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What´s App como meio probatório nas ações de família

What´s App como meio probatório nas ações de família

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A vontade manifestada por meio do aplicativo What´s App pode ser utilizada como meio probatório nos juízos de família, com fundamento no CPC?

RESUMO: Este artigo tem como tema o What´s App como meio probatório nas ações de família, visando a elucidar alguns aspectos referentes às provas no processo civil brasileiro, bem como tecer alguns comentários sobre algumas espécies de provas existentes em nosso ordenamento jurídico pátrio e o seu tempo de juntada, dando maior enfoque na documentação eletrônica, abordando sobre provas digitais, seu regime legal e autenticidade, apresentando breve comentário acerca da Lei 11.419, de 2006, como também justificando o uso do aplicativo como meio probatório nas Varas de Família, a sua utilidade como confissão extrajudicial, sua autenticidade e o uso da ata notarial através de fundamentações teóricas baseadas em doutrinas e jurisprudências.

Palavras Chave: Provas no Processo civil. Espécies de provas. Documentação Eletrônica. Ações de Família.

ABSTRACT This article has as its theme the What's App as a probative means in family actions, aiming to elucidate some aspects related to the evidence in the Brazilian civil process, as well as to make some comments about some species of evidence existing in our legal order and its time with a focus on electronic documentation, addressing digital evidence, its legal regime and authenticity, with a brief comment on Law 11.419, of 2006, as well as justifying the use of the application as a probative means in Family Sticks, its usefulness as an extrajudicial confession, its authenticity and the use of notarial acts through theoretical foundations based on doctrines and jurisprudence.

Keywords: Evidences in civil proceedings. Species of evidence. Digital evidence. Family law actions. 


INTRODUÇÃO

 O Direito está presente no dia a dia de cada cidadão, procurando resolver conflitos por meios conciliatórios, proporcionando uma gama de possibilidades para solucionar tais litígios que possam surgir. No entanto, as partes podem não chegar a um acordo, necessitando recorrer às vias judiciais, nas quais precisarão de meios que comprovem suas alegações. As aplicabilidades dos meios comprobatórios estão mencionadas no Código de Processo Civil.

 Durante o processo, conforme o artigo 369 do Código mencionado acima, as partes possuem o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados no dispositivo, para provar a veracidade dos fatos em que se baseia o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do magistrado.

 Em decorrência dos avanços tecnológicos, os meios de comunicação estão mais diversificados, as pessoas estão se comunicando de forma instantânea por meio de redes sociais com o auxílio da internet. Tal comunicação permite-se ser registrada de várias formas, podendo uma delas ser através da captura da tela do aparelho utilizado.

 Sendo assim, abriram-se margens para novos meios comprobatórios nos processos judiciais, tornando-se relevante o uso das redes sociais, por demonstrarem a vida íntima das partes, sendo ainda mais imprescindível nas ações de família, pelo fato de já possuírem relacionamento anterior à propositura da ação. Um exemplo são os registros de conversas realizadas no aplicativo What´s App, nos quais podem ser demonstrados diálogos entre as partes que confirmem a veracidade dos fatos alegados.

 Posto isso, o presente artigo possui a finalidade de realizar uma abordagem da aplicabilidade da manifestação de vontade por meio do aplicativo Whats' App como meio probatório em juízo, com fundamento no Código de Processo Civil Brasileiro, apresentando a definição e a função da prova no processo de conhecimento, examinando a aplicabilidade da comprovação documental eletrônica, justificando o uso do aplicativo como meio probatório nas Varas de Família através de fundamentações teóricas baseadas em doutrinas e jurisprudências.

 O estudo é realizado por meio da metodologia jurídica Positivismo jurídico, onde o Direito positivo é a fonte exclusiva da interpretação, sendo realizada uma análise dogmática. Os fatos apenas referidos pela lei serão considerados. Não desenvolvendo uma crítica política no campo científico do Direito, somente crítica técnica. Utilizando uma metodologia de abordagem dedutiva, sendo a extração discursiva do conhecimento a partir de premissas gerais aplicáveis a hipóteses concretas. Por intermédio de uma cadeia de raciocínio em ordem descendente, de análise do geral para o particular, chega a uma conclusão.

