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A regra-matriz de incidência tributária do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU

A regra-matriz de incidência tributária do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU

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Percebem-se avanços no STF acerca da progressividade do IPTU em razão do valor do imóvel, da sua destinação ou localização e da função social da propriedade.

RESUMO:O presente trabalho versa sobre a regra-matriz de incidência tributária do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. O tema é considerado relevante em razão da notoriedade do tributo e por ser fonte de arrecadação dos mais de 5.500 (cinco mil e quinhentos) municípios brasileiros. O estudo dos aspectos material, espacial, temporal, pessoal e quantitativo permite conhecer os diversos debates no campo doutrinário e jurisprudencial sobre o tema, além de orientar o legislador municipal quando da instituição do tributo ou revisão da legislação tributária e possibilitar ao contribuinte e aos operadores do direito a verificação da lei instituidora e dos atos praticados pela Administração tributária.

Palavras-chave: Regra-matriz de incidência tributária. Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. Critérios material, espacial, temporal, pessoal e quantitativo.

SUMÁRIO:1 DA REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA...1.1 Da norma jurídica tributária..1.2 Do fato gerador e da subsunção do fato à norma..1.3 Da regra-matriz de incidência tributária..1.3.1 Critério material.1.3.2 Critério espacial..1.3.3 Critério temporal.1.3.4 Critério pessoal..1.3.4.1 Sujeito ativo...1.3.4.2 Sujeito passivo..1.3.4.3 Sujeição passiva indireta ou responsabilidade..1.4 Critério quantitativo...1.4.1 Base de cálculo (ou base imponível)....1.4.2 Alíquota...2 A REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA DO IPTU – PARTE 12.1 Notas históricas acerca do IPTU....2.2 Critério material..2.3 Critério espacial..2.4 Critério temporal....3 A REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA DO IPTU – PARTE 2..3.1 Critério pessoal: O sujeito ativo do IPTU..3.2 Critério pessoal: o sujeito passivo do IPTU...3.3 Responsabilidade tributária..4 A REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA DO IPTU – PARTE 3.4.1 Base de cálculo..4.2 A majoração do valor venal..4.3 Alíquota.4.4 A progressividade do IPTU..5 ASPECTOS RELEVANTES DO IPTU..5.1 O IPTU e as restrições ambientais..5.2 O IPTU e o imóvel cultivado em área urbana..5.3  O IPTU  e o direito real de laje..5.4 Concessão de direito real de uso e o IPTU..CONCLUSÃO...REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...


INTRODUÇÃO

O presente trabalho trata da regra-matriz de incidência tributária (ou norma-padrão dos tributos) do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, razão pela qual serão abordados cada um dos seus critérios, a saber: material, espacial, temporal, pessoal e quantitativo.

O tema é considerado relevante por conta da abrangência e importância do tributo municipal para a arrecadação dos mais de 5.500 (cinco mil e quinhentos) municípios do país. Não remanescem dúvidas de que algumas práticas, descuradas da boa técnica, implicam irregularidades e/ou nulidades que demandarão apreciação por parte dos operadores do direito consoante o ordenamento jurídico pátrio.

O conhecimento apurado dos elementos da norma-padrão dos tributos possibilita aos cidadãos, incluindo os operadores do direito, verificar se o ente tributante tem atendido aos comandos constitucionais, especialmente ao princípio da legalidade tributária.

Para tanto, o trabalho foi desenvolvido com apoio na legislação, doutrina e jurisprudência pátrias, quando então se teve a oportunidade de investigar o tratamento dado em tais meios a cada um dos aspectos supramencionados.

Com finalidade didática, foram desenvolvidos 05 (cinco) capítulos, tendo sido abordado na primeira parte a hipótese de incidência tributária e os critérios/elementos de sua regra matriz aplicáveis a (basicamente) todas as espécies tributárias. Empregou-se o termo “basicamente” porque a taxa, como será visto, não necessariamente, demanda a fixação de alíquotas. O leitor já terá condições de compreender a importância da necessária identidade entre o fato jurídico tributário e a hipótese tributária (tipicidade) para que disso resulte a subsunção.

Do segundo ao quarto capítulo, far-se-á a exposição dos critérios/elementos da regra-matriz do imposto de competência municipal. Optou-se pela subdivisão do tema em três módulos a fim de melhor explorar cada um dos elementos da norma-padrão. Ver-se-á que a mera aplicação da lei, sem que seja realizada uma interpretação pautada nos princípios de índole constitucional, pode resultar numa tributação incorreta.

No segundo capítulo, tratar-se-ão os critérios identificadores do fato, enquadrados no descritor, antecedente ou suposto da norma. São os aspectos material, espacial e temporal.

Em continuidade, adentrar-se-á na análise do consequente ou prescritor da norma tributária, quando então serão vistos os elementos pessoal e quantitativo (capítulos terceiro e quarto).

Na última parte, por fim, abordar-se-ão alguns aspectos relevantes do imposto, quando se trará ao leitor discussões práticas que resvalam nos critérios estudados.


1 DA REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA                            

1.1 Da norma jurídica tributária

O constituinte, já nas primeiras linhas da Carta Magna, explicitou que a República é a forma de governo adotada em nosso país (art. 1°, “caput”, Constituição da República Federativa do Brasil), sendo o poder exercido em nome do povo e para o povo. Por isso, não faz sentido que os representantes pratiquem atos lesivos em face dos representados, sob qualquer pretexto, inclusive por meio cujo foco seja apenas os interesses do Estado. (CARRAZZA, 2004, p. 56).

Nessa senda, e visando garantir ao cidadão sua dignidade, o legislador consagrou diversos princípios e normas dispostos pelo Texto Constitucional, verdadeiras matrizes para a elaboração dos demais diplomas legais e prática das mais variadas, inclusive no âmbito da Administração Pública.

Especificamente na seara tributária, notam-se vários princípios consagrados pela lei maior, i.e., a legalidade, a anterioridade, a capacidade contributiva, dentre outros.

No presente momento, destaca-se o princípio da legalidade, pois o tributo deve contar com suporte em lei, editada por um ente político competente (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). E mais: a lei deve conter todos os elementos e supostos da norma jurídica tributária: hipótese de incidência, sujeitos, base de cálculo e alíquota. (CARRAZZA, 2004, p. 233).

Isso porque a legalidade só será assegurada quando o cidadão contar com condições de apurar a presença dos supostos da norma tributária. De outro modo, o ente tributante não terá atendido à norma.

Por isso, em razão da importância da observância da legalidade para a tributação em nosso país, o estudo da norma tributária é essencial a fim de evitar e coibir eventuais equívocos e abusos cometidos pelo sujeito ativo da relação jurídica tributária.

CARVALHO explica que as normas jurídicas consistem em significações possibilitadas pela leitura do texto de lei (suporte físico) e que, não necessariamente, com este coincide.

Em tom didático, o doutrinador faz menção à estrutura trilateral de inspiração husserliana e destaca três pontos: 1) o suporte físico: o conjunto dos textos do direito posto; 2) o significado: a conduta humana compartilhada na vida social; e 3) a significação: que são as extrações realizadas pelo jurista, possibilitando a formação de juízos lógicos, partindo do contato sensorial com o suporte físico, mas com referência ao quadro dos fatos e das condutas juridicamente relevantes. Nos últimos dois pontos opera-se a construção hermenêutica do fato jurídico. (2017, p. 258).

As premissas acima apresentadas permitem concluir que as regras jurídicas são as significações possibilitadas pela leitura do texto, não se limitando a uma interpretação literal. Caberá ao intérprete ir além, recorrendo aos diversos textos de lei.

1.2 Do fato gerador e da subsunção do fato à norma

Diversas são as designações utilizadas pelos doutrinadores para fazer menção ao fato gerador. Situação-base, pressuposto de fato do tributo, suporte físico, fato imponível, fato gerador, dentre outros, são os termos empregados para designar o antecedente ou suposto das normas que prescrevem as prestações de índole fiscal. (CARVALHO, 2017, p. 268).

KFOURI JR. destaca as diversas abordagens da locução, citando as distintas compreensões de juristas de renome, tais como Luciano Amaro, Geraldo Ataliba, Ricardo Lobo Torres, dentre outros.

Salienta que Geraldo Ataliba compreende a hipótese de incidência como a descrição legal de um fato (formulação hipotética), empregando a expressão “fato imponível” para referir-se à situação em concreto. (2016, p.231).

Ao fazer a opção pela utilização da expressão “fato gerador”, com o intuito de significar tanto a construção normativa geral e abstrata quanto aos fatos jurídicos, COSTA observa que é prudente, até mesmo para que o receptor da mensagem obtenha maior compreensão, que ocorra a especificação da seguinte forma: 1) fato gerador “in abstrato”, para a hipótese normativa; e 2) fato gerador “in concreto”, a fim de referenciar a situação efetivamente ocorrida. (2009, p. 178).

JESUS expõe que o legislador infraconstitucional empregou no Código Tributário Nacional a expressão “fato gerador”, de forma indistinta, tanto para significar a previsão do fato à norma (hipótese) quanto para o fato efetivamente ocorrido (praticado) no mundo. (2015, p. 126).

A partir da leitura da doutrina de CARVALHO, percebe-se predileção à distinção entre “hipótese tributária”, para a construção da linguagem prescritiva geral e abstrata; e “fato jurídico tributário” para a sua projeção factual. A distinção traz nitidez à compreensão da fenomenologia da incidência da norma tributária em sentido estreito ou regra-matriz de incidência tributária. (2017, p. 271).

Haverá subsunção, quando o fato jurídico tributário guardar absoluta identidade com a hipótese tributária (tipicidade). Em havendo tal conexão, estará instaurado, nos dizeres de Alfredo Augusto Becker (citado por CARVALHO), o laço abstrato pelo qual o sujeito ativo torna-se titular do direito subjetivo público de exigir a prestação, devendo o sujeito passivo cumpri-la. (2017, p. 271/272).

1.3 Da regra-matriz de incidência tributária

Após a apresentação dos temas acima destacados, adentra-se no estudo da regra-matriz de incidência tributária, também denominada “norma-padrão”.

De forma didática, JESUS registra linhas breves e certeiras para introduzir o tema:

A regra-matriz de incidência tributária ou norma-padrão dos tributos é uma norma jurídica de comportamento, uma vez que é dirigida diretamente aos contribuintes e serve para prescrever condutas. (2015, p. 128).

A autora também frisa que a regra matriz de incidência tributária traz os elementos mínimos possíveis que podem existir em uma norma jurídica tributária, sendo que nela são identificados os seguintes critérios: (i) material; (ii) espacial; (iii) temporal; (iv) pessoal (sujeito ativo e passivo); e (v) quantitativo (base de cálculo e alíquota). (2015, p. 128).

Infere-se do trecho acima que a regra-matriz de incidência tributária é uma norma de comportamento, pois disciplina a conduta do sujeito que deve a prestação fiscal em face do sujeito que a pretende. Além disso, é possível compreender que a norma padrão deve conter determinados critérios, sem os quais não poderá ser definida de tal forma.

Em sua obra, CARVALHO trata da fenomenologia da incidência da norma tributária em sentido estreito ou regra matriz de incidência tributária, registrando que haverá subsunção, quando o fato jurídico tributário constituído pela linguagem prescrita pelo direito positivo guardar absoluta identidade com o desenho normativo da hipótese tributária. (2017, p. 272).

Disso resulta a importância do tema porque, em não se vislumbrando a absoluta correspondência entre o fato jurídico tributário com a definição normativa da hipótese tributária, não haverá tipicidade, não sobrevindo efeitos jurídicos.

Nos tópicos que seguem será abordado cada um dos critérios. Para fins didáticos, far-se-á a subdivisão em dois grupos, iniciando-se com os critérios identificadores do fato, que, segundo a doutrina, enquadram-se no descritor, antecedente ou suposto da norma – são os aspectos material, espacial e temporal.

Posteriormente, adentrar-se-á na análise do consequente ou prescritor da norma tributária, quando então serão vistos os elementos pessoal e quantitativo.

1.3.1 Critério material

A doutrina considera o aspecto material o mais complexo, pois contém todos os dados de ordem objetiva e permite indicar o núcleo da hipótese de incidência.

CARVALHO informa que o critério ora abordado também é conhecido por elemento objetivo do fato gerador ou por aspecto material da hipótese de incidência. (2017, p. 278).

ATALIBA ensina que o critério material contempla

a designação de todos os dados de ordem objetiva, configuradores do arquétipo em que ela (hipótese de incidência) consiste; é a própria consistência material do fato ou estado de fato descrito pela h.i; é a descrição dos dados substanciais que servem de suporte a h.i. (2008, p. 95).

Para identificá-lo na regra-matriz, é preciso isolar o verbo e o seu complemento indicativos da atividade, pois, assim, obter-se-á a descrição do fato.

JESUS apresenta alguns exemplos para o reconhecimento do critério de acordo com cada espécie tributária.

Auferir receita, circular mercadoria e ser proprietário de bem imóvel retratam os aspectos materiais, respectivamente, dos impostos de renda, de circulação sobre mercadoria e sobre a propriedade predial e territorial urbana.

No que diz respeito à taxa (tributo vinculado), fornece o exemplo da expedição de um alvará de funcionamento (taxa de polícia).

O verbo realizar com o seu complemento – obra pública – descreve o fato previsto no antecedente da regra-matriz de incidência tributária da contribuição de melhoria. (2015, p. 128/129).

