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A natureza jurídica dos valores pagos a título de inscrição em concursos públicos

taxas ou preços públicos?

A natureza jurídica dos valores pagos a título de inscrição em concursos públicos: taxas ou preços públicos?

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O aprofundamento da discussão sobre a natureza jurídica da inscrição paga pelos candidatos a concursos públicos - se taxa ou se preço público - é fundamental para que se possa delinear a eventual necessidade de lei que institui o tributo.

INTRODUÇÃO

É de notório conhecimento que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público, de acordo com a sua natureza e complexidade, em cumprimento ao disposto no art. 37, II[1] da Constituição da República Federativa do Brasil (CR/88).

Assim como em grande parte das administrações públicas brasileiras, ocorre que, no âmbito da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão do Estado de Minas Gerais (Seplag), a operacionalização dos certames é frequentemente realizada por instituição especializada em concursos públicos, contratada pela Administração. Assim, importante definir como deve se dar a remuneração destas empresas, diante da demanda dos setores responsáveis para que seja efetuada por meio da própria arrecadação da taxa de inscrição dos candidatos ao concurso público.

Verifica-se a existência de pontos controversos que dificultam a definição do formato de operacionalização dos certames por meio da contratação de empresas terceirizadas, uma vez que não há entendimento pacífico sobre a natureza jurídica dos valores de inscrição. A discussão gira em torno de se consiste em taxa – e, portanto, espécie de tributo[2] – ou preço público – natureza não tributária.

Oportunamente, é importante esclarecer que, a princípio, a designação “taxa de inscrição” não é utilizada em seu sentido técnico e, com isso, não se presta a definir, a priori, a natureza jurídica dos valores recolhidos a título de participação de candidatos em concursos públicos. Afinal, a CR/88 e o Código Tributário Nacional, Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966 (CTN) não qualificam essa receita dentro dos conceitos legais de tributo. Sendo assim, consoante preconiza o art. 4º do CTN[3], a designação “taxa de inscrição” não implica na automática atribuição da natureza jurídica de taxa aos valores recolhidos nesta qualidade.

Esta é a temática deste artigo, que, valendo da revisão da literatura sobre taxa e preços públicos, bem como da análise de julgados relacionados, visa a aprofundar a discussão, conforme os contornos trazidos pela doutrina e pela jurisprudência, permitindo melhor delineamento e classificação das taxas de inscrição em concursos públicos.


2. A NATUREZA JURÍDICA DAS TAXAS E DOS PREÇOS PÚBLICOS

O aprofundamento da distinção entre taxas e preços públicos faz-se essencial considerando a eventual necessidade de criação de legislação específica e prévia sobre o tema, instituindo a cobrança do tributo, caso se conclua que a natureza jurídica é de taxa. Afinal, sabe-se que, dentre os vários princípios que informam o direito tributário, estão o da legalidade e o da anterioridade tributária.

Considerando a existência da controvérsia quanto à categorização da taxa de inscrição nos concursos públicos, bem como a importância de buscar solucioná-la a fim de proporcionar segurança jurídica aos atos administrativos que envolvem a contratação de servidores efetivos por intermédio de empresa especializada na gestão de concursos, passa-se a analisar cada um dos institutos, taxas e preços públicos.

De acordo com Baleeiro (1973), as discussões jurídicas na delimitação da fronteira entre taxas e preços sempre foram as mais ásperas, revelando-se imperiosa a sua correta diferenciação.

Não obstante, cabe destacar, conforme determina a Súmula 545 do STF, de 12 de dezembro de 1969, que "preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu".

Baleeiro (1973) lembra que taxa consiste em espécie de tributo, definida em lei, ao passo que o preço público pode ser fixado por ato da autoridade administrativa, se a lei assim permitiu. E continua: "um preço pode ser estabelecido, exigido e majorado em qualquer dia do ano para cobrança imediata. Já a taxa há de ser decretada e autorizada num ano para cobrança no exercício imediato" (p. 252).

