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Ensaio sobre a necessidade de uma teoria para a superação democrática do Estado constitucional moderno

Ensaio sobre a necessidade de uma teoria para a superação democrática do Estado constitucional moderno

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O texto estuda a superação democrática do Estado Constitucional Moderno e sua insuficiência como organização de Poder Público, além de discutir algumas das propostas para sua substituição.

            Não exageremos: o privado não é sempre bonito e o público não é sempre feio.

Giovanni Sartori


            Palavras-chave: Superação do Estado Constitucional Moderno; Sociedade sem estados; Novo Contrato Social; Sociatismo; Capitalismo Democrático; Insuficiência do Estado Constitucional Moderno; Democracia Ecológica; Democracia Radical; Democracia Internacional; Ciberdemocracia ou Democracia eletrônica; Globalização; Trans-nacionalização.


            Resumo: Este artigo procura contribuir para a formação da base teórica destinada à superação democrática do Estado Constitucional Moderno, estabelecendo uma seqüência lógica para a análise das evidências de sua insuficiência como organização de Poder Público, além de discutir algumas das propostas atuais para sua substituição.

            Abstract: This article seeks to contribute to the development of the theoretical foundation for democratic overcoming of the Modern Constitutional State, establishing a logical sequence for analyzing the evidence of its inadequacy as an organization of the Public Power. It also discusses some of the current proposals for its replacement.


INTRODUÇÃO

            O artigo que ora se publica é fruto de investigação realizada na Universidade de Alicante, por ocasião do estágio de Pós-Doutorado, realizado pelo autor com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES/MEC de agosto de 2005 a fevereiro de 2006, e que estará formando um livro dedicado a discutir a superação democrática do Estado Constitucional Moderno em diversos aspectos, procurando estimular a produção teórica neste sentido.

            As bases metodológica e teórica do presente artigo vêm sustentadas pelas propostas apresentadas por vários autores e em várias obras, com a investigação amparada pelas seguintes hipóteses:

            a)O Estado Constitucional Moderno - e sua base teórica - são insuficientes para enfrentar a complexidade da Sociedade transnacional contemporânea;

            b)A diversificação da Democracia é fundamental para o novo modelo de organização político-jurídica que substituirá o Estado Constitucional Moderno;

            c)A Democracia deve ser considerada uma proposta de civilização, e não o Estado Constitucional Moderno, já ultrapassado e insuficiente para servir como Poder Público no mundo atual;

            d)Haverá um novo Poder Público. Um espaço público construído com base em teorias contemporâneas e democráticas de solidariedade;

            e)O Constitucionalismo pode ser mantido, desde que conforme as novas formulações destinadas a organizar o novo espaço público de poder transnacional;

            f)A Solidariedade e a participação democráticas terão papel destacado nas novas formulações teóricas destinadas a organizar um Poder Público pós-moderno;

            g)A insuficiência do Estado Constitucional Moderno tornou-se ainda maior após a queda do regime comunista do leste europeu, o que ensejou um forte incremento no processo de globalização.

            As hipóteses declinadas acima foram elaboradas a partir da constatação que se vive, atualmente, numa época de transformações sem precedentes. Os avanços tecnológicos se produzem, como nunca, a uma velocidade vertiginosa. O que valia há algum tempo atrás, agora parece inservível. Deve-se ressaltar que a globalização se manifesta de forma diferente conforme as pessoas, grupos ou situações. Para alguns, é um processo apaixonante e vivem com otimismo o presente, tratando de situar-se na nova ordem e de rentabilizar todas as oportunidades oferecidas. Outros se encontram desorientados e desnorteados diante de mudanças tão rápidas e olham com receio o presente, que parece apontar para um futuro incerto. Finalmente, há quem contempla com medo o presente e o futuro e busca segurança tentando voltar a um passado que já não existe, com o risco constante de voltar-se para posições anacrônicas, obsoletas.

            Nunca como em nossos dias pode-se ser tão consciente da inter-relação entre povos e culturas diferentes, graças a tecnologias como a Internet, capazes de conectar com o outro extremo do planeta.

            Mas, se contemplado globalmente o mundo, não se pode deixar de chamar atenção à falta de mudanças realmente importantes para a humanidade. Continuamos vivendo em um mundo cheio de desigualdades e, apesar da produção cada vez maior de riqueza, esta se encontra cada vez mais concentrada em menos mãos. O fato é que se está criando um mundo no qual a cobiça de uns poucos, deixa muitos nos estertores da história. Sociedades que, enquanto vivem um progresso tecnológico e possibilidades econômicas nunca vistas, fabricam e reproduzem a exclusão. [01]

            Exclusão esta que ampara a necessidade de se buscar uma análise político-jurídica sobre a atual crise que se abate sobre as instituições modernas e sobre o Estado Constitucional Moderno como representação da organização do Poder Público.

