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A suspensão do fornecimento de energia elétrica ao usuário inadimplente e a Constituição Federal

A suspensão do fornecimento de energia elétrica ao usuário inadimplente e a Constituição Federal

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Sumário: 1. Breve Introdução – 2. A Constituição Federal e o Ideal de Justiça – 3. Os Serviços Públicos e o Direito Administrativo – 4. Os Serviços Públicos e a Constituição Federal: 4.1. Os Princípios – 5. A Suspensão do Fornecimento de Energia face ao Inadimplemento das Contas de Consumo: 5.1. A Inconstitucionalidade do art. 6º, § 3º, inciso II, da Lei nº 8.987/95: 5.1.1. A Violação ao Princípio da Boa-Fé; 5.1.2. A Violação aos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade; 5.1.3. A Violação ao Inciso XIII, do Art. 5º; 5.1.4. A Violação ao Inciso XIII, do Art. 5º; 5.1.5. A Violação ao Inciso XXXV, do Art. 5º; 5.1.6. A Violação ao Inciso LV, do Art. 5º; – 6. A Jurisprudência – 7. Conclusões.


1. Breve Introdução

Com a recente privatização das empresas-concessionárias de serviços públicos, os consumidores em geral aguardavam, com grande expectativa, uma melhora acentuada na prestação dos serviços, incluindo o tratamento dispensado a milhões de usuários.

Entretanto, verifica-se, na prática, que a postura e a mentalidade das empresas recém-privatizadas continua a mesma dos tempos em que se encontravam sob a administração direta do Estado: ao menor pretexto ou fundamento, interrompem a prestação dos serviços essenciais à sociedade, máxime ante a ausência de pagamento das contas de consumo.

A prática consistente em interromper ou suspender o fornecimento de serviços públicos ao usuário inadimplente ocorre de há muito em nosso país, sem que os operadores do direito tenham se preocupado em indagar: a Constituição Federal de 1998 permite, quer explícita ou implicitamente, a interrupção da prestação dos serviços públicos essenciais como forma de punição ao usuário inadimplente? Essa é pergunta que procuraremos responder nos estreitos limites deste artigo, que ao revés de ter a pretensão de esgotar o tema, antes de tudo busca lançar algumas luzes à solução do problema.


2. A Constituição Federal e o Ideal de Justiça

A Constituição Federal de 1998 positivou novos valores que representam os hodiernos anseios da sociedade brasileira.

Com efeito, a Carta Política sufraga, como valores supremos da ordem jurídica, os ideais de dignidade, de igualdade, de liberdade, de segurança, de propriedade e de justiça, antepondo-os, como inerentes à natureza humana, ao Estado, ao legislador e ao intérprete.(1)

Quis o constituinte ampliar o espectro de nossa Constituição, exatamente para direcionar, sob sua ótica, o legislador ordinário, impondo-lhe balizas e limites claros, definidos e expressos, sobre diferentes temas de cunho político, social e econômico, a exemplos de outros sistemas ocidentais em que de há muito se têm imiscuído conotações, principalmente sociais, aos esquemas tradicionais, que reduziam à regulamentação da estrutura do Estado e de suas relações com os cidadãos em seu território a temática constitucional.(2)

Abandona-se, dessa forma, o neutralismo do Estado antes chamado "de Direito" pela noção de "Estado de Justiça", impregnado de valores que lhe cabem defender e perseguir, estes, aliás, declarados solenemente no preâmbulo de nossa Carta e em seus textos iniciais, e que representam os valores mais elevados da própria natureza humana.(3)

"O individualismo e o abstencionismo ou neutralismo do Estado liberal", anota o constitucionalista José Afonso da Silva, "provocaram imensas injustiças, e os movimentos sociais do século passado e deste especialmente, desvelando a insuficiência, permitiram que se tivesse consciência da necessidade da justiça social, conforme nota Lucas Verdú, que acrescenta: "Mas o Estado de Direito, que já não poderia justificar-se como liberal, necessitou, para enfrentar a maré social, despojar-se de sua neutralidade, integrar, em seu seio, a sociedade, sem renunciar ao primado do Direito. O Estado de Direito, na atualidade, deixou de ser formal, neutro, individualista, para transformar em Estado material de Direito, enquanto adota uma dogmática e pretende realizar a justiça social". Transforma-se em Estado Social de Direito, onde o "qualificativo social refere-se à correção do individualismo clássico liberal pela afirmação dos chamados direitos sociais e realização de objetivos de justiça social"."(4)

O direito passa a ser um instrumento de justiça e inclusão social na sociedade atual, instrumento de proteção de determinados grupos na sociedade, de realização de novos direitos fundamentais, de combate ao abuso do poder econômico.(5)

Dentro desse novo contexto introduzido pela Constituição Federal de 1988, tanto o Direito Privado quanto o Público são impregnados de elementos sociais.

A sociedade brasileira é submetida aos novos valores sociais que representam os anseios e expectativas do mundo contemporâneo, dentre as quais destaca-se a Justiça Social, exigindo do Estado uma atuação firme para a defesa da sociedade.

Passa-se do Estado Liberal ao Estado Social.

Ante a nova filosofia do chamado Estado Social, haverá um intervencionismo cada vez maior do Estado nas relações contratuais, no intuito de relativizar o antigo dogma da autonomia da vontade com as novas preocupações de ordem social, com a imposição de um novo paradigma, o princípio da boa-fé objetiva. É o contrato, como instrumento à disposição dos indivíduos na sociedade de consumo, mas, assim como o direito de propriedade, agora limitado e eficazmente regulado para que alcance a sua função social.(6)

Com efeito, a partir da crescente intervenção estatal nos negócios, visando regulá-los e ainda limitar a incidência de uma plena autonomia da vontade, passa o Direito a ser visualizado predominantemente por sua face social, preocupado em estabelecer uma ordem jurídica justa, e não apenas imposta sem quaisquer preocupações ético-sociais.

Por isso, segundo anotou o gênio alemão de Karl Larenz, a preocupação com o direito justo "concierne a los juristas, porque, si bien es cierto que los juristas pueden limitar-se a cumplir las normas de un concreto Derecho positivo, o las decisiones judiciales que en ese Derecho sean vinculantes, no pueden evitar que se los coloque incesantemente ante el problema de saber si lo que hacen es o no <<justo>>, sobre todo cuando las relaciones vitales cambiam y los casos no se planteam ya de un modo igual."(7) A preocupação atual dos juristas passa a ser a busca da realização de justiça, e não apenas a de aplicar a lei mecanicamente, verificando se a hipótese fática subsume-se à legal, sem qualquer ingerência de valores metajurídicos.

Prova disto é a redação do artigo 3º, da Constituição Federal, ao determinar que constitui objetivo fundamental da República Federativa do Brasil a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Ora, não se constrói uma ordem com estas características se não for buscado como início de tudo o atendimento aos destinatários das normas constitucionais.(8)

A busca da construção de uma sociedade livre justa e solidária, dentro de uma sociedade de massas, de consumo incentivado e forçoso, aproxima-se da utopia, mas jamais pode deixar de ser a meta principal do Estado brasileiro.(9)

Como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, na feliz expressão do legislador, esta meta deve fazer parte do processo de declaração de incidência das normas. Ao juiz não é mais dado o direito de simplesmente analisar os fatos apresentados na petição inicial e controvertidos na contestação, sem antes procurar estabelecer como seu objetivo fundamental, ao entregar a jurisdição aos destinatários das normas constitucionais, na qualidade de Estado interventor, a busca de uma sociedade livre, justa e solidária.(10)

É visível que neste processo, o Estado juiz deva observar o que ocorre no mundo dos fatos, de forma atenta e crítica, na medida em que o arcabouço jurídico-positivo que há, notadamente para os contratos civis e comerciais, foi editado sob a égide de uma realidade fática completamente diversa daquela que hoje se apresenta às portas do século XXI. (11)

No mesmo sentido doutrina o professor Alcides Tomasetti Junior(12), esclarecendo que um dos objetivos fundamentais do Estado Democrático de Direito, de acordo com a Constituição Federal de 1988, é a solidariedade social (CF, art. 1o, caput, e art. 3o, nº 1):

"Se o empresário individual ou a sociedade empresária, no desempenho da livre iniciativa que implica a liberdade de contrato (CF, art. 1o, n. IV, 2a parte, e art. 170, caput), exorbita de sua função social, comete abuso que a lei civil genericamente trata como ilícito (CC. Art. 160, n. I, 2a parte, a contrario sensu, combinados com a 1a parte do n. II ao art. 145). Nos arts. 116, parágrafo único, e 154 da Lei 6.404/76, que dispõe sobre as sociedades por ações, há menções explícitas à função social das companhias. Essas normas aplicam-se também às sociedades por quotas de responsabilidade limitada (Dec. 3.708/19, art. 18).

As sociedades empresárias e os empresários individuais predisponentes das cláusulas contratuais à semelhança das perqueridas nesta oportunidade só exercerão constitucionalmente a livre iniciativa econômica pelo intermédio de expedientes contratuais uniformizados quando se ajustarem ao princípio da solidariedade (CF, art. 1o, n. IV; art. 3o, n. I) e ao princípio de respeito ao consumidor ( 170, n. V), ambos em convergência com o princípio da função social da propriedade dos bens de produção (art. 5o, inciso XXIII, ex argumento).

A incidência e aplicação desses princípios não dependem de lei ordinária.

Se a Constituição explicitamente alicerçou princípios de direito, à sua luz terão de ser apreciadas as normas constantes das leis infraconstitucionais. Todas as regras incompatíveis com os princípios constitucionais devem considerar-se implicitamente revogadas, total ou parcialmente. Da mesma forma, todos os negócios jurídicos, ou cláusulas deles, que contrariem aqueles princípios devem ser já considerados ilícitos, com as conseqüências de direito comum ordenadas à nulidade superveniente, ou à oportuna ineficacização daqueles negócios e cláusulas.

Ressalvado o princípio do respeito aos direitos adquiridos, declarado no n. XXXVI ao art. 5o da própria Constituição, resta lembrar que este mesmo princípio, nos casos a decidir, deverá ser aplicado mediante valorações concretizadoras que o harmonizem sistematicamente com a disposição do inc. XXXII ao mesmo art. 5o, e com o princípio do mencionado n. V ao art. 170 daquela lei maior." (Grifamos)

Assim, na medida em que a atividade negocial, decorrência óbvia da livre iniciativa, é consagrada, pela Constituição, como o principal instrumento social de colimação dos fins da ordem econômica, conclui-se que deve ser exercida em função dos interesses da coletividade. Traçando-se um pararelismo com a propriedade, pode-se dizer que, enquanto esta é legitimada no limite de sua função social, aquela também se subordina a um imperioso ajustamento às exigências da coletividade.(13)

Ante o quadro descrito apresentava-se necessária a intervenção estatal nos negócios jurídicos com o objetivo precípuo de restabelecer o equilíbrio dos agentes sociais de há muito rompido na prática, através da imposição de políticas mínimas, impondo, algumas vezes, restrições ao pleno exercício das atividades econômicas, já que o modelo jurídico-econômico fundado no voluntarismo e individualismo exacerbados, conseqüência das concepções difundidas nos séculos XVIII e XIX, não se mostrava adequado e consentâneo à realidade social atual. Face à dinâmica atual da vida econômica e social brasileiras, não poderia o Direito deixar de se adequar às novas realidades.