Outrossim, Moura (2008) reforça tal entendimento ao elucidar que preço público decorre da utilização de serviços públicos facultativos que a Administração Pública, diretamente ou por meio de delegação a concessionário ou permissionário, coloca à disposição da população. De acordo com o autor, são serviços prestados em decorrência do estabelecimento de relações contratuais, como a contratação de serviços de telefonia, fornecimento de energia elétrica, gás ou água.

Ademais, Moura (2008) destaca que tais relações contratuais, associadas ao preço público em geral, são regidas pelo direito privado, traduzindo uma relação de natureza pró-cidadão e que visa a atender aos usuários no tocante às suas comodidades ou necessidades pessoais.

Lado outro, Sacha Calmon, em seu Curso de Direito Tributário Brasileiro (2002, pp. 194-195), retrata a estrita conexão existente entre Estado de Direito e legalidade na tributação: "onde houver Estado de Direito haverá respeito ao princípio da reserva de lei em matéria tributária". E continua:

"Os princípios jurídicos da legalidade, seja formal, seja material (tipicidade), anterioridade e irretroatividade da lei tributária encontram justificação singela e promanam diretamente da experiência dos povos:

a) o princípio da legalidade significa que a tributação deve ser decidida não pelo chefe do governo, mas pelos representantes do povo, livremente eleitos para fazer leis claras;

b) o princípio da anterioridade expressa a ideia de que a lei tributária seja conhecida com antecedência, de modo que os contribuintes, pessoas naturais ou jurídicas, saibam com certeza e segurança a que tipo de gravame estarão sujeitos no futuro imediato, podendo dessa forma organizar e planejar seus negócios e atividades (...)." 

Insta destacar, ainda, que o artigo 150 da CR/88, a seguir, que traz as limitações ao poder de tributar, veda aos entes federativos a cobrança de tributo sem lei que o estabeleça e no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, dentre outras exigências:  

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

III - cobrar tributos:

a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; (Vide Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

(...)

Já o art. 97 do CTN também normatiza a sistemática de criação de tributos, dispondo que somente a lei poderá estabelecer a sua instituição, extinção, majoração ou redução (observados os casos em que, excepcionalmente, é dispensada para a majoração e a redução), devendo, além disso, definir toda a estrutura da norma tributária, como o fato gerador, fixar as bases de cálculo e alíquotas, entre outros (COELHO, 2002).

Especificamente com relação às taxas, o CTN assim as disciplina:

Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

Parágrafo único. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em função do capital das empresas. (Vide Ato Complementar nº 34, de 1967, grifo nosso)

Baleeiro (1973, p. 242), no mesmo sentido, define taxa como "o tributo cobrado de alguém que se utiliza de serviço público especial e divisível, de caráter administrativo ou jurisdicional, ou tem a sua disposição, e ainda quando provoca em seu benefício, ou por ato seu, despesa especial dos cofres públicos".

Sabe-se que o CTN define taxa como tributo vinculado quanto ao seu fato gerador, mas não quanto ao destino do produto da arrecadação. Nesse sentido, Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo (2009, pp. 14 e 43) apresentam a seguinte definição de taxa:

"A taxa é, pois, um tributo que tem como fato gerador ou hipótese de incidência uma atuação estatal específica relativa ao contribuinte. Por ser a hipótese de incidência das taxas vinculadas a um ato ou fato do Estado, diz-se que elas são um tributo vinculado.

(...)

Por último, quanto ao destino do produto da arrecadação das taxas, cabe notar que não existe vinculação constitucional expressa entre a receita e a despesa, vale dizer, não é obrigatório que a arrecadação da taxa seja legalmente destinada a um fundo ou órgão específico incumbido de custear ou desempenhar a atividade estatal que constitui o fato gerador do tributo. Mas a lei pode estabelecer vinculação da arrecadação de taxas, porque não se lhes aplica o art. 167, IV, da Constituição, dispositivo exclusivamente endereçado aos impostos." (Grifo nosso)

Em consonância com a doutrina, o Tribunal de Contas da União (TCU), no Processo TC-015.289/2004-7, manifestou-se da seguinte forma:

"Com relação ao destino dado aos valores arrecadados não há, ao contrário do afirmado pela unidade técnica, como regra geral, a obrigatoriedade da vinculação do produto de arrecadação a determinada atividade estatal. O art. 145, II, da Constituição Federal nada dispõe a respeito.

