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Aspectos dogmáticos da(s) teoria(s) da imputação objetiva

Aspectos dogmáticos da(s) teoria(s) da imputação objetiva

Publicado em . Elaborado em .

Definir é limitar.

Oscar Wilde


LISTA DE SIGLAS

TACrSP- Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo

TJSP- Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

TJRJ- Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro


RESUMO

A partir da década de 70, o Direito Penal tem passado por uma verdadeira revolução com a introdução da(s) Teoria(s) da Imputação Objetiva. Essa nova dogmática busca soluções para problemas no âmbito da relação de causalidade entre ação e resultado.

Como são vários os caminhos metodológicos buscados pelos seguidores há a dificuldade de uma "padronização" desta teoria, ou seja, uma imputação objetiva comum a todos os estudiosos e, exatamente por isso, essa nova tendência jurídico-penal continua a ser desenvolvida, principalmente na Alemanha.

A construção desse sistema, denominado funcionalista, acabou tornando-se um renascimento de conceitos neokantianos, os quais Hans Welzel havia rejeitado. Dentro desse contexto, o objeto do presente estudo consiste em analisar, sempre de forma crítica e valorativa, a visão de dois renomados juristas alemães acerca do tema, Claus Roxin e Günther Jakobs, além de apresentar a possível aplicação dessa teoria dentro do ordenamento jurídico nacional para buscar um sistema penal mais justo.


INTRODUÇÃO

O Direito Penal, assim como as demais áreas jurídicas, necessita se adaptar a um novo contexto: o da sociedade do novo século. Nesse panorama globalizado, novas vertentes apresentam-se com soluções para problemas ainda discutíveis dentro da seara jurídico-penal.

Uma dessas vertentes, a qual a doutrina brasileira começa a discutir com mais habitualidade, é a(s) Teoria(s) da Imputação Objetiva.

Vista de forma cautelosa por juristas já acostumados ao finalismo, proposto por Hans Welzel, ou até mesmo de forma a deturpar o pensamento dos autores alemães responsáveis pelo desenvolvimento de tais teorias, essa nova dogmática ainda encontra barreiras para uma possível aplicação no país.

O presente trabalho tem por finalidade apresentar de forma didática e valorativa aspectos importantes dessa tendência e demonstrar através de exemplos e até mesmo de uma jurisprudência que, em certos casos, o ordenamento jurídico nacional já pode acolher algumas nuances dessa(s) Teoria(s).

Iniciar-se-á procurando apresentar brevemente as idéias dos três mais aclamados doutrinadores alemães da atualidade: Hans Heinrich Jescheck, Claus Roxin e Günther Jakobs.

Em seguida far-se-á uma curta apresentação aos aspectos mais importantes da teoria do delito (inclusive apresentando um excursus sobre o Causalismo e o Finalismo).

O objeto de estudo do terceiro capítulo deste trabalho é o nexo de causalidade já que a(s) Teoria(s) da Imputação Objetiva procura(m) remediar aspectos nos quais as teorias da conditio sine qua non, da causalidade adequada e da adequação social restaram insuficientes.

Todos os critérios de imputação propostos por Claus Roxin e Günther Jakobs serão discutidos criteriosamente nos capítulos seguintes da presente pesquisa, para, depois de lançadas as principais contribuições dos dois autores, podermos verificar a possibilidade de aplicação dessas idéias no ordenamento jurídico brasileiro, como já citado anteriormente.


1 A DOGMÁTICA PENAL ATUAL

Dizer que a Imputação Objetiva operou uma grande mudança de pensamento na Teoria do Tipo [01] não é novidade em países europeus tais como a Alemanha. As idéias contidas sob esta ótica denominam-se correntes funcionalistas.

O nome, teoria funcional, vem do preceito que a dogmática e a técnica jurídica cedem espaço para os fins superiores do Direito Penal e sua função de regular os comportamentos sociais.

No Brasil, porém, esse é um assunto relativamente novo e, por isso, desconhecido da maior parte dos estudantes, os quais, durante a faculdade, são apresentados ao Finalismo como um sistema irretocável.

A discussão acerca do tema, que está em evidência na ciência penal alemã, ainda não está concluída,pois não há uma uniformização dos vários aspectos dessa tendência, que teve sua gênese na década de 1920 com as formulações propostas por Karl Larenz e Richard Honig.

O chamado Funcionalismo apresenta-se em diferentes concepções. Analisaremos aqui as idéias propostas por dois dos autores mais significativos desse movimento, Claus Roxin e Günther Jakobs.

A proposta deste trabalho é apresentar essa que é uma das atuais vertentes do direito penal alemão flertando com a possibilidade de aplicação de suas idéias dentro do ordenamento jurídico nacional face à discussão em torno do nexo de causalidade e do Art. 13 do Código Penal. Inicialmente apresentaremos generalidades sobre a teoria do delito e analisaremos as teorias acerca do nexo de causalidade para então, depois de semeada a idéia do seu âmbito de aplicação, de maneira criteriosa, estudarmos a(s) chamada(s) Teoria(s) da Imputação Objetiva.

1.1.O PÓS-FINALISMO (AS TENDÊNCIAS ATUAIS DO DIREITO PENAL)

Foi após a segunda grande guerra que o finalismo se impôs na Alemanha encerrando o conflito doutrinário com a dogmática causalista, a partir de então superada.

Nessa conjuntura do pós-guerra a produção científica alemã apresentou várias opiniões que hoje orientam o Direito Penal. Constatam-se diversas correntes na dogmática jurídica-penal ou, em outras palavras, pode-se dizer que "o direito penal encontra-se tomado por correntes ecléticas". [02]

Procurar-se-á introduzir os principais preceitos das três correntes de maior influência, hoje, na dogmática penal alemã.

1.1.1 Hans-Heinrich Jescheck

Hans-Heinrich Jescheck apresenta uma das correntes de pensamento que atualmente influencia o ordenamento jurídico nacional: o conceito social de ação. [03]

Do seu ponto de vista não se pode limitar o Direito Penal a poucos enunciados fundamentais, propondo uma dogmática jurídico-penal teórica e prática.

O conceito social de ação do autor "abrange todas as formas de comportamento humano que podem ser levadas em conta num juízo de imputação penal. A via negativa, por outro lado, determina a irrelevância de alguns comportamentos para esta mesma imputação jurídico-penal". [04]

Segundo Eugenio Raúl Zaffaroni, o pensamento de Hans-Heinrich Jescheck (seguido por outros atores tais quais Wessels, Lackner, etc.) trata-se de um funcionalismo limitado e consiste em uma volta para o neokantismo. Para Claus Roxin trata-se de uma "síntese neoclássica-finalista". [05]

Em resumo, para Hans-Heinrich Jescheck a dogmática deve ser acompanhada de outras disciplinas, como a Filosofia do Direito e o Direito Penal Comparado, possibilitando uma melhor compreensão desse sistema.

1.1.2 Claus Roxin (Política Criminal – Teleologismo e Funcionalismo)

O sistema teleológico funcional proposto por Claus Roxin nasceu em 1970 como uma oposição aos conceitos finalistas. É um sistema funcional (ou racional) "baseado na política criminal da moderna teoria dos fins da pena". [06]

A principal característica desse sistema é a teoria da imputação situada no tipo objetivo. O doutrinador sustenta que o problema dos sistemas anteriores é restringir o tipo objetivo à causalidade e propõe sua substituição pela criação e realização de um risco não permitido abrangido pelo âmbito de proteção da norma de cuidado. [07]

1.1.3 Günther Jakobs (Normativismo Funcional)

Citado como o penúltimo discípulo de Hans Welzel, [08] Günther Jakobs propõe um novo panorama, o qual não se limita à união dos conceitos de adequação social com os de risco permitido e o do princípio da confiança.

O autor rejeita a dogmática ontológica proposta pelo finalismo welzelniano e "propõe soluções em sentido contrário, ou seja, a normativização de toda a dogmática". [09] Dessa maneira o autor afasta os conceitos pré-jurídicos de causalidade, poder, capacidade culpabilidade e outros para vinculá-los à verdadeira função do Direito Penal, qual seja, "prevenção-integração, onde a violação de uma norma é disfuncional ao sistema, não porque cause dano a um bem jurídico, mas porque contradiz o modelo de orientação da norma". [10]

A dogmática funcionalista de Claus Roxin e Günther Jakobs recebe várias críticas, propostas principalmente, por adeptos do chamado finalismo ortodoxo, dentre os quais podemos citar o mais influente deles, Hans-Joachim Hirsch, seguidor incondicional do pensamento finalista de Hans Welzel. [11]

Citado autor assevera que as teses funcionalistas são um retrocesso e que o correto é apoiar-se em dados da realidade ôntica como propunha Hans Welzel.

As diferentes tendências da dogmática funcionalista certamente irão convergir para um ponto uniforme, olhos postos na necessidade de construção de um novo sistema jurídico-penal que acompanhe as transformações sociais. Enquanto isso não ocorre nos resta analisar, sempre de forma crítica, o pensamento dos dois maiores representantes desta nova teoria e buscar soluções para a possível aplicação em âmbito nacional.


2. APRESENTAÇÃO À TEORIA DO DELITO

2.1 CONCEPÇÕES BIPARTIDA E TRIPARTIDA DAS INFRAÇÕES PENAIS

Há duas concepções quanto à classificação das infrações penais. A primeira é a concepção tripartida que classifica as infrações penais em crimes, delitos e contravenções. Esse sistema é adotado em países como França, Inglaterra e Grécia.

Na segunda concepção, a divisão bipartida, não há distinção entre crimes e delitos. Aqui eles são tratados como sinônimos, separando-os das contravenções penais. Esse é o sistema adotado pelo nosso ordenamento jurídico, além do italiano, dinamarquês e outros.

Não há diferença de natureza das infrações penais, residindo sua distinção apenas na sanção cominada.

O art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal assim discorre:

Art.1º. Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente. [12]

2.2 CONCEITOS DE DELITO

2.2.1 Formal

É a contradição entre fato e uma norma penal incriminadora. É toda a ação ou omissão que viola a norma penal e tem por conseqüência uma pena. Em outras palavras, "crime é toda ação ou omissão proibida pela lei sob ameaça de pena". [13]

2.2.2 Material

É toda ação ou omissão que lesa ou expõe a perigo bens juridicamente tutelados. É a violação de um bem penalmente protegido. [14] O conceito material indica a lesão do bem jurídico, ou seja, a gravidade do dano social produzido pelo fato punível. [15]

2.3 TEORIA DO DELITO

2.3.1 Conceito

Eugenio Raúl Zaffaroni conceitua a Teoria do Delito como "a parte da ciência do direito penal que se ocupa de explicar o que é o delito em geral, isto é, quais são as características que deve ter qualquer delito". [16]

2.3.2 Estratificação

O terceiro conceito de delito é o analítico ou estratificado, o qual traz referência aos elementos que o compõem. [17] Delito é toda conduta humana típica, antijurídica e culpável. [18] Essa é a definição adotada por Aníbal Bruno, Magalhães Noronha, Heleno Fragoso, Wessels entre outros. Poucos autores ainda colocam como quarto elemento a punibilidade.

Não existem delitos que não sejam condutas humanas. Porém não é qualquer conduta humana que se classifica como delito. É necessário que a conduta esteja tipificada em algum artigo do Código Penal em sua Parte Especial (ex: matar alguém – art. 121), ou ainda em leis especiais que prevêem tipos penais. Há a descrição de quais são as condutas proibidas pelo ordenamento jurídico e a elas associa-se uma pena.

Além de típica, a conduta deve ser contrária ao ordenamento jurídico, isto é, não é permitida. Esse conceito de antijuridicidade surge pelo fato de existirem condutas típicas que não são contrárias às normas. São elas, as hipóteses descritas no art. 23 do Código Penal Nacional:

Art. 23. Não há crime quando o agente pratica o fato:

I – em estado de necessidade;

II – em legítima defesa;

III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. [19]

A conduta típica e antijurídica denomina-se injusto penal. [20] Logo, conclui-se que o delito é o injusto culpável sendo a culpabilidade a reprovabilidade do injusto.

2.4. EXCURSUS SOBRE O CAUSALISMO E O FINALISMO

2.4.1 Teoria Causalista

A teoria causalista divide-se em dois momentos distintos. O primeiro é o proposto por Von Liszt e Ernest Von Beling e se denominou sistema clássico. [21]

Ainda dentro do causalismo tem-se uma pequena evolução com a introdução de um sistema denominado neoclássico. [22]

a) Von Liszt e Ernest Von Beling – Sistema Clássico

Ihering, no final do século XIX, foi o primeiro a perceber que existiam condutas antijurídicas não culpáveis. [23] Desta maneira, chegava-se à conclusão de que existem condutas contrárias ao ordenamento mas que mesmo assim são permitidas.

Foi com o advento dessa concepção que se fez a distinção entre elementos externos da ação (injusto objetivo) e elementos internos (culpabilidade – relação psicológica entre ação e o autor).

No início do século XX, Von Liszt definiu o delito como a conduta antijurídica, culpável e punível. [24] Ele manteve a separação Objetivo-subjetiva do delito, mas para ele o injusto era composto apenas pela antijuridicidade.

Em 1906, Ernest Von Beling enunciou a sua teoria e, mesmo sem fugir do sistema objetivo-subjetivo, distinguiu, dentro do injusto, a tipicidade da antijuridicidade. Para o doutrinador o tipo tinha a função de descrever objetivamente as condutas.

Talvez a maior contribuição da teoria causalista tenha sido a introdução do tipo no conceito de crime, pois aqui o delito já passava a ser concebido como a conduta típica, antijurídica e culpável, porém de uma forma diferente da concebida hoje.

A culpabilidade, aqui, era entendida como o vínculo psicológico que ligava a conduta ao resultado, em forma de dolo ou culpa e, por isso, essa teoria ficou conhecida como teoria psicológica da culpabilidade e, posteriormente, como sistema clássico.

A base filosófica do sistema Liszt-Beling era a do positivismo mecanicista: ação era o movimento corporal voluntário capaz de causar uma modificação no mundo exterior. [25] Aqui a vontade é separada de seu conteúdo, isto é, a ação é concebida como uma enervação muscular. Nesse sentido, Eugenio Raúl Zaffaroni nos traz a seguinte explicação:

[...] De acordo com este conceito, haveria uma "ação" homicida se um sujeito disparasse sobre outro com vontade de pressionar o gatilho, sem que fosse necessário levar em conta a finalidade a que se propunha fazê-lo, porque essa finalidade não pertencia à conduta [...] [26]

b) Sistema Neoclássico

A principal característica do sistema neoclássico é a quebra do esquema "objetivo-subjetivo".

Aqui a culpabilidade deixa de ser a relação psicológica entre o agente e o fato e passa a ser um juízo de censura ou reprovação pessoal, com base em elementos psico-normativos. Daí as definições: teoria normativa ou teoria psicológico-normativa. Agrega-se aos elementos subjetivos, que eram tidos como espécies de culpabilidade, outros, de natureza normativa.

Começou a abandonar-se o esquema "objetivo-subjetivo" que vinha do Iluminismo e voltou-se os olhos para o esquema estrutural sustentado por Aristóteles. Do aristotelismo tomou Frank, em 1907, um "novo" conceito de culpabilidade: a culpabilidade contém a relação psicológica nos casos em que esta existe, mas não é uma relação psicológica, e sim que, em sua essência, é reprovabilidade. [27]

A culpabilidade para a teoria normativa ficaria com os seguintes elementos: imputabilidade, dolo e/ou culpa e exigibilidade de conduta diversa.

Para que o agente possa ser punido pelo fato ilícito cometido não basta a presença dos elementos subjetivos (dolo ou culpa), mas se nas condições em que ele se encontrava era possível exigir-lhe uma conduta conforme o direito. [28]

O esquema de Frank não rompeu totalmente com o psicologismo. Na verdade esse esquema serviu mais como uma ponte entre o normativismo e o psicologismo.

Em 1910, com a descoberta de elementos anímicos, [29] houve uma introdução de elementos subjetivos ("elementos subjetivos do injusto") no tipo.

2.4.2 Teoria Finalista

No final da década de 1920 e início dos anos 30 começam as discussões no sentido de que a relação psicológica (dolo e culpa) não poderia estar contida na culpabilidade. Era necessário transformar a culpabilidade em reprovabilidade pura. [30]

Hellmuth von Weber, em 1929, começou a construção do que se chama a concepção complexa do tipo penal. [31] Porém ele não fazia a distinção entre tipicidade e justificação e retomou uma divisão bipartida do delito: tipo de injusto e culpabilidade.

Foi mais precisamente em 1931 quando Hans Welzel publicou, na Revista da Ciência Penal Conjunta nº 51, um artigo chamado "Causalidade e Ação" que nasceu a teoria da ação finalista. [32] Ele foi o responsável pelo aperfeiçoamento da teoria do tipo complexo (objetivo-subjetivo).

Conforme essa teoria pessoal do ilícito, a qual veio substituir o conceito causal até aquele momento predominante, o dolo e a culpa já não eram mais forma ou elementos da culpabilidade. [33]

Totalmente voltado ao esquema aristotélico, Hans Welzel afirmou que "a ação é o exercício de uma atividade final". [34] A teoria finalista quebrou todos os vínculos com a perspectiva neokantiana que separa o mundo do ser (ontológico) do dever ser (axiológico).