É prudente a colocação de CARVALHO no sentido de que não se revela adequado utilizar verbos impessoais (como haver) ou daqueles sem sujeito (i.e. chover) para o critério material, por não estarem associados ao sujeito que pratica a ação. Do contrário, ficará comprometido, por lógica, o seu sujeito. O doutrinador conclui que o verbo deve ser pessoal e de predicação incompleta, para que haja um complemento. (2017, p. 280).

1.3.2 Critério espacial

O critério espacial está associado à competência exercida por cada pessoa política, pois determina onde o fato deva ocorrer para que as consequências previstas na norma sejam geradas.

CARVALHO apresenta classificação didática do tributo de conformidade com o grau de elaboração do critério espacial da respectiva hipótese tributária. Assim temos:

  1. Hipótese cujo critério espacial faz menção a determinado local para a ocorrência do fato típico, i.e., impostos de importação e exportação;
  2. Hipótese em que o critério espacial alude a áreas específicas, quando então o acontecimento apenas ocorrerá quando nelas houver ocorrido geograficamente, i.e., imposto sobre a propriedade territorial rural e imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana; e
  3. Hipótese de critério espacial genérico, quando todo e qualquer fato ocorrido sob a vigência territorial da lei instituidora estará apto a desencadear seus efeitos. CARVALHO enquadra todos os demais impostos nesta espécie, i.e., imposto sobre produtos industrializados e imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços.  (2017, p. 282).

É válido registrar que o aspecto espacial não deve ser confundido com a eficácia territorial da lei, pois nem sempre se opera tal correspondência. É o que se verifica, por exemplo, com o imposto de renda e com o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana: na primeira hipótese, o tributo abrange fatos ocorridos fora das fronteiras do nosso país; na segunda, a lei municipal surte efeitos por toda a extensão do território correspondente, mas também alcança zonas rurais, não incluídas no impacto tributário. (CALMON e DERZI, 2003, p. 131/132)

1.3.3 Critério temporal

O elemento temporal da hipótese de incidência pode ser definido como a propriedade que esta tem de designar, de forma explícita ou implícita, o momento em que se deve considerar realizado o fato imponível.

Segundo JESUS, trata-se do aspecto que permite indicar o momento em que se considera ocorrido o fato imponível e, consequentemente, nasce a obrigação tributária.  (2015, p. 130).

Será o legislador quem irá estabelecer o momento em que será reputado consumado o fato imponível. Em havendo omissão neste ponto, entender-se-á consumado o fato na ocasião em que ocorrido o fato material descrito.

O aspecto temporal jamais poderá ser fixado em momento anterior à consumação do fato, em prestígio ao princípio da irretroatividade da lei (art. 150, inciso III, alínea “a”, da CF).

A esse propósito, bem observa Ataliba que a violação ao princípio da irretroatividade implica “inconstitucionalidade das antecipações de tributos (algumas das vezes camufladas sob a capa da substituição tributária)”. (2008, p. 95).

A título de nota, é válido destacar que a doutrina apresenta algumas classificações ao tratar da estrutura da hipótese de incidência. Será simples quando se referir a um fato ou acontecimento uno e singelo; complexo, quando forem conjugados diversos acontecimentos ou fatos, pela compreensão de uma situação integrada por diversos elementos reunidos numa só figura – o fato imponível só estaria consumado quando da ocorrência do último dos fatos elencados. (ATALIBA, 2008, p. 94/98)

CARVALHO registra crítica à classificação apresentada por compreender que a incidência tributária atinge somente o resultado, não sendo legítimo pretender efeitos tributários antes de sua consumação. (2017, p. 287/290).

Há ainda a classificação dos fatos em instantâneos ou periódicos sob o aspecto de sua dinâmica (e não de sua estrutura).

Instantâneos seriam os fatos imponíveis consumáveis de forma definitiva no tempo (que se esgotam em determinado instante) – a cada repetição do mesmo fato, tem-se fato imponível autônomo e distinto dos antecedentes.

Nos fatos periódicos não há situação temporal definida, pois consistem em situações ou estados, como, p.ex., ser titular de domínio ou de direito de posse, etc. Noutras palavras, embora haja um momento inicial, o fato imponível só é reputado consumado no momento fixado na lei. (ATALIBA, 2008, p. 94/98).

1.3.4 Critério pessoal

O critério pessoal consiste no conjunto de elementos, extraídos do prescritor da norma, que permite apurar quem são os sujeitos ativo (credor) e passivo (devedor) da relação jurídica.

1.3.4.1 Sujeito ativo

O artigo 119 do Código Tributário Nacional dispõe que o “sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público titular da competência para exigir o seu cumprimento”. (BRASIL, 1966).

O dispositivo tem recebido críticas por parte da doutrina, pois em dissonância com o artigo 7º e seu parágrafo 3º.

Ao realizar o cotejo entre o texto legal e os conceitos de competência e de capacidade tributária, ter-se-á a compreensão de que o termo “competência” (inserido em sua redação) não foi empregado com boa técnica.

A dúvida deve ser afastada, pois a competência tributária consiste na “aptidão para criar, “in abstrato”, tributos” (CARRAZZA, 2004, p. 449). O artigo 145 da Constituição da República Federativa do Brasil é claro ao restringir a atribuição tão somente à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.

Ao contrário, ao redigir o artigo 119 do Código Tributário Nacional, o legislador tratou da capacidade tributária, consistente na “aptidão para arrecadar e fiscalizar a exigência fiscal”. (COSTA, 2009, p. 188).

Portanto, é possível concluir que o legislador infraconstitucional dispôs sobre a capacidade tributária do sujeito ativo que, nem sempre, será uma pessoa política (dotada da competência tributária).

Falar-se-á em parafiscalidade quando a pessoa política delegar, mediante lei, a outra pessoa com personalidade jurídica de direito público (como autarquias ou fundações) ou privado (que persigam finalidades públicas ou de interesse público) as aptidões para arrecadar e fiscalizar tributos. (ATALIBA, 2008, p. 81 e 84).

COSTA destaca a figura do sujeito ativo auxiliar, compreendido como  aquele “que exerce as atividades de arrecadação e fiscalização para outra, mediante remuneração por essas tarefas”. Cita como exemplo a previsão inserta na Lei n. 11457/2007, pois compete à União a arrecadação e fiscalização da contribuição devida ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. O diploma referido prevê uma retribuição de 3,5% (três inteiros e cinco décimos por cento) do montante arrecadado pelos serviços. (2009, p. 188/189).

1.3.4.2 Sujeito passivo

O Código Tributário Nacional apresenta o conceito do sujeito passivo da obrigação tributária principal e acessória (artigos 121 e 122[1]).

Infere-se do texto da lei que o sujeito passivo tributário é a pessoa, física ou jurídica, detentora da aptidão para figurar no polo passivo da relação, incumbindo-lhe realizar o pagamento do tributo ou penalidade pecuniária (obrigação principal), ou a prática de um comportamento positivo ou negativo, no interesse da arrecadação tributária (obrigação acessória).

O diploma legal classifica o sujeito passivo da obrigação principal em: 1) contribuinte (ou sujeito passivo direto), quando a pessoa tiver “relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador” (art. 121, parágrafo único, I); e 2) responsável (ou sujeito passivo indireto), “quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei” (art. 121, parágrafo único, II). (BRASIL, 1966).

Por se tratar de obrigação de natureza “ex lege”, as convenções particulares, i.e., contratos, dentre outros instrumentos congêneres, não poderão ser opostas ao fisco (art. 123 do Código Tributário Nacional). De forma exemplificativa, cita-se a típica cláusula constante dos contratos de locação impondo ao locatário o dever de pagar o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU), sendo certo que não terá o condão de afastar a cobrança em face do contribuinte do tributo, qual seja, o proprietário do imóvel ou as demais pessoas elencadas no art. 34 do CTN. (MACHADO, 2004, p. 142/143).

ATALIBA destaca que o sujeito passivo nem sempre vem indicado de forma expressa na lei. Quando implícita, caberá ao intérprete deduzir tal indicação com suporte no sistema constitucional, sem descurar do fato imponível. Compreende que o legislador deve colocar como sujeito passivo, no que tange aos impostos, a pessoa cuja capacidade contributiva seja exteriorizada, conforme determina o Texto Constitucional em seu art. 153, §1° (2008, p. 87)

Logo, o olhar atento do operador do direito será essencial para apurar as situações em que o Estado, por mero comodismo, indique como sujeito passivo pessoa que não pratique o fato imponível ou não tenha relação pessoal e direta com tal materialidade.

A sujeição passiva apresenta vários contornos, o que se percebe por conta do relevante número de dispositivos contidos no corpo do Código Tributário Nacional sobre o tema, inclusive para a indireta.

A sujeição passiva indireta não será abordada com minúcias no presente trabalho, por não ser a finalidade visada. De qualquer forma, em razão da relevância de alguns pontos para o tema proposto, realizar-se-ão algumas verificações no subitem que segue e no capítulo correlato ao sujeito passivo do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana.

1.3.4.3 Sujeição passiva indireta ou responsabilidade 

O artigo 121, parágrafo único, II, do Código Tributário Nacional  dispõe que o responsável, de forma genérica, é aquele que, não sendo o contribuinte, tem sua obrigação como decorrência de disposição expressa de lei. (BRASIL, 1966).

No entanto, isto não implica dizer que o legislador infraconstitucional estará autorizado a eleger, de forma arbitrária, o responsável tributário, pois existem limitações constitucionais, conforme frisa ATALIBA:

As limitações constitucionais no trato da matéria de responsabilidade tributária são as seguintes: i) exigência de lei complementar (art. 146, III, b) e ii) razoabilidade, a orientar o legislador na escolha do terceiro que virá a responder pelo ônus tributário, uma vez que sempre há de estar vinculado indiretamente ao fato gerador (art. 5º, LIV). (2008, p. 197)

O mestre prossegue destacando que, na concepção doutrinária de Rubens Gomes de Sousa, a sujeição passiva indireta pode ocorrer por transferência ou substituição. Subdivide a primeira em sujeição passiva indireta por solidariedade, por sucessão ou por responsabilidade.

Fala-se em transferência quando, após surgida a obrigação tributária em face de determinada pessoa (o sujeito passivo direto), opera-se a transferência para outra (o indireto).

Há solidariedade quando duas ou mais pessoas são simultaneamente obrigadas pela mesma obrigação.

A sucessão ocorre quando a obrigação é transferida para outro devedor em razão do desaparecimento do devedor original.

Entende-se que há responsabilidade quando a lei tributária responsabiliza outra pessoa pelo pagamento do tributo.

Ainda de acordo com a classificação, a substituição se opera quando houver previsão expressa em lei no sentido de que a obrigação tributária surge, desde logo, em face de uma pessoa diferente do sujeito passivo direto.

É válido trazer à reflexão o entendimento de CARVALHO no sentido de que “as relações jurídicas integradas por sujeitos passivos alheios ao fato tributado apresentam a natureza de sanções administrativas”, pois, a seu ver, o terceiro figura no polo passivo por ter descumprido dever legalmente imposto, i.e., a situação do adquirente de bem imóvel que não empreendeu diligências para verificar se todos os tributos estavam quitados até a data do negócio (art. 130, CTN). (2017, 335).

1.4 Critério quantitativo

1.4.1 Base de cálculo (ou base imponível)

A base imponível (ou base de cálculo) e a alíquota (que será vista no tópico seguinte) integram o consequente da hipótese de incidência tributária e se referem ao aspecto quantitativo.

A base de cálculo é compreendida como a “dimensão do aspecto material da hipótese de incidência [...] É, por assim dizer, o seu aspecto dimensional”. (2008, p. 108).

A importância do elemento ora estudado é tamanha que o legislador inseriu no texto constitucional previsão expressa no sentido de que “as taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos” (art. 145, §2º, CF) (BRASIL, 1988). Visou, assim, resguardar o contribuinte das situações em que o fisco pretenda exigir prestações pecuniárias a um serviço ou ao exercício do poder de polícia sob o formato de imposto.

A esse propósito, ao citar Hector Villegas, ATALIBA apresenta notas esclarecedoras e que merecem registro:

A taxa também tem limites que são naturais à sua própria conformação objetiva e que estão referidos ao seu montante. Estes limites devem partir da noção básica, segundo a qual a mesma é um tributo vinculado, sendo sua hipótese de incidência uma determinada atividade estatal suscetível de ser individualizada, relativamente à determinada pessoa. Daí por que a fixação do montante não pode levar em conta circunstâncias inerente à pessoa ou aos bens do obrigado (que são hipóteses de incidência de imposto), mas só circunstâncias atinentes à atividade em si mesma, por ser ela, e não outra coisa, a hipótese de incidência da obrigação correspondente às taxas. (2008, p. 111).

CARVALHO destaca que a base de cálculo apresenta as seguintes funções: 1) medir as proporções reais do fato (capacidade contributiva); b) compõe a específica determinação da dívida (função projectiva); e c) confirma, infirma ou afirma o verdadeiro critério material da descrição contida no antecedente da norma. (2017, p. 341/343).