            O Estado Constitucional Moderno, surgido a partir das revoluções burguesas do Século XVIII, sustentado pelas teorias do Poder Constituinte, da Tripartição do Poder, da Democracia Representativa e destinado a atender os interesses da burguesia liberal capitalista, está no cerne de toda a discussão a ser desenvolvida no presente artigo e será a matriz política com a qual vai-se operar.

            Para efeitos conceituais o Estado Constitucional Moderno é gênero, do qual Estado Liberal, Estado Social, Estado de Bem Estar, Estado Contemporâneo e todas as outras denominações dadas às variações de seu âmbito de atuação são espécies. Ou seja, há uma só matriz político-jurídica, com vários modelos que foram surgindo a partir de decisões – ou necessidades – ideológicas.

            É claro que este raciocínio pode ser acusado, como proposta de método de análise, com essa objetividade, de simplificar uma questão muito complexa, mas a intenção é buscar evidências científicas que, de um modo geral e sem complicações desnecessárias, demonstrem que a construção político-jurídica denominada Estado Constitucional Moderno é insuficiente para o atual momento que vive a civilização humana na terra. E que já o era na medida em que a complexidade das relações políticas, sociais e econômicas passou a aumentar em progressão geométrica. Principalmente a partir dos avanços tecnológicos tornados possíveis a partir das comunicações por satélite e da popularização dos micro-processadores, popularmente chamados de computadores pessoais.

            O valor principal a ser utilizado para a sustentação da tese da necessidade da superação democrática do Estado Constitucional Moderno é a Democracia.

            A Democracia Participativa, a Democracia Ecológica, a Ciberdemocracia, a Democracia Econômica, entre outras propostas, estão contempladas e discutidas ao longo deste artigo, como forma de chamar atenção para as possibilidades de uma Cidadania Democrática Mundial. A internacionalização da Democracia e, a partir dela, a internacionalização do Estado a partir de uma nova construção político-jurídica. O Estado Constitucional Moderno construído teoricamente para existir soberano no seu interior e para se relacionar conflitivamente com o seu exterior, deve sair de cena, substituído por um novo Estado que, ao que tudo indica, será o mediador das relações políticas, sociais e econômicas locais e regionais com aquelas globalizadas, ou mundializadas.

            É importante destacar que não basta reformar o Estado Constitucional Moderno por "outro" modelo, reformado, de Estado Constitucional. Reformar o Estado Constitucional Moderno, como está sobejamente demonstrado, não resolve os problemas, gravíssimos, ligados à exclusão, à miséria e à concentração da riqueza em mãos de poucos. [02]

            O fato é que, como já prediziam alguns autores, entre eles Alvim Tofler no seu livro A Terceira Onda, a construção de uma nova civilização sobre os destroços da velha envolve o projeto de novas estruturas políticas mais apropriadas em muitas nações ao mesmo tempo. Isto é um projeto penoso e, contudo, necessário, de âmbito mental estonteante e que certamente levará décadas – se não séculos – para concluir. [03]

            Todas as estruturas deverão ser modificadas, não porque são de esquerda ou de direita ou porque sejam controladas por este ou aquele grupo ou classe, mas porque são cada vez mais impraticáveis – não mais adequadas para as necessidades de um mundo radicalmente mudado, principalmente após a derrocada do comunismo no leste europeu.

            É importante registrar que, para construir o novo Estado a partir da Democracia, é preciso superar a pressuposição amedrontadora, mas falsa, de que a diversidade aumentada traz automaticamente a tensão e o conflito social. Pode ser exatamente o contrário. O conflito na Sociedade não é apenas necessário, ele é desejável. Providenciados os arranjos sociais adequados, a variedade pode contribuir para uma civilização segura e estável, ao contrário da proposta endógena que orientou o Estado Constitucional Moderno até agora. [03]

            A necessidade de superação do Estado Constitucional Moderno acompanha o que vem acontecendo com todas as estruturas da convivência política, que surgiram de crises, de uma crise anterior, se consolidaram durante determinado tempo e, por fim, cederam seus lugares a outras novas que, por sua vez, acabaram por entrar em decadência. Isto é assim porque o Estado, como toda estrutura de convivência, é fruto de uma cultura anteriormente descrita. Políbio, com sua teoria cíclica, e nos tempos modernos o genial Giambattista Vico, com sua doutrina dos corsi e ricorsi e depois Marx, ao aplicar a dialética no sentido histórico-materialista, corrigiram o enfoque otimista do progresso indefinido que surge da controvérsia literária entre os modelos antigos e modernos. As crises do Estado Constitucional Moderno demonstram que cada modelo de Estado sempre foi uma reforma do anterior. Este sempre continha reminiscências passadas e caricaturas futuras. O esquema: Estado Liberal de Direito – Estado Social de Direito – Estado Democrático de Direito (todavia não realizado) parece corroborar essa afirmativa, já que são espécies do mesmo gênero. [04]

            A partir destas constatações é que se desenvolve o raciocínio sobre a necessidade de superação democrática do Estado Constitucional Moderno, com a preservação do espaço público, do Poder Público, a ser concebido sobre outras bases teóricas.


