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Crimes passionais.

Uma realidade contemporânea

Crimes passionais. Uma realidade contemporânea

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O presente estudo examina sobre o Crime Passional, cuja classificação doutrinal percebe ser aquele movido por sentimentos de violenta paixão e outros dela consequente, em que o indivíduo ativo afasta da pessoa amada o que esta tem de mais valioso, a vida

             
                                                              RESUMO

O presente estudo examina sobre o Crime Passional, cuja classificação doutrinal percebe ser aquele movido por sentimentos de violenta paixão e outros dela consequente, em que o indivíduo ativo afasta da pessoa amada o que esta tem de mais valioso, a vida. Em virtude disso, surge à vontade para compreender até onde vai um amor doentio, onde um ser humano que diz amar outro, em vez de defender-lhe a vida, faz o contrário, mata a pessoa que é o motivo de seu desejo. E para descrever sobre esse intrigante assunto, entram em cena os sentimentos que levam à prática desse crime e se este tem de fato relação com o amor, o ódio ou paixão, salientando que ódio e amor não são contrários, mas faces de uma mesma moeda. Faça a descrição das características desse homicida em potencial, além de outros fatores como o econômico que podem desencadear possíveis perigos em relações amorosas. Bem como o comportamento do homicida passional, sob os aspectos da Psicologia Jurídica e da Psicanálise. Também fazendo ressalva quanto ao significado e conteúdo da dignidade da pessoa humana na ordem Constitucional, sob a luz do Art. 1º, III da Constituição Federal, que coloca a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental. Por conseguinte aborda as estatísticas de homicídio de mulheres no Brasil e em Rio Branco, Estado do Acre.

Palavra – chave: Crime Passional, Perfil do Criminoso, Dignidade Humana, Psicanálise.

ABSTRACT

His study examines the Crime Passionate about whose classification doctrinal realizes that moved by feelings of violent passion and her other consequent on the individual asset away from the loved one that is most valuable in life. As a result, provokes the desire to understand how a human being who loves another, instead of defending his life, makes otherwise, kills the person who is the subject of your desire. And to describe about this intriguing subject, the feelings come into play that lead to the commission of that crime and whether it has in fact related to love, hate or passion, noting that hate and love are not opposites, but faces of the same coin. Write a description of that murderous potential, as well as other factors that can trigger the economic potential dangers in relationships. And homicidal behavior passionate, under the aspects of Forensic Psychology and Psychoanalysis. Also makes caveat as to the meaning and content of human dignity in order Constitution, in the light of Article 1, III of the Federal Constitution, which places human dignity as a fundamental principle. Therefore discusses the statistics of murder of women in Brazil and Rio Branco, Acre State.

Key - words: Passionate Crime, Criminal Profile, Human Dignity, Psychoanalysis.

1INTRODUÇÃO

Ainda hoje no Brasil existem muitos casos dos chamados crimes passionais.  Comportamentos Criminosos gerados pelo poderoso sentimento de paixão, sob o argumento de amor pela vítima que traiu a confiança do agente ou o repeliu. Uma mistura de paixão, ciúmes, posse.

Essas emoções podem ser tão pavorosas que induzem o indivíduo transtornado e cego ao desespero, indo ao limite de suas reações: tirando a vida do ente amado.

Em sua grande maioria os casos de crimes passionais são motivados contra mulheres por seus maridos, namorados, amantes, homens que não admitem a ideia de que não tem o controle sobre sua parceira e, para ter as rédeas da situação de novo, eles sentem necessidade de ensinar-lhes uma lição, por muitas vezes fatal.

Necessitando com urgência a restauração do seu orgulho ferido, de sua honra denegrida, por qualquer atitude desonesta do outro. O homicida passional é narcisista.

Não omitindo as mulheres ainda serem autoras de inúmeros casos, tem-se a necessidade de ressaltar que o machismo ainda domina no entendimento da sociedade. Onde alguns indivíduos ainda pensam que a mulher é mero objeto disponível para saciar as necessidades do homem e jamais contraria-lo. Pessoas assim são as capazes de matar, mesmo que jamais tenham transmitido tal pensamento.