Portanto, a base imponível deverá guardar correspondência com o conteúdo econômico descrito na hipótese de incidência, pois, de outra forma, restará configurada a inconstitucionalidade da imposição (ATALIBA, 2008, p. 212). Assim, forma, fica nítida a função descrita no item “c” (acima) e apontada por CARVALHO – “havendo desencontro entre os termos do binômio (hipótese de incidência e base de cálculo), a base é que deve prevalecer. Por isso, tem o condão de infirmar o critério material [...]” (2017, p. 344)

Também é oportuna a distinção realizada por ATALIBA entre a “base imponível” (ou base de cálculo) e a “base calculada”, pois a primeira é um conceito legal – é a dimensão do aspecto material da hipótese de incidência – está no plano abstrato; ao passo que a segunda resulta da aplicação concreta da base imponível – está no plano da aplicação da lei – é a precisa medida de um fato (2008, p. 113).

1.4.2 Alíquota 

A alíquota pode ser compreendida como a fração da base de cálculo e que, após conjugada a esta, resulta na determinação da quantia objeto da prestação pecuniária.

Em regra, é apresentada como um percentual a ser aplicado sobre a base de cálculo e mediante o emprego das técnicas de proporcionalidade, de progressividade, de diferenciação e de regressividade. 

A respeito das técnicas aplicáveis à alíquota, são válidas as conclusões extraídas da doutrina de ATALIBA. Vejamos:

Será proporcional quando for uniforme e invariável, qualquer que seja o valor da matéria tributada. Ao contrário, ter-se-á progressividade quando a alíquota for elevada à medida que houver aumento da quantidade gravada. A primeira técnica costuma ser criticada por não revelar o princípio da capacidade contributiva (art. 145, §º, da CF); ao contrário, a segunda costuma receber elogios por atender ao referido comando constitucional.

A regressividade consiste na diminuição da alíquota à medida que houver aumento da base de cálculo e se aplica tão somente para a tributação extrafiscal.

Ter-se-á diferenciação quando forem adotadas alíquotas distintas de acordo com um ou mais critérios, como ocorre, por exemplo, com o IPVA, que poderá ter alíquotas diferenciadas em função do tipo e utilização do veículo (art. 155, §6º, II, CF).  (ATALIBA, 2008, p. 213).

Por fim, é válido destacar que a alíquota não é aplicável a todos os tributos, a exemplo do que se verifica com algumas taxas. Isso se justifica porque às taxas se aplica o princípio da remuneração. (COSTA, 2009, p. 117).


2 A REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA DO IPTU – PARTE 1 

2.1 Notas históricas acerca do IPTU

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 dispõe em seu artigo 156, inciso I, que compete aos Municípios instituir o imposto sobe a propriedade predial e territorial urbana[2]. (BRASIL, 1988).

No entanto, referida competência nem sempre foi disposta de tal forma nas Constituições anteriores, apurando-se modulações diversas.

Com efeito, o referido tributo já competiu aos Estados na Constituição de 1891 (art. 9º, item 2º). Foi objeto de dois impostos distintos (imposto predial e imposto territorial urbano), de competência dos Municípios, na Constituição de 1934.

Na Constituição de 1937, o imposto sobre a propriedade territorial estava reservado aos Estados, exceto sobre a urbana, que foi atribuída aos Municípios.

Com o advento da Constituição de 1946 ocorreu a unificação desses impostos, quando então o imposto predial e territorial urbano passou à competência dos Municípios. (MACHADO, 2017, p. 398/399).

2.2 Critério material

No capítulo anterior, destacou-se que o aspecto material

contém a designação de todos os dados de ordem objetiva, pois fornece o aspecto básico para se identificar o tributo exigido, permitindo a indicação do núcleo da hipótese de incidência. Corresponde ao verbo e seu complemento. (JESUS, 2015, p. 128).

O Código Tributário Nacional prevê expressamente que o fato gerador do IPTU é a “propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município” (art. 32, CTN). (BRASIL, 1966)

Há discussões acerca da constitucionalidade do dispositivo porque alguns defendem que o legislador infraconstitucional teria extrapolado os lindes do núcleo da ação tributável ao incluir, além da propriedade, o domínio útil e a posse.

Em sua obra, LOPES FILHO registra o entendimento de Paulsen, defensor da inconstitucionalidade do dispositivo. É o que resta claro no trecho abaixo transcrito:

Entendemos que o art. 32 do CTN, no que desborda do conceito de propriedade, é incompatível com o texto constitucional. De fato, note-se que é a riqueza relevada pela propriedade que é dada à tributação. Assim não se pode tributar senão quem revele tal riqueza. A titularidade de qualquer outro direito revela menor riqueza e, o que importa, não foram os demais direitos reais previstos constitucionalmente como ensejadores de impostos. (2015, p. 22/ 23).

No mesmo sentido, GAVALDÃO JR. defende a inconstitucionalidade do Código Tributário Nacional no tocante à descrição do núcleo da hipótese de incidência. (2002, p. 306/309).

Pela constitucionalidade, Barreto, citado por GAVALDÃO JR., defende que o legislador constitucional não adotou um sentido técnico para o vocábulo propriedade, mas sim uma acepção correntia (comum ou vulgar) (2002, p. 302) e, em atenção aos princípios da igualdade (art. 150, III, CF) e da capacidade contributiva (art. 145, §1º, CF), cuja observância também está sujeito o legislador infraconstitucional, o art. 32 do Código Tributário Nacional não padece do vício da inconstitucionalidade ao também abarcar o domínio útil e a posse. (LOPES FILHO, 2015, p. 16/17)

LOPES FILHO compreende que o entendimento de Paulsen revela desacerto porque fundado apenas numa interpretação gramatical. Entende que a não tributação da posse com “animus domini” e o domínio últil implicaria excluir da incidência do tributo manifestação de “propriedade” sob perspectivas sociais e econômicas, além de ferir os princípios da isonomia e da capacidade contributiva (p. 2015, p. 24 e 25).

Nesse mesmo diapasão, HARADA registra que o artigo 156, I, da Constituição Federal, donde se infere a outorga da competência impositiva municipal, deve ser interpretado em harmonia com os demais preceitos da Constituição Federal e à luz dos princípios da isonomia tributária e da capacidade contributiva, com o intuito de evitar injustiças sociais e, até mesmo, inviabilizar o lançamento tributário. Arremata ao exemplificar fazendo menção à parte final do art. 150, §3º, da Constituição Federal, pois o constituinte é peremptório ao submeter à tributação o promitente comprador. Registra, ainda, situações em que há  tributação mesmo quando o comprador do imóvel não tenha levado a registro o seu título aquisitivo (2012, p. 110/111).

Superadas as discussões, avança-se com a análise do art. 32 do Código Tributário Nacional.

Antes de abordar a propriedade, o domínio útil e da posse, é importante destacar o conceito de bens imóveis segundo o disposto no Código Civil, pois, segundo este diploma, abrange o solo e tudo quanto se lhe incorpore natural ou artificialmente (art. 79, Código Civil brasileiro[3]).

O legislador infraconstitucional adotou técnica diferente para o Código Civil vigente se comparado com o diploma de 1916, pois foi mais sucinto ao deixar de realizar a classificação em imóveis por natureza, por acessão física e intelectual. Esta técnica pode gerar dúvidas em relação à possibilidade de tributação do imóvel por acessão intelectual. No entanto, é justamente no cotejo entre a legislação civil e tributária que a incidência fica afastada pelo fato de o artigo 32 do Código Tributário abarcar apenas o bem imóvel por natureza ou por acessão física.

De acordo com o Código Civil, o proprietário goza do mais amplo direito real, pois tem pleno domínio sobre a coisa, podendo dela usar, gozar e dispor de maneira absoluta, exclusiva e perpétua.

DINIZ formula um conceito de propriedade a partir dos seus atributos, pois a compreende como sendo “o direito que a pessoa física ou jurídica tem, dentro dos limites normativos, de usar, gozar, dispor de um bem corpóreo ou incorpóreo, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha”. (2007, p. 114).

O domínio útil consiste no direito atribuído ao enfiteuta de usufruir o bem mediante o pagamento de uma renda anual ao aforador ou titular do domínio direto. É vedada a constituição de novas enfiteuses e subenfiteuses consoante o Código Civil de 2002, sendo que as existentes estão subordinadas às disposições do Código Civil de 1916. (TARTUCE; SIMÃO, 2008, p. 317).

Também existem discussões acerca da posse objeto da tributação.

Segundo o disposto no art. 1196 do Código Civil, “considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”. (BRASIL, 2002).

O artigo 34 do Código Tributário Nacional dispõe que o possuidor “a qualquer título” será contribuinte do IPTU. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que somente a posse com “animus domini”, assim entendida a exclusiva (não desdobrada), consiste no fato gerador do IPTU (Resp nº 1091198/PR, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 24-05-2011, DJe 13-06-2011).

Para LOPES FILHO, é preferível adotar a expressão posse com “animus domini” em contraponto com a posse “ad usucapionem” porque nem toda posse estável que faz incidir o IPTU pode transmudar-se em propriedade mediante o instituto da usucapião, tal como a posse exercida pelo usufrutuário. (LOPES FILHO, 2015, p. 20).

2.3 Critério espacial

O aspecto ora analisado refere-se ao local no qual ocorre o fato gerador da obrigação tributária.

Como já mencionado, o município competente para a instituição e cobrança do tributo, via de regra, é aquele no qual está situada a propriedade a ser tributada. É necessário, ainda, que o imóvel esteja localizado na zona urbana, pois, quando não, o imposto a ser tributado será o imposto sobre a propriedade territorial rural (ITR), de competência da União (art. 153, I, da CF).

O conceito de zona urbana pode ser extraído do artigo 32, §1º, do Código Tributário Nacional, cuja transcrição segue abaixo:

§ 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público:

I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;

II - abastecimento de água;

III - sistema de esgotos sanitários;

IV - rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;

V - escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado. (BRASIL, 1966).

Infere-se do dispositivo que será suficiente a presença de dois dos melhoramentos acima elencados para a configuração da zona urbana, porém, ainda, será necessário, conforme dicção legal, que estes sejam mantidos ou executados pelo Poder Público[4]. (LOPES FILHO, 2015, p. 40).  

Ao contrário, o conceito de zona rural será obtido por exclusão do de zona urbana, eis que a definição constante do art. 6º e seu parágrafo único da Lei n. 5868, de 12/12/1972 foi invalidada pelo Supremo Tribunal Federal[5]. (HARADA, 2012, p. 129/130)

É importante frisar que o artigo 32 do CTN foi alterado pelo art. 15 do Decreto-lei n. 57/1966. O dispositivo alterador foi recepcionado com status de lei complementar pela Constituição Federal de 1967 e pela EC n. 1/69 e, embora mais tarde tenha sido revogado pelo art. 12 da Lei n. 5868/1972, permaneceu em vigor pelo fato de a norma revogadora ter sido declarada inconstitucional por invasão da esfera de competência do legislador complementar.

Sendo assim, como dito, remanesce a alteração promovida pelo art. 15 do Decreto-lei n. 57/1966, razão pela qual o imóvel que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial, será tributado por meio do ITR, ainda que localizado na zona urbana do Município.

Não só os imóveis localizados na zona urbana, nos termos do art. 32 do CTN, com a ressalva do art. 15 do Decreto-lei n. 57/1966, serão objeto da tributação pelo IPTU, mas, também, é possível que a lei municipal considere urbanas “as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior” (art. 32, §2°, CTN)[6]. (LOPES FILHO, 2015, p. 40).

É válido frisar que as áreas urbanizáveis ou de expansão urbana não se confundem com a urbana, razão pela qual a compreensão dos requisitos para fins de tributação deve ser outra.

Consoante o disposto no art. 32, §2º, do CTN, os Municípios, por lei expressa, poderão considerar urbanas, mesmo que não preenchidos os requisitos dispostos no art. 32, §1º, as áreas urbanizáveis ou de expansão urbana. Para tanto, é necessário que constem de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes e se destinem à habitação, à indústria ou ao comércio.

Percebe-se que o disposto no artigo 32, §2º, do CTN não é autoaplicável, sendo imperiosa a existência de lei local que declare urbanas as áreas urbanizáveis ou de expansão urbanas.

Por fim, é oportuno ressaltar que haverá incidência do IPTU para os sítios de recreação, mesmo quando localizados fora da zona urbana, desde que atendidos os requisitos do artigo 14 do Decreto-lei n. 57/1966, abaixo transcrito:

Art. 14. O disposto no art. 29 da Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966, não abrange o imóvel que, comprovadamente, seja utilizado como "sítio de recreio" e no qual a eventual produção não se destine ao comércio, incidindo assim, sobre o mesmo imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, a que se refere o art. 32 da mesma lei. (BRASIL, 1966).

É possível compreender a partir da leitura do dispositivo que os requisitos para a tributação pelo IPTU são: 1) que o imóvel seja utilizado como sítio de recreio, ainda que localizado fora da zona urbana; e 2) que a produção não se destine ao comércio.

Portanto, percebe-se que o Decreto-lei não adotou o critério da localização do imóvel, mas sim o de sua destinação.

2.4 Critério temporal

O aspecto ora abordado versa sobre o momento em que se considera ocorrido o fato gerador, quando então nasce a obrigação tributária.

Não há no Código Tributário Nacional regulamento para este critério, razão pela qual tal tarefa ficou a cargo do legislador municipal, que deverá definir a periodicidade e o momento em que considerará ocorrido o fato imponível.