Tendo isso em conta, o saudoso Carlos Maximiliano já advertia:

"Não pode o Direito isolar-se do ambiente em que vigora, deixar de atender às outras manifestações da vida social e econômica; e esta não há de corresponder imutavelmente às regras formuladas pelos legisladores. Se as normas positivas se não alteram à proporção que envolve a coletividade, consciente ou inconscientemente a magistratura adapta o texto preciso às condições emergentes, imprevistas. A jurisprudência constitui, ela própria, um fator do processo de desenvolvimento geral; por isso a Hermenêutica se não pode furtar à influência do meio no sentido estrito e na acepção lata; atende às conseqüências de determinada exegese: quanto possível a evita, se vai causar dano, econômico ou moral, à comunidade. O intuito de imprimir efetividade jurídica às aspirações, tendências e necessidades da vida de relação constitui um caminho mais seguro para atingir a interpretação correta do que o tradicional apego às palavras o sistema silogístico de exegese."(14)

O direito passa a ser um instrumento de justiça e inclusão social na sociedade atual, instrumento de proteção de determinados grupos na sociedade, de realização de novos direitos fundamentais, de combate ao abuso do poder econômico.(15)

A Constituição Federal deixa isso claro, especialmente sob a inteligência de seu artigo 170, quando fixa as finalidades da Ordem Econômica: "(...) assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social (...)".

É induvidoso que a Constituição Federal claramente adotou o modelo econômico capitalista, fundado na livre iniciativa e na livre concorrência: a ordem econômica na Constituição de 1988 define opção por um sistema econômico, o sistema capitalista.(16)

Explicitado o sistema capitalista como aquele pelo qual faz opção a ordem econômica na Constituição de 1988, cabe indagarmos se, ao fazê-lo, o texto constitucional rejeita – ou não rejeita – a economia liberal e o princípio da auto-regulação da economia. (17)

Essa indagação é, também, prontamente respondida: há nela, nitidamente, rejeição da economia liberal e do princípio da auto-regulação da economia. Basta, para tanto, ler o art. 170: a ordem econômica liberal é substituída por uma ordem econômica intervencionista. (18)

Sem dúvidas, há liberdade de ação no mercado, tendo em vista o princípio da livre iniciativa; todavia, essa liberdade vem a ser limitada pelos demais princípios regentes da ordem econômica e, ainda, pelos demais princípios constitucionais, dentre os quais destacamos o da boa-fé objetiva, da razoabilidade e da proporcionalidade.

Face o texto constitucional o modelo capitalista encontra limites, e esses limites visam inibir quaisquer posturas que de alguma forma agridam os demais direitos, garantias e princípios consitucionais, dentre os quais encontra-se o da defesa dos consumidores(19).

Nesse contexto, preciosas se apresentam as palavras de Sérgio Varella Bruna, para quem "A liberdade de iniciativa empresarial, portanto, porque inserida no contexto constitucional, há de ser exercitada não somente com vistas ao lucro, mas também como instrumento de realização da justiça social – da melhor distribuição de renda – com a devida valorização do trabalho humano, como forma de assegurar a todos uma existência digna. Assim, o lucro não se legitima por ser mera decorrência da propriedade dos meios de produção, mas como prêmio ou incentivo ao regular desenvolvimento da atividade empresária, segundo as finalidades sociais estabelecidas em lei. A liberdade de iniciativa, destarte, mais do que uma garantia individual, passa a ser uma técnica de produção social, dentre da qual se insere o sistema de mercado, cujos objetivos são juridicamente estabelecidos. Isso equivale a dizer que o estabelecimento de uma ordem econômica, que tem por obrigação a realização da justiça social, através da proteção do consumidor, da busca do pleno emprego, da redução das desigualdades sociais, entre outros, condiciona não só a ação do Estado, mas as ações de toda a sociedade. Todos, inclusive os empresários, devem orientar suas atitudes com vistas à consecução de tais objetivos."(20)

A liberdade de iniciativa econômica privada, num contexto de uma Constituição preocupada com a realização da justiça social (o fim condiciona os meios), não pode significar mais do que "liberdade de desenvolvimento da empresa no quadro estabelecido pelo poder público, e, portanto, possibilidade de gozar das facilidades e necessidade de submeter-se às limitações postas pelo mesmo". É legítima, enquanto exercida no interesse da justiça social. Será ilegítima, quando exercida com objetivo de puro lucro e realização pessoal do empresário. Daí por que a iniciativa econômica pública, embora sujeita a outros tantos condicionamentos constitucionais, se torna legítima, por mais ampla que seja, quando destinada a assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.(21)

A plena economia de mercado, assim entendida aquela em que o Estado deixava aos particulares a missão de autoregularem os seus interesses, e que implicava necessariamente na visão absolutista dos direitos subjetivos, já não mais se mostrava adequada à efetiva proteção daqueles que não detinham os meios de produção e informação, não mais garantia o atingimento de uma das finalidades da República: a proteção à dignidade da pessoa humana.


3. Os Serviços Públicos e o Direito Administrativo

À luz do Direito Administrativo, pode-se dizer que serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administrados, prestado pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público.(22)

Segundo a doutrina de Hely Lopes Meirelles, os serviços públicos, em linhas gerais, ainda se classificariam em administrativos, industriais, uti singuli e uti universi.

Serviços administrativos são os que a Administração executa para atender a suas necessidades internas ou preparar outros serviços que serão prestados ao público, tais como o da imprensa oficial, das estações experimentais e outros dessa natureza. (23)

Serviços industriais são os que produzem renda para quem os presta, mediante a remuneração da utilidade usada ou consumida, remuneração, esta, que, tecnicamente, se denomina tarifa ou preço público, por ser sempre fixada pelo Poder Público, quer quando o serviço é prestado por seus órgãos ou entidades, quer quando por concessionários, permissionários ou autorizatários.(24)

Serviços uti universi são aqueles que a administração presta sem ter usuários determinados, para atender à coletividade no seu todo, como os de polícia, iluminação pública, calçamento e outros dessa espécie. Esses serviços satisfazem indiscriminadamente a população, sem que se erijam em direito subjetivo de qualquer administrado à sua obtenção para seu domicílio, para sua rua ou para seu bairro. Estes serviços são indivisíveis, isto é, não mensuráveis na sua utilização.(25)

Serviços uti singuli são os que têm usuários determinados e utilização particular e mensurável para cada destinatário, como ocorre com o telefone, a água e a energia elétrica domiciliares. Esses serviços, desde que implantados, geram direito subjetivo à sua obtenção para todos os administrados que se encontrem na área de sua prestação ou fornecimento e satisfaçam as exigências regulamentares. (26)

Com relação à estes últimos, dado não serem remunerados mediante tributos, mas, sim, tarifa, escreveu Hely Lopes(27) que os mesmos eram de utilização facultativa, e não compulsória, assertiva essa que entendemos não mais corresponder à realidade, o que procuraremos demonstrar adiante.


4. Os Serviços Públicos e a Constituição Federal

Em face da Constituição Federal de 1988 (art. 175), entendemos conceituarem-se como serviços públicos todos aqueles prestados pelo Poder Público, quer diretamente ou por intermédio de seus delegados, os quais se submetem às regras e controles do Estado. O serviço público é, por natureza, estatal.(28)

Nesse contexto, pouco importa a sua classificação em administrativos, industriais, uti singuli e uti universi, eis que a sua natureza será sempre pública tão-só pelo fato de a Constituição assim ter definido.

Calha, nesse diapasão, a doutrina do ilustre Celso Antônio Bandeira de Mello(29): "A Carta Magna do País já indica, expressamente, alguns serviços antecipadamente propostos como da alçada do Poder Público federal. É o que se passa com o serviço postal e o Correio Aéreo Nacional (art. 21, X, da Constituição), com os serviços de telecomunicações, de rádio difusão sonora e de sons e imagens, serviços e instalações de energia elétrica, navegação aérea, aeroespacial, infra-estrutura aéreoportuária, transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de Estado ou Território, transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros, exploração dos portos marítimos, fluviais e lacustres (art. 21, XII, letras "a" a "f"), seguridade social (art. 194) e educação (arts. 205 e 208)." (Grifamos)

Neste particular, é certo que os potenciais de energia hidráulica são bens da União (CF, art. 20, VIII), a ela cabendo explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, "os serviços e instalações de energia elétrica" (CF, art. 21, XII, b), além de lhe competir, exclusivamente, legislar sobre energia (CF, art. 22, IV). Daí concluir-se que o bem energia elétrica é de natureza pública, e não de índole, mesmo que remotamente, privada.

A Constituição Federal, em face dos artigos transcritos, deixou claro que a prestação do serviço em questão, por ser essencial, deve ser sempre fornecido visando atender, exclusivamente, os interesses da população.

De mais a mais, há que se observar que o prestador do serviço privado estrutura sua operação econômica com finalidade diversa da satisfação do interesse público. Ele busca obter o maior lucro possível, tendo em vista os princípios da atividade econômica em sentido estrito (CF, art. 170). Já o prestador do serviço público desempenha atividade disciplinada pelos princípios de direito público e apenas pode intentar a satisfação egoística de seu interesse de lucro na medida em que se realize o interesse público.(30)

4.1. Os Princípios

Princípio, em linguagem leiga, dá a idéia de começo, origem, base.

Princípios, por sua vez, são proposições diretoras de uma ciência, as quais todo o desenvolvimento posterior desta ciência deve estar subordinado.(31)

Na seara do Direito, pode-se dizer que os princípios jurídicos são enunciados lógicos, implícitos ou explícitos, que, por sua grande generalidade, ocupam posição de preeminência nos vastos quadrantes do Direito e, por isso mesmo, vinculam, de modo inexorável, o entendimento e a aplicação das normas jurídicas que com eles se conectam.(32), (33)

Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo.(34)

Os princípios jurídicos constituem a base do Ordenamento jurídico, a parte permanente e eterna do Direito e, também, o fator cambiante e mutável que determina a evolução jurídica; são as idéias fundamentais e informadoras da organização jurídica da Nação.(35)

E, precisamente por constituir a base mesma do Ordenamento, não é concebível uma norma legal que o contravenha.(36)

Por isso, violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustêm e alui-se a toda estrutura neles esforçada.(37)

Desta forma, está revelada a gigantesca importância de um princípio num sistema jurídico, de maneira que, insofismaticamente, podemos concluir que ao se ferir uma norma, indiretamente estar-se-á ferindo um princípio daquele sistema, que na sua essência estava embutido.(38)

A Constituição Federal não estampou explicitamente em seu texto os princípios que informam a prestação de serviços públicos. Daí a importância de extraí-los da sistemática constitucional então vigorante.

