Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/73070
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

AS SETE PRÁTICAS DE GESTÃO PÚBLICA MUNICIPAL DE QUALIDADE

AS SETE PRÁTICAS DE GESTÃO PÚBLICA MUNICIPAL DE QUALIDADE

Publicado em . Elaborado em .

Veja as 7 práticas que são essenciais para que o gestor tenha o controle da máquina pública.

AS SETE PRÁTICAS DE GESTÃO PÚBLICA MUNICIPAL DE QUALIDADE

Trabalho sério e em equipe, envolvimento dos servidores públicos municipais, contratação de uma equipe eminentemente técnica, bom senso e direcionamento - com definições de atribuições e noção clara de subordinação - e distanciamento de questões político partidárias. Estas são atitudes que certamente influenciam no sucesso da gestão de um Município, mas 7 práticas são essenciais para que o gestor tenha o controle da máquina pública, quais sejam: 

1 - Comprar com qualidade – não comprar “gato por lebre”. Definir bem o objeto. A boa compra é definida na requisição e não no setor de Compras ou de Licitações. Licitação legal, não significa licitação de qualidade. 

Existem pelo menos duas situações, que nem mesmo a mais primorosa definição de objeto é capaz de fazer com que a Administração de pequenos e médios municípios compre bem: Obras públicas e pneus. Infelizmente, a leitura feita da Lei 8666/93 pelos Tribunais de Contas dos Estados e da União impede que os Municípios contratem empreiteiras éticas, profissionais, comprometidas e que entreguem o serviço como definido nos Projetos, planilhas e cadernos técnicos. Quase que invariavelmente contrata-se empresas que não tem condições, nem técnicas, nem morais, para entregar a obra pelo preço comprometido. Ofertam descontos absurdos em cima de tabelas que já são enxutas. É questão de lógica, ofertam descontos muito superiores ao lucro esperado naquelas condições.

Os Tribunais de Contas precisam encarar esta realidade e admitir mais critérios que possam garantir uma compra de serviços de obras de qualidade, da mesma forma, que precisam admitir mais critérios para a compra de pneus. Em nome da ampla concorrência os Tribunais de Contas estão obrigando os Municípios a atentar para o princípio da economicidade.  A verdade é que, como é possível licitar hoje obras e pneus, o que os Municípios sofrem, além do demasiado trabalho de procedimentos administrativos e judiciais, é de patente desperdício de dinheiro público, de forma institucionalizada, pelos órgãos de controle.

2 – Estruturar o setor de tributos, em especial a fiscalização, o que só tem condições reais de ser realizado com a equipe do Município completamente envolvida. Os Municípios só sobreviverão com a complementação da receita própria. O resto é falácia.

2.1 – Diagnóstico da legislação e sua adequação.

2.2 – Fiscalização do ISS dos grandes contribuintes – Bancos, cartórios, substitutos tributários, mineradoras, grandes indústrias

2.3 – Estruturação do IPTU, desde a planta genérica de valores até a fiscalização sistêmica e atualização pela própria equipe do cadastro municipal.

2.4 – Fiscalização conjunta da CFEM.

2.5 – Implantação de práticas salutares em matéria de ITBI

2.6 – Implantação das instâncias recursais.

2.7 – Fiscalização do Simples Nacional 

2.8 – Fiscalização do VAF.

2.9 – Cobrança administrativa e judicial da Dívida Ativa. Priorizar, no primeiro momento, a cobrança administrativa e na cobrança judicial, quando necessária, fazê-la de modo efetivo, já indicando na inicial bem a penhora.

3 – Tornar a gestão do solo urbano rentável, o que, definitivamente não é o mesmo que lucrativa. Isso só é possível com a participação efetiva da equipe do Município. Veja: Tudo acontece no solo urbano. Falar da gestão do solo urbano é falar da qualidade de vida que o Município oferta aos cidadãos. 

3.1 – Cadastramento multifinalitário. Informação é pressuposto para gerência de qualquer problema. (cadastro não pode ser ferramenta só para cobrar tributos. Para ter legitimidade, cadastro tem que servir para reunir informações importantes para a Saúde, Educação, Assistência Social, Meio Ambiente e para a Regularização Fundiária.)

3.2 – Plano Diretor feito com a participação efetiva da equipe do Município. Deixar que uma empresa faça, por si, o Plano Diretor de seu Município, é o mesmo que  contratar uma empresa para criar seus filhos ou arrumar seu guarda roupas. Você provavelmente não reconhecerá seus filhos como seus e, quanto ao guarda roupa, este ficará lindo, mas certamente você não encontrará seus pertences e grande parte dos seus objetos estará em lugar que você não deseja. 

