPP com instrumento de fomento ao desenvolvimento de projetos econômicos e sociais.

            b) PPP para a satisfação de necessidades sociais

            As parcerias, nos países desenvolvidos, mesmo atendendo às pressões da escassez dos recursos do Estado, normalmente se orientam para solucionar as questões de gestão profissional de viabilização de infra-estrutura de transporte coletivo, educação e saúde. Ou seja, na parceria com o empreendedor privado busca-se injetar na prestação de serviços públicos os valores eficiência, eficácia e qualidade de classe mundial (4), referenciais para a iniciativa privada competitiva, sempre em busca da inovação de processos e de produtos.

            Entende-se que serviços públicos eficazes e confiáveis são fundamentais para uma economia flexível e produtiva, combatendo a pobreza e a exclusão social à medida que abre oportunidades de auferir renda e de acesso a serviços de qualidade.

            É clara a posição neste sentido de Tony Blair, primeiro-ministro do Reino Unido, onde há alguns anos tem experimentado vários projetos de PPP (5), com significativos resultados na área da saúde. O jornal britânico Guardian Unlimited, de 25 de junho de 2001, publicou:

            "Prime minister Tony Blair is especially keen on what he believes to be the cultural values of the private sector. He wants to inject a fresh, innovative and entrepreneurial "can-do" approach into public services, which he believes are essentially entrenched, reactive, and conservative.

            He said: "We need to break decisively with the tradition of monolithic, centrally driven public services. We need to mobilise the small battalions and give them freedom to innovate and change. I want local managers and professionals to be entrepreneurs.""

            Os benefícios percebidos são a dinamização dos projetos, a alocação de riscos, compromissos públicos de longo prazo para projetos de interesse privados.

            Assim, os projetos de PPP são importantes na modernização desses países, evoluir a qualidade dos serviços públicos para serviços de classe mundial, promiscuir estilos gerenciais de modo sinérgico, com o desenvolvimento das percepções e compreensões de objetivos públicos e privados e atenção aos objetivos e interesse sociais.

            Não se caracterizam como PPP os negócios que apresentam uma das condições abaixo:

            - Quando os contratos são convencionais (empreita, concessão, permissão ou autorização).

            - Quando não há transferência de riscos para o empreendedor.

            - Quando o empreendedor não é o gerenciador do projeto.

            - Quando o Poder Público atua como operador.

            - Quando não há delegação de autoridade e responsabilidade.

            De modo geral, os projetos de PPP se aplicam às ferrovias, metrô, aeroportos, portos, rodovias, geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, petróleo, gás, telecomunicações, saneamento básico e tratamento da água, hospitais, escolas, presídios, prédios públicos e centros de convenção.

            Por fim, para a composição cooperativa dos setores público e privado, cabe observar a Matriz de Cooperação, que ilustra a vontade-disponibilidade de interação entre esses setores, adaptada de SENN (1992, p. 64) nesta monografia:

            FIGURA 1 – MATRIZ VONTADE-DISPONIBILIDADE

 

             

            Disponibilidade Pública

   
   

            Cooperação de PPP: parceiros cientes da necessidade de atuarem conjuntamente, como: projetos de grandes dimensões (Motivadores: segurança, capital privado, restrição fiscal, gerenciamento profissional etc). PPP: CONCESSÃO, PERMISSÃO

   

            Setor público regula a iniciativa privada, participação privada é "forçada"

             

            Para setor público: planejamento de projetos locais como, construção de casas populares, criação de empregos, melhorias viárias etc

 
 

            CONTRATAÇÃO: OBRAS E SERVIÇOS

            Para setor privado: interessa estudar estratégias mercadológicas e custos de produção. Emprego de capital intensivo. PRIVATIZAÇÃO: CONCESSÃO, PERMISSÃO

             


Jogo: GANHA-PERDE

            Jogo: GANHA-GANHA

             


Vontade Privada Nula

            Disponibilidade Privada

 

            Iniciativa privada orienta recursos para projetos públicos, agentes públicos são "forçados" a negociar ou cooperar

            Ações públicas e privadas independentes, sem cooperação

            Ex.: gestão pública, empresa pública etc

            CONTRATAÇÃO: OBRAS E SERVIÇOS

            Jogo: PERDE-PERDE

            Jogo: GANHA-PERDE

 

             

            Vontade Pública Nula

             

            A PPP insere-se num contexto de cooperação estratégica, mais eficiente para a sociedade como um todo, pois as partes envolvidas, setores privado e público, "têm consciência de que nenhum dos dois teria condições de gerenciar sozinho um projeto..." (SENN, 1992, p. 66).

            c) A adoção da política de PPP no Brasil: objetivos e abrangência do modelo do governo Lula

            A adoção da política de PPP no Brasil, considerada neste formato sistêmico e de interesse global do Estado, em todas as esferas de poder, União, Estados, Distrito Federal e Municípios, se insere no contexto de busca de soluções para a falta de recursos para investimentos principalmente em infra-estrutura. A falta de investimentos em infra-estrutura inviabiliza o desenvolvimento econômico do país, empobrece sua população pela escassez de acesso ao trabalho, fonte principal de obtenção da renda que provê a sobrevivência digna das pessoas.

            O Brasil, dentro das perspectivas de seu desenvolvimento econômico, teve nos anos 30 um modelo de Estado nacionalista e desenvolvimentista, com a interferência deste no domínio econômico, diretamente e indiretamente, pelos seus órgãos e agentes. Estado era regulador e participativo, atuando estruturadamente, ramificando os poderes emanados do poder executivo central. Neste período, desenvolve-se a capacidade de Estado de planejar e interferir na dinâmica da economia brasileira. Há uma relação com a iniciativa privada, que busca o diálogo com o governo na defesa de seus interesses, enquanto o Estado domina ditatorialmente a esfera política.

            Na Carta Constitucional de 37 consolida-se o autoritarismo do poder executivo ao conferir amplos poderes ao chefe deste poder.

            Os trabalhadores têm seus sindicatos controlados por regramentos uniformizadores. As greves são proibidas. Por outro lado, neste período da ditadura Vargas, surge a CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, um instrumento legal que traz importantes dispositivos de proteção e valorização do trabalho assalariado.

            Este período é marcado na economia pelo efetivo despertar do comércio exterior, do surgimento do parque siderúrgico nacional e pelo início da exploração do petróleo. Inicia-se o capitalismo industrial no Brasil, com a modernização do direito societário e falimentar e a implantação do direito do trabalho.

            De 1946 a 1950, período pós ditadura Vargas, há um alívio nas ações centralizadoras do Estado, inaugurando-se um período de maior liberalidade econômica

            No segundo governo Vargas, os anos 50, as estruturas sócio-econômicas passaram a exigir projetos de desenvolvimento mais complexos. Amplia-se o grau de racionalização e de gerência do desenvolvimento nacional por meio de uma busca de um planejamento sistemático. É criado o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico - BNDE: cria-se uma estrutura de planejamento com finalidade de propiciar investimentos estatais no setor de bens de capital (indústria química e farmacêutica).

            Juscelino Kubitschek buscou a industrialização acelerada, o que demandou equipamentos e matérias-primas, frente a uma insuficiência na capacidade de importação, causando problemas a setores básicos para a dinâmica da vida econômica, como transporte, energia e crédito, agravada pelo quadro inflacionário. JK busca estimular o desenvolvimento da iniciativa privada e reforça o modelo de substituição de importações, elaborada no segundo governo Vargas. Busca-se estimular a implantação do setor de bens de consumo durável. O Plano de Metas de JK apresentou resultados expressivos nos setores de energia elétrica, rodovias, siderurgia, petróleo, cimento, fertilizantes, indústria mecânica e de material elétrico pesado. Ao final deste período já afloram alguns problemas, como o aumento da dependência do capital estrangeiro, o crescimento da dívida externa, a concentração industrial, o êxodo rural, as migrações e... a inflação.

            Os governos militares encontram um cenário internacional bastante favorável em termos de liquidez e oferta de empréstimos, o que viabilizou a política econômica voltada para o desenvolvimento de infra-estrutura e desenvolvimento econômico, principalmente entre 1967 até 1973. Neste período ocorre a reforma bancária (1964), que melhora as condições de fluxo de capitais estrangeiros para o país nos anos seguintes.

            Ao final da década de 70, nos anos 80 e 90 os investimentos em infra-estrutura no Brasil foram bastante insuficientes. Ambiente político e social eivados de profundas transformações redemocratizantes e com seus inerentes instabilidades e riscos. Crises econômicas sucedidas por planos de estabilização de uma incontrolável inflação até o advento do Plano Real, bem sucedido no controle das disparadas de preços, porém gerador de produtos nacionais pífios, incapazes de promover o crescimento econômico necessário. Tais condicionantes levaram ao quadro encontrado pelo governo Lula em 2003.

            O governo Lula desde seu estabelecimento preocupou-se com a realidade de que não há recursos estatais para suportar o desenvolvimento da insuficiente infra-estrutura brasileira. Segundo dados do BNDES, nos anos 70 o investimento governamental estava na ordem de R$ 170 milhões em valores atualizados, hoje estariam por volta de R$ 37 milhões. (6)

            A empresas que desenvolvem os projetos de interesse do governo nas telecomunicações, no setor energético e no setor de transportes atuam no regime de concessão de serviço público, como na construção e exploração de rodovias e de eletricidade; ou de autorização (geração termoelétrica; telefonia celular).

            Em tais regimes, o Estado é obrigado a cumprir o contrato firmado, quando perde um instrumento importante de política social ao respeitar acréscimos de tarifas ou preços públicos segundo política de reajuste pactuada.

            Os riscos de mercado e a perspectiva de retorno do investimento condicionam os negócios com o governo, no regime de concessões, uma vez que à iniciativa privada é imperioso amortizar tais investimentos.

            No caso de uma obra, pode o governo abrir um processo de licitação e contratar o executor, pagando o preço da obra durante sua realização, em prazo inferior a sessenta meses, conforme estabelece a Lei de Licitações, no inc. II do art. 57, pela redação dada pela Lei 9.648/98.

            No contexto contratual a Parceria Público-Privada surge como alternativa à concessão de prestação de serviços públicos. Na PPP, o Estado paga o "preço justo" ao particular, ao longo de um contrato de prestação de serviços ou obras e serviços de engenharia de longo prazo, superior a 5 anos, mas com atenção ao cumprimento de metas de qualidade previamente estabelecidas e acordadas.

            Devem ser ressaltados como inovações dos contratos em regime de PPP:

            - Possibilidade de desenvolver projetos conjuntos de longo prazo;

            - O compromisso da iniciativa privada de prestar serviço de natureza e interesse públicos cumprindo metas e obrigações de resultados medidos por indicadores de qualidade; e

            - A garantia de remuneração pelo Estado aos esforços do particular como contrapartida aos benefícios propiciados pelo projeto.

            Desse modo, espera-se que o regime de PPP apresente eficácia na atração de capital privado para fomentar a prestação de serviços públicos em áreas não visitadas pela concessão, permissão ou autorização, como é o caso de hospitais públicos, escolas públicas e presídios.

            Apesar de abrir um campo interessante para a formatação criativa de projetos, regime de PPP tem limites na Lei de Licitações, na Lei de Concessões e na Lei de Responsabilidade Fiscal.

            Portanto, o sucesso dos contratos de PPP depende de uma harmonização e estabilização legal e regulatória e de um horizonte de riscos amenizados para que haja garantia ao capital privado de que não entre numa aventura que o comprometa, por falta de retorno ou por desistência do Estado.

            Assim, a consecução desses objetivos da PPP é necessário confiança na sustentabilidade do crescimento, segundo condições como, no plano econômico, a do estabelecimento de uma política industrial consistente, taxa de câmbio adequada, promoção comercial internacional, reservas de divisas estatais ampliadas, responsabilidade fiscal e melhoria do perfil da dívida externa e interna; no plano político-social, estabilidade institucional e regulatória, diminuição da corrupção institucional e pacificação social (reforma agrária e violência criminal). Tais aspectos compõem os cálculos do risco-país da empresas internacionais de ratings.