(...)

Bernardo Ribeiro de Moraes (apud Luiz Emygdio da Rosa Jr., ob. cit. p. 205), destaca que “a destinação do produto tributário ocorre após a arrecadação, jamais podendo tal fato constituir característico das espécies tributárias. O destino da arrecadação, quando muito, é elemento contábil (não-jurídico das espécies tributárias).”

Sacha Calmon Navarro (Curso de Direito Tributário Brasileiro, 3ª  ed. p. 425/6) dispõe de forma semelhante: “Nada impede que o legislador cobre taxas pela prestação dos serviços públicos e divisíveis (...). Nada o impede de destinar a outros fins o produto arrecadado. (...) É que para a caracterização jurídica da taxa é irrelevante o destino de sua arrecadação. E, por outro lado, cabe ao legislador de cada ordem de governo (União, Estados e Municípios), em relação ao princípio da autonomia dos entes locais, base do federalismo (art. 25 da Constituição de 1988), dispor sobre as respectivas despesas, ajuizando a boa destinação dos dinheiros públicos.” (Grifo nosso).

São importantes ainda as considerações de Aliomar Baleeiro (Direito Tributário Brasileiro, 11ª ed., p. 68):

“Mas ressalvas devem ser feitas ao art. 4º do Código Tributário Nacional, no ponto em que considera irrelevante, de forma generalizada, a destinação do produto arrecadado para a definição da espécie tributária. É que a destinação, efetivamente, será irrelevante para distinção entre certas espécies (taxas e impostos, p. ex.), mas é importante no que tange à configuração dos empréstimos compulsórios.

A Constituição de 1988 pela primeira vez, cria tributos finalisticamente afetados (...) a afetação do produto a certas despesas ou serviços é requisito necessário para o exercício da competência federal, no que tange às contribuições e aos empréstimos compulsórios.” (Grifo nosso).

Ou seja, verifica-se que a afetação de receitas é característica das contribuições e não das taxas. Como exceção a regra, tem-se a aplicação dos recursos arrecadados em razão das custas e emolumentos judiciais (consideradas taxas pelo Supremo Tribunal Federal – ADI 1772/98), em razão do disposto no § 2º do art. 98 da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional 45/2004, o qual dispõe que “as custas e emolumentos serão destinados exclusivamente ao custeio dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça”." (Grifo nosso)

ACÓRDÃO Nº 532/2005-TCU-PLENÁRIO

Não sendo característica da taxa a vinculação do produto de sua arrecadação a determinada atividade do Estado, seria difícil, para tais entendimentos, considerar como taxa os valores pagos a título de inscrição. Afinal, é necessário custear os concursos públicos, mas não se sabe, de antemão, quantos candidatos irão se inscrever, o que compromete a previsibilidade do montante a ser gasto na realização do certame.

Em suma, percebe-se que a distinção entre taxa e preços públicos permanece a demandar maiores discussões no contexto da oferta de serviços públicos no Brasil. Moura (2008) ilustra a controvérsia com os casos do esgoto e da água:

"[...] a rigor em localidades onde estes serviços fossem colocados à disposição dos usuários, mas com utilização de caráter obrigatório (ou seja, a lei não permitisse poços e nem fossas), a remuneração deveria ser feita mediante taxa e sofreria as limitações impostas pelos princípios gerais da tributação (legalidade, anterioridade, etc.). Por outro lado, se a lei local permitisse meios alternativos à população para obter água e dispor de seus dejeitos, o serviço estatal oferecido, pelo ente político ou por seus delegados, não teria natureza obrigatória, seria facultativo e, portanto, seria remunerado mediante preço público." (p. 66)

Nesse diapasão, o STF tem consolidado o entendimento de que a natureza jurídica da remuneração dos serviços de água e esgoto, prestados por concessionária de serviço público, é de tarifa ou preço público[4].