3.3 – O Município deve utilizar em seu Plano Diretor apenas as ferramentas que são compatíveis com o tamanho e características de seu território. (Não é porque o Estatuto das Cidades fala em IPTU Progressivo, Outorga Onerosa do Direito de Construir, etc, etc, que seu Plano Diretor deve obrigatoriamente trazer estes institutos. Atenção para as características e o porte do seu Município).

3.4 – Atenção especial para o zoneamento de seu Município. Colorir a planta de várias cores não garante, nem de longe, um zoneamento factível. O maior cuidado que um Município deve ter é vedar a ocupação das áreas que genuinamente são proibidas de uso, tais como APPs, algumas UCs,  áreas de risco, áreas não edificáveis em razão de lei; e definir regras claras para a ocupação em APAs, quando possível, para áreas sujeitas a regularização fundiária, para a ocupação em áreas urbanas isoladas. Definir medidas para minorar impactos de atividades industriais específicas. No entanto, é imprescindível definir apenas instrumentos que o Município tem condições de implementar. O resto é “blá, blá, blá”.

3.5 – As áreas urbanas isoladas do centro urbano principal devem receber atenção especial do legislador. Lembrar que se aprovados loteamentos nestas áreas, caso a lei não traga regras bem específicas, o Município certamente assumirá um ônus que não tem condições de arcar. 

3.6 – Muito embora de especial importância, as áreas institucionais de loteamentos devem ser muito bem pensadas, pois se não cuidadas pelo Município, certamente serão invadidas. 

3.7 – Definir uma política Municipal de Meio Ambiente e os mecanismos e taxas para o licenciamento de atividades de impacto local.

3.8 – Elaborar ou adequar a legislação de posturas municipais condizente com a realidade do Município e suas principais deficiências. Regras claras para comércio ambulante, material de construção, lotes vagos, propagandas, etc, etc.

3.9 – Capacitar fiscais de posturas. Sem fiscalização consciente não há gestão pública municipal.

3.10 – Elaborar ou adequar a legislação de obras particulares. O Código de Obras obrigatoriamente deve “conversar” com o Plano Diretor. Atenção para regras conflitantes. 

3.11 – Capacitar fiscais de obras. Sem fiscalização consciente não há gestão pública municipal.

3.12 – Definir preços públicos e instrumentos para a gestão do solo urbano.

4 – Ter extremo cuidado com as obrigações contraídas perante o Ministério Público. Muito embora extremamente conhecedores das leis, os promotores, padecem, a seu ver, de uma deficiência crucial com relação aos Municípios. Eles definitivamente não conhecem do dia a dia de uma administração pública, de seus desafios diários e das características de cada um dos Municípios de sua Comarca. Definir obrigações sem conhecer a realidade de um Município pode levar a absurdos intangíveis.  

4.1 – Os gestores públicos municipais devem evitar a assinatura de Termos de Ajuste de Conduta, os famosos TACs, com o Ministério Público. Isto porque, na letra da lei, o TAC tem a mesma força de uma sentença. Se não cumprido, será imediatamente executado, sem que ao gestor e ao Município seja ofertada a oportunidade de ampla defesa e contraditório, direito constitucional de todos. O TAC é sentença de promotor e, em nosso ordenamento jurídico, o órgão institucional que decide é juiz. Portanto, assinar TAC atenta contra as normas basilares do nosso Direito.

4.2 – Em Municípios com mais de 30 mil habitantes indico aos Prefeitos que tenham advogado (s) especializado em responder ofícios do MP. Advogado este que vá atrás do corpo técnico de cada Secretaria e formule a resposta junto com estes profissionais. Lembre-se: esta será a base de sua defesa em uma eventual Ação Civil Pública.

5 – Ter um corpo jurídico forte e profundo conhecedor de Direito Público. Nada impede que o Prefeito traga para seu corpo jurídico, em cargos de livre nomeação, advogados de sua confiança. Mas é crucial que existam na equipe, advogados que conheçam de Direito Público e de suas nuances.

5.1 – O corpo jurídico do Município deve ser o responsável pelas questões do dia a dia do Município. Acompanhar as ações judiciais (inclusive Execuções), atender as secretarias e ao gabinete do Prefeito em dúvidas cotidianas, dar parecer em licitações, acompanhar as questões dos Recursos Humanos. Em Municípios de médio porte é necessário que a Secretaria da Saúde tenha um advogado profundo conhecedor do SUS e de Consórcios Públicos. 