1.1 - A UTOPIA DA SOCIEDADE SEM ESTADOS: A NECESSIDADE DO PODER PÚBLICO.

            Dalmo Dallari é, provavelmente, o autor brasileiro que tratou esse assunto com maior profundidade em seu O Futuro do Estado [05], quando trata especificamente das teorias sobre o futuro do Estado e do mundo sem estados.

            Dallari assinala que a corrente mais importante, por sua influência prática e que sustenta a idéia de um mundo sem estados é a anarquista, sendo que seus principais representantes são originários do marxismo-leninismo. Mas, segundo ele, não há, no presente, elementos concretos que permitam afirmar que o mundo está caminhando para a extinção do Estado. O autor indica que o mundo sem estados não é plausível, sendo apenas um ideal utópico e sem apoio na realidade. [06]

            A posição de Dallari é a que serve de escopo ao presente artigo, ou seja, a superação democrática do Estado Constitucional Moderno não elimina o Estado como Poder Público, mas o substitui por outra construção político-jurídico, concebida a partir de pressupostos democráticos e levando em consideração a profunda mudança na delimitação do âmbito de atuação da nova construção político-jurídica.

            É interessante notar que os autores tidos como de "esquerda", são mais "estatalistas", no sentido de preservar o Estado Constitucional Moderno, que outros mais identificados com a "direita". Esta constatação, observada por determinado ângulo, é contraditória, pois foram os liberais capitalistas os maiores beneficiados pelo Estado Constitucional Moderno. Os socialistas apenas se instalaram nas estruturas públicas, mas não se pode dizer que o instrumento funcionou a seu favor.

            Autores de orientação liberal, como Robert Nozick, por exemplo, foram mais longe na direção da eliminação do Estado do que muitos outros, de orientação socialista. A sua obra publicada em 1974, Anarchy, state and utopia [07], teve enorme repercussão intelectual nos Estados Unidos. Vale a pena, para se começar a discutir o tema, resumir o sentido de sua investigação à qual se referem todos os que procuram dar um fundamento filosófico às críticas que fazem ao modelo de Bem Estar, assim como suas alternativas.

            Nozick se inscreve na perspectiva anarquista libertária, contestando a refutação final da legitimidade de toda forma de Estado. Para desenvolver seu argumento, Nozick raciocina, como Hobbes ou Locke, a partir do estado de natureza. Mas tenta mostrar contra eles que não é necessário formular a hipótese de um Contrato Social – fundando o Estado político exterior à Sociedade – para fugir dos inconvenientes desse estado de natureza (a guerra de todos contra todos ligada à incerteza da distinção entre o "meu" e o "teu"). Trata-se, para ele, de pensar a emergência de um modelo Estado Constitucional Moderno Mínimo a partir de uma inteligência estritamente econômica do social.

            O que Nozick prega, na verdade, é uma espécie de "Capitalismo Asséptico".

            Essa "reescrita" da emergência do Estado mínimo permite a Nozick permanecer fiel ao princípio anarquista de recusa de toda violação do território do indivíduo. O Estado Mínimo que ele define é globalmente o produto de uma explicação em termos de mão invisível (invisible-hand explanation): é compreendido a partir de uma percepção estritamente econômica e individualista das relações sociais. A escolha já não é, portanto, a seus olhos, entre o Estado-protetor clássico e a anarquia. Ele chega a definir logicamente um Estado Mínimo que seja um não-Estado, no sentido contratualista e político do termo: não é exterior à Sociedade e não produz nenhum Direito próprio.

            Nozick traduz o pensamento liberal que ensaia propor a superação do Estado Constitucional através da revisão do conceito de Poder Público invasivo, mesmo nos modelos de Estado Mínimo. Ao substituir o princípio da redistribuição, próprio do Estado-Providência, pelo da compensação, Nozick fornece a base de uma crítica da ilegitimidade do modelo de Providência. A seu ver, é quase fortuito que o princípio de compensação para os "independentes" se traduz por um mecanismo de redistribuição da oferta de proteção. [08]

            Como contraponto a Nozick o melhor exemplo é o de Boaventura de Souza Santos, que em várias de suas obras defende a superação democrática do Estado Constitucional Moderno, mas substituído por outra construção político-jurídica estatal que preserve o espaço público a partir da internacionalização da Democracia e que seja teorizada com base em um novo Contrato Social pós-moderno, que considere a complexidade e a diversidade da Sociedade mundializada.


1.2 – UM NOVO CONTRATO SOCIAL?

            É importante estimular o raciocínio de nossos cientistas da Política e do Direito para a possibilidade de um novo Contrato Social.

