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Responsabilidade civil do ente público pela conservação das vias públicas

Responsabilidade civil do ente público pela conservação das vias públicas

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Em se tratando de responsabilidade do Estado, convém trazer à baila a celeuma doutrinária no que tange a aplicação ou não do art. 37 § 6 da CF/88 nas hipóteses de omissão estatal, isto é, quanto à aplicabilidade da teoria objetiva da responsabilidade.

1. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E RESPONSABILIDADE OBJETIVA

Primeiramente, faz-se cogente apontar o comportamento que revela na obrigação de indenizar. Nessa esfera, uma pessoa é responsável quando apta a ser sancionada, independentemente de ter perpetrado pessoalmente um ato jurídico. De tal modo, a responsabilidade será direta quando dizer respeito ao próprio ocasionador do dano, ou indireta, quando se alude a terceiro, que, de uma maneira ou de outra, está conectado ao ofensor. Caso não seja identificado o ocasionador do dano, esse se absterá de adimplir a obrigação e a vítima suportará o prejuízo.

Há o entendimento predominante que no direito pátrio a responsabilidade permanece ligada aos atos ilícitos extracontratuais advindos de comportamentos comissivos. Já as omissões permaneceriam sujeitas à análise da culpa sob a forma objetivada na teoria do acidente administrativo ou culpa administrativa.

1. 1.  RESPONSABILIDADE SUBJETIVA

O primeiro pressuposto a ser analisado é a conduta culposa. Vide art. 186 do Código Civil, “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligencia ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

A conduta se revela através de todo comportamento humano voluntário exteriorizado por meio de uma ação ou omissão que produza consequências jurídicas. Referida ação ou omissão é o objetivo da conduta, possuindo como aspecto subjetivo a vontade, como nos reitera Sergio Cavalieri Filho (2008, p.24).

Todos devem abster-se, fora do domínio contratual, de praticar atos que possam lesar o seu semelhante, sendo que a violação do dever geral de abstenção se observa de um fazer. Contudo, como fora dito acima, a conduta omissiva também pode resultar numa violação de direito ou ainda em lesão a um terceiro. A omissão surge a partir da abstenção de uma conduta que devia ter sido acionada.

Também chamada de responsabilidade subjetiva, a teoria da culpa é a regra geral de nossa legislação pátria, onde se faz necessária existência da culpa para gerar o dever de indenizar. Com base no Direito Romano, precursor do nosso Direito, e através do Direito Francês, que recepcionou a responsabilidade civil fundada na culpa, o Brasil adotou a teoria geral da responsabilidade civil subjetiva.

A ideia de responsabilidade civil está relacionada à noção de não prejudicar outro. A responsabilidade pode ser definida como a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar o dano causado a outrem em razão de sua ação ou omissão. Nas palavras de Rui Stoco:

“A noção da responsabilidade pode ser haurida da própria origem da palavra, que vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém pelos seus atos danosos. Essa imposição estabelecida pelo meio social regrado, através dos integrantes da sociedade humana, de impor a todos o dever de responder por seus atos, traduz a própria noção de justiça existente no grupo social estratificado. Revela-se, pois, como algo inarredável da natureza humana” (STOCO, 2007, p.114).

Segundo Silvio Rodrigues “A responsabilidade civil é a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam” (RODRIGUES, 2003, p. 6). O termo responsabilidade Civil, conforme a definição de De Plácido e Silva é:

“Dever jurídico, em que se coloca a pessoa, seja em virtude de contrato, seja em face de fato ou omissão, que lhe seja imputado, para satisfazer a prestação convencionada ou para suportar as sanções legais, que lhe são impostas. Onde quer, portanto, que haja obrigação de fazer, dar ou não fazer alguma coisa, de ressarcir danos, de suportar sanções legais ou penalidades, há a responsabilidade, em virtude da qual se exige a satisfação ou o cumprimento da obrigação ou da sanção” (SILVA, 2010, p. 642).

No direito atual, a tendência é de não deixar a vítima de atos ilícitos sem ressarcimento, de forma a restaurar seu equilíbrio moral e patrimonial. Conforme o entendimento de Carlos Alberto Bittar:

“O lesionamento a elementos integrantes da esfera jurídica alheia acarreta ao agente a necessidade de reparação dos danos provocados. É a responsabilidade civil, ou obrigação de indenizar, que compele o causador a arcar com as consequências advindas da ação violadora, ressarcindo os prejuízos de ordem moral ou patrimonial, decorrente de fato ilícito próprio, ou de outrem a ele relacionado” (BITTAR, 1994, p. 561).

