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Contrarrazões à incidente de uniformização

Devolução valores recebidos à título de auxílio-doença

Contrarrazões à incidente de uniformização. Devolução valores recebidos à título de auxílio-doença

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Trata-se de minuta de contrarrazões à incidente de uniformização em que se requer a devolução de valores recebidos em decorrência de decisão judicial.

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL COORDENADOR DA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE GOIÁS.

Processo n.: 

Recorrente: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Recorrido: JOSÉ 

JOSE, já qualificado, nos autos da Ação para Concessão de Auxílio-Doença que move em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, processo em epígrafe, por seu advogado infra-assinado, vem à presença de Vossa Excelência apresentar CONTRARRAZÕES ao INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO, requerendo que sejam recebidas e encaminhadas à Egrégia Turma Nacional de Uniformização, nos termos do art. 14 da Lei n. 10.259/01.

Termos em que,

Pede deferimento.

Anápolis/GO, 21 de setembro de 2017.          

Wendell Ribeiro Quintino

OAB/GO n. 32.157

CONTRARRAZÕES ao INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO

Processo n.: 

Recorrente: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Recorrido: JOSE

Egrégia Turma Nacional de Uniformização,

Ínclitos Julgadores.

O Recorrido ajuizou ação para concessão de auxílio-doença com pedido de antecipação dos efeitos da tutela em face do Recorrente, sendo julgado procedente o pedido, determinando-se sua implantação no prazo de 30 dias.

Apresentado o recurso inominado pela Autarquia Previdenciária, a este foi dado provimento para julgar improcedente o pedido inicial, revogando a tutela concedida e dispensando a parte autora da devolução dos valores recebidos a esse título.

A Autarquia Previdenciária apresentou pedido de uniformização, haja vista divergência jurisprudencial entre a Turma Recursal do Estado de Goiás e o Superior Tribunal de Justiça, acerca da devolução dos valores recebidos a título de antecipação dos efeitos da tutela.


I – FUNDAMENTOS JURÍDICOS

O Recorrente apresentou pedido de uniformização que tem por objeto tratar da questão acerca da necessidade de devolução dos valores concedidos a título de antecipação dos efeitos da tutela em caso de revogação ulterior, diante da divergência jurisprudencial sobre o tema, entre a Turma Recursal do Estado de Goiás e o Superior Tribunal de Justiça.

O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento de que é devido o ressarcimento dos valores recebidos por força de antecipação de tutela que fora posteriormente revogada.

Apesar do entendimento esposado pela Primeira Seção do STJ, no julgamento do Recurso Especial n. 1.401.560-MT, sob o regime de recurso repetitivo, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica no sentido de que se apresenta incabível a devolução das importâncias recebidas pela parte em virtude de decisão judicial, considerando não só o caráter alimentar das verbas previdenciárias, mas também a hipossuficiência do segurado e o fato de tê-las recebido de boa-fé (Cf. ARE 734242 AgR, Rel. Ministro Roberto Barroso, STF - Primeira Turma, DJe-175 de 08/09/2015; ARE 658950 AgR, Rel. Ministro Luiz Fux, STF - Primeira Turma, DJe-181 de 14/09/2012), dentre outros julgados, verbis:

EMENTA: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. BENEFÍCIOPREVIDENCIÁRIO. NATUREZA ALIMENTAR.RECEBIMENTO DE BOA-FÉ EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. DEVOLUÇÃO. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes. 2. Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº 8.213/1991. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 734242 AgR / DF - DISTRITO FEDERAL. Relator(a):  Min. ROBERTO BARROSO. DJe-175  DIVULG 04-09-2015  PUBLIC 08-09-2015).(g.n.)

