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A necessidade de criação do estatuto de proteção integral da pessoa transplantada

A necessidade de criação do estatuto de proteção integral da pessoa transplantada

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Ao tempo em que se enaltece o esforço do Estado em buscar a inclusão social das pessoas com deficiência, não podemos deixar de alertar sobre o surgimento de uma nova minoria, fruto da evolução tecnológica.

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa pretende enfrentar a temática relacionada à necessidade da criação de um estatuto de proteção integral voltado especificamente às pessoas transplantadas com o propósito de definir um rol mínimo de direitos protetivos partindo-se do paradigma dos direitos tutelados pelo ordenamento pátrio as pessoas com deficiência.

Em meio aos avanços tecnológicos da medicina e as políticas públicas voltadas ao transplante, o Brasil alcançou, na última década, o patamar de segundo lugar no mundo em número de transplantes realizados. Contudo, a partir do procedimento médico de transplante tem surgido uma nova minoria social de pessoas transplantadas que ainda se encontram desassistidas pelo ordenamento jurídico pátrio.

Diante dessa realidade, a presente pesquisa parte das seguintes problemáticas: Existem no ordenamento jurídico brasileiro normas legais especialmente voltadas à proteção da pessoa transplantada ou que poderiam ser utilizadas para esse fim? Quais as consequências da falta de normas especialmente criadas para a pessoa transplantada? Seria possível criar um estatuto específico à tutela desse segmento social com fundamento na Constituição Federal?

Com o grande número transplantes realizados no país milhares de pessoas transplantadas necessitam ser reincluídas na sociedade. Por esse motivo, o presente estudo tem o objetivo de demonstrar a necessidade da criação de um estatuto de proteção integral voltado especificamente à reinclusão social dessa minoria, que garanta a elaboração de políticas públicas como, por exemplo, de incentivos fiscais às empresas que venham a contratar uma pessoa transplantada.

Essa pesquisa justifica-se na medida em que pretende evidenciar a ausência de normas jurídicas voltadas a pessoa transplantada e, por conseguinte, demonstrar a necessidade de criação de um rol mínimo de direitos voltados à tutela dessa minoria social a partir de uma interpretação sistêmica da Constituição Federal, e com isso conscientizar a sociedade e as autoridades públicas da realidade social enfrentada por essas pessoas.

Ao mesmo tempo em que o Brasil comemora o segundo lugar no mundo em número de transplantes realizados, surge juntamente, a necessidade de reflexão acerca da proteção desses brasileiros pelo Estado após o procedimento médico de transplante. É nesse momento de retorno ao convívio social que a pessoa transplantada evidencia a ausência de direitos voltados à sua proteção, especialmente no retorno ao mercado de trabalho, diante da inexistência de previsão constitucional expressa e de uma legislação infraconstitucional de tutela dos direitos da pessoa transplantada.

Após o transplante é necessário que a pessoa transplantada faça um grande esforço físico e mental para se adaptar às suas novas condições de vida, principalmente sob o ponto de vista biológico, psicológico e social. Segundo especialistas, a pessoa transplantada enfrenta questões psicológicas intensas, a degradação física, o uso contínuo de medicamentos imunossupressores, as consultas médicas regulares e, principalmente, a incerteza da vida causada pelo medo da rejeição do órgão. Essas situações vivenciadas após o transplante podem gerar grandes dificuldades para a pessoa transplantada conseguir sua reinserção social na família, na sociedade, e ainda vir a causar a incapacidade para o trabalho.

Diante dessa realidade, a criação do estatuto visa assegurar um sistema normativo voltado especialmente à pessoa transplantada. Nesse sentido, cabe esclarecer que se procurou padronizar nesse estudo o uso da expressa “pessoa transplantada” com a finalidade de demonstrar a necessidade de garantia da dignidade da pessoa humana dessa parcela aos moldes da pessoa com deficiência.

A realidade enfrentada após o transplante precisa ser analisada com o devido respeito e enfrentada de maneira sistêmica e integral, ou seja, deve ser tratada sob o ponto de vista de todos os aspectos da vida da pessoa transplantada, como a saúde, o transporte, a assistência social, a previdência e o trabalho, a fim de garantir sua reinclusão social e com isso proporcionar uma vida digna.

Para criação do Estatuto de Proteção Integral da Pessoa Transplantada partiu-se da análise da legislação pátria de tutela da pessoa com deficiência a fim de se definir um rol mínimo de direitos extensíveis a pessoa transplantada e, no âmbito internacional, utilizou-se como referência a Lei n. 26.928, promulgada pelo parlamento Argentino, em janeiro de 2014, a qual instituiu o “sistema de protección integral para personas trasplantadas”, primeira lei no mundo sobre o tema.

No que se refere ao procedimento metodológico, o presente estudo classifica-se quanto aos objetivos da pesquisa como descritiva e exploratória; quanto ao método e forma de abordagem do problema a pesquisa é classificada como qualitativa e quantitativa; e quanto aos procedimentos adotados para a coleta de dados refere-se a uma pesquisa bibliográfica e documental.


CAPÍTULO I

A PESSOA TRANSPLANTADA: GARANTIA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E OS DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS

1 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E OS DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS COMO FUNDAMENTO DE CRIAÇÃO DO ESTATUTO DE PROTEÇÃO INTEGRAL DA PESSOA TRANSPLANTADA

A dignidade da pessoa humana, como princípio constitucional que fundamenta todo o arcabouço jurídico brasileiro, deve servir de fonte primária para qualquer interpretação constitucionalmente que se faça necessária. Cabe enaltecer que a conquista do respeito à dignidade da pessoa humana e aos direitos humanos fundamentais simboliza a evolução social humana por meio da justiça e do combate à exploração do homem pelo seu semelhante.

Significa de tal modo a vitória da liberdade contra a opressão e da paz contra as barbáries da guerra. Nos ensinamentos de Nunes (2002, p. 38) “[...] torna-se necessário identificar a dignidade da pessoa humana como uma conquista da razão ético-jurídica, fruto da reação à história de atrocidades, que, infelizmente, marca a existência humana”. A dignidade humana simboliza um verdadeiro superprincípio constitucional, significando a norma maior que deve orientar o constitucionalismo contemporâneo, dotando-lhe de especial racionalidade, unidade e sentido. (PIOVESAN, 2003, p. 393).

Diante da importância da dignidade para o ordenamento jurídico, os operadores do direito precisam observar este supraprincípio. Nas lições de Nunes (2002) a dignidade ilumina todos os demais princípios e normas constitucionais e infraconstitucionais, por isso quando houver a necessidade de interpretação, aplicação ou criação de norma jurídica a dignidade da pessoa humana jamais deve ser desconsiderada.

Com relação aos direitos e garantias fundamentais, estes têm como fundamento jurídico principal a dignidade da pessoa humana, que funciona como pilar de sustentação de todo o sistema constitucional brasileiro. Ela torna-se o verdadeiro plano de fundo direcionador dos direitos humanos fundamentais, que por sua vez nela encontram seu principal fundamento.

Diante da realidade enfrentada pela pessoa transplantada, surge a necessidade de reflexão a cerca da garantia de proteção contra toda e qualquer atividade que possa vir a lesar seus direitos. Na medida em que o Estado Brasileiro adota políticas públicas voltadas ao incentivo ao transplante e possibilita o desenvolvimento de novas tecnologias, precisa também aperfeiçoar seu ordenamento jurídico de tutela às pessoas transplantadas, ou seja, reinserir essa parcela na sociedade e no mercado de trabalho.

Portanto, para a construção de um estatuto de proteção jurídica da pessoa transplantada o parlamento brasileiro deve guiar-se a luz da garantia da dignidade da pessoa humana e dos direitos fundamentais.

1.1 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA COMO FUNDAMENTO DE PROTEÇÃO DA PESSOA TRANSPLANTADA

Diante da ausência de uma legislação voltada especificamente à proteção da pessoa transplantada, surge a reflexão acerca da garantia da dignidade da pessoa humana dessa minoria social, tendo em vista que o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana é reconhecido como a viga mestra da qual se edificam todos os direitos humanos fundamentais voltados à tutela do ser humano. 

Nesse contexto, é possível afirmar que a dignidade da pessoa humana não decorre do ordenamento jurídico, portanto, ela não existe somente onde é reconhecida pelo direito, uma vez que é anterior a ele e constitui-se num bem inato do ser humano que não pode ser concedido ou retirado das pessoas. (MARTINEZ, 1996).

A dignidade da pessoa humana, enquanto fundamento do Estado Democrático de Direito, no qual o Brasil se constitui, possui um valor supremo de democracia que fundamenta todo o ordenamento jurídico. (SILVA, 2002). Pode-se afirmar que a República Federativa do Brasil tem como pedra fundamental de todo seu sistema constitucional pátrio a dignidade da pessoa humana, cuja previsão encontra-se expressa no artigo 1º, inciso III da Carta Magna. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988).

Frente à importância da dignidade da pessoa humana para o sistema constitucional pátrio, o qual consagra o homem como centro do universo jurídico, parte-se para a seguinte indagação: qual o significado do termo dignidade da pessoa humana? Para responder essa questão central, é importante ressaltar que explicar o significado de dignidade da pessoa humana é uma tarefa bastante complexa, uma vez que, embora a sua compreensão seja relativamente fácil, é uma expressão carregada de sentimentos. (CARVALHO, 2006).

De acordo com Nunes (2002, p. 38), o conceito de dignidade foi sendo construído no decorrer da história, fruto da reação às atrocidades que infelizmente marcam a experiência humana. Para o autor, é necessário identificar a dignidade da pessoa humana como uma conquista da razão ético-jurídica. A dignidade não cuida de aspectos específicos da existência humana como a integridade física, a intimidade, a vida, ou a propriedade, mas sim de uma qualidade tida como inerente, atribuída a todo e qualquer ser humano, ou seja, um valor próprio que identifica o ser humano como tal. (SACHS, 2000 apud SARLET, 2012, p. 50).

Sempre que se procurar explicar o significado de dignidade da pessoa humana, é indispensável fazer-se referência aos ensinamentos do filósofo Immanuel Kant. Apresenta-se a seguir o conceito de dignidade nas palavras de Kant, em respeito a tamanho significado filosófico:

No reino dos fins, tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se acha acima de todo preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende uma dignidade. (KANT, p. 134 apud SARLET, 2012, p. 40).

Para o filósofo Kant, o homem deve existir como um fim em si mesmo, e nunca ser utilizado como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade. Em todas as suas ações o ser humano tem sempre de ser considerado simultaneamente como um fim, tanto nas que se dirigem a ele mesmo como nas que se dirigem a outros seres racionais. (KANT, p. 134 apud SARLET, 2012, p. 40).

Portanto, o homem como ser racional nunca deve ser considerado um meio para os outros seres, mas fim em si mesmo. Depreende-se desses ensinamentos de Kant que a pessoa humana encontra-se no reino dos fins, do que podemos compreender o ser humano como um ser com dignidade própria, que possui uma dignidade nata que o caracteriza.

Para Kant o ser humano por ser possuidor de razão e manter sua autonomia de vontade, consequentemente possui a faculdade de autodeterminação e consciência para agir de acordo com a representação de certas leis que ele próprio faz. (SARLET, 2012). Evidencia-se da base teórica Kantiana que a dignidade da pessoa humana impossibilita a coisificação e a instrumentalização do ser humano, já que este deve ser considerado um fim e não como um meio. (BAEZ, 2010, p. 24).

A dignidade da pessoa humana tem como núcleo principal o direito do indivíduo de se autodeterminar, conforme a sua própria razão, no que diz respeito às decisões essenciais relativas a sua própria existência, portanto considera-se um atributo inerente a todos os seres humanos. (DWORKIN, 2003). Como um valor humano, a dignidade compromete-se em propiciar aos indivíduos condições para que possam ter uma vida decente conforme suas as necessidades mais íntimas, ou seja,  segundo as particulares de cada indivíduo.

Esse valor intrínseco do ser humano proporciona ao mesmo o direito de decidir de forma autônoma sobre seus projetos existenciais e felicidade, e onde esta autonomia lhe faltar ou não puder ser atualizada, ainda assim deve ser considerado e respeitado pela sua condição humana. (KOPPERNOCK, 1997 apud SARLET, 2012, p. 63).

Nas lições de Nunes (2002), em relação à dignidade este pondera no sentido de que o ser humano vive no meio social e que nenhum indivíduo é isolado. O ser humano nasce com integridade física e psíquica, e no decorrer da vida chega num momento de seu desenvolvimento em que seu pensamento, suas ações e seu comportamento, têm de ser respeitados, bem assim sua liberdade, imagem, intimidade, consciência, religiosa, científica,, etc., afinal tudo compõe sua dignidade.

Para Moraes (2003, p. 60), a dignidade da pessoa humana apresenta-se com dupla concepção, "a primeira prevê um direito individual protetivo em relação ao próprio Estado e aos demais indivíduos, a segunda estabelece verdadeiro dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes".

A dignidade da pessoa humana deve ser considerada como um direito individual protetivo de receber tratamento igualitário tanto do Estado quanto dos demais indivíduos, no sentido material de igualdade, ou seja, de tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, suprindo suas as carências físicas, intelectuais, econômicas e sociais. (PEZZELLA e BORBA, 2012, p. 243).

Para Silva e Spengler Neto (2005), a experiência nazista resultou em inúmeras atrocidades que afrontaram a dignidade da pessoa humana. As crueldades praticadas pelos nazistas são consideradas "o marco histórico que gerou a consciência de que se deveria preservar a dignidade da pessoa humana a qualquer custo, devendo-se, assim, lutar contra tudo que a viole".

Em 1948, a Organização das Nações Unidas proclamou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, após as desumanidades da Segunda Guerra Mundial. Em seu preâmbulo a declaração afirma que "o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.”  (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1948).

Para Piovesan (1996), a Declaração Universal dos Direitos Humanos é o documento alicerce da luta universal contra a opressão e a discriminação. Ela defende a igualdade e a dignidade das pessoas, e reconhece que os direitos humanos e as liberdades fundamentais que devem ser aplicados a todos os indivíduos do planeta. Essa declaração "vem a atestar o reconhecimento universal de direitos humanos fundamentais, consagrando um código comum a ser seguido por todos os Estados".

A referida declaração "constitui a mais importante conquista dos direitos humanos fundamentais em nível internacional", proclamando "a necessidade essencial dos direitos da pessoa humana serem protegidos pelo império da lei, para que a pessoa não seja compelida, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão". (MORAES, 2003, p. 34-36).

O Tribunal Constitucional da Espanha, inspirado na Declaração Universal, manifestou-se no sentido de que a dignidade da pessoa humana deve ser considerada "um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que leva consigo a pretensão ao respeito por parte dos demais”. (LLORENTE, p. 72 apud SARLET, 2012, p. 55).

Tarefa imposta a todos os Estados, a dignidade da pessoa humana exige que os Estados conduzam as suas atuações "tanto no sentido de preservá-la, quanto objetivando a promovê-la, especialmente criando condições que possibilitem o pleno exercício e fruição dessa dignidade.” (PODLECH, 1989, p. 280 apud SARLET, 2012, p. 56).