Em seu sentido etimológico e também no sentido jurídico, a responsabilidade civil está atrelada a ideia de contraprestação, encargo e obrigação. Entretanto é importante distinguir a obrigação da responsabilidade. A obrigação é sempre um dever jurídico originário; responsabilidade é um dever jurídico sucessivo consequente à violação do primeiro (CAVALIERI FILHO, 2008, p. 3).

1.1.1. DO DEVER DE AGIR

Todavia, há de se observar a responsabilidade de quem tem o dever jurídico de agir em determinada situação e não faz. Tal dever de agir “pode advir de lei, de negócio jurídico ou de conduta anterior do próprio omitente, criando o risco da ocorrência do resultado, devendo, por isso, agir para impedi-lo”, conforme Sergio Cavalieri Filho (2008, p.24). Desta forma, apenas aquele individuo que tinha como obrigação agir, e não o fez, é quem pode e deve ser responsabilizado pelas consequências de sua conduta omissiva.

1.1.2. IMPUTABILIDADE

Nesta esteira, ainda devemos analisar a faceta da imputabilidade. Só comete ato ilícito quem em pleno discernimento do caráter antijurídico de sua conduta. Apenas pessoas capazes podem exercer atos ilícitos, excluindo-se os absolutamente e relativamente incapazes. Uma vez que a responsabilidade subjetiva decorre de uma conduta, tal conduta deve ser culpável, dependendo do discernimento do agente.

Sergio Cavalieri Filho argumenta que “a imputabilidade é pressuposto não só da culpa em sentido lato, mas também da própria responsabilidade”.  De tal maneira, não se pode imputar um ato danoso a alguém que, no momento em que pratica a conduta, não tenha capacidade de entender a reprovabilidade de sua conduta danosa.

Uma vez que o Estado não se trata de pessoa física, não se pode eximir de sua responsabilidade por incapacidade civil.

A imputabilidade do agente define-se também como o conjunto de condições pessoais que concede ao agente a capacidade de responder pelas consequências de sua conduta contrária à norma jurídica. A imputabilidade está ligada à responsabilidade, a capacidade de entender que o fato é ilícito, e de agir em conformidade com esse entendimento. A nossa legislação não define o que imputabilidade, apenas enumera os casos que a excluem, os considerados inimputáveis. Desta forma, estes são considerados incapazes, não sendo responsáveis pelos atos cometidos. Porém, de conformidade com a lei, pelos atos dos incapazes, responde aquele que detém sua guarda, sendo exceção o contido no art. 928 e seu parágrafo único do Código Civil:

“Art. 928. O incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes. Parágrafo único. A indenização prevista neste artigo, que deverá ser equitativa, não terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem” (Código Civil de 1973).

1.1.3. DA CULPA

Como terceiro ponto de estudo, há que se ressaltar a culpa, visto que esta é o principal diferenciador entre as responsabilidades subjetiva e objetiva, uma vez que aquela exige uma conduta culpável e esta prescinde da culpa, bastando apenas a existência de uma conduta do agente. Não podemos ignorar o fato de que o dano e o nexo causal devem estar presentes em ambas as formas de responsabilidade.

Nesta esteira, sob excelentíssimas palavras de José de Aguiar Dias (1979, p.136), “a culpa é a falta de diligência na observância da norma de conduta, isto é, o desprezo, por parte do agente, do esforço necessário para observá-la, com resultado não objetivado, mas previsível, desde que o agente se detivesse na consideração das consequências eventuais de sua atitude”.

Sendo a conduta culposa imputável, a dolosa não pode se abster de tal característica, visto que em ambas há conduta voluntária do agente. Por hora, analisamos então que o termo utilizado pela doutrina e pelo ordenamento jurídico brasileiro é a culpa lato senso, sendo um conceito amplo de forma que o conceito de dolo se encontra abrangido naquele.

Cabe à vítima provar o dano experimentado, e que este dano partiu de uma ação ou omissão culposa do agente. Quanto ao agente, poderá se eximir do dever de indenizar, se provar a inexistência de um dos pressupostos, ou através das excludentes. Se provar que foi prudente, diligente e observou as leis vigentes, inexistirá o elemento culpa. Se o prejuízo suportado pela vítima não se relaciona com seu ato, inexistirá o elemento nexo causal. E se não ocorreu nenhum prejuízo para a vítima, quer patrimonial quer moral, inexistirá o elemento dano.