A esse propósito, destaca-se trecho da ementa da Apelação n. 1009067-51.2016.8.26.0053, relatada pelo Des. Eurípedes Faim do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

(...) MOMENTO DA OCORRÊNCIA DO FATO GERADOR DO IPTU. O Código Tributário Nacional não fixou uma data ou período específico para o momento da ocorrência do fato gerador do IPTU. Como regra geral, tem-se adotado o ano civil, especificando o dia 1º de janeiro de cada ano. Entretanto, há liberdade para os Municípios nessa fixação, pois o Código Tributário Nacional não determinou nada a esse respeito, nem ao menos que o imposto fosse anual, o que permitiria que a lei municipal previsse a ocorrência de fatos geradores em períodos menores ou maiores de tempo [...].

A título exemplificativo, verifica-se na Lei n. 6.989/66, do Município de São Paulo (BRASIL, 1966), que o momento fixado para a ocorrência do fato gerador do IPTU foi o dia 1º de janeiro de cada exercício. Isto é o que se apura, via de regra, no âmbito de outros Municípios, i.e., Piracaia/SP (art. 12, parágrafo único, Lei Complementar n. 25, de 12/12/2001) (PIRACAIA/SP, 2001) e São José dos Campos (art. 5º, parágrafo único, da Lei Complementar n. 2252, de 21/11/1979) (SÃO JOSÉ DOS CAMPOS/SP, 1979).

No entanto, outras periodicidades poderão ser definidas pela lei municipal, de acordo com as peculiaridades e alterações no curso do exercício. No entanto, em prestígio ao princípio da legalidade tributária e tipicidade fechada, o critério ora abordado deverá contar com previsão legal. Ainda, faz-se necessário que a periodicidade diversa da anual não tenha efeito confiscatório, o que demandará proporcionalidade das alíquotas aplicáveis (LOPES FILHO, p. 29).

Na vida prática, o critério temporal também é importante para o lançamento do tributo, pois as alterações ocorridas no curso do exercício, tais como, aumento ou supressões da área construída, titularidade, posse ou domínio útil, dentre outros fatores relevantes, não implicam alteração para o exercício em que o lançamento ocorreu. Ficam ressalvadas as hipóteses em que a lei municipal desça em minúcias atinentes às modificações promovidas ao longo do ano.

A propósito, apuram-se no Município de São Paulo cobranças proporcionais quando houver construção ou modificação de edificação que implique alteração do valor venal do imóvel, constituição de novo terreno, instituição de condomínio edilício em planos horizontais ou em planos verticais[7].

É oportuno registrar que a periodicidade para a ocorrência do fato gerador não se confunde com a possibilidade de parcelamento para o pagamento do tributo.

Com efeito, há situações em que o lapso de tempo para o critério em estudo, a depender de previsão expressa em lei por cada Município, poderá ser mensal, bienal, trimestral etc., caso em que o fato gerador ocorrerá em período inferior ao anual. Repita-se: o parcelamento se refere ao pagamento do tributo; a periodicidade ao momento em que se considera ocorrido o seu fato gerador, quando então se apura a situação do imóvel, i.e., área construída, modificações de titularidade, possuidor à época, dentre outras ocorrências.

Ao citar Ataliba, LOPES FILHO destaca que:

(...) o valor do bem, suas características levadas em consideração (área edificada, área não edificada, benfeitorias etc.), seu proprietário lato sensu serão, todos, referentes àquele dia. [...] a possibilidade de parcelar o pagamento de modo a permitir o adimplemento proporcional ao longo dos meses restantes é fenômeno relacionado à quitação da dívida que não afeta a relação tributária já erigida. É fenômeno plenamente diverso de uma dívida mensalmente apurada, constituída e exigida. (2008, p. 30).

É oportuno ressaltar a hipótese em que se apura a venda do imóvel durante o curso do exercício. Acaso a lei municipal considere o fato gerador ocorrido no dia primeiro de cada ano, tal fato não implica modificação do contribuinte durante o seu curso. Ou seja, o contribuinte continuará sendo aquele que praticou o fato gerador no dia 1º de janeiro do exercício, ao passo que o adquirente será tido como responsável nos termos do ar. 131, I, do Código Tributário Nacional.

A esse propósito, destaca-se:

APELAÇÃO - Execução fiscal Exceção de Pré-executividade que não foi julgada - IPTU dos exercícios de 2000 a 2002. Sentença que extinguiu o processo reconhecendo a impossibilidade de alteração do polo passivo da demanda. Alienação do imóvel no curso da execução - Redirecionamento contra os atuais proprietários - Obrigação 'propter rem' - Hipótese de responsabilidade por sucessão - Aplicação dos artigos 130, caput, e 131, I, ambos do CTN. Inaplicabilidade da Súmula 392 do STJ - Precedentes jurisprudenciais. Exceção de pré-executividade acolhida. Crédito do exercício de 2000 prescrito antes do ajuizamento da ação. Inteligência do art. 174, caput, do CTN. Reconhecimento de ofício. Possibilidade (§ 5º, do art. 219, do CPC e Súmula 409, do C. STJ). Prosseguimento da execução contra os atuais proprietários quanto aos créditos remanescentes - Recurso provido. (Apelação n.º 0501306-97.2005.8.26.0348, 18ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Roberto Martins de Souza, j.13/11/2014).

Por isso, o aspecto ora tratado figura dentre os critérios da regra matriz de incidência tributária, eis que a fixação do momento de ocorrência do fato gerador possibilitará analisar a regularidade dos procedimentos adotados pelo fisco em cotejo com a relação jurídico-tributária.


3 A REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA DO IPTU – PARTE 2

3.1 Critério pessoal: O sujeito ativo do IPTU

O artigo 119 do Código Tributário Nacional dispõe que “o sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público, titular da competência para exigir o seu cumprimento”. (BRASIL, 1966).

Ao conjugar o dispositivo com o artigo 156 da Constituição Federal, é possível concluir que o Município figura como sujeito ativo do tributo[8], desde que o imóvel cuja propriedade, domínio útil ou posse com “animus domini” esteja localizado em seu território[9].

Conforme o já destacado, a competência para a instituição do tributo deve ser respeitar os limites territoriais do Município. No entanto, há situações em que não há precisão nas demarcações do território municipal, o que pode acarretar conflito de competência. Isso se verifica quando há imprecisão do mapa cartográfico de modo a inviabilizar a correta localização das linhas divisórias dos Municípios contíguos.

Segundo HARADA, não há legislação que resolva a questão. O doutrinador compartilha situação prática por ele vivenciada na Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

Com o intuito de solucionar questão relativa ao duplo lançamento, o doutrinador orientou para que cada Município se atentasse à tributação da parcela do imóvel situado em seu território, adotando o critério de preponderância do ente em cujo território situava-se mais de 50% do imóvel objeto da tributação.  

No entanto, o caso era mais complexo porque não havia perfeita delimitação de fronteira entre os Municípios envolvidos, razão pela qual orientou para que fosse realizado acordo entre os entes para nova demarcação de suas linhas divisórias. Não houve avanço na tentativa em razão da discordância por parte da Casa Legislativa de um dos Municípios. (2012, p. 153).

MACHADO ressalta a hipótese em que a tributação é realizada por Município incompetente. Observa que o pagamento ao fisco incompetente não impede a tributação pelo ente competente, tendo o contribuinte de realizar o pagamento e pleitear a restituição pelo pagamento indevido a quem pagou de forma equivocada. Registra, ainda, casos em que se opera a cobrança de forma concomitante, quando, então, caberá ao contribuinte propor ação de consignação em pagamento a fim de elidir a mora. (2017, p. 45).

3.2 Critério pessoal: o sujeito passivo do IPTU

Consoante o disposto no art. 34 do Código Tributário Nacional, “o contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular de seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título”. (BRASIL, 1966).

Nesse sentido, conforme entendimento sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça (súmula 399), cabe ao Município, por meio de lei própria, estabelecer o sujeito passivo do IPTU, ou seja, escolher o contribuinte.

Segundo LOPES FILHO, não há na legislação nacional uma ordem de preferência para a escolha, cabendo verificar quem dentre as pessoas dispostas no dispositivo legal detém os poderes econômicos e jurídicos típicos de proprietário, elementos que revelam a capacidade contributiva e o critério material da regra matriz.

O doutrinador bem observa que não é adequado tributar o titular do domínio útil ou o possuidor apenas quando houver impossibilidade material ou jurídica de exigir o tributo do proprietário, pois, como dito, é necessário investigar quem, dentre os possíveis contribuintes, goza, de fato, da disponibilidade econômica sobre o imóvel. (LOPES FILHO, p. 46).

Logo, percebe-se que, embora a súmula editada pela Corte Especial confira a livre escolha ao ente tributante, esta está condicionada à investigação daquele que detém o domínio econômico sobre o imóvel, em prestígio ao princípio da capacidade contributiva.

No julgamento do REsp n. 47078/SP[10], relatado pelo Ministro Teori Albino Zavascki, é possível verificar que não há justificativa para que se tribute pura e simplesmente o proprietário do imóvel, sem que, contudo, seja apurado quem de fato detém a disponibilidade econômica da coisa.

A esse propósito, HARADA registra que o “sujeito passivo do IPTU só pode ser aquela pessoa física ou jurídica que detém a disponibilidade econômica do imóvel, seja ela possuidora (posseira), titular de domínio útil ou proprietária”. (2012, p. 118).

LOPES FILHO analisa caso envolvendo compromisso de compra e venda, chamando a atenção do leitor para que a situação em concreto seja vista com atenção, não se resolvendo a questão afeta à tributação de forma idêntica e imutável. É o que se observa no trecho em destaque:

[...] será válida a circunstância de tributação alternativa quando ambos denotem capacidade contributiva. É o que se verifica quando o promitente comprador está na posse do imóvel – ele tem direito real restrito à aquisição (art. 1417, Código Civil) e à sequela (art. 1418, Código Civil) – mas o promitente vendedor, mesmo sem posse direta, persiste como proprietário, tendo, ainda, domínio econômico da coisa, com base em seu direito real, consistente no pagamento do preço avençado, sobretudo quando há parcelamento do valor, ainda que os poderes de dono estejam, em boa medida, com o possuidor. Em situação, pois, em que há uma divisão do domínio estável da coisa, facultando a tributação tanto do proprietário (promitente vendedor) quanto do possuidor (promitente comprador).(2015, p. 54).

O trecho em destaque fornece exemplo no qual se nota a manifestação simultânea da capacidade contributiva tanto por parte do promitente vendedor quanto do promitente comprador, quando, então, o fisco poderá tributar qualquer um deles indistintamente.

No entanto, há situações em que não se apura a disponibilidade econômica do promitente vendedor, caso em que deverá ser excluído  da tributação.

No tópico a seguir, faz-se o registro de outra hipótese envolvendo o compromisso de compra e venda, porém não se trata de tributação simultânea do promitente comprador e do promitente vendedor como contribuintes, mas sim de responsabilidade tributária.

Como já destacado, o artigo 34 do CTN dispõe que o possuidor a qualquer título também pode figurar como contribuinte do imposto. No entanto, é oportuno destacar o entendimento pacificado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que somente a posse com “animus domini” permite a tributação do possuidor.[11]

Sendo assim, por não se vislumbrar a posse com “animus domini” do locatário, não é possível considerá-lo contribuinte, mesmo que haja previsão em contrato. Dois são os motivos: 1) as convenções particulares relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos não podem ser opostas ao fisco (art. 123 do Código Tributário Nacional); e 2) o locatário, embora possuidor direto, não exerce posse com “animus domini”.

Por identidade de motivos, apuram-se algumas decisões excluindo a tributação em face do possuidor de bem público por força de contrato de concessão, permissão ou autorização.[12]

Por fim, é importante trazer situações em que se apuram mais de um proprietário, mais de um detentor do domínio útil ou mais de um possuidor, caso em que todos serão considerados contribuintes por força da solidariedade prevista no artigo 141, I, do Código Tributário Nacional. Isso se justifica porque há interesse comum na situação que constitui o fato gerador da obrigação.

3.3 Responsabilidade tributária

Dispõe o artigo 121, parágrafo único, inciso II, do Código Tributário Nacional, que o sujeito ativo do IPTU poderá lançar o imposto contra o responsável tributário.

Infere-se do artigo 128 do Código Tributário Nacional que a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa decorre de lei, sendo necessário que esta (a pessoa) esteja vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação.

Para melhor compreensão, transcrevemos o dispositivo:

Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação. (BRASIL, 1966).

De forma exemplificativa, citam-se os casos envolvendo compromisso de compra e venda, em que há a figura do promitente vendedor e a do promitente comprador. O tema demanda análise atenta porque o negócio jurídico pode apresentar peculiaridades diversas, tais como ser: 1) em caráter irrevogável e irretratável, mesmo diante do inadimplemento do compromissário comprador, com transmissão imediata da posse ao promitente comprador e averbação no registro de imóveis; 2) revogável e retratável, diante do inadimplemento, sem averbação ou com averbação, dentre outras situações.

Repita-se. O contexto deve ser apreciado com cautela, pois, nem sempre, o lançamento tributário em face de um ou do outro poderá ser considerado legítimo. A análise do domínio econômico da coisa revela-se importante para averiguar se a eleição do sujeito passivo foi feita de forma correta.