 Sendo assim, o artigo apresenta a prova na visão do Código de Processo Civil, indicando seus tipos e uma abordagem sobre o ônus da prova. Bem como as especificidades da documentação eletrônica e sua previsão legal. E, a aplicabilidade do What´s App nas Varas de Família, explanando acerca dos tipos de ações de família, os tipos de provas recorrentes, sua autenticidade e possibilidade do uso da ata notarial.


1.    PROVA

Este tópico inaugural irá versar acerca das noções gerais de prova no processo à luz da Constituição Federal e do Código de Processo Civil, discorrendo sobre o meio probatório documental e o seu momento de juntada aos autos.

1.1  NOÇÕES GERAIS DE PROVA

A Constituição Federal de 1988, no seu artigo 5º, inciso LV, se manifesta com relação à produção de provas para que seja exercido o direito do contraditório e ampla defesa:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; (BRASIL, 1988)

Em sintonia com o disposto no art. 5º, LV, da Constituição Federal, o Código de Processo Civil explana acerca de como devem ser tais meios e recursos:

Art. 369.  As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.

A noção de prova acaba sendo ligada à descoberta da verdade, sendo aquilo que comprova a veracidade ou a autenticidade de um fato ou alguma coisa. Segundo Cardoso (2007, Migalhas), “a função da prova no processo civil é de autenticar os fatos alegados nos autos”, devendo ser produzida dentro dos limites impostos pela legislação ordinária e constitucional. Segundo Marquesin (2017, Direito Net)

“A prova possui um papel fundamental no processo civil brasileiro, seja por ratificar um direito alegado, ou até mesmo por acelerar a prestação jurisdicional de acordo com a qualidade da prova produzida, pois por meio dela pode-se emitir um juízo de certeza ou um “juízo de probabilidade”.

Nas palavras do mestre Carnelutti, a prova em seu sentido jurídico consiste na demonstração da verdade formal dos fatos discutidos, mediante procedimentos determinados, ou seja, através de meios legítimos.

Toda prova possui como características o objeto (os fatos que desejam certificar), a finalidade (convicção sobre determinada alegação), o destinatário (o magistrado que julgará a causa) e os meios (espécies de provas para constatar o fato), podendo ser obtidas de acordo com a lei ou de forma ilícita.”

“Constata-se a suma importância das provas, por ser uma das bases norteadoras da decisão judicial. O seu conceito pode assumir diferentes conotações não apenas no processo civil, mas também em outras ciências” (Reichelt, p. 19).

Para Marinoni (2016, p. 257):

Assim é que pode significar inicialmente os instrumentos de que se serve o magistrado para o conhecimento dos fatos submetidos à sua análise, sendo possível assim falar em prova documental, prova pericial, etc. Também pode essa palavra representar o procedimento através do qual aqueles instrumentos de cognição se formam e são recepcionados pelo juízo. De outra parte, prova também pode dar a ideia da atividade lógica, celebrada pelo juiz, para o conhecimento dos fatos. E, finalmente, tem-se como prova, ainda, o resultado da atividade lógica do conhecimento. (MARINONI, 2016, p. 257) 

Nesse contexto, Marinoni (2016, p. 259) conceitua prova como “todo meio retórico regulado pela lei, e dirigido a, dentro dos parâmetros fixados pelo direito e de critérios racionais, convencer o Estado-juiz da validade das proposições, objeto de impugnação, feitas no processo”.

1.2  PROVA DOCUMENTAL

São enumerados alguns tipos de provas no Código de Processo Civil de forma não exaustiva, havendo a possibilidade de serem produzidas outras espécies, contanto que não contrariem o sistema normativo jurídico brasileiro. O objetivo do presente artigo não é abordar todos os tipos de provas presentes no código, apenas a prova documental, em especial a eletrônica que será abordada no próximo tópico.

Segundo Comoglio, Ferri e Taruffo (1999, p. 657, apud MARINONI, 2016, p. 364) “à categoria das provas documentais se reduzem em geral todas as coisas que aparecem idôneas a documentar um fato, ou seja, a narrá​-lo, a representá​-lo ou a reproduzi​-lo”.

Sendo assim, quando falamos em prova documental atrelamos a documentos escritos, seja em papel ou qualquer outro material. No entanto, não são unicamente os escritos, mas tudo que apresente expressamente um registro físico sobre algum acontecimento, como as fotografias ou impressão de mensagem eletrônica, extraídas de celulares, realizadas por aplicativos de mensagem instantânea, por exemplo.