Segundo entendemos, quatro são os princípios relativos à prestação de serviços públicos: adequação, generalidade, segurança e continuidade.

Adequação consiste em eficiência do ponto de vista técnico. A atividade deve ser estruturada segundo as regras técnicas a ela pertinentes e de modo a que se constitua em meio causalmente próprio para satisfazer necessidades dos usuários. A atividade em que se materializa o serviço público é um meio-causa que deve conduzir a um fim-conseqüência. Não será adequado o serviço que não for apto a satisfazer, do ponto de vista técnico, a necessidade que motivou a sua instituição.(39)

Generalidade consiste na universalização da oferta do serviço, para propiciar sua fruição por todos os potenciais usuários. Se o serviço não se destina a ser ofertado a um número indeterminado de usuários, sequer se caracteriza como público. Isso não impede a imposição de limites quantitativos na operação do serviço. É óbvio que as dimensões materiais do instrumental necessário à prestação do serviço podem acarretar limites insuprimíveis. Haverá um número máximo de passageiros transportáveis através de certo veículo, por exemplo. O que se pretende indicar, porém, é que o serviço público consiste em prestação de utilidade a todos os potenciais interessados, ainda que as razões materiais e de segurança possam acarretar a limitação quantitativa. Generalidade consiste em uma peculiaridade de outra natureza, portanto. Caracteriza-se quando se oferta o serviço ao maior número possível de usuários, abrangendo todas as manifestações de necessidades, sem discriminações incompatíveis com o princípio da isonomia. Ofende-se a generalidade não com mera fixação de limites, mas com o privilégio na eleição dos usuários que serão beneficiados. Outra manifestação de ofensa à generalidade se verifica quando uma parte significativa do universo de usuários não é atendida.(40)

Segurança é o desenvolvimento da atividade sem pôr em risco a integridade física e emocional de quem quer que seja (usuários e não usuários). Não existe segurança em termos absolutos, na acepção da eliminação de todo e qualquer risco, em virtude da inviabilidade de subordinar a ocorrência dos eventos futuros a esquemas cognoscitivos e a vontade humana. Logo, não se pode qualificar um serviço como inadequado simplesmente por ter-se verificado ocasional ofensa à integridade física ou emocional de usuários. Segurança significa, no caso, a adoção das técnicas conhecidas e de todas as providências possíveis para reduzir os riscos de danos, ainda que assumindo ser isso insuficiente para impedir totalmente sua concretização.(41)

O item da segurança envolve uma relação de custo-benefício, onde se consideram as vantagens e as desvantagens das providências destinadas à redução dos riscos. Mas os resultados seriam extremamente perversos, se fosse viável tomar apenas os fatores econômicos. A dignidade da pessoa humana é incompatível com avaliações de natureza meramente econômica. Não se compatibiliza com a Constituição promover avaliação econômica da vida humana, dos atributos do homem ou de sua personalidade. Portanto, quando se alude à relação custo-benefício, indica-se uma relação cujo objeto é o interesse público. Se estiverem em jogo apenas interesses econômicos, a relação custo-benefício pode ser tomar em vista exclusivamente fatores econômicos. Mas, quando o risco envolver a dignidade do ser humano, os argumentos de custo econômico devem ser ponderados em face da amplitude do problema. Esta construção se entranha com o desenvolvimento social e econômico. O subdesenvolvimento provoca menosprezo à vida e à dignidade humanas. A viabilidade da existência do serviço acaba por superar a relevância de sua adequação. Ainda quando a pobreza e a ausência de disponibilidade de recursos técnicos impossibilitem providências mais sofisticadas acerca da segurança, isso não significa liberação do prestador do serviço de cautelas dessa ordem. Como se afirmou, todas as cautelas e providências possíveis, em face das circunstâncias, devem ser adotadas.(42)

Continuidade é a ausência de interrupção, segundo a natureza da atividade desenvolvida e do interesse a ser atendido. Em termos práticos, é claro que a continuidade se avalia diferentemente conforme se trate de fornecimento de água ou de transporte de passageiros. Observe-se que regularidade, sob um certo ponto de vista, pressupõe continuidade. Aquela é um plus relativamente a esta. Os serviços podem ser contínuos, sem que sejam regulares. Mas é impossível o serviço ser regular, se também não for contínuo.(43), (44)

De todos os princípios relativos à prestação de serviços públicos, temos que o da continuidade é o que desempenha importância vital para o sistema constitucional. E tal fato, para nós, possui o seguinte fundamento: a Constituição Federal erigiu à condição de públicos vários serviços que entendeu desempenharem papel de extrema importância na sociedade, devendo ser sempre fornecidos visando à satisfação do seu interesse.(45)

O professor Caio Tácito(46) dá bem a idéia da importância de referido princípio quando aponta: "O princípio da continuidade do serviço público impõe ao concessionário o dever de prosseguir na exploração mesmo se for ruinosa. À Administração incumbe, correlatamente, partilhar das cargas extraordinárias, restaurando a economia abalada e a eficácia da execução do contrato." (Grifamos)

Logo, conclui-se desde já que a interrupção do fornecimento de energia nos casos de impagamento das contas de consumo pelo usuário jamais ocorrerá no interesse da coletividade(47), mas, sim, contra, pois não é demasiado difícil imaginar os nefastos efeitos que a interrupção, mesmo quando temporária, acarreta às pessoas.

Em remate, estes são os princípios norteadores da prestação dos serviços públicos implicitamente agasalhados pelo texto constitucional. Na qualidade de verdadeiros princípios, sua força cogente independe de consagração em obra do legislador. Por outro lado, sua recepção em texto legal não lhe acarreta a perda do valor de fonte principal do direito, com as funções de fundamento, interpretação e integração do ordenamento. A conversão em lei, antes de degradá-los, tem o condão de reavivar a sua existência, a fim de que não sejam esquecidos pelos agentes incumbidos da concreção dos fins da ordem jurídico-econômica. Os imperativos que governam a ordem jurídica, tendentes à purificação das condutas extrapoladoras do exercício normal dos direitos, praticado ou não pelo mais forte economicamente, não concebem que tais princípios, plasmados no CDC, fiquem custodiados dentro do encerro legal.(48)

Ressaltada a importância dos princípios na interpretação e aplicação do Direito, passemos a analisar se a Constituição Federal admite a interrupção do fornecimento de energia elétrica em face do impagamento das contas de consumo.


5. A Suspensão do Fornecimento de Energia face ao Inadimplemento das Contas de Consumo

5.1. A Inconstitucionalidade do art. 6º, § 3º, inciso II, da Lei nº 8.987/95

Após o advento da Lei nº 8.987/95, a qual normatizou os institutos da concessão e permissão dos serviços públicos, vários foram os autores que decretaram peremptoriamente que a partir daquela data a interrupção da prestação dos serviços públicos por falta de pagamento encontrava-se legalizada, e, portanto, autorizada, ante os termos do § 3º, inciso II, do seu art. 6º, verbis:

"Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.

(...)

§ 3º Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando:

(...)

II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade."

Destarte, em que pese a letra fria do texto legal, o artigo 6º, § 3º, inciso II, da Lei nº 8.987/95, viola inúmeros dispositivos constitucionais e, inclusive, o Princípio Constitucional da Continuidade dos Serviços Públicos, como dantes exposto. Vejamos.

5.1.1. A Violação ao Princípio da Boa-Fé Objetiva

Segundo a doutrina civilista clássica, boa-fé é a intenção pura, isenta de dolo ou malícia, manifestada com lealdade e sinceridade, de modo a não induzir a outra parte ao engano ou erro.(49) É a chamada boa-fé subjetiva, um estado de ignorância sobre características da situação jurídica que se apresenta, suscetível de lesionar os direitos de outrem.

Atualmente, a noção clássica de boa-fé subjetiva vem cedendo espaço à sua face objetiva, a qual leva em consideração a prática efetiva e as conseqüências de determinado ato em lugar de indagar sobre a intenção do sujeito que o praticou. A boa-fé objetiva diz respeito a elementos externos à norma de conduta, que determinam como se deve agir. É um dever de agir de acordo com determinados padrões, socialmente recomendados, de correção, lisura, honestidade.(50)

De acordo com Karl Larenz(51), "El principio de la "buena fe" significa que cada uno debe guardar "fidelidad" a la palabra dada y no defraudar la confianza o abusar de ella, ya que ésta forma la base indispensable de todas las relaciones humanas; suppone el conducirse como cabía esperar de cuantos con pensamiento honrado intervienen en el tráfico como contratantes o participado en él en virtud de otros vínculos jurídicos. Se trata, por lo tanto, de un módulo "necesitado de concreción" que únicamente nos indica la dirección en que hemos de buscar la contestación a la cuestión de cuál sea la conducta exigible en determinadas circunstancias. No nos da una regra apta para ser simplemente "aplicada" a cada caso particular y para leer en ella la solución del caso cuando concurran determinados presupuestos. Sino que en cada supuesto se exige un juicio valorativo del cual deriva lo que el momento y el lugar exijan. Pero este juicio no se obtiene a través del criterio subjetivo del que hace la apreciación en caso de litígio, por conseguinte, del juez, sino que se tomará como módulo el pensamiento de un intérprete justo y equitativo, es decir, que la sentencia ha de ajustarse a las exigencias generalmente vigentes de la justicia, al criterio reflejado en la conciencia jurídica del pueblo o en el sector social al que correspondan los participantes (p. ej., comerciantes, artesanos, agricultores), en tanto ello no sea contrario a las exigencias y al contenido objetivo de los valores descritos en las palabras "fidelidad" y "crédito" (es decir, confianza). A este juicio cooperan los usos y concepciones ya existentes en el tráfico – habiendo de investigarse a su vez si coinciden con aquellas supremas exigencias – y de otra parte el ejemplo y modelo que la jurisprudencia ofrece en la valoración de casos análogos o equiparables." (Grifamos)

Segundo anota o professor Alberto do Amaral Júnior(52), "O princípio da boa-fé objetiva foi, aliás, implicitamente reconhecido pela Constituição Federal, que no art. 3º, determina: "Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - constituir uma sociedade livre, justa e solidária."

A justiça e solidariedade nas relações de consumo, para usar os termos do art. 3º do texto constitucional, significa a repressão das cláusulas abusivas visando à obtenção do equilíbrio das relações de consumo."

