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A figura do serial killer psicopata no direito penal brasileiro

A figura do serial killer psicopata no direito penal brasileiro

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Breves considerações sobre psicopatia em seu grau mais elevado, iniciando pelo seu aspecto histórico e trazendo a evolução de seu conceito ao longo do tempo.

INTRODUÇÃO

O estudo desse trabalho buscou conhecer e entender as facetas e características de um psicopata que comete assassinatos em série, analisando seus aspectos peculiares, como os sociais, psicológicos, para assim compreender seu modus operandi e o porquê da necessidade de novas políticas públicas para enfrentar as ações criminosas desse perfil.

Assim, no intuito de melhor compreender o assunto, a proposta deste artigo se baseia numa abordagem da figura do serial killer psicopata, e também sobre a medida de segurança aplicada aos portadores do transtorno da psicopatia, tendo como objetivo observar a sua eficácia tendo em vista a grande controvérsia entre proteger o bem jurídico maior, que é a vida, de ambos os lados da situação: a sociedade, como potencial vítima e também ao indivíduo que comete o crime, pois o direito deste também deve ser observado.

Este trabalho divide-se em quatro seções. A primeira cuida da definição e histórico da psicopatia, desde Pinel (1745-1826), um dos percussores dos estudos sobre a psicopatia, até a atualidade.

A seção seguinte analisa a personalidade psicopática, e, a formação da personalidade de um indivíduo psicopata, serão apresentados fatores externos e internos que poderiam ensejar um desencadeamento da psicopatia e suas características.

Na sequência, serão desenvolvidas as implicações criminais da conduta do psicopata, o crime seu modus operandi e sua reincidência. E, em seguida, sua culpabilidade.

Por fim, após uma breve abordagem da medida de segurança e seus pressupostos atuais. Este artigo apresentou uma proposta eminentemente teórica sobre uma medida de segurança específica para tratamento dos psicopatas.

Este artigo utilizou a pesquisa bibliográfica, valendo-se, também, de artigos específicos sobre o assunto, revisão de literatura e do método qualitativo. Cabe esclarecer que alguns autores relacionados a este tema tratam de maneira específica os conceitos de sociopata, psicopata, condutopata, entre outros. Contudo, não se adentrou nessa distinção teórica, e, para fins acadêmicos, neste trabalho foi tratado apenas a figura do psicopata e em especial o que comete assassinatos em série, conhecidos como serial killer.

Por fim, nas Considerações Finais deste trabalho, retornou-se ás questões iniciais na busca de compreensão deste universo repleto de ponderações e considerações acerca da linha tênue que é manter a sociedade a salvo desse tipo de indivíduo e ainda assim resguardar o direito fundamental deste.


BREVE HISTÓRICO E CONCEITO

Segundo Henriques (2009) palavra psicopata, de acordo com sua etimologia, vem do grego e significa "doença da alma" (psykhé = alma; pathós = doença). No século XIX a expressão “psicopatia” era utilizada em seu sentido amplo na literatura médica para nomear doentes mentais de modo geral, não havendo ainda uma ligação entre psicopatia e personalidade antissocial.

Balone (2002), traz considerações mostrando que tal termo perpassou por uma grande evolução no que tange ao seu conceito, sendo ela a personalidade psicopática. Salientam-se as mais famosas e enriquecedoras denominações como a “Loucura sem delírio” ou “Loucura racional” de Pinel e a “loucura moral” de Prichard.

Na história da sociedade, sempre existiu histórias de grandes líderes, com um incrível poder de oratória e convencimento, e com uma facilidade de infringir regras com o objetivo apenas de alcançar poder. Estes indivíduos não calculam seus atos e o reflexo de suas ações sobre outros, sendo capazes de agir da maneira que julgar necessário simplesmente com intuito de atingir seus objetivos pessoais, inclusive utilizando da força e brutalidade.

Pinel apud Pereira (2004), um dos primeiros estudiosos a conceituar a psicopatia, fala de pessoas que têm características de mania, mas que não possuem nenhuma forma de delírio. Cita também que se admirava de ver muitos loucos que, em nenhum momento apresentavam prejuízo algum em seu discernimento ou senso de realidade. Sá (1995) traz os estudos de Kurt Schneider (1887-1967), onde este definiu a psicopatia como sendo um distúrbio da personalidade que não afeta a inteligência nem a estrutura orgânica do indivíduo.

Segundo o entendimento de Maranhão:

O psicopata é antissocial. Sua conduta frequentemente o leva a conflitos com a sociedade. Ele é impelido por impulsos primitivos e por ardentes desejos de excitação. Na sua busca autocentrada de prazeres, ignora as restrições de sua cultura. O psicopata é altamente impulsivo. É um homem para quem o momento que passa é um segmento de tempo separado dos demais. Suas ações não são planejadas e ele é guiado pelos seus impulsos. O psicopata é agressivo. Ele aprendeu poucos meios socializados de lutar contra frustrações. Tem pequeno ou nenhum sentimento de culpa. Pode cometer os mais apavorantes atos e ainda rememorá-los sem qualquer remorso. Tem uma capacidade pervertida para o amor. Suas relações emocionais, quando existem, são estéreis, passageiras e intentam apenas satisfazer seus próprios desejos. Estes dois últimos traços: ausência de amor e de sentimento de culpa marcam visivelmente o psicopata, como diferente dos demais homens. (MARANHÃO, 1995, pag. 95)