Nas palavras de Enrico Ferri, para que haja crime:

[...] é necessária uma ação do homem, que, no ambiente social, modifique, ofenda, viole as relações exteriores do homem para homem. Na realidade da vida, para que um homem cometa um crime, é preciso, antes de tudo, que tenha a idéia e delibere realizá-la [...] [35]

O conceito de ação elaborado por Hans Welzel inspirou-se na teoria da ação desenvolvida por Samuel Pufendorf (que será vista em tópico próprio), e foi a partir desse conceito que ele desenvolveu a teoria do ilícito pessoal. Logo, sua concepção revisitou o conceito de ação para então demonstrar a fragilidade dos sistemas clássico e neoclássico e questionar a relação interna-externa concebendo a ação como unidade dialética de momentos objetivos e subjetivos. [36]

Hans Welzel concluiu que uma ação não podia esgotar-se em um simples processo causal como supunha a teoria causal do ilícito, e sim que ela só poderia obter sucesso quando dirigida por um ser humano. [37]

Isto posto, conclui-se que no finalismo o resultado será imputado ao sujeito quando considerado produto de sua vontade.

Foi com a reforma do Código Penal Nacional, em 1984, que a legislação passou a adotar o finalismo e com isso o dolo passou a fazer parte do tipo. [38] Dessa forma, sem dolo ou culpa, não há uma conduta típica.


3 NEXO CAUSAL ENTRE CONDUTA E RESULTADO

O tipo pertence à lei, mais precisamente à parte especial do Código Penal e às leis especiais (ex: matar alguém – art. 121 do Código Penal Nacional). Além disso, o tipo é predominantemente descritivo e sua função é a individualização das condutas humanas.

Como bem assinala Eugenio Raúl Zaffaroni, citando Max Ernst Mayer, a tipicidade é um indício da antijuridicidade e toda conduta típica é antinormativa. [39]

Os elementos do fato típico são: a conduta, o resultado, a relação de causalidade e a tipicidade. [40]

A relação de causalidade, ou nexo causal, é o vínculo existente entre a conduta e o resultado.

O resultado de um crime subdivide-se em resultado jurídico (aquele visto como a conseqüência da ação no aspecto do ordenamento jurídico) e resultado naturalístico (que nada mais é do que a modificação que a conduta provoca no mundo exterior). [41]

Não existe crime sem resultado jurídico, entretanto é possível existir crime sem o resultado naturalístico (no caso dos crimes de mera conduta ou formais). E daí conclui-se inexistir relação de causalidade nos delitos de mera atividade.

Considerando nosso Código Penal, evidencia-se que, determinando o art. 13, caput, 1º parte, que o resultado naturalístico, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa, o sistema só tem aplicação aos tipos de crimes materiais (que exigem a produção do resultado naturalístico). Diante disso, ficam excluídos os crimes de mera conduta e os formais, uma vez que nos primeiros o tipo só descreve o comportamento e nos segundos, não exige a produção do evento. [42]

O problema inicial de toda investigação que tenha por fim imputar um resultado ao agente e, posteriormente, fixar sua responsabilidade penal analisando a culpabilidade, é concluir se o agir ou não agir do sujeito ocasionou a ocorrência típica. [43]

É interessante fazer uma pequena distinção entre imputatio facti (consistente na imputação de um resultado ao agente pela sua conduta) e imputatio juris (que seria uma análise do conteúdo antijurídico ou culpável do episódio). [44]

O nexo de causalidade é um dos elementos do fato típico de maior complexidade, tendo sido construídas várias teorias acerca do tema. As mais importantes são a da equivalência das condições de Julius Glaser e da causalidade adequada de Johannes Von Kries [45], porém a doutrina ainda não encerrou a discussão acerca do tema, já que a Imputação Objetiva nos apresentou novas visões principalmente através dos pensamentos de Claus Roxin e Günther Jakobs e, cada vez mais, autores nacionais estão enveredando por esse caminho.

O objetivo deste capítulo é apresentar algumas dessas teorias de maneira crítica, demonstrando suas falhas para então apontarmos os novos rumos tomados pelos adeptos do funcionalismo.

3.1 TEORIA DA EQUIVALÊNCIA DAS CONDIÇÕES (CONDITIO SINE QUA NON)

A teoria da equivalência das condições (ou dos antecedentes) foi idealizada por Julius Glasser e adaptada por Von Buri, que foi o primeiro a introduzir essa teoria na jurisprudência por ser magistrado do Tribunal Supremo do Reich. [46]

Nas palavras de Hans Welzel, na teoria da equivalência das condições considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

Esta teoria parte da idéia de que todo efeito tem uma multiplicidade de relações causais, e cada uma dessas condições, na relação de causalidade, é igualmente necessária para o resultado, e, por conseguinte, todas as condições têm o mesmo valor. [47]

Günther Jakobs critica a metodologia dessa teoria. [48] Para ele, a lógica da teoria da equivalência dos antecedentes é inútil e redundante, uma vez que a sua aplicação só é possível quando de antemão sabe-se qual é a causa do ocorrido. Um exemplo deste problema é o do calmante Contergan (ou Talidomida). Para saber se o calmante, quando tomado por mulheres grávidas, é a causa de má formação do feto, devemos eliminar este fato para saber se o resultado teria ocorrido. [49] Para responder a essa pergunta é necessário saber se o remédio em questão causa má formação dos fetos. Ora, sabendo que o remédio em questão causa o resultado, é inútil a aplicação da teoria de Julius Glasser.

3.1.1 Preceito Legal da Relação de Causalidade

Art. 13. O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

Superveniência de causa relativamente independente

§ 1º A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.

Relevância da omissão

§ 2º A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:

a)tenha por lei obrigação de cuidado, proteção e vigilância;

b)de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;

c)com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado. [50]

3.1.2 Crítica à Teoria da Conditio Sine Qua Non à Luz do Art. 13 do Código Penal

A denominada teoria da conditio sine qua non foi adotada pelo nosso legislador penal, seguindo o exemplo do Código Italiano. Francisco de Assis Toledo critica o legislador pelo fato de ter se pronunciado expressis verbis sem deixar o problema "às elucubrações da doutrina". [51] Mais adiante veremos que mesmo com a legislação adotando a teoria da conditio sine qua non podemos aplicar a imputação objetiva em âmbito nacional, o que acaba por invalidar a afirmação do autor.

Como já visto anteriormente, segundo essa teoria, tudo que concorre para o resultado é causa dele, isto é, todos os antecedentes do resultado naturalístico são relevantes e desse princípio decorre o nome da teoria de "equivalência dos antecedentes". [52]

Para atender à questão de quando a ação deve ser considerada causa, a doutrina acabou por adotar o método da eliminação hipotética [53]de Thyrén. Se com a exclusão de uma ação o resultado teria deixado de ocorrer, considera-se causa. É um juízo ex post.

Analisar-se-á o seguinte exemplo proposto por Damásio de Jesus: [54]

Uma vítima é dolosamente atingida por disparos de revólver e vem a ser internada em um hospital onde ocorre um incêndio e ela vem a falecer em conseqüência exclusiva das queimaduras.

O § 1º do art. 13 do CP acaba por restringir a aplicação da teoria da conditio sine qua non. "A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou".

Ora, o parágrafo citado estabelece que as causas relativamente independentes supervenientes que por si só produzem o resultado, é que quebram o nexo de causalidade. Logo, se as causas que provocam o resultado mais grave forem preexistentes ou concomitantes, o agente do delito que praticou a conduta superveniente menos grave responderá pelo resultado, mesmo que este seja não seja desejado. [55]

A seguir vemos mais alguns exemplos: [56]

a) causa preexistente absolutamente independente da conduta do sujeito: Caio toma um veneno com o fim de cometer o suicídio e vem a ser atingido posteriormente por golpes de Tício, vindo a morrer instantes depois em conseqüência do envenenamento;

b) causa concomitante absolutamente independente: Tício Fere Mévio no exato momento em que este vem a falecer exclusivamente por um enfarto. No caso, coexistem a agressão e o mal cardíaco;

c)causa superveniente absolutamente independente: Tício coloca veneno na refeição de Caio que vem a falecer pela queda de uma viga em sua cabeça, antes do veneno operar em seu organismo.

No caso de causa absolutamente independente o agente não pode ser responsabilizado pelo resultado morte, pois sua conduta não tem nenhuma relação com o resultado morte. No terceiro exemplo, Tício, por ter ministrado o veneno, responde por tentativa de homicídio. [57]

E agora analisemos os exemplos de causas relativamente independentes: [58]

a) causa preexistente relativamente independente: Tício atira em Caio, errando os disparos, mas a vítima morre do coração pois o susto desencadeou uma taquicardia;

b)causa concomitante relativamente independente: Tício persegue Caio na via pública, atirando contra o mesmo, sendo que Caio vem a ser atropelado enquanto foge, morrendo em decorrência do atropelamento;

c) causa superveniente relativamente independente: Tício atira em Caio causando-lhe lesões leves na mão direita, mas a vítima vem a morrer no caminho do hospital em decorrência de traumatismo craniano provocado por um acidente automobilístico que envolveu o veículo utilizado em seu socorro.

Quando há uma relação entre a causa da morte da vítima com a conduta do sujeito diz-se que a causa é relativamente independente.

Nos exemplos A e B o agente será responsabilizado pelo resultado morte. No caso do exemplo C, há uma ruptura do nexo causal, [59] isto é, o agente não pode ser responsabilizado pelo resultado segundo o §1º do art. 13 do nosso Código Penal, como se viu anteriormente.

3.1.3 Jurisprudência relacionada [60]

a) A respeito do caput do art. 13 do Código Penal Nacional:

Sem que haja relação de causa e efeito entre a ação ou omissão do agente e o resultado morte, não pode ele ser responsabilizado por esta (TACrSP, Julgados 78/210; RT 529/368), sendo inadmissível, no Direito Penal, a culpa presumida ou a responsabilidade objetiva (STF, RTJ 111/619). Se é incerta a relação de causalidade entre a atividade do agente e a morte do ofendido, absolve-se (TACrSP, Julgados 66/227). Se a vítima, para escapar à agressão, feriu-se na fuga, responde pela lesão o agente que a quis agredir, pois há relação de causa e efeito (TACrSP, Julgados 86/311, 69/327).

b) A respeito do § 1º do art. 13 do Código Penal Nacional:

- Admitindo:

O nexo causal, tanto nos crimes dolosos como nos culposos, não suporta a superveniência de causa que, por si só, afete o resultado e possa isentar a responsabilidade do agente (TACrSP, Julgados 84/407; RT 598/349). "A cirurgia facial, que não tinha por objetivo afastar o perigo de vida, provocado pela lesão, mas tão-só corrigir o defeito, constitui-se causa independente, apta, por si só, a produzir a morte" (TJSP, RT 530/329). Se o evento resultou de ato da vítima, consistente na ação independente de descer do veículo em movimento, que se intercalou na relação causal iniciada pelo agente ao abrir a porta antes do ponto de desembarque, a interrupção da causalidade afasta a culpa do agente (TACrSP, RT 453/401). Se a morte da vítima decorreu de sua condição pessoal de cardíaca, ignorada pelo agente, não a tendo atingido os tiros desfechados por este, responde ele por tentativa e não por homicídio consumado (TJSP, RT 405/128).

- Não admitindo:

Não é superveniência de causa independente o surgimento de infecção nas meninges ou broncopneumonia durante o tratamento das lesões sofridas (TACrSP, Julgados 82/305; TJSP, RJTJSP 161/276). Não importa que a condição de diabética tenha concorrido para a morte da vítima de delito de trânsito (TACrSP, RT 527/362). Responde pelo crime o agente que, ameaçando a vítima de submetê-la à prática de atos libidinosos, deu causa a que se atirasse do veículo em movimento (TJRJ, RT 637/290). Também responde se a vítima, ao fugir de roubo às margens de rodovia, vem a ser atropelada e morta (TJSP, RJTJSP 158/304).

3.2 TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA (TEORIA DA ADEQUAÇÃO)

Essa teoria, elaborada por Von Kries, nasceu após a reforma do Código Penal Alemão de 1953 para evitar algumas injustiças (ou absurdos) na aplicação irrestrita da teoria da equivalência dos antecedentes. Anteriormente, aplicava-se a responsabilidade objetiva nos delitos agravados pelo resultado, [61] isto é, se uma pessoa viesse a ferir outra de forma superficial e essa viesse a falecer por um acidente automobilístico a caminho do hospital, o sujeito responderia por lesões corporais seguidas de morte.

Para a teoria da causalidade adequada só se considera como causa a conduta que isolada, tenha probabilidade mínima de provocar o resultado, ou aquela condição "que, segundo as relações comuns da vida social, possua idoneidade genérica para produzir tais lesões". [62] São deixados de lado os acontecimentos extraordinários e excepcionais.

Analisemos a morte de um passageiro atingido por um raio quando o cocheiro, ao dormir, seguiu equivocadamente o caminho errado: Ao aplicarmos a teoria da equivalência dos antecedentes temos que se o condutor não tivesse dormido a carruagem não teria seguido o caminho errado e, por isso, o raio não cairia sobre o passageiro.

Mediante um critério puramente físico, naturalístico, não há como recusar a existência de um liame causal entre a conduta omissiva do cocheiro e a morte do viajante. A causalidade adequada, contudo, temperando os excessos decorrentes da conditio sine qua non, vai afastar, do ponto de vista jurídico, a relação de causa e efeito, por considerar a absoluta imprevisibilidade e improbabilidade entre uma efêmera soneca e um relâmpago assassino. [63]

É exatamente nessa oposição ao critério naturalístico que a teoria da adequação se excede. [64] Quem também pensa assim é o doutrinador Juarez Cirino dos Santos quando aduz que essa teoria "procura resolver, simultaneamente, questões de causalidade e questões de atribuição, porque identificar a causa adequada para o resultado típico é, também, identificar o fundamento da atribuição do resultado ao autor, como obra dele". [65]

A teoria da causalidade adequada foi base para a construção das modernas teorias da imputação, pois além de demonstrar as falhas da teoria da conditio sine qua non também tornou os fatos imprevisíveis irrelevantes para o campo penal.

3.3 TEORIA DA ADEQUAÇÃO SOCIAL

Teoria desenvolvida por Hans Welzel (que, como vimos anteriormente, foi quem introduziu o finalismo), essa é uma teoria precursora do movimento da Imputação Objetiva, e se fundamenta na adequação social. O autor foi o primeiro a estabelecer um contato entre o fato punível e a realidade social e hermenêutica.

A teoria fundamenta-se na premissa que o Direito Penal só tipifica as condutas que tem alguma relevância social. As condutas que se adequam socialmente não poderiam ser delitos e, dessa forma, "devem ser excluídas do âmbito da tipicidade". [66] Um fato não pode ser aceito pela sociedade e ao mesmo tempo ser definido em lei como infração penal.

Esse conceito de adequação social se aproxima do que a doutrina adepta da Imputação Objetiva chama de "risco permitido", porém, por ainda ser uma idéia imprecisa, ela não foi aceita como uma teoria e sim como uma interpretação. [67]

3.3.1 Jurisprudência relacionada [68]

Se o descaminho referiu-se a objetos de pequeno valor para comércio de sacoleiro, além do princípio da insignificância, aplica-se o da adequação social, pois a sociedade não considera a prática de tal comércio como ilícito penal (TRF da 1ª Região, RT 727/601).


4 INTRODUÇÃO À(S) TEORIA(S) DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA

O grande progresso trazido pelo finalismo na década de 30 limitou-se ao tipo subjetivo já que muitas questões referentes ao tipo objetivo ainda não haviam sido solucionadas.

Como já vimos no primeiro capítulo dessa pesquisa, a contraposição ao pensamento finalista de Hans Welzel é expressa hoje através de várias vertentes como a da(s) teoria(s) da imputação objetiva.

Nos referimos aqui às teorias da imputação objetiva do resultado, pois, seus dois maiores expoentes, Claus Roxin e Günther Jakobs, pensam de maneira um pouco diferenciada (as idéias dos autores serão analisadas em capítulos próprios).

Essa não-uniformidade é alvo de algumas críticas: José Henrique Pierangelli afirma que não há falar em uma teoria da imputação e sim em um movimento. [69] Luiz Flávio Gomes assevera que a imputação objetiva "não é propriamente uma teoria, senão um conjunto de princípios elaborado para cumprir a função de delimitar e corrigir o nexo de causalidade". [70] Bernardo Feijóo Sánchez vai mais longe ao dizer que, "salvo valiosíssimas e escassas contribuições, a teoria da imputação objetiva, em seu atual grau de desenvolvimento, não vai além de um conglomerado desconexo de princípios e critérios que se contradizem entre si, carecendo de um elo condutor que lhes outorgue uma lógica interna". [71]

A concepção dominante do tipo já não corresponde a uma teoria subjetivista ou finalista do injusto pessoal, mas se canaliza através da referência à teoria da imputação objetiva, ainda que não se tenha alcançado um acordo definitivo sobre como deve ficar constituída uma teoria do injusto pessoal, desenvolvida a partir dos pressupostos desta teoria teleológica-valorativa. [72]

De qualquer forma, é importante frisar que "a teoria da imputação objetiva confere ao tipo objetivo uma importância muito maior da que ele até então tinha, tanto na concepção causal como na final", [73] com a compatibilidade do posicionamento do dolo no tipo subjetivo (talvez seja por isso que Damásio de Jesus conclui, em sua obra sobre o assunto, que a Imputação Objetiva e o Finalismo podem conviver em harmonia).