Com efeito, o art. 128 impõe requisitos para a atribuição de responsabilidade tributária a terceira pessoa, a saber: 1) existência de lei; e 2) que a pessoa esteja vinculada ao fato gerador da obrigação. Para o requisito de número dois, é necessário, ainda, que a lei defina se a responsabilidade do contribuinte restará excluída ou se permanecerá em caráter supletivo.

O tema costuma ser exemplificado pela doutrina com a citação do recurso especial n. 1.111.202-SP (2009/0009142-6), relatado pelo Ministro Mauro Campbell Marques, pois sujeito ao regime de recursos repetitivos. Abaixo segue a transcrição de sua ementa:

EMENTA. Tributário. Execução fiscal. IPTU. Contrato de promessa de compra e venda de imóvel. Legitimidade passiva do possuidor (promitente comprador) e do proprietário (promitente vendedor). 1. Segundo o art. 34 do CTN, consideram-se contribuintes do IPTU o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título. 2. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que tanto o promitente comprador (possuidor a qualquer título) do imóvel quanto seu proprietário/promitente vendedor (aquele que tem a propriedade registrada no Registro de Imóveis) são contribuintes responsáveis pelo pagamento do IPTU. Precedentes: REsp n. 979.970- SP, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJ de 18.6.2008;[...]. 3. “Ao legislador municipal cabe eleger o sujeito passivo do tributo, contemplando qualquer das situações previstas no CTN. Definindo a lei como contribuinte o proprietário, o titular do domínio útil, ou o possuidor a qualquer título, pode a autoridade administrativa optar por um ou por outro visando a facilitar o procedimento de arrecadação” (REsp n. 475.078-SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 27.9.2004). 4. Recurso especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ n. 8/2008.

Ao comentar a decisão, LOPES FILHO salienta que o entendimento firmado não se aplica a qualquer caso, pois a situação retratada na decisão supra destacada revelou existir lei municipal prevendo a responsabilidade tributária do promitente vendedor pelo fato de não ter sido diligente no cumprimento das obrigações acessórias, mormente quanto ao dever de informar as alterações aos registros competentes. Neste caso, um deles será cobrado na condição de contribuinte e ou como responsável.

O doutrinador ainda observa que, em determinados contextos, é possível que tanto o promitente comprador quando o promitente vendedor revelem capacidade contributiva, caso em que se opera uma divisão do domínio estável da coisa, podendo o fisco tributar tanto um quanto o outro. Isto se verifica, por exemplo, quando o promitente comprador possui o imóvel e o promitente vendedor, mesmo sem a posse, fica mantido como proprietário por conta do seu direito real relativo ao pagamento do preço avençado. (2015, p. 53/54).

Nota-se, portanto, que as situações acima são distintas. Como já visto, a sujeição passiva tributária deve ser analisada em cotejo com a capacidade contributiva. Se, a título de exemplo, o proprietário (promitente vendedor) já não revele mais esta capacidade, a tributação só se relevará correta em face do promitente comprador (possuidor com “animus domini”).

O Superior Tribunal de Justiça proferiu algumas decisões em que se revela possível realizar a distinção nos casos analisados, preservando, por isso, a técnica necessária à identificação do sujeito passivo.

É o que se observa no Resp 1204294, também de relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques. Abaixo seguem alguns trechos da ementa para melhor compreensão da distinção realizada em face do Resp 1111202/SP.

[...] Contornos específicos, que fazem destacar-se um caso particular na massa de demandas repetitivas, reclamam detido pronunciamento jurisdicional, como forma mesmo de aperfeiçoar o regime estabelecido na Lei n. 11.672/2008” 3. Além disso, no que se refere ao acórdão proferido em sede de apelação (fls. 86/94), o Tribunal de origem, entre outros fundamentos, entendeu que, ainda que o promitente comprador não seja  proprietário em virtude da ausência de registro da escritura de compra e venda no Cartório de Registro de Imóveis, ele o tornou em razão da usucapião, explicitando que “por força de promessa de compra e venda celebrada em caráter irrevogável e irretratável, com transmissão imediata da posse, lavrada no ano de 1979, devidamente averbada no competente cartório de registro de imóveis”, sendo que, “de tão longínqua a data de formação do contrato, já se exauriu, há muito, o prazo da usucapião”, razão pela qual deve ser afastada a responsabilidade do promitente vendedor....

Resta clara a compreensão dos julgadores porque tiveram a percepção de ter inexistido no caso concreto a repartição do domínio econômico da coisa, pelo fato de, na prática, já haver compra e venda aperfeiçoada.

Avançando mais um pouco no tema, vale destacar que a posse “a qualquer título”, prevista no art. 34 do Código Tributário Nacional, também demanda análise em cotejo com o domínio econômico da coisa. A Corte Especial tem sido categórica no sentido de que a posse para fins de tributação só pode ser a que revele “animus domini”.

A esse propósito:

Ementa: TRIBUTÁRIO. IMÓVEL DE DOMÍNIO DA UNIÃO. CONCESSÃO DE USO. IPTU. NÃO INCIDÊNCIA. CESSIONÁRIO. POSSE SEM ANIMUS DOMINI. PRECEDENTES. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, o bem imóvel de domínio da União, ocupado por cessionária de uso de área, não se sujeita a incidência de IPTU, haja vista que a posse, nessa situação, não é dotada de animus domini. 2. O cessionário do direito de uso não é contribuinte do IPTU, haja vista que é possuidor por relação de direito pessoal, não exercendo animus domini, sendo possuidor do imóvel como simples detentor de coisa alheia. 3. Precedentes: AgRg no Ag 1207082/RJ, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Primeira Turma, DJe 14/04/2010; AgRg no Ag 1129472/SP, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJe 01/07/2009; AgRg no REsp 947267/RJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ18/10/2007; REsp 681406/RJ, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ 28/02/2005; AgRg no Ag 1243867/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 12/03/2010; AgRg no REsp 885.353/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 06/08/2009; REsp 933.699/RJ, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 28/03/2008; REsp 325489/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 24/02/2003. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL AgRg no REsp 1034641 RJ 2007/0044985-2 (STJ)

Por identidade de motivos, não se afigura correta a tributação do locatário, ainda que haja previsão contratual, não só em razão da inocorrência de posse com “animus domini”, mas também em razão do prescrito no art. 123 do Código Tributário Nacional.[13]


4 A REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA DO IPTU – PARTE 3

4.1 Base de cálculo

O artigo 33 do Código Tributário nacional dispõe que “a base de cálculo do imposto é o valor venal do imóvel” (BRASIL, 1966) e, em seu parágrafo único, expressa que, para a determinação desta (base) não deve ser considerado o valor dos bens móveis mantidos, em caráter permanente ou temporário. Noutras palavras, não compõe a base o bem por acessão intelectual.

Segundo a doutrina, a previsão inserta no parágrafo único do dispositivo seria desnecessária, pois ao dispor sobre o fato gerador do imposto no artigo 32, “caput”, do mesmo Código, o legislador foi categórico ao incluir apenas os imóveis por natureza ou por acessão física.

Acerca do conceito de valor venal, HARADA informa que há uma definição doutrinária acolhida pela jurisprudência, sendo “aquele que o imóvel alcançará para compra e venda à vista, segundo condições usuais do mercado de imóveis, e que a variação de dez por cento para mais ou para menos é usual”. (2012, p. 349).

O conceito é pertinente pelo fato de a disponibilidade econômica ser essencial ao atendimento do princípio da capacidade contributiva, de cunho constitucional.

Há de se indagar se a disposição prevista no art. 33 do CTN de que a base de cálculo deve ser o valor venal configura invasão da competência municipal por parte da União (quando edita normas de caráter geral). No entanto, a doutrina considera que cabe ao legislador local definir os fatores pertinentes e juridicamente relevantes para o lançamento, razão pela qual não há que se falar em restrição à competência municipal.

A esse propósito, a regulamentação municipal de tais fatores deve ser realizada por meio de lei municipal (e não por ato infralegal), em respeito ao princípio da legalidade.

No recurso especial n. 648.245, com repercussão geral reconhecida,  interposto pelo Município de Belo Horizonte, questionava-se decisão do Tribunal de Justiça de Minas que considerou ilegal a fixação do novo valor venal dos imóveis do município por meio de Decreto (e não por lei).

Ao relatar a insurgência recursal, o Ministro Gilmar Mendes observou que o Código Tributário Nacional é claro quanto à exigência de lei para a majoração de tributo (art. 97, parágrafo primeiro, CTN), o que não se confunde com a atualização do valor, não submetida a exigência de reserva legal. (STF, 2017).

A súmula 160 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça também é expressa nesse sentido: “É defeso, ao Município, atualizar o IPTU, mediante decreto, em percentual superior ao índice oficial de correção monetária”.

Compreende-se do teor do enunciado que a atualização por meio de decreto é possível, desde que respeitado o índice de correção monetária. De outro modo, as alterações que extrapolem os limites da súmula, deverão ser objeto de lei.

Há quem defenda entendimento pela possibilidade de ser válida a edição de decreto que defina a técnica de cálculo e a planta de valores. Os defensores desta corrente justificam a tese a partir da distinção entre base normativa e base calculada.

ATALIBA ensina que a base de cálculo corresponde a um conceito legal – é a dimensão do aspecto material da hipótese de incidência – está no plano abstrato (base normativa); ao passo que a base calculada resulta da aplicação concreta da base imponível – está no plano da aplicação da lei – é a precisa medida de um fato (2008, p. 113).[14]

LOPES FILHO destaca o entendimento de Aires Barreto no sentido de que a planta de valores consiste em ato administrativo e não um ato normativo, podendo, por isso, ocorrer a fixação por meio de Decreto:

É bom ter presente que o “mapa ou planta de valores” é o ato administrativo de aplicação da norma leal a casos concretos. Mas não é ato normativo: só declara os valores apurados pelo Fisco (declaração resultante de mera verificação de fato). A planta constitui a aplicação da lei (esta sim abstrata e genérica) a um grupo de fatos, uma série de fatos concretos já individualizados e identificados.  (2015, p. 78/79).

No entanto, HARADA ressalta que a base de cálculo do imposto é o valor venal do imóvel e, por ser um dos aspectos do fato gerador da obrigação tributária, só pode ser fixado ou alterador por lei, revelando-se inconstitucional a sua majoração por decreto, o que já foi decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (RE.92.335-SP, in RTJ-96/880). (2002, p. 348).

LOPES FILHO registra as fases para que ocorra a definição do valor a ser pago por parte do contribuinte. Veja abaixo:

É fácil perceber que há uma gradação normativa a ser percorrida até se definir o valor a ser pago por um contribuinte de IPTU: primeiro o padrão abstrato do valor venal, estabelecido pelas normas gerais contidas no CTN; segundo, legislação local prescrevendo não só o valor venal como base de cálculo, mas, sobretudo, seu critério de apuração (se individualmente ou por avaliações em massa); terceiro, definição do método, fórmula e elementos de mensuração (adequados aos critérios individualizados ou de massa anteriormente optado, recorrente inclusive, neste último, à planta genérica de valores); quarto, o lançamento, considerando a base calculada em atenção às particularidades do imóvel de determinado contribuinte. (2015, p. 75).

4.2 A majoração do valor venal

A Constituição Federal dispõe que “ninguém será obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (art. 5º, inciso II). (BRASIL, 1988).

Ao tratar das limitações do poder de tributar, o constituinte assegurou ao contribuinte que a exigência ou aumento de tributo só podem ser veiculados por meio de lei (art. 150, inciso I, CF).

Consagrou assim, com o intuito de proteger os cidadãos, o princípio da reserva legal (também conhecido por princípio da legalidade tributária). (2009, p. 102).

Na mesma linha, o legislador infraconstitucional estabeleceu no Código Tributário Nacional, em seu art. 97, inciso II, que a majoração de tributos só poderá ser estabelecida por meio de lei.

Noutras palavras: o princípio da legalidade tributária deverá ser atendido, sob pena de o aumento ser considerado ilegal e passível de impugnação na esfera extra e/ou judicial.

Dispõe o parágrafo primeiro do dispositivo citado que “equipara-se à majoração do tributo a modificação da sua base de cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso”. Em seu parágrafo segundo estabelece que “não constitui majoração do tributo, para fins do disposto no inciso II, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo”. (BRASIL, 1966).

A interpretação atenta do dispositivo permite extrair três informações de relevo: 1) a modificação da base de cálculo do tributo que importe em torná-lo mais oneroso resulta em sua majoração; 2) a majoração só pode ser estabelecida por meio de lei em sentido formal; e 2) a mera atualização monetária não configura majoração. 

Logo, tem-se a compreensão de que o imposto só pode ser majorado por meio de lei, em prestígio ao princípio da legalidade tributária, aplicando-se a mesma regra para a modificação de sua base de cálculo quando se tornar mais oneroso. A  mera atualização da base de cálculo pode ser feita por ato infralegal, normalmente por meio de Decreto.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula nº 160, segundo a qual “é defeso, ao Município, atualizar o IPTU mediante decreto em percentual superior ao índice oficial de correção monetária.”

A Corte Especial já conta com diversos julgados sobre o tema, trazendo-se, a título de exemplo, a ementa abaixo transcrita:

TRIBUTÁRIO. IPTU. MAJORAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO POR MEIO DE DECRETO MUNICIPAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 160/STJ.

1. Nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, a majoração da base de cálculo do IPTU depende da elaboração de lei, não podendo um simples decreto atualizar o valor venal dos imóveis sobre os quais incide tal imposto com base em uma planta de valores, salvo no caso de simples correção monetária.