Constatadas as divergências entre taxas e preços públicos, passa-se a seguir ao aprofundamento da discussão sobre a natureza da taxa de inscrição em concursos públicos. 


3. DISCUSSÃO SOBRE A NATUREZA JURÍDICA DA TAXA DE INSCRIÇÃO EM CONCURSOS PÚBLICOS

Destaque-se, desde já, que estudos sobre as várias taxas e preços públicos existentes no direito brasileiro indicam que a definição de sua natureza jurídica é feita pelos tribunais de maneira casuística, embora mantidas as características elementares de cada um dos institutos. Nesse viés, relembra-se a inexistência de consenso doutrinário e jurisprudencial quanto à natureza jurídica dos valores de inscrição em concursos públicos, fato trazido no início da Consulta nº 850.498, de 27 de fevereiro de 2013, do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE/MG), que entendeu que a taxa de inscrição em concurso público constitui receita pública:

"Antes de adentrar no mérito, é importante destacar que não há entendimento pacificado no âmbito doutrinário e jurisprudencial acerca da natureza jurídica das taxas de inscrição em concursos públicos. Há duas correntes: uma sustentando que as taxas de inscrição possuem natureza tributária e outra em sentido diametralmente oposto negando-lhe a natureza tributária."

Neste sentido, importante decisão sobre o tema é a Consulta nº 850.498, do TCE/MG, cujo trecho foi citado acima, e que se destaca a seguir:

CONSULTA - CÂMARA MUNICIPAL - CONCURSO PÚBLICO - TAXA DE INSCRIÇÃO - RECEITA PÚBLICA - 1) RECOLHIMENTO - CONTA ÚNICA DA CÂMARA MUNICIPAL - VEDAÇÃO DE CAIXAS ESPECIAIS (ART. 56 DA LEI 4.320/64) - EXCEDENTE DA RECEITA PERTENCENTE AO ERÁRIO MUNICIPAL - 2) RECEITA ARRECADADA - UTILIZAÇÃO - PAGAMENTO DE SERVIÇOS PRESTADOS PARA REALIZAÇÃO DE CONCURSO - POSSIBILIDADE - CONDIÇÃO NECESSÁRIA - FIXAÇÃO DE VALORES NO EDITAL DE LICITAÇÃO E NO CONTRATO - 3) ADMINISTRAÇÃO E GERENCIAMENTO DA RECEITA - DELEGAÇÃO A EMPRESA PRIVADA - IMPOSSIBILIDADE - PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA E DA PRESTAÇÃO DE CONTAS. 1) O recolhimento dos valores recebidos a título de taxa de inscrição, destinados ao custeio das despesas efetuadas com a realização do concurso público para o provimento de cargo nos seus quadros, deve ser feito na conta única da Câmara Municipal, sendo vedada a criação de caixas especiais, nos termos do artigo 56 da Lei n. 4.320/64. Vale destacar que, caso o valor recolhido com as taxas de inscrição seja superior ao valor gasto com a realização do concurso, essa diferença pertencerá aos cofres municipais, em conformidade com os princípios orçamentários da unidade, da universalidade e do orçamento bruto. 2) A receita arrecadada pelo Poder Legislativo Municipal, proveniente de taxa de inscrição para Concurso Público, pode ser utilizada para pagamento dos serviços prestados pela empresa vencedora do processo licitatório para realização de concurso público, desde que os editais de licitação e os contratos especifiquem que a forma de remuneração da empresa contratada será fixa ou variável, em conformidade com o número de inscritos ou de acordo com as receitas auferidas com a inscrição dos candidatos. Além disso, o edital e o contrato devem estabelecer os valores globais e máximos da avença a ser firmada, com base na estimativa do montante a ser arrecadado com as inscrições, bem como devem conter uma cláusula estabelecendo que os valores recolhidos que superarem o previsto no contrato pertencerão aos cofres municipais.3) Não é possível delegar a administração e gerenciamento de recursos públicos provenientes da arrecadação de taxas de inscrição em concurso público a uma empresa privada contratada para a realização do concurso público, pois as taxas de inscrição constituem receitas públicas. Ademais, considerando que, em face do princípio da transparência, compete ao Poder Público prestar contas dos seus gastos, o depósito das taxas de inscrição direto na conta da contratada ofenderia o disposto no art. 14 da Lei Complementar n. 101/2000 e nos arts. 58 a 65 da Lei n. 4.320/64, uma vez que configuraria renúncia e omissão de receita, além de antecipação de pagamento à contratada pela prestação do serviço, desrespeitando as fases da realização da despesa. 4) Precedente: Consulta 837086 (29/08/2012). 5) Determina-se que seja dada ampla divulgação do conteúdo do voto condutor deste parecer, em especial, no site do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. (Grifo nosso)