Sendo assim, este trabalho acadêmico apresenta um estudo sobre o crime passional, especificamente o homicídio, analisando o perfil do agressor e a evolução do pensamento da sociedade em relação a este assunto.

Essa pesquisa teve como base principal o livro da Procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo Luiz Nagib Eluf, A paixão no banco dos réus, que defende uma visão pró-igualdade de gêneros e repúdio total ao homicida passional.

Entretanto, não há a pretensão de esgotar todas as possibilidades de abordagem que o tema deste trabalho permite, a intenção é não apenas cumprir mais um dos requisitos formais indispensáveis à conclusão do Curso, mas também aprofundar os conhecimentos construídos ao longo da graduação, uma vez que, hoje, a carreira jurídica requer constante reflexão e atualização.

1 CRIME PASSIONAL

  1. HISTÓRICO

Após séculos, a mulher pertencia, em primeiro ao seu pai, e após o casamento, ao esposo. Sendo que na antiga Roma, onde surgiu o direito, a mulher não era admitida como cidadã plena, onde seu esposo teria pleno direito para tomar decisões sobre a vida da esposa.

Com a chegada da Idade Média, o esposo tinha também lugar parecido, não podendo contrariar o senhor governante quando este tivesse interesse por sua esposa. No período da Idade Moderna, as ordens que tinha para bater na esposa, era ela mesma que dava por ser infiel ao seu esposo. Já no Brasil quando o esposo era desonrado pela esposa e ele não manifestasse nenhuma reação para castigá-lá, o Estado intervinha afim, de até mesmo condená-lá a pena de morte (KEPPE, 1991, p.114).

A Revolução Francesa desabrochou para novos valores. Com as novas leis era reservada a mulher o direito à vida, acabando com os tempos de violência física e moral. Chegando à Europa essa conquista após o ano de 1800, no Brasil, no ano de 1830, de forma que quando o esposo, companheiro ou amante que cometesse o crime de homicídio contra a esposa, companheira ou amante, em casos de crimes passionais, recebia pena que era delegada pelo Estado, com processo judicial, pelo crime ocorrido, mesmo que não houvesse lei específica. O termo legítima defesa da honra, só era usado nos casos de traição, nos casos do esposo desconfiar da esposa, por causa do ciúme ou quando acabava o relacionamento amoroso, provocando a fúria do homem. A admissão da legítima defesa da honra como a sua não aceitação vieram das inovações da sociedade, das mudanças que transformaram os valores e costumes.

No século XX o argumento da violenta emoção, que prevê o Código Penal, passou a ser inserido nos Tribunais do Júri. Onde, não era aceito pela defesa por se tratar de causa de diminuição ou atenuação da pena. Outro jeito seria buscar, a absolvição do réu, onde seria visto com todo respeito pela defesa, já sem alternativa.

1.2 CONCEITO

O crime passional está interligado a um amor violento, possessivo, a uma doença, que acomete a pessoa a um crime de homicídio. Vale lembrar, que a pessoa acredita ser possuidora de seu companheiro (a), ficando cada vez mais egoísta e violenta caso este não acate suas ordens.

Sendo o desejo de se vingar um dos motivos do crime, além do sentimento de posse. Ressalta a conduta passional como sendo a ação originada pela paixão patológica. Afirma Eluft (2009, p.111):

O crime passional é decorrente de uma paixão embasada no ódio, na possessividade, no ciúme desprezível, na vingança, no sentimento de frustração aliado à prepotência, na mistura de desejo sexual frustrado com rancor. O delito passional é de natureza psicológica, uma vez que a paixão desvairada transforma a mente humana.

Delinear crimes passionais como os crimes originados por mera provocação de emoções intensas, salientando a paixão, originada do amor.

Não se pode falar em crime por amor, sendo o amor um sentimento puro, verdadeiro, onde este sentimento terno visa só o bem querer da pessoa com quem se vive. O crime passional se alicerça na paixão, não se sabendo dizer ao certo se ele se origina do amor ou do ódio ou de ambos. Sendo um sentimento que faz nascer uma paixão cheia de ciúme, de possessividade, não aceitando o fim do relacionamento com a pessoa amada, dando origem a fúria e a mágoa.