Complementando com o entendimento de Costa:

Após anos de evolução do conceito, hoje, pode-se resumir o conceito de Personalidade psicopática, atual antissocial, caracterizada principalmente por ausência de sentimentos afetuosos, amoralidade, impulsividade, principalmente falta de adaptação social e incorrigibilidade. (COSTA, 2008)

Segundo Hare apud Araújo (2011), o grande impulso para a discussão sobre o diagnóstico da psicopatia foi a Segunda Guerra Mundial, uma vez que, nesse período, houve a necessidade de se identificar, diagnosticar e tratar indivíduos potencialmente perigosos e que pudessem ameaçar a estrutura e o controle militar.  Foram vários os estudos que tentaram conceituar a psicopatia, até que se chegasse ao conceito atual, em conformidade com a Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial da Saúde (CID 10):

Transtorno de personalidade caracterizado por um desprezo das obrigações sociais, falta de empatia para com os outros. Há um desvio considerável entre o comportamento e as normas sociais estabelecidas. O comportamento não é facilmente modificado pelas experiências adversas, inclusive pelas punições. Existe uma baixa tolerância à frustração e um baixo limiar de descarga da agressividade, inclusive da violência. Existe uma tendência a culpar os outros ou a fornecer racionalizações plausíveis para explicar um comportamento que leva o sujeito a entrar em conflito com a sociedade. (CID-10 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1993.)

Silva (2010), argumenta que seus atos criminosos não provem de mentes adoecidas, mas sim de um raciocínio frio e calculista combinado com uma total incapacidade de tratar as outras pessoas como seres humanos pensantes e com sentimentos.

Cleckley descreve as características mais frequentes do que hoje se chama de psicopata:

problemas de conduta na infância, inexistência de alucinações e delírio, ausência de manifestações neuróticas, impulsividade e ausência de autocontrole, irresponsabilidade, encanto superficial, notável inteligência e loquacidade, egocentrismo patológico, autovalorização e arrogância, incapacidade de amar, grande pobreza de reações afetivas básicas, vida sexual impessoal, trivial e pouco integrada, falta de sentimento de culpa e de vergonha, indigno de confiança, falta de empatia nas relações pessoais, manipulação do outro com recursos enganosos, mentiras e insinceridade, perda específica da intuição, incapacidade para seguir qualquer plano de vida, conduta antissocial sem aparente arrependimento, ameaças de suicídio raramente cumpridas, falta de capacidade para aprender com a experiência vivida. 

O mesmo autor também define:

Os psicopatas possuem a capacidade de tentar esconder o seu comportamento antissocial, aparentando serem homens civilizados e charmosos. Dessa forma conseguem manipular, ou seja, fragilizar a defesa de suas vítimas. Indivíduos considerados impulsivos, emocionais superficialmente, apresentando indiferenças a apegos pessoais, abraçando de maneira fugaz atitudes agressivas e indiferenças quanto ao acato às normas e obrigações, desencadeando a posturas antissociais (CLECKLEY, 1988, p143).

Corroborando com este entendimento, Palomba (2003) deixa claro em seu posicionamento que os psicopatas não são doentes mentais, mas também não podem ser enquadrados como pessoas normais, haja vista possuírem deformidades em seu senso ético moral, bem como outros distúrbios, como o da afetividade e da sensibilidade, cujas alterações psíquicas os levam ao cometimento dos mais variados delitos.

Costa (2008) aponta que a psicopatia pode ser diferenciada de outros transtornos de personalidade, baseado em suas características de sintomas interpessoais (egocêntricos, manipuladores, determinados e frios), afetivos (apresentam labilidade, superficialidade emocional, incapacidade de manter vínculos estáveis e falta de sentimento de remorso ou culpa) e comportamentais (criminalidade e uso de substâncias psicoativas).

Importante ressaltar que a psicopatia não é sinônimo de criminalidade pois, nem todo psicopata será um criminoso. Segundo Silva (2010), no mundo, a porcentagem de pessoas portadoras desse transtorno chega 4%( quatro por cento) da população mundial sendo 3% (três por cento) homens e 1 % (um por cento) mulheres, ou seja, a cada 25 (vinte e cinco) pessoas, uma teria o transtorno. mas desse número apenas 1% (um por cento) pode chegar a cometer algum crime de maior gravidade, como um homicídio.

Para Kaplan et al:

[...] o transtorno da personalidade antissocial é caracterizado por atos antissociais e criminosos contínuos, mas não é sinônimo de criminalidade. Em vez disso, trata-se de uma incapacidade de conformar-se às normas sociais que envolvem muitos aspectos do desenvolvimento adolescente e adultos do paciente. (KAPLAN, H. I.; SADOCK, B. J.; GREEB, J. A. Ibidem, p.692)

            Assim Taborda et al. (2004), destacam que o conhecimento deste transtorno de personalidade é de fundamental importância, especialmente para a psiquiatria forense, não somente por auxiliar o exame pericial que cada vez mais vem detectando esta característica nos indivíduos, mas por principalmente demonstrar e tentar explicar a gravidade dos crimes praticados pelos portadores de personalidades psicopáticas. 