É preciso provar a conduta culposa (culpa) do agente para que haja o dever de indenizar, que se origina do ato ilícito. A culpa aqui referida é a voluntariedade de conduta do agente.

1. 2.  RESPONSABILIDADE OBJETIVA

Quando o Estado desobedecer o dever objetivo de adotar as providências imprescindíveis e apropriadas a evitar danos as pessoas e ao patrimônio e, praticando suas competências, der ensejos à ocorrências do dano, estarão presentes os dados necessários a formulação de um juízo de reprovabilidade quanto o seu comportamento. Não é necessário averiguar a existência de uma vontade psíquica na acepção da ação ou omissão causadoras do dano.

Para maior compreensão do instituto da responsabilidade objetiva do Estado, é imprescindível considerar a relação jurídica entre Estado e administrado, que, no caso, é o cidadão, sob a ótica deste último. Diante do aparato que tem o Estado para organizar a vida em sociedade e administrar os serviços que deve proporcionar ao administrado, este se depara em flagrante hipossuficiência, não tendo condições, em um estado de igualdade formal, de convergir juridicamente com o Estado.

Deste modo, de acordo com o princípio da isonomia, que em uma leitura modernizada propõe que se trate de forma igual os iguais e desigual os desiguais na medida de sua desigualdade, o instituto em tela vêm para contrabalançar a relação entre Estado e administrado, tendo em vista que afasta-se a precisão de prova da culpa, esta a maior dificuldade deparada pelo cidadão comum em determinada relação jurídica.

Vale destacar que, assim como na responsabilidade subjetiva, deparamos na responsabilidade objetiva as consequentes conjeturas: conduta ilícita, dano e nexo causal. Desta maneira, o basilar diferencial em meio às duas naturezas de responsabilidade é a culpa, afastada na responsabilidade objetiva. A ausência de culpa como conjetura da responsabilidade objetiva não articula que ela não possa estar presente, mas que ela não tem relevância para a averiguação do dever de indenizar. Assim, existindo uma conduta ilícita e um dano causado, o fator de averiguação do dever indenizatório, na responsabilidade objetiva, é o nexo causal.

De acordo com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1998, foi alargado o alcance da responsabilidade do Estado em comparação às Constituições anteriores, sendo posto que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa atribuição, acarretarem a terceiros, afiançado o direito de regresso contra o acusado nos casos de dolo ou culpa.

A responsabilidade objetiva do Estado constitui aclamar uma presunção iuris et de iure de culpa, ou seja, uma vez que averiguada a existência de um dano e nexo de causalidade entre este e o funcionamento da Administração, o Estado não pode comprovar a sua ausência de culpabilidade.

Destarte, ficam aplicadas duas espécies diferenciadas de responsabilidade, a responsabilidade objetiva, que não há necessidade de investigação de culpa do Estado, e, ainda, a responsabilidade subjetiva, com necessidade de verificação de culpa do agente estatal perante o Estado.


2. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

Conforme supramencionado, uma vez constituído algum dano causado à terceiro, em virtude de atividade realizada, ou omitida, pelo Estado, configura-se a responsabilidade civil do Estado, de tal sorte que esta acarreta o dever estatal de ressarcir os prejuízos surgidos, sem que se faça necessária a configuração de dolo ou culpa na conduta.

A responsabilidade civil do Estado motivado por conduta ilícita tem a seguinte fundamentação, nas palavras de Weida Zancaner Brunini:

Subsistem, porém, entre nós os danos provenientes de ato lícito, um que, por seu grau, por seu porte, implica indenização ou ressarcimento, e usamos as duas expressões porque, entre nós, elas são e devem ser sinônimas, essa espécie de dano anormal e especial que, por onerar um particular de modo abusivo, merece ser repartido, o que só se pode fazer mediante indenização efetuada pelo Estado. Dessa forma, o efeito é o mesmo, pois se lícito o ato, mas anormal e especial o dano, exigível se torna o ressarcimento, visto que o dano anormal e especial configura por si só uma injustiça, e a forma de reparação não há por que ser diversa daquela existente para a reparação dos danos provenientes de atos ilícitos.