Aonde este sentimento “paixão” vem transbordando do sentimento de posse, conjuntamente, com o ciúme, e quando o ciúme supera os limites do amor faz originar pensamentos perversos e insanos na mente de um criminoso, dito como o homicida passional.

1.3ELEMENTOS QUE DÃO ORIGEM AO CRIME PASSIONAL

1.3.1 Amor

O amor é a junção de vários sentimentos, tão puros como ele ou não, modificando em algo muito além, diversificado, insubstituível, grandioso, tendo o poder de ocasionar resultados desastrosos.

O amor carnal torna a pessoa amada como um negócio, um objeto de desejo, fazendo com que a pessoa se torne única e não admite em nenhum momento a separação. Onde no amor físico nota-se a presença de outro aspecto: o ódio, originado pelo medo da separação.

1.3.2 Ciúme

O ciúme passional é uma mistura de complexo de inferioridade com falta de maturidade afetiva, advindo do amor sexual, que leva a enormes erros, inclusive ao homicídio. Surge de uma expressão de egoísmo descomedida. Em resumo, o ciumento descompensado, faz da vida dele e da pessoa amada um inferno. Seguindo nessa linha de pensamento, o ciúme prejudica, desestrutura, despreza quem o sente, tendo como resumo um grande desespero, levando à loucura, agressão e, finalmente, ao acontecimento do crime passional. O ciumento é desconfiado, inseguro quanto ao fato de saber se a pessoa que tanto ama lhe trai ou não.

Conjuntamente ao ciúme está o descaso a indiferença e quando o passional os tem como determinantes, age de forma premeditada. Sendo que alguns, ao invés de cometerem o homicídio, suicidam-se diante da incapacidade de se defrontar com tal sentimento.

1.3.3 Paixão

A palavra passional tem sua origem ligada à paixão, onde confere aos homicídios gerados por paixão, a denominação de passionais.

Considerando a paixão como um sentimento de extensão do amor. O indivíduo tomado de paixão perde sua identidade pela fascinação que o outro exerce sobre ele. É um sentimento que causa dor, porque, a pessoa perde a sua autonomia, o seu poder, o domínio de seus atos, tornando-se sujeito da ideia fixa que nasce dentro dele, com isso cresce um sentimento que o toma, por completo, o controle de seu raciocínio. A pessoa torna-se sujeito de si mesmo, sentindo a pressão daquela ideia fixa e sem controle, onde comete atos ilícitos que podem levar a prejudicar, o seu objeto de desejo, por aquela ideia fixa e cega.

1.3.4 Honra

Honra é sentimento de dignidade própria que leva o indivíduo a procurar merecer e manter a consideração geral, dignidade.

Sendo que a honra que envolve o crime passional alicerça-se no comportamento da pessoa com quem se mantém relação amorosa e afetiva.

No crime passional, a honra está relacionada com o reconhecimento social e a autoestima da pessoa perante a sociedade, sendo que, se for manchada, a pessoa será capaz de cometer um crime passional para “lavar sua honra com sangue” e não ser motivo de piadas e fofocas.

A obra “A Paixão no Banco dos Réus” está dividida em três partes, das quais, na última, a autora Luiza Nagib Eluf (2009, p. 178) relata uma entrevista realizada com o criminalista Valdir Troncoso Peres, que expõe que a honra é imanente ao homem, e arrancá-la dele é o mesmo que matá-lo, assim, ele se sente no direito de matar por entender estar em legítima defesa. Informa, ainda, que, em todos os casos que ele defendeu o autor do delito, este sempre se achou no direito de matar por sua honra. Relata que nunca teve um homicida passional que se arrependesse.

Há uma forte presença, nesse tipo de delito, do egoísmo, pois aqueles que praticam o crime passional, o fazem por conveniências pessoais, por terem convicção de que, de algum modo, devem satisfazer a opinião alheia.