O DESENVOLVIMENTO DA PSICOPATIA E SUAS CARACTERÍSTICAS

Kaplan et al. (2003) mostram em seus estudos que a psicopatia é um Transtorno Congênito de Personalidade. Apesar de ser possível observar vários indícios e sintomas de predisposição para o transtorno na infância, este somente poderá ser diagnosticado com segurança a partir dos dezoito anos de idade.  Vale salientar que os transtornos de personalidade não podem ser considerados como uma doença, mas sim uma anormalidade do desenvolvimento psicológico que alteram a integração psíquica e resultam no comportamento estranho e mal ajustados do indivíduo no meio social e consigo mesmo.

Kaplan et al. (2003) salientam também sobre a psicopatia como um estado patologia mental caracterizada por desvios, principalmente, de caráter. Esse desvio de caráter começa a se desenvolver desde a infância. Por isso, na maioria das vezes, os primeiros sinais do transtorno podem ser observados nesta fase ou na adolescência, por meio de comportamentos incomuns e agressivos que, durante estes períodos, são denominados de transtornos de conduta.

No entendimento de Trindade (2011) a psicopatia não é um transtorno mental da mesma ordem da esquizofrenia, do retardo ou da depressão. Logo, pode-se dizer que não é propriamente um transtorno mental, mas sim um transtorno de personalidade, já que implica uma condição mais grave de desarmonia na formação da personalidade.

Eça preceitua que:

Em verdade, conhece-se a personalidade psicopática através da constatação de que existem certos indivíduos que, sem apresentar alterações da inteligência, ou que não tenham sofrido sinais de deterioração ou degeneração dos elementos integrantes de seu psiquismo, exibem, através de sua vida, sinais de serem portadores de intensos transtornos dos instintos, da afetividade, do temperamento e do caráter, sem, contudo, assumir a forma de verdadeira enfermidade mental. (EÇA, 2010, p. 282)

Na infância, os fatores de predisposição para desenvolver a psicopatia comumente incluem o Transtorno de Conduta, Transtorno de Déficit de Atenção e a hiperatividade. Vale frisar que essa predisposição isoladamente não representa que o indivíduo se tornará um psicopata. Segundo Simon (2011), a combinação da disfunção neurobiológica com déficit de atenção/hiperatividade e transtorno de conduta, se mostra mais frequente entre meninos que meninas. O pesquisador atribui esse fato às normas de socialização e da formação cultural, já que as meninas normalmente são mais educadas e conseguem controlar sua expressão evidente de raiva.

De acordo com Natrielli et al. (2012) as disfunções do lobo frontal associam-se a agressividade e existem evidências de associação entre danos da área pré-frontal e subtipos de impulsos de comportamentos agressivos.

 Corroborando assim com os estudos de Palomba (2014) ao afirmar que nenhum tipo de acontecimento traumático da infância, faz surgir a psicopatia, pois como já dito, este não é um transtorno que surge com base em algum fato, ele já está lá desde sempre. Problemas como abusos sexuais sofridos, agressões físicas ou psicológicas, qualquer tipo de maus tratos sofridos pela criança não é capaz de por si só gerar esse Transtorno Congênito de Personalidade, pois se assim fosse, a quantidade de pessoas que desenvolveriam a psicopatia seria muito mais elevada.

Porém, ainda segundo Palomba (2010) o meio e forma em que essas crianças vivem podem vir a ser um gatilho para desenvolver o transtorno. Então pode-se concluir que a psicopatia é o resultado dramático da soma entre fatores cruciais como: má-formação genética biológica, fruto de desarranjo bioquímico na estrutura cerebral; desestrutura sócio familiar que propicie um gatilho para desenvolver o transtorno.

Silva (2010) caracteriza os psicopatas de um modo geral como indivíduos frios, calculistas, inescrupulosos, dissimulados, mentirosos, não tem a capacidade de ter empatia, desprovidos de culpa ou remorso e, muitas vezes, revelam-se agressivos e violentos quando seus planos são contrariados, são verdadeiros “predadores sociais”, usando de diferentes formas de manifestação dos seus atos transgressores.

Quanto às características dos portadores do citado transtorno, Trindade complementa o entendimento:

O psicopata é um indivíduo egoísta, impulsivo, agressivo, sem sentimento de culpa ou remorso em relação a comportamentos que seriam estarrecedores para os modelos da sociedade. Trata-se de um sujeito impulsivo e agressivo, desprovido do sentimento de vergonha, de remorso e de consideração pelos outros. Na realidade, a psicopatia é um transtorno no qual existe uma fundamental incapacidade de amar ou de se estabelecer uma relação de confiança. Há falta de insight, de habilidade para controlar impulsos [...] (TRINDADE, 2011, p166)

Também salienta que tais indivíduos não se sentem de nenhuma forma como responsáveis por seus atos, colocam sistematicamente a culpa dos seus erros nos outros. Não detém a capacidade de aprender com a experiência, reincidindo esses comportamentos. São imediatistas, não conseguem sustentar planos nem a longo nem a médio prazo. Importa salientar que tal transtorno manifesta-se de maneira particular em cada indivíduo, logo, não existe generalidade em suas atitudes, podendo apresentar variações a depender do caso concreto. A esse respeito, Silva (2010) ressalta que os psicopatas possuem níveis variados de gravidade: leve, moderado e grave. Os primeiros dedicam-se pequenos delitos, mas não chegarão ao ponto de matar suas vítimas. Ao contrário dos últimos, que utilizando métodos cruéis, sentem enorme prazer em cometer atos brutais.