A teoria causal da ação conduzia a um regressus ad infinitum, olhos postos na teoria da conditio sine qua non, e é exatamente nessa seara que a teoria da imputação objetiva procura trabalhar. "A dogmática penal atual reconhece a necessidade de a teoria da relação causal ser restringida por uma correção limitadora, evitando os males do versari in re illicita imputatur omnia, quae sequuntur ex delicto." [74]

Além disso, enquanto os finalistas consideram a ação de matar como o direcionamento voluntarioso do curso causal no sentido da morte e, dessa maneira, não consideram o homicídio culposo uma ação de matar, a concepção funcionalista prevê que "toda causação objetivamente imputável de uma morte será uma ação de matar" [75] mesmo quando não houver dolo. Essa concepção gera, segundo Claus Roxin, um "deslocamento do centro de gravidade para o tipo objetivo".

Antes de nos aprofundarmos no estudo das teorias propostas por Claus Roxin e Günther Jakobs far-se-á uma análise criteriosa da evolução do conceito de imputação.

4.1 ASPECTOS HISTÓRICOS

4.1.1 Platão e Aristóteles

Apesar da Imputação Objetiva ser apontada como um renascimento de conceitos neokantianos, [76] Platão e Aristóteles também contribuíram para essa moderna construção doutrinária.

Platão foi o primeiro a falar que era a lei que definia a imputabilidade do ato moral e que o sujeito era responsável por suas próprias ações, bem como às conseqüências que dela decorrem. Até então, o conceito de imputação era ligado à simples ação dos deuses. Nas palavras do próprio Platão, em sua obra A República, "a virtude não tem senhor; cada um a terá em maior ou menor grau, conforme a honrar ou a desonrar. A responsabilidade é de quem escolhe. O Deus é isento de culpa". [77]

Aristóteles aprimorou os estudos de Platão dizendo que:

[...] só se pode atribuir a responsabilidade por uma ação a quem voluntariamente fez uso de sua "liberdade natural" (livre determinação de agir), com ou sem ânimo de praticar determinado delito, sem adequar seu comportamento ao juridicamente exigível. Tão somente os atos que estão sob domínio da vontade são suscetíveis de imputação [...] [78]

O conceito de imputação concebido por Aristóteles é ontológico, mas também apresenta alguns traços valorativos.

4.1.2 Samuel Pufendorf

Samuel Pufendorf, filósofo do direito natural, reelaborou a doutrina de Aristóteles e afirmou que só podem ser imputados ao homem os resultados que dependam da vontade humana ou que por ela sejam domináveis. Logo, ele "não entedia como actio humana qualquer movimento proveniente de um homem, mas só aquele que é dirigido pelas específicas capacidades humanas, ou seja, o intelecto e a vontade". [79]

Segundo Hans Welzel, citado por Luiz Régis Prado, "Pufendorf foi certamente o primeiro a introduzir na ciência do Direito Penal o fundamental conceito de imputação (imputatio), tratando-o sistematicamente". [80] Assim também pensa Armin Kauffman quando afirma que Pufendorf oferece ao Direito Penal, com a concepção de imputação, uma idéia que serve de fundamento básico para a construção de sua parte geral.

A base de sua teoria da imputação dividia-se em duas acepções: imputativitas e imputatio, sendo a primeira uma relação entre ação livre e agente, isto é, a ação só será imputada ao homem quando causada por ele com consciência e vontade. A expressão imputatio seria a operação judicial para comprovar a ocorrência dos elementos que compõem as imputativitas, isto é, um juízo de valoração ex post.

4.1.3 Georg Hegel

Parte da doutrina diz que a(s) moderna(s) teoria(s) da imputação objetiva sedimenta(m)-se no início do século XIX com Georg Hegel, através da elaboração do princípio de que um fato só pode ser imputado como responsabilidade da vontade. [81]

Segundo o doutrinador, a imputação volta a ser uma característica interna da ação que nada mais era senão uma vontade livre realizada por um sujeito imputável.

Conceito baseado na concepção de Pufendorf, seu erro residia no fato de identificar a ação do direito penal com a ação (‘livre’) culpável conforme ensinamento de Hans Welzel. Neste contexto sua idéia é questionada pela doutrina em relação à aplicabilidade nos delitos culposos os quais o resultado não é aplacado pela vontade do sujeito. [82]

4.1.4 Karl Larenz

Foi da filosofia jurídica de Georg Hegel, porém com algumas diferenças, que Karl Larenz, no ano de 1927, extraiu sua concepção de imputação objetiva. O doutrinador expressou suas idéias através da divulgação de sua tese "A teoria de imputação de Hegel e o conceito de imputação objetiva". [83]

Sobre a questão, Luiz Régis Prado assevera que "O próprio Larenz afirmava que seu conceito de fato coincidia com o conceito de ação de Hegel, o que não é verdade. Hegel concebia a ação como um complexo subjetivo (vontade) e objetivo (fato); já Larenz extirpa da ação sua estrutura material (momento subjetivo), de modo que seus critérios normativos de restrição da causalidade não restringiriam a imputativitas – como fazia Hegel -, mas sim a imputatio, no sentido de Pufendorf". [84]

Para Georg Hegel um acontecimento "só poderia ser submetido à valoração jurídica se fosse exteriorização da vontade subjetiva ou da moral" [85] do agente. Assim, os fatos que não são abarcados como obra do sujeito consideram-se produtos do acaso. Ora, como visto anteriormente, essa teoria era inaplicável aos delitos culposos.

E é nesse ponto que Karl Larenz diverge de seu mestre, Georg Hegel, tomando em sentido objetivo os conceitos de finalidade e imputação. Ele cria uma possibilidade de previsão ao afirmar que "a objetividade do conceito de imputação permite que este englobe, além dos fatos conhecidos e queridos (fatos dolosos), aqueles que poderiam ter sido abarcados pela vontade do sujeito (fatos culposos)". [86]

Para Karl Larenz:

A "imputação nada mais é do que a tentativa de delimitação entre fatos próprios do agente e acontecimentos puramente acidentais e é chamada de objetiva porque essa possibilidade de previsão não é aferida com base na capacidade e conhecimentos do autor concreto, mas de acordo com um critério geral e objetivo, o do ‘homem-inteligente-prudente’". [87]

A expressão "Imputação Objetiva" foi adotada pela doutrina moderna. Por outro lado, a concepção majoritária atual da(s) teoria(s) da imputação objetiva abandona as iniciais fundamentações de Karl Larenz e baseia-se em considerações teleológico-normativas derivadas do fim que se atribui ao Direito Penal e às normas penais. [88] "Esta teoria se converte num juízo teleológico, enquanto as características individuais do autor se encontram na culpabilidade." [89]

4.1.5 Richard Honig

Richard Honig, apontado como um dos precursores da linha de pensamento da moderna teoria da imputação objetiva, difere de Karl Larenz por não mais enfatizar a imputação do comportamento e sim do resultado.

"Honig trouxe para o Direito Penal a imputação objetiva, com base na persecução objetiva da finalidade, excluindo os cursos causais determinados pela causalidade e estabelecendo um juízo de imputação autônomo, no qual o resultado é o reflexo de um fim." [90]

O autor argumenta que têm relevância para o ordenamento jurídico aqueles "resultados que possam ser ‘pensados finalmente’ em virtude de sua alcançabilidade ou evitabilidade". [91] A exclusão dos fatos determinados pela causalidade foi a base do pensamento de Richard Honig.

Por ser a causalidade muito ampla, a conduta humana só terá importância para o Direito Penal quando houver uma finalidade objetiva ligada a essa causalidade. "São, portanto, imputáveis aqueles resultados que podem ser finalmente vislumbrados." [92]

Richard Honig apresenta o clássico exemplo do sobrinho que pretende receber a herança do tio rico e faz com que o mesmo dirija-se, em um dia de chuva, a uma floresta onde costumam cair muitos raios. [93]

Embora haja a vontade do sobrinho de receber a herança, não é possível imputar o resultado morte a ele, pois o mesmo não tem o controle causal sobre o resultado. Não se examina a consciência e vontade de um agente em particular e sim do que poderia ser compreendido conscientemente pela vontade humana em geral. Por isso trata-se de uma imputação objetiva. [94]

Os atuais defensores da Imputação Objetiva coincidem com Richard Honig apenas por considerar que a relação entre conduta e resultado não se acaba com a causalidade. [95]

4.2 CONCEITO DE IMPUTAÇÃO OBJETIVA

Como visto no capítulo anterior, o problema causal ainda é um centro de discussão dentro do Direito Penal e as teorias do nexo de causalidade apresentadas não satisfazem o objetivo de identificar os fatos relevantes para o Direito. "Há a necessidade da teoria da relação causal ser restringida por uma correção limitador, evitando os males do ‘versari in re illicita imputatur omnia, quae sequuntur ex delicto’." [96]

A partir dos argumentos apresentados por Richard Honig, Claus Roxin afirmou que "imputável é somente o resultado que se pode conceber como orientado de acordo com a finalidade". [97]

Já foi apontado anteriormente que não há uma uniformização quanto ao conceito de Imputação Objetiva, porém, pode-se ressaltar que "só haverá imputação objetiva quando for possível imputar um resultado a uma pessoa se a ação desta criou um risco juridicamente desaprovado que está refletido no resultado típico". [98]

Para Damásio de Jesus, "imputação objetiva significa atribuir a alguém a realização de uma conduta criadora de um relevante risco juridicamente proibido e a produção de um resultado jurídico." [99] É necessário que haja outro nexo, além da relação de causalidade, para a atribuição de um resultado a uma pessoa, qual seja, a realização de um risco proibido pela norma.

Imputação objetiva não se confunde com responsabilidade penal objetiva que determina ao autor do fato sua responsabilidade, ainda que não haja atuado com dolo nem culpa. Também não pode ser confundida com a imputabilidade penal (capacidade do autor diante de seu caráter de querer e compreender o fato delinqüente). [100]

4.2.1 Aplicação da Imputação Objetiva

É pacífico o posicionamento da atual doutrina alemã acerca da aplicação da Imputação Objetiva a todos os tipos da parte especial e leis especiais, "incluindo culposos e dolosos, bem como os omissivos". [101] A tendência inicial era de aplicação somente aos crimes de resultado excluindo os de mera atividade e os omissivos. [102]

Damásio de Jesus, Fernando Galvão e Luís Greco são alguns exemplos de doutrinadores nacionais que acolhem a idéia que a imputação objetiva aplica-se a qualquer crime e não só aos crimes materiais. Reyes Alvarado aduz que "a teoria da imputação objetiva, como determinadora do injusto do comportamento, é aplicável a todos os tipos da parte especial, isto é, tanto aos delitos de resultado como aos que encerram perigo, igualmente aos ilícitos dolosos e culposos". [103] Na visão desses autores a teoria incide em crimes tentados e consumados, materiais, formais e de mera conduta, comissivos e omissivos.

É certo que grande parte dos casos problemáticos que se pretendeu resolver com essa teoria dizem respeito aos delitos culposos e que o desenvolvimento da noção da criação do risco juridicamente relevante não autorizado se assemelha à observância ao dever objetivo de cuidado, mas nos fatos dolosos a criação da situação de risco é tão evidente que os esforços doutrinários se concentraram nas dificuldades apresentadas para a determinação da situação de risco não intencional. [104]

Segundo a doutrina há vários casos específicos de interesse na aplicação dos critérios de imputação objetiva. Podemos exemplificar duas dessas situações peculiares, quais sejam, a aplicação aos crimes impossíveis e a violência desportiva. [105]

O preceito legal do primeiro caso é o art. 17 do Código Penal Nacional.

Art. 17. Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime. [106]

A teoria da imputação objetiva elucida a atipicidade dos casos ao afirmar que não há criação de um risco juridicamente desaprovado. Além disso, no crime impossível, como não há a criação do risco não há falar em realização desse risco e por isso não há tipicidade. Como veremos especificamente, segundo Claus Roxin, a ação deve oferecer um risco ao bem jurídico para ser juridicamente relevante para o Direito Penal.

O preceito legal do segundo caso está no art. 23, III, do Código Penal e encontra-se acobertada por uma excludente de antijuridicidade, qual seja, o exercício regular de direito.

Art. 23. Não há crime quando o agente pratica o fato:

I – em estado de necessidade;

II – em legítima defesa;

III – em estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular de direito. [107]

Para a teoria da imputação objetiva a discussão encontra-se no âmbito do tipo já que se trata de um risco permitido. Desde que obedecidas as regras do esporte, estar-se-á realizando um risco permitido. A doutrina tradicional exclui a antijuridicidade do fato e a teoria da imputação objetiva exclui a tipicidade.


5 A IMPUTAÇÃO OBJETIVA SEGUNDO CLAUS ROXIN

5.1. A TEORIA DO INCREMENTO DO RISCO

Antes de ter suas considerações aclamadas pela literatura especializada, Claus Roxin teve sua primeira proposta rejeitada pela doutrina alemã e espanhola ao publicar um artigo no qual trazia à tona questões relacionadas às "condutas alternativas adequadas ao direito". [108]

A teoria elaborada pelo autor, denominada teoria do incremento do risco, limitou-se inicialmente ao âmbito dos delitos culposos.

"O critério do incremento do risco foi reservado para a solução dos casos de comportamentos alternativos ajustados ao Direito." [109] Não se confunde a teoria do incremento do risco com a idéia geral proposta pelo autor como princípio do risco. A teoria do incremento do risco é uma teoria ad hoc que procura resolver um determinado grupo de casos. [110]

Sua teoria tenta resolver de forma diferenciada "os casos em que somente se pode demonstrar que provável ou possivelmente também tivessem ocorrido os resultados", comparando uma conduta hipotética que observava o risco permitido e a realizada pelo autor. Assim, se a conduta do autor incrementasse o risco de lesão em relação à hipoteticamente permitida, teríamos um tipo culposo consumado, enquanto, se não se incrementasse não se poderia imputar o resultado. Concluindo: "em caso de dúvida sobre se o risco não permitido se integralizou no resultado, este se imputa sempre que se constata que o autor criou um risco não permitido". [111]

Formulada de forma extrema essa teoria leva a conclusões precipitadas que infringem o princípio in dubio pro reo. [112] Por exemplo: um motorista que conduz a 53km/h, em uma área de limite de velocidade de 50km/h, e atropela um pedestre. Mesmo se não houver a certeza de que guiando-se a 50km/h o resultado seria evitado, ou o limite de velocidade teria reduzido o risco, entende-se que o motorista "matou" ou "lesionou". "O incremento do perigo além do permitido faz a balança se inclinar em favor da proteção dos bens jurídicos." [113]

Há uma idéia de responsabilidade ilimitada. Se uma pessoa se comporta de forma inadequada não se distingue em seu comportamento a parte típica e a parte permitida. Claus Roxin acaba incorrendo na idéia versarista nesses casos de dúvida quando "não se sabe se o risco típico se integralizou no resultado", isto é, não se distingue uma parte permitida e outra proibida e o autor acaba respondendo por todas as conseqüências de seu comportamento antijurídico. [114]

5.2 CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA

Claus Roxin, no início da década de 70, formula uma série de critérios normativos de imputação para os delitos de resultado (tanto os dolosos como os culposos) visando à construção de uma teoria da imputação objetiva desvinculada do dogma causal. [115]

Nas palavras de Antonio Luís Chaves Camargo: "Após os anos 70, os princípios e regras sistemáticas da imputação objetiva, vários critérios surgiram, determinantes da atribuição do resultado típico a uma ação exterior praticada pelo agente e com relevância jurídico penal." [116]

O ponto comum entre os critérios citados seria o princípio do risco, "com base no qual, partindo do resultado, o importante é saber se a conduta do autor criou ou não um risco juridicamente relevante de lesão típica de um bem jurídico". [117] Dessa forma, a imputação objetiva tem relação com a ação humana, a qual deve criar um risco juridicamente desvalorado que tem por conseqüência um resultado típico. [118]

Para o autor, mesmo havendo dolo, ações que não geram um risco juridicamente relevante não podem ser punidas pelo Direito Penal. Em outras palavras, "se o Direito Penal proíbe condutas para proteger bens jurídicos, é óbvio que só fará sentido proibir condutas que, de alguma forma, os ameacem, noutras palavras: condutas perigosas". [119] Se o autor não cria um risco juridicamente relevante não existe uma realização do tipo ainda que ele saiba e queira causar determinado resultado. [120]

Claus Roxin elaborou os seguintes parâmetros para a determinação do juízo de imputação objetiva: a diminuição do risco; a criação ou não-criação de um risco juridicamente relevante; o incremento ou falta de aumento do risco permitido; o âmbito de proteção da norma e o alcance do tipo.

5.2.1 Casos de diminuição do risco

Claus Roxin propõe o caso de A que ao perceber que uma pedra cairá sobre B, não podendo evitar que isto aconteça, afasta-o de tal modo que o dano causado sobre este seja menor. [121]

No caso exposto percebemos que houve uma diminuição do risco para o bem jurídico protegido. O agente não criou um risco modificando o curso causal para que a conseqüência seja mais favorável a este bem jurídico. Mesmo caracterizando-se um dano ao bem não há um desprezo pela proteção valorativa do ordenamento jurídico. [122]

As ações que diminuem o risco de lesão a um bem jurídico não podem ser típicas, não por uma mera falta de dolo ou culpa do autor, mas porque seria irracional punir ações que melhoram a situação do bem tutelado. Na mencionada hipótese, mesmo se na ação do autor estivesse presente o dolo de ferir o braço, e para isso necessitava-se desviar a pedra que estava na direção da cabeça, não há que se falar em tipicidade da ação. [123]

Outro exemplo relacionado à diminuição do risco é o do médico que não consegue evitar a morte do paciente, podendo apenas adiá-la.