1.4 PERFIL DO CRIMINOSO PASSIONAL

O deliquente passional nunca se arrepende de seu ato. Onde em alguns casos, frente ao juiz se mostra arrependido, pensando em abrandar sua pena, certo da justiça dos juizes. Entretanto seus defensores nunca escondem a verdade, concordam no direito de matar. O executor do homicídio passional, nunca nega o delito. Entretanto em seu pensamento ele deduz que não adianta matar a mulher que cometeu a traição se a comunidade não ficar sabendo que sua honra foi preservada, isso é o que diz o próprio homicida. Portanto, o delinquente passional não tem o poder de conter seus sentimentos, o que faz dele uma pessoa com dificuldades em seus sentimentos e no discernimento de sua inteligência.

O criminoso passional é visto como um narcisista, onde o mesmo só pensa em si próprio, onde necessita ser admirado pelos outros e reconhecido por suas qualidades. Não podendo sentir-se desprezado, traído ou indesejado, quando isso ocorre reage com violência.

Geralmente, o delinquente passional não comete o crime de novo, não reincide, isso não ocorre devido ao seu senso moral, mas pela impossibilidade de se ver em situação semelhante e ser dominado tão intensamente pela paixão.

1.5  CRIMINOLOGIA

A criminologia conceitua-se, como objetivando o estudo do crime e do criminoso, sendo isso: criminalidade. A Criminologia busca o estudo do crime e dos criminosos, dentro de um jeito causal explicativo, informando seus elementos naturais.

Sendo o estudo das causas que levam ao crime e a violência em geral faz-se necessário para que se busque descobrir a culpa e imputabilidade do agente, da legítima defesa, do estado de necessidade.

A criminologia preocupa-se com o estudo analítico de delitos e delinquente, bem como do comportamento da vítima.

1.6 VITIMOLOGIA

Conceitua- se Vitimologia como sendo o estudo da vítima em seus diversos planos. Onde se estuda a vítima sob um aspecto maior e geral: psicológico, social, econômico, jurídico.

Entretanto para compreender o homicídio passional, é preciso também buscar entender a relação dos princípios existente entre homicida e vítima. Para alguns doutrinadores da Vitimologia, a vítima pode ajudar de várias maneiras para a concretização de um crime ou ocorrência de acidente para seu próprio prejuízo.

Vale lembrar que, é importante no homicídio passional a correlação entre a vítima e o vitimário, onde deve ser comparada com cuidado, de forma que a vítima muitas vezes não é amplamente impune no processo que desencadeia o crime por amor.

2 CRIMES PASSIONAIS NO BRASIL

Na história de todo o mundo, existem casos de crimes que de algum modo marcaram e para sempre serão lembrados. As histórias de homicídios passionais cometidos no Brasil são inúmeras e várias delas ainda povoam a memória de uma nação, até hoje comovida com tal brutalidade A cada duas horas, uma mulher é assassinada no Brasil, quase sempre pelo marido, namorado, ex-companheiro ou demais parentes. Os dados, extraídos do Atlas da Violência 2019, mostram ainda que 50% das vítimas têm entre 18 e 30 anos. Em 65% dos casos, os filhos assistem à agressão e 15% desses também são agredidos.

Falando de crime passional, mas especificamente de homicídio, a grande surpresa sempre é gerada na sociedade. Esse homicida, na maioria dos casos homem, se acha no primitivo direito de acabar com a vida do objeto de desejo por este ter lhe traído.

2.1 A VIOLÊNCIA NO BRASIL CONTRA MULHERES

Verificamos crescimento expressivo de 30,7% no número de homicídios de mulheres no país durante a década em análise (2007-2017), assim como no último ano da série, que registrou aumento de 6,3% em relação ao anterior. Entre 2007 e 2017 houve aumento de 20,7% na taxa nacional de homicídios de mulheres, quando a mesma passou de 3,9 para 4,7 mulheres assassinadas por grupo de 100 mil mulheres. Nesse período, houve crescimento da taxa em 17 Unidades da Federação. Já no recorte de 2012 a 2017, observamos aumento de 1,7% na taxa nacional e um aumento maior ainda de 5,4% no último ano, período em que se verificam taxas ascendentes em 17 UFs em relação a 2016. (ATLAS DA VIOLÊNCIA, 2019, p.35).