Como se vê, o TCE/MG entende que o depósito dos valores destinados ao custeio das despesas efetuadas com a realização do concurso público para o provimento de cargos deve ser feito em conta única, de acordo com o princípio da unidade de tesouraria, estabelecido no art. 56 da Lei n.º 4.320, de 17 de março de 1964[5], que estatui normas gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

Ademais, como se viu, entende o TCE/MG que o edital e o contrato devem estabelecer os valores globais e máximos da avença a ser firmada, com base na estimativa do montante a ser arrecadado com as inscrições, bem como devem conter uma cláusula estabelecendo que os valores recolhidos que superarem o previsto no contrato pertencerão aos cofres municipais.

A seguir, o TCE/MG esclarece não ser possível delegar a administração e gerenciamento de recursos públicos provenientes da arrecadação de taxas de inscrição em concurso público a uma empresa privada contratada para a realização do concurso público, pois as taxas de inscrição constituem receitas públicas.

Observe-se que o entendimento é que as ‘taxas de inscrição’ consistem em receitas públicas. Não se referiu o tribunal, entretanto, expressamente a taxa como espécie de tributo. Deste modo, em que pese aquele tribunal haver delineado o procedimento necessário à contratação de empresa terceirizada que realizará a gestão dos concursos, não enfrentou o questionamento central que se busca aprofundar neste estudo.

O Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público{C}[6] assim define a receita pública:

"São disponibilidades de recursos financeiros que ingressam durante o exercício orçamentário e constituem elemento novo para o patrimônio público. Instrumento por meio do qual se viabiliza a execução das políticas públicas, as receitas orçamentárias são fontes de recursos utilizadas pelo Estado em programas e ações cuja finalidade precípua é atender às necessidades públicas e demandas da sociedade. Essas receitas pertencem ao Estado, transitam pelo patrimônio do Poder Público, aumentam-lhe o saldo financeiro, e, via de regra, por força do princípio orçamentário da universalidade, estão previstas na Lei Orçamentária Anual – LOA. Nesse contexto, embora haja obrigatoriedade de a LOA registrar a previsão de arrecadação, a mera ausência formal do registro dessa previsão, no citado documento legal, não lhes retira o caráter de orçamentárias, haja vista o art. 57 da Lei nº 4.320, de 1964 (...)."

No sentir do TCE/MG, o depósito dos valores de inscrição não pode ser efetuado diretamente na conta da contratada, pois ofenderia o disposto no art.14 da Lei Complementar n.º 101, de 4 de maio de 2000{C}[7] e os arts. 58 a 65 da Lei n.º 4.320/64, uma vez que configuraria renúncia e omissão de receita, além de antecipação de pagamento à contratada pela prestação do serviço, desrespeitando as fases da realização da despesa.

Os artigos 58 a 65 acima mencionados se referem às fases da despesa e trazem as normas que disciplinam o empenho, a liquidação e a ordem de pagamento, sendo que cada etapa só pode se perfazer se a anterior tiver sido plenamente observada. Assim, o TCE/MG entende necessário que os valores recolhidos a título de inscrição em concursos públicos observem todas as fases de realização da despesa estabelecidas na Lei n. º 4.320/64.