A interpretação do princípio da boa-fé em chave constitucional revela novos parâmetros através dos quais a relação obrigacional, antes fundada determinantemente no princípio da autonomia da vontade, deve ser enquadrada no sistema jurídico. Estes novos parâmetros, que no caso específico da boa-fé sinalizam para o dever de cooperação entre as partes vinculadas por uma relação obrigacional, para o dever, enfim, de consideração pelos interesses alheios à luz do escopo econômico-social da relação em questão, poderiam ser resumidos através do imperativo ético de solidariedade contratual.(53)

Na base do conjunto de princípios e em razão da influência do aspecto moral, encontra-se o princípio da boa-fé, segundo o qual as partes devem pautar a sua atuação em consonância com a lealdade e com a confiança recíprocas que a vida de relações impõe. Cumpre a cada qual respeitar a posição do outro contratante e operar com fidelidade e com probidade, a fim de que alcance os objetivos pretendidos com o contrato, agindo consoante padrões éticos normais à contratação pretendida.(54)

Presente tanto na formação, na conclusão e na execução, o princípio impregna de moralidade a atividade negocial, na defesa de valores básicos da convivência humana e de direitos ínsitos na personalidade. Com isso, o comportamento da parte deve, em todos os diferentes momentos do relacionamento, desde a aproximação à consecução de todas as obrigações, estar imbuído de espírito de lealdade, respeitando cada um o outro contratante e procurando, com a sua ação, corresponder às expectativas e aos interesses do outro contratante. Fidelidade à palavra, lealdade no tratamento e cumprimento adequado das obrigações, consoante padrões normais à contratação a que se vincula, são, pois, noções componentes do princípio em questão, que encontra, ademais, consagração legislativa em vários pontos das codificações, inclusive a nossa, que em diferentes situações protege especialmente a parte que, em sua ação, o obedece (como, dentre outros, nos casos de aquisição de boa-fé, atuação, por outrem, de boa-fé; posse de boa-fé).(55)

É, em verdade, princípio cardeal do sistema jurídico romano-cristão, cuja base ética é realçada na doutrina, exatamente em razão de concepções ideológicas relacionadas à própria natureza humana, donde se extrai, no fundo, o direito aplicável a cada civilização, em consonância, substancialmente, com a alma da coletividade e, formalmente, à regra da maioria para a sagração.(56)

Em decorrência desse princípio, são reconhecidos deveres correlatos ou laterais em todas as espécies contratuais, que se incorporam às relações negociais, exigindo aos contratantes comportamentos adequados, principalmente em vínculos que se estendem no tempo.(57)

Pontifica o Ministro Ruy Rosado de Aguiar Júnior(58) que "A boa fé é uma cláusula geral que permite a solução do caso levando em consideração fatores metajurídicos e princípios jurídicos gerais. Funciona, porém dentro do sistema, no sentido de que nele encontra sua fundamentação e dele retira o caráter juridicamente normativo de seu enunciado. Como "janela" do sistema jurídico, a boa fé permite conhecimento dos elementos externos não positivados, ou positivados para outro sentido, que se impõe à consideração e pode levar à uma decisão para além do que estava programado (culpa post pactum finitum) ou mesmo em contrário (supressio; adimplemento substancial) a algum preceito expresso, que é assim reelaborado ou desconsiderado em razão da função prevalente do princípio. A concepção de sistema aberto é, portanto, indispensável à compreensão da cláusula da boa fé, mas, entenda-se, aberto interna e externamente. O arbítrio deve ser rigorosamente controlado, tanto mais quanto maiores as facilidades de seu uso pela reunião de uma cláusula geral a conceitos indeterminados; o afastamento da discricionariedade e do psicologismo se garante pela necessidade de fundamentação da decisão e de sua conformidade com o ordenamento jurídico global.

A boa fé tem duas funções principais: cria deveres secundários de conduta (anexos ou acessórios); impõe limites ao exercício de direitos."

Boa-fé objetiva significa, portanto, uma atuação "refletida", uma atuação refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo contratual e a realização do interesse das partes.(59)

Quando as empresas-concessionárias ameaçam suspender o fornecimento de energia elétrica aos usuários sob o fundamento de existirem débitos tarifários, e ainda, apurados unilateralmente, estão a agir em desconformidade à boa-fé objetiva, vale dizer, de forma desleal, injusta, eis que desproporcional ao fim a que se destina se apresenta a prática empreendida, pois o único objetivo é o de constranger ao máximo os devedores, que na grande maioria das vezes não possuem meios técnicos e financeiros para salvaguardar os seus interesses.

Diante disso, muitas vezes os incautos usuários pagam o que não devem por temerem o pior: a perda do seu pequeno estabelecimento ou até mesmo a impossibilidade de suprirem as suas necessidades básicas, o que vem a representar um ato reprovável, desumano e ilegal, colocando o lucro do empreendimento à frente do interesse maior da sociedade que é o de receber o fornecimento dos serviços públicos sem solução de continuidade.

Os tempos são outros e a sociedade já não mais tolera o abuso de direito, o agir de forma desarrazoada, pois o direito não pode caminhar divorciado dos princípios morais que imperam na sociedade e que norteiam as consciências a conceberem os relacionamentos dentro de um mínimo de decência e pudor econômico, sob pena de se converterem estes em instrumento de pura especulação e destruição, ao invés de se tornarem fatores construtivos da riqueza nacional.(60)

Daí porque a hipótese do inciso II não autorizar a suspensão de serviços obrigatórios, cuja prestação se faz no interesse público ou é essencial à dignidade da pessoa humana. Essa é a situação específica do fornecimento de água tratada e de coleta de esgotos. A instalação de rede de distribuição de água tratada e de coleta de esgotos não se faz como de satisfação do interesse individual dos usuários. Trata-se de instrumento de à saúde pública. Através desses serviços, eliminaram-se quase totalmente as epidemias, transmitidas anteriormente através da contaminação da água. A suspensão dos serviços de água e esgoto representaria risco à saúde pública, na medida em que alguns dos integrantes da comunidade poderiam adquirir doenças, evitável através do tratamento de água e esgoto. Algo similar pode ser afirmado no tocante ao fornecimento de energia elétrica para fins residenciais, em situação que possa colocar em risco sua sobrevivência. Em suma, quando a Constituição Federal assegurou a dignidade da pessoa humana e reconheceu o direito de todos à seguridade, introduziu obstáculo invencível à suspensão de serviços públicos essenciais. Nesses casos, o Estado dispõe de duas escolhas. A primeira é promover a cobrança compulsória do valor correspondente à tarifa, para haver do usuário o montante correspondente aos serviços que continuam a ser prestados. A segunda é, verificando a carência de recursos, custear a manutenção da prestação dos serviços (inclusive e se for o caso, através da elevação das tarifas) cobradas dos demais usuários. Nesta última alternativa, a comunidade arcará com o custo dos serviços. A carência de recursos não autoriza a supressão da existência e da dignidade da pessoa humana.(61)

Destarte, diante da adoção de um padrão ético-jurídico de conduta reprovável por parte das empresas fornecedoras de energia elétrica, conclui-se inexistir respeito ao Princípio da Boa-Fé.

5.1.2. A Violação aos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade

No Direito Brasileiro, a técnica da verificação da razoabilidade pode ser admitida como presente no Texto Constitucional sob duas óticas diversas. Abrem-se, assim, duas construções admissíveis. Primeiramente, e como decorrência da doutrina alemã, pode-se considerar o "princípio da razoabilidade" como implícito no sistema, revelando-se assim como um "princípio" constitucional não escrito. Por outro lado, poder-se-ia, já agora sob a inspiração direta da doutrina norte-americana, extraí-lo da cláusula do devido processo legal, mais especificamente como decorrente da noção substantiva que se vem imprimindo a dita cláusula.(62)

Doutrina o professor Luis Roberto Barroso(63):

"O princípio da razoabilidade é um parâmetro de valoração dos atos do Poder Público para aferir se eles estão informados pelo valor superior inerente a todo ordenamento jurídico: a justiça. Sendo mais fácil de ser sentido do que conceituado, o princípio se dilui em um conjunto de preposições que não o libertam de uma dimensão excessivamente subjetiva. É razoável o que seja conforme à razão, supondo equilíbrio, moderação e harmonia; o que não seja arbitrário ou caprichoso; o que corresponda ao senso comum, aos valores vigentes em dado momento ou lugar. Há autores, mesmo, que recorrem ao direito natural como fundamento para a aplicação da regra da razoabilidade, embora possa ela radicar-se em princípios gerais da hermenêutica. Sobre este ponto em particular, veja-se a passagem, inspirada em San Thiago Dantas:

"Não é apenas a doutrina do Direito Natural que vê no Direito uma ordem normativa superior e independente da lei. Mesmo os que concebem a realidade jurídica como algo mutável e os princípios do Direito como uma síntese das normas dentro de certos limites históricos reconhecem que pode haver leis inconciliáveis com esses princípios, cuja presença no sistema positivo fere a coerência deste, e produz a sensação íntima do arbitrário, traduzido na idéia de "lei injusta"".

Sobre o princípio da proporcionalidade assesta o mestre português Canotilho(64):

"Quando se chegar à conclusão da necessidade e adequação do meio para alcançar determinado fim, mesmo neste caso deve perguntar-se se o resultado obtido com a intervenção é proporcional à <<carga coativa>> da mesma. Meios e fim são colocados em equação mediante um juízo de ponderação, a fim de se avaliar se o meio utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim. Trata-se, pois, de uma questão de <<medida>> ou <<desmedida>> para se alcançar um fim: pesar as desvantagens dos meios em relação às vantagens do fim."

A circunstância de ele não estar previsto expressamente na Constituição de nosso País não impede que o reconheçamos em vigor também aqui, invocando o disposto no § 2º do art. 5º: "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados etc."(65)

Na prática, os tribunais superiores já vêm aplicando essa técnica, embora em muitas ocasiões não se refiram a ela de modo expresso, e em outras a apliquem de forma inconsciente.(66)

Assim é que em decisão proferida em 1953, o Supremo Tribunal Federal já admitia essa variante da técnica da verificação da razoabilidade:

"O poder de taxar não pode chegar à desmedida do poder de destruir, uma vez que aquele somente pode ser exercido dentro dos limites que o tornem compatível com a liberdade de trabalho de comércio e de indústria e com o direito de propriedade. É um poder, em suma, cujo exercício não deve ir até o abuso, o excesso, o desvio, sendo aplicável, ainda aqui, a doutrina fecunda do détournement de pouvoir. Não há que se estranhar a invocação dessa doutrina ao propósito da inconstitucionalidade, quando os julgados têm proclamado que o conflito entre a norma comum e o preceito da Lei Maior pode-se acender não somente considerando a letra, o texto, como também, e principalmente, o espírito e o dispositivo invocado".(67)

Em julgados posteriores, de maneira mais veemente o Supremo pôde adotar referida técnica. Assim, admitiu, em decisão liminar, a violação ao princípio da proporcionalidade e razoabilidade, por lei estadual que determinava a pesagem de botijões entregues ou recebidos, para substituição, à vista do consumidor e com pagamento imediato de eventual diferença a menor. Entendeu ainda o Supremo, quanto à medida provisória que vedava a concessão de medida liminar em mandado de segurança e outras ações, que "há necessidade de controle da razoabilidade das leis restritivas ao poder cautelar".(68)

Com efeito, podemos dizer que, à luz da Constituição Federal, ‘os fins visados pelo Poder Público nem sempre justificam os meios empregados’.