Capítulo 3: O sonho representado pelas PPP no Brasil

            Em recente evento em Brasília (13 e 14 de novembro de 2003), o presidente do BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, importante e economista e ilustre professor, Carlos Lessa, encerrou o "Seminário Internacional Parceria Publico-Privada (PPP) na Prestação de Serviços de Infra-Estrutura MRE – BID –BNDES" fazendo apologia ao sonho do desenvolvimento imaginado pelo agente público decisório, quando supera a visão imediatista de mercado e ir além, aonde se encontra o sonho, pois para ele "só além do mercado é que está o sonho".

            Nas palavras de LESSA (2003):

            As sociedades têm que sonhar, e sonhar significa a vontade de ser, e a vontade de ser implica trabalhar com extrema objetividade, no limite das suas possibilidades, lançando mão dos expedientes disponíveis, e tentar mover-se em direção ao sonho.

            Para Lessa, abraçando a tese keynesiana de Kalecki, o Estado é o promotor de "qualquer" ciclo econômico, que ascende pelo investimento estratégico, onde está presente o investimento público, predominantemente, em infra-estrutura.

            Aponta o baixo crescimento brasileiro, desde o começo dos anos 80, com a crise do México, que afastou a oferta de empréstimos para a América Latina, e o jogou o Brasil em sucessivas crises e planos econômicos tópicos de emergência, aprofundando a incapacidade de crescimento adequada com as demandas sociais.

            Preocupado com o crescimento insuficiente do Brasil, LESSA (2003) desabafa:

            Nós brasileiros não vamos a lugar nenhum com taxas de crescimento medíocres. Em 20 anos, retrocedemos da oitava posição em produção industrial no mundo para décima terceira. São vinte anos de crescimento medíocre. Creio que, ao falar disso no Brasil, quase que eu estou falando do que aconteceu na maior parte dos países da América Latina. E ficamos todos esperando o investimento direto, em escala, no mundo globalizado, que iria nos fecundar, introduzir em nós o ânimo e a injeção necessária. Isto é do meu ponto de vista uma esperança vã, absolutamente vã.

            No mesmo evento, o diplomata Samuel Pinheiro Guimarães, representando o ministro Celso Amorim, do Ministério das Relações Exteriores, realça a necessidade da parceria entre os setores públicos e privados e assevera que "acrescentaria que, no caso do Brasil, crescendo a uma taxa de 1.3% ao ano, a população, há uma pressão muito grande sobre a infra-estrutura. Só para manter a deficiente infra-estrutura existente, é necessário um esforço muito grande de investimento. Para isso também a questão da limitação de recursos é importante. Portanto, o esquema das Parcerias Público-Privadas pode se tornar um instrumento muito relevante para viabilizar essas obras. Naturalmente todos os aspectos sociais decorrentes para a retomada do crescimento no Brasil são de extrema importância, e neles a parceria também se torna um instrumento crucial."

            O que deixa claro qual o papel que a política de PPP significa para o governo Lula, ou seja, estabelecer parcerias, obviamente eficazes, é um "instrumento crucial" para o crescimento do Brasil.

            Assim, o sonho do desenvolvimento e do crescimento necessitam das PPP, pois o sonho para o Brasil, um país periférico, é definido por LESSA (2003) como sendo o desenvolvimento econômico condicionado à obtenção da inclusão social e à manutenção da soberania nacional: "Para os países de uma periferia do mundo, o sonho é o do desenvolvimento. Eu diria que é o sonho do desenvolvimento com inclusão social, eu diria que é o sonho do desenvolvimento com inclusão social e soberania e agora eu vou dizer mansa, mansa soberania nacional. Esse é o sonho."

            a) O Projeto de Lei – PL de contratos de PPP do Ministério do Planejamento do governo Lula

            O Projeto de Lei n°2546/03 (* vide nota de atualização) - Lei da PPP -, em tramitação no Congresso insere-se no contexto do Plano Plurianual – PPA do governo para o período 2004 a 2007, que espera investir até 2007 o equivalente a 21,7% do PIB – Produto Interno Bruto. Nesse sentido, foi encaminhado ao Congresso Nacional, em 19 de novembro de 2003, em regime de prioridade, proposta de Projeto de Lei PPP. Entretanto, sua tramitação no Congresso Nacional poderá impor-lhe alterações significativas, uma vez que se trata de uma lei que buscar encaixar-se como uma cunha no edifício jurídico, na área sensível que regulamenta as atividades de contratação de entidades privadas pelo setor público, obrigando a uma acomodação importante nos modos de fluxos de capital e mesmo nos montantes comprometidos, que devem observar a capacidade de endividamento público, em respeito à Lei de Responsabilidade Fiscal.

            Seu objetivo é adaptar o atual marco legal de contratação (Lei nº 8.666, de 1993) e de concessão de serviços (Leis nº 8.987 e 9.074, ambas de 1995), implementando algumas alterações que facilitem a adoção do sistema de parceria e o seu elemento de distinção: compartilhamento dos riscos e financiamento privado.

            Trata este PL de regular, de forma abrangente, todos os contratos de parceria no Brasil, em qualquer esfera administrativa de poder, conforme estabelece seu art. 1o e seu parágrafo único:

            Art. 1° Esta Lei institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada, no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

            Parágrafo único. Esta Lei se aplica aos órgãos da administração direta, aos fundos especiais, às autarquias, às fundações públicas, às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

            Merecem atenção neste projeto de lei os seguintes aspectos:

            I -Garantias à remuneração pública do parceiro privado: Que visam firmar a confiança do particular que assume a responsabilidade integral pelo investimento no projeto objeto da parceria.

            a) Remuneração: Observar os instrumentos de remuneração e garantia previstos. Atenção especial deve ser dada ao (§ 3º do art. 5º), que estabelece a precedência das obrigações originárias de contratos de Parceria Público-Privada na liberação de recursos orçamentários e pagamentos em relação às demais obrigações contratadas pelo Poder Público:

            Art. 5º A contraprestação da administração pública nos contratos de parceria público-privada poderá ser feita por:

            I - pagamento em dinheiro;

            II - cessão de créditos não tributários;

            III - outorga de direitos em face da administração pública;

            IV - outorga de direitos sobre bens públicos; ou

            V - outros meios admitidos em lei.

            §1º A remuneração do parceiro privado poderá sofrer atualização periódica com base em fórmulas paramétricas, conforme previsto no edital de licitação.

            § 2º Os contratos previstos nesta Lei poderão prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao seu desempenho na execução do contrato, conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade previamente definidos.

            § 3º A liberação dos recursos orçamentário-financeiros e os pagamentos efetuados para cumprimento do contrato com o parceiro privado terão precedência em relação às demais obrigações contratuais contraídas pela administração pública, excluídas aquelas existentes entre entes públicos e observado o disposto no art. 9º da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000.

            § 4º Não se aplica à licitação destinada à contratação de que trata esta Lei, o disposto na alínea "a" do inciso XIV do art. 40 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de l993.

            b) Liquidação do empenho em favor do financiador:

            O PL autoriza a liquidação do empenho em favor da instituição financeira que financiou a parceria, como garantia do empréstimo feito pelo parceiro privado (art. 7º):

            Art. 7º O contrato de parceria público-privada poderá prever que os empenhos relativos às contraprestações devidas pela administração pública possam ser liquidados em favor da instituição que financiou o projeto de parceria, como garantia do cumprimento das condições do financiamento.

            Parágrafo único. O direito da instituição financeira limita-se à habilitação para receber diretamente o valor verificado pela administração pública na fase de liquidação, excluída sua legitimidade para impugná-lo.

            c) Vinculação das receitas: admite-se a vinculação de receitas e utilização de fundos especiais, desde que previsto em lei específica (art. 8º); e,

            Art. 8º Para o cumprimento das condições de pagamento originárias dos contratos administrativos decorrentes de parceria público-privada será admitida a vinculação de receitas e instituição ou utilização de fundos especiais, desde que previsto em lei específica.

            d) Fundo Fiduciário de Incentivo às PPP:

            autorização para integralização de Fundo Fiduciário de Incentivo às Parcerias Público-Privadas a ser instituído por Instituições Financeiras (art. 9º):

            Art. 9º Para concessão de garantia adicional ao cumprimento das obrigações assumidas pela administração pública, fica a União autorizada a integralizar recursos, na forma que dispuser ato do Poder Executivo, em Fundo Fiduciário de Incentivo às Parcerias Público-Privadas criado por instituição financeira.

            §1º A integralização a que se refere o caput poderá ser realizada com os seguintes recursos públicos:

            I - dotações consignadas no orçamento e créditos adicionais;

            II - transferência de ativos não financeiros; e

            III - transferência de bens móveis e imóveis, observado o disposto em lei.

            § 2º A integralização de recurso no Fundo Fiduciário mediante a transferência de ações de companhias estatais ou controladas pela administração pública, nos termos do inciso II do § 1º,não poderá acarretar a perda do controle acionário pela União.

            §3º Estados, Municípios e o Distrito Federal poderão, mediante lei específica, autorizar a integralização de fundos fiduciários com as características referidas neste artigo.

            II - Estabelecimento de metas de desempenho condicionando a remuneração do parceiro: A Administração Pública poderá definir metas e padrões de qualidade que indiquem o desempenho do parceiro no contrato, prevendo uma remuneração variável:

            § 2º Os contratos previstos nesta Lei poderão prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao seu desempenho na execução do contrato, conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade previamente definidos.

            III - Consonância com a Lei de Responsabilidade Fiscal: O art. 14 expressa a preocupação em atender a Lei de Responsabilidade Fiscal

            IV - Órgão Gestor: Um comitê ou órgão gestor, coordenado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, terá a como funções:

            - Fixar procedimentos para contratação de PPP;

            - Selecionar projetos;

            - Difundir conhecimentos técnicos ao setor público; e

            - Recepcionar as iniciativas do setor privado no campo das PPP.

            Art. 13. Ato do Poder Executivo instituirá órgão gestor, a ser coordenado pelo Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão, com a finalidade de fixar procedimentos para contratação de parcerias público-privadas no âmbito da administração pública e definir as atividades, obras ou serviços considerados prioritários para ser executados sob o regime de parceria.

            A arquitetura dos negócios de PPP está, portanto, estruturada numa composição de natureza tripartite, qual seja, a Administração Pública, o empreendedor privado e os financiadores das dívidas.

            O Estado compõe um fundo fiduciário como garantia do pagamento da contraprestação de obras ou serviços e as entidades financeiras disponibilizam os recursos financeiros. Na redação do art. 7o o devido pela Administração poderá ser liquidado em favor da instituição financeira, "como garantia do cumprimento das condições do financiamento"

            O órgão ou comitê gestor atua de modo global e sistêmico nas seleções dos projetos, desempenhando o papel de efetuar as escolhas e não escolhas de interesse do governo, com base em critérios técnicos e políticos.

            O esquemático abaixo (7) expõe a arquitetura dos negócios de PPP, com o posicionamento dos principais atores: Setor Público, Parceiro Privado e Financiadores.

            FIGURA 2 – ARQUITETURA DOS NEGÓCIOS PPP

             


             

             

             

             

            b) Primeira Carteira de Projetos PPP do Governo Lula

            O Governo Federal elaborou uma 1ª carteira de projetos PPP que totaliza R$13 bilhões em investimentos, nas áreas de transporte, recursos hídricos e irrigação. Espera-se que o setor privado invista de 70 a 80% desse total, com as primeiras licitações ocorrendo nos primeiros seis meses de 2004.

            O ministro do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Guido Mantega, calcula que já no início de 2004 será possível fechar os quatro primeiros grandes contratos de parceria no setor de transporte.