            Os riscos advindos da obsolescência do Contrato Social Moderno são muito graves para se permanecer de braços cruzados. É fundamental encontrar alternativas de sociabilidade que neutralizem e previnam os riscos oriundos da obsolescência do Estado Constitucional Moderno e desbravem o caminho a novas possibilidades democráticas. A tarefa não é fácil: o desequilíbrio social gerado pela crise do Contrato Social Moderno é tão profundo que desequilibra inclusive a resistência aos fatores de crise ou a reivindicação de emancipação que deveria dar sentido à resistência democrática. Boaventura de Souza Santos acrescenta que já não é simples saber, com clareza e convicção, em nome do que e de quem resistir, inclusive supondo que se conheça aquilo contra o qual se resiste, o que também não é fácil. [09]

            As teorias do Estado Constitucional Moderno alcançaram sua plausibilidade e foram introduzidas na realidade social graças à teoria política moderna, entre elas a do Contrato Social. Basta mencionar nomes como Hobbes, Locke, Montesquieu e Rousseau. Ou pensar no conceito de Estado, o princípio da divisão de poderes, o princípio das maiorias e a proteção das minorias ou outras similares, para trazer à memória este arcabouço teórico. Estas teorias, que fizeram possível a realização do Estado Constitucional Moderno, não resistem, sem dúvidas, a uma reflexão sobre a situação originada por ele. Não só por estarem superadas cientificamente, mas também por serem responsáveis pela realidade atual. [10]

            Para a necessidade de um novo Contrato Social tem-se como ponto de partida a insuficiência irreflexiva do postulado da proeminência da coisa pública: o Poder Público não existe como simples resultante dos interesses privados, mas supõe um pacto social – ou Contrato Social - hígido que preceda e sobre-passe todos os contratos particulares. [11] Ao abandonar-se esse postulado e com a redução do Poder Público a uma função de mercado, o espaço público fica imediatamente ameaçado de desaparecimento, pois não há mercado capaz de fixar o valor do interesse público e delimitar o espaço da solidariedade. Atualmente, só um novo Contrato Social poderá recuperar o espaço público perdido. [12]

            O que se quer indicar é que as teses formadoras do Estado Constitucional Moderno responderam adequadamente aos requerimentos da Sociedade do seu tempo, através da classe dominante: a burguesia. Neste sentido, a partir do constitucionalismo moderno a teoria político-jurídica esteve conectada com a realidade social dominante. [13]

            Só que, atualmente, da mesma forma que o crescente poder estatal da Europa do Século XVIII reorientou a direção dos protestos populares desde os problemas locais até questões nacionais, as novas tecnologias atuais da comunicação, principalmente, mas não só, permitem um contato em escala intercontinental entre as pessoas, através de redes em constante formação. [14]

            Este conjunto de novas realidades está erodindo de forma extraordinária os alicerces que até agora sustentaram a teoria liberal do Estado Constitucional Moderno. Basta olhar o mundo atual e, particularmente, o funcionamento efetivo dos estados atuais para se comprovar até que ponto estão obsoletas as teorias em torno do Estado Constitucional Moderno. A ordem internacional deixou de ser, na prática, baseada nos estados para se converter num sistema complexo no qual aparecem, lado a lado com eles, estruturas e organizações de diversos tipos, tais como as forças do mercado, as forças ou organizações geopolíticas, as instituições de Direito Internacional ou as próprias ONGs, que vêm adquirindo um protagonismo cada vez mais intenso nos assuntos de escala mundial, influindo com sua atividade, de forma notória, na ação dos estados e, principalmente, na atividade da própria ONU.

            O resultado de tudo isso constitui o progressivo desaparecimento dos elementos teóricos constitutivos do Estado Constitucional Moderno: centralização territorial, monopólio efetivo por poder tripartido, a sujeição de todos os poderes seculares ao Estado e o questionamento, cada vez maior, dos seus instrumentos de legitimação, como o Poder Constituinte e a Democracia Representativa Parlamentar. Em seu lugar se observa o aparecimento de processos centrífugos nos quais é produzida a dispersão de competências e poderes entre vários grupos e instituições, e isso tanto de um ponto de vista material como jurídico-formal. Isso provoca um crescente questionamento sobre a validade da distinção clássica entre instituições públicas e privadas, entre Estados e Sociedade Civil. No momento atual, até os mais sagrados interesses do Estado Constitucional Moderno ficam submetidos à contestação e à restrição por parte de atores fora do espaço público.

            O Contrato Social Moderno não alcança a profusão social da pós-modernidade. [15]

            A grande questão é como fazer um Contrato Social no e para o Século XXI. Em que bases. Como estabelecer um Contrato Social transnacional, se em nossa Sociedade atual o estado de natureza está na ansiedade permanente quanto ao presente e ao futuro, no iminente desgoverno das expectativas, no caos permanente, nos atos mais simples da sobrevivência ou convivência. [16]

            Fernado Gustavo Knoerr, em seu capítulo intitulado Representação Política e Globalização, na obra denominada Repensando a Teoria do Estado, organizada por Ricardo Marcelo Fonseca, leciona que o Estado Constitucional Moderno não é mais soberano, mas um sócio, um parceiro do capital privado que não conhece fronteiras e por isso perdeu sua condição de espaço público, o que ocasiona o citado desgoverno de expectativas.