Em 1988, a Constituição Federal Brasileira foi promulgada sob forte influência das Cartas Constitucionais de outros Estados que garantiam a proteção dos direitos humanos. É marcante nessa Carta Magna a tutela dos direitos fundamentais, sob o fundamento do princípio da dignidade da pessoa humana como substrato principal para todos os demais direitos e garantias individuais e coletivos. O Estado Constitucional Democrático da atualidade é um Estado de abertura constitucional radicado no princípio da dignidade do ser humano. (CASTRO, 2003, p. 19).

Pode-se concluir que a dignidade da pessoa humana é inerente a todo ser humano pelo simples fato de existir, portanto merece toda proteção do Estado. O ser humano não deve sofrer qualquer forma de discriminação em razão de sua deficiência, condição física, saúde, raça, credo, ou crença religiosa. Consequentemente, toda interpretação da norma, na aplicação do ordenamento pátrio, deve fundar-se nesse princípio constitucional central da República Brasileira.

Portanto, em que pese a ausência de norma protetiva específica que garanta os direitos da pessoa transplantada, essa lacuna jamais pode ser interpretada como ausência de direitos desse segmento social, mas sim como um dever do Estado de  atender essa iminente necessidade por meio da edição de um estatuto protetivo sob o manto constitucional da dignidade da pessoa humana.

1.2 OS DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS COMO GARANTIA DA TUTELA DA PESSOA DA PESSOA TRANSPLANTADA

Inicialmente, para fins de discussão acerca da melhor terminologia a ser adotada, apresenta-se a distinção do significado dos termos “direitos humanos”, “direitos fundamentais” e “direitos humanos fundamentais”, que comumente são utilizados como sinônimos. Para este estudo preferiu-se adotar a expressão direitos humanos fundamentais para demonstrar a necessidade de tutela da pessoa transplantada, na medida em que esta expressão tem o condão de reforçar a unidade essencial e indissolúvel entre os direitos humanos e os direitos fundamentais.

Os direitos humanos são aqueles positivados nos tratados e declarações internacionais, que têm por base a dignidade humana, e em sua dimensão básica são universais. Constituem um conjunto de normas que impedem a redução do indivíduo à condição de objeto. Os direitos humanos vêm sendo reconhecidos e implantados lentamente, ao logo da história, como forma de realização da dignidade humana. (BAEZ, 2010, p. 29).

A expressão direitos humanos guarda relação com os documentos de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional. Eles aspiram à validade universal, para todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um inequívoco caráter supranacional. (SARLET, 2006, p. 35-36). Para Diniz (2001, p. 19-20), “os direitos humanos, decorrentes da condição humana e das necessidades fundamentais de toda pessoa humana, referem-se à preservação da integridade e da dignidade dos seres humanos e à plena realização de sua personalidade”.

Já os direitos fundamentais são agentes da realização dos direitos humanos, no interior da ordem jurídica de cada país, tendo como limite a dignidade da pessoa humana, impedindo qualquer forma de redução do indivíduo à condição de objeto ou a diminuição de seu status como sujeito de direitos. (BAEZ, 2010, p. 29). O termo direitos fundamentais se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado. (SARLET, 2006, p. 35-36).

Nesse diapasão, os direitos humanos são frutos de processos culturais de emancipação do ser humano na luta constante pela dignidade da pessoa humana, enquanto os direitos fundamentais são os resultados de processos culturais de regulação das conquistas alcançadas pelos processos emancipatórios. Logo, os direitos fundamentais não são apenas a positivação dos direitos humanos, mas a garantia das conquistas que aqueles alcançaram, pois os direitos humanos cabem dentro dos direitos fundamentais, mas deles extravasam. (PEZZELLA e BORBA, 2012, p. 243).

A compreensão e a delimitação do conceito dos direitos fundamentais foram sendo construídas na realidade social com o surgimento do mundo moderno, nos séculos XV e XVI. Trata-se de um conceito histórico que foi sendo costurado em conjunto com a realidade e submetido a esses elementos que concorrem para a sua percepção pelo Direito Positivo. (PEZZELLA e BORBA, 2012, p. 233).

Finalmente, os direitos humanos fundamentais podem ser conceituados como o conjunto de valores éticos, positivados ou não, que visam a proteger e realizar a dimensão básica da dignidade humana, impedindo que os indivíduos sofram qualquer tipo ou redução legal ou moral ao seu status como sujeitos de direitos. (BAEZ, 2011 p. 45). Para Sarlet (2012), o uso da expressão direitos humanos fundamentais auxilia a ressaltar que os direitos humanos também buscam reconhecer certos valores e reivindicações essenciais a todos os seres humanos.

Assim, determinado direito humano fundamental, como o direito à vida, deve persistir e ser invocado, mesmo nos estados ou sociedades que não o reconheçam dentro de suas ordens jurídicas internas, pois é por natureza inerente a todos os seres humanos. Essa característica permite destingi-los claramente dos direitos fundamentais, uma vez que esses últimos, para existirem, devem passar por um processo de positivação e reconhecimento no direito interno dos Estados. (CANOTILHO, 1999 apud BAEZ, 2011, p. 46).

Para Moraes (2003, p.39), os direitos humanos fundamentais podem ser definidos como o conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que têm por finalidade o respeito a sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana.

Os direitos humanos fundamentais "colocam-se como uma das previsões absolutamente necessárias a todas as Constituições, no sentido de consagrar o respeito à dignidade humana, garantir a limitação do poder e visar o pleno desenvolvimento da personalidade humana". (MORAES, 2003, p. 20). Desse modo "o respeito aos direitos humanos fundamentais, principalmente pelas autoridades públicas, é pilastra-mestra na construção de um verdadeiro Estado de direito democrático". (MORAES, 2003, p. 21-22).

Remonta ao antigo Egito e Mesopotâmia, no terceiro milênio a. C., a origem dos direitos humanos fundamentais, onde já eram previstos alguns mecanismos de proteção individual em relação ao Estado. O forte desenvolvimento dos direitos humanos deu-se do final do século XVIII, após a Revolução Francesa e estendeu-se até o século XX, culminando em 1948 na edição da Declaração Universal dos Direitos Humanos. (MOARES, 2003, p. 24-25).

Com o surgimento do Estado, surge também o indivíduo como senhor de direitos, que deixa de ser súdito para ser cidadão, e a construção de um vínculo político-jurídico entre o cidadão e o Estado, onde esse último assume a soberania. O Estado tem o dever de atuar de maneira a proteger, tutelar e prover as necessidades com vistas sempre a reequilibrar as relações no plano concreto dos fatos que se desenvolvem no cotidiano. (PEZZELLA e BORBA, 2012, p. 233).

Em relação aos direitos humanos fundamentais a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) consagra especialmente o direito à vida, à liberdade, à segurança pessoal, à igualdade e à liberdade de pensamento, consciência e religião nos seus artigos III, VII e XVIII:

Artigo III

Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

[...]

Artigo VII

Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei. Todos têm direito a proteção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.

[...]

Artigo XVIII

Todo homem tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião.

Quanto mais desenvolvida culturalmente for uma sociedade, mais protegida será a dignidade da pessoa humana, e mais próxima de uma realização efetiva dos direitos fundamentais. Uma sociedade que não discute e não permite uma ampla discussão social e jurídica da importância da pessoa em sua plenitude, na perspectiva física e psíquica, deixa de cumprir o seu papel principal de desenvolvimento integral da pessoa. (PEZZELLA e BORBA, 2012, p. 241).

Nas lições de Bobbio (2004) em sua clássica obra “A Era dos Direitos”, os direitos humanos apresentam-se em gerações, também consideradas pela doutrina como dimensões. A primeira dimensão corresponde aos direitos de liberdade, ou um não agir do Estado. A segunda dimensão representa os direitos sociais, ou também uma ação positiva do Estado, ou seja, uma realização prática. A terceira dimensão constitui-se numa categoria heterogênea de direitos como: solidariedade, fraternidade, direito a paz e de viver num ambiente não poluído. A quarta dimensão decorre das pesquisas biológicas, que também permitirão a manipulação do patrimônio genético de cada indivíduo.

Portanto, nas palavras de Sarlet (2009, p. 87), pode-se concluir que os “todos os direitos e garantias fundamentais encontram seu fundamento direto, imediato e igual na dignidade da pessoa humana, do qual seriam concretizações”. Nesse sentido, “há uma relação indissociável entre a dignidade da pessoa e os direitos fundamentais, pois estes são explicitações da dignidade”. De modo que “em cada direito fundamental se faz presente um conteúdo ou, pelo menos, alguma projeção da dignidade da pessoa”.

No ordenamento jurídico brasileiro, em relação ao transplante de órgãos e tecidos, pode-se identificar direitos fundamentais tanto do doador e quanto do receptor por meio da interpretação constitucional. Tendo em vista o objetivo deste estudo, tratar-se-á especialmente do receptor (pessoa doente), demonstrando-se o seu direito fundamental de submeter a um transplante a partir da interpretação sistêmica constitucional da dignidade da pessoa humana, da inviolabilidade do direito à vida, do direito de liberdade de consciência, do direito à integridade física, do direito ao próprio corpo, do direito de personalidade e do incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento científico, dentre outros.

Conforme amplamente exposto, a dignidade da pessoa humana é um valor moral e espiritual inerente ao ser humano, da qual emanam todos demais direitos fundamentais. Toda pessoa é dotada desse preceito, que se constitui o princípio máximo do Estado Democrático de Direito. Portanto, diante da existência de uma doença crônica incurável que coloque em risco a vida de um ser humano, a dignidade da pessoa humana é o valor nato que garante o seu direito a submeter a um transplante na busca de uma melhor qualidade de vida.

Os direitos humanos fundamentais são todos os direitos mais próximos e indissociáveis do gênero humano, dos quais o direito à vida é o maior bem tutelado pelo ordenamento jurídico, haja vista que sem esta, a própria sociedade não existiria. Para Moraes (2004, p. 65), “o direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais direitos”.

O artigo 5º, caput, da Constituição Federal de 1988, assegura a inviolabilidade do direito à vida. Esse dispositivo constitucional determina que cabe ao Estado assegurar o direito à vida em sua dupla acepção, a primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter uma vida digna quanto à subsistência. Nesse viés, o direito à vida deve ser entendido como direito a um nível adequado com a condição humana. (MOARES, 2003, p. 87).

Em relação ao direito de liberdade de consciência, o filósofo Immanuel Kant, no final do século XVIII, visualizou a liberdade como liberdade de consciência e, segundo ele, deveria ser protegida, somente podendo ser coibida a conduta exteriorizada. Porém, foi na Idade Moderna que a liberdade passou a ser sinônimo de consciência, onde a ideia da liberdade é tida como fenômeno subjetivo baseado na consciência individual. (CABRAL, 2009).

A Constituição Federal no artigo 5º, inciso VI, tutela a liberdade de consciência que se caracteriza como exteriorização do pensamento e está intimamente ligada às liberdades de expressão e de pensamento. Como um direito fundamental decorrente da dignidade da pessoa humana, o receptor detém o direito de liberdade de consciência de se submeter a um transplante. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988).

O direito à integridade física é um direito fundamental que encontra guarida no artigo 5º, incisos III e XLVII da Carta Magna, sob as formas tendentes a abolir excessos como a tortura, as penas cruéis e o tratamento desumano ou degradante. Trata-se de uma proteção jurídica que busca evitar ao ser humano o dano físico, o prejuízo à saúde ou a perturbação às facultadas mentais, essa tutela repercute na legislação penal com a previsão de sanções as ações de ofensa à integridade corporal ou à saúde de outrem (art. 129, caput, do Código Penal), e na legislação civil onde constitui ato ilícito (art. 949 e arts. 189, 187 e 927 do Código Civil). (CATÃO, 2004, p. 168).

A integridade física também encontra previsão legal no artigo 13 do Código Civil, o qual proíbe a disposição do próprio corpo, quando esta importar em diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes. A única exceção admitida está contida no parágrafo único do referido artigo, que permite a disposição, por pessoa capaz, de tecidos, órgãos e partes do corpo para fins de transplante ou tratamento, na forma da Lei n. 9.434/97. (FIÚZA, 2003, p. 26-27).

No artigo 14, o Código Civil dispõe que “é válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte sobre os atos de disposição do corpo”. No parágrafo único do referido artigo prevê que “o ato de disposição pode ser revogado a qualquer tempo” pelo doador. (CÓDIGO CIVIL, 2002).

O artigo 15 do Código Civil proclama que “ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica”, essa exigência de autorização espontânea e consciente do paciente, ou de seu representante, se incapaz, para se submeter à cirurgia ou a tratamento médico, representa a inviolabilidade do corpo humano. (GOMES, 2010).

O direito ao próprio corpo ainda é pouco regulamentado na legislação pátria, encontra previsão em dispositivos do Código Civil ligados a direitos da personalidade e leis esparsas como a Lei n. 9.434/97 que refere-se à remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante. (CATÃO, 2004, p. 175).

Apresenta-se ainda como um princípio no biodireito, "especialmente diante dos avanços das técnicas de tratamentos empregados pela medicina que envolvem a possibilidade de disposição de certas partes do corpo humano, ora em prol do mesmo sujeito, ora em favor de outra pessoa". (SILVA, 2002, p. 240).

Esse direito fundamental ao próprio corpo impõe os limites admissíveis de interferência no corpo humano em todas as etapas e dimensões da vida humana, seja embrião, feto, criança, adolescente, pessoa adulta, pessoa idosa, ou já falecida. (GAMA, 2003). Em que pese a vontade individual, o direito ao próprio corpo humano encontra limites jurídicos para disposição de partes na dignidade da pessoa humana e no direito à vida. Assim, a pessoa individualmente não tem direito real sobre partes de seu corpo, havendo, portanto, a necessidade de uma ordem pública que expressamente permita a disposição de partes do corpo humano. (GOMES, 2010).

Nesse diapasão, o ser humano tem direito ao seu próprio corpo e pode exercê-lo com certos limites, corpo este formado de aparelhos, sistemas, tecidos e células, o qual representa a integridade física desse ser humano. O corpo humano é uma estrutura autônoma, funcional e psíquica do ser humano, sendo sob esse ponto de vista considerado um bem jurídico tutelado pelo direito, e que deve ter sua inviolabilidade resguardada pelo Estado. (SÁ, 2003, p. 97).

Sobre o direito de personalidade, Miranda (2000) ensina que "a personalidade em si não é direito; é qualidade, é o ser capaz de direitos, o ser possível estar nas relações jurídicas como sujeito de direito". A personalidade é atributo inerente ao homem, ou seja, não requer o preenchimento de qualquer requisito, nem depende do conhecimento ou da vontade do ser humano. Mesmo que o indivíduo não tenha consciência da realidade, é dotado de personalidade, pelo simples fato de ser pessoa. (PEREIRA, 2001, p. 142).

O Código Civil no seu artigo 1º dispõe que "toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil". Os direitos da personalidade têm por finalidade a proteção dos direitos indispensáveis à dignidade e integridade da pessoa. O civilista Bittar (2003) conceitua direitos da personalidade como sendo "os direitos reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade, [...], para a defesa de valores inatos ao homem, como a vida, a higidez física, a intimidade, a honra, a intelectualidade e outros".