Embora se tratar de responsabilidade civil, esta matéria não é regulada por normas de direito privado ou Código Civil, doutro modo, há normas e princípios específicos que a regulamenta, assim como o direito administrativo. Frente ao fato da responsabilidade estatal possuir normas e fundamentos próprios, Celso Antônio Bandeira de Mello argumenta que:

Seja porque os deveres públicos do Estado o colocam permanentemente na posição de obrigado a prestações multifárias das quais não se pode furtar, pena de ofende o Direito ou omitir-se em sua missão própria, seja porque dispõe do uso normal de força, seja porque seu contrato onímodo e constante com os administrados lhe propicia acarretar prejuízos em escala macroscópica, o certo é que a responsabilidade estatal por danos há de possuir fisionomia própria, que reflita a singularidade de sua posição jurídica. Sem isto, o acobertamento dos particulares contra os riscos da ação pública seria irrisório e por inteiro insuficiente para resguardo de seus interesses e bens jurídicos.

A responsabilidade do estado é constitucional, uma vez que prevista na Constituição Federal, e o poder público não pode se abster de tal responsabilidade, ignorando seu dever de reparar danos causados por suas condutas tortuosas.

Sua finalidade principal é o restabelecimento do comedimento transgredido pelo dano. Por esse motivo, há em nosso ordenamento jurídico a responsabilidade civil não só abarcada pelo conceito do ato ilícito, mas também tem a indenização de danos em que não se elucubra da ilicitude da ação do agente ou até do episódio de ato ilícito, o que se afiança pela Teoria do Risco, haja vista a imagem de reparação ser mais dilatada do que puramente o ato ilícito.

O princípio que escora a responsabilidade civil atual é o da restitutio in integrum, ou seja, da reposição do prejudicado ao status quo ante. Desta maneira, a responsabilidade civil possui dupla colocação na esfera jurídica do prejudicado, quais são: mantenedora da segurança jurídica em analogia ao prejudicado e sanção civil de natureza compensatória.

2.1. RESPONSABILIDADE ESTATAL POR CONDUTA OMISSIVA

O Estado tem a capacidade de trazer danos aos seus administrados tanto por uma conduta comissiva quanto por uma conduta omissiva. Para ser apurada a sua responsabilidade por conduta omissiva é preciso averiguar qual dos fatos foi categórico para gerar o evento danoso, ou seja, qual fato provocou decididamente o dano e quem estava compelido a evitá-lo.

Quando o Estado enseja dano por meio de uma conduta comissiva é incontestável que este responda objetivamente, segundo a teoria do risco administrativo. Estando cogente apenas a apresentação dos consequentes elementos da responsabilidade civil: ação do Estado, dano e o nexo causal entre ambos, conseguindo o nexo causal ser quebrado caso aconteça alguma das excludentes de responsabilidade do Estado, que são: caso fortuito, força maior e culpa exclusiva da vítima.

Contudo, quando o dano gerado pelo Estado é por meio de uma omissão, existe uma intensa controvérsia doutrinária e jurisprudencial, porquanto, nem a Constituição Federal de 1988, nem o Código Civil de 2002, cometeram expressamente a referência de qual tipo de responsabilidade seria abraçada, se objetiva ou subjetiva.

Na Constituição Federal, em seu artigo 37, § 6º, assegura a responsabilidade objetiva do Estado nas hipóteses em que seus agentes, revestidos de todo o poder dado por este, causarem danos a terceiros. Todavia, como supracitado, tal dispositivo não deixou evidente se tal responsabilidade se aplica também em casos de conduta omissiva, o que gera uma discussão evidente e extremamente oportuna, uma vez que por vezes a omissão estatal gera diversos danos a terceiros.

As teorias que surgiram em torno de tal aplicação sugerem a possibilidade de dolo ou culpa do Estado nos casos de omissão. Teoria do risco, no caso de omissões do ente público, e teoria da culpa, quando há demonstração de dolo ou culpa por parte do Estado nos casos de omissão.

Observa-se que a jurisprudência majoritária faz uso da teoria da responsabilidade subjetiva do Estado em caso de omissão, não sendo designado ao terceiro, lesado, a responsabilidade de identificar a negligência, imprudência ou a imperícia praticada pelo Estado, bastando haver a configuração da faute du service, que é a substituição da culpa pessoal do indivíduo agente, na falta do serviço prestado, pela culpa do próprio estado, pela culpa administrativa, na maioria das vezes anônima.

Entre os doutrinadores, uma corrente tem como base a superioridade constitucional e a interpretação literal, independentemente do ato lesivo causado ter transcorrido de uma ação ou omissão do Estado, a responsabilidade será sempre objetiva.