            Chega a ser possível, nesse contexto, até mesmo afirmar o surgimento de um "anti-contratualismo moderno", traduzido na volta do exercício direto do poder por entes privados. Não se pode esquecer que no contratualismo clássico partia-se de um acordo firmado apenas por indivíduos absolutamente iguais, o que já não ocorre, principalmente em se considerando que desta avença participa também o capital internacional.

            Nesta etapa de crise do contratualismo moderno não há mais indivíduos, mas grupos privados (de trabalhadores, de indústrias, de empresários, de interesses "globalizados") exercendo o poder político na mais evidente defesa de interesses egoísticos. [17]

            Daí que se deve definir do modo mais amplo possível os termos de uma reivindicação cosmopolita capaz de romper o círculo vicioso das fases do contratualismo moderno. Esta reivindicação deve reclamar, em termos gerais, a reconstrução e reinvenção de um espaço-tempo que permita e promova a deliberação política. Um novo espaço público, nas palavras de Boaventura de Souza Santos. [18]

            O objetivo final seria a construção de um novo Contrato Social, muito diferente do da modernidade. Deve ser um contrato muito mais inclusivo e que abarque não só os homens e os grupos sociais, mas também a natureza. Em segundo lugar, será um contrato mais conflitivo, porque a inclusão deve ser promovida segundo critérios tanto de igualdade como de diferença. Em terceiro lugar, ainda que o objetivo final do contrato seja a construção do espaço-tempo da deliberação democrática, este contrato, diferentemente do contrato social moderno, não pode limitar-se ao espaço-tempo nacional e estatal: deve incluir os espaços-tempo local, regional e global. Por último, o novo contrato não se baseia numa clara distinção entre Estado e Sociedade, entre economia, política e cultura ou entre público e privado: a deliberação democrática, enquanto exigência cosmopolita, não tem sede nem forma institucional específicas. [19]

            O descrito acima remete a uma análise pautada na essência utópica da Democracia como parte de um novo Contrato Social pós-moderno. Por um lado, as democracias modernas propõem a idéia do Contrato Social e do consenso de todos os indivíduos. Produtos da vontade livre dos cidadãos. Por outro são empurradas, permanentemente, por forças não controláveis pelas instituições do Estado Constitucional Moderno, aquelas geradas pela economia capitalista globalizada e que desmentem a pretensão que se possa ter capacidade de autocontrole. É exatamente neste ponto que a Sociedade se habilita para criticar a Democracia Representativa Moderna e propor outras hipóteses de Contratação Social e outras possibilidades de representação política. [20]

            Várias funções tradicionais do Estado Constitucional Moderno não escapam à lógica da globalização. E as conseqüências deste fenômeno questionam profundamente a Soberania dos estados, já que dizem respeito às liberdades públicas, finalidade e condição de existência do Estado Constitucional Moderno. Compartilhar determinadas informações, a interligação dos arquivos e as escutas telefônicas são assuntos que se apresentam como simples colaboração técnica, sem levar-se em conta que são problemas que atingem os fundamentos do próprio Estado Constitucional Moderno, se levadas às últimas conseqüências. Questões como a de definir a informação que o Poder Público está autorizado a obter sobre os cidadãos, supõe, indiscutivelmente, pontos cruciais para um novo Contrato Social.

            Ao que tudo indica, um novo Contrato Social seria muito diferente do Contrato Social Moderno. Muito mais inclusivo, abrangendo também a natureza, a ecologia.

            Assim, seria preciso por em ação quatro novos pré-contratos sociais, que seriam os pilares de uma Democracia internacionalizada: um pré-Contrato Social para erradicar a pobreza; um pré-Contrato Social Ambiental para preservar o meio ambiente, um pré-Contrato Social Cultural para garantir educação a todos ao longo da vida e um pré-Contrato Social Ético que volte a dar sentido e perspectiva à aventura humana. [21] Os quatro pré-contratos sociais formariam um Contrato Social global, capaz de prever toda uma série de elementos complexos, próprios do momento atual em que se vive.

            Um novo Contrato Social pautado pelos pilares destacados acima significa reagir ao "pensamento único". É preciso colocar o ser humano no foco de todas as preocupações, sejam elas ligadas à globalização, ao meio ambiente, ao capitalismo, à Democracia. Os parâmetros serão muito mais inclusivos e humanos.


1.3 – A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAPITALISMO E O ESTADO CONSTITUCIONAL MODERNO.

            É importante frisar que a socialização democrática do capitalismo não tem qualquer relação com algumas experiências ultrapassadas e irracionais que eram defendidas por alguns setores do pensamento político moderno [22].

