Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/66967
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Ampliação do conceito de insumos no regime de não cumulatividade das contribuições do Pis e COFINS pelo STJ

Ampliação do conceito de insumos no regime de não cumulatividade das contribuições do Pis e COFINS pelo STJ

Publicado em . Elaborado em .

Em 2018 pelo rito dos recursos repetitivos o STJ reconheceu a ilegalidade de instruções normativas e definiu conceito mais amplo e benéfico aos contribuintes.

O regime de não cumulatividade das contribuições do PIS e COFINS ensejam muitos debates e questionamentos judiciais. Dentre as muitas teses apresentadas, sempre possuiu grande destaque a questão do creditamento de insumo, mais precisamente, o que caracteriza insumo para fins do predito regime de tributação.

De um lado encontramos a Receita Federal com posição muito restritiva, pautada das IN 247/02 e 404/04, glosando e autuando muitos contribuintes que a partir de seu entendimento ampliaram indevidamente o conceito de insumos. Para a Secretaria, entende-se por insumo apenas bens e produtos estritamente necessários para a consecução de sua atividade fim.

De outro lado, encontramos contribuintes buscando a ampliação do conceito de insumo, traduzindo-o como todo o necessário para a realização de sua atividade econômica, ainda que não diretamente ligados ao fim da empresa. Mediante esta tese, pretendem os contribuintes a utilização como insumo e abatimento da base de cálculo das referidas contribuições dos custos gerais, despesas comerciais, enfim, tudo o que de alguma forma contribui, ainda que indiretamente para a disponibilização de seu produto final no mercado (denominados insumos indiretos).

A pesquisa nos permitia encontrar gama de decisões, especialmente no STJ, apontando a ilegalidade das instruções normativas acima mencionadas, bem como limitando o creditamento a insumos essenciais ao processo produtivo. Contudo, a importância do julgamento do RE 1221171, além de ocorrer sob a sistemática dos recursos repetitivos e impactar uma vasta gama de processos, está em propor soluções aprofundadas ao debate e apresentar norte seguro à análise dos futuros creditamentos do regime não cumulativo das contribuições Pis e COFINS.

De início cabe destacar no voto do E. Min. Napoleão Nunes Maia Filho a diferenciação precisa e crucial das sistemáticas de não cumulatividade do IPI e Pis/COFINS, fonte de entendimentos equivocados e também base de postura restritiva da Receita Federal. Vejamos:

 

“27. O creditamento no IPI e no ICMS – digo isso apenas para recordar – vincula-se ao quantum recolhido nas operações anteriores porque os fatos geradores desses impostos são, respectivamente, a industrialização e a circulação comercial de mercadorias ou alguns serviços. No caso do PIS/COFINS, o creditamento consiste em verdadeiro ou autêntico desconto, pois essas contribuições têm por fato gerador o próprio faturamento da empresa ou da entidade a ela equiparada; a distinção é formidavelmente gritante, como se percebe.

28. E essa é a pedra-de-toque para afastar a confusão que comumente havia entre o creditamento do IPI e o creditamento do PIS/COFINS. No primeiro caso, o tributo incide sobre o produto, então o crédito efetivamente decorre dos insumos; no segundo caso, vê-se que o tributo incide sobre o faturamento, então o crédito deve decorrer – e somente pode decorrer – das despesas, sendo essa conclusão de clareza ofuscante ou brilhante como a do sol nordestino.”

Pautado no esclarecimento acima, recorda o Ministro que as Leis ns. 10.637, de 2002 e 10.833, de 2003 instituíram a sistemática da não-cumulatividade para a contribuição ao PIS e para a COFINS, mas não definiram o que deveria ser considerado insumo para a consecução de tal sistemática. A definição de insumo acabou senso instituída por meio de atos administrativo normativos, quais sejam: Instrução Normativa SRF n. 247, de 2002 (art. 66, § 5º), e Instrução Normativa SRF 404, de 2004.

Todavia, ambas Instruções Normativas, para definirem insumos, pautaram-se na sistemática de não cumulatividade própria do IPI, admitindo apenas despesas com aquisição de bens e produtos para fabricação de bens ou prestação de serviços.