5.2 - Assessorias e consultorias jurídicas e de gestão são de extrema importância para as ações de estruturação das políticas municipais, pois ao corpo jurídico e técnico do Município é praticamente impossível implementar ações jurídicas e técnicas que visem o aprimoramento da gestão pública. As assessorias e consultorias são essenciais nas áreas de: tributação, fiscalização de tributos, posturas, obras e meio ambiente; auditorias, serviços demasiadamente técnicos, perícias específicas, feitura e consolidação de legislações e codificações mais complexas, ou mesmo, nas áreas de capacitação de servidores para, por exemplo, definição de objetos de licitação, cadastramento permanente, fiscais, etc. O único cuidado que o gestor deve tomar é como contratar tais consultorias e assessorias. Caso não haja simultaneamente objeto singular e notória especialização, o mais indicado é licitar por Técnica ou Técnica e Preço.

6 – Todo Município de pequeno e médio porte tem a necessidade patente de consolidar a sua legislação. Os Municípios tem leis que revogam leis que revogam artigos, que introduzem normas, incisos, alíneas, etc. É uma verdadeira miscelânea. É de suma importância que os Municípios consolidem suas legislações, em especial as estruturadoras, tais como Lei Orgânica, Códigos: de Tributos, Obras, Posturas, Sanitário; Plano Diretor ou Lei de Uso e Ocupação do Solo, Leis relativas ao Meio Ambiente, etc. Informação é pressuposto para a gerência de qualidade. Um Município que desconhece as próprias leis pode tomar decisões equivocadas e ser questionado por isto.

6.1 – Os procuradores municipais (e a Câmara de Vereadores) devem primar pelo uso da correta técnica legislativa. Ao revogar artigos, ao introduzir normas, artigos, incisos, etc a uma determinada lei, devem imediatamente, em ato contínuo, consolidá-la e colocá-la à disposição da população, por meio eletrônico. É de suma importância que os operadores do Direito Público Municipal atentem para a correta prática legislativa, que evitem revogar leis inteiras e prefiram adequar as existentes. Isto é respeito pela história legislativa de um Município.

7 – Construir uma relação de profundo respeito com a Câmara Municipal. 

7.1 – É usual que questões politiqueiras influenciem na apreciação de projetos de leis de suma importância para os Municípios, no entanto, o respeito pela Câmara de Vereadores resolve a maioria das barreiras não técnicas. Por isso é fundamental que o Gestor Público mantenha uma ótima relação de respeito com o legislativo municipal. Isto é possível com ações fáticas de muito fácil implementação, quais sejam:

7.1.1 – Sempre que estiver elaborando um projeto de lei de maior vulto, envolver a Câmara de Vereadores e a população, até por meio de Audiências Públicas, na definição de pontos relevantes. Sempre disponibilizar para a Câmara Municipal um advogado ou técnico para apresentar aos vereadores a matéria e a sua importância.

7.1.2 – Evitar enviar Projetos de Lei para a Câmara de Vereadores que demandem apreciação fora dos prazos regimentais. É claro que o Executivo pode demandar uma tramitação de urgência, no entanto, existem prazos razoáveis até mesmo para esta questão, que inevitavelmente devem ser compreendidos pelo Gestor. É impossível uma análise acurada de um Projeto de Lei em uma semana por exemplo. 

7.1.3 - Sempre enviar ao Executivo, quando se tratar de projetos de lei de importância significativa, estudos que comprovem a necessidade daquela legislação ou mesmo as melhoras que são esperadas. 

7.1.4 – Os vereadores precisam de informações precisas para desenvolverem sua função. Por isso é de suma importância que eles recebam do Executivo todas as informações definidas em lei e as solicitadas por meio de Requerimentos. 

7.1.5 – Sempre que convocada a equipe técnica do Prefeito deve comparecer a Câmara de Vereadores preparada para responder as questões levantadas pelos edis.

7.2 – Um Legislativo respeitado não se furta e não poderia fazê-lo de apreciar matérias importantes para o Município.


Autor

  • Juliana Fernandino

    Juliana Fernandino Costa é advogada, especialista em Direito Público e Tributário e Diretora de Cursos da empresa Pauta Municipal. Já atuou na elaboração de legislação de ordenamento do solo urbano nos municípios de Jequitibá, Araçaí, Inhaúma, Santana de Pirapama e Nazareno. É assessora jurídica na prefeitura de Ouro Branco e nas Câmaras Municipais de Caetanópolis e Paraopeba. Elaborou a legislação tributária nos municípios de Fronteira e Governador Valadares. É palestrante nas áreas de Tributos Municipais, Gestão do Solo, Obras e Posturas, Meio Ambiente e Processo Legislativo.

    Textos publicados pela autora

    Site(s):

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pela autora. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.