Destarte, é razoável provocar a paralisação de uma atividade econômica com vistas à cobrar uma dívida? É razoável impedir o exercício de uma atividade lícita, tendo por intuito a cobrança de pretensos débitos? É possível, nos dias atuais, a qualquer cidadão sobreviver condignamente sem energia elétrica? É evidente que não, pois a mesma revela-se de extrema importância na vida atual, quer para manter em funcionamento qualquer atividade econômica, quer para permitir a conservação de alimentos, a higiene adequada, bem como o necessário lazer das pessoas, somente para citarmos alguns exemplos.

Ora, é evidente que se as pessoas não puderem trabalhar ou as empresas vierem a baixar as portas as concessionárias de energia elétrica jamais irão conseguir cobrá-las, eis que riqueza nenhuma estarão a gerar. Portanto, conclui-se que as posturas adotadas carecem de razoabilidade, além de serem desproporcionais aos fins visados, não podendo ser olvidado que "quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor." (art. 620, CPC)

Pode-se afirmar, portanto, que em boa parte, o critério de verificação da proporcionalidade da lei toma em linha de consideração direta os princípios constitucionais, como vetores que são para o desenvolvimento válido das leis pelo legislador ordinário. Assim, o referido critério pode ser considerado, nesse ponto, como um critério que, partindo dos princípios constitucionais como objetivos últimos do sistema, analisa a conformidade ou não das leis aos mesmos, extraíndo daí, eventualmente, uma inconstitucionalidade, por violação do princípio da proporcionalidade.(69)

É que dentro de certos parâmetros de nexo lógico, o legislador terá liberdade em seu atuar. Contudo, o Direito, e isto em nenhuma de suas manifestações, pode se compatibilizar com a injustiça. O critério de averiguação da razoabilidade ou proporcionalidade guarda evidente ligação com a questão da discricionariedade, seja ela administrativa ou legislativa.(70)

Na realidade, as concessionárias de energia elétrica, sob o pseudo manto da legalidade, optam pelo meio mais gravoso de cobrança da dívida, meio esse que não se revela razoável, tampouco proporcional à sua finalidade. É preciso deixar bem claro que a parêmia dura lex, sed lex, cedeu lugar à necessidade de decidir-se com razoabilidade as situações em concreto, pois o compromisso maior do Estado de Direito é com a justiça.(71), (72), (73)

5.1.3. A Violação ao Inciso XIII, do Art. 5º

Há muito tempo o Supremo Tribunal Federal, na seara do direito tributário-fiscal, assestou, em respeito ao Princípio do Livre Exercicio de Atividade, Ofício ou Profissão, dantes já previsto nas Constituições de 1946 e 1967, ser inadmissível à autoridade tributária proibir que o contribuinte em débito – para com a fazenda pública -, adquirisse estampilhas, despachasse mercadorias nas alfândegas e exercesse suas atividades profissionais, o que redundou na edição das Súmulas 70, 323 e 547, verbis:

"Súmula 70: "É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo".

"Súmula 323: "É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para o pagamento de tributos".

"Súmula 547: "Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais."

O artigo 141, § 14, da Constituição Federal de 1946, assim enunciava:

"É livre o exercício de qualquer profissão, observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer." (Grifamos)

Por sua vez, a redação do § 23, do artigo 150, da Constituição Federal de 1967, assim dispunha:

"É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer." (Grifamos)

E que o que significava a locução ‘condições de capacidade’ exposta nos textos constitucionais apontados?

Di-lo, com a habitual clareza, Pontes de Miranda(74):

"Sempre que a profissão liberal, para que o público seja bem servido e o interêsse coletivo satisfeito, requeira habilitação, não constitui violação a legislação que estabeleça o mínimo de conhecimentos necessários. Para o próprio provimento de cargos públicos, é de mister que o candidato preencha os pressupostos que a Constituição estatui e a lei estatuir. Tais os limites gerais da liberdade de profissão."

Temos que a locução ‘condições de capacidade’ dizia respeito ao ‘mínimo de conhecimentos necessários’ para que se exercesse determinada profissão, se para o seu bom desempenho assim o exigisse. Logo, restrições outras ao seu exercício apresentavam-se inadmissíveis.

Partindo-se dessa premissa, o recado enviado pela Corte Suprema às autoridades fazendárias foi claro: se débitos tributários há, ou se qualquer infração fiscal foi cometida, que a Fazenda do Estado ingresse com as medidas judiciais que entender necessárias, porém não impeça o exercício de atividade lícita.

Muito embora o Supremo Tribunal Federal tenha fincado posição nesses termos há muito tempo, é de se estranhar que os operadores do direito jamais tivessem procurado aplicá-la às hipóteses de interrupção no fornecimento de serviços públicos essenciais.

Ao suspender o fornecimento de energia elétrica à qualquer pessoa, as concessionárias de energia elétrica estarão, na verdade, provocando a paralisação das atividades por ela desenvolvidas, o que, no caso das empresas, redundará no seu fechamento, enquanto em face das pessoas físicas impedirá a sua própria subsistência, a sua sobrevivência com um mínimo de dignidade.

Nesse contexto, seguindo os passos dos textos constitucionais anteriores, estatui o artigo 5º, inciso XIII, da Constituição Federal:

"XIII - É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer". (Grifamos)

Em vista da dicção do texto constitucional, resta evidente que a intenção do legislador não foi outra senão a de estabelecer condições mínimas para o exercício de trabalho, ofício ou profissão, respeitadas a aptidão e grau de instrução necessários ao seu desempenho. Há, de fato, ofícios e profissões que dependem de capacidade especial, de certa formação técnica, científica ou cultural. Assim, compete privativamente à União legislar sobre condições para o exercício de profissões (art. 22, XVI). Só lei federal pode definir as qualificações profissionais requeridas para o exercício das profissões.(75)

O termo "qualificações profissionais" diz respeito às necessárias capacitação e formação técnicas, científicas ou culturais exigidas para o desempenho de determinadas atividades. Com efeito, a exigência destas qualificações prende-se à questões de ordem intelectual, e não financeira, já que a demonstração de aptidões especiais – qualidades pessoais - revela-se de suma importância, regra geral, ao bom desempenho de determinadas profissões. A atual redação deste artigo deixa claro que o papel da lei na criação de requisitos para o exercício da profissão há de ater-se exclusivamente às qualificações profissionais. Trata-se portanto de um problema de capacitação técnica, científica ou moral(76), dado que o mero exercício do poder de polícia do Estado não pode ir ao ponto de vedar certas atividades. (77)

Nesse sentir, é de clareza palmar que a locução "é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão" previsto no artigo 5º, inciso XIII, da CF, não admite sejam criados óbices ao pleno gozo e exercício das profissões em geral, inferindo-se, daí, ser vedado à concessionária de energia elétrica suspender unilateralmente o fornecimento de energia elétrica às pessoas físicas ou jurídicas, ao argumento da existência de débitos tarifários.

Como conseqüência do exposto, se o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão é livre, dada a clareza da dicção do texto constitucional, pode-se dizer que a ameaça de paralisação de fornecimento de energia elétrica às pessoas físicas ou jurídicas redundará na violação do artigo 5º, inciso XIII, da Constituição Federal, eis que estarão, por óbvio, impedidas de exercer plenamente e normalmente as suas atividades se não dispuserem da necessária energia elétrica.

A ruína do comércio, da indústria e da vida das pessoas será inexorável, hipóteses essas inadmissíveis.

A energia elétrica é, atualmente, bem de uso vital à qualquer pessoa, e não meramente facultativo(78) como se pensava anteriormente. É impensável a sobrevivência digna de qualquer ser humano ou a manutenção e desenvolvimento de qualquer atividade econômica sem que dela se faça uso. A vida moderna sem energia elétrica é impensável.

Por isso as Concessionárias de Serviços, as quais exercem funções delegadas pelo Poder Público, não possuem o direito (= poder) de deixarem de prestar um serviço que na atualidade apresenta-se de vital importância à sociedade. Atualmente, podemos denominar o fornecimento de energia elétrica de serviço existencial.

À respeito doutrinava o professor Clóvis do Couto e Silva(79): "A sociedade moderna vem-se caracterizando por incessante e progressiva padronização. Assim, à margem dos seus tipos legais, estabeleceram-se os que se poderiam denominar de sociais, por obra e influência de práticas reiteradas, tipos esses ainda não recebidos e normados convenientemente. Resultado de práticas continuadas, de costumes, esses tipo têm a cogência peculiar ao "poder" da sociedade.

Essa afirmativa importa em reconhecer haver outros elementos de fixação no mundo social, além do Direito. Todos esses elementos atuam sobre a atividade dos indivíduos processando-se uma estruturação, um tipificar-se de condutas, na qual a vontade individual, em virtude da objetivação decorrente da incidência daqueles fatores sociais, vai passando para o segundo plano. Em outras hipóteses, o resultado se supõe tão obviamente desejado, a ponto de ensejar, embora possa parecer paradoxal, que não se pesquise sua existência. São os atos absolutamente necessários à vida humana. A tipificação somente cresce de ponto e de importância quando se tratar desse último tipo de ato, pois relativa-se e objetiva-se a vontade, de modo a converter o que seria, "in thesi" negócio jurídico, em verdadeiro ato-fato. Os atos de tipo existencial referem-se às necessidades básicas do indivíduo, tais como alimentação, vestuário, água, etc." (Grifamos)

Complementando as palavras do mestre gaúcho, diríamos que o fornecimento de energia elétrica não é apenas necessário à vida humana, mas, sim, a qualquer atividade empreendida pelo homem. Portanto, como se vê, o seu fornecimento é necessário à existência e manutenção de todas as pessoas.

Em remate, o que cumpre deixar certo é que não há possibilidade de o Estado restringir o número de trabalhos, ofícios ou profissões do particular, entendido este como todo aquele que irá exercer estes misteres autonomamente ou mediante vínculo empregatício com entidades não governamentais(80), o que estará ocorrendo de forma oblíqua, diga-se sub-reptícia, se qualquer pessoa não mais tiver acesso ao consumo de energia.