Estes atos administrativos desconsideram que as contribuições Pis e COFINS incidem sobre receita/faturamento, inexistindo, portanto, vinculação a um bem especial, mas realizando a sistemática da não cumulatividade pela técnica base sobre base.[1]

Desta forma, reconheceu a ilegalidade das instruções normativas por violaram a não cumulatividade própria das contribuições do Pis e da COFINS e também por invadirem esfera de lei stricto sensu, na medida em que restringiram indevidamente o conceito de insumo.

Com tal reconhecimento, o julgamento apresentou conceito de insumo, este pautado nos critérios de relevância e essencialidade face às atividades fins da empresa, quer de ordem material, imaterial ou ainda que não consumido no processo produtivo, mas sem o qual o objeto ou prestação não seriam possíveis.

A Ilustre Min. Regina Helena Costa define com perfeição e inequivocidade os elementos essenciais de caracterização do insumo para a sistemática não cumulativa do Pis e da COFINS:

“Demarcadas tais premissas, tem-se que o critério da essencialidade diz com o item do qual dependa, intrínseca e fundamentalmente, o produto ou o serviço, constituindo elemento estrutural e inseparável do processo produtivo ou da execução do serviço, ou, quando menos, a sua falta lhes prive de qualidade, quantidade e/ou suficiência.

Por sua vez, a relevância, considerada como critério definidor de insumo, é identificável no item cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, integre o processo de produção, seja pelas singularidades de cada

cadeia produtiva (v.g., o papel da água na fabricação de fogos de artifício difere daquele desempenhado na agroindústria), seja por imposição legal (v.g., equipamento de proteção individual - EPI), distanciando-se, nessa medida, da acepção de pertinência, caracterizada, nos termos propostos, pelo emprego da aquisição na produção ou na execução do serviço.”

 

A leitura do julgamento e reflexão sobre os votos favoráveis permite a conclusão da adoção de um critério mais amplo de insumo, favorável ao contribuinte, porém, não irrestrito, sendo necessária a análise casuística e instrução probatória, cabendo ao contribuinte apresentar de forma detalhada, consistente e clara seu processo produtivo e a essencialidade e relevância de cada item pretendido como insumo.

Não há dúvidas de que o julgamento do RE1221170-PR representou grande vitória aos contribuintes, mas estes, ao formularem suas pretensões ao Poder Judiciário ou administrativamente não apenas deverão apresentar seu inequívoco direito a conceito ampliado de insumo, mas demonstrar pontualmente o que é essencial e relevante para a formatação de seu bem ou serviço final, provando ainda que a ausência de qualquer dos itens materiais, imateriais, consumíveis ou não importaria em impossibilidade do fornecimento ou fornecimento deficitário sem as características principais do objeto final da empresa.

Isto requer não apenas esforço argumentativo, mas principalmente organização dos processos internos de produção da empresa e clareza nos dados contábeis, pois a produção de prova passa a ser decisiva para o reconhecimento do direito a crédito em insumos no regime não cumulativo das contribuições do Pis e da COFINS.

 


[1] As alíquotas da Contribuição para o PIS/Pasep e da COFINS, com a incidência não-cumulativa, são, respectivamente, de 1,65% e 7,6%. Nessa sistemática é possível que o creditamento de valores apurados mediante a aplicação das mesmas alíquotas, justificando assim o que se chama de técnica de base sobre base.


Autor

  • Roberta Vieira Gemente

    Advogada, formada pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas - Puccamp, pós -graduada em Direito Tributário pela Faditu, MBA em Direito Fiscal pela Trevisan Escola e Negócios,certicada em diversos cursos de Direito Tributário ministrados na PUC-SP, GVLaw, Apet, dentre outros. Pós graduanda em Direito de Contratos e Responsabilidade Civil. Atuação na área Contenciosa e Consultiva Tributária desde o ano de 2000, prestando serviços para escritórios de médio e grande porte. Inscrita na OAB, seção SP, sob o número 186.599.

    Textos publicados pela autora


Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pela autora. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.