No que tange ao incentivo a pesquisa e ao desenvolvimento científico, não cabe ao Estado Brasileiro proibir os indivíduos que se beneficiem dos avanços tecnológicos, isto porque são advindos de áreas que o próprio Estado promove o incentivo conforme proclama a Constituição Federal no seu artigo 218:

Art. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas.

§ 1º - A pesquisa científica básica receberá tratamento prioritário do Estado, tendo em vista o bem público e o progresso das ciências.

[...] (Constituição Federal, 1988).

Pode-se concluir que Carta Magna garante a todos os brasileiros o direito fundamental de se submeter a um transplante pela analise sistêmica das normas e princípios constitucionais. Assim, esse direito fundamental encontra alicerce na dignidade da pessoa humana, no direito à vida, no direito de liberdade de consciência, no direito à integridade física, no direito ao próprio corpo, no direito de personalidade, no incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento científico e nos demais direitos fundamentais.

Em que pese a garantia constitucional da pessoa transplantada a uma vida digna com respeito aos seus direitos fundamentais, a partir do procedimento cirúrgico de transplante evidencia-se uma lacuna com relação à tutela específica da pessoa transplantada. Consequentemente, o Estado precisa garantir um rol mínimo de direitos específicos como forma de concretizar o princípio da dignidade de pessoa humana dessa parcela da sociedade.

Infelizmente, conforme será demonstrado no capítulo seguinte, o mercado de trabalho altamente competitivo tem eliminado sumariamente da disputa por uma vaga de emprego aqueles brasileiros que se submetem a um transplante. Sem um emprego para garantir a renda da família, todos integrantes do núcleo familiar tem sua subsistência ameaçada, e a pessoa transplantada aumenta a possibilidade de rejeição do órgão, uma vez que fatores sociais e psíquicos influenciam na melhoria da qualidade de vida e diminuem as chances de rejeição.


CAPÍTULO II

A NECESSIDADE DE PROTEÇÃO LEGAL DAS PESSOAS TRANSPLANTADAS

2 A CRIAÇÃO DO ESTATUTO DE PROTEÇÃO INTEGRAL DA PESSOA TRANSPLANTADA

O Brasil possui um dos maiores programas públicos de transplantes de órgãos e tecidos do mundo. Segundo o Ministério da Saúde (2014) mais de 90% dos procedimentos de transplantes no Brasil são financiados pelo Sistema Único de Saúde – SUS. Esse amplo incentivo público voltado ao transplante e os avanços da biociência nos últimos anos tem resultado no crescimento exponencial do número de pessoas transplantadas.

Todavia após o tão esperado procedimento médico de transplante a pessoa transplantada, além da luta constante contra a rejeição do órgão, enfrenta uma nova batalha, qual seja, a reinserção na sociedade, e principalmente, no mercado de trabalho. É nesse momento de retorno ao convívio social que a ausência da tutela de um rol mínimo de direitos da pessoa transplantada fica evidente pela inexistência de previsão constitucional expressa e de uma legislação infraconstitucional de proteção dos direitos desse segmento social.

A pessoa transplantada precisa fazer um grande esforço físico e mental para se adaptar as suas novas condições de vida, tanto biologicamente, psicologicamente e socialmente. De acordo com especialistas a pessoa transplantada precisa lidar com questões psicológicas intensas, a degradação física, o uso contínuo de medicamentos imunossupressores, as consultas médicas regulares, e principalmente com a incerteza da vida causada pela medo da rejeição do órgão. Todas essas situações enfrentadas após o transplante podem gerar dificuldades de reinserção social no seio da família e na sociedade, e ainda vir a causar a incapacidade laboral.

Nesse contexto, a criação do estatuto de proteção integral visa assegurar um rol mínimo normativo a essa pessoa transplantada. Para tanto, essa realidade precisa ser enfrentada de maneira sistêmica e integral, ou seja, deve-se tratar dos vários aspectos da vida da pessoa transplantada necessários a sua reinclusão social como a saúde, o transporte, a assistência social, a previdência e o trabalho, com vistas à garantia de uma vida digna.

Para criação desse estatuto de proteção partiu-se da analise da legislação pátria de tutela da pessoa com deficiência para se definir um rol mínimo de direitos extensíveis a pessoa transplantada e, em âmbito internacional, analisou-se a Lei n. 26.928 promulgada pelo parlamento Argentino, em janeiro de 2014, que instituiu o “sistema de protección integral para personas trasplantadas”.

A utilização dos direitos pátrios de proteção da pessoa com deficiência fundamenta-se na proximidade das características físicas, psíquicas e sociais desses dois grupos sociais, a exemplo da comparação entre a pessoa com deficiência em virtude de nefropatia grave e a pessoa transplantada de rim.

A pessoa com deficiência por nefropatia grave é acometida por doença grave com previsão na Lei n. 8.213/91, e por isso tem a seu favor toda a proteção normativa pátria voltada à pessoa com deficiência. Por outro lado, se essa pessoa com deficiência submete-se a um transplante de rim, será uma pessoa transplantada, e, por conseguinte, não encontrará no ordenamento jurídico pátrio a mesma previsão protetiva, mesmo que antes do transplante estivesse tutelada pelos direitos da pessoa com deficiência por nefropatia grave.

Com base nessa proximidade fática, busca-se demonstrar os acontecimentos históricos e as normas de inclusão social da pessoa com deficiência para evidenciar também a necessidade de proteção da pessoa transplantada, nova minoria social que surge após um transplante.

Historicamente as pessoas com deficiência sempre foram discriminadas pela sociedade, na antiguidade os gregos eliminavam as pessoas tidas como "defeituosas", e os romanos abandonavam a própria sorte suas crianças “deformadas”. Durante a Idade Média, apesar de serem consideradas “filhos de Deus”, muitas pessoas com deficiência foram eliminadas com o objetivo de "absolverem-se de seus pecados".

Essa realidade só começou a mudar após a Revolução Francesa no século XVIII. Nesse período a pessoa com deficiência passa ser vista como um ser humano, e não mais como "dispensáveis do convívio social". Mas é no século XX, após duas Grandes Guerras Mundiais e Guerra do Vietnã, que tiveram como resultado milhares de pessoas mutiladas, que essa mudança de paradigma no sentido de inclusão social da pessoa com deficiência se acentua ainda mais.

Surge nesse momento histórico a necessidade de reabilitação e reinclusão dessas pessoas com deficiência na sociedade. No Brasil essa visão pautada na dignidade da pessoa com deficiência chega ao ápice com a previsão expressa de direitos e garantias especiais na Constituição Federal de 1988.

É diante desse contexto de reabilitação e reinclusão social da pessoa com deficiência tão discriminada ao longo da história, mas que tem conquistado importantes avanços na normatização de seus direitos, como a recente conquista do Estatuto da Pessoa com Deficiência em 2015, que se pretende demonstrar a necessidade de criação de um estatuto de proteção integral voltado às pessoas transplantadas com vistas a garantir-lhes a dignidade da pessoa humana e os direitos humanos fundamentais.

2.1 O TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS NO BRASIL

A "utilização da palavra 'transplante' pela ciência médica é secular, derivada do latim transplantare, que significa transferir órgão ou porção deste de uma para outra parte do mesmo indivíduo, ou ainda, de indivíduo vivo ou morto para outro indivíduo". (FERREIRA, 1993, p.1703 apud PEREIRA, 2006).

A Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos define o transplante “como um procedimento cirúrgico que consiste na reposição de um órgão ou tecido de uma pessoa doente – receptor – por outro órgão normal de um doador, morto ou vivo. É um tratamento que pode prolongar a vida com melhor qualidade, ou seja, é uma forma de substituir um problema de saúde incontrolável por outro sobre o qual se tem controle”. (BANDEIRA, 2001, p. 28).

O primeiro, dos procedimentos de transplante de órgãos largamente utilizados no tratamento de falência terminal de órgãos, foi o transplante renal. As técnicas cirúrgicas básicas usadas no transplante renal foram desenvolvidas no princípio do século XX por Alexis Carrel ganhador do prêmio Nobel de 1912. Em 1951, ocorreu o primeiro transplante de um órgão vital não regenerativo, foi um transplante de rim efetuado pelo médico David M. Hume, no Hospital Brigham and Women, em Boston, nos Estados Unidos. (DA SILVA NETO, 2004).

No Brasil o primeiro transplante de órgão ocorreu em 1964, no Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro, quando Sérgio Vieira Miranda, de 18 anos, recebeu um rim de uma criança de nove meses, portadora de hidrocefalia. Segundo o Jornal do Brasil de 18 de abril de 1964, participaram do transplante os cirurgiões Alberto Gentile, Pedro Abdalla, Carlos Rudge, Oscar Regua, Antônio Carlos Cavalcante e Ivonildo Torquato. (RIBEIRO e SCHRAMM, 2006).

Em 1967, o cirurgião Christian Barnard realizou no hospital sul-africano da Universidade de Cape Town o primeiro transplante cardíaco de humano para humano bem-sucedido. Dois anos depois, no dia 28 de maio de 1969, o Dr. Euriclides J. Zerbini realizou o primeiro transplante cardíaco no Brasil, no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. O receptor sobreviveu por 28 dias após o transplante, vindo a óbito devido ao processo de rejeição. (LIMA; MAGALHAES; NAKAMAE, 1997).

Os avanços nos medicamentos imunossupressores, na preservação de órgãos, nas técnicas cirúrgicas e nas medidas de suporte ventilatório e hemodinâmico permitiram que os transplantes de órgãos se tornassem em uma terapêutica de escolha para pacientes com vários tipos de insuficiência orgânica. (MANFRO e FERNANDES, 2001).

A Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), sociedade médica sem fins lucrativos que mantém registro nacional com informações uniformes sobre doações e transplantes, divulga trimestralmente dados estatísticos da doação de órgãos e transplantes realizados no país. No encerramento do ano de 2014, o Registro Brasileiro de Transplantes (veículo oficial da ABTO) destaca dados importantes a cerca do transplante de órgãos, dentre eles destaca-se que o Brasil é o segundo país do mundo em número de transplantes.

Em 2014, o país atingiu a marca de 20.934 transplantes realizados, destes 13.036 foram de córnea, 5.639 de rim, 1.755 de fígado, 126 de pâncreas, 311 de coração e 67 de pulmão. A seguir se apresentam os números absolutos de transplantes de córnea, rim, fígado, pâncreas, coração e pulmão do ano de 2007 a 2014:

Quadro 1 - Número absoluto de transplantes

Número de transplantes

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014

CÓRNEA

9.040

13.341

12.723

14.696

14.696

15.281

13.744

13.036

RIM

3.462

3.815

4.285

4.975

4.975

5.413

5.447

5.639

Doador vivo

1.713

1.740

1.742

1.650

1.650

1.499

1.382

1.384

Doador falecido

1.749

2.035

2.543

3.001

3.325

3.914

4.065

4.255

FÍGADO

1.008

1.177

1.334

1.413

1.496

1.598

1.723

1.755

PÂNCREAS

163

174

160

133

181

151

142

126

CORAÇÃO

161

201

201

166

160

228

271

311

PULMÃO

46

53

59

61

49

69

80

67

Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO)

Apesar dos esforços e dos importantes números de transplantes que colocam o país em destaque internacionalmente, segundo a ABTO, no final de 2014, cerca de 28.523 pessoas aguardavam na fila por um transplante, brasileiros que tem no transplante a última esperança de vida digna ou até mesmo de sobrevivência.

Em relação ao ano de 2014 a ABTO divulgou dados sobre o número de transplantes realizados e o número de pacientes ativos em lista de espera em dezembro de 2014:

Quadro 2 – Número de transplantes realizados e pacientes ativos em lista de espera

Informações relevantes

Córnea

Rim

Fígado

Pâncreas

Coração

Pulmão

Transplantes realizados

13.036

5.639

1.755

126

311

67

Pacientes ativos em lista de espera em dez/2014

8.602

18.147

1.304

19

247

204

Total de pacientes ativos em lista de espera em dez/2014

28.523

Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO)

Após esse breve relato dos dados numéricos da realidade de transplantes no Brasil, percebe-se a importância da edição de um estatuto protetivo que garanta direitos, aos moldes dos direitos da pessoa com deficiência, para essa parcela nova da sociedade brasileira, em pleno crescimento, e ainda carece de proteção após o tão esperado procedimento médico de transplante, que traz consigo a possibilidade de uma vida com dignidade, mas que para ser plena, necessita do amparo do Estado Brasileiro e do empenho de toda a sociedade.

2.1.1 O transplante e o Biodireito

No campo da medicina o progresso biotecnológico está em pleno desenvolvimento e possibilita a sociedade enfrentar os males que comprometem a saúde das pessoas. Da utilização dessas modernas biotecnologias têm surgido novas questões sociais e éticas que antes não existiam no seio da sociedade. A partir dessa nova realidade o estudo da Bioética ganha importância, uma vez que o Direito na maioria das vezes não consegue acompanhar, em tempo real, tantas mudanças.

A bioética nasceu da necessidade de um controle da utilização crescente e invasora de tecnologias cada vez mais numerosas e afinadas nas práticas biomédicas. (LEITE, 1998). Com tantas implicações na sociedade, por consequência do progresso tecnológico, também se acentua cada vez mais a imprescindível presença do Direito ao lado da Bioética na defesa das pessoas perante possíveis violações dos direitos fundamentais do homem.

Assim, no campo da medicina, o progresso biotecnológico surge com o intuito de ajudar a sociedade a enfrentar problemas que comprometem a saúde das pessoas, nesse sentido, muitos avanços médicos se destacam no benefício à saúde humana como as modernas técnicas de transplante, inseminação artificial, células tronco, dentre tantas outras.

A bioética é conceituada por Sauwen (1997, p. 103) como o estudo interdisciplinar, ligado à Ética, que investiga, nas áreas das ciências da vida e da saúde, a totalidade das condições necessárias a uma administração responsável da vida humana em geral e da pessoa humana em particular. Ela nasceu da necessidade de um controle da utilização crescente e invasora de tecnologias cada vez mais numerosas e afinadas nas práticas biomédicas. (LEITE, 1998).

No que tange aos transplantes inúmeros questionamentos tem afetado o ordenamento jurídico brasileiro, em especial o direito à vida, a possibilidade de burlar a fila de espera para doação, o uso de órgãos e tecidos de anencéfalos para transplante, o comércio ilegal de órgãos, a doação coercitiva de órgãos, o transplante de rins entre não parentes, entre outros.

Frente aos avanços da ciência, problemas éticos resultantes dos procedimentos experimentais de transplantes de órgãos trouxeram “grandes dilemas: experiências duvidosas, conceitos de morte revistos, o direito a cidadania, o respeito em relação ao desejo familiar da doação, a esperança de quem precisa urgentemente de um órgão, o aumento na fila de espera e o medo”. (DA SILVA NETO, 2004, p. 16).

Diante do exposto, o presente estudo pretende conscientizar da importância de se incluir nos atuais questionamentos da bioética a utilização da expressão “pessoa transplantada” como forma de garantia da dignidade de segmento social, e ainda a possibilidade da extensão dos direitos da pessoa com deficiência a pessoa transplantada por meio da criação de um estatuto de proteção integral da pessoa transplantada.