Conclui-se, assim, que a postura adotada pelas concessionárias de energia elétrica viola frontalmente o artigo 5º, inciso XIII, da Constituição Federal, o que pode ocorrer, em regra, de forma direta, no caso das pessoas jurídicas, ou indireta, no das pessoas físicas.

5.1.4. A Violação ao Inciso XXXV, do Art. 5º

Todas as leis infraconstitucionais devem - ou pelo menos deveriam - haurir validade na Constituição Federal, sob pena de invalidade.

Entretanto, a partir do momento em que as concessionárias de energia elétrica se arrogam no direito de suspender o seu fornecimento ante o impagamento das contas de consumo, estão, na verdade, a subtrair do crivo do Poder Judiciário o monopólio da Jurisdição, instituindo verdadeiro Tribunal de Exceção: alegam existirem débitos e ameaçam suspender o fornecimento de energia se não ocorrer o pagamento dos valores que entende devidos. Tal postura viola frontalmente o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, verbis:

"XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;" (Grifamos)

Embora o destinatário principal desta norma seja o legislador, o comando constitucional atinge a todos indistintamente, vale dizer, não pode o legislador e ninguém mais impedir que o jurisdicionado vá a juízo deduzir pretensão.(81)

Em igual medida, todo e qualquer expediente destinado a dificultar ou mesmo impedir que a parte exerça sua defesa no processo civil atenta contra o princípio da ação e, por isso, deve ser rechaçado.(82)

Não podem as leis ou atos judiciais, quer direta ou indiretamente, subtrair da apreciação do Poder Judiciário, através da criação de obstáculos, qualquer lesão ou ameaça a direito. Com efeito, constitui a proteção contra a lesão ou ameaça um direito fundamental assegurado às pessoas físicas ou jurídicas.

Com efeito, se assim entenderem necessário, caberá às concessionárias de energia ingressar em juízo para cobrar dos usuários os valores que entendem devidos, submetendo ao crivo do Poder Judiciário a plausibilidade da sua pretensão. Se débitos existem, poderão cobrá-los de forma lícita, e não ameaçar a própria sobrevivência das empresas e dos cidadãos.

Na realidade, a ameaça de suspensão do fornecimento de energia elétrica funciona como meio de constranger os pretensos devedores a pagar o que porventura estejam a dever, e também o que não devem, dado que ante a iminência do corte certamente pagarão quaisquer valores que lhes forem apresentados sem pestanejar.

Quem não teme pela sorte do seu negócio ou pela impossibilidade de viver condignamente, assistindo ao seu programa de tevê predileto, ou até de não mais poder usufruir de água quente no inverno, ou até mesmo de manter os alimentos conservados em geladeira?

Além do mais, é sabido e ressabido que a ninguém é dado tomar a justiça em suas próprias mãos. Ora, por exemplo, se perante o inquilino recalcitrante o único meio de que dispõe o locador para expulsá-lo do prédio locado é a ação de despejo, porquê às concessionárias de energia elétrica seria permitido fazer justiça pelas próprias mãos através da suspensão do fornecimento do serviço, o que inclusive estaria a violar o Princípio da Continuidade dos Serviços Públicos Essenciais? Não há, com efeito, fundamento constitucional para tanto.

Aliás, já nos idos de 1927, o jurista francês Maurice Hauriou(83), Decano Honorário da Faculdade de Direito de Toulouse, assestou em obra de grande importância:

"La garantía que resulta del principio de que nadie tiene el derecho de tomarse la justicia por su mano – Este principio del régimen de Estado significa que nadie tiene el derecho de forzar a un tercero, sino en virtud de sentencia de un tribunal o de un título ejecutorio librado por un agente ministerial, no dirigiendóse, ademas, el procedimiento civil más que contra los bienes (supresión de la acción de prender al deudor y de la prisión por deudas en materia civil y comercial (L. 22 de julio de 1867)). Una jurisprudencia firme debería aplicar este principio a las grandes empresas, y particularmente a las empresas de distribuición de energía eléctrica, establecidas bajo el régimen de la simple autorización de voire, sin pliego de condiciones, pero poseyendo un monopolio de hecho em la región, y que se permiten cortar la corriente al abonado que no quiere aceptar las nuevas exigencias de aquella, a riesgo de arruinar su comercio y su industria. Cuando se piensa que un propietario carece del derecho de expulsar por sí mesmo, mediante la fuerza, a un inquilino que no satisface el alquiler, mal se concibe que el propietario de un cable eléctrico tenga el derecho de tomarse la justicia por sí mesmo, cortando la corriente al abonado." (Grifamos)

Ora, se muitos anos atrás a vida das pessoas já era totalmente dependente da utilização de energia elétrica, apresentando-se onerosamente excessiva, e portanto abusiva a interrupção do seu fornecimento ao usuário que estivesse a dever, não há duvidas de que a prática ainda adotada pelas concessionárias continua a agredir o Ordenamento Constitucional, o que ainda muitos juristas não se aperceberam.

Dessa forma, a violação ao inciso XXXV, do artigo 5º, da Constituição Federal é indiscutível.

5.1.5. A Violação ao Inciso LV, do Art. 5º

O princípio do devido processo legal entra no Direito Constitucional positivo com um enunciado que vem da Magna Carta inglesa: ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal (art. 5º, LIV). Combinado com o direito de acesso à Justiça (art. 5º, XXXV) e o contraditório e a plenitude da defesa (art. 5º, LV), fecha-se o ciclo das garantias processuais. Garante-se o processo, e "quando se fala em ‘processo’, e não em simples procedimento, alude-se, sem dúvida, a formas instrumentais adequadas, a fim de que a prestação jurisdicional, quando entregue pelo Estado, dê a cada um o que é seu, segundo os imperativos da ordem jurídica. E isso envolve a garantia do contraditório, a plenitude do direito de defesa, a isonomia processual e a bilateralidade dos atos procedimentais", conforme autorizada lição de Frederico Marques.(84)

Eis a lição de Pontes de Miranda(85):

"A regra do texto não é regra jurídica vazia, não é, como diriam os juristas alemães, "leerlaufend"; trata-se de direito subjetivo (constitucional) de defesa. Dele nasce direito constitucional a defender-se ou a ter tido defesa; em conseqüência disso, é nulo o processo em que se não assegura ao réu a defesa, ainda que tenha o juiz aplicado alguma "lei". A lei que não obedece ao art. 150, § 15, é inconstitucional, e, ainda em processo de habeas-corpus, deve ser posta de parte." (Grifamos)

Caminhando nesta mesma direção, Hely Lopes Meirelles(86) aponta que, "a defesa, como já vimos, é garantia constitucional de todo acusado, em processo judicial ou administrativo (art. 5º, LV), e compreende a ciência da acusação, a vista dos autos na repartição, a oportunidade para oferecimento de contestação e provas, a inquirição e reperguntas de testemunhas e a observância do devido processo legal (due process of law). É um princípio universal dos Estados de Direito, que não admite postergação nem restrições na sua aplicação." (Grifamos)

Outrossim, o jurista Roque Antonio Carrazza(87) doutrina:

"Percebemos, pois, que o direito à ampla defesa traz à sirga o direito ao devido processo legal. Ambos são inseparáveis, de modo que vulnerar um eqüivale a ferir de morte o outro." (Grifamos)

Ora, as empresas-concessionárias, ao ameaçarem suspender unilateralmente o fornecimento de energia elétrica ao usuário, até mesmo em razão do impagamento de contas de consumo estarão, ao impedir que o mesmo possa contestar os valores que alegam serem devidos, a ele transferindo o ônus de ingressar em juízo para impugnar valores que desconhece completamente: a medição do consumo, a apuração e o cálculo utilizado são do exclusivo conhecimento das empresas, e não dos consumidores. Daí se vê, portanto, que as concessionárias criam inúmeros obstáculos para que os eventuais prejudicados possam defender-se regularmente, dado ser curial que este obstáculo se traduz em um entrave, conforme a hipótese até mesmo insuperável, ao atingimento da finalidade do objetivo do constituinte(88), que foi a de propiciar pleno acesso ao Poder Judiciário.

Portanto, ante o rito sumaríssimo imposto pela concessionárias aos usuários, conclui-se inexistir respeito ao inciso LV, do artigo 5º, da Constituição Federal.


6. A Jurisprudência

O Poder Judiciário, por sua vez, não obstante ainda encontrar-se dividido quanto à legalidade (= constitucionalidade) da drástica medida adotada, aos poucos está reassumindo o seu real papel: o defensor primeiro da Constituição Federal.

A decisão judicial que bem demonstra a nova posição do Judiciário foi proferida pelo culto Ministro José Delgado, do Superior Tribunal de Justiça, nos autos do Recurso em Mandado de Segurança nº 8.915-MA, os seguintes termos: "1. É condenável o ato praticado pelo usuário que desvia energia elétrica, sujeitando-se até a responder penalmente.

2. Essa violação, contudo, não resulta em reconhecer como legítimo ato administrativo praticado pela empresa concessionária fornecedora de energia e consistente na interrupção do fornecimento da mesma. 3. A energia é, na atualidade, um bem essencial à população, constituindo-se serviço público indispensável subordinado ao princípio da continuidade de sua prestação, pelo que se torna impossível a sua interrupção. 4. Os arts. 22 e 42, do Código de Defesa do Consumidor, aplicam-se às empresas concessionárias de serviço público. 5. O corte de energia, como forma de compelir o usuário ao pagamento de tarifa ou multa, extrapola os limites da legalidade. 6. Não há de se prestigiar atuação da Justiça privada no Brasil, especialmente, quando exercida por credor econômica e financeiramente mais forte, em largas proporções, do que o devedor. Afronta, se assim fosse admitido, aos princípios constitucionais da inocência presumida e da ampla defesa. 7. O direito do cidadão de se utilizar dos serviços públicos essenciais para a sua vida em sociedade deve ser interpretado com vistas a beneficiar a quem deles se utiliza."

Do corpo do referido acórdão, extraem-se os seguintes fundamentos, verbis:

"É sabido que em todas as atividades do homem há os que cumprem e os que não cumprem com seus deveres, sendo esta última classe minoritária.

O desvio de consumo de energia elétrica é uma prática condenável, bastante disseminada entre os consumidores. Para puni-los criminalmente, só por meio dos caminhos legais. Para coibir o ato, se socorre a concessionária das inspeções, que podem e devem ocorrer nas instalações elétricas de qualquer consumidor, isso não se caracterizando nenhum abuso por parte de quem o realiza, desde que dentro dos ditames da lei. O que entendo abusivo é o meio utilizado pela impetrada para obrigar o devedor a pagar o que julga que lhe é devido, que é com a ameaça quase sempre consumada de suspender-lhe o fornecimento de energia elétrica, meio ilegal, como prevê o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 42.