Conclui Silva:

Pesquisas tem constatado que a aparição precoce do comportamento antissocial (infância e adolescência) é um forte indicador de problemas transgressores e criminalidade no adulto. Vale ressaltar que o psicopata sempre vai revelar ausência de consciência genuína frente às demais pessoas: são incapazes de amar e nutrir o sentimento de empatia. Eles jamais deixarão de apresentar comportamentos antissociais; o que pode mudar é a forma de exercer suas atividades ilegais durante a vida (roubos, golpes, desvio de verba, estupro, sequestro, assassinato etc.). Em outras palavras, a maioria dos psicopatas não é expert numa atividade criminal especifica, mas sim "passeia" pelas mais diversas categorias de crimes, o que Hare denominava versatilidade criminal. (SILVA, 2010, p. 102)

Ainda, em conformidade com este entendimento, continua Silva:

A parte racional ou cógnita dos psicopatas é perfeita e íntegra, por isso sabem perfeitamente o que estão fazendo. Quanto aos sentimentos, porém, são absolutamente deficitários, pobres, ausentes de afeto e profundidade emocional. Assim concordo plenamente quando alguns autores dizem, de forma metafórica, que os psicopatas entendem a letra de uma canção, mas são incapazes de compreender a melodia. (SILVA, 2010 p. 20)

Porém, é importante salientar como mostra Silva (2010), que existem indivíduos que apresentam algumas características outrora citadas, e agem de forma transgressora, mas que não necessariamente são psicopatas, pois é preciso uma análise minuciosa de todos os sintomas e principalmente identificar a principal particularidade do psicopata, que é a incapacidade de sentir remorso, culpa ou qualquer tipo de empatia pelo outro.

Assim como também é possível que um indivíduo tenha o transtorno, mas não chegue ao extremo de cometer um crime de maior gravidade, como um homicídio. Já que o número de indivíduos portadores do transtorno é de apenas 1% (um por cento), e pelo fato de que para o indivíduo, não importa a natureza da ação, mas sim o seu objetivo final, uma vez que este é privado do sentimento de culpabilidade.

Sousa (2013) distingue a psicopatia em duas categorias: os passivos e os agressivos. Os passivos sãos esses indivíduos que não chegam a matar, mas também vivem de forma transgressora. Comentem crimes como estelionato, corrupção e enriquecimento ilícito. Estes também podem ser chamados de exploradores ou predadores sociais.

Quanto ao psicopata agressivo, são encontrados nesse indivíduo características sádicas e comportamento parafílicos, que são a parte do grupo dos psicopatas que chegam ao ápice de cometer um homicídio e que é o foco do presente trabalho.

Tendo um apanhado de características apresentadas sobre o transtorno da psicopatia, se torna mais próximo o entendimento de como esse indivíduo se encaixa na sociedade e da importância que é relacionar corretamente os seus sintomas para uma análise prudente, evitando assim um laudo pericial incorreto e que esse indivíduo volte a reincidir e fazer novas vítimas. 


O MODUS OPERANDI E ASSINATURA DO SERIAL KILLER PSICOPATA

Um psicopata pode ser agente em qualquer crime, de menor ou maior potencial ofensivo, e inclusive nunca chegar a praticar nenhum crime como ficou demonstrado anteriormente acerca de suas características. Porém o presente estudo pretende focar naqueles indivíduos diagnosticados como psicopatas que cometem crimes de maior gravidade, levando assim tanto ao direito criminal quanto também, carcerário, os questionamentos relacionados a sua eficácia para com esses casos.

Conforme estabeleceu Palomba (2003), os serial killers podem ser divididos em três espécies: os mentalmente normais, os doentes mentais e os fronteiriços. Os mentalmente normais são conhecidos como “assassinos de aluguel”. Matam como profissão, recebem por isso. Eles não apresentam nenhum tipo de enfermidade ou deformidade mental. O serial killer doente mental comete seus atos em razão da agressividade que existe em si mesmo. Geralmente são esquizofrênicos ou sofrem de surtos psicóticos. Já o fronteiriço é o serial killer que tem o transtorno da psicopatia. Sua doença não é mental, e sim, moral, demonstrando claramente a falta de senso ético e afetividade pelos seus semelhantes, sendo, entretanto, como já citado anteriormente sadio no que diz respeito às demais faculdades mentais.

Frisa-se, igualmente, pensamento de Mougenot:

Os serial killers podem ser psicóticos – estes, sim, doentes mentais, e não psicopatas. De qualquer sorte, é sabido que as características comuns aos psicopatas (déficit comportamental, impulsividade, agressividade, ausência de remorso, superficialidade das relações sociais etc.) facilitam o surgimento do serial killer, uma vez que a superação de outros crimes menores ou pequenos atos de sadismo, desde atos contra animais, na infância pode leva-los à busca do máximo prazer, que encontram nos crimes cometidos contra seres humanos. (MOUGENOT, 2004, p.76 )

De acordo com Morana (2004) O serial killer, que embora não necessariamente tenha o transtorno da psicopatia, a grande maioria foi diagnosticada como psicopata utilizando-se da tabela criada por Robert Hare como instrumento para se diagnosticar a psicopatia, a Hare Psychopathy Checklist (PCL). “[...] um estudo conduzido por Stone, 86,5% dos serial killers preenchiam os critérios de Hare para psicopatia, sendo que um adicional de 9% exibiu apenas alguns traços psicopáticos, mas não o suficiente para alcançar o nível de psicopatia”

Há uma contradição no que tange o conceito de assassinato em série, para que se possa considerar o indivíduo como um serial killer. O Manual de Classificação de Crimes do FBI (Federal Bureau of Investigation) (1992) o assassinato em série seria definido, como três ou mais eventos separados em três ou mais locais, distanciados por um hiato denominado “período de resfriamento emocional” entre os homicídios.