            O que se pretende, caso seja válido pensar numa ordem estatal pós-moderna, é refletir sobre as incertezas e justificativas morais que coincidem, tanto empiricamente – sendo o Estado agente do capitalismo – quanto filosoficamente – sendo o Estado o signo da hierarquização entre os homens. Se o que se quer é uma ordem livre, igualitária e com a democratização do capitalismo, todos serão forçados a pensar na superação do Estado Constitucional Moderno. [23]

            O sistema mundial atual é um produto do capitalismo industrial transnacional que integra em si tanto setores pré-industriais, como setores pós-industriais. A utopia de uma Sociedade mais justa e de uma vida melhor, uma idéia que, enquanto utopia, é tão necessária quanto o próprio capitalismo, somente poderá prosperar com a inserção dos princípios democráticos nas práticas capitalistas. [24]

            Em que pese o desaparecimento das fronteiras que separavam os sistemas políticos em função de sua adesão a modelos econômicos antagônicos, continua tendo uma elevada dose de atualidade o problema da relação entre Democracia e economia de mercado. O problema está na possível incompatibilidade entre a "autodeterminação do Estado" – como reflexo teórico, por sua vez, da vontade da maioria popular soberana – e o poder financeiro e econômico das grandes corporações empresariais. Essa dialética ganha maior intensidade se considerado esse muito conhecido fenômeno denominado globalização, que vem confirmar a subordinação do Estado Constitucional Moderno às decisões adotadas nos circuitos econômicos que formam as grandes multinacionais e os mercados financeiros, nos quais o protagonismo está a cargo de instituições bancárias com um considerável nível de independência com relação aos ambientes democráticos.

            Esta realidade está na pauta da doutrina mais avançada, que entende serem necessários esforços para democratizar o capitalismo e torná-lo solidário, superando a idéia de acumulação individual ou de grupos em detrimento do conjunto da Sociedade global.

            Uma das formas de Capitalismo Democrático é a denominada Democracia econômica. Os requisitos que podem satisfazer um projeto de democratização das relações econômicas são de dois matizes: primeiro, apresentar um "desenho global" da capacidade de persuadir aquelas pessoas que reconheçam valor nas políticas de inovação (de identidade e de solidariedade). Segundo, prever benefícios materiais que os indivíduos possam perceber imediatamente ou calculá-los com facilidade (incentivos materiais e individuais).

            Os programas de Democracia Econômica deverão desenvolver a dupla função de mobilizar as paixões e os interesses. Neste sentido, é importante a investigação que realiza Domenico Nuti [25], que parte da hipótese de que as diferentes acepções de Democracia Econômica – correção do funcionamento espontâneo do mercado através de políticas de intervenção do Poder Público, constituição de instituições de auto-governo social e valorização de diferentes âmbitos de Democracia Micro-econômica – não são alternativas, mas sim complementares. As pesquisas do autor italiano concluem que o processo de Democracia Econômica se desenvolve através de uma pluralidade de dimensões.

            Além de Domenico Nuti, outros autores apontam, de modo geral, que a Democracia Econômica pode ser associada às seguintes dimensões: a primeira estaria relacionada com a "superação dos modelos de industrialismo". Os programas de democracia econômica terão dificuldades para terem êxito se não forem abertos à maioria dos trabalhadores e cidadãos. Considerando-se o modelo social-democrata sueco, que funciona como uma espécie de paradigma, a Democracia Econômica deve ser considerada a terceira etapa no desenvolvimento da Democracia e deverá assinalar a evolução desde as democracias política e social (que já estão razoavelmente discutidas, mas não implantadas, principalmente nos países periféricos e semi-periféricos) à Democracia Econômica. Esta questão está ligada a todas as tentativas para ampliar e qualificar a cidadania. É claro que um novo modelo de Poder Público, superados os conceitos clássicos de Soberania, divisão de poderes e Democracia Representativa, constituirá um fundamental meio de cultura para os projetos de Democracia Econômica. A segunda dimensão está vinculada com as reformas e funcionamento das relações industriais. O processo, muito provavelmente, será multidisciplinar e aqui, no caso, economistas e administradores privados devem estar convencidos da premência da mudança, até para a própria sobrevivência da espécie humana. Na maioria dos países existe uma crise crônica e desorientadora dos modelos clássicos do pluralismo e do neo-corporativismo. As relações empresariais mais eficazes são aquelas que combinam um bom grau de concentração com margens de descentralização, de regulação rigorosa com elementos de flexibilidade. O rol de empresas interessadas só poderá se consolidar se estiverem presentes propostas de aumento de qualidade e a participação nos seus resultados e nas suas funções de coordenação e administração. [26]

            É preciso ir fundo nas propostas de reforma dos fundamentos do Capitalismo. Caso não seja controlado pela Sociedade, qualquer tipo de tentativa de desenvolvimento de modelos estatais pós-modernos será efêmero, infrutífero. E o único modo de convencer os centros de comando capitalistas é demonstrar que o futuro da humanidade e o do próprio capitalismo depende desta mudança de concepção, fazendo convergir Democracia, lucro e interesse social transnacional.