IN CASU, se a impetrada deseja receber o que lhe é devido, pelo consumidor inadimplente, que se valha dos meios legais e não lhe ameaçando privar do consumo de um dos bens mais preciosos da humanidade na atualidade.

Ao utilizar-se de meio inidônio para receber o que lhe é devido, está a impetrada agindo desconforme à lei." (Grifamos)

Por sua vez, o não menos ilustre Ministro Garcia Vieira, também com assento no Superior Tribunal de Justiça, nos autos do Recurso Especial nº 201.112-SC, assim decidiu com relação à suspensão do fornecimento d’água a usuário em débito :"A Companhia Catarinense de Água e Saneamento negou-se a parcelar o débito do usuário e cortou-lhe o fornecimento de água, cometendo ato reprovável, desumano e ilegal. Ela é obrigada a fornecer água à população de maneira adequada, eficiente, segura e contínua, não expondo o consumidor ao rídiculo e ao constrangimento."

O Tribunal de Justiça do Maranhão, em decisão corajosa, foi além: determinou a suspensão do efeitos da Portaria que respaldava o corte do fornecimento de energia elétrica ante a ausência de pagamento das contas de consumo. O Des. Antonio Guerreiro Júnior, em 2 de agosto de 1.999, concedeu liminar a pedido do Ministério Público, determinando a suspensão dos efeitos da portaria nº 222/87 do DNAEE, que autoriza o corte do fornecimento mensal dos consumidores.

Segundo o Desembargador as normas das portaria ferem os direitos e garantias individuais, bem como afrontam o Código de Defesa do Consumidor.

No Estado de São Paulo, deve ser destacado o posicionamento adotado pelo Primeiro Tribunal de Alçada Civil, notadamente do seu ilustre Vice-Presidente, Juiz Antonio de Pádua Ferraz Nogueira, que, em algumas ocasiões, impediu a pretensão à interrupção do fornecimento de energia elétrica como meio de cobrança de dívidas:

Foi o que decidiu a 10ª Câmara do 1º TACivSP, nos autos da apelação nº 779.381-1, julgada em 29.09.98, onde se declarou ser ilegal a suspensão do fornecimento de energia elétrica visando compelir o usuário a pagar pretenso débito tarifário. Neste caso específico, o acórdão reconheceu ter ocorrido violação do relógio medidor, mas, mesmo nessa hipótese, impediu o corte no fornecimento de energia elétrica.

Do mesmo teor foi o despacho proferido pelo Vice-Presidente do 1º TACivSP, nos autos do Mandado de Segurança nº 889.229-1, despacho esse que impediu que a concessionária de energia elétrica efetuasse o corte do fornecimento à então impetrante, verbis:

"Fls. 156 e seguintes

Mantenho o despacho recorrido, porque, havendo decisão agravável, ou sentença apelável, ou mesmo acórdão com trânsito em julgado, desde que revestidos de flagrante ilegalidade, fazendo-se necessário o pronto e eficaz reparo para que não ocasione dano irreparável, a jurisprudência tem admitido, em caráter excepcional e em casos especialíssimos, o mandado de segurança (cf. 1º TACSP – Órgão Especial – Mandado de Segurança nº 846.822-8, j. em 29.04.99, v.u., rel. Juiz ARIOVALDO SANTINI TEODORO – Nesse sentido: RT 653/109; RTFR – 3ª Região 5/212; RSTJ 83/92; STJ-RT 715/269; RSTJ 95/53; JTJ 173/279), que "data venia", entendo, em tese, vestir-se a hipótese dos autos.

Veja-se, a propósito, que a r. sentença veio infringir os arts. 5º, incisos II, XIII, LV e LXIX, dentre outros, da Constituição Federal.

Não deixa também de afrontar do Colendo Superior Tribunal de Justiça, que se apoiam nos arts. 22 e 12 do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), que se aplicam às empresas concessionárias de serviço público.

Assim, no Resp. 174085/60 – Reg. 9800332197, 1ª Turma, v.u, Rel. Min, JOSÉ DELGADO, j. em 18.08.98, decidiu-se: "1. É impugnável, por Mandado de Segurança, o ato de autoridade dirigente de Sociedade de Economia Mista, quando praticado com abuso e de forma ilegal. "In casu", trata-se de ato do Superintendente de Distribuição Norte das Centrais Elétricas de Goiás (CELG) e seu representante local, que visando a competir o recorrente ao pagamento de contas em atraso, determinou a supressão do fornecimento de energia elétrica em outras unidades ao mesmo pertencentes, que estavam com o atualmente, procurado emprestar ao vocábulo autoridade o conceito mais amplo possível para justificar a impetração de Mandado de Segurança, tendo a lei adicionado-lhe o expletivo "seja de que natureza for" (Resp 84.082/RS, Rel. Min. Demócrito Reinaldo). 3. Recurso Especial a que se dá provimento" (grifei). Também, dentre outros, no ROMS nº 8915/MA, Reg. 9700624471, 1ª Turma, v.u., Rel. Min. JOSÉ DELGADO, j. em 12.05.98, firmou-se: "1. É condenável o ato praticado pelo usuário que desvia energia elétrica , sujeitando-se até a responder penalmente. 2. Essa violação, contudo, não resulta em reconhecer como legítimo ato administrativo praticado pela empresa concessionária fornecedora de energia e consistente na interrupção do fornecimento da mesma. 3. A energia é, na atualidade, um bem essencial a população, constituindo-se serviço público indispensável subordinado ao princípio da continuidade de sua pestação, pelo que se torna impossível a sua interrupção. 4. Os arts. 22 e 42, do Código de Defesa do Consumidor, aplicam-se às empresas concessionárias de serviço público. 5. O corte de energia, como forma de compelir o usuário ao pagamento de tarifa ou multa, extrapola os limites da legalidade. 6. Não há de se prestigiar atuação da Justiça privada no Brasil, especialmente, quando exercida por credor econômica e financeiramente mais forte, em largas proporções do que o devedor. Afronta, se assim fosse admitido, aos princípios constitucionais da inocência presumida e da ampla defesa. 7. O direito do cidadão de se utilizar dos serviços públicos essenciais para a sua vida em sociedade deve ser interpretado com vistas a beneficiar a quem deles se utiliza" (grifei)

Por outro lado, quanto à pertinência do exame da legitimadade passiva do litisconsorte necessário "writ", encontramos, além dos precedentes jurisprudenciais acima, vários outros que estão a mostrar que, - por delegação, ou por autorização, - o ato praticado é típico de Administração Pública. É, assim, ato de autoridade, para fins de mandado de segurança (cf. RJTJESP-Lex 122/180-182; JTJ-Lex 214/127-128).

Em tese, portanto, - ressalte-se, - cabe o mandado de segurança, deixando-se à Turma Julgadora, - como expresso na decisão que determinou o seu processamento, - o controvertido exame do seu real cabimento na hipótese "sub judice" e a aferição da legitimadade passiva, o que , "ad-cautela", só deverá ocorrer após o regular processamento do "mandamus".

Também por estes fundamentos, pois, mantenho a decisão de fls. 97/98. Processe-se o Agravo Regimental."

Aliás, o entendimento esposado reflete o posicionamento que o Colendo Superior Tribunal de Justiça vem adotando em casos semelhantes, inclusive admitindo o manejo de mandado de segurança para evitar a suspensão no fornecimento dos chamados serviços essenciais, posição essa que se coaduna com a letra e o espírito da Constituição Federal.


7. Conclusões

Finalmente, há que se deixar claro que se débitos de consumo de energia elétrica houver, as empresas-concessionárias não estarão impedidas de cobrá-los. Se meios outros há para cobrar, inclusive encontrando-se o próprio Estado a eles submetidos (v.g. Lei nº 6.830/80), por quê optar-se pelo mais gravoso? Não há justificativa para tanto.

O que se pretende, apenas, é que submetam à apreciação do Poder Judiciário a sua pretensão, deixando de agir sponte sua, como se magistrados fossem.

Não se pode esquecer, outrossim, que o serviço de fornecimento de energia elétrica é público, essencialmente público, por expressa determinação constitucional (CF, art. 21, XII, b). Por isso, não se pode tratá-lo como se privado fosse, submetido, mesmo que não de forma absoluta, aos interesses pessoais dos empresários. Diante disso, deve prevalecer o princípio da continuidade dos serviços públicos, implicitamente agasalhado pelo texto constitucional, o qual harmonizasse com os demais princípios, garantias e direitos fundamentais prestigiados pela Constituição Federal de 1988.

De qualquer modo, a preocupação do jurista deverá ser sempre a de atender os anseios de Justiça, visando salvaguardar o Bem Comum.

É o que assevera Alípio Silveira(89):

"A técnica hermenêutica do "razoável", ou do "logos do ser humano", é a que realmente se ajusta à natureza da interpretação e da adaptação da norma ao caso. A dimensão da vida humana, dentro da qual se contém o Direito, assim o reclama. O fetichismo da norma abstrata aniquila a realidade da vida. A lógica tradicional, de tipo matemático ou silogístico, não serve ao jurista, nem para compreender e interpretar de modo justo os dispositivos legais, nem para adatá-los às circunstâncias dos casos concretos. O juiz realiza, na grande maioria dos casos, um trabalho de adatação da lei ao caso concreto, segundo critérios valorativos alheios aos moldes silogísticos.

Ora, ao se orientar por juízos de valor em que se inspira a ordem jurídica em vigor, deverá o intérprete atender às exigências do bem comum, já que a lei é a ordenação da razão, editada pela autoridade competente, em vista do bem comum. E como o bem comum se compõe de dois elementos primaciais – a idéia de justiça e a utilidade comum – são êsses elementos, de caráter essencialmente valorativo, os princípios orientadores."

E, com efeito, a interrupção do fornecimento de energia elétricas aos usuários, ao invés de atender às exigências do bem comum, fere-o de morte, pois faz tabula rasa da solidariedade que deve permear as relações em sociedade, eis que em verdade se passa é que todos os homens têm de portar-se com honestidade e lealdade, conforme os usos do tráfico, pois daí resultam relações jurídicas de confiança, e não só relações morais.(90)


8.Notas

1. BITTAR, Carlos Alberto. O direito civil na constituição de 1988. 2ª ed., São Paulo: RT, 1991 p. 15 e ss..

2. BITTAR, Carlos Alberto, op. cit., p. 17.

3. BITTAR, Carlos Alberto, op. cit., p. 17.

4. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 116.

5. MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 3ª ed., São Paulo: RT, 1999, p. 101.

6. MARQUES, Cláudia Lima, op. cit., p. 102.

7. LARENZ, Karl. Derecho Justo-Fundamentos de Etica Juridica. Madri: Civitas, 1993, p. 19.

8. CASADO, Márcio Mello. Os Princípios Fundamentais como Ponto de Partida para uma Primeira Análise do Sobreendividamento. http://www.palhares.com.br.