            O presidente Lula apresentou o modelo de PPP em Dubai durante a viagem para o Oriente Médio no início de dezembro de 2003 e o ministro Mantega voltou a apresentá-lo em Washington.

            Segundo Lula, "Agora é só apresentar projetos como o PPP para que os empresários brasileiros e internacionais se sintam atraídos para investimentos", afirmou Lula, prevendo uso de "recursos do orçamento, do BNDES, do Banco do Brasil e da Caixa Econômica (Federal)." O Banco Interamericano de Desenvolvimento, a Corporación Andina de Fomento e o BNDES firmaram um compromisso para financiar até US$ 1 bilhão em projetos no modelo PPP.

            Abaixo segue uma tabela (8) mostrando setores e valores de investimentos de interesse do governo no Plano Plurianual - PPA 2004-2007. Os números devem servir como uma idéia da ordem de grandeza, uma vez que há variações que dependem de estudos setoriais e das premissas e metodologias adotadas.

            TABELA 1 – VALORES DE INVESTIMENTOS PPP

             

            Setor

            Investimento (R$ bi)

            Saneamento/Habitação

            66,6

            Energia

            31,65

            Transportes

            10,69 (sem considerar 5 bi para manutenção)

            Infra-estrutura hídrica

            3,91

            Aeroportos

            3,16

            Total

            116,01

             

            Nas duas próximas páginas apresentam-se os quadros de projetos transportes (rodovias, ferrovias e portos) e irrigação previstos pelo governo federal para cada uma das regiões do Brasil, expostos na I Carteira de Projetos de PPP (9), divulgada no site do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, em 24 de fevereiro de 2004, onde o valor de transportes totalizam R$ 10,4 bilhões e não os R$ 10,7 bilhões do estudo do jornal Valor Econômico, acima ilustrado.

            Outro fato que corrobora a não exatidão dos valores: a versão em inglês da I Carteira de Projetos de PPP (PPP – I Projects Portfolio), em 25 de fevereiro de 2004 mostra valores diferentes da versão portuguesa, sendo que na totalização, esta versão, a portuguesa, traz R$ 13,067 bilhões enquanto a inglesa, R$ 13,685 bilhões; logo, R$ 618 milhões de diferença!

            FIGURA 3 – I CARTEIRA DE PROJETOS PPP

            FIGURA 3 – I CARTEIRA DE PROJETOS PPP (CONTINUAÇÃO)

            

            Como exemplo, abaixo segue o consolidado de informações, onde o governo federal expressa os aspectos que leva em conta para considerar um projeto.

            Assim, é importante realçar a preocupação com os benefícios sócio-econômicos.

            FIGURA 4 – CONSOLIDADO DE INFORMAÇÕES DE PROJETO PPP

            

             

            c) Outras experiências brasileiras em PPP

            Realçam, nos dias em que esta monografia é escrita, as ações executivas e legislativas dos estados de Minas Gerais e de São Paulo no que tange a uma busca de estruturação de parceria público-privada nos moldes entendidos pelo governo federal.

            A seguir serão apresentados os principais pontos da Lei mineira e do Projeto de Lei de São Paulo.

            d) As leis mineira e a paulista de regulamentação de parcerias

            O governo mineiro antecipou-se na questão da obtenção de uma legislação de PPP, quando em 25 de novembro de 2003, a Assembléia Legislativa deste estado aprovou o Projeto de Lei 889/2003, que se transformou na Lei nº 14.868. Posteriormente também foi implantado o Fundo PPP pela Lei no 14.869.

            O Poder Executivo do Estado de São Paulo, no dia 06 de novembro de 2003, submeteu à Assembléia Legislativa seu Projeto de Lei no 1.141/2003, que tramita nessa casa.

            Apesar dos pontos de semelhança entre os dois projetos estaduais, no concerne à preocupação com eficiência, respeito a direitos e interesses dos destinatários dos serviços e dos agentes privados, à universalização do acesso a bens e serviços essenciais, à responsabilidade fiscal e mesmo `a arquitetura dos negócios, onde:

            QUADRO 1 – COMPARATIVO DE LEGISLAÇÕES

             

 

 

            Minas Gerais

            São Paulo

            Conselho Gestor

            CGP – Conselho Gestor de PPP, vinculado ao governador (presidido pelo governador)

            Conselho Gestor PPP vinculado ao governador (controlado por este)

            Ente Contratante

            Governo por meio da Unidade PPP da Secretaria de Desenvolvimento Econômico – com quadro profissional contratado

            CPP – Cia Paulista de Parcerias (gestão) – sem quadro próprio de pessoal

            Seleção dos Projetos

            Conselho

            Conselho

             

            Há uma importante diferença entre as legislações estaduais:

            Enquanto na mineira, os contratos de parceria devem reger-se pelo regime de concessão e permissão, de acordo com as exigências da Lei de Licitações e Contratos, o projeto paulista nem mesmo cita a palavra concessão.

            Lei Mineira:

            Art. 12 - Os instrumentos de parceria público-privada previstos no art. 11 desta Lei reger-se-ão pelas normas gerais do regime de concessão e permissão de serviços públicos e de licitações e contratos e atenderão às seguintes exigências:

            Projeto de Lei Paulista:

            Art. 8º - Os contratos de parceria público-privada reger-se-ão pelo disposto nesta lei e pelas normas gerais sobre licitações e contratos administrativos e deverão estabelecer:

            Este ponto indica uma busca de maior independência do projeto paulista aos pontos considerados imobilizadores dos regimes contratuais de concessão e permissão, alinhando-se ao projeto federal, que – de forma intermediária – estabelece em seu art. 13 o "regime de parceria" e deixa sem eficácia todos os dispositivos legais que o contrariam:

            Projeto de Lei Federal:

            Art. 17 - Aplica-se às parcerias público-privadas o disposto na Lei nº 8.666, de 1993, e, no caso de concessões e permissões de serviços públicos, o disposto na Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e na Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995, no que não contrariar esta Lei.

            Outros interessantes aspectos poderiam ser explorados nas comparações dos textos legais de que visam regulamentar as PPP, mas que, por extravasarem o âmbito desta monografia, resta como oportunidade para futuros estudos.

            Por buscar compatibilizar-se com o edifício legal vigente, a lei de PPP mineira é pragmática e tem o condão de viabilizar alguns projetos antes de outros estados e, mesmo, de antecipar-se às iniciativas federais na atração de parceiros e captação de recursos, sabidamente limitados.

            Deve ser observado que é competência privativa da União legislar sobre normas gerais de contratação e de licitação, em todas as esferas administrativas, como se depreende do art. 22, inc. XXVII, da Constituição Federal, com a redação da Emenda Constitucional 19/1998:

            Art. 22. (*) Compete privativamente à União legislar sobre:

            XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III;

            A competência privativa caracteriza-se por ser, em regra, indelegável, segundo entendimento do Protocolo nº : 14399/2003 – PGJ-MP/PR, do Ministério Público do Paraná:

            O parágrafo único do artigo 22, da Carta Magna, abre a única exceção, estabelecendo que a autorização aos Estados para legislarem sobre as matérias de competência reservada à União pode derivar unicamente de lei complementar. Assim, somente com a concordância do quorum qualificado exigido para a aprovação da lei complementar, pode a União passar aos Estados parcela do poder que lhe outorga a Constituição de normalizar sobre as importantes questões arroladas nos incisos do citado artigo 22.

            Neste caso, apenas com previsão legal, por Lei Complementar, poderão Estados e Municípios legislarem sobre contratos da administração com parceiros privados. Tal autorização para as PPP não existe na legislação brasileira, o que tornará sem efeito as leis de PPP estaduais e municipais, por sua inconstitucionalidade, quando solicitado à intervenção o Supremo Tribunal Federal.

            e) As possibilidades de PPP no âmbito municipal

            A adoção de PPP na esfera municipal se insere no mesmo contexto restrição de recursos da Administração Pública para investimentos em ofertas de serviços públicos. Neste sentido, a seguir será exposto um quadro das condições de arrecadação frente às demandas municipais, o que permitirá uma contextualização das possibilidades de adoção das PPP no âmbito municipal, considerando-se a definição da agenda pública, o modelo municipal de PPP e a oportunidade de uma agência de fomento de projetos de parceria.

            f) Aspectos Importantes sobre a Tributação e as Demandas Municipais

            A seguir serão tratados em alguns tópicos aspectos importantes sobre a tributação, como principal fonte de receita da Administração Pública, possibilitando ao Estado a propulsão da oferta de bens e serviços públicos, e, de outro lado, as demandas crescentes por bens e serviços públicos.

            g) O problema do orçamento municipal: demandas municipais:

            As demandas dos cidadãos, confundidas com as demandas municipais, uma vez que – fundamentalmente é neste espaço geográfico que ele reside, produz, reproduz, circula, desenvolve sua condição humana, sua obra pessoal, suas relações sociais e afetivas, enfim sua realização humana. Na medida em que aceitamos que o governo municipal cumpre uma função administrativa, entendida como "o dever de o Estado atender ao interesse público, satisfazendo o comando decorrente dos atos normativos" (ROSA, 2002) e que o interesse do cidadão pode-se confundir com o interesse público, na comunidade em que ele desenvolve sua vida pessoal, social e econômica, entende-se ser dever do governo municipal conhecer, prever, organizar, comandar e controlar as ações tomadas no sentido da satisfação das necessidades de infra-estruturas e de serviços, sejam esses, implícitos ou explícitos, atuais ou futuros. Tais necessidades configuram o que assumido aqui por demandas públicas, já filtradas das não escolhas, conforme posto por OFFE (1984).

            O orçamento municipal é condicionado pelas receitas tributárias, que tem mudado seu perfil de composição ao longo da história recente, com ênfase interessante para o período posterior à promulgação da Constituição de 1988, que deu uma nova dinâmica ao federalismo brasileiro, à medida em que consolidou em seu desenho marcantes traços de interesses regionalistas, florescendo o debate acerca da distribuição de competências entre os entes federados, face ao aumento de participação dos Estados e Municípios nas receitas federais. Em seus estudos, BOVO (1999, p. 90) defende que o aumento da participação dos Municípios nas receitas federais veio acompanhado de um especial incremento dos gastos nas políticas sociais, porque, segundo este mestre:

            "...1 – os Municípios foram forçados a assumir programas que deveriam ser de responsabilidade do governo federal, desde que diversas obras e serviços deixaram de ser executados pela União. Entre 1908 e 1992, enquanto os gastos federais na área social mantiveram-se em torno de US$ 38 bilhões, nos Estados este montante passou de US$ 16 para US$ 20,9 bilhões e, nos Municípios, de US$7,2 para US$ 13 bilhões;

            2 – os Municípios passaram a utilizar uma parcela cada vez maior das receitas próprias com gastos sociais, pois os Estados e a União reduziram os repasses de recursos conveniados especialmente para as áreas de educação e saúde;

            3 – como os governos municipais estão mais próximos da população e, portanto, sofrem diretamente as pressões pela execução das políticas públicas, o agravamento das carências sociais implicou em um aumento da demanda por serviços públicos."

            Cabe lembrar que o Brasil apresenta desigualdades regionais de todas as ordens, desde qualidades de demandas até capacidade pública de administração do equacionamento das fontes de receita e das ofertas de bens e serviços públicos.

            Os municípios brasileiros apresentam diversidades gritantes, mesmo em nível regional ou estadual, demandando soluções específicas, caso a caso. REZENDE (1994) afirma que o "grande desafio [do sistema tributário brasileiro] consiste em conciliar o máximo de descentralização com uma adequada capacidade de redução das desigualdades regionais", não resolvidos pela Carta de 1988.