 

2.1.2 Ordenamento jurídico brasileiro e o transplante

No Brasil os transplantes são regulamentados por meio da Lei n. 9.434 de 1997, também chamada de Lei dos Transplantes, e alguns dispositivos do Código Civil e do Código Penal. Cabe ressaltar que após sua entrada em vigor a Lei dos Transplantes sofreu importantes alterações trazidas pelas Leis 10.211/2001 e 11.521/2007.

No seu artigo 1º a Lei de Transplantes define que a disposição gratuita de tecidos, órgãos e partes do corpo humano, excetuados o sangue, o esperma e o óvulo é permitida no Brasil no seguinte teor:

Art. 1º A disposição gratuita de tecidos, órgãos e partes do corpo humano, em vida ou post mortem, para fins de transplante e tratamento, é permitida na forma desta Lei.

Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, não estão compreendidos entre os tecidos a que se refere este artigo o sangue, o esperma e o óvulo.

O artigo 4º da referida Lei com alteração dada pela Lei n. 10.211/2001 dispõe que a retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes ou outra finalidade terapêutica dependerá de autorização dos familiares:

Art. 4o A retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes ou outra finalidade terapêutica, dependerá da autorização do cônjuge ou parente, maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo grau inclusive, firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à verificação da morte. (Redação dada pela Lei n. 10.211, de 23.3.2001)

Esse mesmo dispositivo em seu texto original dizia que se presumia a autorização a doação de tecidos, órgãos ou partes do corpo, salvo manifestação em contrário, nos seguintes termos: “Art. 4º Salvo manifestação de vontade em contrário, nos termos desta Lei, presume-se autorizada a doação de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano, para finalidade de transplantes ou terapêutica post mortem”.

Para a doutrina a determinação de doação presumida de tal dispositivo, do ponto de vista jurídico, correspondia uma violação do regime democrático, dentro do qual a regra é a pessoa dizer o que deseja. Do ponto de vista ético, a doação presumida afrontava o princípio da autonomia da vontade e da dignidade da pessoa humana à medida que retirava a autonomia de decidir sobre a disposição do próprio corpo a qualquer tempo por abuso do poder do Estado. (NEVES, 1997 apud KLIEMANN E CATIARI, 2006).

Depois de muitas críticas a tal dispositivo, em março de 2001, foi editada a Lei n. 10.211/2001, modificando a Lei de Transplantes no seu artigo 4º e assim extinguindo a presunção de doação de órgãos. Contudo para alguns juristas a substituição pela decisão da família ainda representa uma afronta jurídica, haja vista que ainda é permitida a remoção, post mortem, de tecidos ou órgãos sem a necessária autorização expressa do indivíduo em vida, violando os princípios da dignidade da pessoa humana e da autonomia da vontade.

Nesse diapasão o Novo Código Civil aprovado pela Lei n. 10.406 de 10 de janeiro de 2002 trouxe a possibilidade de disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte para depois da morte nos ditames do seu artigo 14:

Art. 14. É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte.

Parágrafo único. O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo.

 

Desse modo o artigo 14 do Código Civil supracitado dá a possibilidade de decisão ao indivíduo de dispor do "próprio corpo" num transplante post mortem. Note-se que este dispositivo se adapta perfeitamente aos princípios da Bioética, da dignidade da pessoa humana e da autonomia da vontade, principalmente porque autoriza não só a declaração de disposição de corpo para após a morte, como também a revogação de tal manifestação da vontade a qualquer tempo. (KLIEMANN E CATIARI, 2006).

Cabe esclarecer que o Código Civil regulou apenas os atos declaratórios de vontade de dispor do próprio corpo post mortem, deixando margem à aplicação da Lei dos Transplantes nos casos em que não houve o ato de disposição, cabendo então a decisão a família do de cujus.

Diante do exposto pode-se concluir que o ordenamento jurídico pátrio estabelece importantes dispositivos legais que permitem a realização do transplante, contudo nem o Código Civil, tampouco a Lei dos Transplantes trataram de direitos da pessoa transplantada após o procedimento médico.

2.1.3 O impacto do transplante sobre o trabalho e a renda das famílias

A partir desse ponto, apresentam-se dois estudos científicos na área médica e depoimentos que apontam o impacto do transplante sobre a renda das famílias e a capacidade laborativa da pessoa transplantada.

Em 2005, foi realizado um estudo no Hospital de Base do Distrito Federal com o objetivo de avaliar se o transplante renal, efetivamente, torna possível a recuperação da capacidade laborativa da pessoa transplantada de rim. (LOBO e BELLO, 2006).

Dentre os resultados obtidos na pesquisa destacam-se os seguintes dados:

79 homens (62,9%) e 46 mulheres (37,1%), com média de 40 anos de idade e cinco anos de transplante. Destes, 02 tinham doença incapacitante permanente na época do transplante (1,6%) e 11 após um ano de transplante (8,8%). Quanto ao aspecto de capacitação para o trabalho após um ano de transplante, encontravam-se 113 pacientes aptos (91%), dos quais 41 necessitavam de reabilitação profissional (33%).

Em relação a situação laboral na época do transplante, 28 (22,5%) pacientes eram ativos e 96 (77,4%) inativos. Um ano após o transplante renal, notou-se um acréscimo de pacientes em atividade laborativa, ou seja, 38 (30,6%) estavam ativos e 86 (69,5%) inativos. Contudo, a diferença foi considera não significativa. (LOBO e BELLO, 2006).

 

Nesse estudo os pesquisadores evidenciaram um maior retorno ao mercado de trabalho no grupo dos pacientes com maior escolaridade (ensinos médio e superior). Destaca-se que as pessoas transplantadas analfabetas e com ensino fundamental representaram juntas 53,9% dos inativos após o transplante conforme tabela a seguir:

Quadro 3: Situação do trabalho relacionado à escolaridade.

Escolaridade

Pré-Transplante

Pós-Transplante

Ativos

Inativos

Ativos

Inativos

Analfabeto

0 (0,0%)

7 (5,6%)

0 (0,0%)

7 (5,6%)

Fundamental

20 (16,1%)

62 (50,0%)

22 (17,7%)

60 (48,3%)

Médio

7 (5,6%)

23 (18,5%)

13 (10,4%)

17 (13,7%)

Superior

1 (0,08%)

4 (3,2%)

3 (2,4%)

2 (1,6%)

Subtotal

28 (22,6%)

96 (77,4%)

38 (30,6%)

86 (69,4%)

Total

124 (100%)

124 (100%)

Fonte: LOBO e BELLO, 2006

Em suas conclusões, os pesquisadores destacaram que apesar de 91% dos pacientes estarem aptos ao trabalho após o transplante, o retorno ao mercado de trabalho de 8,1% não foi significativo estatisticamente, e demonstrou grande deficiência dos programas sociais de reabilitação para o trabalho e inclusão social conforme as conclusões a seguir:

91% dos pacientes foram considerados capazes, do ponto de vista de saúde para o trabalho. Destes, 67% poderiam retornar à profissão que exerciam antes do transplante renal e 33% necessitavam de reabilitação profissional. Se levarmos em consideração que 91% dos pacientes encontravam-se capazes de exercer uma atividade laborativa, podemos inferir destes resultados que existe grande deficiência dos programas de reabilitação para o trabalho e inclusão social. (LOBO e BELLO, 2006).

 

Depois do transplante de órgão, muitos sentimentos afetam a pessoa transplantada como depressão, medo da rejeição e ansiedade, os quais com frequência reduzem a capacidade para o trabalho e o convívio social. Nesse contexto é fundamental a reflexão a cerca da importância do trabalho na vida de um ser humano já que “o trabalho pode dar um sentido mais produtivo à vida, bem como um ganho financeiro, na maioria dos casos, refletindo numa melhor qualidade de vida”. (PARIS, 1997 apud LOBO e BELLO, 2006).

Nessa perspectiva, Lobo e Bello (2006) observam que deveriam ser desenvolvidos programas sociais com a finalidade de recolocar os pacientes pós-transplante no mercado de trabalho, evitando a manutenção de gastos previdenciários com indivíduos que reverteram a incapacidade laborativa.

Outra pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, em 2010, aborda a relação entre renda, trabalho e qualidade de vida de pacientes submetidos ao transplante de medula óssea. (MAESTROPIETRO, 2010).

Dados dessa pesquisa revelaram que em relação à situação produtiva a maioria dos pacientes no pré-transplante estavam inseridos no mercado de trabalho, e que após o transplante, a maioria se encontrava afastada de suas ocupações anteriores. Evidenciou-se, ainda, que as condições de pobreza dos pacientes depreciam a qualidade de vida, o sentimento de ser competente em sua vida pessoal e o ajustamento psicológico, o que pode elevar ainda mais os riscos inerentes ao transplante. (MAESTROPIETRO, 2010).

Portanto, a pobreza constitui-se risco potencial para os agravos que podem suceder ao transplante, na medida em que intensificam as dificuldades de seguir orientações rigorosas em termos de higiene, alimentação, moradia e transporte. (MAESTROPIETRO, 2010).

Diante do exposto, pode-se evidenciar a importância do trabalho na qualidade de vida da pessoa transplantada já que a atividade laboral tem um papel determinante no equilíbrio psicológico do ser humano, uma vez que tem implicações diretas nas condições fisiológicas, psíquicas, mentais e sociais do indivíduo. O trabalho traz satisfação pessoal, significa saúde, disposição, diversão, e significa, portanto, vida digna. (CARREIRA e MARCON, 2003).

Em 2001, o nefrologista José Medina Pestana, presidente da ABTO, em entrevista a Revista Isto É, lamentou que apesar do quadro positivo do número de transplantes no Brasil, após o transplante, pode começar uma nova batalha para o transplantado. Para ele “não se trata do problema de driblar a rejeição, mas a dificuldade de se recolocar no mercado de trabalho. Geralmente, se há dois candidatos a uma vaga e um é transplantado, a empresa opta pelo não transplantado”. (ZACHÉ, 2001).

Muitas vezes, a própria rotina de consultas frequentes, as medicações em horários certos e o mal estar após ingestão dos medicamentos podem comprometer a empregabilidade da pessoa transplantada. O médico nefrologista Reginaldo Carlos Boni, da Santa Casa de São Paulo, esclarece que “para garantir o sucesso do transplante, o transplantado deverá seguir à risca as recomendações do médico, tomando corretamente suas medicações, respeitando doses e horários, e realizando os exames que forem solicitados a cada consulta”. E acrescenta “é importante que o receptor compareça a todas as consultas de retorno agendadas, que logo após o transplante serão frequentes”. (COIMBRA, 2011).

Nesse contexto, o Deputado Estadual de São Paulo, Fernando Capez, é autor do Projeto de Lei n. 811/2009 que visa incluir os transplantados na Lei n. 12.907/2008 que consolida a legislação relativa à pessoa portadora de deficiência. Para Capez "os transplantados, muitas vezes, sofrem as mesmas limitações dos portadores de deficiência, merecendo o mesmo amparo do ordenamento jurídico". (CAPEZ, 2009).

O Deputado Estadual acrescenta que “a inserção do transplantado no mercado de trabalho e no engajamento social tem um alto custo pessoal, uma vez que o mesmo deve fazer tratamento constante com medicamentos imunossupressores para evitar a rejeição de órgão”. O uso desses medicamentos "limita o cumprimento das atividades rotineiras em razão de vários efeitos colaterais, como anemia, náuseas, vômitos, diarreia, dor abdominal, febre, calafrios, diminuição de apetite, retinopatia, falta de ar e pressão baixa, entre outros". (CAPEZ, 2009).

Capez (2009) conclui que "muitas vezes o transplantado é vítima de preconceito, que só pode ser combatido com ações que criem oportunidades para sua participação ativa na sociedade”. Portanto, é nesse contexto de necessidade de reinserção social e garantia da dignidade da pessoa humana que se pretende conscientizar da importância de criação do Estatuto de Proteção Integral da Pessoa Transplantada.

 

2.2 OS DIREITOS DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA COMO PARADIGMA PARA CONSTRUÇÃO DO ESTATUTO DE PROTEÇÃO INTEGRAL DA PESSOA TRANSPLANTADA

Diante da atual lacuna jurídica existente no ordenamento pátrio pela ausência de uma legislação que tutele os direitos da pessoa transplantada, pretende-se apresentar uma série de direitos da pessoa com deficiência que devem ser utilizados com o objetivo se suprir esse vazio uma vez que a dignidade da pessoa humana da pessoa transplantada está ameaçada.

A solução legal para garantir uma vida digna à pessoa transplantada fundamenta-se primeiramente na dignidade da pessoa humana, pilastra mestre que sustenta os direitos fundamentais previstos na Constituição. Pelo princípio da dignidade da pessoa humana todo ser humano, pelo simples fato de existir, merece toda proteção, sem qualquer forma de discriminação em razão de sua condição física e saúde, e, por conseguinte toda interpretação da Constituição Federal e da Legislação Infraconstitucional deve fundamentar-se nesse princípio constitucional.

A inexistência de um dispositivo constitucional específico ou de uma legislação infraconstitucional para tutela de pessoa transplantada não pode ser interpretada no sentido de ausência de direitos, mas como uma omissão legislativa do Estado Brasileiro. Portanto, em que pese a inexistência de previsão legal que ampare os direitos da pessoa transplantada é perfeitamente possível a utilização da hermenêutica jurídica com a fim de interpretar a Constituição Federal a partir da garantia da dignidade da pessoa humana.

Nesse contexto, cabe enaltecer os dispositivos constitucionais de proteção da pessoa com deficiência que foram conquistados, ao longo da história, após muitas lutas e sofrimentos, até serem positivados na Constituição Federal, e ainda a recente aprovação do Estatuto da Pessoa com Deficiência em 2015, por meio da Lei n. 13.146/15.

Diante disso, é possível afirmar que os dispositivos constitucionais e o Estatuto da Pessoa com Deficiência devem ser estendidos à pessoa transplantada pela interpretação do âmago de proteção da Constituição Federal de 1988, que visa à inclusão e a de vedação de qualquer forma de discriminação da pessoa com deficiência.

Frente à importância das garantias constitucionais da pessoa com deficiência, a partir desse ponto apresenta-se um resumo histórico da pessoa com deficiência, a construção da conceituação dessa parcela da sociedade, e por fim o bloco de dispositivos constitucionais previstos na Carta Magna de 1988 de inclusão social e tutela da pessoa com deficiência, os quais poderão servir de possível extensão a pessoa transplantada.

2.2.1 Histórico da Pessoa com Deficiência e sua Conceituação

Segundo a autora Maria Aparecida Gugel ao longo da história foram utilizados "termos como aleijado, inválido, incapacitado, defeituoso, desvalido (Constituição de 1934), excepcional (Constituição de 1937), e pessoa deficiente (Emenda Constitucional 12/1978) para designar a pessoa com deficiência". Esses termos continham em sua essência o preconceito de que se tratavam de pessoas sem qualquer valor, socialmente inúteis e dispensáveis do cotidiano social. (GUGEL, 2006, p. 25).

Historicamente as informações sobre as pessoas com deficiência estão contidas de forma esparsa na "literatura grega e romana, na Bíblia, no Talmud e no Corão". Nesse sentido documentos da época destacam que as pessoas com deficiência "em Esparta eram eliminados e os romanos abandavam a própria sorte suas crianças deformadas". (GUGEL, 2006, p. 25).