9. CASADO, Márcio Mello, art. cit., http://www.palhares.com.br.

10. CASADO, Márcio Mello, art. cit., http://www.palhares.com.br.

11. CASADO, Márcio Mello, art. cit., http://www.palhares.com.br.

12. TOMASETTI JUNIOR, Alcides. Aspectos da Proteção Contratual do Consumidor no Mercado Imobiliário Urbano. Rejeição das Cláusulas Abusivas pelo Direito Comum. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: RT, nº 1, 1992.

13. FRONTINI, Paulo Salvador. A Atividade Negocial e Seus Pressupostos Econômicos e Políticos. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo: RT, nº 18, 1975, p. 38.

14. In Hermenêutica e Aplicação do Direito. 15ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 157.

15. MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 3ª ed., São Paulo: RT, 1999, p. 101.

16. GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição Federal de 1998.3ª ed., São Paulo: Malheiros, p. 306. (Grifamos)

17. GRAU, Eros Roberto, op. cit., p. 306.

18. GRAU, Eros Roberto, op. cit., p. 306. (Grifamos)

19. Sobre o princípio constitucional de proteção e defesa dos consumidores, assevera o professor JOSÉ AFONSO DA SILVA: "Realça de importância, contudo, sua inserção entre os direitos fundamentais, com o que se erigem os consumidores à categoria de titulares de direitos constitucionais fundamentais. Conjugue-se isso com a consideração do art. 170, V, que eleva a defesa do consumidor à condição de princípio da ordem econômica. Tudo somado, tem-se o relevante efeito de legitimar todas as medidas de intervenção estatal necessárias a assegurar a proteção prevista. Isso naturalmente abre larga brecha na economia de mercado, que se esteia, em boa parte, na liberdade de consumo, que é a outra face da liberdade do tráfico mercantil fundada na pretensa lei da oferta e da procura. A defesa dos consumidores "responde a um duplo tipo de razões: em primeiro lugar, razões econômicas derivadas das formas segundo as quais se desenvolve, em grande parte, o atual tráfico mercantil; e, em segundo lugar, critérios que emanam da adaptação da técnica constitucional ao estado de coisas que hoje vivemos", imersos que estamos na chamada sociedade de consumo, em que o "ter" mais do que o "ser" é a ambição de uma grande maioria das pessoas, que se satisfaz mediante o consumo." (In op. cit., p. 255).

20. BRUNA, Sérgio Varella. O Poder Econômico e a Conceituação do Abuso em seu exercício. São Paulo: RT, 1997, p. 141.

21. SILVA, José Afonso da, op. cit., p. 726. (Grifamos)

22. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 11ª ed., São Paulo: Malheiros, 1999, p. 477.

23. Meirelles, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 24ª ed., São Paulo: Malheiros, 1999, p. 299.

24. Meirelles, Hely Lopes, op. cit., p. 300.

25. Meirelles, Hely Lopes, op. cit., p. 299 e ss..

26. Meirelles, Hely Lopes, op. cit., p. 299 e ss..

27. Meirelles, Hely Lopes, op. cit., p. 299 e ss..

28. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 733. (Grifamos)

29. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio, op. cit., p. 485 e ss..

30. JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de Serviços Públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p. 131.

31. HOLANDA, Aurélio Buarque de. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 2ª ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, p. 1.393..

32. CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 9ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 31.

33. Para o professor português Jorge Manuel Coutinho de Abreu,"(...) os princípios juridicos são ideias ou intenções normativas gerais rectoras da regulação jurídica. São critérios axiológicos (expressivos de valores ético-sociais e políticos - valores ideológicos gerais, se se quiser - ou de valores mais especificamente jurídicos) que fundamentam ou informam a normação jurídica e concretas realizações do direito. Reflectem, portanto, determinações valorativas da consciência jurídica geral." (In Sobre os Regulamentos Administrativos e o Princípio da Legalidade. Coimbra: Almedina, 1987, p. 136 e ss..)

34. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, p. 629 e ss..

35. PEREZ, Jesús González. El Principio General de La Buena Fé en el Derecho Administrativo. Madrid: Real Academia de Ciencias Morales y Politicas, 1983, p. 45-46, apud CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 9ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 33.

36. PEREZ, Jesús González, apud CARRAZZA, Roque Antonio. ob. cit., p. 33.

37. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, p. 630.

38. RODRIGUES. Marcelo Abelha. Análise de Alguns Princípios do Processo Civil À Luz do Título III do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: RT, nº 15, 1995, p. 45.

39. JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de Serviços Públicos, p. 127.

40. JUSTEN FILHO, Marçal, ob. cit., p. 127.

41. JUSTEN FILHO, Marçal, ob. cit., p. 126.

42. JUSTEN FILHO, Marçal, ob. cit., p. 126 e ss..

43. JUSTEN FILHO, Marçal, ob. cit., p. 127.

44. Segundo Mário Masagão, "(...) a "continuidade" significa que as necessidades públicas, a cuja satisfação se destina o serviço, não devem ser atendidas esporàdicamente, mas de forma ininterrupta e constante." (In Curso de Direito Administrativo. 5º ed., São Paulo: RT, 1974, p. 254.).

45. A importância do princípio da continuidade dos serviços públicos é demonstrada pelo fato de ser vedada, em regra, no âmbito dos contratos envolvendo o seu fornecimento a alegação da exceção de contrato não cumprido, como bem demonstra o professor MARÇAL JUSTEN FILHO: "O dispositivo não alude à interrupção em virtude de inadimplemento do poder concedente. O princípio da continuidade do serviço público exclui, como regra, a exceptio inadimpleti contractus. Ademais, a conduta do poder concedente não é hábil, em princípio, a produzir algum efeito tão nocivo ao concessionário que possa autorizar a suspensão da atividade." (In ob. cit., p. 127..

46. In Direito Administrativo. 4ª ed.. São Paulo: Saraiva, 1974, p. 209.

47. Conforme a locução adotada pelo art. 6º, § 3º, inciso II, da Lei nº 8.987/95.

48. NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. A Proteção Contratual no Código do Consumidor e o Âmbito de sua Aplicação. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: RT, nº 27, 1998, p. 70 e ss..

49. ALVIM, Pedro. O Contrato de Seguro. 3ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 130.

50. Vede, por todos, NORONHA, Fernando. O Direito dos Contratos e seus Princípios Fundamentais. São Paulo: Saraiva, 1994.

51. In Derecho de Obligaciones. tomo I. Madri: Editorial Revista de Derecho Privado, 1958, p. 142 e ss..

52. In A Boa-Fé e o Controle das Cláusulas Contratuais Abusivas nas Relações de Consumo. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: RT, nº 6, 1993, p. 32.

53. NEGREIROS, Teresa. Fundamentos para uma Interpretação Constitucional do Princípio da Boa-Fé. Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 261.

54. BITTAR, Carlos Alberto. Direito dos Contratos e Dos Atos Unilaterais, p. 38 e ss.. (Grifamos)

55. BITTAR, Carlos Alberto, ob. cit., p. 39.

56. BITTAR, Carlos Alberto, ob. cit., p. 39.

57. BITTAR, Carlos Alberto, ob. cit., p. 40.

58. In A Extinção dos Contratos por Incumprimento do Devedor, 1991, 1ª ed., Aide, p. 243.

59. MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 2ª ed., São Paulo: RT, 1995, p. 79 e ss.. (Grifamos)

60. RIZZARDO, Arnaldo. Da Ineficácia dos Atos Jurídicos e da Lesão no Direito. Rio de Janeiro: Forense, 1983, p. 96.

61. JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de Serviços Públicos, p. 130. (Grifamos)

62. BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e Interpretação Constitucional. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1997, p. 178.

63. In Interpretação e Aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 204 e ss..

64. CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional. 6ª ed., Coimbra: Almedina, 1995, p. 383 e ss..

65. Guerra Filho, Willis Santiago. O Princípio da Proporcionalidade na Constituição. http:\\ www.teiajuridica.com.br.

66. BASTOS, Celso Ribeiro, ob. cit., p. 178.

67. BASTOS, Celso Ribeiro, ob. cit., p. 179.

68. BASTOS, Celso Ribeiro, ob. cit., p. 179.

69. BASTOS, Celso Ribeiro, ob. cit., p. 181.

70. BASTOS, Celso Ribeiro, ob. cit., p. 181.

71. MARTINS COSTA, Judith. A Boa-Fé no Direito Privado. São Paulo: RT, 1999, p. 459.

72. "Onde não há justiça distributiva, ou há apodrecimento, ou há revolta" (PONTES DE MIRANDA, Franciso Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967. Tomo VI. São Paulo: RT, 1968, p. 37.).

73. Magistralmente aponta Alípio Silveira que"(...) em face de qualquer caso, o aplicador há de proceder "razoàvelmente," investigando a realidade e sentido dos fatos, indagando dos juízos de valor em que se inspira a ordem jurídica em vigor, para que se encontre a solução satisfatória, entendendo-se esta em função do que a ordem jurídica considera como sentido de justiça", pois "(...) deverá dar ao caso concreto a solução mais justa possível." (In Hermenêutica no Direito Brasileiro. São Paulo: RT, 1968, p. 36).

74. In Comentários à Constituição de 1967. Tomo V. São Paulo: RT, 1968, p. 498 e ss.. (Grifamos)

75. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 250.

76. BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentários à Constituição do Brasil. 2º vol. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 250.

77. BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra da Silva, ob. cit., p. 250.

78. Meirelles, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, p. 299 e ss..

79. In A Obrigação como Processo. São Paulo: José Bushatsky, 1976, p. 91 e ss..

80. BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra da Silva, ob. cit., p. 79.

81. NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 3ª ed., São Paulo: RT, 1996, p. 93. (Grifamos)

82. NERY JUNIOR, Nelson, ob. cit., p. 99.

83. In Principios de Derecho Publico y Constitucional. 2 ª ed.. Madri: Reus, 1927, p. 161.

84. SILVA, José Afonso da, ob. cit., p. 411.

85. In ob. cit., p. 219.

86. In Direito Administrativo Brasileiro, p. 619.

87. In , ob. cit., p. 275.

88. BASTOS, Celso Ribeiro. MARTINS, Ives Gandra da Silva, ob. cit., p. 174. (Grifamos)

89. In Hermenêutica no Direito Brasileiro. 1º vol.. São Paulo: RT, 1968, p. 86.

90. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. Tomo XXXVIII. 3ª ed., Rio de Janeiro: Borsoi, 1972, § 4.242, p. 321. (Grifamos)


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SEGALLA, Alessandro Schirrmeister. A suspensão do fornecimento de energia elétrica ao usuário inadimplente e a Constituição Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 48, 1 dez. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/710. Acesso em: 25 abr. 2024.