            A receita dos municípios cresceu, de modo geral, devido ao incremento nas transferências do governo central, afrouxando o vínculo de responsabilidade entre cidadão que contribui e a Administração, criando um ambiente propício para irresponsabilidade e para o desperdício dos recursos disponibilizados. Isto associado à falta de dados confiáveis e atualizados sobre as condições e demandas específicas locais, à ausência de coordenação dos órgãos das três esferas de governo (BOVO, 1999) e à inexistência de definição de responsabilidades entre cada ente federado, alteram de forma significativa o enfrentamento da questão da escassez dos recursos que visam atender as demandas sociais. Estamos claramente diante de problemas de ordem racional, que devem ser essencialmente enfrentados por qualquer matiz ideológico de políticas que busquem solucionar, de modo honesto, o atendimento às demandas sociais.

            O aumento das demandas municipais, muito além das carências na educação e na saúde, tem sido dinamizado pelas novas necessidades e formas de exclusão social e econômica, oriundas da globalização das comunicações e informações e da escassez de recursos, desafiando a capacidade de gestão municipal no fornecimento de bens e serviços públicos, que deve ser orientada na busca da máxima eficiência, entendida como a minimização dos custos e a maximização dos benefícios resultantes da atividade estatal.

            i - Demandas Públicas e Serviços Públicos:

            A capacidade governativa de todas as esferas da Administração Pública brasileira encontra-se bastante prejudicada pela infra-estrutura econômica. Na falta recursos econômicos e gerenciais, as políticas públicas não têm a eficácia de resolver os problemas da sociedade. Não se pode esquecer que a carência e dificuldade de permeabilizar gestões pautadas pela eficiência na administração de recursos, por sua tecnicidade inerente, esbarra no modelo democrático de fazer política brasileiro.

            As inovações de gestão visíveis no momento atual tangem a duas tendências, quais sejam, o ativismo democrático e o empreendedorismo, sendo que a busca de estímulos à participação ampla de agentes econômicos numa gestão compartilhada com o poder público, para buscar satisfazer as demandas sociais, tem dado a tônica ao atual Projeto de Lei da Parceria Público Privado da União e das iniciativas de outros membros da Federação.

            ii - Fontes de receitas tributárias de renda do município:

            A CF/88 estabeleceu as fontes de receitas tributárias dos municípios:

            Art. 156 - Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

            I - propriedade predial e territorial urbana;

            II - transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;

            III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no Art. 155, II, definidos em lei complementar;

            IV - (Revogado pela EC n.º 3-1993).

            Além das receitas tributárias, pode o município auferir receitas através da exploração econômica de serviços prestados aos cidadãos, como saneamento básico, coleta e processamento do lixo, prestação de serviços de telecomunicações, energia elétrica, administração de estradas de rodagem, entre outros.

            As administrações municipais (10) mantêm uma forte dependência das transferências, constitucionais ou voluntárias, dos governos federal e estadual. As receitas tributária próprias dos municípios originam-se do Imposto sobre a Prestação de Serviços (ISS), do imposto sobre a propriedade territorial urbana (IPTU), do imposto sobre a transmissão, intervivos, de bens imóveis (ITBI), das taxas e das contribuições de melhorias.

            A arrecadação própria dos municípios representou, em 1997, cerca de 30% de sua receita líquida disponível. A grande representatividade das transferências de outras esferas de governo pode conduzir a um sub-aproveitamento das bases tributárias próprias. Com grande parte da receita já garantida pelas transferências, não haveria motivação à impopular tarefa de exigir o rigoroso cumprimento das obrigações tributárias.

            Portanto, uma forte dependência das transferências dos governos federal e estadual aos municípios deveria na verdade contribuir para ações empreendedoras das Administrações municipais. Talvez agora, com um cenário de liquidez escassa, haja interesse maior de se equacionar melhor as fontes e forma de obtenção de recursos, além das pressões políticas expressas nas negociações da reforma tributária em discussão no Congresso Nacional.

            iii - Soluções políticas e econômicas às questões da receita municipal

            a. A falência da Administração Pública

            Chega-se a comentar, em alguns círculos de atores políticos e econômicos (BERNAREGGI, 1990) a possibilidade da falência da Administração Pública, decorrente das crescentes e cada vez mais sofisticadas demandas sociais, frente a um Estado sem recursos e com sua capacidade tradicional de obtenção de receitas exaurida.

            A elevação das alíquotas ou criação de novos tributos, a despeito da criatividade dos tecnocratas dos governos, parecem próximas ao seu limite real, pois a sociedade parece não ter como pagar mais ao Estado.

            Estudos do governo federal, mostrando a decidida tomada de recursos privados, pelo Estado, com uma fatia – hoje – já superior aos 35,9%. (11) (BERNAREGGI, op. cit.).

            b. A Reforma tributária

            Há uma possível correlação da dívida líquida do setor público com a participação tributária do governo no PIB. O problema é que tal dívida não resultou de investimentos importantes, mas sim de um quadro de agravamento da insolvência financeira, colocando a economia do país numa situação de busca de créditos internacionais em condições desfavoráveis, piorando a situação das contas correntes e poucos benefícios puderam chegar até os cidadãos.

            iv - A reforma tributária e seu impacto no município

            A reforma tributária em curso no Congresso Nacional, sem consultar diretamente o contribuinte, pessoa física ou jurídica, tem causado profundas discussões nos mais diversos setores da sociedade e, mesmo no seio do Estado (12), uma vez que há uma forte tendência de que a reconfiguração distributiva das receitas fiscais acabe por aumentar a participação do Estado na apropriação da riqueza nacional.

            A classe trabalhadora tem tido forte redução de renda, como atesta estudo do Bacen (13), indicando a queda importante do custo unitário do trabalho, em julho de 2003, na marca de US$ 50.

            Isto aprofunda os problemas de capacidade de consumo, com conseqüências recessivas às empresas que sobrevivem do mercado nacional. O trabalhador tem sua cesta de consumo alterada, aumentando a participação percentual dos itens de necessidades básicas, atinentes à alimentação, moradia, saúde, vestuário e transporte, espremendo ou eliminando gastos com educação, atividades de lazer e de cultura, entre outros.

            O governo federal, em sua estratégia arrecadatória, marcada pela premência e pragmatismo (14), "fatiando" a Reforma Tributária, tem buscado garantir suas receitas. Na recente edição da Medida Provisória n° 135, de 30 de outubro de 2003, alterando alíquotas da Cofins, um tributo federal, claramente afeta a vida econômica dos municípios, onde as atividades das empresas, cujas receitas integram a base de cálculo desse tributo, são exercidas. Como todo tributo, concorre com a renda e com o salário disponível para dinamizar o consumo, mobilizar a poupança e revigorar o investimento. Assim, maior o tributo, menor a renda e o salário para compor a demanda agregada. Apesar das evidências, o governo federal continua afirmando o contrário, como é de tradição no Brasil:

            Mudança trará diminuição da carga, garante Fazenda

            A mudança de tributação da Cofins, que deixará de ser cumulativa e passará a incidir sobre o valor agregado a partir de fevereiro de 2004, vai representar uma redução da carga tributária sobre a produção nacional, garantiu ontem o secretário de política Econômica do Ministério da Fazenda, Marcos Lisboa. Essa redução será compensada pelo aumento da tributação dos bens e serviços importados. (Jornal Valor Econômico Ano 4 - Nº 881 - 1º Caderno, de 5 de novembro de 2003)

            No mesmo sentido, a manutenção da alíquota de 27,5%, que também comprime o salário líquido da classe trabalhadora, contribuindo para queda de vendas e de produção, uma vez que não há espaço para a sonegação para o trabalhador registrado.

            Classe média paga mais IR com manutenção de alíquota de 27,5% (Folha On Line: 21/10/2003 - 19h39)

            O dinheiro arrecadado pelo governo não tem sido usado com eficiência, nem com eficácia. As demandas sociais não têm sido atendidas, de longe passam por um mínimo razoável, o que torna a gana tributária geradora de maiores desigualdades e de pobreza, quantificável, aplicando-se uma Análise de Lorenz.

            A distribuição funcional da renda indica a sua repartição entre os fatores de produção, principalmente entre o trabalho e o capital.

            De forma inversa, a arrecadação tributária que deveria ser um instrumento da política distributiva, frente ao sorvedouro dos gastos públicos, empobrece a população, em sua renda disponível e na oferta de equipamentos e serviços públicos.

            Na esfera empresarial, a já freqüente a sonegação fiscal deve ser ampliada, corroborando a Curva de Lafer (ad tempora), isto porque as alíquotas marginais dos impostos, até um certo valor, podem manter uma correspondência direta com o montante dos tributos arrecadados pelo governo. No entanto, após um dado valor limite de alíquota marginal, a alíquota máxima, qualquer incremento de alíquota significará perda de receita tributária. Isto se dá pelo estímulo à sonegação fiscal e ao desestímulo das atividades produtivas.

            v - Participação da Iniciativa Privada

            Busca-se, já há algum tempo, atrair a iniciativa privada para compor com o Estado na realização de seus projetos, seja na forma de empreendedorismo público ou de ativismo estatal, reformando a Lei de Licitações, atualizando a Lei de Concessões, estabelecendo as agências reguladoras e, agora, criando-se nas esferas federal e estadual, legislações que permitam estimular as parcerias público-privado (PPP).

            vi - A Questão da Parceria Público-Privado: aspectos

            Alguns aspectos atinentes à parceria público-privado (PPP) merecem destaque, principalmente quanto à capacidade de endividamento do setor público em parcerias de projetos de envergadura, quando deve assumir algumas despesas, como valor do projeto proposto (a idéia), shadow tolls e outras, frente aos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal. Assim, aspectos da accountability da Administração Pública devem ser profissionalmente trabalhados, sendo ações de envergadura de Estado e não de governos, uma vez que os prazos de maturação e de contratação são bastantes superiores aos mandatos executivos.

            vii - O modelo de PPP municipal

            A Prefeitura Municipal de São Paulo vem anunciando o que propala "a primeira modalidade de PPP do Brasil para urbanizar favelas", com os projetos de urbanização das favelas Heliópolis e Paraisópolis (15).

            A proposta foi elaborada pela Prefeitura, com o acompanhamento do SECOVI (Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Comerciais e Residenciais de São Paulo), da ABECIP (Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança) e da APEOP (Associação Paulista de Empresários de Obras Públicas).

            A modalidade de PPP proposta por esta municipalidade trata-se de uma concessão, que não deixa de ser pragmática e criativa, como consta das informações de seu Plano Diretor recentemente aprovado e de declarações da prefeita Marta Suplicy e de seu Secretário da Habitação e de Desenvolvimento Urbano, Paulo Teixeira, acerca da formulação dos negócios veiculadas na imprensa.

            No Plano Diretor estabelece a concessão, a proposição do projeto e o risco da exploração:

            Art. 239 - O Poder Executivo fica autorizado a delegar, mediante licitação, à empresa, isoladamente, ou a conjunto de empresas, em consórcio, a realização de obras de urbanização ou de reurbanização de região da Cidade, inclusive loteamento, reloteamento, demolição, reconstrução e incorporação de conjuntos de edificações para implementação de diretrizes do Plano Diretor Estratégico.

            § 1º - A empresa concessionária obterá sua remuneração mediante exploração, por sua conta e risco, dos terrenos e edificações destinados a usos privados que resultarem da obra realizada, da renda derivada da exploração de espaços públicos, nos termos que forem fixados no respectivo edital de licitação e contrato de concessão urbanística.

            § 2º - A empresa concessionária ficará responsável pelo pagamento, por sua conta e risco, das indenizações devidas em decorrência das desapropriações e pela aquisição dos imóveis que forem necessários à realização das obras concedidas, inclusive o pagamento do preço de imóvel no exercício do direito de preempção pela Prefeitura ou o recebimento de imóveis que forem doados por seus proprietários para viabilização financeira do seu aproveitamento, nos termos do artigo 46 da Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001, cabendo-lhe também a elaboração dos respectivos projetos básico e executivo, o gerenciamento e a execução das obras objeto da concessão urbanística.