4. SIMILARIDADE AO PEDÁGIO

Com vistas a aprimorar a discussão, vale introduzir no objeto de estudo deste trabalho a figura do pedágio, uma vez que possui similaridades com os valores cobrados a título de participação em concursos públicos.

Nesse desiderato, vale frisar que, conforme apontava Baleeiro (1977), na Constituição de 1946 ficava ressalvada a cobrança de taxas de pedágio destinadas exclusivamente à indenização das despesas de construção, conservação e melhoramento das estradas. Ou seja, havia, em alguma medida, a vinculação do produto da arrecadação dos pedágios.

Já no contexto da atual CR/88, apresenta-se o acórdão dado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n.º 800, julgada em junho de 2014 e proposta pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), tendo por objeto o Decreto 34.417/92, do Estado do Rio Grande do Sul, que autoriza a cobrança de pedágio na Rodovia Estadual RS/135 e o caracteriza como preço público, e não como taxa. O estudo desta decisão é interessante porque a cobrança do pedágio guarda semelhanças com os valores de inscrição em concursos públicos.

Na ADI n.º 800/14, sustenta o requerente que a cobrança de pedágio somente pode ser instituída por lei (princípio da legalidade estrita), já que se trata de taxa, que é espécie de tributo, e não de preço público, motivo pelo qual o referido decreto seria inconstitucional.

Dentre os fundamentos trabalhados na decisão, destacou-se o art. 150, V da CR/88, a seguir, que consiste na base constitucional do pedágio, e pode ser interpretado como taxa ou como preço público:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(...)

V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público;

O Ministro Teori Zavascki, Relator da ADI n.º 800/14, em seu voto, destacou que persiste antiga controvérsia acerca da natureza do pedágio:

Os que sustentam sua natureza tributária, da subespécie taxa, o fazem sob os seguintes fundamentos, essencialmente: (a) estar o pedágio referido na Constituição quando tratou das limitações ao poder de tributar; (b) constituir pagamento de um serviço específico ou divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição; (c) não ser cabível remunerar serviços públicos por meio outro que não o de taxa (Roque Antônio Carrazza. Curso de direito constitucional tributário financeiro e tributário. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 115. Também: Geraldo Ataliba; Aires Barreto. Pedágio federal. Revista de Direito Tributário, São Paulo, nº. 46, p. 90-96, out./dez. 1988).

Já os que sustentam tratar-se de preço público, com natureza contratual, o fazem com base nas seguintes considerações: (a) a inclusão no texto constitucional apenas esclarece que, apesar de não incidir tributo sobre o tráfego de pessoas ou bens, pode, excepcionalmente, ser cobrado o pedágio, espécie jurídica diferenciada; (b) não existir compulsoriedade na utilização de rodovias; e (c) a cobrança se dá em virtude da utilização efetiva do serviço, não sendo devida com base no seu oferecimento potencial."

(Ricardo Lobo Torres. Tratado de direito constitucional tributário. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 486. Igualmente: Sacha Calmon Navarro Coêlho. Comentários à Constituição de 1988: sistema tributário. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 308-309).

Apresentados os argumentos que defendem ser o pedágio taxa, e lado outro, preço público, o STF decidiu que se trata de preço público:

"7. Em suma, no atual estágio normativo constitucional, o pedágio cobrado pela efetiva utilização de rodovias não tem natureza tributária, mas sim de preço público, não estando, consequentemente, sujeita ao princípio da legalidade estrita.