Do ponto de vista finalista a atuação do agente estaria amparada por uma causa de justificação (estaria no âmbito da antijuridicidade). Claus Roxin contesta essa visão, já que excluir a ilicitude pressupõe a afirmação da tipicidade da conduta quando esta, na verdade, é irrelevante para o Direito Penal. [124] A imputação objetiva afasta do âmbito do Direito Penal essas ações determinadas pela diminuição do risco já que nelas não está presente a tipicidade. [125]

Destarte, nas situações em que a diminuição do risco refere-se a bens jurídicos diversos, teríamos a excludente de ilicitude. Basta olharmos para o exemplo proposto pelo próprio autor de um homem que joga uma criança pela janela de sua residência, a qual encontra-se em chamas, provocando lesões corporais de natureza grave, mas evitando sua morte pela ação do fogo. Dessa forma poderíamos afirmar a imputação objetiva do resultado no caso de recorrer ao estado de necessidade como causa de justificação da lesão. Entretanto, "a negação da imputação objetiva poderá ser mantida se se contempla a lesão à saúde ou à integridade física não como um aliud, mas como um minus em relação à morte da mesma pessoa". [126]

Para reconhecermos a diminuição do risco é necessário que este não seja substituído por outro de igual intensidade como no caso de uma pessoa que, para salvar outra de um desabamento, acaba empurrando-a de uma altura capaz de determinar-lhe o resultado morte. [127]

Além disso, o autor não pode ser o responsável pela criação do perigo ao bem jurídico, "ou pela obrigação, em qualquer de suas formas, de evitar o resultado". [128] Na ocorrência desta hipótese estaríamos diante de uma posição de garantidor do crime comissivo por omissão o que, no caso de ocorrência do resultado, não excluiria a imputação objetiva.

A crítica apontada por doutrinadores em relação à diminuição do risco é a solução do conflito de interesses situada no tipo, quando, na visão desses autores, essa discussão deve estar situada no âmbito da antijuridicidade através das causas de justificação.

5.2.2 A criação ou não de um risco juridicamente relevante

Iniciaremos este ponto abordando o caso proposto por Claus Roxin, e já visto aqui anteriormente, do sobrinho que envia o tio a um bosque no meio de uma tempestade na esperança de que caia um raio e este venha a morrer, o que realmente acaba ocorrendo.

Para Claus Roxin em relação à "atividades normais e juridicamente irrelevantes da vida cotidiana, como passear pelo centro, tomar banho, caminhar pela montanha, os riscos mínimos socialmente adequados que deles derivam não são levados em conta pelo Direito, de modo que uma causação de resultado por eles provocada não é de antemão imputável." Essa concepção baseia-se na teoria da adequação e na idéia de dirigibilidade objetiva a fins desenvolvida por Karl Larenz e Richard Honig. [129]

No caso exposto, já que não houve a criação de um perigo não permitido por parte do sobrinho, não há se falar em ação típica. Não analisa aqui a existência ou não de dolo, a questão é puramente objetiva.

A diferença do pensamento de Claus Roxin e de Welzel é que este nega a existência de dolo no caso exposto, enquanto aquele nega a presença do delito de homicídio em vista do "alto grau de improbabilidade do curso causal". [130]

Segundo o autor, também é aplicável esse critério às hipóteses de desvio do processo causal. [131]

Claus Roxin dá como exemplo de hipótese de desvio do curso causal o caso de A atirar em B, com propósito de matar, ferindo-o, vindo o mesmo a morrer em conseqüência de um posterior incêndio no hospital em que estava internado. O doutrinador nega a existência de um homicídio doloso ou culposo ao negar a imputação objetiva. Vejamos:

Hans Welzel, no exemplo acima mencionado, conclui que mesmo que o resultado dependa da ação homicida de A, sua realização não foi finalmente visualizada por ele. Segundo o autor o que ocorreria aqui seria uma tentativa de homicídio, já que "o resultado típico não deve ser considerado como provocado dolosamente se se produz unicamente como conseqüência do encadeamento de circunstâncias inesperadas (desvio essencial do curso causal)". [132]

Claus Roxin concorda com a solução apresentada por Hans Welzel, porém não acata seus argumentos. Sustenta o autor que a criação do risco proibido derivada do disparo da arma de fogo "não desembocou na morte acidental posterior, porque o risco de que alguém que esteja em um hospital morra como decorrência de um incêndio é tão pequeno que deve ser juridicamente desconsiderado. [133]

Existe uma controvérsia em relação à admissão do critério do risco juridicamente relevante em relação aos crimes dolosos, haja vista que o referido critério abarca dois elementos dos tipos de injusto culposo, qual sejam, a previsibilidade objetiva e a observância do dever de cuidado. Os doutrinadores que criticam esse critério aduzem que:

Como a inobservância do dever de cuidado objetivamente devido é um elemento que pertence à antijuridicidade, não tem sentido algum inserir "a referência ao cuidado objetivamente devido para evitar a lesão dos bens jurídicos nos delitos dolosos de ação, pois neles a conduta vai dirigida pela vontade do autor a produzir a lesão ou o perigo do bem jurídico". [134]

De toda a explanação, conclui-se que a criação de um risco não permitido reúne dois requisitos: um ontológico (que seria a criação do risco) e outro axiológico (o risco não é permitido).

5.2.3 O aumento do risco permitido

Segundo Claus Roxin, alguns aspectos devem ser levados em consideração pelo julgador: a) deve verificar se houve a realização ou não de um risco não permitido; b) verificar se o resultado provocado pelo autor era compreendido no âmbito de proteção da norma; c) averiguar se a conduta do autor aumentou o risco permitido e se o comportamento conforme o direito evitaria o resultado.

O autor sugere o exemplo do industrial que fere o dever de cuidado ao entregar a seus subordinados, matéria-prima não desinfetada para seu manejo, provocando a morte de quatro deles. Mais tarde fica provado que, mesmo a correta desinfecção não teria evitado as mortes. [135]

Já analisamos o ponto de vista do autor nos casos em que não há certeza sobre o acontecimento do fato mesmo com a observância do dever de cuidado, em tópico anterior, ao analisarmos a teoria do incremento do risco. O doutrinador afirma que não havendo certeza se a ação produziu um aumento do risco deve-se punir, infringindo o princípio in dúbio pro reo. Atualmente, os defensores do critério do aumento do risco exigem a comprovação desse aumento.

Aqui, Claus Roxin nega a imputação objetiva já que o resultado teria sido produzido da mesma forma, com certeza, no caso de observância do cuidado objetivamente devido pelo sujeito. "No caso, a imputação do resultado está relacionada com a inobservância de um dever de cuidado, totalmente inútil, mantendo-se dentro do risco permitido a não desinfecção do material". [136]

5.2.4 O âmbito de proteção da norma

Toda norma tem um fim de proteção limitador do risco permitido. Esse fim, ou âmbito de proteção da norma deve ser observado nos casos de imputação objetiva.

Analisemos o seguinte exemplo, proposto por Hans-Heinrich Jescheck, de um ciclista que, conduzindo sua bicicleta à noite, seguido por outro ciclista, choca-se com um terceiro ciclista que vinha em direção contrária. O acidente poderia ser evitado caso o segundo ciclista, que estava logo atrás do primeiro, tivesse farol em sua bicicleta e iluminasse o da frente. [137]

Claus Roxin destaca que a omissão do primeiro ciclista originou o risco de uma colisão, o qual se realizou. Da mesma forma, o fato do segundo ciclista não possuir iluminação em sua bicicleta também originou o perigo do primeiro ciclista sofrer um acidente. A diferença entre as duas condutas reside no fato da norma de cuidado exigir a presença de iluminação na bicicleta, não para evitar choques de terceiros, mas sim para sua própria segurança. Dessa maneira, o resultado de lesão ao ciclista da frente não poderia ser imputado ao ciclista de trás.

O doutrinador sustenta que em casos semelhantes o resultado não seria imputável, pois o âmbito de proteção da norma "só abarca danos diretos". [138]

Alguns autores equivocam-se ao afirmar que seria esse o critério aplicável para afastar a imputação nos casos de colocação em perigo de um terceiro voluntariamente aceito por este, nos casos de autolesão e de provocação de suicídios. Dessa forma, eles não fazem a distinção entre o âmbito de proteção da norma e o alcance do tipo. O próprio Claus Roxin não fazia distinção entre os dois critérios, no início. Apenas recentemente recorreu à expressão alcance do tipo.

5.2.5 O alcance do tipo

Acabamos de observar: não há confundir o fim de proteção da norma com o alcance do tipo (ou finalidade de proteção do tipo). Enquanto o primeiro está no âmbito da criação de um risco juridicamente relevante, o segundo está no âmbito de realização do mesmo.

Roxin se utiliza da expressão alcance do tipo para esclarecer que, muitas vezes, a imputação pode fracassar porque o tipo não alcança os resultados característicos indicados no resultado produzido, uma vez que o tipo não se destina a evitar tais acontecimentos. [139]

Na maioria dos casos em que estão presentes a criação do risco não permitido e sua realização no resultado, tem-se que o fato é objetivamente típico. Contudo, quando o tipo penal não visava evitar o dano provocado pelo autor, também pode haver a exclusão da tipicidade. [140]

Apesar da aplicação deste argumento se dar principalmente no campo dos delitos culposos, Claus Roxin apresenta três grupos de casos onde há exclusão da imputação pela falta de alcance do tipo nos delitos dolosos, quais sejam: a contribuição a uma autocolocação dolosa em perigo; a heterocolocação em perigo consentida; e a imputação de um resultado a um âmbito de responsabilidade alheio.

a) a autocolocação em perigo consentida

Existe autocolocação em perigo "se alguém efetua condutas criadoras de um perigo a si mesmo ou se expõe a um perigo já existente". [141]

Analisemos o seguinte exemplo: A desafia B a atravessar um lago de gelo fino e quebradiço. B, ao aceitar o desafio, tenta atravessar o lago e acaba morrendo afogado devido ao rompimento do gelo. A deve ser responsabilizado por homicídio doloso ou culposo?

Claus Roxin baseia sua resposta em uma peculiaridade do Direito Penal Alemão: a participação em suicídio não é punível naquele ordenamento jurídico. No ordenamento jurídico nacional tal argumento não procede já que está tipificado em nosso Código Penal, no art. 122, o auxílio ao suicídio.

Para o doutrinador, "se o mais (a autolesão) pode ser realizado sem punição, com maiores motivos se deve deixar impune o menos (a autocolocação em perigo)". [142] Da mesma forma solucionaria-se o caso de A, policial, que sabe que sua namorada tem a intenção de suicidar-se e, por descuido, deixa uma arma no banco de seu carro. [143]

No mesmo sentido, não é imputável a um traficante a morte por overdose de um de seus clientes, que injetou a heroína comprada. O risco não tolerado e punível apresenta-se aqui pelo tráfico de drogas e não pelo homicídio. Até a adoção da teoria da imputação objetiva pelos tribunais alemães, punia-se o traficante pelo homicídio culposo. Atualmente reviu-se o posicionamento com a adoção do princípio da autocolocação da vítima em perigo.

Quando o autor estiver ciente de que a vítima não sabe dos riscos que sua conduta proporciona a eventual lesão será atribuída a ele como sua obra, esta será punível. [144]

É o caso do exemplo proposto pelos autores do médico contaminado por varíola que continua a exercer sua profissão expondo seus pacientes ao risco de contágio. Para Claus Roxin, o médico é responsável pela transmissão da doença a seus pacientes, já que o tipo de lesões culposas tem a finalidade de prevenir tais condutas. Em relação ao paciente que sabia que o médico estava doente e mesmo assim submeteu-se a tratamento com o mesmo, houve a realização do perigo criado pelo médico, mas o paciente se expunha conscientemente ao perigo. De acordo com o autor, há aqui uma autocolocação em perigo dolosa.

Claus Roxin também cita o exemplo da contaminação pelo vírus HIV. Para o autor se ambos conhecem o perigo de transmissão do vírus através do ato sexual à pessoa que transmitiu não poderá ser imputado o resultado, pois o outro consentiu em se autocolocar em perigo. "Caso diverso ocorrerá, havendo a imputação, se o doente de AIDS oculta sua enfermidade e mantém relações sexuais sem a devida proteção para evitar o contágio". [145]

b) a heterocolocação em perigo consentida

Aqui se analisam os casos em que a vítima não coloca-se em uma situação de perigo mas consente que uma terceira pessoa crie o risco para ela, tendo consciência do mesmo. É um tema amplo e bastante discutível, sendo necessária uma abordagem exclusiva sobre o assunto para maior compreensão.

Como exemplo podemos colocar em pauta o caso do acidente com o helicóptero do empresário João Paulo Diniz que resultou na morte da modelo Fernanda Vogel. O empresário deu ordens ao piloto para decolar no meio de uma tempestade, mesmo tendo sido advertido dos perigos (partindo do pressuposto que a decisão de decolar foi tomada por ambos, o empresário e a modelo).

Exemplo proposto por Claus Roxin é o do passageiro que, com pressa para chegar a determinado destino, pega um táxi e ordena que o condutor do veículo ultrapasse a velocidade máxima permitida e, em decorrência dessa velocidade, acontece um acidente em que o passageiro vem a falecer. [146]

Nos casos supra citados, "a atuação da vítima exclui a tipicidade do agente". [147] Ou, em outras palavras, o agir conjunto da vítima, atuando em interação com o agente exclui a tipicidade do fato.

Segundo a teoria da imputação objetiva o piloto do helicóptero do empresário João Paulo Diniz não deverá ser punido. Destarte, o ordenamento jurídico nacional segue outra teoria, advogando pela responsabilização penal do piloto. Assim, conclui-se que "as culpas não se compensam". Por esse ponto de vista o piloto responderia por homicídio culposo.

c) atribuição do resultado ao âmbito de responsabilidade alheio

O alcance do tipo não abarca os resultados que deveriam ser evitados por um terceiro, ou, em outras palavras, "de acordo com o entendimento de Roxin, a esfera de proteção jurídico-penal não abarca aqueles resultados cuja evitação cairia no âmbito de responsabilidade profissional de outra pessoa". [148] Dessa forma, quando determinada pessoa assume a responsabilidade de evitar o resultado, aquele que inicialmente a detinha não é mais o responsável caso este se produza.

Tomaremos como exemplo, caso proposto por Claus Roxin em que A dirige seu caminhão sem iluminação traseira e, por esse motivo, é interceptado por policiais em uma barreira. Para evitar colisões com carros que possam vir, um dos policiais coloca uma lanterna de luz vermelha na pista, atrás do caminhão, e ordena ao motorista que dirija-se ao próximo posto de gasolina, informando que uma viatura irá logo atrás protegendo o caminhão não iluminado. Ao retirar a lanterna da pista antes de partirem, um veículo atinge o caminhão provocando a morte do passageiro do mencionado veículo. [149]

Segundo o doutrinador, o resultado não pode ser imputado ao motorista do caminhão pelo fato dos policiais já terem assumido o controle da situação.

Da mesma forma resolvem-se os casos de erros médicos que agravam o estado da vítima lesionada por alguém. Exemplo: um motorista dirige de forma imprudente e ocasiona um acidente em que seu acompanhante tem a perna fraturada. O passageiro, ao ser levado ao hospital morre em decorrência de uma intervenção cirúrgica realizada de forma equivocada pelo médico.

Para Claus Roxin exclui-se a imputação, pois o médico substituiu ou não impediu a realização do perigo criado pelo autor. O autor não responde pela morte "se, no curso da operação, um corte errado leva à morte por hemorragia, se forem ministrados medicamentos contra-indicados e que, por isso, provoquem a morte, se, em virtude de um erro de anestesia, sobrevém parada cardíaca etc". Também não é imputado o resultado ao autor se o médico se recusa a tratar o paciente vindo este a morrer em virtude dos ferimentos. [150]

Luis Régis Prado diz que "ao ser o paciente conduzido ao hospital e atendido pelo médico, entra na esfera de responsabilidade deste, que cria e realiza um risco para sua vida". [151] Porém, se o médico atuar devidamente, no caso de uma lesão mais grave que uma simples perna quebrada, observando todos os cuidados, mas mesmo assim o paciente vir a falecer, o motorista responderia pelo delito de homicídio culposo. Isso ocorre, pois o médico não criou um risco mortal e sim não evitou o risco criado pelo motorista.

5.3 SÍNTESE – OS ELEMENTOS DO CRIME DE IMPUTAÇÃO OBJETIVA SEGUNDO CLAUS ROXIN

Claus Roxin apresenta um novo conceito de ação diferente do proposto por causalistas e finalistas. Sua idéia é de que a ação é uma "manifestação da personalidade, ou seja, tudo que se pode atribuir como centro anímico-espiritual a um ser humano". [152] Trata-se de um conceito funcional onde o elemento básico que abrange todos os tipos de ações (sejam elas culposas, dolosas, inconscientes ou inconscientes, ou omissivas) é a manifestação da personalidade. [153] Dessa maneira ficam excluídos do conceito de ação os pensamentos, as atitudes não exteriorizadas e a vis absoluta.

Além disso, apresenta uma nova concepção do tipo. No seu ponto de vista o tipo objetivo "contém, em geral, a descrição do sujeito ativo, de uma ação típica e do resultado que é punido". [154] A parte especial do Código Penal é responsável pela interpretação desses elementos e à parte geral cabe a apresentação de princípios que venham a reger a ação típica. Dentro ainda do tipo objetivo há uma subdivisão entre elementos descritivos (que são os que "revelam os processos naturais e anímicos cognoscíveis") e normativos (onde leva-se em conta o âmbito de proteção da norma, já visto aqui anteriormente). [155] O tipo subjetivo é representado pelo dolo e outros elementos subjetivos adicionais já apresentados pela teoria finalista da ação.