            Adicionalmente, a empresa ou consórcio que vencer a concessão (por meio de licitação específica) terá que urbanizar sem receber pagamentos oriundos do orçamento da Prefeitura, mas será paga com certidões de outorga onerosa. A concessionária poderá revender, utilizar em empreendimentos próprios ou apresentar as certidões como garantia de operação de crédito.

            A título de registro, em São José do Rio Preto, a Secretaria Municipal de Planejamento e Gestão Estratégica está levando adiante algumas ações classificadas pela sua administração como sendo PPP. Tais ações estão voltadas viabilizar a sustentabilidade e desenvolvimento de negócios de pequenos e micros empresários. Entende a Prefeitura de São José do Rio Preto ser uma PPP a "doação" de áreas em mini distritos industriais e de apoio institucional para o desenvolvimento de empresas. No entanto, essas ações não caracterizam por si mesmas uma parceria público-privada, como tratado nesta monografia, pois não fica claro qual o serviço público viabilizado ou prestado por ações voltadas para a criação de pólos para o fortalecimento de empresas sem finalidade pública, como joalherias e transportadoras.

            h) A oportunidade de uma agência autônoma de fomento de projetos de PPP

            A UNDP – United Nations Development Programme da Organização das Nações Unidas (ONU), desenvolve um programa denominado PPPUE - Public-Private Partnerships for the Urban Environment (16), desde o Rio Earth Summit, em 1994, que visa dar suporte ao desenvolvimento de parcerias entre os setores público e privado em nível de pequenas e médias cidades carentes de serviços básicos de saneamento e de meio ambiente. Suas ações visam articular investidores, fornecedores, agências reguladoras, usuários, especialistas e pesquisadores para enfrentar os desafios da oferta cooperativa desses serviços em diversos países ao redor do mundo.

            A sua estrutura de parcerias é ampla e tripartite, contando com a participação da Administração Pública (em todos os níveis), empreendedores privados (nacionais e estrangeiros, regulares ou informais) e a sociedade civil (centros de pesquisa, entidades comunitárias, Organizações Não-Governamentais), conforme seu esquema abaixo (17):

            FIGURA 5 – ESQUEMÁTICO PPP - UNDP

            

            A PPPUE desenvolve um trabalho complementar ao da Public-Private Infrastructure Advisory Facility (PPIAF), uma iniciativa de interesse do Banco Mundial, que disponibiliza recursos em larga escala.

            Os principais setores de atuação da PPPUE são o saneamento básico, produção e distribuição de energia e viabilização de bens públicos tais como, mercados públicos, matadouros públicos, terminais de ônibus etc.

            No desenvolvimento das instituições democráticas seriamente preocupadas com a produção e reprodução da pobreza, da exclusão social e econômica, da iniquidade e da violência, parece oportuno a estruturação de agências autônomas de âmbito municipal ou regional, para a proposição de agenda de projetos de PPP às Administrações locais. Essas agências cuidariam da colheita, avaliação, análise e consolidação das demandas sociais em âmbito municipal e supra municipal (regional), buscando coordenar a reunião de recursos humanos, capitais, tecnologias e capacidade gerencial para a estruturação e viabilização de projetos que viabilizem a satisfação dessas demandas, inclusive articuladas à PPPUE.

            Por outro lado, tais agências poderiam atuar na identificação das "não escolhas" mais significativas, lembrando OFFE (1984): a definição das agendas públicas municipais está eivada de vícios, devidos aos "interesses estreitos, efêmeros, contraditórios e imperfeitamente formulados", numa definição de caráter classista da dominação política) e na avaliação de suas conseqüências visíveis ou potenciais, prestando um serviço de orientação às políticas públicas de investimento em infra-estrutura, educação, saúde, habitação, transporte, emprego e segurança. Os conselhos municipais estariam aparelhados de informações consolidadas a partir de dados reais, estatisticamente tratadas, fornecidos pelas agências, para que seus conselheiros pudessem emitir seus pareceres de modo fundamentado.

            O resultado político mais instigante seria o aclaramento das contradições das decisões de Estado e sua legitimidade política no contexto dos interesses divergentes de classes e grupos sociais, contribuindo para um amadurecimento político pela dinâmica da dialética estabelecida pelas seletividades opostas, estando ou não presentes na agenda pública municipal. Economicamente, poderia haver uma maior base para captação de recursos, por sua capacidade de articular parcerias em âmbito global, através da PPPUE.


Capítulo 4: As realidades do sonho

            Da Exposição de Motivos do PL Federal das PPP, apresentada pelo governo por intermédio de Guido Mantega e Antonio Palocci Filho, extrai-se o reconhecimento do governo brasileiro de que necessita de um programa de PPP por dois motivos, quais sejam, pela "falta de disponibilidade de recursos financeiros e aproveitamento da eficiência de gestão do setor privado."

            Além disso, considera o governo Lula, ser a PPP "indispensável" para o nosso crescimento econômico, "em face das enormes carências sociais e econômicas do país, a serem supridas mediante a colaboração positiva do setor público e privado."

            Neste sentido, o Plano Plurianual – PPA estima o preço do sonho da PPP e prevê a necessidade de investimentos de cerca de 21,7% do PIB – Produto Interno Bruto, até 2007 para que se viabilize o retorno do crescimento econômico do país.

            Por outro lado, os capitalistas não perdem o foco de alguns pontos preocupantes, pois reais. Empresários capitalistas monitoram as realidades econômicas, políticas, legais, sociais e culturais, pois, em última instância, a decisão de gastar ou investir tem de estar revestida pela segurança, pelo risco bem calculado, pelo plano B (alternativo) detalhadamente delineado, como o comprova o paradoxo de Allais (ad tempora), que demonstra a preferência pela segurança na vizinhança da certeza, na prova neobernoulliana, realizada com empresários, com alta soma de dinheiro a investir.

            A velocidade de comercialização, a dinâmica e escala da atividade negocial, que nesta fase de e-business e automatização de controles e negócios proporcionam um giro de valores financeiros há pouco tempo inimaginável, faz com que o mundo empresarial fique especialmente sensível a custos sem fundamentos claros e à maximização de lucros, que ao menor descuido podem causar lesões irreversíveis no organismo empresarial, comprometendo a sua sobrevivência. A composição de parcerias se justifica plenamente neste contexto, onde a colaboração ou compartilhamento na pesquisa e no desenvolvimento, na comercialização ou na administração de custos indiretos dão vigor às alianças estratégicas, importantes para a permanência e fortalecimento de suas atividades nacionais ou supranacionais. Desse modo, todas as realidades econômicas, políticas, jurídicas, sociais e culturais devem ser consideradas pelos empresários, pois acabam repercutindo em sua confiança ou em sua segurança em investir, estimulando ou desmotivando o direcionamento de seu capital para determinados setores da economia ou áreas geográficas.

            As realidades a seguir comentadas não se esgotam em forma ou conteúdo nesta despretensiosa monografia, que se satisfaz em apontá-las de modo a contribuir para futuros estudos de acompanhamento e avaliação da política de PPP no Brasil.

            Realidade 1 – Poder do Príncipe: A confiança do empreendedor privado nas atitudes e valores dos governantes é de fundamental importância para o sucesso das parcerias buscadas pela Administração Pública. A confiança está intimamente ligada à percepção do risco do negócio.

            A negociação entre capitalistas e governantes, mesmo no domínio da ética, requer um certo grau de compatibilidade ideológica. Os valores políticos não podem apresentar tanta dissonância, como aconteceria se os ocupantes dos cargos executivos estatais questionassem os fundamentos filosóficos da legitimidade da propriedade privada dos meios de produção.

            Neste aspecto, mesmo sendo o governo Lula reconhecido como de "esquerda", seu discurso não é o do confronto com o capital e sua prática econômica, pragmática, tem oscilado entre a ortodoxia monetarista e os anseios desenvolvimentistas keynesianos, o que, em termos teleológicos, não soa estranho aos ouvidos dos empreendedores capitalistas.

            A insegurança provém da instabilidade regulatória e tributária. As tendências de centralização de decisões políticas e ingerências administrativas (18) de âmbito econômico setorial, como nas ações para a restrição de atuação das agências reguladoras (que devem ter independência e autonomia), fundamentais para a estabilidade regulatória, conforme o entendimento generalizado do capital. A efervescência tributária leva insegurança ao empresário, pois seus custos de produção ou da dinâmica do negócio (custo financeiro do prolongamento da realização da venda) restam afetados. Adicionalmente, deve ser lembrado que a possibilidade de "quebra de contrato" também cinde a confiança e eleva os risco, assim o Efeito Requião (19) pode causar dificuldades para o estabelecimento de parcerias eficazes (20).

            No entanto, a história política brasileira é marcada por instabilidades e mudanças significativas no Poder, com reflexos nas prioridades assumidas por um determinado governo. Isso leva qualquer um a concluir que um período de 30 anos está eivado de riscos, pois as agendas públicas são projetos de governos e não de Estado. Além disso, tais agendas correm sempre o risco de serem ardilosamente manipuladas pelas tecnoburocracias que constituem a máquina administrativa, como se viu no "paradoxo do voto". O poder do príncipe (e da burocracia estatal) sobrepõe-se ao Estado, sua vontade justa ou não pode levar a quebra de contratos legítimos.

            Apesar de disso, há sinais de confiança na política nacional de PPP, como se depreende do recente empréstimo de US$ 505 milhões de disponibilizado pelo Banco Mundial para ajudar no crescimento do país, podendo ser aproveitados nas PPP. (21)

            Falar da confiança no sentido contrário, ou seja, dos governantes nos parceiros privados não é tão importante, uma vez que aqueles devem orientar-se pelos Princípios da Administração Pública e leis decorrentes, que impõem rigores na apuração da idoneidade do ente privado, antes da celebração de qualquer contrato.

            Realidade 2 - Corrupção: O Brasil não tem ocupado posições confortáveis nos rankings internacionais de organismos que se dedicam ao monitoramento deste comportamento que desagrega a confiança em qualquer parceria. Segundo relatório da World Audit (22), o Brasil ocupa a 47a posição entre 125 países, em que os EUA ocupam a 15a. No Perfil de Competitividade do Fórum Econômico Mundial (23), o Brasil apresenta um Índice de Instituições Públicas (composto pelos sub-índices corrupção e legislação e contratos) de 45/100. Segundo O Relatório Global da Corrupção 2003 – América Do Sul, da Transparência Brasil da Transparency International (24):

            A administração de Fernando Henrique Cardoso teve, a seu favor, o fato de ter feito importantes avanços na luta contra a corrupção. A Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000, que aumenta o controle e o monitoramento dos gastos públicos, entrou em vigor em 2002; o órgão responsável pela fiscalização das finanças internas saiu do Ministério da Fazenda e tornou-se mais independente.

            Mas grande parte desse progresso é invisível a muitos brasileiros. Em uma pesquisa realizada em meados de 2002, 51% dos entrevistados responderam que a corrupção federal tinha aumentado durante os últimos dois anos; 41% disseram que tinha aumentado nos estados; e 40% deram a mesma resposta sobre a corrupção nos municípios.

            Os críticos culpam a rede complexa e obscura das alianças políticas brasileiras. A lealdade política está por toda a parte, em nome de resultados eleitorais e, assim, esses "casamentos

            de conveniência" prejudicaram os esforços contra a corrupção empreendidos pelo governo Fernando Henrique Cardoso; qualquer ofensiva mais séria comprometeria pessoas de seu próprio partido.

            A corrupção deve ser combatida, de forma sistemática, em todas as esferas administrativas brasileiras, pois ela abala qualquer confiança para parcerias e "encarece" (pela cobrança de propinas de intermediação, facilitação, preferência, agilização etc) qualquer projeto, anulando todo o ganho de eficiência produtiva almejada.

            Realidade 3 – Agenda Pública: A despeito da crença do presidente do BNDES de que o agente público decisório tem a capacidade de ver e pensar a longo prazo e "expressar a vontade de uma nação" (25), a experiência nacional mostra dissintonias de interesses muito sérias no seio da nação, evidenciadas pelos altos níveis de exclusão social e violência SEIBEL (2004).