Na concepção de Casoy:

O primeiro obstáculo na definição de um serial killer é que algumas pessoas precisam ser mortas para que ele possa ser definido assim. Alguns estudiosos acreditam que cometer dois assassinatos já faz daquele assassino, um serial killer. Outros afirmam que o criminoso deve ter assassinado pelo menos quatro pessoas. (CASOY, 2004, p.16)

Alvarez (2004) traz que uma das definições mais atuais é a de Egger, Professor de Justiça Criminal da Universidade de Illinois, em Springfield, que em 1998 rebaixou o até então vigente número de três homicídios para dois.

Casoy (2002) define que o modus operandi de um psicopata é marcado pela criação de uma espécie de um “ritual” quando este comete um homicídio. Enquanto criminosos comuns agem almejando riqueza patrimoniais, vingança ou algum outro meio que justifique seus atos, os psicopatas apresentam manifesta e gratuita crueldade. Para que seja estudado o “modus operandi”, ainda segundo a aultora é necessário observar-se a arma, o tipo de vítima e o local escolhido para a realização do delito.

Rocha complementa:

O modus operandi é composto pelo planejamento do crime, pela escolha do local, o caminho traçado pelo criminoso para chegar até o local, a vigilância prévia da vítima e da cena do crime, armas ou utensílios utilizados no fato, a natureza das lesões, os métodos de matar, o local e a posição do corpo, os elementos, retirados e deixados na cena do crime, e o meio de transporte utilizado pelo assassino. (ROCHA, 2013, p. 20)

De acordo com O Manual de Classificação de Crimes do FBI (1992) um serial killer geralmente utiliza de três formas de “caçar” sua vítima. A primeira forma é a utilizada pelos “assassinos nômades”, que são aqueles que mudam de cidade e matam de acordo vão viajando; com a constante mudança de cidade, ou até Estado, dificultando o trabalho da polícia e com isso consegue seguir impune por muito tempo. Já os “assassinos territoriais”, que são os tipos mais comuns e conhecidos, até por uma questão de exposição midiática dos seus atos, estabelecem um limite de atuação, podendo ser uma cidade, bairro ou até mesmo um local especifico, como foi o caso de Francisco de Assis Pereira na revista Veja em 5 de agosto de 1998, que ficou conhecido como “Maníaco do Parque” por levar suas vítimas sempre para o mesmo local, um parque em local ermo em São Paulo. Um caso mais raro são o dos classificados como “assassinos estacionários”, que utilizam um único local para os homicídios, como sua casa, local de trabalho ou até mesmo em hotéis. O “modus operandi” pode ir se modificando com o aperfeiçoamento do psicopata ou pelo método de execução dos seus crimes. 

Innes (2010) traz em sua obra os estudos do Doutor Kim Rossmo, que elenca como o serial killer cerca e ataca sua vítima. Há o raptor, que ataca sua vítima praticamente no momento em que a encontra; o perseguidor, que segue e observa a vítima até o momento mais oportuno de ataca-la e predador, que atrai a vítima usando de algum pretexto a um local especifico, a executa e esconde seu corpo nesse mesmo local.

O serial killer deixa uma marca nos crimes que comete, chamada de assinatura, quase como um ritual. A autora traz como exemplos de assinaturas “quando o criminoso mantém a atividade sexual em uma ordem típica; usa repetidamente um específico tipo de amarração da vítima, dispõe o corpo de maneira peculiar e chocante, entre outras formas.” Casoy (2002, p. 48)

Segundo Freeman (2013), os serial killers podem ser classificados de acordo com seus padrões organizacionais e sociais, ou também de acordo com seu motivo. A classificação que tem por base o motivo é conhecida pela “Tipologia de Holmes”. Nesse método, o serial killer poderá ter seu foco no ato, que são os que matam de forma ágil e impetuosa; ou podem se centrar no processo, que são os que matam lentamente.   

Ainda dentro da classificação feita de acordo com o ato, Freeman (2013) esclarece que essa forma comporta subtipos: visionários e missionários. Os visionários são aqueles que matam motivados por vozes e alucinações, já os missionários, matam porque creem que um grupo especifico de pessoas deve ser exterminado. Afastando assim a possibilidade de estes terem o transtorno da psicopatia, já que como infra citado o psicopata não sofre de alucinações ou delírios.

Conforme explana Casoy (2004) o serial killer possui uma característica peculiar de humilhar suas vítimas e fazê-las sofrer, reforçando assim a ideia de que o criminoso psicopata tem sim o discernimento do que é degradante, colocando a vítima nessa situação para que ele se sinta bem. O prazer dele reside no ápice do constrangimento e desespero da sua vítima. Um exemplo desse comportamento é o serial killer abandonar o corpo de sua vítima nu.