Apontamos anteriormente alguns pontos que, para Claus Roxin, são tratados no âmbito do tipo enquanto outros doutrinadores usam das causas de justificação para negar a antijuridicidade da conduta. [156]

Claus Roxin "atribui à culpabilidade uma idéia de prevenção, que substituiu pela função de responsabilidade no sentido de que esta categoria responde sobre a necessidade jurídico-penal da sanção ao caso concreto". Assim, a conduta que for típica e antijurídica merecerá uma pena "de acordo com os parâmetros do Direito Penal". [157] Essa pena, teria como base a responsabilidade. Para o autor a pena além do aspecto preventivo "deve indicar na pessoa do sujeito a necessidade e adequação da sanção a ser imposta". [158]

Quanto aos elementos do crime, na síntese esclarecedora de Schünemann, Roxin estabelece que a partir da função político-criminal da dogmática, o tipo é associado à determinabilidade da lei penal conforme o princípio do nullun crimen; a antijuridicidade, ao âmbito das soluções sociais dos conflitos e a culpabilidade, à necessidade da pena de considerações preventivas. [159]

Em síntese, "para que um resultado seja objetivamente imputado a determinado comportamento, faz-se necessário, portanto, que este importe em um risco juridicamente desaprovado que se realize no próprio resultado". [160] Além da necessidade de relação de causalidade entre uma pessoa e o resultado é preciso haver a criação e realização de um risco ou perigo não permitido abarcado pelo fim de proteção da norma e pelo alcance do tipo.


6 A IMPUTAÇÃO OBJETIVA DE GÜNTHER JAKOBS

6.1 FUNDAMENTAÇÃO

Muito já se falou sobre a missão do Direito Penal. Para Nilo Batista é a proteção dos bens jurídicos "através da cominação, aplicação e execução da pena". [161]

Segundo Günther Jakobs, essa é uma visão ultrapassada. A missão do Direito Penal, para o jusrista alemão, não é a proteção dos bens jurídicos [162] já que estes estão constantemente expostos. Para ele, a verdadeira missão é "garantir a identidade social" [163] e, para isso, é necessário que as violações da norma sejam punidas.

Para o autor, se o fim do Direito Penal fosse a proteção dos bens jurídicos não haveria como existir legalmente qualquer contato social. No sistema de Günther Jakobs a pena tem a missão de reafirmar a vigência da norma. O jurista parte do princípio de que a sociedade tem a expectativa de que cada pessoa cumprirá o papel que exerce dentro de um padrão pré-estabelecido.

A função da pena, como prevenção geral positiva que visa o exercício de reconhecimento da norma, é exposta com os seguintes aspectos: confiança na vigência da norma, apesar de sua eventual violação; exercício da fidelidade ao Direito, que é a conexão entre o comportamento e o dever de assumir seus custos e, exercício da aceitação de suas conseqüências, que é o reconhecimento de aceitar os custos e conseqüências penais, apesar de apreendida, pela sua violação. Estes aspectos caracterizam o que se denomina de prevenção geral mediante o exercício de reconhecimento da norma, ou seja, a prevenção geral positiva, não intimidatória. [164]

Günther Jakobs defende que a imputação objetiva do comportamento é imputação vinculada a uma determinada sociedade concretamente considerada. Em outras palavras, a sociedade deve determinar quais os riscos que devem ser suportados por ela e, por conseqüência, os que devem ser punidos. Há condutas que, mesmo lesionando bens jurídicos, devem ser suportadas para que não haja uma estagnação das relações sociais.

A aplicação da teoria da imputação objetiva de Günther Jakobs se dá tanto no âmbito dos delitos culposos como nos dolosos.

Günther Jakobs subdivide as normas em dois grupos: as normas ao redor (ou entorno) do social, e as normas diretamente sociais. [165]

As primeiras são aquelas que "se estabilizam por si mesmas, não permitindo qualquer contrariedade, trazendo para quem as viola uma poena naturalis". [166] São normas que observam as leis da lógica e da matemática. Exemplo: dois mais dois são quatro, o ser humano não consegue viver sem oxigênio. Ou seja, são normas que não precisam de tutela jurídico-penal.

As normas diretamente sociais são aquelas em que "a violação não atinge a pessoa que a infringiu ou o grupo, pois as demais pessoas continuam a cumpri-las". [168] Para manter a sociedade em harmonia, as ações que violarem essas normas são sancionadas com uma pena.

6.2 CRITÉRIOS DE IMPUTAÇÃO

Günther Jakobs divide a imputação em dois níveis: o primeiro é a imputação das condutas ou dos comportamentos e o segundo diz respeito à imputação objetiva do resultado. [167]

"A imputação objetiva do comportamento é imputação vinculada a uma sociedade concretamente considerada". [169] O resultado alcançado por uma pessoa e que seja socialmente relevante será interpretado com a afirmação do material, isto é, da imputação objetiva do comportamento.

Sem este material de interpretação, o resultado não é mais do que um conglomerado naturalista, na melhor das hipóteses, algo que o indivíduo perseguia, um curso causal, ou um curso causal psiquicamente sobredeterminado; em todo caso, não é mais que um amálgama heterogêneo de dados que não adquiriram significado social algum. [170]

A imputação do resultado é a relação de uma conduta típica e um resultado por meio de leis gerais específicas ou ditadas pela experiência. Sendo assim, na imputação do resultado irá se constatar se a produção do resultado tem relação com a realização do risco típico ou não. [171]

Primeiramente há a qualificação do comportamento como típico (o que seria a imputação do comportamento) para então, no âmbito dos delitos de resultado, coconstatr-se que o resultado produzido "se explica precisamente pelo comportamento imputável (imputação objetiva do resultado)". [172]

Dentro do primeiro nível o doutrinador propõe quatro critérios de imputação que devem ser observados.

6.2.1 O risco permitido

Já foi apontado acima que qualquer contato social cria um risco mesmo com os indivíduos agindo de boa-fé. Da mesma forma restou demonstrada a visão de Günther Jakobs acerca do tema, concluindo que se todos os contatos sociais fossem evitados teríamos uma estagnação no convívio social. [173] Para ilustrar o doutrinador cita os exemplos do tráfego de veículos, de um aperto de mão que pode transmitir uma infecção, etc.

O risco permitido para ele, nada mais é do que "o estado normal de interação, ou seja, o status quo de liberdades de atuação vigentes, desvinculado da ponderação de interesses que deu lugar ao seu estabelecimento". [174] Ou, em outras palavras, o risco permitido seria aquele "vinculado à configuração da sociedade"; seria uma concreção da adequação social. [175] Resumindo: a vida social não se configura sem a permissão de certos riscos.

O autor descarta a configuração do risco permitido como resultado do cálculo entre custos e benefícios. Günther Jakobs prefere usar como fonte do risco permitido a configuração da sociedade, uma vez que cada uma tem suas particularidades (influências históricas, culturais, geográficas) que irão tornar um risco qualquer em um risco permitido ou proibido.

Dentro do contexto o doutrinador aduz que o risco permitido é necessário para a liberdade de cada um dentro da sociedade. Entretanto, a contraprestação desse benefício de liberdade não deve ser suportada por indivíduos determináveis. Em outras palavras, todas as vítimas de condutas que geram um risco permitido devem ser anônimas. Ilustrando a explanação o Günther Jakobs cita o seguinte exemplo: "se ex ante se conhecesse a identidade das vítimas que o tráfego viário vai ocasionar num determinado dia, seria impossível que nesse dia o tráfego se desenvolvesse como atividade juridicamente permitida". Só pode haver um risco permitido se as vítimas potenciais sejam, além de vítimas, potenciais beneficiárias que a atividade proporcione. O risco deixa de ser permitido quando a própria norma o define assim. O tráfego de veículos é permitido desde que respeitadas as normas de trânsito. [176]

É eficaz a distinção do autor entre risco permitido e causas de justificação. Para Günther Jakobs "um comportamento que gera um risco permitido é considerado socialmente normal, não porque no caso concreto esteja tolerado em virtude do contexto em que se encontra, mas porque nessa configuração é aceito de modo natural". [177] Os comportamentos que criam riscos permitidos não são típicos. Não há falar em causas de justificação já que a tipicidade não é afirmada.

O autor conclui que comportamentos que ensejam riscos permitidos não estão dentro de um contexto especial para serem tolerados. Por outro lado, é isso que ocorre no âmbito da justificação onde comportamentos que per si são perturbadores restam admitidos.

Um indivíduo que se comporta dentro de padrões estabelecidos pela norma ou pela lex artis [178] está dentro dos limites do risco permitido. Günther Jakobs cita que há âmbitos de vida que não podem ser regularizados por um padrão de comportamento. Cita o exemplo do médico em que normas acabariam por impedir o desenvolvimento de novas técnicas e procedimentos para a cura de pacientes. Nesse sentido o padrão de comportamento não estaria limitado por normas de direito e sim pela lex artis. É o caso das normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) e das associações profissionais como a OAB, CREA (Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia) e CRM (Conselho Regional de Medicina). Dessa forma, o comportamento apresenta-se atípico para o Direito Penal.

Se alguém cria um risco permitido não haverá sequer tentativa. Na problemática do risco permitido há dois problemas cruciais: por um lado a grande relevância que Jakobs concede às normas extrapenais e às regras da técnica para a determinação do permitido numa determinada sociedade, e a relevância dos ‘conhecimentos especiais’de que disponha o autor. [179]

Destarte, existem situações em que o indivíduo não cumpre as determinações da norma desviando sua conduta do padrão esperado, porém tomando cuidados ou medidas de segurança especiais não exigidas pelo Direito, de forma a compensar esse comportamento perigoso. Mas, essas compensações tornariam a conduta do autor que não se encontra dentro dos padrões de risco permitido, adequadas?

Segundo Günther Jakobs, as condutas que são proibidas pelas normas de Direito não admitem compensações. Assim, mesmo quando são tomados cuidados especiais, o risco é proibido. [180]

O autor cita o exemplo do motorista experiente que, conduzindo um automóvel dentro do limite de velocidade, mesmo que ligeiramente ébrio, induz maior segurança do que um principiante inseguro que não comete erro algum. O comportamento do motorista experiente não é permitido pois a proibição da colocação abstrata em perigo discrimina não um determinado nível de risco mas sim um tipo de comportamento. O autor aduz ainda que "no âmbito do regulado pelo Direito, não existe um grau fixo de permissão geral para levar a cabo colocações em perigo, mas a permissão está vinculada à configuração do comportamento". [181]

Quando não há normas jurídicas a questão difere do seguinte modo: as demais normas determinam um padrão que se pode alcançar de qualquer maneira, tanto levando-se em conta o descrito na norma, como de maneira diversa.

Para ilustar sua explanação o doutrinador apresenta o exemplo do indivíduo que constrói um muro com espessura menor que a recomendada, porém com um material mais resistente.

Nessa seara encontra-se a discussão doutrinária mencionada anteriormente: "Quem decidirá quando um comportamento é do tipo que se proíbe ordinariamente e quando concorrem condições ideais para sua realização"? [182]

Para o autor não prospera atribuir essa decisão ao juízo do homem cuidadoso. Günther Jakobs analisa duas hipóteses: a) na primeira, a qual o doutrinador discorda, coloca-se no lugar do autor que criou o risco uma pessoa dita expert na matéria relativa ao caso concreto e que deve estar preparado por todos os conhecimentos e aptidões especiais do autor. O doutrinador, de forma pejorativa, fala que dessa forma estaríamos diante de um verdadeiro monstro, posto que jamais haverão dois sujeitos completamente semelhantes; b) a segunda hipótese diz respeito a administração de padrões objetivos em suas distintas concreções, predeterminados pela sociedade, e, inclusive, às vezes estabelecidos juridicamente.

Segundo o doutrinador a valoração do risco é relativa ao papel que o autor está exercendo. Dessa forma um médico que não utiliza materiais esterilizados para realizar um curativo não está exercendo seu papel de acordo com as expectativas da sociedade além de não seguir os procedimentos de sua lex artis, configurando esse risco como proibido. [183]

O autor da conduta que não observou as normas jurídicas criou um risco proibido e, a princípio, uma ação típica. Nos casos em que não existirem normas jurídicas leva-se em consideração o juízo do portador de um papel para saber se a ação foi criadora de um risco especial e se expôs alguém a um risco que exceda o cotidianamente inevitável. Günther Jakobs tenta elucidar a questão através do seguinte exemplo: Um médico, na realização de um curativo, deve esterilizar o local do ferimento utilizando materiais limpos a fim de evitar infecções na área machucada. Esse é o papel que a sociedade espera de um médico. Por outro lado, não espera-se o mesmo comportamento de uma mãe que faz um curativo com tecido para estancar o ferimento de seu filho. No caso em tela a mãe estará agindo dentro do risco permitido porque não tem conhecimentos especiais de primeiros socorros, principalmente se inserido em uma sociedade pouco desenvolvida e sem noções de higiene básica como em países pobres. [184]

Günther Jakobs assevera "que a um único risco descrito de modo naturalista não necessariamente lhe corresponde, por sua vez, um único risco permitido". [185] Podem haver várias permissões de riscos diferentes quanto papéis diversos existam em que se possa administrar o risco de modo socialmente adequado. A figura do expert é aplicada quando o papel exige certa especialidade, como por exemplo no caso de um engenheiro químico ou um neurocirurgião no desempenho de suas funções.

A figura do expert é aplicada quando o papel exige certa especialidade, como por exemplo no caso de um engenheiro químico ou um neurocirurgião no desempenho de suas funções.

É exatamente no âmbito do risco permitido que se encontra o ponto mais controverso da teoria da imputação do autor alemão: "ele descarta, na análise do risco, quaisquer conhecimentos especiais do autor (obviamente quando o papel exercido não exigir tais conhecimentos) que possam ajudá-lo a prever o resultado lesivo". [186] O fundamento apresentado pelo autor é o de que, nas situações em que a sociedade não exigir os conhecimentos especiais para o exercício do papel em questão, não é obrigação de ninguém possuí-los. E para ilustrar sua fundamentação, utiliza-se do exemplo do engenheiro, que ao alugar um automóvel, descobre, através de seus conhecimentos técnicos específicos, que os freios falharão em breve. Apesar disso, devolve o veículo ao locatário e o próximo cliente, ao usar o carro, sofre um acidente. Para o autor, o engenheiro não violou o seu papel e, no caso em tela, seu comportamento não ultrapassou o nível do risco permitido. O autor aduz que "ninguém espera de quem aluga um automóvel que tenha conhecimentos em matérias técnicas". [187]

Então, na visão do jurista, ninguém tem obrigação de adquirir ou manter os conhecimentos especiais sobre algo, tratando-se de algo subjetivo. No exemplo apontado, do engenheiro, o autor diz que no momento em que ele constata o problema encontra-se no papel de arrendatário do automóvel e, por isso, não é garante na hora de devolver o veículo de que o mesmo esteja "livre dos danos que se geraram à margem de seu comportamento". [188]

Cabe aqui, verificarmos a afirmação de Günther Jakobs sobre o tema:

O autor pode entregar-se à maior das mínimas distrações que lhe impede adquirir o conhecimento especial, e pode licitamente esquecer-se subitamente de algo que um dia chegou a conhecer. Explicando de outro modo, a relevância jurídico-penal dos conhecimentos especiais ficaria limitada aos conhecimentos efetivamente existentes, é dizer, ao dolo. Entretanto, um conhecimento sem o respectivo dever de conhecer seria um elemento não jurídico do delito, ao estar definido de maneira totalmente psicológica. [189]

O doutrinador vincula os conhecimentos especiais ao dolo, e cita o exemplo de um garçom que, ao perceber que há uma fruta venenosa no prato que irá servir, aguarda até que chegue ao restaurante uma pessoa a quem odeia. No caso, o autor desvia o curso do destino, convertendo-o em "objeto de sua organização, pelo que responderá pelas conseqüências". [190]

O penalista alemão argumenta que deve-se levar em conta os conhecimentos especiais do autor quando houver certa vinculação entre ele e a vítima. Cita essa vinculação através de duas situações: a vinculação através de uma instituição da sociedade e por uma obrigação organizacional. Em relação à primeira situação usa-se o exemplo do médico que ao realizar um curativo no filho deve observar técnicas inerentes à sua profissão. Na segunda hipótese temos o exemplo do dono de um automóvel que sabe que seu freio não está funcionando corretamente e, dessa forma, deve buscar a correção do problema, pois a sociedade espera que ele observe os padrões de segurança ditados por ela.

Assim, "uma mãe que trabalha como médica não deve ativar unicamente os conhecimentos correspondentes a uma mãe normal se seu filho adoece". [191]

6.2.2 O princípio da confiança

O princípio da confiança elaborado por Günther Jakobs baseia-se na seguinte proposição: "quando o comportamento dos seres humanos se entrelaça, não faz parte do papel do cidadão controlar de maneira permanente a todos os demais; de outro modo, não seria possível a divisão do trabalho". [192]

O princípio da confiança baseia-se na recém citada divisão do trabalho. Cada qual é responsável pelo correto cumprimento do papel que exerce na sociedade e pode esperar que, da mesma forma, o outro também o seja.

O penalista germânico apresenta duas modalidades de aplicação deste princípio. A primeira hipótese está relacionada com a situação em que o autor cumpre o seu papel confiando na ação anterior de um terceiro. [193] Para ilustrar utilizamo-nos do exemplo do médico cirurgião que confia no trabalho dos auxiliares responsáveis pela esterilização dos equipamentos. Se por acaso o responsável não esterilizar corretamente os equipamentos o resultado lesivo decorrente do fato não pode ser imputado ao médico. A expressão autor, aqui, refere-se ao autor da conduta inofensiva que posteriormente é desviada por um terceiro e não ao autor de um fato criminoso, este sim, responsável pela conduta típica.