Durante o Cristianismo, embora se considerasse a pessoa com deficiência “filhos de Deus”, o tratamento concebido caminhava da prestação de caridade ao extermínio para expurgar-lhes dos pecados. Somente após a Revolução Francesa que essa ótica sofre profundas mudanças e passa-se a encarar a deficiência do ponto de vista alquímico, portanto tratável. (GUGEL, 2006, p. 26).

Nesse período com os avanços no conhecimento filosófico e médico surgem as primeiras iniciativas de ensino de comunicação para pessoas surdas, cria-se o código Braille para pessoas cegas, e inventos de ajuda como cadeira de rodas, bengala, próteses, entre outros. (GUGEL, 2006, p. 26).

Porém, é no século XX, após duas Grandes Guerras Mundiais e a Guerra do Vietnã, tragédias humanas que deixaram milhares de mutilados, que surge a necessidade de evolução na reabilitação dessas pessoas mutiladas e sua integração social. Em 1970, a Organização das Nações Unidas proclama a Declaração dos Deficientes Mentais, documento fundamental no processo de inclusão da pessoa com deficiência mental.

Em 1975, a Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou a Declaração dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiências, para atuar como referência no apoio e proteção de direitos, introduzindo o termo “pessoa portadora de deficiência”. (GUGEL, 2006, p. 27).

A partir desse momento várias ações internacionais surgiram como a Classificação Internacional de Impedimentos, Deficiências e Incapacidades, em 1980, da Organização Mundial de Saúde (OMC) e a Convenção nº 159 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 1983, que trata sobre Reabilitação Profissional e Emprego de Pessoas Deficientes, entre outras.

Com relação às divergências terminológicas sobre a conceituação dada para esse grupo social das pessoas com deficiência, percorrer-se-á os termos adotados no decorrer da história. Na Convenção da OIT nº 159, ratificada pelo Brasil por meio do Decreto Legislativo nº 51/1989, a pessoa com deficiência era conceituada, no artigo 1º como “pessoa deficiente” nos seguintes termos: “todas as pessoas cujas possibilidades de obter e conservar um emprego adequado e de progredir no mesmo fiquem substancialmente reduzidas devido a uma deficiência de caráter físico ou mental devidamente comprovada”.

Para Fonseca (2006, p. 267) esse conceito em questão ressalta o caráter funcional das deficiências físicas ou sensoriais, estabelecendo o dever dos países signatários de se engajarem em atividades de integração e viabilizem o exercício das atividades profissionais.

Nesse contexto, em 1999, foi editado o Decreto nº 3.298/99, que regulamenta a Lei Federal n. 7.853/89 a qual dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Em seu artigo 3º, inciso I, o referido define “deficiência” como "toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade". Ainda, de acordo com o artigo 4º do Decreto nº 3.298/99, alterado pelo artigo 70 do Decreto nº 5.296/04 foram estabelecidas cinco categorias de deficiência: física, auditiva, visual, mental e múltipla.

Para Maria Aparecida Gugel a concepção trazida pelo Decreto nº 3.298/99 "ainda que considerada um avanço, não reflete o reconhecimento de que a pessoa com deficiência é sujeito de direitos e, portanto, deve gozar das mesmas e todas as oportunidades". (GUGEL, 2006).

Em 2001, Convenção Interamericana para a Eliminação de todas as formas de discriminação contra a Pessoa Portadora de Deficiência, “Convenção da Guatemala”, ratificada pelo Decreto Legislativo nº 3.956/01, define no seu artigo I a “deficiência” como "uma restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social".

Segundo Gugel (2006, p. 31) esse conceito “reforça a ideia de que a deficiência física, mental ou sensorial decorre das restrições geradas pelas limitações ou restrições que poderão, ou não, serem agravadas pelo ambiente externo”. E acrescenta "se o ambiente externo (a arquitetura urbana, etc) for favorável, estiver adaptado e pronto para receber, integrando eventuais limitações serão superadas".

Por conseguinte não pode o interprete da norma em vigor associar deficiência com incapacidade, especialmente para o trabalho e para a vida independente. Essa nova definição "não se refere a pessoas como incapazes, mas, a todas as pessoas", assim a "atual definição valoriza a condição da pessoa com deficiência elevando-a a sujeito de direitos, e determina que se elimine toda e qualquer forma de discriminação e que se promova a vida independente, a autossuficiência e a sua total integração, em efetiva condição de igualdade". (GUGEL, 2006, p. 32).

Em 2006 a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas teve o objetivo de promover, defender e garantir condições de vida com dignidade e a emancipação das pessoas que têm alguma deficiência. Em 2007 o Brasil assinou-a sem reservas, bem como o seu protocolo facultativo, comprometendo-se com os cinquenta artigos que tratam dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais dos brasileiros com deficiência. Seu texto foi integrado no ordenamento pátrio, como emenda, à Carta Constitucional brasileira, em julho de 2008.

Por fim, cabe esclarecer que apesar de a legislação brasileira, inclusive a Constituição Federal, se referir à "pessoa portadora de deficiência", essa denominação não é mais usada internacionalmente. Desde 2006, o termo passou a ser “Pessoa com Deficiência” conforme o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela Assembléia Geral da ONU, e posteriormente pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 186, de 2008, e ratificado em 1º de agosto de 2008, e que reflete uma tendência mundial.

 

2.2.2 Os Direitos Constitucionais da Pessoa com Deficiência

A Constituição Federal de 1988 tutelou os direitos das pessoas com deficiência em diversos dispositivos expressamente, sem excluí-los dos demais dispositivos constitucionais. Desse modo receberam especial atenção na Carta Magna, e são, por conseguinte, destinatárias de todos os direitos fundamentais inerentes ao ser humano, e por isso devem ter sua dignidade da pessoa humana assegurada pelo Estado Brasileiro.

Há que se ressaltar que a inserção de todos os dispositivos constitucionais de inclusão social da pessoa com deficiência foram conquistados ao longo da história após muita luta e sofrimento, até serem positivados na Carta Magna, com a finalidade sublime de incluir "todas" as pessoas com deficiência na sociedade sem qualquer forma de discriminação.

Diante dessas conquistas é possível afirmar que esses dispositivos devem ser interpretados no seu âmago de inclusão e de vedação de qualquer forma de discriminação a pessoa com deficiência, e por consequência extensíveis a todas as pessoas transplantadas. Assim, ainda que inexista previsão constitucional expressa que ampare os direitos da pessoa transplantada, é possível a interpretação da Constituição Federal buscando seu "espírito" de proteção do substrato mais básico que do ser humano que é a dignidade da pessoa humana.

Após esse breve relato histórico e conceituação da pessoa com deficiência, apresenta-se a seguir o bloco de dispositivos constitucionais que tem por objetivo a tutela dessa minoria social, e que devem ter sua extensão garantida à pessoa transplantada para a criação do seu estatuto de proteção.

 

2.2.1.1 Direito à Igualdade

A Constituição Federal no artigo 5º assegura que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza", consagrando o princípio de igualdade. Cabe ressaltar que para a pessoa com deficiência seja efetivamente igualada em direitos, é fundamental a analise desse princípio sob a ótica da igualdade material, a qual não se confunde com a igualdade formal.

A igualdade formal pode ser considerada a positivação do artigo 5º que estabelece que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza". Contudo, é importante salientar que essa igualdade Ipsis litteris, merece atenção, posto que pode não garantir a todos as mesmas oportunidades, as mesmas condições de vida e de participação social.

Assim sendo, ganha importância a igualdade material que visa dirimir as desigualdades sociais, tratando desigualmente os desiguais na medida da sua desigualdade, a fim de oferecer proteção jurídica a grupos sociais que costumam, ao longo da história, figurar em situação de desvantagem, a exemplo das pessoas com deficiência e recentemente as pessoas transplantadas. (FONSECA, 2006).

Diante do exposto há que se interpretar esse dispositivo constitucional no sentido hermenêutico de dirimir as desigualdades sociais e garantir uma vida digna a pessoa transplantada, aos moldes das políticas públicas voltadas a pessoa com deficiência.

 

2.2.1.2 Direito à Saúde

No Brasil, a Constituição Federal de 1988 sob forte influência das declarações internacionais de direitos humanos apresenta no seu texto diversos dispositivos que tratam expressamente da saúde, tendo sido reservada, ainda, uma seção específica do artigo 196 a 200 sobre o tema, dentro do capítulo destinado à Seguridade Social.

No seu artigo 6º informa que o direito à saúde trata-se de um direito social. No artigo 7º há dois incisos tratando da saúde, o inciso IV que determina que o salário-mínimo deverá ser capaz de atender as necessidades vitais básica do trabalhador e sua família, inclusive a saúde, entre outras, e o inciso XXII, que impõe a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.

No seu artigo 196 a Magna Carta consagrou a saúde como um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Já seu artigo 197 reconhece que as ações e serviços de saúde são de relevância pública, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou por intermédio de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

Por fim, o artigo 198 formulou a estrutura geral do Sistema Único de Saúde (SUS), considerando-o como uma rede regionalizada e hierarquizada, organizada de acordo com as seguintes diretrizes: a) descentralização, com direção única em cada esfera de governo; b) atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; c) participação da comunidade.

Nesse contexto o artigo 18 do Estatuto da Pessoal com Deficiência assegurada a atenção integral à saúde da pessoa com deficiência em todos os níveis de complexidade, por intermédio do SUS, garantido acesso universal e igualitário. Assim sendo é possível verificar dos dispositivos constitucionais acima expostos que a Magna Carta tem na sua essência a atenção integral a saúde do ser humano em todos os níveis de complexidade por meio do SUS o que garante a pessoa transplantada o mesmo tratamento igualitário.

 

2.2.1.3 Direito ao Transporte e à Mobilidade

A Constituição Federal de 1988, no artigo 227, parágrafo 2º prevê que "a lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência".

Com fundamento em dispositivos constitucionais de proteção da pessoa com deficiência foram editadas as Leis n. 10.048/00 e 10.098/00. A Lei Federal n. 10.048/00 determina em seu artigo 3º que as empresas públicas de transporte e as concessionárias de transporte coletivo reservarão assentos, devidamente identificados às pessoas portadoras de deficiência.

Com relação passe livre a Lei Federal n. 8.899/94, regulamentada pelo Decreto 3.691/00, concede o passe livre interestadual no sistema de transporte coletivo interestadual as pessoas portadoras de deficiência comprovadamente carentes. Existem, ainda, por força da competência concorrente, nos termos do artigo 24, inciso XII da Constituição Federal, as legislações Estaduais e do Distrito Federal e por força do artigo 30, inciso VII dos Municipais que garantem a acessibilidade da pessoa com deficiência nos transportes intermunicipais e transportes coletivos municipais.

Por conseguinte, a partir de uma interpretação constitucional é plenamente possível a extensão do direito ao passe livre nos sistemas de transportes coletivos interestaduais, intermunicipais e municipais à pessoa transplantada com vista a suprir a necessidade de ter assegurado seu pleno tratamento médico após o transplante, visto que serão necessários exames e consultas rotineiras para evitar a rejeição do órgão.

 

2.2.1.4 Direito ao Trabalho

O direito do trabalho "constitui-se como direito social, devendo o Estado mobilizar-se para realizar políticas públicas de pleno emprego", posto que “é a partir do trabalho que o ser humano conquista sua independência econômica e pessoal, reafirma sua capacidade produtiva, exercita sua autoestima e se insere na vida em sociedade". Portanto "falar-se em direito do trabalho é assegurar a efetiva realização de todos os outros direitos que espelham a dignidade da pessoa". (FONSECA, 2006, p. 249).

A Constituição Federal no artigo 6º inclui entre os direitos sociais fundamentais, o direito ao trabalho, e prevê no artigo 7º, inciso XXXI, a "proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência".

No seu artigo 227, § 1º, inciso II, a Carta Magna assegura que o Estado promoverá programas de assistência integral, com a "criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência".

No setor público, com fundamento no seu artigo 37, inciso VIII, a Constituição Federal assegura que nos concursos públicos haverá a reserva de cargos e empregos públicos para pessoas com deficiência. Nesse viés, a Lei Federal n. 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico único dos servidores públicos civis da União estabelece no seu artigo 5º, §2º que "é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras, e para tais pessoas reservadas até 20% das vagas oferecidas no concurso".

Já no setor privado, as empresas privadas deverão assegurar reserva de cargos destinados à pessoa com deficiência. Segundo a Lei Federal n. 8.213/91 no seu artigo 93 qualquer empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% a 5% dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas nos seguintes ditames:

Art. 93. A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:

I - até 200 empregados..............................................................................2%;

II - de 201 a 500........................................................................................ 3%;

III - de 501 a 1.000.....................................................................................4%; IV - de 1.001 em diante. ............................................................................5%.

§ 1º A dispensa de trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias, e a imotivada, no contrato por prazo indeterminado, só poderá ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante.

[...]

 

Nesse contexto cabe ressaltar que o Estatuto da Pessoa com Deficiência dispõe no seu artigo 34 que pessoa com deficiência tem direito ao trabalho de sua livre escolha e aceitação, em ambiente acessível e inclusivo, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. Desse modo a pessoa com deficiência tem direito, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, a condições justas e favoráveis de trabalho, incluindo igual remuneração por trabalho de igual valor, sendo vedada restrição ao trabalho da pessoa com deficiência e qualquer discriminação em razão de sua condição, inclusive nas etapas de recrutamento, seleção, contratação, admissão, exames admissional e periódico, permanência no emprego, ascensão profissional e reabilitação profissional, bem como exigência de aptidão plena.

Por fim no seu artigo 35 o Estatuto determina que seja finalidade primordial das políticas públicas de trabalho e emprego promover e garantir condições de acesso e de permanência da pessoa com deficiência no campo de trabalho, inclusive por meio de programas de estímulo ao empreendedorismo e ao trabalho autônomo, que devem prever a participação da pessoa com deficiência e a disponibilização de linhas de crédito.

Diante do exposto, pode-se concluir que a extensão desses direitos visa garantir a inclusão da pessoa transplantada no mercado de trabalho, ao mesmo tempo em que veda qualquer forma de discriminação. Pode-se afirmar que o acesso ao mercado de trabalho visa assegurar a efetiva realização de todos demais direitos que garantem sua dignidade de pessoa humana, uma vez que após a realização do transplante é necessário que a pessoa transplantada tenha condições físicas e psíquicas para evitar a rejeição por meio trabalho que tem esse papel fundamental.

 

2.2.1.5 Direito à Habilitação e à Reabilitação

A Constituição Federal, no artigo 203, inciso IV dispõe que a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, dentre seus objetivos "a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária".

Nesse contexto o Estatuto da Pessoa com Deficiência dispõe no seu artigo 14 que o processo de habilitação e de reabilitação é um direito da pessoa com deficiência. Sendo que o processo de habilitação e de reabilitação tem por objetivo o desenvolvimento de potencialidades, talentos, habilidades e aptidões físicas, cognitivas, sensoriais, psicossociais, atitudinais, profissionais e artísticas que contribuam para a conquista da autonomia da pessoa com deficiência e de sua participação social em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas.