Com efeito, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região adota o mesmo entendimento firmado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, entendendo não ser possível a repetibilidade, devido a sua natureza alimentar:

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TRABALHADOR URBANO. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES PAGOS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. VERBA ALIMENTAR. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. 1. Os requisitos para a concessão do auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez estão dispostos no art. 42, caput e § 2º, da Lei 8.213/91, quais sejam: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento do período de carência (12 contribuições), quando exigida; 3) incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou total e permanente (aposentadoria por invalidez) representando esta última aquela incapacidade insuscetível de recuperação ou de reabilitação para o exercício de atividade que garanta a subsistência (incapacidade total e permanente para o trabalho) e 4) não ser a doença ou lesão preexistente à filiação do segurado ao Regime Geral da Previdência Social. 2. Nos termos do art. 59 da Lei n. 8.213, de 1991, não é devido benefício de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez ao segurado cuja doença que motiva o pedido seja preexistente à sua filiação ao Regime Geral da Previdência Social ou à recuperação de sua qualidade de segurado, exceto se a incapacidade decorrer do agravamento ou de progressão da doença ou lesão. Precedentes deste Tribunal. 3. (...). 5. O egrégio STJ, em regime de recurso repetitivo, decidiu, em 12/02/2014, que "a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos." (REsp 1401560/MT, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Rel. p/ Acórdão Ministro Ari Pargendler, Primeira Seção, julgado em 12/02/2014, DJe 13/10/2015). 6. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal adotou orientação diversa no ARE 734242, publicado em 08/09/2015, segundo o qual o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes. 7. Consoante o entendimento sufragado pelo Tribunal Pátrio, a revogação da decisão que, em antecipação da tutela, concedeu benefício previdenciário, não conduz ao entendimento de devolução das parcelas recebidas pela parte autora. 8. Apelações desprovidas. (TRF1 APELAÇÃO 00146134920164019199, Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, SEGUNDA TURMA, e-DJF1 DATA:01/07/2016). (g.n.)

Ainda, em conformidade com o entendimento acima exposto, afora outros tribunais, tem-se o do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no mesmo sentido, in verbis:

 EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL.  BOA-FÉ. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99.   (TRF4, APELREEX 0005342-91.2015.404.9999, Quinta Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 02/06/2015). (g.n.)

Ademais, o caráter eminentemente alimentar dos benefícios previdenciários faz com que tais benefícios, quando recebidos de boa-fé, não sejam passíveis de devolução, devendo ser relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei n. 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/99 à luz do texto constitucional.

A devolução dos valores cobrados por força de revogação da antecipação dos efeitos da tutela, fere o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), tendo em vista a natureza do benefício concedido, uma vez que este substitui a renda do trabalhador enquanto fica impossibilitado de exercer suas atividades laborais, sento totalmente consumido pelo segurado. Como poderia haver eventual restituição?

Bem assim, tal posicionamento acarreta grave insegurança jurídica podendo levar a descrédito as decisões judiciais, porquanto importariam em verdadeira armadilha para o jurisdicionado, que é autorizado a receber um proveito econômico e, logo após, obrigado a devolvê-lo.

De toda sorte, não se pode afastar as particularidades dos autos, que trata de pessoa em estado de miserabilidade econômica, conforme declaração de rendimentos e encargos sociais constante nos autos (fl. 11), que afastaria qualquer possibilidade de devolução de valores, sobretudo pela inexistência de condições financeiras.

Assim, em virtude do princípio da boa-fé e do caráter alimentar das parcelas recebidas a título de antecipação da tutela, não é razoável exigir sua devolução, de modo que a revogação dessa medida há de surtir efeitos ex tunc, haja vista que não há nos autos indícios de má-fé da parte autora.

Com efeito, diante do aparente conflito de posicionamentos entre o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal acerca deste tema, há de prevalecer a interpretação da Corte Suprema, porquanto em consonância com a segurança jurídica, respeitado o princípio da dignidade da pessoa humana.


II – DOS PEDIDOS

Diante do exposto requer o processamento e a inadmissão  do Pedido de Uniformização, ou no mérito, que seja uniformizada a jurisprudência consoante o entendimento esposado pelo Supremo Tribunal Federal e pelo acórdão atacado, diante da não sujeição à repetição de indébito do benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, em razão de seu caráter alimentar.

Termos em que,

Pede deferimento.

Anápolis/GO, 21 de setembro de 2017.

Wendell Ribeiro Quintino

OAB/GO 32.157


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