Os documentos podem ser públicos ou particulares, dependendo de sua origem. Serão públicos quando provierem de departamentos públicos e particulares quando confeccionados pelas próprias partes. Ainda, eles podem ser apresentados em seu estado original ou por meio de cópias.

Para Theodoro Júnior (2017, p. 1251):

São reproduções eficazes dos documentos públicos ou particulares: (a) o traslado; (b) o traslado do traslado; (c) a pública­forma; (d) o registro público; (e) a certidão de inteiro teor, de tudo que constar de livro público ou de autos; (f) a certidão por extrato parcial de documento, ou a certidão em forma de relatório sobre o processo; (g) a fotocópia ou a xerocópia autenticada.

Precisam ser autênticos, ou seja, verdadeiros. Qualquer suspeita de falsificação será analisada por perícia e, caso comprovada, as devidas providências serão tomadas pelo juízo.

1.3  MOMENTO DA JUNTADA

Em regra, conforme o art. 435 do CPC, os documentos probatórios devem ser juntados aos autos com a petição inicial ou com a contestação.

Todavia, em seu parágrafo único, admite-se também a juntada posterior de documentos formados supervenientes à propositura da ação, bem como dos que se tornaram conhecidos, acessíveis ou disponíveis após esses atos, cabendo à parte que os produzir comprovar o motivo que a impediu de juntá-los anteriormente e incumbindo ao juiz, em qualquer caso, avaliar a conduta da parte de acordo com o art. 5o.

A parte, intimada a falar sobre documento constante dos autos, prazo de 15 (quinze) dias, poderá impugnar a admissibilidade da prova documental, impugnar sua autenticidade, suscitar sua falsidade, com ou sem deflagração do incidente de arguição de falsidade e manifestar-se sobre seu conteúdo.


2.    DOCUMENTAÇÃO ELETRÔNICA

O presente ponto irá abordar acerca da documentação eletrônica, apresentando a definição de provas digitais, seu regime legal e autenticidade. E ainda, realizar um breve comentário sobre a Lei 11.419.

2.1  PROVAS DIGITAIS

   Ao falar de provas digitais, é normal o uso da expressão “documentação eletrônica” para referir-se aos dados e arquivos digitais. Todavia, as provas digitais possuem características diferenciadas, que conduzem ao seu enquadramento em uma classificação própria, muito embora as semelhanças entre a prova digital e o documento permitam a utilização do meio de prova documental como procedimento probatório em juízo.

     Os elementos obtidos das fontes digitais, em conjunto com os demais elementos do processo, conduzem, então, ao resultado probatório, por meio da verificação das asserções feitas pelas partes.

     Encontram-se, na doutrina, algumas definições de prova digital (referida na doutrina norte-americana e inglesa como digital evidence), as quais, geralmente, possuem múltiplos sentidos ou correspondem ao sentido de “elemento de prova”.

     Eoghan Casey (2004, p. 12) define digital evidence como “qualquer dado armazenado ou transmitido usando um computador que confirma ou rejeita uma teoria a respeito de como ocorreu um fato ofensivo ou que identifica elementos essenciais da ofensa como intenção ou a álibi”.

Rodrigues (2011, p. 30) conceitua “prova electrónico-digital” como “qualquer tipo de informação, como valor probatório, armazenada (em repositórios electrónicos-digitais de armazenamento) ou transmitida (em sistemas de redes informáticas ou rede de comunicações electrónicas, privadas ou publicamente acessíveis, sob a forma binária ou digital”.

     Sendo assim, pode-se definir prova digital como os dados em forma digital tendo como meio físico um suporte eletrônico ou transmitidos em rede de comunicação, os quais contêm a representação de fatos ou ideias.

2.2  REGIME LEGAL E AUTENTICIDADE

Segundo o artigo 439 do Código de Processo Civil de 2015, “a utilização de documentos eletrônicos no processo convencional dependerá de sua conversão à forma impressa e da verificação de sua autenticidade, na forma da lei.