Já no seu artigo 35 o Estatuto trata da Habilitação Profissional e Reabilitação Profissional, dispondo que o poder público deve implementar serviços e programas completos de habilitação profissional e de reabilitação profissional para que a pessoa com deficiência possa ingressar, continuar ou retornar ao campo do trabalho, respeitados sua livre escolha, sua vocação e seu interesse.

Conforme esse dispositivo a habilitação profissional corresponde ao processo destinado a propiciar à pessoa com deficiência aquisição de conhecimentos, habilidades e aptidões para exercício de profissão ou de ocupação, permitindo nível suficiente de desenvolvimento profissional para ingresso no campo de trabalho. Sendo que a habilitação profissional e a reabilitação profissional devem ocorrer articuladas com as redes públicas e privadas, especialmente de saúde, de ensino e de assistência social, em todos os níveis e modalidades, em entidades de formação profissional ou diretamente com o empregador.

Portanto, conforme já exposto anteriormente a direito ao trabalho possibilita a dignificação do ser humano perante a sociedade, assim a possibilidade da pessoa transplantada ter assegurado pelo Estado o seu processo de habilitação ou reabilitação para o trabalho possibilita-lhe adquirir o nível de desenvolvimento profissional suficiente para o ingresso e reingresso no mercado de trabalho, a reintegração na sociedade e a garantia da dignidade da pessoa humana.

 

2.2.1.6 Direito à Aposentadoria

A Carta Magna prevê o direito de aposentadoria no seu artigo 201, que disciplina sobre a previdência social, e dispõe que a aposentadoria é um benefício previdenciário cuja incidência se dá por diversas causas, por exemplo, a aposentadoria por invalidez que é devida àquele que perde a capacidade laborativa. (FONSECA, 2006, p. 261).

No que tange ao §1º do artigo 201, esse dispositivo diz que a vedação de adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, admite exceção quando se tratar dos segurados portadores de deficiência.

Cabe ressaltar que Lei Complementar n. 142 de 2013 regulamenta o § 1o do art. 201 da Constituição Federal, no tocante à aposentadoria da pessoa com deficiência segurada do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, a qual o Estatuto faz referência no seu artigo 41 ao tratar do direito à previdência social.

Conforme o artigo 2º dessa Lei Complementar para o reconhecimento do direito à aposentadoria considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. 

Nesse sentido com vistas a assegurar a dignidade da pessoa humana o artigo 201, §1º da Carta Magna pode ser interpretado no sentido de inclusão do segurado do regime geral de previdência social, que realize um transplante e necessite de aposentadoria, ter um tratamento diferenciado conforme a Lei Complementar n. 142/2013.

 

2.2.1.7 Direito à Assistência Social

O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal fixa o benefício continuado, de caráter assistencial, em favor da pessoa com deficiência ou idosa, "que não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".

Em razão desse dispositivo a Lei Federal n. 8.742/93 define no artigo 1º a assistência social como "direito do cidadão e dever do Estado" e tem como objetivo, dentre outros, a "promoção da integração à vida comunitária das pessoas portadoras de deficiência".

Essa lei assegura 01 (um) salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência, que comprove não possuir os meios de prover a sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 do salário mínimo, direito este reafirmado pelo artigo 40 do Estatuto da Pessoa com Deficiência.

Nesse diapasão o Estatuto determina no seu artigo 39 que os serviços, os programas, os projetos e os benefícios no âmbito da política pública de assistência social à pessoa com deficiência e sua família têm como objetivo a garantia da segurança de renda, da acolhida, da habilitação e da reabilitação, do desenvolvimento da autonomia e da convivência familiar e comunitária, para a promoção do acesso a direitos e da plena participação social.

Diante do exposto a previsão constitucional do artigo 203, inciso V da Constituição Federal merece a devida extensão de direitos posto que se mostra fundamental para a garantia da dignidade da pessoa transplantada que não possua meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, uma vez que assegura o acesso a um benefício continuado no valor de um salário mínimo, fundamental para a sobrevivência e a luta contra a rejeição do órgão.

 

2.2.2 Estatuto da Pessoa com Deficiência – Lei n. 13.146/15

Em 06 julho de 2015 foi aprovado o Estatuto da Pessoa com Deficiência por meio da Lei Federal n. 13.146/2015 que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência.

Em relação ao emprego do termo “estatuto”, Pablo Stolze enfatiza que “este importante estatuto, pela amplitude do alcance de suas normas, traduz uma verdadeira conquista social. Trata-se, indiscutivelmente, de um sistema normativo inclusivo, que homenageia o princípio da dignidade da pessoa humana em diversos níveis”. (STOLZE, 2015)

No seu artigo 1º a Lei dispõe que tem como base a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, ratificados pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo no 186/2008, em conformidade com o procedimento previsto no § 3o do artigo 5o da Constituição Federal, e promulgados pelo Decreto no 6.949/2009.

De acordo com o artigo 2º do Estatuto considera-se “pessoa com deficiência” aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.  

Desse modo, em relação à pessoa com deficiência não deve ser mais tecnicamente considerada civilmente incapaz, na medida em que os artigos 6º e 84, do mesmo diploma, deixam claro que a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa:

Art. 6o  A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para:

I - casar-se e constituir união estável;

II - exercer direitos sexuais e reprodutivos;

III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar;

IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;

V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e

VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

 

Art. 84.  A pessoa com deficiência tem assegurado o direito ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas.

[...]

Para Stolze (2015) o Estatuto pretendeu, homenageando o princípio da dignidade da pessoa humana, fazer com que a pessoa com deficiência deixasse de ser “rotulada" como incapaz, para ser considerada, em uma perspectiva constitucional isonômica, dotada de plena capacidade legal, ainda que haja a necessidade de adoção de institutos assistenciais específicos, como a tomada de decisão apoiada e, extraordinariamente, a curatela, para a prática de atos na vida civil.

Por fim a Lei Brasileira de Inclusão, nos termos do seu artigo 94, criou o “auxílio-inclusão” que será pago a pessoa com deficiência moderada ou grave que receba o benefício de prestação continuada, e que passe a exercer atividade remunerada que a enquadre como segurado obrigatório do RGPS; ou que tenha recebido, nos últimos 5 (cinco) anos, o benefício de prestação continuada, e que exerça atividade remunerada que a enquadre como segurado obrigatório do RGPS.

Ante ao exposto, diante do propósito da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência de promover, proteger e assegurar o exercício pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente é que por meio deste estudo que se busca demonstrar a necessidade de extensão de direitos a pessoa transplantada com o fim de criação do Estatuto de Proteção Integral da Pessoa Transplantada.

 

2.3 DIREITO COMPARADO ARGENTINO: O SISTEMA DE PROTECCIÓN INTEGRAL PARA PERSONAS TRASPLANTADAS - LEY 26.928 de 2014

No âmbito internacional apresenta-se a recente Lei n. 26.928 promulgada em 10 de janeiro de 2014 pelo Parlamento Argentino que cria o Sistema de Protección Integral para Personas Trasplantadas. Segundo seu o artigo 1º o objeto da referida lei é a criação de um sistema global de proteção das pessoas que receberam transplantes ou estão na lista de espera para transplantes no Estado Argentino.

Segundo Gonzalez (2014,) esta nova lei Argentina, única no mundo, é a chave para uma verdadeira inclusão social e laboral de pessoas transplantadas. Nesse sentido Fernández (2014) em analise a aprovação da referida lei esclarece que o transplante tem a capacidade de restaurar a esperança e qualidade de vida. No entanto, apesar dos enormes benefícios que envolvem a intervenção médica para aqueles que conseguem receber o órgão de que necessitam, alguns obstáculos permanecem, como as dificuldades de inserção ou reinserção no mercado de trabalho são o denominador comum que sofre a grande maioria das pessoas transplantadas na Argentina.

Nesse viés Fernández (2014) apresenta o depoimento do Advogado e transplantado Alejandro González, o qual relata que o cerne da questão é que o transplantado está em desvantagem para trabalhar ou conseguir um emprego, mesmo que sejam capazes de fazê-lo, porque a situação legal é absolutamente única: não é considerado pessoa com deficiência, mas também nunca obtem alta hospitar, de modo que dificilmente passam por um teste ocupacional.

O Sistema de Porteção Integral das Pessoas Transplantadas tem por fim de preservar o direito à saúde de pessoas transplantadas residente na Argentina assegurando o seu direito à saúde de tal modo que permita as pessoas transplantadas viverem com dignidade, através da implantação de um sistema de proteção e a adoção de leis para a garantia da igualdade de acesso aos cuidados médicos. (CABRAL, 2014).

A referida lei conta com quinze artigo com vistas a promover medidas de ações positivas para assegurar uma efetiva igualdade de oportunidades e de tratamento, e o pleno gozo e exercício dos direitos reconhecidos pela Constituição Argentina e pelos tratados internacionais sobre direitos humanos, particularmente no que diz respeito à pessoa transplantada. Desse modo essa lei visa assegurar que as pessoas transplantadas tanto a integração familiar quanto social através da assistência médica completa, da educação em todos os níveis, da segurança social e do emprego. (ROMERO, 2014).

Dentre os benefícios previstos na referida lei estão:

a) a cobertura de 100% no fornecimento de medicamentos, testes de diagnóstico e cuidados de todas as doenças que estão direta ou indiretamente relacionadas com o transplante (art. 4º);

b) o fornecimento de passagens de transporte terrestre ou transporte fluvial de passageiros sob jurisdição nacional, no caminho entre a casa e qualquer destino necessário para comparecer por razões de cuidados devidamente credenciados. O Benefício deve ser estendido para um companheiro se a necessidade for comprovada (art. 5º);

c) a adoção de planos e medidas para facilitar as pessoas transplantadas o acesso a uma habitação adequada ou que se adapte às exigências que a sua condição exigir (art. 6º);

d) nas relações de trabalho, seja nos setores público e privado, e em relação à exigência de exames pré-emprego, é proibida como motivo de desclassificação para a admissão ou a manutenção de uma relação de trabalho ser transplantado ou estar matriculado em lista de espera para doação, sendo que a ignorância desse direito será considerado ato discriminatório (art. 7º);

e) direito a licenças especiais que permitam estudar, reabilitação e tratamento inerente à recuperação e manutenção de seu estado de saúde, sempre que necessário, sem a perda do emprego (art 8º);

f) o empregador tem o direito de uma dedução especial no cálculo Imposto de Renda equivalente a 70% em cada período fiscal, sobre a remuneração paga aos trabalhadores transplantados ou na lista de espera para doação (art 9º);

g) o Ministério de Trabalho deve promover o incentivo à criação de programas de emprego, empreendedorismo e oficinas protegidas para as pessoas transplantadas ou na lista de espera para doação (art 10º);

h) o Estado deve fornecer subsídio mensal não contributivo, equivalente a uma pensão por invalidez, para as pessoas transplantadas ou na lista de espera para doação em situação de desemprego forçado e que não tem qualquer outro benefício de pensão (art 11º);

Diante de todo o exposto, fica evidente a importância da lei do Estado Argentino que criou o primeiro Sistema de Proteção Integral das Pessoas Transplantadas do mundo, na medida em que visa  a proteger os direitos das pessoas transplantadas tendo por base uma visão abrangente para a garantia da qualidade de vida humana digna, visto que as pessoas transplantadas precisam fazer um grande esforço físico e mental para se adaptar às suas novas condições de vida, tanto biologicamente, psicologicamente e socialmente.

 


CAPÍTULO III

O ESTATUTO DE PROTEÇÃO INTEGRAL DA PESSOA TRANSPLANTADA

3 DEFINIÇÃO DO ROL MÍNIMO DE DIREITOS DO ESTATUTO DE PROTEÇÃO INTEGRAL DA PESSOA TRANSPLANTADA

Em que pese a inexistência de previsão constitucional e legislação específica que ampare os direitos da pessoa transplantada em nível nacional é perfeitamente possível a utilização da hermenêutica jurídica com o objetivo de interpretação da Constituição Federal e da Legislação Infraconstitucional buscando o "espírito da lei", ou seja, com vistas a finalidade edição de um Estatuto de Proteção que vise a inclusão social da pessoa transplantada.

Nesse contexto a Constituição Federal de 1988, conhecida como a "Constituição Cidadã", em nenhum dispositivo proíbe a possibilidade extensão de direitos da pessoa com deficiência a pessoa transplantada, frente à garantia da dignidade da pessoa humana núcleo central do qual emanam todos os demais direitos fundamentais.

Há que se observar que todos os dispositivos constitucionais supracitados de inclusão social da pessoa com deficiência foram conquistados ao longo da história até serem positivados na Constituição Federal com a finalidade sublime de incluir "todas" as pessoas na sociedade Brasileira sem qualquer forma de discriminação.

Nesse sentido à luz da Constituição Brasileira, seria prudente a extensão dos direitos da pessoa com deficiência a pessoa transplantada com a finalidade de criação do Estatuto de Proteção Integral da Pessoa Transplantada que abranja vários aspectos da vida como acesso à moradia, saúde, assistência social e psicológica, trabalho, habilitação, reabilitação e transporte.

Portanto, após toda fundamentação jurídica apresentada até o momento apresenta-se a seguir uma relação de direitos das pessoas com deficiência possíveis de extensão as pessoas transplantadas com o objetivo inclusão social e laboral diante das necessidades emergentes da situação enfrentada pelas pessoas que receberam um transplante ou que estão na lista de espera para transplante.

 

3.1 A RELAÇÃO DE DIREITOS DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA POSSÍVEIS DE EXTENSÃO A PESSOA TRANSPLANTADA

Diante da necessidade de criação do Estatuto de Proteção Integral da Pessoa Transplantada faz-se necessária enumerar os principais direitos da pessoa com deficiência previstos na legislação pátria possíveis de extensão as pessoas transplantadas com vista à garantia da dignidade da pessoa humana e dos direitos fundamentais.

Por conseguinte, será apresentada uma séria de direitos de maneira detalhada com vistas a demonstrar que seria perfeitamente possível a extensão de direitos devido a diversos aspectos que já foram apresentados até o momento e que tem como pano de fundo a dignidade humana.

 

3.1.1 Reserva de Cargos em Empresas Privadas

Desde 1991, instituiu-se no país a reserva de vagas para pessoas com deficiência nas empresas privadas, que varia de 2% a 5%, conforme porte da empresa, com previsão no artigo 93 da Lei n. 8.213/91.

No campo histórico desde a Revolução Francesa observa-se uma tendência de quase todas as nações no sentido de que as políticas públicas voltadas para a pessoa com deficiência devem se afastar do modelo puramente assistencial e priorizar a inclusão social e laboral, adotando-se incentivos ou cotas para trabalhadores com deficiência tanto no setor público quanto no setor privado. (BAARS, 2009, p. 3).

No que diz respeito ao direito positivo brasileiro a legislação referente ao trabalho da pessoa com deficiência acompanha esse entendimento internacional de incentivo e inclusão da pessoa com deficiência, nos termos do inciso XXXI do art. 7º da Constituição Federal, que proíbe qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do portador de deficiência.

Nesse sentido a política de cotas trata-se de uma ação afirmativa importante para promover a dignidade e a independência da pessoa com deficiência. É importante, ainda, para promover o desenvolvimento da nação, na medida em que estimula que as pessoas sejam produtivas, ao invés de permanecerem na inatividade e na dependência de ações assistenciais do governo. (BAARS, 2009, p. 3).