A segunda hipótese é relativa ao autor que inicia uma tarefa em observância às normas jurídicas e/ou sociais que são exigidas e, por isso, não é responsável pela forma incorreta que um terceiro dá continuidade a sua obra. [194] Basta inverter os papéis do exemplo anterior. O anestesista que observa as normas jurídicas e inerentes à sua lex artis não responde pelos danos causados ao paciente se o médico age de forma irresponsável.

Conclui-se das duas hipóteses apresentadas que "não pode haver regresso de responsabilidade na direção daquele que se comportou de forma socialmente adequada ou de acordo com o risco permitido numa determinada atividade". [195]

Existem restrições óbvias ao princípio da confiança. É o caso de haver motivo para não se confiar na ação do terceiro ("quando se pode ver que a outra parte não faz, ou não fez, justiça à confiança de que cumpriria as exigências de seu papel"). [196] Cite-se aqui, uma pessoa que encontra-se embriagada, por exemplo.

6.2.3 A proibição de regresso

Uma particularidade da teoria da imputação objetiva de Günther Jakobs é desenvolvê-la no âmbito da "tradicional teoria da autoria e participação". [197]

Exatamente por ser uma contribuição particular do jurista à objetivação do tipo, que supõe um interessante campo de discussão para a ciência penal, infelizmente, devido a amplitude do tema, não será possível analisar nos mínimos detalhes todas as nuances que envolvem tal assunto.

"Quem assume com outro um vínculo que de modo invariavelmente considerado é inofensivo, não viola seu papel como cidadão, ainda que o outro incorpore esse vínculo numa atividade não permitida". [198] A proibição de regresso conclui que um comportamento considerado inofensivo e dentro do risco permitido não pode constituir uma participação em uma atividade não permitida. Não há falar em imputar o resultado lesivo ao sujeito que exerceu sua atividade de forma regular.

Para o jurista alemão há proibição de regresso mesmo nos casos em que o autor da conduta inofensiva sabe da pretensão criminosa de um terceiro. Há uma grande controvérsia doutrinária referente à essa questão: o penalista Fernando Galvão (in Imputação Objetiva. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002) aduz que o correto seria imputar o resultado ao autor da conduta inofensiva seja como co-autor ou como partícipe. Segundo Günther Jakobs se um padeiro vende um pão para seu freguês, mesmo sabendo da intenção do mesmo em envenenar o produto com ânimo de matar alguém, ao padeiro não será imputado o resultado morte. Para o autor ou uma ação é inofensiva ou não é. A partir do momento em que o padeiro, no caso em tela, agiu de acordo com as normas e padrões de comportamento não interessa como o terceiro irá agir posteriormente. O conhecimento do padeiro de que o seu cliente irá usar o pão para envenenar outra pessoa não muda a valoração de seu comportamento de inofensivo para ofensivo.

O sujeito que "realiza algo que seja invariavelmente considerado socialmente adequado não responde, e isso independentemente do que pense e conheça". [199]

Violaria seu papel social, aquele sujeito que "não mantém sob controle objetos perigosos, especialmente quando faz entrega deles ou quem adapta seu comportamento na planificação delitiva de outra pessoa". [200] O autor apresenta em sua obra o exemplo de uma loja que vende artigos para jardim. Ora, isso é algo inofensivo mas, a partir do momento em que desenvolve-se uma luta violenta diante da loja e pessoas feridas que participaram da luta entram no recinto buscando a entrega imediata de uma enxada, o autor afirma que pode ser que as coisas sejam distintas. Neste aspecto leva-se em consideração o caráter subjetivo do fato.

Günther Jakobs conclui que "um comportamento é acessório quando constitui um motivo para imputar o ato executivo realizado pelo autor. No demais, vigora uma proibição de regresso". [201] A pessoa que se adequar ao plano delitivo do autor dá vazão para que o ato executivo lhe seja imputável.

A proibição de regresso é um tema que suscita discussões. Dois dos discípulos de Günther Jakobs, Derksen e Lesch estão tentando desenvolver a questão.

6.2.4 A competência da vítima

O desvio danoso do papel que cada qual cumpre dentro da sociedade faz com que o resultado lesivo seja imputado ao autor da conduta. Às vezes o contato social não é de competência só do autor, mas também da vítima.

Podemos citar duas ocasiões distintas: a primeira é quando o "próprio comportamento da vítima fundamente que se lhe impute a conseqüência lesiva". [202] A segunda hipótese refere-se aos casos em que a vítima, por obra do destino, encontra-se nessa situação. Nestes casos estamos diante de uma competência da vítima. [203]

O doutrinador cita o consentimento como o caso mais conhecido de competência, ou capacidade, da vítima. Porém, como exposto logo acima, isso pode ocorrer por simples infortúnio da mesma.

Segundo seguidores da teoria finalista da ação, nos crimes em que o bem jurídico seja disponível, a competência da vítima deverá ser analisada no âmbito da antijuridicidade, como uma causa excludente da ilicitude. Para Günther Jakobs e os seguidores do funcionalismo, a mesma deverá ser analisada já no âmbito da tipicidade.

Na Alemanha, como a participação em suicídio não é punível, podemos trasladar essa visão aos crimes nos quais o bem jurídico seja indisponível. No caso do ordenamento jurídico nacional isso não é possível haja vista que a hipótese está tipificada no art. 122. Magalhães Noronha afirma que "embora não seja crime, o suicídio é antijurídico, pois a vida humana é um bem indisponível. Se fosse lícito não se admitiria, mesmo, a punição daquele que induz, instiga ou auxilia o suicida em seu gesto tresloucado". [204]

O fundamento básico do pensamento do jurista alemão é que a vítima não pode "assumir um contato social arriscado sem aceitar como fruto de seu comportamento as conseqüências que conforme um prognóstico objetivo são previsíveis". [205]

Nesse sentido, é mister citar as palavras de Reyes Alvarado: "Quem, dentro de seu âmbito de competência se expõe a um perigo do qual pode resultar para si mesmo conseqüências negativas assume integralmente a responsabilidade por referidos efeitos." [206]

Exemplo bastante discutido dentro da doutrina atual é o do contágio do vírus HIV [207] através de relação sexual com uma pessoa que se prostitui ou que usa drogas. Günther Jakobs assim reflete sobre a questão:

No que diz respeito a este último caso, ainda há algumas questões pouco claras; nesse sentido, por exemplo, não está claro se a vítima unicamente atua a próprio risco quando não só conhece o modo de vida arriscado, mas também a infecção com o vírus da AIDS, ou, se, pelo contrário – como creio que é correto -, há uma ação de próprio risco quando conhece determinadas condições sob as quais uma pessoa cuidadosa contaria que existissse uma probabilidade de contágio superior à medida que esteja presente a enfermidade. [208]

Segundo o doutrinador não estão claras quais são as condições de competência da vítima que excluem de maneira total a competência do autor, e "quando existe algo parecido a uma concorrência de culpas jurídico-penalmente relevantes que diminui a responsabilidade do autor sem eliminá-la por completo". [209] Günther Jakobs diz que é necessário determinar se a vítima desempenhou papel de vítima ou se desempenhou o papel de alguém que atuou com próprio risco.

6.3 SÍNTESE – OS ELEMENTOS DO CRIME DE IMPUTAÇÃO OBJETIVA SEGUNDO GÜNTHER JAKOBS

Apresentamos anteriormente a visão do doutrinador Claus Roxin acerca dos elementos do crime. Resta-nos agora analisar como Günther Jakobs conceitua a ação, o tipo, a antijuridicidade e a culpabilidade.

O conceito de ação apresentado por causalistas no início do século XIX foi definido por Von Liszt e Ernest Von Beling como sendo uma modificação no mundo exterior produzida de forma voluntária através de um movimento corporal consistente num fazer ou não fazer (omissão). [210]

A teoria finalista apresentou um conceito ontológico de ação baseado no pensamento welzelniano, afastando o conceito naturalístico ou causal e estabelecendo que a ação é um fazer final.

A visão finalista já não é mais vista como um sistema irretocável. Várias críticas foram elaboradas em torno do "conceito de ação final dirigida voluntariamente a um resultado pretendido". [211] Essas críticas possibilitaram o surgimento de novos conceitos de ação, e um deles é o apresentado por Günther Jakobs. [212]

O doutrinador alemão conclui que o erro da doutrina finalista é vincular o conceito de ação somente às propriedades do ato executado, dessa forma não há menção à questão das alternativas do autor. Para ele, ação é a causação de um resultado inevitável individualmente. [213] Partindo dessa idéia, vislumbra-se a impossibilidade da pessoa jurídica praticar ações já que:

[...] o relevante para o injusto penal não é a ação, mas um conceito que determine o que é o sujeito e o que é a ação. Neste sentido, o mundo exterior para o sujeito e o vínculo deste com o mesmo, caso de imputação, se tornam elementos de análise. A capacidade individual para dirigir a ação, como expressão de sentido individual, não é uma questão de propriedades psíquicas, ou de outro tipo, mas saber-se o que é um sujeito e quando pode ser responsabilizado pelos resultados de sua organização. [214]

O conceito de ação do autor está ligado à missão do Direito Penal na sua visão, qual seja, garantir a liberdade da sociedade. Assim, toda conduta que for contrária à norma terá por conseqüência uma pena.

Esse conceito de ação engloba tanto o comportamento culposo como o doloso e a omissão.

No campo do tipo penal, o autor aduz que o tipo objetivo é "a parte externa do delito", sendo o tipo subjetivo "as circunstâncias que possibilitam a conversão de um tipo objetivo em ação típica". [215] Cabe à parte especial a interpretação dos tipos objetivos que descrevem as ações que não são toleradas/permitidas pela sociedade. Surge o tipo subjetivo no instante em que há a exteriorização de uma ação para atingir determinado resultado.

Para Günther Jakobs o conhecimento do injusto não faz parte do dolo ou da culpa stricto sensu, pertencendo à culpabilidade.

O jurista classifica as ações que não são antijurídicas em duas espécies: a) as ações irrelevantes para o ordenamento jurídico (ex: tiros para o alto) e b) as que apesar de apresentar características de condutas antijurídicas são permitidas pela sociedade (ex: estado de necessidade). [216]

A recondução das causas de justificação para o âmbito do tipo é baseada nos seguintes princípios: a) princípio da responsabilidade; b) princípio de definição de interesses por parte da própria vítima da intervenção; c) princípio da solidariedade. Sobre esses princípios, e com maiores detalhes, faz-se necessário um estudo mais aprofundado na própria obra do autor (JAKOBS, Günther. Derecho Penal – Fundamentos y teoria de la imputación. Trad. Joaquim Cuello Contreras e José Luis Serrano Gonzáles Murillo. Madri: Marcial Pons, Ediciones Jurídicas, 1997). Haja vista a complexidade de tal tema, não nos ocuparemos de maiores explanações.

Günther Jakobs estabelece à culpabilidade uma função de prevenção geral. Para ele, a função da pena é a de "estabilizar o ordenamento". [217] Quando o indivíduo não cumprime a norma a qual se submete, é imputada ao mesmo uma culpabilidade que se evidencia na pena.

"Enquanto para Roxin, por exemplo, a imputabilidade apresenta uma base empírica, de possível verificação no plano psíquico, Jakobs rotula como ‘culpabilidade’ uma série de exigências preventivo-gerais". [218]


7. DA POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA NO ORDENAMENTO JURÍDICO NACIONAL

No âmbito do nexo de causalidade, verificamos a aplicação da teoria da equivalência das condições pelo nosso legislador quando do estudo do art. 13 e de seus parágrafos 1º e 2º do Código Penal Pátrio.

Na Alemanha, onde estão os maiores expoentes em matéria de imputação objetiva, não verificamos tal peculiaridade. Sendo assim, indaga-se: Seria possível a aplicação dos fundamentos da imputação objetiva dentro do ordenamento jurídico nacional?

Essa indagação já encontra resposta dentro de nossa jurisprudência. Apesar da pequena, e muitas vezes equivocada, divulgação de tal teoria dentro da doutrina nacional, [219] (podemos citar poucas obras que traduzem fielmente o pensamento dos autores alemães), já temos antecedentes em nossos tribunais. [220]

7.1 CRÍTICAS À IMPUTAÇÃO OBJETIVA

Em nossa doutrina encontramos algumas críticas ao pensamento funcionalista.

Na visão de Luiz Regis Prado e Érika Mendes de Carvalho o dolo representa um pressuposto da imputação objetiva visto que o tipo subjetivo é anterior ao tipo objetivo pois o segundo é o objeto do primeiro e apenas por razões didáticas o tipo objetivo deve ser explicado antes do tipo objetivo. Os autores aduzem que "é imperioso que se parta do tipo subjetivo para se saber qual o tipo objetivo efetivamente realizado, visto que este último não se trata de mera causação de um evento no mundo exterior, mas produto de uma ação finalista dirigida e controlada pelo sujeito". [221] Os funcionalistas dizem que o tipo objetivo não se trata somente de mera causação de um evento no mundo exterior. Para eles a realização do tipo objetivo não está limitada à causalidade.

7.2 A IMPUTAÇÃO OBJETIVA EM RELAÇÃO AO ART. 13 DO CÓDIGO PENAL

O objeto de estudo da imputação objetiva é a análise da relação entre um fato e um resultado, nos crimes de resultado (dolosos ou culposos) ou, quanto aos crimes formais e os de perigo (observadas suas peculiaridades), é a "constatação de um fato decorrente de um agir comunicativo que pode ser ligado a uma ação, no sentido de modificação exterior do mundo social". [222]

A relação de causalidade, como já visto anteriormente, não encerra o tipo objetivo como pensavam os causalistas. Dessa forma o art. 13 não pode ser encarado como um obstáculo à aplicação da teoria da imputação objetiva no ordenamento jurídico brasileiro.

Basta analisar com cautela: na teoria de Claus Roxin, os critérios por ele estabelecidos para constatar a imputação objetiva são a determinação do risco, o âmbito de proteção da norma, a proibição de regresso e a conduta da vítima. Esses critérios só serão aplicados se estiverem presentes:

a) a existência de uma ação que determinou um resultado, e a existência de um fato, de acordo com a teoria da equivalência das condições. No caso do Direito Penal brasileiro, é o art. 13 do Código Penal; b) a presença de um risco não permitido pelo sistema social; e c) o fato tenha característica de um tipo penal, na forma do ordenamento jurídico. [223]

O art. 13 do Código Penal pátrio abre a possibilidade para que se insiram novos pressupostos de imputação, ou de realização do tipo objetivo. "Uma vez constatada a presença de um fato com a comprovação dos itens descritos, passa-se à verificação, através da imputação objetiva, da possibilidade de reprovação deste fato que será imputado como decorrente da ação de determinada pessoa". [224] Para Antonio Luís Chaves Camargo não se deve abandonar a teoria da equivalência das condições ao utilizar a imputação objetiva como método de análise do fato típico relevante ao ordenamento jurídico-penal.

A imputação objetiva introduziu ao tipo, elementos normativos para atender aos fins do Direito Penal. A causalidade, como já demonstrado, nada mais é do que um pressuposto da imputação objetiva. Dessa forma, a adoção da teoria da equivalência das condições (conditio sine qua non) no art. 13 do Código Penal Nacional em nada influencia a recepção da teoria da imputação objetiva. O art. 13 não determina que a realização do tipo encerra-se na causalidade.

Ao redigir o § 1º do referido artigo, a idéia do legislador foi a de limitar o alcance da teoria da equivalência e, baseado nele, criou-se as teorias das concausas antecedentes, supervenientes e concomitantes.

A imputação objetiva veio para facilitar a compreensão das diversas nuances do curso causal, imputando ao autor apenas o que resultar de sua obra. Da mesma forma que o caput do artigo, seu § 1º tampouco deve ser visto como um obstáculo à recepção da imputação objetiva em nosso ordenamento. [225]

Luís Greco conclui que a função do art. 13, § 1º do Código Penal é a de ser "o dispositivo com base no qual a moderna teoria da imputação pode encontrar um ponto de apoio legislativo expresso". [226] Dessa forma, o art. perde a função de ser o fundamento legal da (complexa) teoria das concausas.

Comprovar-se-á a possibilidade de aplicação de alguns aspectos da imputação objetiva em um julgado da 2ª Câmara Criminal de Belo Horizonte, o que demonstra que a teoria é um avanço no desenvolvimento de um novo Direito Penal, voltado aos novos paradigmas de uma sociedade que não pára de evoluir.

7.3 A APLICAÇÃO DA TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA

Para analisarmos melhor a aplicação da teoria da imputação objetiva no âmbito nacional, é mister analisar três exemplos retirados da jurisprudência nacional e propostos por Luís Greco, na introdução da obra de Claus Roxin. [227] A análise dos julgados serve para que se demonstre a importância prática de tal teoria que, ainda que não acabada, já oferece à jurisprudência vários aspectos importantes e que já podem ser aplicados.

a) Um paciente, vítima de lesões corporais, é anestesiado com excessiva quantidade de éter sulfúrico. Como conseqüência vem a falecer em virtude de um choque anestésico que teve por conseqüência uma síncope cardíaca.