            Robert Dahl empresta grande relevância à busca de soluções democráticas para o capitalismo, com pesquisas que já se estendem por muitos anos. Num ensaio denominado Capitalismo Corporativo, o autor desenvolve a possibilidade de implantação de uma estrutura econômica alternativa, que ajudaria a reforçar a igualdade política e a Democracia, através da redução das desigualdades originadas pelo capitalismo global. [27]

            É provável que, progressivamente, a liberdade econômica se transformará em liberdade política com o aparecimento do investimento e o consumo "socialmente responsável", que utiliza as novas possibilidades de consumo e investimento proporcionados pelos instrumentos tecnológicos e pela globalização para colaborar com a evolução do sistema mundial de produção, de modo a levá-la à consecução de alguns fins éticos, sociais e políticos. Note-se que há, também, uma forte dose de otimismo, contraposta ao pessimismo da idade contemporânea, nas propostas de Democracia Econômica.

            Sem a democratização do capitalismo as bases para a superação do Estado Constitucional Moderno estarão comprometidas. É fundamental democratizar o capitalismo para superar o Estado Constitucional Moderno. [28]


1.4 – AS ALTERNATIVAS DEMOCRÁTICAS.

            O vento da história mudou de direção e sopra em um único sentido: o da Democracia. Neste sentido, a política é autônoma (da religião), e onde chega o sopro da pós-modernidade, um governo é legítimo unicamente se eleito pelos governados e se está fundado em seu consentimento. Para o Zeitgeist [29], o espírito de nosso tempo, A Democracia já não tem inimigos, já não está ameaçada por legitimidades alternativas. Mas ganhar a guerra não é ganhar a paz. Viramos uma página, mas por isto mesmo o livro do futuro está mais aberto do que nunca. [30]

            Assim, é preciso considerar a construção das democracias. Não mais da Democracia, como em sua concepção moderna, mas de muitas democracias, como sugere e requer o novo ambiente mundial. A partir desta constatação é possível propor os seguintes conceitos de Democracia:

            a)A Democracia Ecológica;

            Diz-se democracia ecológica ao direito a entender, a participar, a poder apresentar reclamações e a ser atendidos a todos os que participam do debate ambiental: a população, os grupos comunitários, os defensores do meio ambiente, os empresários, os trabalhadores e empregados, os governos e os representantes eleitos e todos os representantes de segmentos sociais.

            No último meio século, a humanidade encontrou-se diante da possibilidade de se auto-destruir e a inédita condição de ter consciência disso. Ou seja, de saber que as armas atômicas e a crise ambiental podem não apenas desviar o caminho da história, mas inclusive representar o final da própria história (porque no dia depois de amanhã não haverá humanos que possam explicá-la). [31] O que deixaria até Francis Fukuiama [32] desapontado.

            Da mesma maneira que no âmbito individual, a consciência da morte pode levar a viver com mais sabedoria (a apreciar ainda mais a vida), assim, a consciência da possibilidade de uma morte coletiva poderia promover uma sociedade mais "sábia", mais capaz de compreender o valor daquelas instáveis condições que chamamos "paz" e "equilíbrio social e ambiental". [33]

            Assim, a expressão "sustentabilidade ambiental" refere-se às condições sistêmicas em virtude das quais, em escala planetária ou regional, as atividades humanas não podem chegar a estressar o ecossistema além do limite a partir do qual se ativam fenômenos irreversíveis de degradação. [34]

            A questão ambiental poderia, em definitivo, converter-se em um terreno de cultivo de valores e comportamentos favoráveis ao crescimento de uma cultura civil democrática. Pode, também, acontecer o contrário, mas isso não significa que não seja uma necessidade na qual se deva concentrar-se.

            Não só porque a Democracia seja um contexto coerente com as necessidades da transição à sustentabilidade. Não somente pelo fato de parecer o mais atrativo, mas também porque é o mais eficaz para impulsionar e promover um fenômeno tão complexo. Definitivamente, a Democracia é um regime social capaz de aprender.

            A Democracia é (ou pode ser, quando funciona) um grande processo de aprendizagem coletivo e, por isso, é precisamente o único caminho com o qual se pode esperar chegar à sustentabilidade.

            A nova cultura da sustentabilidade deve caracterizar-se, como a Democracia, por uma base de entendimento comum (algumas práticas sociais, alguns valores, alguns critérios de juízo socialmente compartilhados) que representem o mínimo indispensável para fazer convergir o interesse político e social na direção da sustentabilidade ambiental, e deixar em aberto o máximo de espaço possível às diferenças entre as idéias e suas interações. Ou seja, de tal maneira que possam conviver dialeticamente diversas hipóteses de sociedade sustentável.

            A solução está em dar à democracia um poder de aceleração o maior possível, pondo-a em tensão, nas formas que lhe são fisiológicas, ou seja, favorecendo o crescimento de uma nova cultura e de uma nova sensibilidade social, de novos juízos de valores, de novas competências difusas.

            O caminho passa pelo desenvolvimento de uma Democracia mais madura, capaz de definir cada dia seus instrumentos para fazer frente às novas experiências, às novas problemáticas, às novas formas de comunicação que a tecnologia introduz na vida cotidiana. E, ao mesmo tempo, capaz de produzir uma nova cultura e novos comportamentos.

