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Tomada de crédito de PIS e Cofins e a constitucionalidade da terceirização da atividade-fim

Tomada de crédito de PIS e Cofins e a constitucionalidade da terceirização da atividade-fim

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Analisa-se o posicionamento do STJ em relação ao conceito de insumo pautado nos critérios de relevância e essencialidade face às atividades-fim da empresa.

A Lei n. 10833/2003, em seu artigo 1º, institui a Cofins no regime não cumulativo, determinando como sua base de cálculo o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica. Realizada a apuração nos termos do art. 2º da referida lei, seu artigo 3º permite que da base de cálculo sejam descontados créditos, dentre os quais os relativos a bens e serviços utilizados como insumo na prestação de serviço ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda (chamados créditos de insumos).[1]

É de amplo conhecimento que as legislações de instituição do PIS e Cofins não trouxeram a definição de insumo, circunstância esta geradora de muitas discussões até recente posicionamento do Superior Tribunal de Justiça[2], o qual afastou a interpretação restrita e inadequada das Instruções Normativas SRF n. 247/02 e 404/2004, trazendo conceito de insumo pautado nos critérios de relevância e essencialidade face às atividades-fim da empresa, quer de ordem material, imaterial ou ainda que não consumido no processo produtivo, mas sem o qual o objeto ou prestação não seriam possíveis.

Assim, muito embora seja necessária prova material da essencialidade do item a ser considerado insumo para o processo produtivo, inequívoco que a decisão ampliou de modo considerável as oportunidades lícitas de creditamento e, consequentemente, de economia tributária segura.

Em paralelo à decisão do Superior Tribunal de Justiça, o Supremo Tribunal Federal ao analisar a ADPF324 e o RE 958252 declarou a constitucionalidade da terceirização de atividades-fim das empresas, fixando a tese a seguir transcrita:

Decisão: O Tribunal, no mérito, por maioria e nos termos do voto do Relator, julgou procedente o pedido e firmou a seguinte tese: 1. É lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada. 2. Na terceirização, compete à contratante: i) verificar a idoneidade e a capacidade econômica da terceirizada; e ii) responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias, na forma do art. 31 da Lei 8.212/1993, vencidos os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. Nesta assentada, o Relator esclareceu que a presente decisão não afeta automaticamente os processos em relação aos quais tenha havido coisa julgada. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 30.8.2018.

Para além da possibilidade de declaração de nulidade da terceirização quando esta inobservar os requisitos de lei específica e da responsabilização da empresa tomadora pelo descumprimento de obrigações trabalhistas, certo que no âmbito tributário a utilização conjunta das decisões judiciais pode trazer aos empresários nova possibilidade de crédito dentro da sistemática não cumulativa do PIS e Cofins.

Acerca desta possibilidade de tomada de crédito vale dizer que a mesma não se enquadra na vedação prevista no artigo 3º, §2º, inciso I, da Lei 10833/2003, segundo a qual não dá direito a crédito o valor pago a título de mão de obra à pessoa física, haja vista na terceirização de atividades ocorrer a contratação de um serviço realizado por empresa legalmente constituída para tais finalidades.

Deste modo, a hipótese de contratação de serviço utilizado de modo essencial na consecução do produto encontraria total enquadramento na hipótese legal permissiva de crédito.

Outrossim, merece destaque para a fundamentação da possibilidade a análise da Solução de Divergência Cosit n. 29/2017:

ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP. EMENTA: CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP. NÃO CUMULATIVIDADE. MÃO DE OBRA TERCEIRIZADA. INSUMOS.

Observados os demais requisitos legais, permitem a apuração de crédito da não cumulatividade da Contribuição para o PIS/Pasep, na modalidade aquisição de insumos (inciso II do art. 3º da Lei nº 10.637, de 2002), os dispêndios da pessoa jurídica com a contratação de empresa de trabalho temporário para disponibilização de mão de obra temporária aplicada diretamente na produção de bens destinados à venda ou na prestação de serviços a terceiros. 

DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 10.637, de 2002, art. 3o, II, IN SRF nº 247, de 2002, art. 66, I, “b”, e § 5o; Lei nº 6.019, de 1974, arts. 2º e 4º.

Vinculada à Solução de Consulta Cosit nº 105, de 31 de janeiro de 2017, publicada no Diário Oficial da União (DOU) de 23 de março de 2017.

ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL - COFINS. EMENTA: COFINS. NÃO CUMULATIVIDADE. MÃO DE OBRA TERCEIRIZADA. INSUMOS.

Observados os demais requisitos legais, permitem a apuração de crédito da não cumulatividade da Cofins, na modalidade aquisição de insumos (inciso II do art. 3º da Lei nº 10.833, de 2003), os dispêndios da pessoa jurídica com a contratação de empresa de trabalho temporário para disponibilização de mão de obra temporária aplicada diretamente na produção de bens destinados à venda ou na prestação de serviços a terceiros.

DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 10.833, de 2003, art. 3o, II; IN SRF nº 404, de 2004, art. 8º, I, “b” e § 4o; Lei nº 6.019, de 1974, arts. 2º e 4º.

Vinculada à Solução de Consulta Cosit nº 105, de 31 de janeiro de 2017, publicada no Diário Oficial da União (DOU) de 23 de março de 2017.

Note-se que a Receita Federal no ano de 2017 entendeu que os valores dispendidos na contratação de mão de obra terceirizada aplicada diretamente na sua produção permitem apuração de crédito de PIS e Cofins.

Esta solução traz importante fundamento para a ampliação da oportunidade de tomada de crédito, pois advém do órgão arrecadador/fiscalizador o qual sinaliza de forma expressa o direito.

Considerando que a terceirização de atividades-fim preenchem o requisito da relevância e essencialidade para a formatação do bem ou serviço prestado pela empresa (conforme preceituado pelo STJ), a subsunção da hipótese ao permissivo legal que dá direito ao desconto é linear e objetiva.

Diante do exposto, sendo a terceirização de serviços lícita e não tentativa de fraude ou simulação, incidindo a mesma sobre atividade essencial para a consecução do produto ou serviço da empresa, a possibilidade de creditamento encontra robusto fundamento jurídico.

Vale ainda destacar o aspecto temporal.

A autorização para terceirização das atividades-fim ocorreu com a Lei n. 13429 de 31 de março de 2017, entendendo-se este como marco inicial ordinário para a possibilidade de tomada deste tipo de crédito.

Cabe ainda esclarecer que tal possibilidade de creditamento implica em perda de arrecadação e, muito provavelmente, encontrará barreiras à sua plena e tranquila utilização. Sob esta perspectiva, buscando preservar segurança, o recomendado é a apresentação à Receita Federal de consulta ou a provocação do Poder Judiciário, quer via Mandado de Segurança ou Ação Declaratória com Pedido de Repetição, antes do início efetivo da tomada destes créditos.


NOTAS

[1] Artigo 1º a 3º da Lei 10637/02 tratam da sistemática do PIs, instituindo semelhante regime e mesmas previsões, diferindo apenas na alíquota aplicável.

[2] RE 1221171


Autor

  • Roberta Vieira Gemente

    Advogada, formada pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas - Puccamp, pós -graduada em Direito Tributário pela Faditu, MBA em Direito Fiscal pela Trevisan Escola e Negócios,certicada em diversos cursos de Direito Tributário ministrados na PUC-SP, GVLaw, Apet, dentre outros. Pós graduanda em Direito de Contratos e Responsabilidade Civil. Atuação na área Contenciosa e Consultiva Tributária desde o ano de 2000, prestando serviços para escritórios de médio e grande porte. Inscrita na OAB, seção SP, sob o número 186.599.

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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GEMENTE, Roberta Vieira. Tomada de crédito de PIS e Cofins e a constitucionalidade da terceirização da atividade-fim. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5649, 19 dez. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/70211. Acesso em: 28 mar. 2024.