Por outro lado, uma segunda corrente apreende que em se tratando de uma omissão estatal a responsabilidade será sempre subjetiva. Existindo pequenas modificações de pensamento no ensejo pelo qual será subjetiva. Vale ressaltar, ainda, que esta corrente é a abraçada pelo Superior Tribunal de Justiça e a acobertada pelo poder público. Neste ângulo, há também a visão de Diogenes Gasparini, que diz que o texto que rege esse assunto na Constituição estabelece para a configuração da responsabilidade objetiva do Estado uma ação do agente público, pois há o emprego do verbo “causar”. Isso denota que se tem de haver por conjetura uma performance do agente público e que não existirá responsabilidade objetiva por atos omissivos.

Ainda há uma terceira corrente sobre a matéria, ponderada intermediária, que assevera que necessitará ser estudado o acontecimento real para que se averigue a natureza da responsabilidade civil do Estado.  Assim, o ato ilícito não se expõe sempre com o componente subjetivo, existindo até mesmo o ato ilícito em definição ampla, que é o simples confronto entre a conduta e o dever jurídico conferido pela norma jurídica, sem alusão ao elemento subjetivo.

Conforme a última corrente trazida, ainda se divide a responsabilidade civil do Estado de acordo com o tipo da omissão. Se a omissão do Estado for específica, onde o Estado tinha uma obrigação de atuar e não atuou, a responsabilidade será objetiva. Contudo, se a omissão do Estado for genérica, não existe como se ordenar do Estado um desempenho específico, prontamente, a sua responsabilidade será subjetiva. A omissão específica do Estado será perfilhada quando a inércia da Administração Pública for a motivo direto e contíguo do não embaraço do evento nocivo.

2.1.1. O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E A CONDUTA OMISSIVA

O princípio da legalidade exige que a administração pública apenas faça ou deixe de fazer algo, desde que previsto em lei. Acontece, entretanto, que em sua ampla maioria os atos administrativos são atos vinculados. Mesmo nos atos discricionários ainda sobrecarrega tal princípio, pois a margem de liberdade de deliberação que a norma permite ao agente tem, sempre, um contorno, exigido pela própria norma.

Na responsabilidade do Estado por conduta omissiva, o agente apresenta a obrigação de atuar, posto em lei, entretanto, contravindo à lei, não atua. Por não ter atuado, originou um dano ao particular. Assim sendo, versa sobre uma conduta ilícita, adversa à lei, imediatamente, ferindo-se o princípio da legalidade.

Destarte, o interesse social tem por objetivo a conservação da ordem pública na acepção de viabilizar a conformidade social, necessário advertir a seriedade de uma conduta ilícita e omissiva. O ato ilícito corresponde ao que a sociedade rejeita como conduta, ou seja, o que não é permitido no grupo social. É o mesmo que estar contravindo com os valores deste grupo. Da mesma maneira, o risco social que proporciona a conduta omissiva é de seriedade muito mais elevada.


3. DEVER ESTATAL DE RESSARCIR

Primeiramente, deve-se situar a culpa como causa do erro estatal, para que se fundamente a causa de reparação. Referida responsabilidade, no dizer de uns, plasma-se no artigo 37, § 6º da CF, que subjetivamente já era contida no artigo 159 do extinto Código Civil Brasileiro, explanando que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a repara o dano”. No caso do Estado a sua responsabilidade é objetiva em face de a justiça ser considerado um serviço público.

3.1. AS OBRAS REALIZADAS EM VIAS PÚBLICAS

A Administração precisa tomar todas as cautelas indispensáveis para que não sejam gerados prejuízos aos particulares quando realizar obras em vias públicas. Determinadas obras são mais comuns e, por causa do impacto gerado por sua realização, podem criar danos aos particulares se feitas de modo inadequado.

Temos como exemplo as obras que alteram o nível da rua, que, em sua maior parte, são de responsabilidade do município no qual se situa o local em questão, tendo o ele o dever de produzi-las visando o bem comum. Inicialmente, sendo de simples averiguação, existe o dever estatal de indenizar ao particular os prejuízos gerados aos prédios perto à obra e que, existentes antes dela, se encontrem feitos conforme licenciamento e regular verificação da prefeitura.

Assim, não existem apenas os danos que podem ser gerados às estruturas dos prédios, pois, além disso, existem vários problemas que podem ser gerados pela modificação de nível da via pública. Depois de modificado o nível da via, é preciso adequar os prédios que já existiam a este novo nível, devendo a municipalidade responder. Ainda responde o município se, com isso, gerar obstáculo a uma garagem.