            Há a preocupação de que como alguns projetos serão politicamente mais populares que outros, os governos poderão tratar projetos de maneira diferente em para auferir ganhos eleitorais ou em épocas de crise (controle inflacionário, por exemplo), exercerem prioridades econômicas, afrontando a agenda pública e compromissos firmados.

            A definição e a gestão dos projetos de PPP devem levar em conta, através de consultas, os desejos e possibilidades de seus usuários, além dos interesses trabalhistas e sindicais, pensados no longo prazo, pois as experiências internacionais (26) indicam a necessidade de preocupação com esses aspectos. Isto significa, na prática, uma proteção contra riscos políticos, por meio da condução de projetos viáveis e alinhados com interesse público de crescimento econômico, reduzindo a gama de potenciais respostas políticas negativas. A preocupação com os efeitos do paradoxo do voto (WESSELS, 2003, p. 439) e das distorções da ordem preferencial do processo decisório (SENN, 1992, p. 62) devem nortear a escolha e a implementação dos projetos de PPP harmonizados com uma agenda pública legítima e dinâmica é outro desafio a ser enfrentado pelo governo.

            Realidade 4 – Efeito Placebo e Inadimplemento: Todas as esferas de governo têm se utilizado das discussões das PPP para afinar a percepção social, mormente dos empreendedores capitalistas, para a necessidade do país investir em projetos de infra-estrutura para poder crescer economicamente.

            O empreendedor capitalista passa a compartilhar o "sonho" do administrador público, diante de um quadro de política e de ações legislativas, com desenhos de operações econômico-financeiras, respaldadas pela tecnicidade de projetos de desenvolvimento, uma vez que é o desejo de todos ter um país pujante. A realidade da viabilização fática do sonho pode fica obscurecida pela luz do sonho, o que pode levar à realização de investimentos motivados pela satisfação da expectativa do efeito do crescimento, tal qual num efeito placebo: as coisas podem funcionam por que confio que assim seja.

            Como disse recentemente o presidente Luís Inácio Lula da Silva, "Agora é só apresentar projetos como o PPP para que os empresários brasileiros e internacionais se sintam atraídos para investimentos" (27), Este comportamento pode não considerar que a massa de usuários que pagará a tarifa ou preço público está a cada ano, nas últimas duas décadas, empobrecida pelo baixo crescimento do PIB, pelo aumento de desempregados, pela queda do montante tributário arrecadado, pelas metas assumidas juntos aos organismos de financiamento internacional (o que impõe contingenciamentos).

            A iniciativa privada poderá se ver entre duas situações críticas, levando ao inadimplemento do contrato de parceria: seu cliente sem capacidade de compra (crise de demanda) e seu parceiro sem capacidade ou disposição de compor o valor do preço do serviço ofertado (crise de margem).

            Realidade 5 – Cultura Gerencial: Numa relação negocial de parceria entre a Administração Pública e o agente privado os aspectos dos modelos administrativos não podem ser ignorados quando do estabelecimento de contratos e da organização da dinâmica da prestação de serviços contratada.

            A Administração Pública brasileira pauta suas ações orientada por princípios básicos à luz do art. 37 da Constituição Federal, que são:

            - Legalidade: o administrador deve realizar o que é previsto em lei;

            - Impessoalidade: sua atuação deve pautar-se pelo atendimento impessoal, neutro;

            - Moralidade: a atividade administrativa devem atender a um só tempo à lei, à moral; à equidade e aos deveres da boa administração;

            - Publicidade: é obrigatório e cogente divulgar e fornecer informações de todos os atos da Administração, interna ou externamente; e

            - Eficiência: que impõe que o administrador adote critérios profissionais que assegurem o melhor resultado possível, inclusive na organização da entidade em que atua.

            Caracterizada a violação de qualquer princípio básico da Administração estarão inibidos os efeitos do ato viciado.

            Para o exercício de suas funções socorrem a Administração Pública alguns poderes, que não dispensam a correspondência poder-dever, ou seja, o poder só pode ser exercido com uma finalidade específica, subordinando-se ao dever.

            Assim, o Poder Vinculado indica que sua atuação só é lícita se estiver conforme ao comando legal; o Poder Discricionário, de modo diverso da atividade vinculada, possibilita um grau de liberdade de ação para o administrador, desde que esta discricionariedade esteja prevista ou delimitada por lei; o Poder Hierárquico que permite que a Administração estruture sua organização, dentro dos limites de competência previstos em lei, do que decorrem prerrogativas como delegar e avocar atribuições, emitir comandos, fiscalizar, controlar etc; o Poder Disciplinar que corresponde ao dever de punir faltas funcionais cometidas por agentes públicos; o Poder Regulamentar, ou normativo, que permite a edição de regulamentos e decretos complementares à lei, de modo a explicitá-la ou prover sua execução; e o Poder de Polícia que confere à Administração o dever de impor limites ao exercício de direitos e de atividades individuais em função do interesse público.

            Portanto, observando-se os princípios e os poderes da Administração Pública pode-se inferir o quanto seu aparato administrativo se ajusta a uma estrutura burocrática weberiana (OLIVEIRA, 1999, p. 41), pois:

            i. A organização dos cargos obedece aos princípios hierárquicos, com definição de papéis a serem desempenhados no cargos descritos. Cada funcionário respondendo por suas responsabilidades;

            ii. O Poder Hierárquico estrutura a Administração, dentro dos limites da lei, num sistema coerente de regras administrativas abstratas, consistindo sua aplicação na especificidade, nos casos particulares;

            iii. O Poder Disciplinar atua para punir e para proteger o funcionário contra arbitrariedades, garantindo-lhe uma estabilidade corporativa, que no Brasil nem sempre é eficaz no desenvolvimento do espírito de equipe por conta dos baixos salários, da limitada capacidade administrativa dos administradores e da exagerada influência de correntes político-partidárias nos gabinetes da Administração, causadoras de "rachas" nas equipes;

            iv. As atividades normais estão bem dimensionadas e distribuídas de modo estável e uniforme, numa divisão de trabalho onde os serviços são simples, rotineiros e interativos.

            Em suas considerações sobre a reforma do estado brasileiro, BIZELLI (2002) comenta sobre o posicionamento do MARE – Ministério da Administração e Reforma do Estado, implantado em 1995 pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, que vislumbrava uma administração pública gerencial, respondendo "ao aumento das funções econômicas e sociais do Estado, e, de outro, ao desenvolvimento tecnológico e à globalização". Na análise do modelo brasileiro, Luiz Carlos Bresser Pereira, então ministro do MARE, concluiu que a atual Constituição Federal reforça e amplia o controle administrativo burocrático, diminuindo a flexibilidade operacional e contribuindo para a cristalização de interesses corporativos. As reformas propostas pelo MARE tiveram como finalidade dar agilidade à esfera pública, afastando-se de um modelo regulador keynesiano da vida sócio-econômica para a atuação "em parceria com o setor privado e com as organizações não governamentais (ONGs)"

            Na atual administração federal, não está clara a opção pelo modelo proposto pelo MARE, uma vez que há pontos de dissonantes, pois para o fortalecimento da economia nacional, o Programa de Governo do PT para o Brasil, preconizava em seu item 33 a concepção de um Estado articulador e coordenador da economia, numa postura de planejamento estatal keynesiano (contrário às receitas do MARE ao marco regulatório e política de concessões do último governo), mas contando com parcerias (34 c) contratadas com o setor privado (que prevêem, no projeto de lei do governo, o controle de desempenho, como forma de gestão).

            A atividade empresarial privada vive administrativamente outra situação, não lhe ajustando o perfil mecanicista da burocracia estatal. Premido pelas exigências da competição, pela disputa por margens com fornecedores, distribuidores, governos e trabalhadores e pelas demandas por qualidade, respeito ambiental e práticas de responsabilidade social, o empresário busca incessantemente modos administrativos alternativos que otimizem a eficiência e a eficácia de seus negócios, não lhe sendo adequada a dinâmica racionalmente estruturada da burocracia estatal.

            As estruturas empresariais privadas tendem a ser orgânicas, com estrutura hierárquica dinâmica, respondendo rapidamente às modificações e demandas do meio ambiente externo. As variáveis organizacionais são dependentes das variáveis ambientais. Estas são dinâmicas e influem na estabilidade daquelas.

            Assim, não interessam, à iniciativa privada a assunção de obrigações que engessem sua capacidade de reagir, cortando custos, investindo em tecnologias, mudando equipes e procedimentos, pautando-se pela máxima informalidade não desagregadora. Chega-se ao ponto de, numa visão imediatista, questionar a garantia de direitos trabalhistas como estabilidade de emprego, benefícios, irredutibilidade de salários, salários predefinidos, limitação de jornada, promoção por tempo de serviço etc.

            No jogo da maximização de lucros, aumento de rendas e conquistas de maiores fatias de mercado, interessa ao capital privado não ter amarras legais com obrigações trabalhistas e sociais, sendo mesmo intolerante ao cumprimento das obrigações tributárias.

            A superação dos estilos é necessária para a viabilização dos projetos PPP. Para tanto, os contratos devem ter um espaço especial para o regramento das entradas e saídas de caráter macro-operacional.

            O contrato de parceria não deve, portanto, prever operações conjuntas na viabilização da prestação de serviços ou ofertas de bens públicos

            Realidade 6 – Sigilo e Publicidade: A proposição, seleção, contratação e supervisão dos projetos devem ter normas detalhadas em bem definidas para garantir e harmonizar dois direitos aparentemente contraditórios; quais sejam, a obrigação-direito "publicidade" e o direito-obrigação de não revelação de informações confidenciais, os non-disclosure agreements - NDA (sigilo, segredo ou confidencialidade), de extrema importância no mundo empresarial.

            A garantia do sigilo é corrente no dia a dia dos negócios empresariais, uma vez que, numa proposta de projeto há informações tecnológicas e metodológicas que têm valor pecuniário importante no ambiente de competição. Deste modo, para que o empreendedor privado possa apresentar propostas originais e criativas, sem a garantia de contratação (uma vez que para a consecução de um contrato de parceria não será dispensável o processo licitatório), haverá que se criar instrumentos procedimentais que padronizem a extensão e profundidade das propostas, sem revelar segredos tecnológicos ou diferenciais competitivos. A publicidade obrigatória pode inibir a criatividade das propostas e afetar a qualidade da seleção de alternativas de projetos mais eficientes e eficazes.

            Realidade 7 – Existência de Recursos: A questão mais evidente é quanto à disponibilidade física de recursos internos e externos para os investimentos necessários e desejados.

            Angariar centenas de bilhões de reais ou dólares não é tarefa simples, uma vez que se tratam de recursos escassos, nas mãos de capitalistas (que visam o retorno do investimento segundo taxas remuneratórias – lucratividade -, baseadas na clássica avaliação da utilidade ou benefício marginal do projeto), portanto sujeitos aos dilemas de trade off. Assim, deve o governo, a cada projeto dar garantias líquidas e certas de que haverá retorno, com boa lucratividade e segurança contratual e comercial, em todo o longo prazo do projeto de parceria.

            Neste sentido, cabe a discussão da capacidade do Estado cumprir com as cláusulas econômicas de um contrato de parceria (longo prazo) e a legalidade de se assumir compromissos que obrigarão futuras administrações, podendo afrontar a Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF, principalmente quanto ao art. 5o §1º do Projeto de Lei de PPP Federal:

            A remuneração do parceiro privado poderá sofrer atualização periódica com base em fórmulas paramétricas, conforme previsto no edital de licitação.

            Quando a LRF considera não autorizada, irregular e lesiva ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não levem em conta o impacto orçamentário-financeiro e não sejam incompatíveis com a lei orçamentária e não podendo afetar as metas de resultados fiscais; tendo seus efeitos financeiros compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução de despesas. Aqui cabe, uma vez mais a questão da mediocridade do crescimento econômico dos últimos anos e a exaustão da carga tributária, limitando a Administração Pública na assunção responsável de obrigações de longo prazo.