Considerando o período decenal, Rio Grande do Norte apresentou o maior crescimento, com variação de 214,4% entre 2007 e 2017, seguido por Ceará (176,9%) e Sergipe (107,0%). Já no ano de 2017, o estado de Roraima respondeu pela maior taxa com 10,6 mulheres vítimas de homicídio por grupo de 100 mil mulheres, índice mais de duas vezes superior à média nacional (4,7). A lista das unidades federativas onde houve mais violência letal contra as mulheres é seguida por Acre, com taxa de 8,3 para cada 100 mil mulheres, Rio Grande do Norte, também com taxa de 8,3, Ceará, com taxa de 8,1, Goiás, com taxa de 7,6, Pará e Espírito Santo com taxas de 7,5. Considerando-se as maiores diminuições decenais, Distrito Federal, Espírito Santo e São Paulo apresentaram as maiores reduções, entre 33,1% e 22,5%. O caso do Espírito Santo chama a atenção na medida em que até 2012, o Estado aparecia como campeão na taxa de homicídios femininos no país. Embora tenha apresentado crescimento entre 2016 e 2017, parece ter havido uma redução consistente da violência letal contra as mulheres no Estado, provavelmente reflexo das diversas políticas públicas implementadas pelo governo no período e que priorizaram a o enfrentamento da violência baseada em gênero. Já no ano de 2017, o Estado de São Paulo responde pela menor taxa de homicídios femininos, 2,2 por 100 mil mulheres, seguido pelo Distrito Federal (2,9), Santa Catarina (3,1) e Piauí (3,2), e ainda Maranhão (3,6) e Minas Gerais (3,7). Em termos de variação, reduções superiores a 10% ocorreram em seis Unidades da Federação, a saber: Distrito Federal, com redução de 29,7% na taxa; Mato Grosso do Sul, com redução de 24,6%; Maranhão com 20,7%; Paraíba com 18,3%, Tocantins com 16,6% e Mato Grosso com 12,6%. Índices de homicídio de mulheres; e ainda os indicadores quanto aos casos que ocorreram dentro das residências e aqueles em que foram utilizadas armas de fogo. Observamos um pequeno aumento na taxa de homicídio de mulheres (1,7%), entre 2012 e 2017(ATLAS DA VIOLÊNCIA, 2019, p.35).

 Porém, quando desagregamos esse indicador entre os homicídios que ocorreram fora e dentro da residência, verificamos dois comportamentos distintos. Ao mesmo tempo em que a taxa de homicídios fora da residência diminuiu 3,3% no período, o segundo indicador aumentou 17,1%. Possivelmente, a redução de homicídios de mulheres fora da residência esteja refletindo a diminuição gradativa da violência geral que tem se expandido cada vez mais para um maior número de unidades federativas. Por outro lado, o crescimento dos casos que ocorrem dentro das residências deve ser reflexo do aumento de casos de crime passionais, efetivamente. Note-se ainda que o crescimento mais acentuado nos últimos dez anos tem sido na taxa homicídios dentro das residências, com o uso da arma de fogo, que cresceu 29,8%.porém,  na violência contra a mulher, o que pode ser dado indicativo de maior incidência de violência passional (ATLAS DA VIOLÊNCIA, 2019, p.36).

As maiores taxas de vitimização de mulheres concentra-se na faixa dos 15 aos 29 anos de idade, com preponderância para o intervalo de 20 a 29 anos, que é o que mais cresceu na década analisada. Por sua vez, nas idades acima dos 30 anos a tendência foi de queda (ATLAS DA VIOLÊNCIA, 2019, p.36).

Quando desagregamos o local de ocorrência das mortes segundo o estado civil da vítima, surge uma realidade mais chocante ainda. Trata-se de contextos distintos, que mostram que a maioriadas mulheres solteiras morrem em espaços públicos (32%), e apenas 24% morrem em seus domicílios (ATLAS DA VIOLÊNCIA, 2019, p.35).

Esses dados também mostram que a porção mais vulnerável da população feminina é aquela composta por mulheres jovens, pardas, com pouca escolaridade e solteiras.

Os casos de crimes envolvendo relacionamentos amorosos que resultaram em mortes impressionam a população. No Brasil, alguns casos de homicídios passionais ganharam maior notoriedade, dentre eles o do famoso escritor Euclides da Cunha e o de Elize Matsunaga, esposa do empresário Marcos Matsunaga, da Yoki crime ocorrido em 19 de maio de 2012.