Casoy (2004) também trata sobra a assinatura de um serial killer, que para ela se trata da soma de comportamentos identificados pelo modus operandi e pelo ritual. Em regra, é única e está ligada a necessidade do serial killer em cometer o crime, pois só matar, muitas vezes não traduz as fantasias do assassino em série

Para Silva (2010) a assinatura de um serial killer é para eles, uma forma de identificação, como se fosse a assinatura de um artista em sua obra de arte. Como exemplo é o caso de Alexandre Pichushkin, o “Assassino do Xadrez”, atuava na zona sul de Moscou, o ritual iniciava com a captura da vítima, logo após estrangulava-as com um cinto, e ao constatar a morte destas, com um martelo abria um buraco no crânio e colocava uma garrafa quebrada nele. Alexandre fez 46 vítimas, todas usando o mesmo modus operandi e ao final deixando sua marca.

Sendo assim, Silva (2010) define como o “modus operandi” a maneira que o criminoso comete o crime, já a assinatura é o que o criminoso faz como produto de seu desejo, sua realização e é imutável.


A MEDIDA DE SEGURANÇA APLICADA AOS SERIAL KILLERS PSICOPATAS

Consoante o entendimento do grande doutrinador Greco (2008), no momento em que há uma lesão a um bem tutelado pela norma jurídica, existe um fator típico e antijurídico que envolve a conduta do agente que, para o autor, “juízo de censura, de reprovabilidade que se faz sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo agente” (GRECO, 2008, p. 89).

A pena então é um meio do Estado exercer a jurisdição, conforme fomenta Prado:

Em síntese: a justificativa da pena envolve a prevenção geral e especial, bem como a reafirmação da ordem jurídica, sem exclusivismos. Não importa exatamente a ordem de sucessão ou de importância. O que se deve ficar patente é que a pena é uma necessidade social - última ratio legis, mas também indispensável para a real proteção de bens jurídicos, missão primordial do Direito Penal. De igual modo, deve ser a pena, sobre tudo em um Estado constitucional e democrático, sempre justa, inarredavelmente adstrita à culpabilidade (princípio e categoria dogmática) do autor do fato punível. (...) O que resta claramente evidenciado numa análise sobre a teoria da pena é que sua essência não pode ser reduzida a um único ponto de vista, com exclusão pura e simples dos outros, ou seja, seu fundamento contém realidade altamente complexa. (PRADO, 2005, p. 567)

Para Capez (2011) as sanções penais podem ser divididas em pena e medida de segurança. A pena é aquela imposta pelo Estado ao indivíduo, em virtude da prática de uma infração penal, por execução de uma sentença, havendo assim uma restrição ou privação de um bem jurídico, com a finalidade de aplicar a retribuição delitiva ao indivíduo, prevenir a reincidência e proporcional a ressocialização do transgressor.

Já a medida de segurança, para Capez (2011), é uma sanção penal imposta pelo Estado, na execução de uma sentença, onde existe uma intenção preventiva, pois visa evitar que o autor de uma infração penal, que seja considerado perigoso, volte a delinquir.

Simplificando, a diferença entre ambas está no atributo psicológico do sujeito que deve receber uma sanção penal. Quando o agente não consegue compreender a ilicitude do ato cometido, o Código Penal exclui a possibilidade de este sofrer as punições devidas, cabendo no caso aplicar a medida de segurança apesar do ato ser típico e antijurídico.

Capez conceitua a medida de segurança como “sanção penal imposta pelo Estado, na execução de uma sentença, cuja finalidade é exclusivamente preventiva no sentido de evitar que o autor de uma infração penal, que tenha demonstrado periculosidade volte a delinquir” (CAPEZ, 2004, p.400).

Corroborando com esse entendimento, Tourinho leciona:

Se para o agente falta discernimento ético para entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se com esse entendimento, o juiz proferirá sentença absolutória, com fulcro no art. 26 do Código Penal e art. 386, V do Código de Processo Penal, impondo-lhe, contudo, medida de segurança, tal como dispõe os arts. 97 do Código Penal, e art. 386, parágrafo único, III do Código de Processo Penal. (TOURINHO, 2003, p.58)

No entendimento de Jesus:

Enquanto a pena é retributiva-preventiva, tendendo atualmente a readaptar socialmente o delinquente, a Medida de Segurança possui natureza essencialmente preventiva, no sentido de evitar que um sujeito que praticou um crime e se mostra perigoso venha a cometer novas infrações penais. (JESUS, 2000, p.228)

No Código Penal brasileiro é complexo classificar o psicopata na imputabilidade ou na semi-imputabilidade.

Artigo 26 do Código Penal, in verbis:

Artigo 26 do CP – É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Parágrafo único – A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. (BRASIL, 1940)   

Capez (2011) pontua que a semi-imputabilidade é a diminuição da responsabilidade do indivíduo imputável em razão de perturbação psíquica. Verifica-se que, diferentemente dos inimputáveis a quem o Código Penal menciona a existência de doença mental, aos semi-imputáveis é reconhecida apenas uma perturbação da saúde mental.