Aqui, o autor da lesão corporal foi condenado por homicídio consumado. O argumento apresentado pelo tribunal foi o de que, aplicando a teoria da equivalência das condições, não importa se os médicos foram imprudentes. [228] A aplicação da teoria da imputação objetiva nos levaria a uma solução mais justa. O risco não permitido criado pelo autor seria substituído pelo risco criado pelo anestesista. O resultado morte decorreu da realização deste segundo risco proibido (o anestesista não observou a lex artis inerente à sua profissão). Dessa maneira o autor da lesão corporal deve responder por tentativa de homicídio enquanto o anestesista responderia por homicídio culposo. O Tribunal de Justiça de São Paulo condenou o réu por homicídio, pois segundo a aplicação da teoria da equivalência das condições está presente o nexo de causalidade. Já foi visto anteriormente que para a teoria da imputação objetiva, o nexo de causalidade é só mais um elemento do tipo e não encerra o tipo objetivo. Os julgadores não observaram se houve ou não a realização de um risco não permitido e a realização do mesmo no resultado.

b) O réu fere culposamente uma pessoa, que sofria de diabetes, e essa vem a falecer. A perícia constatou que a lesão (fratura/luxação) poderia ser uma concausa.

O tribunal condenou o réu por homicídio culposo. O argumento dos julgadores foi que "pouco importa que a condição de diabético do ofendido haja concorrido para a produção do resultado com preponderância para a conduta dos apelantes". [229] Segundo o julgador as causas preexistentes e concomitantes relativamente independentes não excluem o resultado.

Aplicando a teoria da imputação objetiva, chegamos a uma solução diversa. A situação da vítima não era passível de previsão pela vítima em um momento ex ante do fato. Há o nexo de causalidade entre a conduta e o resultado, visto que a conduta do réu, culposa, criou um risco de produzir lesões e se realizou no resultado, olhos postos na fratura/luxação que a vítima sofreu. Ocorre que o falecimento se deu, não pelo risco não permitido criado pelo autor da conduta e sim pela doença da vítima. Dessa forma, a morte da vítima não poderia ser atribuída ao autor da conduta por ser fruto do acaso, ou, em outras palavras, do infortúnio da vítima.

c) O réu dispara contra a vítima que vem a falecer, não em razão dos tiros, mas sim em virtude de uma parada cardíaca.

Os julgadores condenaram o réu por tentativa de homicídio pelo fato do mesmo desconhecer a doença da vítima. [230] Assim, o evento morte não pode ser imputado ao réu.

Apesar do resultado estar correto, o argumento usado pelos julgadores foi equivocado. O disparo da arma foi a causa do problema cardíaco sofrido pela vítima, já que, eliminando-se a conduta do autor, a vítima não viria a falecer. Qualquer outro julgador poderia argumentar que a conduta foi conditio sine qua non estaria presente o resultado.

Aplicando-se a imputação objetiva, a conclusão seria a mesma do tribunal, porém com sólidos argumentos, enquanto, no caso, o réu foi condenado por tentativa sem nenhuma explicação plausível. O risco não permitido criado pelo autor (da vítima vir a falecer por ferimentos decorrentes do projétil) não se realizou no resultado o que leva à conclusão que o réu deve ser condenado por homicídio culposo.


CONCLUSÃO

A Imputação Objetiva representa uma nova dogmática, revolucionária em vários aspectos, que procura solucionar de maneira concisa questões ainda sem resposta dentro do ordenamento jurídico-penal.

Ainda é cedo para afirmar que a Imputação Objetiva superou o Finalismo, afinal não se trata de uma teoria concluída já que, como vimos, são vários os caminhos metodológicos buscados por seus seguidores. Do funcionalismo radical proposto por Günther Jakobs à Política Criminal Funcionalista de Claus Roxin ainda há muitas diferenças e nuances que precisam ser compiladas em um único sistema, o que possivelmente ocorrerá no futuro. A Imputação Objetiva, apesar de ainda não ser uma teoria acabada já nos trouxe uma nova visão do tipo penal.

O Funcionalismo trouxe ao tipo novos elementos para que se possa afirmar, com maior precisão, a imputação de um resultado ao autor de determinada conduta. Graças a algumas idéias desenvolvidas por seus seguidores já não somos escravos das teorias do nexo de causalidade, que não nos traziam soluções plausíveis para os problemas de imputação. Pelo contrário, vislumbrou-se inclusive a possibilidade de aplicação dessa moderna teoria em nosso ordenamento jurídico sem alteração no texto do controverso art. 13 de nosso Código Penal. Como? Ora, na visão dos dois juristas alemães que foram apresentadas, percebeu-se claramente que o nexo causal não passa de um pressuposto da imputação objetiva.

O tipo subjetivo mantém a estrutura criada pelo pensamento Finalista ainda que não lhe seja dada tamanha importância.

Ambas as visões funcionalistas tem suas falhas, porém seus méritos também são evidentes. Não podemos mais nos limitar à idéia de que a missão do Direito Penal é a proteção dos bens jurídicos.

As críticas à Imputação Objetiva por vezes são válidas, outras não tem fundamento algum. De qualquer forma, a discussão acerca do tema em âmbito nacional pode levar renomados doutrinadores, estudantes de direito e juristas à construção de um sistema que se adapte perfeitamente em nosso ordenamento jurídico ao invés de apenas repetirmos a dogmática penal alemã.


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ANEXO A – INTEIRO TEOR DO ACÓRDÃO PROFERIDO NA APELAÇÃO CRIMINAL Nº 356.212, DA 2ª CÂMARA CRIMINAL DE BELO HORIZONTE

Apelação Criminal n. 356.212, Belo Horizonte, 2ª Câmara Criminal.

Apelante: Ministério Público

Apelados: H.H.B. e H. P.A.H.

Data do julgado: 14 de maio de 2002.

Relator: Juiz Antônio Armando dos Santos

2º Vogal: Juiz Alexandre Victor de Carvalho

Unânime

Excertos do acórdão

"VOTOS – O Exmo. Sr. Juiz Antônio Armando dos Anjos: Quanto aos fatos, narra a denúncia de f. 2-6 que os réus agiram de forma negligente ao administrar a unidade industrial da M., situada no Barreiro, local em que foram vítimas os menores D.S.V., M.J.F.L., e C.R.S., lesionados por queimaduras de 2.º e 3.º graus, sendo que o último, não resistindo aos ferimentos, veio a falecer. Segundo a inicial acusatória, aos 26.7.1996, D.S.V., de dez anos, adentrou o terreno da empresa dos réus, objetivando resgatar uma ‘pipa’, o mesmo ocorrendo com os menores M.J.F.L. e C.R.S. em data de 31.7.1996. Não obstante o terreno ser de grande perigo, já que formado por rescaldo (moinha) de carvão incandescente – derivado do processamento de ferro gusa – o local não era devidamente sinalizado ou vigiado, possibilitando a entrada de estranhos na empresa, como ocorreu com os menores. Adentrando o terreno, as vítimas menores se depararam com uma camada de significativa espessura sobre o solo, mas em combustão espontânea em seu interior, que foi a causa eficiente para as queimaduras experimentadas".

(...)

Em suma, é o relatório.

(...)

O Exmo. Sr. Juiz Antônio Armando dos Anjos:

NO MÉRITO

(...)

A partir dos elementos fáticos destacados pelo Parquet, postos à análise segundo um ponto de vista meramente lógico-formal das categorias dogmáticas do Direito Penal, poder-se-ia sustentar a tese condenatória pretendida. Todavia, o conjunto de elementos fáticos apurados, aliado a uma visão problemática – e não sistemática – das categorias penais, conduz a manutenção da decisão vergastada.

É de sabença comezinha que o crime culposo sempre ocupou posição secundária na Teoria do Crime, restando, assim, nas palavras de Fábio Roberto DÁvila, ‘à margem da dogmática jurídico-penal’. Entretanto, a evolução das relações sociais, conduzidas pelo próprio avanço tecnológico do homem, culminou no aumento de situações de perigo, reflexo de uma sociedade mecanizada e em constante transformação. Neste contexto, a atual visão do crime culposo, fruto da Teoria Finalista da Ação – mostra-se inapropriada a reger inúmeras relações jurídicas do mundo cotidiano, pois estando presa a um conceito puramente lógico, acaba por relegar a um segundo plano o ideal de Justiça, fim último da Ciência Jurídica. Com efeito, o estudo das teorias do crime anteriormente elaboradas (causalismo, neokantismo, finalismo) apenas se preocuparam com a construção de um sistema jurídico-penal lógico (fechado), de modo a fornecer aos operadores do Direito um instrumento para aplicação da lei penal. Ora, na Teoria Causal de Ação, a tipicidade era formal. Assim, a mera subsunção do fato praticado ao modelo legal de crime implicaria na tipicidade da conduta, sem se avaliar nenhum outro elemento. Isto porque, enquanto fruto de um Positivismo Científico (ou empírico), o Causalismo tinha por finalidade garantir o máximo de segurança jurídica, mediante a objetividade e o formalismo nos conceitos das categorias dogmáticas do crime. Entretanto, esta visão estritamente formal deixava de explicar satisfatoriamente inúmeras situações práticas, conduzindo, em muitos casos - principalmente naqueles desprovidos de previsibilidade do sinistro – a decisões injustas.

No atual sistema – Finalista – o rigor formal foi amenizado sem, contudo, implicar em significativas mudanças. Isto porque a tipicidade exigia, além da subsunção formal, a falta de adequação social da conduta praticada, sendo este critério avaliado a partir do consenso comum do que seria certo – ou errado – em um comportamento.

Reflexo desta visão lógico-formal das categorias penais consistiu na adoção pelas legislações penais da chamada Teoria da Equivalência dos Antecedentes Causais, ou teoria da conditio sine qua non, desenvolvida por Julius Glaser, visando solucionar o processo de imputação nos crimes materiais. Segundo esta teoria, o resultado lesivo só é imputado a quem lhe deu causa, considerando-se esta toda ação ou omissão sem a qual o evento final não teria ocorrido. Logo, a mera relação de causalidade naturalística entre o fato e o resultado mostrar-se-ia suficiente ao processo de imputação e conseqüente responsabilização penal.

Atualmente, vem tomando grande relevância na comunidade jurídica os estudos desenvolvidos pelo penalista alemão Claus Roxin, em que procurou dar às categorias do Direito Penal uma nova dimensão, sempre preocupada com os ideais de justiça. Para tal, reestruturou a concepção lógico-formal das categorias do Direito Penal tratadas nas anteriores teorias do crime, que, repita-se, apenas se preocupavam no regular e bom funcionamento do sistema penal, de modo que ele se desenvolvesse de forma lógica, ainda que as soluções não fossem justas. Entende Roxin que, se a justiça é o fim último do Direito, não há como prevalecer um raciocínio meramente sistemático defendido pelos sistemas penais pretéritos.

Ao contrário, far-se-á justiça através de um raciocínio problemático - de análise caso a caso das situações postas à apreciação dos operadores do Direito. Para redefinir as categorias dogmáticas do Direito Penal (ação, tipicidade, ilicitude, culpabilidade), valeu-se de elementos valorativos de Política Criminal como critério reitor para a solução dos problemas vislumbrados. Neste norte, a reestruturação do elemento tipicidade merece destaque, pois nela houve considerável mudança na verificação do nexo de causalidade, sendo ali re-introduzido o conceito de imputação. Assim, a chamada Teoria da Imputação Objetiva fez superar o dogma causal, ao exigir para o tipo objetivo, além da conexão naturalística ação-resultado (causalidade natural), a necessidade que esta conexão, segundo valores de política criminal, sejam imputados ao autor como obra jurídica sua (casualidade típica). Esta modificação introduzida no âmbito da causalidade ajudou a acabar com o subjetivismo extremado do finalismo, que dava muita ênfase ao tipo subjetivo (dolo/culpa), através de uma maior valoração do tipo objetivo, notadamente incidente sobre o nexo de causalidade. Vê-se, pois, que o nexo de causalidade físico não mais implicaria, por si só, em nexo de causalidade jurídico.

Verificada a insuficiência, ou imperfeição, da causalidade natural como determinante da imputação, passou-se a analisar o tipo objetivo à luz de critérios teleológicos-normativos, complementares do tipo, e restritivos da causalidade. Trabalhou-se o conceito de causa dado pela Teoria da Relevância Típica (elaborada por Edmund Mezger), em que causa era concebida como ‘o evento em que o nexo causal era relevante para o tipo’.

Restou à Teoria da Imputação Objetiva, pois, definir quando o nexo causal seria relevante para o tipo. Concluiu-se que a relevância surgiria da análise do nexo de causalidade a partir de critérios valorativos (normativos) do ordenamento jurídico. Este, por sua vez, foi definido pelo Princípio do Incremento do Risco, aferido da ponderação entre os bens jurídicos e os interesses individuais, a partir da análise do risco que o segundo poderia causar ao primeiro.

Em síntese: para se falar em nexo de causalidade é necessário que, após a verificação da causalidade física, seja constatado que o agente criou um perigo relevante fora do âmbito do risco permitido.

A imputação objetiva, embora não prevista na codificação pátria, não tem sua aplicação vedada pelo ordenamento. Emerge como objeto de estudo em diversos países, sendo efetivamente aplicado. No Brasil, conta com crescente adesão dos estudiosos do Direito Penal, sendo que várias decisões dos Tribunais pátrios já se valeram de seus fundamentos, inclusive esta 2.ª Câmara Criminal.

Extrai-se, pois, a finalidade da imputação objetiva: analisar o sentido social de um comportamento, precisando se este se encontra, ou não, socialmente proibido e se tal proibição se mostra relevante para o Direito Penal. Portanto, para se ter a imputação objetiva será necessário, além da causalidade natural, a verificação da criação de um risco jurídico penalmente relevante, imputável no resultado e alcançado pelo fim de proteção do tipo penal. Criou-se, então, diversos critérios valorativos de natureza negativa que, uma vez verificados, excluiriam a imputação objetiva frente a não valoração da conduta como juridicamente relevante para o resultado, culminando na irrelevância jurídica do nexo causal para o tipo.

In casu, há a exclusão da imputação não só pela permissão do ordenamento jurídico ao risco criado, como também pelo fato de o resultado produzido não estar amparado pelo fim de proteção da norma de cuidado. Por fim, rompe-se o nexo de causalidade pelo consentimento das vítimas em sua autocolocação na situação de perigo.

DA INEXISTÊNCIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA PELA PERMISSÃO DO ORDENAMENTO AO RISCO CRIADO

A questão dos autos cinge-se à aferição da responsabilidade dos réus H.H.B. e H.P.A.H. pelas lesões causadas em D. e pelo óbito de C., pois mantendo postura omissa e negligente, não realizando o efetivo acondicionamento de material nocivo (moinha de carvão), tampouco o correto isolamento da área industrial – mediante vigilância, sinalização e cercamento do local – permitiram a entrada das vítimas em suas dependências e a ocorrência dos sinistros. Em que pese a postura dos réus – não acondicionamento do material nocivo – ter incrementado o risco para a produção dos resultados lesivos, verifica-se que as medidas adotadas para a destinação daquele material (moinha de carvão) encontrava-se em consonância com as regras administrativas, contando mesmo com a tolerância dos órgãos públicos quanto à solução traçada. É de se destacar que os lamentáveis acidentes apurados nestes autos ocorreram dentro dos prazos consignados no Termo de Compromisso para a acomodação dos indigitados resíduos sólidos, revelando que a empresa dos réus comportava-se dentro dos parâmetros estabelecidos pelos órgãos ambientais (itens 3.3 e 3.5, do quadro de f. 144).

Do exposto, vê-se que a postura da empresa dos réus estava amoldada às determinações dos órgãos competentes, que fiscalizando constantemente suas atividades, entendia possível não só a prorrogação de prazos para a destinação dos resíduos sólidos – em limites por ela estabelecidos – como também a continuidade das atividades industriais, mediante permissão provisória. Logo, embora se sustente que a postura da empresa tenha gerado um incremento no risco para o resultado materializado nos menores, certo é que as medidas então adotadas encontravam-se em perfeita consonância como as determinações administrativas competentes. Desta forma, surge o conflito, pois embora subsista a causalidade natural do evento, tem-se por prejudicada sua causalidade típica, pois não há como desvalorar uma conduta que se encontra em harmonia com as regras do sistema jurídico.

DA INEXISTÊNCIA DE IMPUTAÇÃO OBJETIVA PELO FATO DE O RESULTADO PRODUZIDO NÃO ESTAR AMPARADO PELO FIM DE PROTEÇÃO DA NORMA DE CUIDADO

O dever objetivo de cuidado exigido dos réus consistia na correta destinação ou armazenamento de resíduos sólidos derivados da produção de ferro gusa (moinha de carvão), até porque a inobservância deste dever permitiu a realização dos trágicos resultados apurados nas vítimas. Contudo, muito embora se tenha demonstrado que este dever objetivo fora cumprido de forma adequada e tolerável pelos órgãos competentes, vê-se que o destinatário do cuidado objetivo não eram as vítimas menores, mas sim a qualidade do meio ambiente como um todo. Pedindo vênia aos que entendem em contrário, tenho que a orientação traçada pelas normas administrativas destinavam-se ao resguardo do meio ambiente contra possíveis danos a serem causados à coletividade, v.g., a poluição do lençol freático da região. Logo, se o resultado fatídico apurado não se encontrava no fim imediato de proteção da norma de cuidado, impossível se mostra à imputação, sob pena de se resgatar o temível versari in re ilicita.