Há uma problematização acerca desse tipo de prova, vez que é notório a flexibilidade da sua formação e utilização. Por tal motivo, é uma abertura para que se torne alvo de alteração, o que feriria a sua confiabilidade e, consequentemente, a sua eficácia probatória.

A verificação da autenticidade das provas digitais não está́ inserida no Código de Processo Civil de 2015. Ainda não existe uma lei específica, mas artigos avulsos que, lidos juntamente, permitem elucidar os dispositivos processuais.

A Medida Provisória nº 2.200­2/01 instituiu um órgão responsável pelo reconhecimento e garantia da integridade de documentos eletrônicos, que realiza a emissão de certificação digital com base no uso de chaves públicas, chamado ICP Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira). Tal MP ainda possibilita que sejam usados diferentes meios para a comprovação da autoria e veracidade da prova digital, ainda que não se use certificação digital, desde que a mesma seja aceita pelas partes. Assim como a MP, o art. 225 do Código Civil aborda acerca da aceitação da prova digital afirmando que:

Art. 225. As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão.

A análise da veracidade dá-se, inicialmente, verificando sua autenticidade na origem do documento, ou seja, a autoria. E, após, a verificação da integridade do documento.

Ocorrendo a arguição de falsidade do documento original, ela será processada eletronicamente na forma da lei processual em vigor, conforme o Art. 10, § 2o da Lei 11.419/06, que disciplina o processo eletrônico.

Nos casos em que não for possível a conversão da documentação eletrônica para a forma impressa, conforme determina o art. 439, o documento não será́ excluído do processo, mas terá́ seu valor probante apreciado pelo magistrado, assegurado às partes o acesso ao seu teor (art. 440, CPC).

A ausência de autenticação do documento convertido só é relevante se houver impugnação da parte contrária (art. 411, III, CPC).

2.3 A PROVA DOCUMENTAL ELETRÔNICA NA LEI 11.419, DE 2006

A Lei 11.419/2006 dispõe sobre a informatização do processo judicial. O teor do artigo 11 da referida lei, estabelece que “os documentos produzidos eletronicamente e juntados aos processos eletrônicos com garantia de origem e de seu signatário, na forma estabelecida nesta Lei, serão considerados originais para todos os efeitos legais”.

Nesse seguimento, as provas digitais juntadas aos processos eletrônicos serão consideradas originais para todos os efeitos legais, se for possível a verificação de sua fonte. Com fulcro no § 3o do art. 11 da lei mencionada, “os originais dos documentos digitalizados (...) deverão ser preservados pelo seu detentor até o trânsito em julgado da sentença ou, quando admitida, até o final do prazo para interposição de ação rescisória”, para que seja possível a constatação de sua legitimidade, caso haja impugnação da parte oposta.

Tal regra é deveras parecida ao que já existia no art. 225 do Código Civil e no Código de Processo Civil. Logo, a novidade é conceder à parte contrária o ônus da prova quanto à arguição de falsidade da prova trazida aos autos, verificando sua autenticidade.


3.    APLICABILIDADE DO WHAT´S APP como PROVA NAS ações DE FAMÍLIA

Neste tópico será abordado um dos exemplos de meio para obtenção da prova digital, o aplicativo What´s App, e sua autenticidade, podendo, através da impressão das mensagens trocadas, ser utilizado nas ações de família no processo de conhecimento. 

 3.1  noções de DIREITO de família

 O direito de família pode ser considerado a área mais vinculada à vida, vez que todas as pessoas estão ligadas às outras, juridicamente falando ou não. Durante toda sua existência criam novos laços, com o casamento ou a união estável, por exemplo.

Diniz (2018, p. 17) conceitua o Direito de família como um “complexo de normas que regulam a celebração do casamento, sua validade e os efeitos que dele resultam, as relações pessoais e econômicas do matrimônio, a dissolução deste, a união estável, as relações entre pais e filhos, o vínculo de parentesco e os institutos complementares da tutela, curatela e tomada de decisão apoiada”, possuindo como objeto a própria família.

 Este ramo do direito regula “as relações entre os seus diversos membros e as consequências que delas resultam para as pessoas e bens” (GONÇALVES, 2018).

Uma das características é a sua natureza personalíssima, possuindo direitos irrenunciáveis e intransmissíveis por herança, ou seja, alguns direitos não podem ser transferidos ou renunciados e nem cedidos.