Capez (2011) prossegue no entendimento em que a semi-imputabilidade possui o mesmo requisito da imputabilidade para sua aplicação, no entanto, a capacidade de entendimento da ilicitude do fato pelo agente é reduzida. Não obstante há a aplicação de pena com redução de 1/3 a 2/3 ou a imposição de medida de segurança de acordo com o melhor entendimento do magistrado.

Quanto a capacidade do discernimento da ilicitude da conduta, Palomba discorre:

A faculdade de entender (libertas judicii) baseia-se na possibilidade que o indivíduo tem de conhecer a natureza, as condições e consequências do ato. Implica no conhecimento da penalidade, da organização legal, das consequências sociais, e supõe um certo grau de experiência, de maturidade, de educação, de inteligência, de lucidez, de atenção, de orientação, de memória.

A faculdade de autodeterminar-se (libertas consilii) baseia-se na capacidade de escolher entre praticar ou não o ato, o que requer serenidade, reflexão e distância de qualquer condição patológica que possa escravizar a vontade do indivíduo, impulsionando-o para o ato. (PALOMBA, 2003, p. 198)

Como já mencionado anteriormente no presente trabalho, consoante especialistas da área psiquiátrica, o psicopata tem total discernimento do ilícito praticado, sabendo distinguir aquilo que é correto ou errado, não podendo, desta forma, e por este motivo, ser a ele deferida a absolvição imprópria em uma persecução penal.

“A personalidade psicopática não se inclui na categoria das moléstias mentais acarretadoras de irresponsabilidade do agente. Inscreve-se no elenco das perturbações de saúde mental, em sentido estrito, determinantes da redução da pena”. (TJMT – AP. Crim – Relator Des. Costa Lima – RT 462/409)

No mesmo sentido:

 “Personalidade psicopática não significa, necessariamente, que o agente sofra de moléstia mental, embora o coloque na região fronteiriça de transição entre o psiquismo normal e as psicoses funcionais” (TJSP – AP CRIM – Relator Des. Adriano Marrey RT 495/304).

Nucci (2014) assente com esse entendimento ao pautar que tais anomalias não excluem a culpabilidade, pois não afetam a inteligência, a razão, nem alteram a vontade do indivíduo.

Para a aplicação da medida de segurança é indispensável a existência de dois pressupostos, a prática de um fato definido como crime e a comprovação da periculosidade do sujeito ativo. Pela lei, presume periculosidade aos inimputáveis, conforme o Artigo 26 do Código Penal deverão obrigatoriamente ser submetido à medida de segurança. Já os semi- imputáveis, não é obrigatória, mas facultativa.

Para Ribeiro (1998), a periculosidade é a probabilidade de o indivíduo vir a delinquir novamente, colocando em risco a sociedade. Dessa forma, qualquer presunção de periculosidade é sempre reprovável, e deve ser aferida pessoalmente em cada caso.

Para a detecção da periculosidade do agente, para a efetivação da norma, é realizado o exame criminológico. Palomba explana sobre como deverá ser feita:

O exame será realizado por dois peritos oficiais. Tecnicamente é um parecer psiquiátrico forense, que só poderá ser elaborado por médicos com especialização na matéria, porquanto envolve elementos da Psiquiatria e do Direito. A dificuldade para formação do juízo de certeza do perito no caso de verificação de cessação de periculosidade é maior do que no parecer criminológico. (PALOMBA, 2003, p.212)

Verificando que o agente é de alta periculosidade, somente será posto em liberdade caso seja considerado apto, por laudo psiquiátrico fundamentado, no qual ateste a cessação de sua periculosidade, como preceitua Mirabete

Verificada a periculosidade do agente e a possibilidade de tratamento curativo, recomendável é a substituição da pena pela medida de segurança, ainda que em recurso da defesa. Substituída a pena pela medida de segurança, produzirá todos seus efeitos, passando o sentenciado, como inimputável, a submeter-se às regras previstas pelos arts. 96 a 99, inclusive quanto à medida de segurança e ao tempo mínimo para realização do exame pericial. (MIRABETE,2005 p.636)

Contudo no que concerne ao jus puniende estatal, não se pode virar as costas para o diploma constitucional, que traz em seu artigo 5º, XLVII que: “não haverá penas: [...] b- de caráter perpétuo” (BRASIL, 1988). No mesmo sentido o Código Penal Brasileiro, em seu artigo 75 preleciona: “O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 (trinta) anos” (BRASIL, 1940). Diante das passagens normativas expostas, fica compreendido que no Brasil é vedada a aplicação de penas que, de alguma forma, constituam caráter perpétuo.

MEDIDA DE SEGURANÇA – PROJEÇÃO NO TEMPO – LIMITE. A redação de alguns dispositivos quais sejam 75 e 97 do Código Penal e 183 da Lei de Execuções Penais devem ser rigorosamente aplicados, a fim de evitar que uma prisão se torne perpétua. Pois, nosso sistema penal admite que um condenado cumpra somente o máximo de trinta anos de prisão. (BRASIL, 2005)

Aguiar (2008) conclui, então, que a garantia constitucional à liberdade de um serial killer psicopata se sobrepõe a também garantia constitucional de segurança da coletividade, contrariando um princípio geral do direito, que é a primazia do interesse coletivo sobre o bem individual, já que é cientificamente comprovado que a psicopatia não tem cura.