Outro fator verificado de ressarcimento ao particular é o dano gerado ao passeio das residências feito com as adequações necessárias ao seu tempo. Tal danificação gera ao poder pública a obrigação de construir novamente o que destruiu. É necessário lembrar que, ainda que não se constate a vigência de legislação própria sobre o assunto no município, a obrigação existe, por aplicação dos princípios gerais de direito.

Quando o fato é de viadutos, elevados e rampas de acesso, existe maior prevenção da jurisprudência com o enquadramento do dano excepcional e injusto colocado como resultado da obra pública realizada ou em andamento. É visível que a realização de viadutos gera prejuízos aos imóveis confrontantes, fazendo com que em diversos momentos resulte na total falta de utilidade do imóvel. Em situações como esta, a prefeitura tem o compromisso de indenizar por perda total do uso da propriedade.

Todavia, não será tudo que devera ser indenizado. Há de se fazer uma pesquisa do caso concreto, com uma análise sobre os danos, por não se tratar do dano enfrentado pelo particular juntamente com o beneficio auferido pela coletividade.

Não nos abstendo também do principio da solidariedade, que e de suma importância quando falamos sobre responsabilidade civil do Estado sobre obras publicas. Deve se ter muita atenção ao se definir dano normal e tolerável no que esta em torno das obras publica. Muitas vezes ocorre o desvio de transito para outro local devido às restruturações instauradas pelo Estado, o que coloca em prejuízo outro setor principalmente os de cunho comercial, com ate mesmo o declínio de vendas. Entende-se que a partir do momento que ocorra prejuízo a civis, motivados por um desvio prolongado no caminho durante o período de obras, a pessoa diretamente afetada tem sim o direito de exigir reparação de danos, consequente do prejuízo que sofreu no período que as obras ocorriam.

3.2. RESPONSABILIDADE REPARÁTORIA FRENTE CONDUTA OMISSIVA

A controvérsia existente frente a este tema está calcada na interpretação do artigo 35, § 6º da Constituição Federal. A expressão “causarem a terceiros” diverge o entendimento de vários doutrinadores, uns entendendo que “causar” remete a uma ação positiva, não podendo relacionar tal expressão a um ato omissivo. Hely Lopes Meirelles, explanando sobre tal assunto, posicionou-se da seguinte forma:

Nessa substituição da responsabilidade individual do servidor pela responsabilidade genérica do Poder Público, cobrindo o risco de sua ação omissão, é que assenta a teoria da responsabilidade objetiva da Administração, vale dizer, da responsabilidade sem culpa, pela só ocorrência da falta anônima do serviço, porque esta falta está precisamente na área dos riscos assumidos pela Administração para consecução de seus fins.

Sob a ótica do autor, portanto, a teoria da responsabilidade objetiva é adotada tanto para as ações, quanto para os omissões do Poder Público.

Em contrapartida, Oswaldo Aranha Bandeira afirma que responsabilidade fundada na teoria do risco sempre implica em uma ação comissiva do Estado, jamais numa omissão, visto que esta só ocorrerá na presunção de culpa anônima da administração. O mesmo explana assim em sua obra:

Deveras, caso o Poder Público não estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razão para impor-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as consequências da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo responsabilidade por ilícito, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então deliberando propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidades de responsabilidade subjetiva.

Vale salientar que a ideia de responsabilidade subjetiva para Celso Antônio Bandeira de Mello se restringe aos casos de omissão. Não abrando casos em que o autor denomina de danos dependentes de situação produzida pelo Estado diretamente propiciatória, como o assassinato de um preso por outro. Conforme o entendimento do autor, em casos dessa conjectura a responsabilidade é objetiva.

Nota-se, portanto, que a jurisprudência pátria majoritária entende ser subjetiva a responsabilidade do Estado por omissão, ainda que não seja unânime. Outrossim, os entendimentos de renomados autores se distinguem apenas com relação ao termo utilizado para descrevê-la, tendo convergência quanto a ideia de a responsabilidade Estatal ser objetiva nas hipóteses de omissão específica ou situação produzida pelo Estado diretamente propiciatória.


REFERÊNCIAS

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DE MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros Editores. 2007.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 25ed. São Paulo Saraiva 2011.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 14. Ed. São Paulo: Editora Malheiros 2007.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, v.4. 6ed. São Paulo: Saraiva 2011.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil – 5 ed – São Paulo. Atlas. 2005.

BRUNINI, Weida Zancaner. Da responsabilidade extracontratual da administração pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981, p. 39-74.

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 23ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 965.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 32ª ed., São Paulo, Malheiros, 2006, p. 654.

BANEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 23ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 965.


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