DA INEXISTÊNCIA DE IMPUTAÇÃO OBJETIVA PELA AUTOCOLOCAÇÃO DA VÍTIMA NA SITUAÇÃO DE PERIGO

Por fim, tenho que a imputação do resultado se mostra prejudicada, pois patente no caso em tela que as tenras vítimas se autocolocaram na situação de risco. Objetivando resgatar uma ‘pipa’, os menores adentraram as instalações da empresa dos apelados, vindo a sofrer as graves lesões (queimaduras e morte, respectivamente) em razão da existência de moinha de carvão no terreno da empresa. Ora, o comportamento das vítimas é que determinou a ocorrência do resultado lesivo, e não a suposta conduta omissiva dos apelados, não havendo que se falar em criação de risco por parte destes. Como verificado nas provas amealhadas, a empresa possui um muro divisório de quase três (3) metros de altura, dotado de arame-farpado em sua parte superior. Esta construção possui cerca de 1,5 Km de extensão, objetivando isolar a área da empresa da entrada de estranhos. Paralelamente à existência deste muro, o local possui placas de advertência, alertando com dizeres de ‘Perigo’ e ‘Proibida a entrada de estranhos’, contando com vigilância periódica de empresa terceirizada.

Neste ponto, oportunas se fazem em algumas considerações acerca do denominado ‘Princípio da Confiança’. Os apelados agiram segundo seu dever, procurando o isolamento da área do parque industrial, confiando que as medidas adotadas fossem suficientes a afastar os estranhos dos limites da empresa. Por sua vez, os menores infringiram o dever de respeitar a propriedade privada, embora advertidos não só pela existência das barreiras físicas (muros) e visuais (placas), como também pelas advertências verbais feitas pelos seus genitores, conforme apurado à f. 468.

Por todo o exposto, e diante das inúmeras peculiaridades do caso colocado à apreciação, entendo que a pretendida responsabilização dos apelados, com base em uma causalidade meramente naturalística, não espelha o ideal de Justiça perseguido pela sociedade e pelo Direito Penal.

Fiel a essas considerações e a tudo mais que dos autos consta, julgo parcialmente procedente o presente apelo tão-somente para, acolhendo a preliminar eriçada pelo Parquet, nos termos do art. 107, IV, do CP, declarar extinta a punibilidade dos réus H.H.B. e H.P.A.H. pelo crime de lesões corporais culposas, em tese, perpetrados contra a vítima M., por ausência de condição específica de procedibilidade da ação penal. Entretanto, entendendo que os lamentáveis acidentes somente ocorreram face dos comportamentos imprudentes das vítimas, no mérito mantenho incólume a r. sentença absolutória por seus próprios e jurídicos fundamentos. É como voto."


NOTAS

01 SÁNCHEZ, Bernardo Feijóo. Teoria da Imputação Objetiva.Tradução de Nereu José Giacomolli. Barueri: Manole, 2003. p. 1.

02 CAMARGO, Antonio Luís Chaves. Imputação Objetiva e Direito Penal Brasileiro. São Paulo: Cultural Paulista, 2002. p. 32.

03 Ibidem. p. 33.

04 Ibidem. p. 33-34.

05 ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal: parte geral. São Paulo: RT, 2001. p. 400.

06 CAMARGO, op. cit., p. 37.

07 ZAFFARONI; PIRANGELLI. op. cit., p. 401.

08 SÁNCHEZ. op. cit., p. 136.

09 ZAFFARONI; PIERANGELLI. op. cit., p. 402.

10 CAMARGO. op. cit., p. 39.

11 HIRSCH, Hans Joachim. El desarrollo de la dogmática penal después de Welzel. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 43, p. 11, Jul.-Set. 2003

12 BRASIL. Código Penal. 42 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

13 MIRABETE. Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal: parte geral. 18 ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 95.

14 DELMANTO, Celso et al. Código Penal Anotado. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 18.

15 SANTOS. Juarez Cirino dos. A moderna teoria do fato punível. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2002. p. 02.

16 ZAFFARONI; PIERANGELI. op. cit., p. 383.

17 MIRABETE. op. cit., p. 96.

18 TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios Básicos de Direito Penal.5.ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 80.

19 BRASIL. Código Penal. 42 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

20 ZAFFARONI; PIERANGELI. op. cit., p. 571.

21 MIRABETE. op. cit., p. 102.

22 ZAFFARONI; PIERANGELI. op. cit., p. 421.

23 PRADO, Luis Regis; CARVALHO, Érika Mendes de. Teorias da Imputação Objetiva do Resultado: uma aproximação crítica a seus fundamentos. São Paulo: RT, 2002. p. 39.

24 ZAFFARONI; PIERANGELI. op. cit., p. 395.

25 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 40.

26 ZAFFARONI; PIERANGELI. op. cit., p. 422.

27 ZAFFARONI; PIERANGELI. op. cit., p. 397.

28 GRECO, Rogério. Teorias do Delito. Disponível em: <http://www.direitopenal.adv.br>. Acesso em: 20. jul. 2004.

29 TOLEDO. op. cit., p. 94.

30 ZAFFARONI; PIERANGELI, op. cit., p. 399.

31 Ibidem. P. 399.

32 GRECO, Rogério. Teorias do Delito. Disponível em: <http://www.direitopenal.adv.br>. Acesso em: 20. jul. 2004.

33 HIRSCH, Hans Joachim. El desarrollo de la dogmática penal después de Welzel. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 43, p. 12, Jul.-Set. 2003.

34 SANTOS. op. cit., p. 14.

35 FERRI, Enrico. Princípios do Direito Criminal. São Paulo, Bookseller, 1999. p. 479.

36 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 51.

37 HIRSCH. op. cit., p. 12.

38 SANTOS. op. cit., p. 09.

39 ZAFFARONI; PIERANGELI, op. cit., p. 454.

40 MIRABETE. op. cit., p. 101.

41 PEDROSO. Fernando de Almeida. Nexo causal, imputação objetiva e tipicidade conglobante. Revista dos Tribunais, n. 794, p. 463. Dez. 2001.

42 JESUS. Damásio de. Imputação Objetiva. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 07.

43 BRUNO, Aníbal. Direito Penal. Rio de Janeiro: Forense, 1959, vol.1, tomo I, p. 305.

44 PEDROSO. op. cit., p. 464

45 SANTOS. op. cit., p. 49

46 CAMARGO. op. cit. p. 48.

47 ROSA, Antônio José Miguel Feu. Causalismo e Finalismo em Direito Penal.Brasília: Consulex, 1993. p. 65.

48 DÁVILA, Fábio Roberto. Crime culposo e teoria da imputação objetiva, Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2001, p. 24.

49 SANTOS, Juarez Cirino dos. op. cit., p. 50.

50 BRASIL. Código Penal. 42 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

51 TOLEDO. op. cit., p. 111.

52 JESUS. op. cit., p. 06.

53 MIRABETE. op. cit., p. 111.

54 JESUS, op. cit., p. 07. *Encontramos exemplos similares em diversas obras.

55 JÚNIOR, Sídio Rosa de Mesquita. Relação de causalidade no direito penal. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0016.html>. Acesso em: 27 jul. 2004.

56 JESUS, op. cit., p. 08.

57 MIRABETE, Júlio Fabrini. Manual de Direito Penal: parte geral. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1990. No mesmo sentido: JESUS. op. cit. p. 09. TOLEDO. op. cit., p. 115.

58 JÚNIOR, Sídio Rosa de Mesquita. Relação de causalidade no direito penal. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0016.html>. Acesso em: 27 jul. 2004.

59 JÚNIOR, Sídio Rosa de Mesquita. Relação de causalidade no direito penal. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0016.html>. Acesso em: 27 jul. 2004.

60 DELMANTO. op. cit., p. 23.

61 ROXIN, Claus. Funcionalismo e imputação objetiva no direito penal. Tradução de Luís Greco. Rio de Janeiro/ São Paulo: Renovar, 2002. p.24.

62 Kries apud ROXIN. op. cit., p. 25.

63 CAPEZ, Fernando. O declínio do dogma causal. São Paulo: jan. 2002. Disponível em: <http://www.direitopenal.adv.br>. Acesso em: 29. jul. 2004.

64 ROXIN. op. cit., p. 26.

65 Ibidem. p. 48.

66 ZAFFARONI; PIRANGELI. op. cit., p. 563.

67 ROXIN. op. cit., p. 32.

68 DELMANTO. op. cit., p. 24.

69 JESUS, Damásio de. A Doutrina Brasileira e a Teoria da Imputação Objetiva – Alguns Posicionamentos. São Paulo: Complexo Jurídico Damásio de Jesus, dez. 2002. Disponível em: <http://www.damasio.com.br>. Acesso em: 01 ago. 2004

70 GOMES, Luiz Flávio. Crime culposo e teoria da imputação objetiva. São Paulo: Instituto de Ensino Professor Luiz Flávio Gomes, out. 2004. Disponível em: <http://www.portalielf.com.br>. Acesso em: 22. out. 2004.

71 SÁNCHEZ. op. cit., p. 104.

72 Ibidem. p. 151.

73 ROXIN, Claus. A Teoria da Imputação Objetiva. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, n. 39, p. 20, Jul.-Set. 2002.

74 JESUS, 2000. p. 24.

75 ROXIN, Claus. A Teoria da Imputação Objetiva. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, n. 39, p. 20, Jul.-Set. 2002.

76 ZAFFARONI; PIERANGELI, op. cit., p. 403.

77 PLATÃO apud PRADO; CARVALHO. op cit., p. 17.

78 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 19.

79 Ibidem. p. 21.

80 Ibidem. p. 21.

81 PRADO; CARAVALHO. op. cit., p. 27.

82 CAMARGO,. op. cit., p. 61.

83 ROXIN. op. cit., p. 14.

84 PRADO; CARVALHO. op. cit. p. 30

85 Ibidem. p. 31.

86 Ibidem. p. 31.

87 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 32-33.

88 AGUADO, Paz M. de la Cuesta. Tipicidad e Imputación Objetiva. Lima: 1997. Disponível em: <http://inicia.es/de/pazenred/Tipicidad.htm>. Acesso em: 01. set. 2004.

89 CAMARGO. op. cit., p. 62.

90 CAMARGO. op. cit., p. 63.

91 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 34.

92 Ibidem. p. 35.

93 CAMARGO. op. cit., p. 63.

94 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 36.

95 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 37.

96 JESUS, 2002.

97 ROXIN apud CAMARGO. op. cit., p. 70.

98 CAMARGO. op. cit., p. 70.

99 JESUS, 2000. p. 33.

100 Ibidem. p. 33.

101 JAKOBS apud CAMARGO. op. cit., p. 71.

102 CAMARGO. op. cit., p. 71.

103 REYES ALVARADO apud ROCHA, Fernando A. N. Galvão. Imputação Objetiva. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000. p. 74.

104 ROCHA. op. cit., p. 33.

105 Sobre o tema: SABAGE, Fabrício Muniz. A moderna teoria da imputação objetiva no Direito Penal. 2002. 77 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação – Curso de Direito, Faculdades Integradas Curitiba, Curitiba, 2002.

106 BRASIL. Código Penal. 42 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

107 BRASIL. Código Penal. 42 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

108 SÁNCHEZ. op. cit., p. 09.

109 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 64-65.

110 SÁNCHEZ. op. cit., p. 35.

111 Ibidem. p. 35-38.

112 Ibidem. p. 38.

113 SÁNCHEZ. op. cit., p. 41.

114 Sobre o assunto: SÁNCHEZ. op. cit., p. 09-44.

115 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 64.

116 CAMARGO. op. cit., p. 72.

117 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 64.

118 Ibidem.

119 ROXIN, Claus. Política criminal e sistema jurídico penal. Tradução de Luís Greco. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

120 SÁNCHEZ. op. cit., p. 67.

121 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 66.

122 CAMARGO. op. cit., p. 73.

123 ROXIN. op. cit., p. 314.

124 ROXIN. op. cit., p. 314.

125 CAMARGO. op. cit., p. 67.

126 MIR PUIG apud PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 67.

127 CAMARGO. op. cit., p. 75.

128 Ibidem. p. 75.

129 ROXIN. op. cit., 315.

130 ROXIN apud PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 72.

131 CAMARGO. op. cit., p. 76.

132 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 72.

133 Ibidem. p. 73.

134 CEREZO MIR apud PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 80.

135 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 81.

136 CAMARGO. op. cit., p. 79.

137 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 84.

138 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 85.

139 CAMARGO. op. cit., p. 190.

140 ROXIN. op. cit., p. 352.

141 PAGLIUCA, José Carlos Gobbis. A autocolocação sob perigo e o princípio da confiança. São Paulo: fev. 2004. Disponível em: <jus.com.br/revista/">http://jus.com.br/revista>. Acesso em: 01. out. 2004.

142 ROXIN. op. cit., p. 354.

143 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 94.

144 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 94.

145 CARVALHO, Alexandre Victor. Vítima e Dogmática. Minas Gerais: maio. 2002. Disponível em:<http://www.direitopenal.adv.br>. Acesso em: 01. out. 2004.

146 ROXIN. op. cit., p. 367-368.

147 CAMARGO. op. cit., p. 183.

148 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 95.

149 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 95.

150 ROXIN. op. cit., p. 380.

151 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 96.

152 CAMARGO. op. cit., p. 92.

153 Ibidem. p. 92.

154 Ibidem. p. 104.

155 Ibidem. p. 104.

156 ** Como vimos no caso da diminuição do risco (5.2.1), da criação de um risco juridicamente relevante (5.2.2) ou da aplicação no âmbito das lesões desportivas (4.2.1)

157 CAMARGO. op. cit., p. 114.

158 Ibidem. P. 114.

159 CAMARGO. op. cit., p. 37.

160 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 102.

161 BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao Direito Penal brasileiro. 8. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002. p. 111-116.

162 JAKOBS, Günther. A imputação objetiva no Direito Penal. Tradução de André Luís Callegari. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 23.

163 JAKOBS apud CAMARGO. op. cit., p. 84. *** Na visão de Antonio Luís Chaves Camargo a missão do Direito Penal é "a revalidação dos valores vigentes na sociedade, considerada esta constituída por grupos que mantêm uma interpretação semântica destes valores, tendo-se como referencial o conceito da maioria, respeitado o da minoria".

164 CAMARGO. op. cit., p. 85.

165 CAMARGO. op. cit., p. 85.

166 Ibidem. p. 85.

167 Ibidem. p. 86.

168 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 111-112.

169 JAKOBS. op. cit., p. 17.

170 Iibdem. p. 17.

171 SÁNCHEZ. op. cit., p. 143.

172 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 109.

173 JAKOBS. op. cit., p. 34.

174 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 111.

175 JAKOBS. op. cit., p. 35.

176 Ibidem. p. 36-38.

177 JAKOBS. op. cit., p. 38.

178 JAKOBS. op. cit., p. 41.

179 SÁNCHEZ. op. cit., p. 141.

180 JAKOBS. op. cit., p. 42-43.

181 JAKOBS. op. cit., p. 43.

182 Ibidem. p. 43-48.

183 JAKOBS. op. cit., p. 47.

184 Ibidem. p. 47.

185 Ibidem. p. 47.

186 BOSZCZOWSKI, Ludmila. Teoria da imputação objetiva no direito penal. 2003. 96 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Curso de Direito, Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2003.

187 JAKOBS. op. cit., p. 49.

188 Ibidem. p. 49.

189 Ibidem. p. 49.

190 JAKOBS. op. cit., p. 51.

191 SÁNCHEZ. op. cit., p. 124.

192 JAKOBS. op. cit., p. 26.

193 Ibidem. p. 26.

194 JAKOBS. op. cit., p. 26.

195 SÁNCHEZ. op. cit., p. 141.

196 JAKOBS. op. cit., p. 26.

197 SÁNCHEZ. op. cit., p. 142.

198 JAKOBS. op. cit., p. 27.

199 Ibidem. p. 67.

200 Ibidem. p. 72.

201 JAKOBS. op. cit., p. 72.

202 Ibidem. p. 29.

203 Ibidem. p. 29-30.

204 NORONHA, Edgar Magalhães. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1983, 4.v. p. 40.

205 JAKOBS. op. cit., p. 30.

206 REYES ALVARADO apud ROCHA, Fernando Galvão. op. cit., p. 107.

207 ****Já havíamos citado esse exemplo, porém sem maiores indagações, ao estudarmos a heterocolocação em perigo consentida dentro da teoria de Claus Roxin (5.2.5).

208 JAKOBS. op. cit., p. 31.

209 Ibidem. p. 31.

210 CAMARGO. op. cit., p. 88.

211 Ibidem. p. 90.

212 Ibidem. p. 94.

213 Ibidem. p. 94.

214 JAKOBS apud CAMARGO. op. cit., p. 94.

215 Ibidem. p. 105.

216 CAMARGO. op. cit., p. 106.

217 CAMARGO. op. cit., p. 114-115.

218 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 122-123.

219 Dessa forma: PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 163.

220 ***** A nível de curiosidade apresentaremos no fim do presente trabalho Acórdão proferido na Apelação Criminal nº 356.212, na 2ª Câmara Criminal de Belo Horizonte, o marco da teoria da imputação objetiva na jurisprudência nacional. Disponível em: <jus.com.br/revista/">http://jus.com.br/revista>. Acesso em: 23. jul. 2004.

221 PRADO; CARVALHO. op. cit., p. 163.

222 CAMARGO. op. cit., p. 133.

223 Ibidem. p. 138.

224 Ibidem. p. 138.

225 SABAGE. op. cit., p. 82.

226 Ibidem. p. 82.

227 ROXIN. op. cit., p. 90-103.

228 TJSP, RT 382.

229 TACrSP, RT 527.

230 TJSP, RT 405.


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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

Aspectos dogmáticos da(s) teoria(s) da imputação objetiva. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 973, 1 mar. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8021. Acesso em: 29 mar. 2024.