2. Não há que se confundir a simples atualização monetária da base de cálculo do imposto com a majoração da própria base de cálculo. A primeira encontra-se autorizada independentemente de lei, a teor do que preceitua o art. 97, § 2º, do CTN, podendo ser realizada mediante decreto do Poder Executivo; a segunda somente poderá ser realizada por meio de lei.

3. Incidência da Súmula 160/STJ: [...] Agravo regimental improvido. AgRg no AREsp 66849 / MG AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL2011/0174910-2, Relator Ministro HUMBERTO MARTINS, Segunda Turma, julgado em 06/12/2011.

No que tange ao princípio da anterioridade, em havendo majoração da base de cálculo, a interpretação conjunta do artigos 150, inciso III, alínea “b”, e seu parágrafo primeiro[15], permite concluir que se aplica apenas a anterioridade comum, não havendo a obrigatoriedade de ser observado o princípio da noventena (ou anterioridade nonagesimal), em razão da redação dada ao referido parágrafo pela Emenda Constitucional n. 42/2003[16].

A esse propósito, ALEXANDRINO e PAULO abordam o tema de forma clara e precisa (2009, p. 41/44):

[...] a EC 42/2003 passou a prever, no art. 150, III, “c”, como regra geral, a necessidade de aguardar-se um prazo mínimo de 90 dias entre a publicação da lei que institui ou aumenta tributo e sua exigência. Essa norma, que pode ser chamada “princípio da anterioridade nonagesimal geral”, “prazo geral de noventena” ou, simplesmente, “noventena” deve ser observada cumulativamente com o princípio da anterioridade do exercício financeiro, a menos, é claro, que o tributo se enquadre como exceção a um dos princípios ou a ambos [...] São os seguintes os tributos não sujeitos ao art. 150, III, “c”, da Carta Política: [...] fixação da base de cálculo do imposto sobre propriedade predial e territorial urbana (IPTU).

Portanto, em havendo a majoração da base de cálculo do IPTU, por meio de lei, até o dia 31 de dezembro de determinado ano, o lançamento será considerado regular a partir do dia primeiro de janeiro do ano seguinte.

4.3 Alíquota

A alíquota consiste no percentual incidente sobre a base de cálculo (valor venal do imóvel) e deve ser definida pelo legislador municipal.

LOPES FILHO salienta a importância da relação lógica entre o critério temporal e a alíquota, pois o legislador municipal pode estabelecer periodicidade inferior ou superior a um ano para a tributação, razão pela qual a atenção deve ser redobrada para que não reste configurado o confisco. (2015, p. 83).

SABBAG registra que o princípio da vedação ao confisco (ou da não-confiscatoriedade) deriva do princípio da capacidade contributiva. A tributação que extirpa o patrimônio do contribuinte, com desrespeito a sua capacidade contributiva e ao direito de propriedade, tem caráter confiscatório, e é vedada pelo artigo 150, inciso IV, da Carta Magna. (p. 43/44).

Acaso, por exemplo, a tributação ocorra trimestralmente, não poderá o legislador pura e simplesmente adotar a mesma alíquota fixada para uma tributação anual, sob pena de restar configurada carga tributária excessiva e desproporcional, malferindo diversos princípios constitucionais, tais como a dignidade humana, a vedação ao confisco, a proporcionalidade e a razoabilidade.

A depender da forma de aplicação da alíquota, os impostos podem ser classificados em proporcionais ou graduados. É considerado proporcional quando há mera aplicação de alíquota fixa à base calculada. Quanto maior a base calculada maior será o valor a ser pago.

Nos impostos graduados as alíquotas são variáveis, podendo ser progressivos, quando a alíquota for maior em razão da base calculada; e regressivos, quando ocorrer o inverso.

Falar-se-á em progressividade fiscal quando o aumento ocorre em relação à base de cálculo ou à capacidade contributiva com o intuito de aumentar a arrecadação. A progressividade extrafiscal apresenta finalidade diversa, tal como a de assegurar a função social da propriedade. (LOPES FILHO, p. 85/87).

A progressividade em razão da função social da propriedade será abordada no tópico seguinte.

4.4 A progressividade do IPTU

Antes de adentrar na análise da progressividade do IPTU, é oportuno destacar a diferença entre impostos progressivos e seletivos, apesar de ambos apresentarem natureza extrafiscal (efeito econômico, não meramente arrecadatório). (2015, p. 441).

MACHADO, fazendo alusão aos ensinamentos de COSTA, registra que o imposto é considerado progressivo quando a alíquota é elevada conforme o aumento da base calculada, sendo o percentual aplicado a um mesmo objeto (2017, p. 250/252).

O imposto será considerado seletivo quando várias alíquotas existirem para diferentes objetos. É o que se verifica, por exemplo, quando se estabelece alíquotas diferentes para IPTU em relação a imóveis diversos, em razão do uso ou localização (2017, p. 252).

Há divergência doutrinária e jurisprudencial acerca da aplicação da progressividade ao IPTU.

Para alguns, a progressividade não se aplica ao imposto pelo fato de ser considerado um tributo de natureza real.

Vale relembrar a classificação doutrinária dos impostos em pessoais e reais. Pessoais (ou subjetivos) são os tributos que levam em conta as condições individuais do contribuinte, por exemplo, sua renda, patrimônio, com vistas a apurar sua capacidade econômica. Os tributos reais (ou objetivos) consideram a realidade econômica com observância do patrimônio (bem juridicamente considerado) não dando muita relevância às características pessoais. (2015, p. 441).

Parte da doutrina critica a classificação acima mencionada por considerar que a capacidade contributiva deve ser analisada tendo em vista a pessoa, pois os objetos (coisas) não são titulares de direitos.

Os defensores da classificação supra consideram que a dimensão econômica relevante toma por base o patrimônio, razão pela qual não faz sentido a incidência do princípio da capacidade contributiva. Por isso, não seria correta a progressividade em relação ao IPTU, admitindo-se apenas uma alíquota fixa e tributação proporcional, exceto para as alíquotas adotadas como instrumento da política urbana, com o intuito de assegurar a função social da propriedade.

LOPES FILHO cita o entendimento de Barreto, que compreende pela não aplicação do princípio da capacidade contributiva com vistas à progressividade em relação ao IPTU, pois, por exemplo, uma pessoa rica, titular de vários imóveis de pequeno valor, pode ser tributada por uma alíquota baixa. No entanto, o doutrinador também registra a compreensão de Machado, no sentido de que a capacidade contributiva resta atendida pelo fato de, via regra, o reflexo financeiro recair sobre o locatário. (2015, p. 85/86).

A discussão também foi objeto de apreciação pela Suprema Corte.

Antes do advento da Emenda Constitucional n. 29/2000, o Pretório Excelso sumulou entendimento considerando inconstitucional a fixação de adicional progressivo do imposto predial e territorial urbano em função do número de imóveis do contribuinte[17]. Aparentemente, a Corte compreendia pela não aplicação do princípio da capacidade contributiva aos impostos de natureza real.

No entanto, apurou-se contradição ao ser realizado o cotejo entre as súmulas 589 e 539.

A súmula 539 apresenta o seguinte teor: “É constitucional a lei do Município que reduz o imposto predial urbano sobre imóvel ocupado pela residência do proprietário, que não possua outro”.

Infere-se da súmula que, para a redução da carga tributária, foram consideradas as características pessoais do contribuinte, o que se contrapõe ao teor do enunciado de n. 589.

Oportuna é a observação realizada por LOPES FILHO:

Ao se admitir a isenção por características pessoais, tem-se aceita a possibilidade de mensuração mais profícua da aptidão econômica por meio de tributos reais. Se essa capacidade será utilizada para aumentar a carga do imposto, esse aumento deve ser investigado por outros critérios jurídicos, e não pela afirmação de que tributo real não se presta a mensurar a capacidade contributiva, como se houvesse uma impossibilidade lógica nesse tocante (2015, p. 89).

O doutrinador observou que não há sentido para que seja vedada a aplicação do princípio da capacidade contributiva aos impostos classificados como reais. Aliás, pondera que o Supremo passou a admitir sua aplicação a tais impostos após o advento da Emenda Constitucional n. 29/2000.

De fato, antes da referida Emenda, algumas leis foram declaradas inconstitucionais pela Suprema Corte em razão da falta de previsão para a progressão em razão do valor do imóvel, sua destinação (residencial ou comercial) ou localização.

Tanto que o Supremo Tribunal Federal editou a súmula n. 668, cujo teor segue transcrito:

É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana.

Infere-se do enunciado que, antes da Emenda Constitucional n. 29/2000, o Supremo não admitia alíquotas progressivas em razão do valor do imóvel, sua destinação ou localização, ainda que muitos juristas defendessem a autorização genérica à aplicação do princípio da capacidade contributiva consoante os termos do art. 145, §1º, da CF, “in verbis”:

§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.

A Corte só admitia a progressividade do imposto para assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana, compreendendo pela aplicação conjunta dos artigos 145, §1° e 182, §4°, ambos da CF[18].

No entanto,  a questão ficou superada com o advento da referida Emenda, havendo previsão expressa para a aplicação da capacidade contributiva ao imposto ora estudado. Confira:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

I -  propriedade predial e territorial urbana;

II -  transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;

III -  serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.

IV -  (Revogado).

§ 1º Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, inciso II, o imposto previsto no inciso I poderá:

I -  ser progressivo em razão do valor do imóvel; e

II -  ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel. (BRASIL, 1988).

Em que pese haver discussões acerca da (in) constitucionalidade da emenda que acrescentou o parágrafo primeiro ao referido dispositivo, o Supremo Tribunal Federal tem compreendido pela aplicação do princípio da capacidade contributiva ao imposto, citando-se a título de exemplo o RE 423.768.

No referido recurso, a administração do Município de São Paulo alegou que a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo contrariava o disposto no art. 156, parágrafo 1º, incisos I e II, da Constituição Federal, pois referido dispositivo autorizava a progressividade da alíquota. Sustentou ainda a necessária observância da capacidade contributiva. Ponderou, também, que não havia vedação para a instituição do imposto progressivo de natureza real, sob pena de violar o princípio da isonomia em cotejo com o da capacidade contributiva.

O ministro Ayres Britto acompanhou o voto do relator, compreendendo que a cobrança deve considerar o patrimônio, a renda e o volume de atividades econômicas das pessoas, em prestígio ao parágrafo primeiro do artigo 145 da Constituição Federal, razão pela qual as pessoas com maior capacidade contributiva devem contribuir em maior escala, com o que se tem uma justiça social imobiliária. [19]

A partir do que foi exposto e com base na classificação dos impostos em progressivos e seletivos, podemos concluir que, para as situações previstas no artigo 156, §1º, inciso I, e 182, §4º, II, ambos da CF, há progressão de alíquotas. E, para a previsão inserta no artigo 156, §1º, II, tem-se seletividade.

Por fim, é importante destacar que o IPTU progressivo no tempo, previsto no art. 182, §4º, inciso II, da Constituição Federal, de caráter extrafiscal, incidirá quando não satisfeita a obrigação de parcelamento, edificação e utilização compulsória do imóvel urbano no prazo assinalado pelo Poder Executivo, ou quando não cumpridas as etapas previstas para os empreendimentos de grande porte. Nestas hipóteses, o Poder Executivo Municipal aplicará o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo, majorando a alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos, conforme o disposto no art. 7º da Lei n. 10257/2001[20]. (2014, p. 581/583).


5 ASPECTOS RELEVANTES DO IPTU

5.1 O IPTU e as restrições ambientais

O meio ambiente ecologicamente equilibrado é princípio constitucional que  visa assegurar, como fim último, a própria vida. Isso justifica a razão de o constituinte ter dedicado capítulo próprio para tratar do tema (Título VIII, Capítulo VI).

Especificamente quanto ao tópico ora abordado, percebe-se que o artigo 225, §1º, inciso III, da Constituição Federal[21], possibilita ao Poder Público a definição de espaços a serem especialmente protegidos. Trata-se de um instrumento de garantia e efetividade ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (2014, p. 39/46).

Noutras palavras, há autorização para que restrições de cunho ambiental sejam implementadas com o intuito de assegurar a todos um meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações. Referidas restrições podem, inclusive, afetar o patrimônio do particular, o que, a depender da abrangência, gerará reflexos na base cálculo do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana.

De fato, acaso as restrições/limitações de cunho ambiental cheguem a ponto de atingir propriedades tributadas pelo imposto ora em estudo, faz-se necessário analisar em que grau ocorreu a redução/supressão do conteúdo econômico da propriedade. Conforme o caso,  tributação poderá restar afetada ou até mesmo prejudicada.

Noutras palavras, é necessário realizar o cotejo entre as normas constitucionais, pois, além de assegurar às presentes e futuras gerações um meio ambiente ecologicamente equilibrado, o constituinte também se preocupou com o resguardo do direito fundamental à propriedade, à sua função social e à capacidade contributiva.

Como visto, a disponibilidade econômica da propriedade, domínio útil ou posse configura o fato gerador do IPTU. Acaso tal disponibilidade fique comprometida, a tributação deverá ser proporcional ou não poderá subsistir, sob pena de malferir os princípios da capacidade contributiva, da vedação ao confisco e, também, da igualdade.