2.2  HOMICÍDIOS NO ESTADO DO ACRE

2.2.1 DADOS ESTATÍSTICOS DA VIOLÊNCIA CONTRA MULHER EM RIO BRANCO/ACRE

No ano de 2005, iniciou-se em Rio Branco uma articulação para estruturação de uma rede de atendimento às mulheres vítimas de violência, em atenção ao que orienta a Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres para as Mulheres, construída pela Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, vinculada à Presidência da República. Nela fica estabelecida a atuação articulada entre instituições/serviços governamentais, não governamentais e comunidade, visando à ampliação e a melhoria da qualidade do atendimento; à identificação e encaminhamento adequado das mulheres em situação de violência; e o desenvolvimento de estratégias efetivas de prevenção. A constituição da rede de atendimento busca dar conta da complexidade da violência contra as mulheres e do caráter multidimensional do problema, que perpassa áreas, tais como: saúde, educação, segurança pública, assistência social, cultura, entre outras.

Conforme Atlas da Violência 2019, o Acre aparece na 4ª posição entre os Estados Brasileiros em relação à taxa de homicídios, com 8,1 mulheres assassinadas para cada 100 mil mulheres habitantes. A taxa média nacional foi de 4,6. Já capital Rio Branco ocupa a 3ª posição entre as capitais brasileiras

Conforme estudo do Analista Criminal da Secretaria de Estado de Segurança Pública do Acre Aldo Colombo (2011), a partir de setembro de 2006, quando entra em vigor a Lei Maria da Penha, houve uma redução do número de registros de violência contra a mulher em relação aos meses que antecederam a sua vigência, contudo não há estudos que descrevam melhor os impactos da lei na variação desses registros.

Nos primeiros seis meses do ano de 2019, a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM) instaurou 1.038 mil inquéritos de violência contra a mulher em Rio Branco. O dado é 14% maior do número registrado no mesmo período em 2018, que foi 910 processos. Ainda segundo os dados, os ex-maridos e ex-companheiros lideram o ranking de agressores. Em seguida aparecem os atuais companheiros ou maridos. São registradas ao dia pelo menos 5 ocorrências de violência contra a mulher. A maioria dos casos envolve o companheiro da vítima. São 150 casos na capital Rio Branco por mês.

Os homicídios contra mulheres em Rio Branco são expressivos para o conjunto do Estado. No período de 2007 a 2011, o município foi responsável por 50% dos casos registrados no Acre.

A Secretaria de Estado de Segurança Pública do Estado do Acre realizou em 2011 no município de Rio Branco, uma pesquisa de percepção de segurança e satisfação da população quanto aos serviços prestados pelos órgãos de segurança pública. A pesquisa foi realizada nos meses de julho e agosto, em 248 setores censitários, conforme a divisão do IBGE, entrevistando pessoas acima de 15 anos em 1.948 domicílios. Quanto à vitimização, 12% das mulheres entrevistadas declararam ter sofrido algum tipo de violência nos últimos 12 meses anteriores à pesquisa.

Ao se desvendar as multidimensões da violência de gênero praticada contra as mulheres, é imperativo que o Estado do Acre também adote uma abordagem multisetorial, atuando de forma conjunta, seja na prevenção, repressão, assistência e garantia de direitos, envolvendo as áreas de saúde, educação, assistência social, segurança pública e justiça, inclusão social dentre outros, para dar cabo à garantia e integridade do atendimento à mulher. Para isso, é necessário que medida de interfaces entre as ações desenvolvidas pelos diversos órgãos voltados para os direitos das Mulheres.

2.2.2 CRIMES PASSIONAIS QUE CHOCARAM A POPULAÇÃO DE RIO BRANCO/ACRE

Geralmente a raiz do crime está em uma não correspondência amorosa por parte de vítima. Sentimentos de posse e de honra ferida, ciúme doentio, desequilíbrio emocional, e ódio perpassam todos os crimes desse tipo. Alguns casos merecem destaque, devido à sua repercussão como esses dois (2) que ocorreram no ano de 2010 em Rio Branco.