 Por ser um bem tão importante, a família é considerada a base da sociedade, tendo proteção especial do Estado, conforme prevê o art. 226 da Constituição Federal.

 3.2  WHAT’S APP COMO CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL NO PROCESSO DE CONHECIMENTO NAS AÇÕES DE FAMÍLIA

 Com os avanços tecnológicos, os meios de comunicação estão mais diversificados, as pessoas estão se comunicando de forma instantânea por meio de redes sociais com o auxílio da internet. Tal comunicação permite-se ser registrada de várias formas, podendo uma delas ser através da captura da tela do aparelho utilizado.

Um exemplo é o aplicativo What´s App, utilizado para troca de mensagens de texto instantaneamente, além de vídeos, fotos e áudios através de uma conexão à internet. Mais de 1 bilhão de pessoas, em mais de 180 países, possuem o app. Seu uso tornou-se tão prevalente que se tornou um modo primário de comunicação para muitos indivíduos. Por tal motivo, podem conter conversas de diversos conteúdos, sejam assuntos de trabalho, negócios e bate papo entre amigos e familiares.

Assim sendo, abriram-se margens para novos meios comprobatórios nos processos judiciais, tornando-se relevante o uso de tais meios, por demonstrarem a vida íntima das partes, sendo ainda mais imprescindível nas ações de família, pelo fato de já possuírem relacionamento anterior à propositura da ação, podendo levar aos autos os diálogos entre os litigantes, coma finalidade de confirmar a veracidade dos fatos alegados.

 O CPC de 2015 disciplina as Ações de Família, apresentando um rol taxativo no artigo 693:

Art. 693.  As normas deste Capítulo aplicam-se aos processos contenciosos de divórcio, separação, reconhecimento e extinção de união estável, guarda, visitação e filiação.

O artigo mencionado em seu parágrafo único estabelece que:

Parágrafo único.  A ação de alimentos e a que versar sobre interesse de criança ou de adolescente observarão o procedimento previsto em legislação específica, aplicando-se, no que couber, as disposições deste Capítulo.

Posto isto, segundo Silva (Migalhas, 2018) podemos usar como exemplo da utilização das provas digitais nas ações de família:

AÇÃO DE ALIMENTOS: Imagens, fotos ou vídeos que revelem sinais exteriores de riqueza (viagens, carros, ostentações, baladas, hábitos de consumo requintados, roupas de grife, constantes idas a bares, boates e restaurantes, etc.) da mãe, do pai ou de outras pessoas obrigadas legalmente a fornecer os meios de sustento e manutenção de menores ou maiores incapazes, podem ser utilizadas para auxiliar no justo arbitramento do valor da pensão alimentícia, principalmente nos casos onde quem tem que o dever de prestar os alimentos alega estar desempregado, ser autônomo, não tem meio de renda conhecido ou tem e procura esconder outras fontes de receita, além da espontaneamente informada. 

AÇÃO OU INCIDENTE DE ALIENAÇÃO PARENTAL: Áudios, imagens, vídeos, mensagens ou fotos que contenham tentativas de desqualificação ou ridicularização da conduta de um dos genitores no exercício da paternidade ou maternidade, bem como que revelem indícios de difamação, de falsas denúncias contra genitor, contra familiares deste - incluído atual namorado(a), companheiro(a) ou cônjuge - ou contra avós, bem como os que busquem denegrir a imagem destes, no intuito de obstar ou dificultar a convivência com a criança ou adolescente, tal qual retirar ou esvaziar a autoridade paterna ou materna em relação ao filho comum, podem ser utilizadas para comprovar a prática de atos de alienação parental. 

AÇÃO DE GUARDA DE FILHOS: Fotos, vídeos, imagens, mensagens e áudios que atestem, em qualquer tempo e situação, a convivência efetiva, constante e afetuosa do filho com o genitor que busca a guarda compartilhada ou até mesmo que revelem a tentativa e esforço para possibilitar tal contato e estreitar os laços afetivos, bem como que demonstrem a participação do interessado, mãe ou pai, no cotidiano do menor, através do exercício dos direitos e deveres concernentes ao poder familiar, poderão ser utilizadas como meio probatório em favor da mãe ou do pai que pleiteia o compartilhamento da guarda do filho comum.