A reserva de cargos para pessoas com deficiência nas empresas privadas está garantida no artigo 7º, inciso XXXI da Constituição Federal e teve sua criação por meio do artigo 93 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, a seguir transcrito:

Art. 93. A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:

I - até 200 empregados...............................................................................2%;

II - de 201 a 500......................................................................................3%;

III - de 501 a 1.000..................................................................................4%;

IV - de 1.001 em diante. .........................................................................5%.

§ 1º A dispensa de trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias, e a imotivada, no contrato por prazo indeterminado, só poderá ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante.  

§ 2º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social deverá gerar estatísticas sobre o total de empregados e as vagas preenchidas por reabilitados e deficientes habilitados, fornecendo-as, quando solicitadas, aos sindicatos ou entidades representativas dos empregados.

 

Diante do exposto pode-se afirmar que a política de cotas é imprescindível para promover a empregabilidade da pessoa com deficiência uma vez que essa ação afirmativa tem a finalidade de gerar igualdade. É nesse viés de inclusão laboral que a extensão da reserva de cargos nas empresas privadas a pessoa transplantada pode proporcionar uma maior garantia de participar do mercado de trabalho com respeito à isonomia.

 

3.1.2 Reserva de Cargos e Empregos Públicos em Concursos Públicos

A reserva de cargos e empregos no setor público encontra previsão no artigo 37, inciso VIII da Constituição Federal o qual foi normatizado em âmbito federal por meio do §2º do artigo 5º da Lei n. 8.112, de 11 de dezembro de 1990, pelo qual restou explicitado que devem ser reservadas até 20% das vagas oferecidas em concurso público para as pessoas com deficiência:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[...]

VIII - a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão;

 

Art. 5o  São requisitos básicos para investidura em cargo público:

[...]

§ 2o  Às pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso.

 

O percentual mínimo de reserva de cargos foi estabelecido pelo artigo 37 do Decreto nº 3.298/1999 que dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, com a reserva de 5% das vagas para pessoas com deficiência:

Art. 37.  Fica assegurado à pessoa portadora de deficiência o direito de se inscrever em concurso público, em igualdade de condições com os demais candidatos, para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que é portador.

§ 1o  O candidato portador de deficiência, em razão da necessária igualdade de condições, concorrerá a todas as vagas, sendo reservado no mínimo o percentual de cinco por cento em face da classificação obtida.

§ 2o  Caso a aplicação do percentual de que trata o parágrafo anterior resulte em número fracionado, este deverá ser elevado até o primeiro número inteiro subseqüente.

 

Portanto é assegurado às pessoas com deficiência o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo e empregos públicos cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência sendo-lhes reservadas no mínimo 20 por cento das vagas oferecidas no concurso. Diante da realidade fática enfrentada pela pessoa transplantada a extensão do direito a reserva de cargos e empregos públicos traria a possibilidade de empregabilidade importante no restabelecimento do convívio social da pessoa transplantada.

 

3.1.3 Habilitação e Reabilitação

Conforme dispõe o recente Estatuto da Pessoa com Deficiência no seu artigo 14 o processo de habilitação e de reabilitação é um direito da pessoa com deficiência, e tem por objetivo o desenvolvimento de potencialidades, talentos, habilidades e aptidões físicas, cognitivas, sensoriais, psicossociais, atitudinais, profissionais e artísticas que contribuam para a conquista da autonomia da pessoa com deficiência e de sua participação social em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas.

No seu artigo 36 o Estatuto dispõe que o poder público deve implementar serviços e programas completos de habilitação profissional e de reabilitação profissional para que a pessoa com deficiência possa ingressar, continuar ou retornar ao campo do trabalho, respeitados sua livre escolha, sua vocação e seu interesse.

Portanto a habilitação e a reabilitação tratam-se de processos orientados a possibilitar que a pessoa com deficiência, a partir da identificação de suas potencialidades laborativas, adquira o nível suficiente de desenvolvimento profissional para ingresso e reingresso no mercado de trabalho e participar da vida comunitária, que são de possível extensão as pessoas transplantadas.

 

3.1.4 Aposentadorias das Pessoas com Deficiência

Nos termos do artigo 201, §1º da Constituição Federal é vedada adoção de requisitos e critérios diferenciados de para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, ressalvado quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar, no seguinte teor:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:  

[...]

§ 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar.

 

Nesse viés a Lei Complementar n. 142/2013 veio a regulamentar o referido § 1º do artigo 201 da Constituição Federal, no tocante à aposentadoria da pessoa com deficiência segurada do Regime Geral de Previdência Social - RGPS.

Segundo a referida lei no seu artigo 2º para o reconhecimento do direito à aposentadoria considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. 

O artigo 3º, inciso IV da presente lei que dispõe sobre a aposentadoria por idade da pessoa com deficiência aos 60 (sessenta) anos de idade para homens e aos 55 (cinqüenta e cinco) anos de idade para mulheres desde que cumprido o mínimo de contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período:

Art. 3o É assegurada a concessão de aposentadoria pelo RGPS ao segurado com deficiência, observadas as seguintes condições: 

[...]

IV - aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período. 

Parágrafo único.  Regulamento do Poder Executivo definirá as deficiências grave, moderada e leve para os fins desta Lei Complementar. 

 

Já o artigo 3º, incisos I, II e III que dispõem sobre a aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência conforme o tempo mínimo de contribuição para homens e mulheres e a gravidade da deficiência para a concessão de aposentadoria:

Art. 3o É assegurada a concessão de aposentadoria pelo RGPS ao segurado com deficiência, observadas as seguintes condições: 

I - aos 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência grave; 

II - aos 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada; 

III - aos 33 (trinta e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência leve; ou 

IV - aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período. 

Parágrafo único.  Regulamento do Poder Executivo definirá as deficiências grave, moderada e leve para os fins desta Lei Complementar. 

 

Diante do exposto pode se concluir que o conceito de pessoa com deficiência, para fins de concessão desses benefícios, não implica em invalidez, mas em “impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.” Portanto não haveria maiores problemas para a extensão de direitos a pessoa transplantada.

 

3.1.5 Aposentadoria por Invalidez Decorrente de Doença Grave

Nos ditames do artigo 42 Lei n. 8.213/91 e regulamentada pelo Decreto nº 3.048/99 a aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.

Para a concessão de aposentadoria por invalidez será necessária a verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.

Deste modo será concedida a aposentadoria por invalidez ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz de forma total e permanente para o trabalho e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. Desse modo sendo uma pessoa transplantada segurada da previdência seria perfeitamente possível buscar o direito a aposentadoria por invalidez decorrente do agravamento da saúde que a torne incapaz de garantir a própria subsistência e insuscetível de recuperação.

 

3.1.6 Aposentadoria por Invalidez Permanente do Servidor Público

A Constituição Federal de 1988 traz no seu artigo 40, §1º, inciso I a possibilidade dos servidores públicos titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios serem aposentados por invalidez permanente com proventos proporcionais, exceto se decorrente de acidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, na forma da lei:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.

[...]

§ 1º Os servidores abrangidos pelo regime de previdência de que trata este artigo serão aposentados, calculados os seus proventos a partir dos valores fixados na forma dos §§ 3º e 17: 

I - por invalidez permanente, sendo os proventos proporcionais ao tempo de contribuição, exceto se decorrente de acidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, na forma da lei;

No âmbito federal a Lei n. 8.112/90 que estabelece o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, prevê a aposentadoria por invalidez permanente, nos seus artigos 186 e seguintes:

Art. 186.  O servidor será aposentado:   

I - por invalidez permanente, sendo os proventos integrais quando decorrente de acidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, especificada em lei, e proporcionais nos demais casos;

[...]

§ 1o  Consideram-se doenças graves, contagiosas ou incuráveis, a que se refere o inciso I deste artigo, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira posterior ao ingresso no serviço público, hanseníase, cardiopatia grave, doença de Parkinson, paralisia irreversível e incapacitante, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estados avançados do mal de Paget (osteíte deformante), Síndrome de Imunodeficiência Adquirida - AIDS, e outras que a lei indicar, com base na medicina especializada.

[...]

§ 3o  Na hipótese do inciso I o servidor será submetido à junta médica oficial, que atestará a invalidez quando caracterizada a incapacidade para o desempenho das atribuições do cargo ou a impossibilidade de se aplicar o disposto no art. 24. 

 

Diante da previsão de aposentadoria por invalidez permanente dos servidores públicos apresenta-se um questão polêmica em relação à pessoa transplantada. Em analise ao rol de doenças do artigo 186, §1º verifica-se que se consideram doenças graves, contagiosas ou incuráveis a cardiopatia grave e nefropatia grave. Sendo assim se um servidor público for acometido de cardiopatia grave ou de nefropatia grave poderá se aposentar por invalidez permanente com os proventos integrais. Por outro norte se esse mesmo servidor público se submeter a um transplante de coração ou de rim poderá se aposentar por invalidez permanente com proventos proporcionais se não recuperar a capacidade para a atividade laborativa.

 Ante ao exposto pode afirmar que o servidor público pode ser aposentado por invalidez permanente decorrente de acidente em serviço, moléstia profissional, doenças graves, contagiosas ou incuráveis, com proventos integrais ao passo que a pessoa transplantada receberia proventos proporcionais. Assim fica evidente a necessidade de extensão de direitos a pessoa transplantada com fulcro na dignidade humana e no tratamento isonômico. No que tange aos Servidores Públicos Estaduais e Municipais estes são regidos por legislação específica dos respectivos Entes que seguem as mesmas regras previstas na Constituição Federal.

 

3.1.7 Auxílio-doença

O benefício previdenciário de auxílio-doença é devido ao segurado que havendo cumprido o prazo de carência quando for o caso ficar incapacitado para o trabalho por mais de 15 (quinze) dias, nos ditames do artigo 59 da Lei n. 8.213/91 que é regulamentada pelo Decreto nº 3.048/99:

Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.

Parágrafo único. Não será devido auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.

 

Desse modo é concedido o auxílio-doença para os segurados da previdência que apresentarem incapacidade temporária para o trabalho ou para a sua atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos, em virtude de alguma enfermidade recuperável, direito que englobaria uma pessoa transplantada incapacitada para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.

 

3.1.8 Benefício de Prestação Continuada

Conforme o artigo 203, inciso V, da Constituição Federal será garantido o benefício continuado, de caráter assistencial, em favor da pessoa com deficiência ou idosa, "que não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".

Esse dispositivo constitucional foi regulamentado pela Lei Federal n. 8.742/93 que assegura 01 (um) salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência, que comprove não possuir os meios de prover a sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 do salário mínimo, direito este reafirmado pelo artigo 40 do Estatuto da Pessoa com Deficiência.

Em respeito à garantia da dignidade humana fica evidente a necessidade de extensão desse direitos as pessoas transplantadas que não possuam meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, uma vez que assegura o acesso a um benefício continuado no valor de um salário mínimo, fundamental para a sobrevivência.

 

3.1.9 Passe Livre de Transporte Interestadual

A Lei Federal n. 8.899/94 concede passe livre às pessoas portadoras de deficiência no sistema de transporte coletivo interestadual. Conforme o artigo 1º é concedido passe livre às pessoas portadoras de deficiência, comprovadamente carentes, no sistema de transporte coletivo interestadual.

Em 2000 foi editado o Decreto 3.691/00 para regulamentar a Lei n. 8.899/94, que dispõe sobre o transporte de pessoas portadoras de deficiência no sistema de transporte coletivo interestadual. Segundo seu artigo 1º as empresas permissionárias e autorizatárias de transporte interestadual de passageiros reservarão dois assentos de cada veículo, destinado a serviço convencional, para ocupação das pessoas deficientes comprovadamente carentes.

Por conseguinte, aos moldes da Lei Argentina seria perfeitamente possível a extensão desse direito as pessoas transplantadas com a finalidade de garantir o devido tratamento de saúde.

 

3.1.10 Direito ao Programa Minha Casa, Minha Vida da Pessoa com Deficiência

Em 2009 a Lei Federal n. 11.977/09 criou o Programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV que tem, nos termos do artigo 1º, por finalidade criar mecanismos de incentivo à produção e aquisição de novas unidades habitacionais ou requalificação de imóveis urbanos e produção ou reforma de habitações rurais, para famílias com renda mensal de até R$ 4.650,00 (quatro mil, seiscentos e cinquenta reais) e compreende os seguintes subprogramas: o Programa Nacional de Habitação Urbana - PNHU e  o Programa Nacional de Habitação Rural - PNHR.

Segundo o artigo 3º, inciso V, da referida lei para a indicação dos beneficiários do Programa Minha Casa, Minha Vida deverão ser observados dentre os requisitos a prioridade de atendimento às famílias de que façam parte pessoas com deficiência. 

Em 2015 foi aprovado o Estatuto da Pessoa com Deficiência o qual garante no seu artigo 31 que a pessoa com deficiência tem direito à moradia digna, no seio da família natural ou substituta, com seu cônjuge ou companheiro ou desacompanhada, ou em moradia para a vida independente da pessoa com deficiência, ou, ainda, em residência inclusiva.

Esse mesmo Estatuto dispõe que nos programas habitacionais, públicos ou subsidiados com recursos públicos, a pessoa com deficiência ou o seu responsável goza de prioridade na aquisição de imóvel para moradia própria, observada a reserva de, no mínimo, 3% (três por cento) das unidades habitacionais para pessoa com deficiência.

Desse modo diante do cenário nacional de inclusão social da pessoa com deficiência destaca-se a importância dessas leis que instituem ações afirmativas para garantia de atendimento de atendimento prioritária a famílias que tem entre os membros uma pessoa com deficiência com vista à garantia do direito à moradia digna.

Por conseguinte seguindo os moldes da Lei Argentina seria perfeitamente possível a extensão desses direitos a pessoa transplantada para a adoção de planos e políticas públicas para facilitar as pessoas transplantadas o acesso a uma habitação adequada.

 

3.1.11 Isenção do Imposto de Renda nos Proventos de Aposentadoria, Reforma ou Pensão

A Lei Federal n. 7.713 de 1988 trata do imposto de renda e dispõe no seu artigo 6º, inciso XIV, a possibilidade de isenção do imposto de renda dos rendimentos percebidos por pessoas físicas em razão de proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma.

Desse modo existe a possibilidade de isenção do Imposto de Renda de Pessoa Física dos proventos de aposentadoria, reforma ou pensão motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de doenças graves enumeradas no artigo como a cardiopatia grave e a nefropatia grave, entre outros, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma, salvo a pensão.

Assim, da mesma forma que foi tratada a aposentadoria por invalidez permanente do servidor público fica evidente a necessidade de extensão de direitos a pessoa transplantada com fulcro na dignidade humana e no tratamento isonômico. Posto que se um servidor público for acometido de cardiopatia grave ou de nefropatia grave poderá se aposentar por invalidez permanente e obter isenção do imposto de renda pessoa física. Por outro lado se esse mesmo servidor público se submeter a um transplante de coração ou de rim poderá se aposentar por invalidez permanente com proventos proporcionais se não recuperar a capacidade para a atividade laborativa e não obter a referida isenção.