            Por outro lado, a vinculação do mercado brasileiro ao dólar americano o torna particularmente sensível aos movimentos da economia americana. Os EUA passam por uma situação de preocupante déficit orçamentário e fiscal. A sua economia tem tido desempenhos preocupantes, mormente após a assunção do governo George W. Bush e dos atos terroristas de 11 de setembro de 2001. Os juros básicos da economia americana caíram a patamares ínfimos, numa estratégia do banco central americano (FED), buscando aquecer o mercado de consumo interno. Como conseqüência, o Brasil e os países emergentes tiveram a oportunidade de atrair capitais (que buscam maiores ganhos) para seus mercados. Tal efeito, entendido como "bolha" por uns economistas ou "minibolha" pelo ex-diretor do Fundo Monetário Internacional, Claudio Loser (28), preocupa pois pode significar que, com a elevação dos juros americanos (possibilidade próxima), há chance de fuga de capitais do Brasil e, mais, caso haja um enfraquecimento do dólar, talvez a competitividade obtida pelos produtos brasileiros no comércio internacional não gere capitais suficientes para compensar a maior dificuldade (custos mais elevados) de obtenção de recursos e capitais financeiros (além da concorrência representada pela China, Índia e Coréia do Sul), afetando investimentos produtivos e de infra-estrutura (PPP).

            Realidade 8 – Empobrecimento e Capacidade de Contratar: Se nas últimas décadas o desempenho econômico nacional mostrou-se ridículo, deprimente foi o PIB de 2003, que indicou o empobrecimento brasileiro, em números absolutos de 0,2%. O consumo das famílias declinou 3,3% e o IBGE comenta (29) que houve queda na arrecadação de impostos oriundos dos setores com maior incidência tributárias (1,7%), entre os quais o de vestuário, bebidas, produtos farmacêuticos, queda no ICMS (1,4%) e II (5,6%). Está claro que as famílias estão sem dinheiro para consumir e estão obrigadas a reprogramar suas cestas de consumo, alterando suas escolhas. As famílias, destinatárias naturais dos serviços e bens produzidos nos projetos de parceria estão sem dinheiro para comprar. O Estado, parceiro público, está sem dinheiro para bancar compromissos responsáveis de longo prazo e estará obrigado com os pagamentos previstos nos inc. I a V e do § 2º, do art. 5º do Projeto de Lei de PPP do governo federal:

            A contraprestação da administração pública nos contratos de parceria público-privada poderá ser feita por:

            I - pagamento em dinheiro;

            II - cessão de créditos não tributários;

            III - outorga de direitos em face da administração pública;

            IV - outorga de direitos sobre bens públicos; ou

            V - outros meios admitidos em lei.

            ...

            § 2º Os contratos previstos nesta Lei poderão prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao seu desempenho na execução do contrato, conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade previamente definidos.

            Há a possibilidade de se prever nos contratos de PPP

            a complementação de tarifas ou preços públicos pelo Estado (30). Isto é uma garantia à atratividade do negócio e o alívio de custos para os usuários, por meio de shadow tolls (aplicada em rodovias), onde o governo assume pagar uma parcela da receita do empreendedor, o que pode afrontar a LRF. De qualquer forma, é necessário ampliar o PIB, o que significa crescer e para crescer é necessário dispor de infra-estrutura (rodovias, portos, ferrovias etc), onde as PPP são um importante alternativa do governo, que necessita de recursos (PIB) para participar dos negócios.

            Realidade 9 – Garantia e Fraude: A garantia dada pelo Projeto de Lei de Parceria Federal de precedência do parceiro privado em relação às demais obrigações contratuais da Administração Pública (§ 3º do art. 5o), garantida, entre outras providências, pela transferência de bens e ativos da União (inc. II e III do art. 9o ), caso permaneça na lei a ser aprovada, causará um número significativo de ações judiciais, um vez que o Estado é inadimplente contumaz de créditos judiciais, sendo que a transferência de bens para privilegiar um potencial credor caracteriza fraude (31). Esta "garantia" é uma ameaça ao programa de PPP.

            Realidade 10 – Lisura nas Negociações: A liberdade contratual na esfera pública, ao longo do tempo, vem sofrendo importantes restrições. Os contratos têm se apresentado de modo tão rígido, tal e qual contratos de adesão. O interesse social sobrepõe-se à liberdade contratual, por razões de ordem pública. O dirigismo contratual estatal, se por um lado confere proteção ao trabalhador, ao inquilino e ao consumidor, por outro, restringe a autonomia da vontade, pela fixação de "princípios mínimos que os contratos não podem afastar" (WALD, 2004).

            A questão da compatibilização de contratos de PPP, que se caracterizam pela "affectio contractus", dos contratos de colaboração, onde os contratantes buscam uma relação equilibrada e eqüitativa, com a atenuação de obrigações quando houver modificações substanciais nas situações das partes (cláusula "rebus sic stantibus"), com a rigidez e os rigores da legislação vigente e com os princípios da Administração Pública é bastante intrigante.

            A flexibilidade que o Projeto de Lei de PPP Federal permite ao Poder Público na modelagem de cada negócio, como diz Mantega, "cada caso é um caso", abre a questão do grau de discricionariedade, transparência, igualdade, eqüidade e o controle da corrupção. Quanto maior o leque de alternativas de contratos (e assim recomenda a racionalidade administrativa moderna), maior é a dificuldade de fiscalização, pelas complexidades inerentes a contratos grandiosos, como os de PPP, mormente afeitos a grandes obras de infra-estrutura pública, como se pode comprovar nos inúmeros processos administrativos e judiciais em curso, que trazem como investigado ou réu, administradores públicos de todos os níveis de governos.

            O problema reside entre a montagem do projeto e sua captação pela Administração Pública, que permitirá a atração de toda classe de consultorias legítimas ou legitimadas ("de fachada"). A consultoria legítima acrescenta valor ao projeto, pois cumpre uma função necessária em sua viabilização. A consultoria ilegítima (legitimada ou "de fachada") encarece o projeto sem acrescer-lhe valor ou utilidade, e sim, ineficiências, apenas servindo para ganhos ilícitos de corruptores e corruptos na articulação de fraudes que oneram o erário público.

            O relator do Projeto de Lei da PPP, deputado federal Paulo Bernardo, do Partido dos Trabalhadores do Paraná, entende que direcionamentos de contratos de PPP poderiam ser evitados com a "fiscalização do governo, da sociedade, da imprensa e das empresas" (32) que tenham participado do certame, situação já encontrada hoje nos contratos licitados em toda as esferas públicas administrativas no país, onde abusos não faltam, bastando pesquisar os processos em tramitação nos Tribunais de Contas, municipais, estaduais e da União. No entanto, no mesmo sentido de posição do deputado, LUDOVICI (1992, p. 175) entende que mecanismos de alarme (denúncias), com efeitos punitivos, poderiam "paradoxalmente" resolver a corrupção em áreas críticas da Administração.

            A dificuldade, no Brasil, está de fato na punição clara e justa e tempestiva, que – ausente alguma dessas condições – alimenta o caldo de cultura das negociatas com a "coisa" pública e o gosto pelo risco que tanto atrai os corruptos. Até que grau a colaboração estabelecida entre a Administração e o empresário será revestida de lisura e redundará em ganhos sociais, pautados pela negociação transparente e flexível, orientada pelos ideais de fraternidade, justiça e espírito público, é um aspecto a ser acompanhado de perto pela sociedade.


Conclusão

            Esta monografia teve o intuito de exercitar o tema PPP, considerado como um modelo viabilizador do sonho da restauração e melhoria da infra-estrutura nacional, condição para alcançar os níveis de desenvolvimento econômico adequado para o país. Neste sentido, foram visitados o cenário de demandas sociais e de limitações do Estado para atendê-las, as raízes e motivações para a adoção da solução de atração de capitais via cooperação iniciativa privada - setor público, o sonho que a política PPP representa e as realidades que o afrontam.

            Aspectos importantes como a questão ético-ideológica da liberdade exigida pelo empreendimento capitalista e as iniciativas de cunho intervencionistas do governo federal (questão do marco regulatório), os problemas de definição de agendas públicas, os níveis de corrupção empresarial e governamental, as dissintonias da agenda pública, as incompatibilidades na convivência de modelos administrativos diversos, as garantias para empreendimentos de longo prazo e a situação de credores já constituídos, o empobrecimento e a inadimplência do Estado bancando estímulos de parcerias (efeito placebo), a insegurança da permanência de investimentos estrangeiros, as contradições dos valores sigilo de projetos tecnologicamente sofisticados (Non-Disclosure Agreements - NDA da iniciativa privada) e a obrigatória publicidade e igualdade de acesso que condicionam a Administração, a flexibilidade de contratos e os critérios de legalidade, transparência e prevalência do interesse público são algumas das realidades que não podem ser desconsideradas, e sim enfrentadas, caso haja sérios propósitos de conferir eficácia à estratégia da PPP no Brasil.

            Conclui este exercício monográfico - embora demandante de aprofundamentos sistematizados de diversos pontos aqui abordados ou não (para o que fica a sugestão de futuros trabalhos em nível de mestrado e doutorado) - que as perspectivas de sucesso global da política PPP, em curso no Brasil, são bastantes estreitas, o que, frente a premência de solução dos imensos problemas nacionais, configura-se num quadro futuro de frustrações. Há uma séria ausência de virtuosismo político adequado, de condições ético-culturais e de excelência administrativa, que contribuam para composições positivas generalizadas e que enfrentem os desafios exigidos pela produção econômica e social de bens e serviços públicos para atender carências sociais. Na palavra de LESSA (2003) o sonho tem que apresentar "bancabilidade" (não apenas disponibilidade de capitais, mas sua perenidade), o que parece não ser uma condição orgânica do ambiente da PPP no Brasil. Não obstante, não se deva considerar que todo projeto PPP estará fadado ao insucesso, mas depositar nesta política toda a esperança de redenção econômica da nação brasileira é sonhar demais, pois as realidades visitadas nesta monografia apontam para uma alta complexidade de arranjos e condicionantes, que apenas por um acaso ou por obra da sorte poderiam encetar o movimento de um ciclo virtuoso de crescimento econômico.

            Assim, outros modos de atração de "empreendimentos" para a realização de recuperação e desenvolvimento da infra-estrutura nacional deveriam ser estimulados em paralelo com os – eventuais e possíveis - projetos bem sucedidos via PPP. Não deveriam ser descartados quaisquer modos lícitos de atração de capitais e recursos para a infra-estrutura do Brasil. Onde possível, respeitando a responsabilidade fiscal, deveriam ser estimuladas pelos atuais governos as composições acionárias, pois associando, numa empresa ou numa estrutura multiempresarial, o Estado (orientado para os interesses públicos) e o capital privado (orientado para a gestão eficiente de recursos para garantia de retornos de investimentos e lucros), pois há interessantes casos de sucesso no setor petroquímico, onde de modo versátil e inteligente (pois acompanhando há décadas os movimentos de mudanças das economias mundiais e local) o Estado estruturou um setor de competitivo em escala global. A complexidade ambiental deste modelo é menor que num ambiente PPP. Assim, a composição de capitais públicos e privados, mesclando gestões com competências definidas, numa organização de direito privado, numa sociedade de economia mista, organizada em cluster (conglomerado) de empresas (holdings), Organizações Não-Governamentais – fundações e universidades, observada uma agenda pública democraticamente definida, poderia viabilizar o alcance dos propósitos de oferta de bens e serviços públicos de qualidade, sem o comprometimento das finanças públicas, com a atração de capitais privados, numa dinâmica cultural de negócios mais consentânea com a realidade política, administrativa e social brasileira.