Nesses casos, as impressões das mensagens, áudios, fotos, vídeos envidas através do aplicativo podem ser utilizadas como confissão extrajudicial, conforme prevê o art. 389 do CPC, quando a parte admite a verdade de fato contrário ao seu interesse e favorável ao do adversário. E mesmo que a confissão extrajudicial seja feita oralmente terá eficácia nos casos em que a lei não exija prova literal, com fulcro no art. 394 do mesmo código.

3.3  AUTENTICAÇÃO DA PROVA

 O registro de conversas realizadas por meio do What´s App é parte integrante do significado de documento, podendo ser tratado como qualquer outro arquivo impresso quando se fala de admissibilidade.

 Mesmo que uma das partes impugne a autenticidade do documento, ainda pode ser admitido como prova, se os critérios necessários forem observados.

 A parte que juntou aos autos a impressão da mensagem presente no aplicativo deve comprovar que o seu assunto diz respeito à existência ou não do fato em apreço, ou que é pertinente para o processo.

 Em tais casos, para preservar a integridade da prova digital, bem como o intuito de convertê-la, à forma impressa, a solução é levar ao Cartório de Notas e solicitar a lavratura de uma ata notarial, que será abordado no próximo tópico.

 Posto isto, incumbe à parte interessada esgotar as medidas pertinentes para desobrigar-se, em tempo cabível e de modo previsto em lei, do seu ônus probatório, expandindo a probabilidade do seu pedido ser acolhido.

3.4  ATA NOTARIAL

 Em casos de impugnação ou com o intuito de preservar o documento, a parte interessada poderá fazer uso da ata notarial, um instrumento público pelo qual o tabelião ou o seu preposto, relatará fielmente a existência e conteúdo do respectivo registro de conversa, mesmo as que contenham áudios, imagens e vídeos.

O art. 384 do CPC e seu parágrafo único versam sobre tal meio de verificação:

“Art. 384.  A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião.

Parágrafo único.  Dados representados por imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos poderão constar da ata notarial.” 

Assim, compreende-se como serviços notariais e de registro, com fulcro no art. 1 da Lei 8.935/1994, a organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.

Desta forma, a ata notarial possui a qualidade de documento público, atrelando a si maior credibilidade e segurança na sua utilização como meio probatório em processos judiciais, podendo ser aliada das provas digitais, como o registro de conversas realizadas pelo aplicativo What’s App, fortalecendo a comprovação de sua veracidade.


Conclusão

 Os problemas levantados ao iniciar-se o presente estudo referem-se a como as provas digitais são aplicáveis na fase de conhecimento da causa, se o aplicativo What´s App se torna meio de prova em juízo, e se, nas Varas de Família, por envolverem situações em que o fato existe anteriormente ao direito, as conversas registradas podem ser utilizadas como meio probatório de confissão extrajudicial.

O desenvolvimento do presente estudo possibilitou uma análise de como as provas digitais podem ser utilizadas como instrumento probatório na fase de conhecimento dos processos judicias, auxiliando no convencimento do magistrado ao examinar a pretensão das partes. Além disso, também permitiu, através de pesquisas bibliográficas e estudo de leis, reunir informações que se encontram dispersas acerca das provas digitais e sua autenticidade.

O Código de Processo Civil brasileiro vigente se manifesta de forma expressa, no artigo 369, com relação à legitimidade das provas admitidas pelo ordenamento jurídico. As conversas realizadas por meio do aplicativo podem ser utilizadas como provas no processo de conhecimento, por serem moralmente legítimas, mesmo que não especificadas no código.

 Nas Varas de Família, os registros de manifestação de vontade através do aplicativo poderão ser utilizados, a sua veracidade será comprovada pela falta de impugnação da parte contrária. E mesmo que uma das partes impugne a autenticidade do documento, ainda pode ser admitido como prova, se os critérios necessários forem observados.

Para finalizar, a partir dos conteúdos desenvolvidos para este trabalho, é possível notar que se abriram margens para novos meios comprobatórios nos processos judiciais, tornando-se relevante o uso das redes sociais, por demonstrarem a vida íntima das partes, sendo ainda mais imprescindível nas ações de família, pelo fato de já possuírem relacionamento anterior à propositura da ação.


REFERÊNCIAS

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