 

3.1.12 Isenção do IPI na Compra de Veículos de Passageiros

As pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, ainda que menores de 18 (dezoito) anos, poderão adquirir, diretamente ou por intermédio de seu representante legal, com isenção do IPI, automóvel de passageiros ou veículo de uso misto, de fabricação nacional, classificado na posição 87.03 da Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (TIPI).

Nesse viés a Lei Federal n. 8.989/95 dispõe sobre a Isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, na aquisição de automóveis para utilização no transporte autônomo de passageiros, bem como por pessoas portadoras de deficiência física.

Segundo o artigo 1º, inciso IV, da referida lei ficam isentos do Imposto Sobre Produtos Industrializados – IPI os automóveis de passageiros de fabricação nacional, equipados com motor de cilindrada não superior a dois mil centímetros cúbicos, de no mínimo quatro portas inclusive a de acesso ao bagageiro, movidos a combustíveis de origem renovável ou sistema reversível de combustão, quando adquiridos por pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, diretamente ou por intermédio de seu representante legal.

Por conseguinte o direito da pessoa com deficiência de adquirir automóveis de passageiros de fabricação nacional, equipados com motor de cilindrada não superior a dois mil centímetros cúbicos pode ser aplicado às pessoas transplantadas com o fim de proporcioná-las uma melhor qualidade de vida durante os deslocamentos necessários aos tratamentos médicos.

 

3.1.13 Isenção do IOF nas Operações de Financiamento para Aquisição de Veículos

Segundo a Lei Federal n. 8.383/91, artigo 72, inciso IV, estão isentas do IOF as operações de financiamento para a aquisição de automóveis de passageiros de fabricação nacional de até 127 HP de potência bruta (SAE), quando adquiridos por pessoas portadoras de deficiência física, atestada pelo Departamento de Trânsito do Estado onde residirem em caráter permanente, cujo laudo de perícia médica especifique: o tipo de defeito físico e a total incapacidade do requerente para dirigir automóveis convencionais; e a habilitação do requerente para dirigir veículo com adaptações especiais, descritas no referido laudo.

Da mesma forma que a isenção do IPI esse direito da pessoa com deficiência de adquirir automóveis de passageiros com isenção de IOF pode ser aplicado às pessoas transplantadas com o fim de proporcioná-las uma melhor qualidade de vida durante os deslocamentos necessários aos tratamentos médicos.

 

3.1.14 Isenção do ICMS na Compra de Automóveis por Deficientes

Em relação ao Imposto sobre a Circulação de Mercadoria e prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) o Convênio ICMS nº 38/2012 do Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ, cláusula primeira, prevê que ficam a isentas do ICMS as saídas internas e interestaduais de veículo automotor novo quando adquirido por pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, diretamente ou por intermédio de seu representante legal.

O benefício previsto nesta cláusula somente se aplica a veículo automotor novo cujo preço de venda ao consumidor sugerido pelo fabricante, incluídos os tributos incidentes, não seja superior a R$ 70.000,00 (setenta mil reais)

Em relação ao Estado de Santa Catarina o Decreto nº 2.870/2001 que aprova o Regulamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação do Estado de Santa Catarina tratou da referida isenção no seguinte teor:

Art. 2° São isentas as seguintes operações internas e interestaduais:

[...]

XIV – a saída dos equipamentos e acessórios relacionados na, Seção VIII do Anexo 1, que se destinem, exclusivamente, ao atendimento a pessoas portadoras de deficiência física, auditiva, mental, visual e múltipla, cuja aplicação seja indispensável ao seu tratamento ou à sua locomoção, desde que adquiridos por instituições públicas estaduais ou entidades assistenciais sem fins lucrativos vinculadas a programa de recuperação de portadores de deficiência (Convênios ICMS  38/91, 121/95,100/96, 05/99, 10/01, 30/03, 18/05, 124/07, 148/07, 53/08, 71/08, 138/08, 69/09, 119/09. 01/10 e 101/12);

 

Art. 38. Ficam isentas do ICMS as saídas internas e interestaduais de veículo automotor novo quando adquirido por pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, diretamente ou por intermédio de seu representante legal, observado o seguinte:

I – o benefício correspondente deverá ser transferido ao adquirente do veículo, mediante redução no seu preço;

II – aplica-se a veículo automotor novo cujo preço de venda ao consumidor sugerido pelo fabricante, incluídos os tributos incidentes, não seja superior a R$ 70.000,00 (setenta mil reais);

III – somente se aplica ao adquirente que não possuir débitos para com a Fazenda Pública estadual;

IV – o veículo automotor deverá ser adquirido e registrado no Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN) em nome da pessoa portadora de deficiência; e

V – o representante legal ou o assistente da pessoa portadora de deficiência responde solidariamente pelo imposto que deixar de ser pago em razão da isenção de que trata esta Seção.

[...]

 

Também da mesma forma que a isenção do IPI e do IOF esse direito da pessoa com deficiência de adquirir automóveis de passageiros com isenção de ICMS pode ser aplicado às pessoas transplantadas com o fim de proporcioná-las uma melhor qualidade de vida durante os deslocamentos necessários aos tratamentos médicos.

 

3.1.15 Isenção do IPVA na Compra de Veículos por Deficientes

As disposições quanto à isenção do imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA), tributo de competência estadual por força do artigo 155, inciso III da Constituição Federal, poderá variar conforme dispuser a legislação de cada Estado.

No Estado de Estado de Santa Catarina a Lei n. 7.543 que institui o IPVA prevê no seu art. 8º, inciso V, alíneas “e” e “k”, as hipóteses de isenção do imposto para veículo terrestre de propriedade de pessoa portadora de deficiência física, visual, mental severa ou profunda ou autista, ou de seu responsável legal, para uso do deficiente ou autista, ainda que conduzido por terceiro (equipado com motor de cilindrada não superior a dois mil centímetros cúbicos) no seguinte teor:

Art. 8° Não se exigirá o imposto:

[...]

V - sobre a propriedade;

[...]

e) de veículo terrestre adaptado para ser dirigido, exclusivamente, por motorista portador de deficiência física que o impeça de dirigir veículo normal;

[...]

k) de veículo terrestre equipado com motor de cilindrada não superior a dois mil centímetros cúbicos, de propriedade de pessoa portadora de deficiência física, visual, mental severa ou profunda ou autista, ou de seu responsável legal, para uso do deficiente ou autista, ainda que conduzido por terceiro.

 

Em relação à isenção do IPVA deve-se analisar da mesma forma que a isenção do IPI, do IOF e do ICMS visto que esse direito da pessoa com deficiência de adquirir automóveis de passageiros com isenção de IPVA pode ser aplicado às pessoas transplantadas com o fim de proporcioná-las uma melhor qualidade de vida durante os deslocamentos necessários aos tratamentos médicos.

 

3.1.16 Passe Livre no Transporte Intermunicipal

Em relação ao direito a passe livre no transporte intermunicipal cada Estado da Federação possui sua própria legislação e peculiaridades. No Estado de Santa Catarina o Decreto nº 1.792/2008 regulamenta a Lei n. 8.038, de 1990, a Lei n. 1.162, de 1993, alterada pela Lei n. 13.740, de 2006, e Lei n. 11.087, de 1999, quanto ao benefício da gratuidade do transporte rodoviário intermunicipal de passageiros e dos serviços de navegação interior de travessias a pessoas portadoras de deficiência.

No artigo 3º do referido decreto são determinadas as pessoas beneficiárias do transporte rodoviário intermunicipal de passageiros e dos serviços de navegação interior de travessias as pessoas com deficiência:

Art. 3º São beneficiárias da gratuidade do transporte rodoviário

intermunicipal de passageiros e dos serviços de navegação interior de travessias as pessoas portadoras de:

I - deficiência física: com alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento de função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções;

II - deficiência mental de moderada à profunda: com funcionamento intelectual significativamente inferior à média manifestado antes dos dezoito anos de idade e limitações associadas à duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como comunicação, cuidado pessoal, habilidades sociais, utilização da comunidade, saúde e segurança, habilidades acadêmicas, lazer e trabalho;

III - transtornos invasivos do desenvolvimento: com autismo, Síndrome de Rett, Transtorno Desintegrativo da Infância e Síndrome de Asperger;

IV - deficiência visual: com acuidade visual igual ou menor que 20/200 no melhor olho, após a melhor correção, ou campo visual inferior a 20° (Tabela de Snellen);

V - deficiência auditiva neurosensorial moderada, severa ou profunda: conforme classificação Davis Silverme (média das freqüências 500, 1000 e 2000 Hz);

VI - atraso no desenvolvimento neuropsicomotor: crianças de zero a quatro anos de idade; e

VII - deficiência múltipla: com associação de duas ou mais deficiências.

Parágrafo único. As pessoas de que trata este artigo deverão ter a deficiência comprovada por laudo diagnóstico, emitido por especialista da área, em que conste, obrigatoriamente, o código correspondente à Classificação Internacional de Doenças - CID mais recente.

 

Da mesma forma que o passe livre no transporte interestadual o passe livre no transporte intermunicipal, aos moldes da Lei Argentina, seria perfeitamente possível a extensão às pessoas transplantadas com a finalidade de garantir o devido tratamento de saúde.

 

3.1.17 Passe Livre no Transporte Coletivo Urbano

Em relação ao direito a passe livre no transporte coletivo urbano cada Ente Municipal possui sua a própria legislação e peculiaridades. No Município de Chapecó-SC o Decreto nº 10.008/2002 regulamenta o sistema de transporte coletivo urbano integrado, o qual prevê no seu artigo 43 o crédito gratuito no Sistema de Transporte Coletivo Urbano Integrado a todos os Portadores de Necessidades Especiais.

Nos termo do artigo 45 esse benefício tem por objetivo atender aspectos de caráter social, ocupacional e de recuperação da pessoa portadora de necessidade especial, respeitadas as condicionantes individuais. Assim, da mesma forma que o passe livre no transporte interestadual e no transporte interestadual o passe livre no transporte coletivo urbano, aos moldes da Lei Argentina, seria perfeitamente possível a extensão às pessoas transplantadas com a finalidade de garantir o devido tratamento de saúde.

 

3.2 O EXEMPLO DE LEGISLAÇÃO DO MUNICÍPIO DE JUIZ DE FORA

Em relação à pessoa transplantada ainda é muito incipiente no país a existência de legislação que garanta direitos a essa parcela da sociedade. Contudo, existem algumas leis municipais que garantem às pessoas transplantadas direitos que lhes proporcionem melhoria na qualidade de vida, reinclusão social e ao mercado de trabalho e principalmente respeito à sua dignidade humana no período pós-transplante.

Em que pese grande parte das autoridades executivas e legislativas brasileiras ainda não terem se preocupado com essa parcela da sociedade é fundamental destacar iniciativas como a Lei n. 10.888/05 do Município de Juiz de Fora que implantou o Programa Municipal de Apoio e Assistência às pessoas submetidas a transplante de qualquer natureza destinada a desenvolver um conjunto de ações com a finalidade de promover a reinserção sócio econômica.

Dessa lei destacam-se os objetivos de previsto no seu artigo 2º no seguinte teor:

Art. 2° - O Programa, ora instituído, tem como principais objetivos:

I - garantir atendimento médico especializado, periodicamente, bem como a obtenção de medicamentos indispensáveis ao processo de recuperação, nos casos em que a pessoa submetida ao transplante comprovadamente não obtiver condições de provê-los sozinha;

II - promover políticas de auxílio para o bom desenvolvimento físico, psíquico e social das pessoas submetidas a transplante, no período pós-operatório;

III - apoiar programas que priorizem e incentivem a doação de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante;

IV - promover a orientação e conscientização da sociedade, através da realização de palestras educativas, simpósios, divulgação na mídia, boletins informativos e outras publicações, no sentido de demonstrar que a realização de transplante não interfere na qualidade de vida nem na capacidade produtiva da pessoa transplantada;

V - implementar medidas que favoreçam a inclusão social e a inserção das pessoas que tiverem sido submetidas a transplante de qualquer natureza, no mercado de trabalho.

 

Pode-se concluir que o país precisa aprovar um Estatuto de Proteção Integral da Pessoa Transplantada com o objetivo de definir um rol mínimo de diretos com vistas a proporcionar as condições necessárias à recuperação e reinserção sócio-econômica das pessoas submetidas a transplante possam ocorrer em níveis aceitáveis de dignidade e cidadania.


4 CONCLUSÃO

Em que pese a ausência de norma protetiva à pessoa transplantada e a omissão do Poder Público Brasileiro em relação aos brasileiros submetidos ao procedimento médico de transplante, é mister ressaltar a louvável inclusão no texto constitucional dos dispositivos voltados a proteger a pessoa com deficiência e a recente aprovação do Estatuto da Pessoa com Deficiência ante o histórico de discriminação que essa parcela da sociedade tem sido submetida.

No entanto, cabe ressaltar que com a evolução das novas tecnologias médicas, tem surgido uma nova minoria de brasileiros transplantados que ainda não recebeu a devida atenção normativa pelo ordenamento jurídico pátrio e apresenta-se carente de ações afirmativas por parte do Estado Brasileiro.

Conforme enfatizado no decorrer de todo o presente estudo a inexistência de dispositivo constitucional específico e de uma legislação infraconstitucional protetiva para a pessoa transplantada não pode ser interpretada no sentido de ausência de direitos, pelo contrário, deve ser vista, principalmente, como uma omissão legislativa do Estado para com essa parcela da sociedade brasileira.

Com relação a essa lacuna jurídica, evidencia-se que uma interpretação sistêmica da Constituição Federal de 1988 sob o prisma da dignidade da pessoa humana e dos direitos fundamentais possibilita a perfeita a extensão dos direitos da pessoa com deficiência à pessoa transplantada, com a finalidade principal de criação do Estatuto de Proteção Integral da Pessoa Transplantada que vise a inclusão social e a construção de uma sociedade justa e solidária.

Pode-se constatar da análise dos resultados das duas pesquisas realizadas com pessoas transplantadas que o procedimento médico de transplante possibilita a recuperação da capacidade laboral da grande maioria dos pacientes. Contudo, a partir do transplante uma nova batalha surge, além do risco inerente da rejeição, a necessidade de reinclusão social, em especial no mercado de trabalho.

Comprovou-se no decorrer do estudo que ainda é ínfimo o número de pessoas transplantadas que retornam ao desempenho de atividades laborativas por diversos fatores como a discriminação na contratação, a falta de programas sociais de habilitação e reabilitação, e principalmente falta de dispositivos legais que garantam a reinserção no mercado de trabalho, a exemplo da reserva de vagas em concursos públicos e a reserva de cargos em empresas privadas, aos moldes dos existentes para a pessoa com deficiência, como também a concessão de incentivos fiscais às empresas que contratem pessoas transplantadas.

Portanto, ao mesmo tempo em que se enaltece o esforço do Estado Brasileiro em proteger e buscar a inclusão social das pessoas com deficiência, não podemos deixar de alertar as autoridades públicas sobre o surgimento de uma nova minoria contemporânea, fruto da evolução tecnológica, que se apresenta atualmente desamparada e carente, e talvez, tanto quanto foi a pessoa com deficiência no decorrer da história.

 


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MEDEIROS, André Amaral; MACHADO, Caren Silva. A necessidade de criação do estatuto de proteção integral da pessoa transplantada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5426, 10 maio 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/64758. Acesso em: 10 maio 2024.