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Notas

            1 Neste sentido, BOVO (1999, p. 65) comentando a situação crítica brasileira, nesse período, afirma que: "Os anos 80 assistem à plenitude da crise do setor público, cuja origem relaciona-se à incapacidade de mobilizar recursos para financiar o desenvolvimento. Foi nesse contexto de exacerbação dos conflitos políticos que a asfixia financeira imposta aos Estados e Municípios pela concentração e centralização dos recursos financeiros na esfera da União, deu início a um movimento que pretendia restaurar o regime democrático e a descentralização fiscal."

            2 Nota do autor: Consenso de Washington, termo assim cunhado por John Williamson, em 1990, quando levantou o rol de políticas semelhantes, comuns ou coincidentes, ou seja o "denominador comum" que as instituições baseadas em Washington, aconselharam para os países da América Latina em 1989. Acabou por transformar-se no sinônimo de "neoliberalismo" e de "globalização". As recomendações ou conselhos dessas instituições eram no sentido dos países buscarem: a disciplina fiscal; o redirecinamento dos gastos públicos para áreas que oferececem maior retorno econômico conjuntamente a uma potencial melhoria nas condições de distribuição de rendas, assim, gastar com saúde pública, educação básica e infra-estrutura; reformar o sistema tributário, para otimizá-lo, diminuindo alíquotas e ampliando a base; liberar a taxa de juros; estabelecer taxas de câmbio competitivas; liberar o comércio; liberar o influxo de investimentos externos diretos; privatizar empresas; eliminar barreiras alfandegárias; garantir o direito à propriedade.

            Por tais abordagens, o termo e as recomendações foram etiquetados como políticas neo-liberais, compatíveis com o movimento de globalização comercial em curso, de interesse americano, europeu e asiático. De fato, o conceito "Consenso de Washington" provou ser útil a defensores e detratores, sendo ampliado em sua extensão e profundidade, incorporando: a governança corporativa; práticas anti-corrupção; flexibilidade nas leis trabalhistas; acordos na Organização Mundial do Comércio – OMC; harmonização de regras e procedimentos financeiros; abertura prudente da conta-capital; política de câmbio definida; Banco Central independente, gerenciando metas de inflação; aparelhar a segurança social; estabelecer metas para a redução da pobreza. Disponível em: <http://www.cid.harvard.edu/cidtrade/issues/washington.html> Acesso em: 17 de janeiro de 2004

            3 No Brasil a experiência é antiga, como conta Carlos Lessa: "O imperador Pedro II implantou a maior parte das ferrovias brasileiras no século XIX, lançando mão de um dispositivo contratual que, na época, se chamava cláusula ouro, pelo qual o Tesouro assumiu o compromisso com o concessionário de cada ferrovia de lhe gerar uma rentabilidade anual de pelo menos 7% ao ano em ouro. O que alguns especialistas mostram que teve conseqüências muito curiosas, uma das quais é produzir uma série de ferrovias que não respeitavam o espaço euclidiano. Tendiam a se mover com a maior sinuosidade possível multiplicando estações, porque não eram apenas elementos formadores de patrimônio, mas também eram elementos que ampliavam a base a ter garantia firme de 7% de ouro." [Seminário Internacional Parceria Publico-Privada (PPP) na Prestação de Serviços de Infra-Estrutura MRE – BID – BNDES, 13 e 14 de novembro de 2003, Brasília, DF]

            4 The Government’s objective is to deliver world class public services. To achieve this, sustained increases in investment and matching reforms are needed to deliver efficient and responsive services, which meet public expectations throughout the country. Strong and dependable public services lay the foundations for a flexible and productive economy. They also promote opportunity and security for all, helping to tackle poverty and social exclusion and improving the quality of life. PFI: meeting the investment challenge, HM Treasury Public Enquiry Unit Report, julho de 2003.

            5 This investment programme is beginning to deliver extensive new and modernized infrastructure to public services. PFI investment has now delivered over 600 operational new public facilities, including 34 hospitals and over 200 new and refurbished schools. The decision to undertake PFI investment is taken on value for money grounds alone, and whether it is on or off balance sheet is a subsequent decision taken by independent auditors and is not relevant to the choice of procurement route. Almost 60 per cent of PFI projects by value are on balance sheet..(Ibid..)

            6 "Perspectivas dos Projetos PPP no Brasil", Sebastião Soares – Secretário de Planejamento Estratégico do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, in Seminário Internacional Parceria Publico-Privada (PPP) na Prestação de Serviços de Infra-Estrutura MRE – BID – BNDES, 13 e 14 de novembro de 2003, Brasília, DF

            7 FONTE: Alexandre Meira da Rosa, Assessor Econômico do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.

            8 FONTE: Dados de estudo do jornal Valor Econômico, publicados no artigo "Obras prioritárias de infra-estrutura exigirão R$ 116 bi", de 04 de fevereiro de 2004.

            9 Disponível em:

            < http://www.planejamento.gov.br/noticias/conteudo/noticias_2003/ mantega_apresenta_primeira_carteira_projetos_PPP.htm>

            10 Disponível em: < http://www.receita.fazenda.gov.br/Historico/Arrecadacao/Carga_Fiscal/1997/Receitas_Est_Mun.htm > Carga Fiscal 1997 - Receitas Tributárias dos Estados e Municípios. Acesso em: 12 de janeiro de 2004.

            11 Fonte citada na Nota 9

            12 "O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Maurício Corrêa, afirmou hoje que a proposta de reforma tributária que tramita no Senado vai aumentar a carga tributária do país: "Toda vez em que se fala em qualquer alteração no sistema tributário nacional é para aumentar tributo, para dar mais ônus ao empresário, portanto, ao contribuintes", afirmou Corrêa sem dizer como se daria esse aumento. O ministro disse ainda que acredita que o Senado fará modificações profundas para evitar que esse aumento seja exagerado. "Deve haver um meio termo capaz de atender as necessidades do Estado, sem fazer esse sacrifício exagerado", disse. Disponível em <http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI163429-EI1483,00.html> Acesso em: 17 de outubro de 2003." E mais,

            "Empresários vão lutar por redução de alíquota (Ivo Ribeiro e Francisco Góes): A Ação Empresarial, movimento que reúne seis confederações nacionais do setor privado, trabalha a todo vapor nos bastidores do Executivo e do Congresso para reverter o aumento da carga tributária representada pelas mudanças nas alíquotas do PIS e da Cofins (...) O coordenador-executivo da Ação Empresarial, Marco Polo de Mello Lopes, lembrou que em setembro deste ano o presidente Lula afirmou que "aumentar a carga tributária seria uma insanidade". Formam parte da Ação Empresarial a CNI, CNC, CACB (confederação das associações comerciais), CNT (dos transportes), CNA e CNF (das entidades financeiras), além de outras 20 entidades. Jornal Valor Econômico - 5 de novembro de 2003 - Ano 4 - Nº 881 - 1º Caderno"

            13 Fonte: BACEN - "Brasil: Panorama Econômico Recente", Afonso Bevilaqua, setembro de 2003.

            14 "Lula baixou MP na madrugada: O presidente Lula baixou às 23h de sexta-feira (quando se comemorava o Dia Internacional da Cerveja) uma medida provisória que é uma paulada nas empresas prestadoras de serviço. Com 69 artigos, a MP determina que a retenção do Imposto de Renda passará de 1,5% para 6,15% sobre a nota fiscal. E a alíquota do Cofins subiu 153% (pulou de 3% para 7,6%) para as prestadoras de serviço. MP de madrugada, nem a turma da Arena fez igual." Disponível em: Acesso em: 04 de novembro de 2003.

            15 Disponível em: Acesso de: 01 de fevereiro de 2004.

            16 Disponível em: < http://www.undp.org/pppue/index.htm> Acesso de: 05 de fevereiro de 2004.

            17 Fonte: United Nations Development Programme, Nota 16

            18 Em recente investida do governo para a composição de uma estrutura de apoio financeiro para os investimentos em PPP, o jornal Folha de São Paulo, na edição de 01 de fev. de 2004, p. B5, apresenta um quadro indicando as ligações políticas dos presidentes dos fundos de pensão Previ (Banco do Brasil), Petros (Petrobrás) e Funcef (Caixa Econômica Federal) com o governo Lula. A idéia do governo é envolver os fundos de pensão nos projetos PPP numa dimensão de R$ 4 milhões. Nota do autor.

            19 Nota do autor: O que no mercado significa repúdio a contratos e decisões judiciais, nome inspirado no atual governador do Paraná, Roberto Requião (PMDB), que, ao final, reduz-se a um risco político, com sérias conseqüências econômicas.

            20 "Por que um governo garantiria um projeto com um parceiro privado com a mesma ênfase que garante suas dívidas?" Esta questão remete à seriedade administrativa no cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e dos acordos internacionais.

            21 Banco Mundial aprova empréstimo de US$ 505 milhões ao Brasil. O Banco Mundial aprovou a concessão de um empréstimo de US$ 505 milhões ao Brasil. Os recursos estão ligados ao financiamento de projetos que impulsionem o crescimento do país e possam ser viabilizados, entre outras alternativas, por meio das Parcerias Público-Privadas (PPP).

            O empréstimo tem vencimento em 14 anos, com cinco de carência. [Valor Online - 19/02/2004 - 17:47:33]

            22 Disponível em:

            23 Disponível em:

            24 Disponível em:

            25 "Porque existe no agente público decisório a capacidade de superar a visão imediatista de mercado. Ele pode pensar a longo prazo, ele pode expressar a vontade de uma nação por ser algo maior, diferente, mais justa do que é no presente - ou seja, só além do mercado é que está o sonho. (...) Quais os projetos que vão ser financiados, é uma experiência que nós vamos ter que desenvolver. Porém eu diria que, no universo dos investimentos, dos projetos identificados como prioritários pela decisão de integrar o sonho ao planejamento, nós - empresários privados, protagonistas da sociedade civil, gestores do aparelho de Estado - saberemos identificar projetos que podem ser, "PPP-izáveis"." LESSA (2003)

            26 Interessante conhecer os problemas ao PPP encontrados nas experiências de outros países, como a Unison - o maior sindicato público do Reino Unido – que tem se oposto fortemente contra projetos de PPP.

            27 In Valor Econômico, 17/12/2003.

            28 Entrevista concedida ao jornal Folha de São Paulo, 01 fev. 2004, B7.

            29 Disponível em:

            30 Segundo Guido Mantega, "se for uma auto-estrada, o poder público vai complementar o pedágio inexistente naquele momento. Se for um projeto de saneamento numa comunidade que não tem como pagar uma tarifa cheia, o poder público vai complementar.. Cada caso é um caso." Gazeta Mercantil - Nacional - 20/11/2003

            31 Vide repúdio público da Ordem dos Advogados do Brasil – São Paulo, em 10/02/2004, que alerta para "os riscos de parceria com patrão que se recusa a pagar seus empregados e outros credores, nem mesmo diante de ordem judicial."

            32 Citado no jornal Folha de São Paulo, de 01 fev. 2004, B4.


NOTA DE ATUALIZAÇÃO (do Editor)

          O projeto de lei das Parcerias Público-Privadas tramitou no Senado Federal sob o nome de Projeto de Lei da Câmara nº 10/2004, tendo sido aprovado o substitutivo do Senado em 22/12/2004.

          Na mesma data, os destaques do Senado foram aprovados em votação simbólica pela Câmara, na qual tramitou sob o nome de Projeto de Lei nº 2.546/2003, devendo em seguida ser encaminhado à sanção presidencial.


Autor


Informações sobre o texto

Monografia apresentada à Faculdade de Ciências e Letras do Campus de Araraquara da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, como parte dos requisitos para conclusão do Curso de Especialização, em nível de pós-graduação lato sensu, em Gestão Pública e Gerência de Cidades. Araraquara, 2004

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Mario Cesar da. Parcerias público-privadas: as realidades de um sonho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 534, 23 dez. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6087. Acesso em: 26 abr. 2024.