8. Ante o exposto, julgo improcedente o pedido formulado nesta ação direta de inconstitucionalidade. É o voto." (Grifo nosso)

 Entendeu ainda ser irrelevante a existência de via alternativa para o usuário trafegar, para que se caracterize como preço público:

"E, a despeito dos debates na doutrina e na jurisprudência, é irrelevante também, para a definição da natureza jurídica do pedágio, a existência ou não de via alternativa gratuita para o usuário trafegar. Essa condição não está estabelecida na Constituição. É certo que a cobrança de pedágio pode importar, indiretamente, em forma de limitar o tráfego de pessoas. Todavia, essa mesma restrição, e em grau ainda mais severo, se verifica quando, por insuficiência de recursos, o Estado não constrói rodovias ou não conserva adequadamente as que existem. Consciente dessa realidade, a Constituição Federal autorizou a cobrança de pedágio em rodovias conservadas pelo Poder Público, inobstante a limitação de tráfego que tal cobrança possa eventualmente acarretar. Assim, a contrapartida de oferecimento de via alternativa gratuita como condição para a cobrança de pedágio não é uma exigência constitucional. Ela, ademais, não está sequer prevista em lei ordinária. A Lei 8.987/95, que regulamenta a concessão e permissão de serviços públicos, nunca impôs tal exigência. Pelo contrário, nos termos do seu art. 9º, § 1º (alterado pela Lei 9.648/98), “a tarifa não será subordinada à legislação específica anterior e somente nos casos expressamente previstos em lei, sua cobrança poderá ser condicionada à existência de serviço público alternativo e gratuito para o usuário”." (Grifo nosso)

De acordo com a Suprema Corte, o elemento nuclear para distinguir taxa de preço público é o da compulsoriedade:

"Segundo a jurisprudência firmada nessa Corte, o elemento nuclear para identificar e distinguir taxa e preço público é o da compulsoriedade, presente na primeira e ausente na segunda espécie, como faz certo, aliás, a Súmula 545: “Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu”."

Dessa sorte, percebe-se que o elemento para se identificar e distinguir taxa e preço público seria o da compulsoriedade, presente no caso das taxas e ausente no caso dos preços públicos. Trazendo, analogicamente, a discussão para o tema trabalhado neste artigo, temos que os valores despendidos pelos candidatos a título de inscrição em concursos públicos não são compulsórios, uma vez que apenas se submetem ao seu pagamento aqueles que desejarem participar do processo seletivo correspondente.


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Percebe-se, portanto, que, longe de ser unicamente acadêmica, a discussão sobre a natureza jurídica da taxa de inscrição em concursos públicos, se taxa ou preço público, possui repercussões práticas relevantes, visto que, se taxa, será necessário, para sua instituição, observar todos os procedimentos legislativos, bem como os princípios e as limitações ao poder de tributar, estabelecidos na Constituição Federal e na legislação pertinente.

Ainda que não haja consenso doutrinário e jurisprudencial sobre a categoria em que se encaixa a taxa de inscrição, persiste, no âmbito do Poder Executivo, a necessidade de adotar entendimentos orientadores da gestão dos concursos públicos. São indispensáveis definições que sirvam de norte para operacionalizar a contratação e pagamento das instituições responsáveis pela realização dos concursos, bem como o enfrentamento de questões como a possibilidade de delegar a administração e gerenciamento de recursos públicos provenientes da arrecadação dessas taxas de inscrição às empresas privadas contratadas.

Conforme demonstrado neste trabalho, o valor de inscrição em concurso público possui características que o assemelham ao pedágio, considerado pelo STF preço público, uma vez que não há compulsoriedade em seu pagamento, já que apenas aqueles que desejarem submeter-se ao processo seletivo deverão pagá-lo; a cobrança se dá apenas em virtude da utilização efetiva dos serviços prestados pela banca organizadora do concurso e não será devida com base no oferecimento potencial destes serviços.

Reafirme-se que o entendimento da Consulta nº 850.498 do TCE/MG veda, como visto, a delegação da administração e do gerenciamento de recursos públicos provenientes da arrecadação dos valores de inscrição em concurso público à empresa privada contratada para a realização do concurso público, pelo fato de constituírem receitas públicas. Entretanto, este entendimento não impede que, na linha do entendimento do STF sobre a natureza do pedágio na ADI n.º 800/14, a taxa de inscrição em concursos públicos seja considerada preço público, o que, além de mais adequado juridicamente, dispensa a necessidade de edição de lei e de observância às limitações ao poder de tributar previstas na CR/88.