CEZAROTI registra que “os proprietários ou possuidores de imóveis urbanos que sofrem limitações administrativas que se sentirem lesados em razão destas restrições podem pleitear a redução do IPTU a ser pago”. (2002, p. 235).

Para tanto, será necessário consultar a legislação municipal do local onde ocorre a tributação e cumprir os requisitos necessários ao pleito.

A título de ilustração, cita-se o disposto na Lei Municipal n. 1633/1991[22], do Município de Piracaia/São Paulo, que prevê estabelece a redução do valor venal de terrenos que possuam restrições ambientais, tais como mata natural, faixas de terreno “non aedificandi”, situados ao longo de cursos d´água e considerados de preservação permanente pela legislação federal.

No julgado, cuja ementa segue abaixo transcrita, há elementos que demonstram a possibilidade de afastar a incidência do IPTU quando a restrição retirar o conteúdo econômico da propriedade.

Agravo de Instrumento. Ação Anulatória de débito fiscal c.c pedido de indenização por danos morais. IPTU. Município de Ilha Comprida. Decisão que indeferiu a tutela provisória. Pretensão  à reforma. Acolhimento. Laudo técnico acostado pelos agravantes que indica estar o imóvel inserido em área de preservação ambiental permanente, notadamente na denominada zona de vida silvestre (Decretos estaduais ns. 26.881/87 e 30.817/89). Existência de restrições severas ao direito de propriedade que podem afastar incidência tributária. Inteligência do art. 32 do CTN. Município que, ademais, não impugnou o recurso e deixou de contestar a ação principal. Tutela de urgência deferida, ante a formação de um juízo positivo de probabilidade, no caso concreto. Decisão reformada. Recurso provido. Agravo de Instrumento n. 2023180-21.2017.8.26.0000 Comarca: Iguape Agravantes: Olindo Zanderin e outro Agravado: Municipio da Estancia Balnearia de Ilha Comprida, Relator Ricardo Chimenti.

A esse propósito, HARADA compreende que, se “houver apossamento administrativo do imóvel ou situação equivalente representada pela superveniência de normas ambientais que interditam o uso da propriedade, o IPTU não poderá ser cobrado” (2012, p. 143). O entendimento conta com suporte constitucional, pois, a interdição total da propriedade, que impede sua disponibilidade econômica, equivale a verdadeira desapropriação.

5.2 O IPTU e o imóvel cultivado em área urbana

Quando se tratou do aspecto espacial do IPTU, registrou-se que o Código Tributário Nacional adotou o critério geográfico para a definição de zona urbana. Viu-se, também, que o conceito de zona rural resulta de um critério de exclusão, ou seja, o que não for urbano será considerado rural.

No entanto, percebe-se que, na vida prática, existem muitas áreas rurais dentro da zona urbana, o que ocorre até por conta do crescimento das cidades.

As propriedades em que há produção agrícola, pecuária e agroindustrial são importantes para o desenvolvimento e abastecimento das regiões, o que, inclusive, pode gerar redução de custos.

Por isso, em que pese o teor do art. 32 do Código Tributário Nacional, persiste a alteração introduzida no art. 15 do Decreto-Lei n. 57, de 18-11-1966, in verbis:

Art. 15. O disposto no art. 32 da Lei n. 5172, de 25 de outubo de 1966, não abrange o imóvel que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial, incidindo assim, sobre o mesmo, o ITR e demais tributos com o mesmo cobrados. (BRASIL, 1966).

O dispositivo supra transcrito foi objeto de revogação pelo art. 12 da Lei n. 5868, de 12/12/1972, porém este dispositivo foi declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal no RE 140773, relatado pelo Ministro Sydney Sanches.

Por isso, remanesce a vigência do art. 15 do Decreto-lei n. 57/1966, recepcionado com status de lei complementar pela Constituição Federal de 1967 e pela Emenda n. 1/69[23].

O Superior Tribunal de Justiça conta com diversas decisões que ressaltam os critérios a serem observados para a incidência do IPTU: a localização e a destinação. Tem compreendido que exclui a incidência do tributo municipal os imóveis cuja destinação seja, comprovadamente, a de exploração agrícola, pecuária ou industrial, incidindo, quando então o imposto será o ITR.

PROCESSUAL CIVIL - IPTU E ITR - INCIDÊNCIA - IMÓVEL URBANO - IMÓVEL RURAL - CRITÉRIOS A SEREM OBSERVADOS - LOCALIZAÇÃO E DESTINAÇÃO - DECRETO-LEI N. 57/66 - RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

(...)

Os precedentes desta Corte a tratarem do tema, ora em análise, são firmes na conclusão de que ‘o artigo 15 do Decreto-Lei n. 57/66 exclui da incidência do IPTU os imóveis cuja destinação seja, comprovadamente, a de exploração agrícola, pecuária ou industrial, sobre os quais incide o Imposto Territorial Rural-ITR, de competência da União’ (REsp 738628 / SP, Segunda Turma, DJ 20.6.2005)”.

Percebe-se que há na interpretação uma conciliação entre o interesse do proprietário e o do Município, que deve primar pelo meio urbano.[24]

5.3  O IPTU  e o direito real de laje

É sabido que em nosso país temos diversos municípios com áreas de parcelamento ilegal de solo e/ou loteamentos irregulares, o que, além de ser prejudicial ao meio ambiente, gera impactos negativos aos que residem nestes locais com prejuízos à sua dignidade.

Com o intuito de possibilitar a regularização fundiária urbana, adveio a Lei Federal n. 13.465/2017. O diploma legal, além de tratar da regularização fundiária urbana, dispõe sobre a regularização fundiária rural, sobre a liquidação de créditos concedidos aos assentados da reforma agrária e sobre a regularização fundiária no âmbito da Amazônia Legal; institui mecanismos para aprimorar a eficiência dos procedimentos de alienação de imóveis da União; e dá outras providências. 

Dentre os diversos temas, as alterações promovidas no Código Civil Brasileiro, com a inserção do direito real de laje no rol do art. 1.225 do citado diploma, chamam a atenção.

Consoante o disposto no art. 1510-A, o direito real de laje consiste na possibilidade de o proprietário de uma construção-base ceder a sua superfície superior ou inferior, a fim de que o titular da laje (compreendida como superfície superior ou inferior) mantenha unidade distinta (daquela originalmente construída sobre o solo). (BRASIL, 2002).

Tal direito reflete na seara tributária, pois, consoante o disposto no art. 1510-A, §2º, do Código Civil brasileiro, “o titular do direito real de laje responderá pelos encargos e tributos que incidirem sobre a sua unidade”.  (BRASIL, 2002).

Também de tamanha relevância é o disposto no §4º do referido artigo, no sentido de que a “instituição do direito real de laje não implica a atribuição de fração ideal de terreno ao titular da laje ou a participação proporcional em áreas já edificadas”.   

Ou seja, as alterações introduzidas já evidenciam que serão necessárias algumas adaptações na legislação municipal, mormente para que a tributação ocorra consoante os reflexos implementados pela Lei n. 13.465/2017.

Com efeito, a lei tributária não tem o condão de alterar a definição, o conteúdo e o alcance dos institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, de forma expressa ou implícita, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias. (art. 110, CTN)

A previsão, sem sombra de dúvidas, implicará alteração na legislação do IPTU dos Municípios de nosso país, pois são nítidos os reflexos na sujeição passiva tributária em face da disponibilidade econômica do direito real de laje e, também, na verificação da base calculada com a não inclusão, para o titular do direito real, de fração ideal de terreno ou das áreas edificadas não abrangidas por sua unidade.

5.4 Concessão de direito real de uso e o IPTU

O Código Tributário Nacional prevê expressamente que o fato gerador do IPTU é a “propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município” (art. 32, CTN).

DINIZ formula um conceito de propriedade a partir dos seus atributos, pois a compreende como sendo “o direito que a pessoa física ou jurídica tem, dentro dos limites normativos, de usar, gozar, dispor de um bem corpóreo ou incorpóreo, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha”. (2007, p. 114).

O domínio útil consiste no direito atribuído ao enfiteuta para usufruir do bem mediante o pagamento de uma renda anual ao aforador ou titular do domínio direto. É vedada a constituição de novas enfiteuses e subenfiteuses consoante o Código Civil de 2002, sendo que as existentes estão subordinadas às disposições do Codex de 1916.

Segundo o disposto no art. 1196 do Código Civil, “considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”. (BRASIL, 2002).

O artigo 34 do Código Tributário Nacional dispõe que o possuidor “a qualquer título” será contribuinte do IPTU. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que somente a posse com “animus domini”, assim entendida a exclusiva (não desdobrada), configura o fato gerador do IPTU[25].

A partir das premissas acima, surge a seguinte dúvida: o cessionário do direito de uso pode figurar no polo passivo desta obrigação tributária?

A Corte Especial tem entendido que o cessionário do direito de uso não pode figurar como sujeito passivo porque a posse a que se refere o artigo 32 do Código Tributário Nacional é a exercida com “animus domini”. Inclusive conta com jurisprudência pacificada sobre o tema.

A ementa abaixo transcrita permite visualizar o entendimento da Corte:

TRIBUTÁRIO   E   PROCESSUAL  CIVIL.  AGRAVO  REGIMENTAL  EM  RECURSO ESPECIAL.  ALEGAÇÃO  DE  OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. IMÓVEL DE DOMÍNIO DA UNIÃO.  CONCESSÃO  DE  USO. IPTU. NÃO INCIDÊNCIA. CESSIONÁRIO. POSSE SEM  ANIMUS  DOMINI.  APRECIAÇÃO DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS, EM ÂMBITO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. I.  Trata-se  de  Agravo Regimental interposto em 05/10/2015, contra decisão monocrática, publicada em 28/09/2015. I[...].  É pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o bem imóvel público, ocupado por concessionária, não se  sujeita  à  incidência  de IPTU, na medida em que a posse, nessa situação,  decorre  de  relação de direito pessoal e não é dotada de animus domini, tratando-se, na verdade, de simples detenção de coisa alheia.  Precedentes:  STJ,  AgRg no AREsp 535.846/RJ, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 24/11/2015; STJ, AgRg no AREsp 691.946/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 16/06/2015. [...] AgRg no REsp 1534170 / DF AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2015/0116786-4, Relatado pela MIn. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Segunda Turma, julgado em 10/05/2016.

O entendimento apresenta sólidos argumentos, pois não há que se falar em posse com “animus domini” em se tratando de bens públicos, consoante o disposto no art. 183, §3º, da Constituição Federal. Ademais, faz-se necessário à identificação do sujeito passivo apurar quem detém a disponibilidade econômica do imóvel.


CONCLUSÃO

A partir do desenvolvimento dos temas propostos, teve-se a oportunidade de destacar a relevância da regra-matriz de incidência tributária (ou norma-padrão dos tributos) do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana.

O conhecimento de cada um de seus elementos possibilitou refletir se as diversas casas legislativas dos municípios de nosso país estão observando preceitos estabelecidos pelo constituinte. E mais, se a Administração Pública também tem primado pela observância dos princípios que asseguram a efetividade da Constituição Federal.

Viu-se que a regra-matriz de incidência tributária é uma norma jurídica de comportamento dirigida aos contribuintes e serve para prescrever condutas, fornecendo os elementos mínimos para que exista a norma jurídica tributária, a  saber: material, espacial, temporal, pessoal e quantitativo.

Registrou-se que aspecto material deve conter a designação de todos os dados de ordem objetiva, fornecendo o aspecto básico para indicar o núcleo da hipótese de incidência. Especificamente para o IPTU, o critério consiste em ser proprietário, titular do domínio útil ou possuidor de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município. Nada obstante, apurou-se que a disponibilidade econômica do bem é essencial para que os conceitos de  propriedade, domínio útil e posse recebam interpretação conforme o Texto Constitucional para uma tributação pautada na isonomia e na capacidade contributiva.

O estudo do critério espacial possibilitou compreender as alterações legislativas que o impactaram, tendo sido destacado que a mera localização do bem não se revela suficiente para a incidência do tributo. Tem sido de suma importância conjugar dois aspectos: a localização e a destinação dada ao imóvel. Os tribunais pátrios têm decidido que, em se tratando de imóveis situados na zona urbana destinados à produção agrícola, pecuária ou agroindustrial, a tributação ocorrerá por meio do imposto sobre a propriedade territorial rural, revelando-se equivocada a pretensão de lançar o IPTU.

A análise do critério temporal permitiu esclarecer o momento em que se considera ocorrido o fato gerador, o que deve ser definido pelo legislador municipal. Registrou-se que, comumente, as legislações dos municípios adotam a periodicidade anual. No entanto, observou-se que periodicidades menores não estão vedadas, porém se faz necessário conjugar o critério com as alíquotas, primando-se, assim, pela observância do princípio do não-confisco.

Ao tratar do critério subjetivo, oportunizou-se ao leitor identificar os sujeitos ativo (municípios) e passivo (proprietário, titular do domínio útil ou possuidor) da relação jurídica tributária. Esclarecer acerca das diversas nuances envolvendo o compromisso de compra e venda em prestígio ao princípio da capacidade contributiva foi de relevo para melhor compreensão da jurisprudência sobre o tema. De fato, há situações em que, nem sempre, o ente municipal poderá lançar o tributo, indistintamente, em face do promitente vendedor e do promitente comprador, devendo atuar com muita cautela para que apure que, de fato, goza da disponibilidade econômica do bem.