2.2.2.1 keyla Viviane dos Santos

Em Rio Branco, em março de 2016 a vendedora Keyla Viviane dos Santos foi morta com duas facadas, uma no peito e outra na virilha, pelo ex-marido, Adjunior Sena, de 32 anos, em frente à loja em que trabalhava uma câmera de segurança do estabelecimento flagrou toda a ação. Em junho de 2016, a Justiça do Acre condenou o ex-marido da vendedora a 27 anos e 6 meses de prisão pelo crime (G1 ACRE, 2018).

2.2.2.2 Antonia Lima Ferreira

A acreana Antônia Lima Ferreira, de 39 anos, não entrou para as estatísticas de homícidios de mulheres no Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mas sofreu com a violência. A mulher foi esfaqueada 18 vezes pelo ex-marido, José Alberto Soares Pinheiro, de 46 anos, quando chegava para trabalhar. O motivo é que ele não aceitava o fim do relacionamento. O crime ocorreu no dia 18 de março de 2017. No mês de agosto de 2018, Antônia relatou que conviveu com o ex por dez anos e pensou que não sobreviveria aos golpes, à mesma teve o pulmão perfurado e foi afastada do trabalho como camareira porque as facadas deixaram o braço direito paralisado, o ex- marido encontra-se preso e o processo continuam na Vara Criminal do município de Rio Branco aguardando audiência. (G1 ACRE, 2018).

Os chamados crimes passionais são um enigma para a coletividade, quando se tenta entender como uma pessoa que dizia amar elimina a vida do ser amado.

2.2.2.3 Guiomar Rodrigues

 Guiomar Rodrigues, de 34 anos, trabalhava em uma panificadora em Rio Branco e foi achada morta por estrangulamento, em dezembro de 2018, em uma área de mata, Ela não queria mais o relacionamento. O principal suspeito do crime é o sargento da Polícia Militar do Acre da reserva José Eronilson Brandão, de 51 anos, com quem ela tinha um relacionamento extraconjugal. O crime teria sido motivado, segundo a polícia, porque a vítima descobriu que estava grávida e não queria mais o relacionamento. O agressor está preso em Rio Branco e nega o crime. (G1 ACRE, 2019).

CONCLUSÃO

O presente estudo buscou mostrar aspectos referentes ao crime passional. Não existiu a pretensão de se estabelecer novos conceitos e exemplos que fossem seguidos por toda a sociedade, mas sim, procurou-se mostrar de forma simplificada, que o crime passional é uma herança perpetuada durante gerações, mas que hoje vem sendo posicionado de forma diferente das épocas passadas.

Não se mata por amor. O homicida sempre age impulsionado por ódio, vingança, possessividade e egocentrismo. Frise-se que os homicidas passionais trazem consigo um histórico arraigado de problemas de toda ordem, não são movidos por sentimentos momentâneos. Na concepção do passional, a única vítima é ele próprio, que teve sua moral e honra feridas pela conduta de seu parceiro.

 Conclui-se que o homicídio passional apenas e tão somente será extirpado quando o patriarcalismo for de uma vez por todas enterrado e as pessoas, enfim, consigam construir relações afetivo-sexuais igualitárias.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres: de Pontes Visgueiro a Pimenta Neves. São Paulo: Saraiva, 2009.

IPEA. Atlas da Violência 2019. Atualização dos Homicídios de Mulheres no Brasil. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/relatorio_institucional/190605_atlas_da_violencia_2019.pdf .Acesso em: 01 de out. 2019.

PORTAL G1 ACRE. No Acre 34 mulheres foram mortas e Estado tem uma das maiores taxas do País. Disponível em: https://g1.globo.com/ac/acre/noticia/2018/08/13/no-ac-34-mulheres-foram-mortas-em-2017-e-estado-tem-uma-das-maiores-taxas-do-pais-aponta-pesquisa.ghtml. Acesso em: 02 out.2019.

PORTAL G1 ACRE. O Acre foi o Estado com maior taxa de Feminicídio do País em 2018. Disponível em: https://g1.globo.com/ac/acre/noticia/2019/03/08/acre-foi-o-estado-com-a-maior-taxa-de-feminicidio-do-pais-em-2018.ghtml Acesso em: 03 out.2019.



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