Confirmando tal entendimento, Bonfim destaca:

É praticamente consenso na Psiquiatria mundial que os serial killers são irrecuperáveis. Faltando-lhes compaixão pelo “outro” e qualquer sentimento de remorso, são movidos unicamente por suas fantasias, que tornam-se a cada passo mais fortes e às quais eles não podem – ou não querem – resistir. Não existe tratamento eficaz para tais tipos criminosos, uma vez que suas personalidades assim estão formadas [...]. Quando presos, cada vez que conseguem enganar os psiquiatras que os avaliam e, assim, lograr obter a liberdade, tornam imediatamente a matar, tal como faziam ou, ainda, de forma mais elaborada e cruel. (BONFIM, 2004, p,92)

Sobre a eficácia da medida de segurança, Banha enfatiza:

Quanto à punição, simplesmente não assimilam os efeitos esta, podem ficar presos por 30 anos, todavia ao saírem vão voltar a cometer crimes. Outra característica muito interessante, advêm do fato deles conseguirem ludibriar os melhores profissionais da psicologia e da psiquiatria, mesmo que estes profissionais façam uso de testes como o “detector de mentiras” ou a Escala Hare porque aparentam ser pessoas normais, e inclusive chegam a fingir que estão ressocializados, entretanto em algum momento vão evidenciar que aquela situação é apenas passageira. (BANHA, 2008, s/p.)

Nucci (2005) entende que, apesar da medida de segurança ser uma forma de sanção penal, não se pode considera-la uma pena, asseverando que a interpretação da referida norma deve ser feita de uma forma restritiva e não de uma forma ampla que abranja as medidas de segurança como pena. Frisa, ainda, que o propósito deste instituto é o seu fim curativo e terapêutico, desta maneira, não deve ser concedida a liberdade do indivíduo submetido à internação antes que este esteja devidamente curado.

 Já para Zafforoni e Pierangeli, afirmam que o indivíduo submetido a medida de segurança deva permanecer internado até estar curado fere diretamente o direito fundamental previsto no art 5º, XLVII, b, da Constituição Federal, que declara expressamente não existir penas perpetuas no Brasil, e ressaltam ainda que:

Não é constitucionalmente aceitável que, a título de tratamento se estabeleça a possibilidade de uma privação de liberdade perpétua, como coerção penal. Se a lei não estabelece o limite máximo, é o intérprete quem tem a obrigação de fazê-lo. (ZAFFORONI; PIERANGELI, 1997. p.862) 

Costa (2008), entende que a solução para o problema da psicopatia estaria na criação de prisões destinadas a psicopatas, onde estes ficariam isolados dos presos comuns, de maneira que não poderiam controlá-los. Esta prisão deveria receber uma atenção especial do Estado, com uma equipe médica e psicológica para acompanhamento permanente.

Em meio a esse paradoxo, resta a opção da criação de novas políticas criminais e sociais voltadas especialmente para essa situação envolvendo homicidas psicopatas, como os serial killers. Buscando assim um equilíbrio entre manter a dignidade e não fazer da privação de liberdade deste um instrumento análogo a de uma prisão perpetua ou pena de morta, mas mantendo a sociedade a salvo das condutas desse indivíduo que não tem chances de cura total.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento do presente estudo abordou a figura do psicopata, buscando trazer à baila basicamente suas características e as possíveis origens de seu comportamento antissocial. Determinou-se, então, que a psicopatia é considerada um transtorno de personalidade, e não uma doença mental como, costumeiramente imagina a sociedade.

Diante disso, verificaram-se as características peculiares da personalidade do psicopata, demonstrando toda a sua insanidade consciente e distanciamento dos padrões morais da sociedade. Além disso, foi feito um breve estudo acerca do serial killer, também chamado de assassino em série, que são indivíduos portadores do grau mais elevado de psicopatia e que frequentemente são descobertos, e apesar de parecer uma realidade distante para a sociedade brasileira, vez ou outra um grande caso de assassinato violento aos moldes de um psicopata surge na mídia, como foi o caso do Francisco De Assis Pereira, o “maníaco do parque”.

 A grande questão nesse ponto é de que para que se tome conhecimento da existência desse tipo de individuo, é preciso que ele primeiro cometa o seu delito.  Assim, foram tratadas as implicações jurídicas decorrentes da condição peculiar da psicopatia. Foi analisada a culpabilidade do psicopata e a divergência doutrinária sobre essa questão, chegando a grande problemática que é qual seria a melhor solução no embate entre proteger a sociedade desses indivíduos que cientificamente falando, não podem ser curados, sem que os coloquem em uma situação análoga a de uma prisão perpetua, já que nosso ordenamento jurídico veda tal pratica.

A medida de segurança foi a maneira vista como a mais adequada para se encaixar esses criminosos, na falta de uma legislação especifica, já que a medida de segurança é facultativa no caso dos semi-imputáveis. A solução viável que se conclui após o estudo é de que é necessário que se implante mais efetivamente as formas de diagnóstico desses indivíduos,  além da necessidade de novas políticas públicas, a criação de uma legislação especifica para tratar dos psicopatas homicidas, centros de detenção especializados para abrigar esse tipo de criminoso, separando-o assim dos presos comuns e fazendo com que assim seja realizado um tratamento que pelo menos controle e estabilize essa condição, mantendo a segurança da sociedade sem retirar a dignidade do indivíduo preso.


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