REFERÊNCIAS

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Tributário na Constituição e no STF. 15ª Edição. Editora Método. SP. 2009. p.14 e 43.

BALEEIRO, Aliomar de Andrade. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1973.

______. Direito tributário brasileiro. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1977. 632 p.

BRASIL, Código Tributário Nacional. (1966). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172Compilado.htm. Acesso em: 30 de out. 2017.

______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso em: 30 de out. 2017.

______. Supremo Tribunal Federal. Súmula 545. de 12 de dezembro de 1969. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumarioSumulas.asp?sumula=2346. Acesso em 30 de out. 2017.

______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 800.  Rio Grande do Sul. Julgada em junho de 2014. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=800&classe=ADI&origem=AP&recurso=0&tipoJulgamento=M. Acesso em 30 de out. 2017.

______. Tribunal de Contas da União. Processo TC-015.289/2004-7. Acórdãonº 532/2005. Plenário.

COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 6. ed. Rio de Janeiro, 2002.

MINAS GERAIS. Consulta do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.  Consulta nº 850.498. Relator Cons. Mauri Torres. 27 de fev. 2013.

MOURA, Márzio Ricardo Gonçalves de. Direito Tributário. Brasília: Vestcon, 2008.


Notas

[1]II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

[2] CTN: Art. 5º Os tributos são impostos, taxas e contribuições de melhoria.

[3] Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la:

I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei;

II - a destinação legal do produto da sua arrecadação.

[4] REsp nº 740.967/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, DJ de 28/04/2006.

[5] Art. 56. O recolhimento de todas as receitas far-se-á em estrita observância ao princípio de unidade de tesouraria, vedada qualquer fragmentação para criação de caixas especiais.

[6] Disponível em: http://www.tesouro.fazenda.gov.br/documents/10180/456785/CPU_MCASP+6%C2%AA%20edi%C3%A7%C3%A3o_Republ2/fa1ee713-2fd3-4f51-8182-a542ce123773

[7]   Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:        (Vide Medida Provisória nº 2.159, de 2001)         (Vide Lei nº 10.276, de 2001)

I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 1o A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.

§ 2o Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de que trata o caput deste artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entrará em vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso.

§ 3o O disposto neste artigo não se aplica:

I - às alterações das alíquotas dos impostos previstos nos incisos I, II, IV e V do art. 153 da Constituição, na forma do seu § 1º;

II - ao cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança.


Autores

  • Stefani Ferreira de Matos

    Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental - Diretor de Metalurgia na Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (SEDE)

    Textos publicados pelo autor

  • Paulo Mendes

    Advogado, professor e Servidor Público estadual da carreira Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental de Minas Gerais. Doutorando em Ciência Política pela UFMG. Mestre em Administração Pública pela Escola de Governo da Fundação João Pinheiro, Especializado em Direito Público pela Universidade Católica Dom Bosco em 2011, Graduado em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais em 2008 e em Administração Pública pela Escola de Governo da Fundação João Pinheiro em 2007. Diretor de Planejamento Econômico e Articulação Institucional da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais e anteriormente Diretor de Fomento aos Consórcios Públicos e Assistência Técnica aos Municípios da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional, Política Urbana e Gestão Metropolitana de Minas Gerais entre 2011 e 2015.

    Textos publicados pelo autor

  • Bruno Ferreira Costa

    Bruno Ferreira Costa

    Graduado em Direito na UFMG e em Administração Pública na Fundação João Pinheiro, atualmente é Subsecretário de Assessoria Técnico-legislativa da Secretaria de Estado de Casa Civil e de Relações Institucionais de Minas Gerais.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GREINER, Isabela; MAGALHÃES, isabela greiner de et al. A natureza jurídica dos valores pagos a título de inscrição em concursos públicos: taxas ou preços públicos?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5709, 17 fev. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68779. Acesso em: 29 mar. 2024.