Viu-se que a base de cálculo do imposto é o valor venal do imóvel, sem, contudo, considerar os bens agregados por acessão intelectual. De suma importância a observância dos princípios da legalidade tributária e da anterioridade para a majoração da base de cálculo, o que não se confunde com a mera atualização da base por meio de ato infralegal, consoante entendimento sumulado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça.

Discorrer sobre a alíquota do imposto trouxe à reflexão os avanços interpretativos no âmbito do Supremo Tribunal Federal acerca da progressividade. Percebeu-se que, atualmente, a Corte Suprema entende que há autorização tanto para a progressividade em razão do valor do imóvel, sua destinação ou localização, quanto para assegurar a função social da propriedade.

Algumas reflexões sobre temas recorrentes e incidentes nos critérios da regra-matriz de incidência tributária do IPTU foram importantes para ilustrar a importância do estudo.

Teve-se a oportunidade de observar que as restrições ambientais podem impactar na base de cálculo do imposto, em prestígio ao princípio da capacidade contributiva. De certo, reduzir ou suprimir a capacidade contributiva do sujeito passivo da relação jurídica tributária não condiz com os preceitos estabelecidos na Constituição Federal.

Destacou-se que o imóvel cultivado em área urbana, conforme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, deve ser objeto de tributação por meio do imposto sobre a propriedade territorial rural, adotando-se os critérios da localização e da destinação.

A recente alteração legislativa do Código Civil por meio da Lei n. Federal n. 13.465/2017, que introduziu o direito real de laje no ordenamento jurídico, implicará alterações nas leis instituidoras do IPTU dos mais de 5.500 (cinco mil e quinhentos) municípios brasileiros no tocante à base de cálculo, pois a instituição deste direito não implica a atribuição de fração ideal de terreno ao titular da laje ou a participação proporcional em áreas já edificadas. Noutras palavras, a análise da disponibilidade econômica do bem deve servir de norte para fins de tributação.

Por fim, apurou-se que o princípio da capacidade contributiva (especificamente no que tange à disponibilidade econômica) também se revela importante aos casos de concessão de direito real de uso. A Corte Especial conta com decisões no sentido de que o cessionário não pode figurar como sujeito passivo por não exercer posse com “animus domini”.

Em razão do exposto, espera-se que o presente trabalho tenha contribuído para algumas discussões e reflexões sobre o tema proposto, bem como destacado sua importância à vida prática dos contribuintes, à atuação dos servidores responsáveis pelo lançamento tributário e dos operadores do direito.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  30. BRASIL. LEI Nº 10257, DE 10 DE JULHO DE 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Disponivel em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm>. Acesso em: 12 out. 2017.


Notas

[1] Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.

Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:

I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;

II - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.

Art. 122. Sujeito passivo da obrigação acessória é a pessoa obrigada às prestações que constituam o seu objeto. (BRASIL, 1966).

[2] A interpretação sistematizada da Constituição Federal permite concluir que o imposto objeto de análise também compete ao Distrito Federal nos termos do art. 32, §1º, CF. Logo, quando se fizer menção à competência dos Municípios para a instituição do IPTU, implicitamente, estar-se-á tratando, também, da competência do Distrito Federal.

[3] Art. 79. São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente. (BRASIL, 2002)

[4] Filho informa que o dispositivo trata de ”um critério pela situação (local + melhoramentos) e não meramente pela localidade”.

[5] A definição de imóvel rural constante do art. 6º e seu parágrafo único da Lei n. 5868, de 12-12-72 foi invalidada pelo Supremo Tribunal Federal, por ter sido invadida a esfera do legislador complementar (RE n. 93850, Refl. Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, julgado em 20-05-1982, DJ de 27-08-1982, PP-08189=0).

[6] Filho informa que o dispositivo (art. 32, §2º, CTN) trata do “urbano por equiparação”.

[7] APELAÇÃO - Ação Anulatória de Débito Fiscal - IPTU - Exercício de 2014 - Pretensão à declaração de ilegalidade do lançamento complementar do IPTU (março a dezembro de 2014) - Legislação Municipal que prevê a ocorrência do fato gerador no mês seguinte nas hipóteses de construção ou modificação de edificação no curso do exercício, gerando lançamentos complementares de forma proporcional ao período restante do exercício - Possibilidade - Previsão legal, artigo 2º, parágrafo 1º, inciso II, alínea “a”, da Lei Municipal nº 6.989/66 - Ocorrência do fato gerador do IPTU com a conclusão da obra (artigos 8º e 9º da Lei Municipal nº. 15.406/2011) - Sentença reformada - Apelo da Municipalidade provido. Recurso de apelação do autor prejudicado. Órgão Julgador: 14° Câmara de Direito Público. Apelação nº: 1036569-96.2015.8.26.0053. Apelantes/Apelados: Município de São Paulo e Luymak Incorporação e Participações Empresa de Propósitos Específicos Ltda. Comarca: São Paulo.

[8] Por força do disposto no artigo 31, §1º e 147 da Constituição Federal, o Distrito Federal e a União, nos territórios federais não divididos em Município, também são titulares da competência ora analisada.

[9] HARADA realiza observação no tocante à identificação do sujeito ativo. Para o doutrinador, “a correta definição do sujeito ativo do IPTU implica necessariamente exame do aspecto material do fato gerador da obrigação tributária conjugado com o exame de seu aspecto espacial”. (2012, p. 114).

[10] Primeira Turma, julgado em 14.9.2004, DJ 27.9.2004, p. 213

[11] REsp 1.327.539

[12] RE 451.152

[13] Art. 123. Salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes. (BRASIL, 1966).

[14] CARVALHO adota os termos base de cálculo “in abstrato” (para a base de cálculo) e base de cálculo fáctica (para a base calculada). (2015, 345).

[15] Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

(...)

III - cobrar tributos:

(...)

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;                             

c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;                              (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

(...)

§ 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I. (BRASIL, 1988).

[16] Ementa: CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IPTU. MAJORAÇÃO DO VALOR VENAL DO IMÓVEL. POSSIBILIDADE MEDIANTE LEI FORMAL. PRECEDENTES DO STF. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA. ÔNUS DE COMPROVAR A ABUSIVIDADE DO AUMENTO DO CONTRIBUINTE. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Trata-se de agravo de instrumento em que o agravante pleiteia a reforma da decisão interlocutória de origem para consignar, em juízo, o pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU no valor anterior à majoração do valor venal do imóvel. Pleiteia, em consequência, a exclusão de seu nome do cadastro de inadimplentes e a suspensão do parcelamento do tributo. 2. A jurisprudência dos Tribunais Superiores firmou orientação no sentido de que qualquer alteração que implique em aumento real do IPTU deve ser feita mediante lei em sentido estrito. Nessa linha, o aumento dos valores da Planta Genérica de Valores Imobiliários, por modificar a base de cálculo do imposto, requer também lei em sentido formal. 3. A intervenção do Poder Judiciário, nesses casos, só é cabível nas hipóteses de flagrante ilegalidade ou ofensa aos Princípios Constitucionais. Sabe-se que majoração da base de cálculo do IPTU submete-se ao princípio da anterioridadetributária, previsto no art. 150, III, b, da CF/88, contudo é uma exceção ao princípioda noventena estabelecido no art. 150, III, c, da referida Carta, podendo ser realizada sua cobrança logo após a sua alteração, desde que não seja no mesmo exercício financeiro que a aumentou. 4. Assim, verificando que a lei que dispôs sobre o novo Código Tributário Municipal, pelo mesmo nesse ponto, não incorreu em qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade, não há motivos para acatar os argumentos despendidos pelo agravante. 5. Ademais, cabe ao contribuinte o ônus da prova de demonstrar a abusividade que possa elidir a presunção de certeza e liquidez inerentes à Certidão da Dívida Ativa. 6. Recurso conhecido e desprovido. ACÓRDÃO [...]TJ-CE - Agravo de Instrumento AI 06241434020158060000 CE 0624143-40.2015.8.06.0000 (TJ-CE). Data de publicação: 23/09/2015.

[17] Súmula 589, STF. É inconstitucional a fixação de adicional progressivo do imposto predial e territorial urbano em função do número de imóveis do contribuinte.

[18] Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o  bem-estar de seus habitantes.

[...]

§ 4º É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:

(...)

II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;

(...)

[19] http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=167302 (acesso em 18 de outubro de 2017)

[20] Art. 7o Em caso de descumprimento das condições e dos prazos previstos na forma do caput do art. 5o desta Lei, ou não sendo cumpridas as etapas previstas no § 5o do art. 5o desta Lei, o Município procederá à aplicação do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no tempo, mediante a majoração da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos.

§ 1o O valor da alíquota a ser aplicado a cada ano será fixado na lei específica a que se refere o caput do art. 5o desta Lei e não excederá a duas vezes o valor referente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de quinze por cento.

§ 2o Caso a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar não esteja atendida em cinco anos, o Município manterá a cobrança pela alíquota máxima, até que se cumpra a referida obrigação, garantida a prerrogativa prevista no art. 8o.

§ 3o É vedada a concessão de isenções ou de anistia relativas à tributação progressiva de que trata este artigo. (BRASIL, 2001).

[21] Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

[...]

III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; [...] (BRASIL, 1988)

[22] Art. 1° - Os terrenos situados no perímetro urbano do município, com área superior a 5.000 m2 (cinco mil metros quadrados), que possuam mais de 50% (cinquenta por cento) de mata natural ou que apresentem declividade superior a 45º(quarenta e cinco graus), terão direito a redução de 50%(quarenta por cento) do seu valor venal, para efeito do Imposto Territorial Urbano -ITU. (BRASIL, 1991).

Art. 2º - As faixas de terreno "non aedificandi", situadas ao longo de cursos d´água e consideradas como de preservação ambiental pela legislação federal, desde que localizadas dentro do perímetro urbano, farão, igualmente, jus à redução de que trata o artigo anterior.

Parágrafo único - Somente terá direito a redução o terreno cuja faixa comprometer mais de 50% (cinquenta por cento) da área total do imóvel, levando-se em consideração as medidas estabelecidas pelo Código Florestal.

Art. 3º - O benefício será concedido mediante requerimento do interessado e vistoria do imóvel pelo órgão competente.

Art. 4º - Constatado, a qualquer tempo, que houve redução do percentual mínimo exigido para a concessão do benefício, será este revogado compulsoriamente, com incidência retroativa do valor venal integral no exercício de competência do tributo.

[23] DECISÃO: Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que inadmitiu recurso extraordinário (art. 102, III, a, da Constituição Federal) interposto de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul cuja ementa possui o seguinte teor: “DIREITO TRIBUTÁRIO. ITR E IPTU. IMÓVEL LOCALIZADO EM ÁREA URBANA, COM DESTINAÇÃO E UTILIZAÇÃO EM FINS RURAIS: INCIDÊNCIA DO ITR E NÃO DO IPTU. 1. Relevante, para a definição da incidência do ITR (Imposto Territorial Rural) e do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), é o efetivo uso e destinação econômica do imóvel tributável, e não a sua localização (rural ou urbana). O art. 32 do CTN não mais prevalece à vista dos arts. 15 e 16, do DL nº 57/66, não revogado pela Lei nº 5.868/72, declarada inconstitucional pelo STF e suspensa sua vigência pela Resolução nº 313/83, do Senado Federal. Assim, pode o Município instituir o IPTU sobre os bens imóveis localizados em sua zona urbana, definida em lei municipal, qualquer que seja o seu uso e destinação, ressalvados, contudo, os utilizados em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial, que se sujeitam unicamente ao ITR, da competência federal. ....Por fim, mesmo que superados tais óbices, saliento que o Supremo Tribunal Federal fixou entendimento de que o Decreto-Lei 57/1966  foi recepcionado pela Constituição federal de 1967 com o status de lei complementar, não podendo ser alterado por lei ordinária. Confiram-se, neste sentido, o RE 140.1773 (rel. min. Sydney Sanches, DJ de 04.06.1999); o RE 93.850 (rel. min. Moreira Alves, DJ de 27.08.1982); o AI 559.827 (rel. min. Gilmar Mendes, DJ de 16.06.2006); o AI 414.674 (rel. min. Cezar Peluso, DJ de 30.03.2005); e o RE 76.057 ... Do exposto, nego seguimento ao agravo de instrumento. Publique-se. Brasília, 10 de setembro de 2010. Ministro JOAQUIM BARBOSA Relator (AI 773785, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, julgado em 10/09/2010, publicado em DJe-179 DIVULG 23/09/2010 PUBLIC 24/09/2010)

[24] HARADA, 2002, 151.

[25] “Resp nº 1091198/PR, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 24-05-2011, DJe 13-06-2011)


Autor

  • Vanderson Souza

    Formado pela Universidade São Francisco desde 2004; Na área pública, atuei como: Escrevente Técnico do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo;, Advogado Público na Cia. Saneamento Ambiental de Atibaia; e, atualmente, atuo como Procurador Jurídico Municipal e advogo e presto consultoria jurídica a empresas com escritório na cidade de Atibaia Especializado em Ciências Penais, Direito Público e Tributário e Processual Tributário

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Trabalho de conclusão de curso da especialização em direito tributário e processual pela Escola Paulista de Direito

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Vanderson. A regra-matriz de incidência tributária do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5640, 10 dez. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/69567. Acesso em: 8 maio 2024.