            É importante repetir: a questão ambiental mal encaminhada pode ser um perigo mortal para a Democracia. E a crise da Democracia é uma redução nas esperanças de êxito dos esforços futuros para resolvê-la. [35]

            Por outro lado, sem o reconhecimento de que os direitos fundamentais devem incluir o meio ambiente, que este deve ser saudável e não pode ser destruído sem castigo, o chamamento à população para que coopere com a sustentabilidade ambiental não deixa de ser uma mostra de cinismo. Desarmados, os cidadãos comuns não dispõem dos mecanismos básicos para defender o meio ambiente. Um emaranhado de normas não permite que o bosque veja a árvore. A ausência de um ambiente democrático para a resolução de conflitos afasta a Democracia Ambiental, uma proposta regeneradora da confiança da população nos poderes públicos.

            b)A Ciberdemocracia ou Democracia eletrônica;

            A fascinação pela comunicação de massas ameaça, então, triunfar sobre o debate político, o único meio pelo qual se manifesta a liberdade dos cidadãos. A Sociedade passa a ser dominada pelos meios de comunicação e não o contrário, como deveria ser.

            Um dos desafios impostos ao novo Estado que surgiria da superação do Estado Constitucional Moderno seria a democratização dos meios de comunicação, que hoje estão a serviço, muitas vezes, de interesses escusos. [36]

            O novo Estado estaria conectado com as possibilidades originadas com o surgimento da telefonia, da televisão digital, da informática e do conjunto de novos mecanismos de comunicação a distância. A "ciberdemocracia" poderia ser experimentada e outras formas de participação e mecanismos representativos poderiam ser propostos. Atualmente é muito fácil organizar consultas rápidas à população sobre temas de interesse imediato e que requeiram um pronunciamento de relativa urgência. Plebiscitos e referendos não teriam porque serem casos excepcionais na vida social e política. Ao menos tecnologicamente já não há mais desculpas. [37]

            Os extraordinários avanços tecnológicos dos últimos anos estão sacudindo, cada vez com mais força, os alicerces que sustentavam as modernas sociedades democráticas. Estas transformações não só estão afetando de modo substancial as relações sociais, mas também estão questionando a validade e funcionamento das atuais estruturas e instituições políticas. [38]

            O Estado Constitucional Moderno, principalmente seus modelos autoritários, perderam, de modo definitivo, a batalha para os meios de comunicação na era da Internet.

            O novo Estado deverá ter nos meios de comunicação um de seus principais instrumentos de exercício democrático, e não o contrário, como se pode observar atualmente.

            c)A Democracia econômica;

            Como já foi tratada em parte anterior deste artigo, a democratização do capitalismo é fundamental para que a superação democrática do Estado Constitucional Moderno possa ser realizada com base em pressupostos adequados ao novo ambiente mundial.

            A economia está destinada a produzir riquezas. A política se dedica, ainda que nem sempre seja assim, à distribuição ou re-distribuição destas riquezas. E são as distribuições as que podem ser declaradas de direita ou de esquerda. Mas, em todo caso, a política pode distribuir riqueza somente se a economia a produz. Se a economia não funciona, a política já não tem nada que redistribuir e acaba por distribuir pobreza. A autonomia e prioridade da produção da riqueza, sobre a distribuição, é procedimental. Pode-se, muito bem, dizer que a distribuição é mais importante que a geração da riqueza. Mas a prioridade procedimental continua sendo a mesma. Caso não tenha o que comer, só se pode dividir a fome. E não é uma opção interessante.

            Assim, considerado o procedimento lógico descrito acima e concebido por Giovanni Sartori [39], o que resta é a democratização da economia, ou seja, que a comunidade possa participar da decisão do que e como será produzido, principalmente pelo acesso ao crédito.

            Em princípio, uma economia de mercado é compatível com qualquer sistema político que conceda liberdade ao mercado. Portanto, teoricamente, mercado e ditadura podem acoplar-se, como já se observou durante as ditaduras sul-americanas das décadas de 70 e 80. Mas está claro que a realidade hoje é outra. Não há como escapar do "contágio democrático", o que torna, atualmente, praticamente impossível aquele acoplamento. A vitória da Democracia como princípio de legitimidade permite prever que o êxito do mercado se converterá, cada vez mais, numa demanda da Democracia. Com a condição, bem entendido, de que o mercado tenha êxito e de que verdadeiramente produza Bem Estar. [40]

            As democracias representativas atuais estão carentes de uma estrutura ética concebida a partir de valores democráticos conectados com as necessidades pós-modernas. Os valores que foram impostos são os valores do mercado, enquanto que o modelo de conduta é o das estratégias empresariais que se movem pelo lucro, deixando de lado outros padrões éticos e de valores totalmente indispensáveis para a convivência, como são os da gratuidade e da generosidade. Assim, a única política possível parece ser a da lógica que o sistema econômico proporciona. Esta colonização da vida pública pela economia fez com que os estatutos de defesa do consumidor (e sua lógica) fossem se afirmando sobre os direitos de cidadania, supondo a mercantilização da vida política, que fica eclipsada. Deve-se recordar, nesse sentido, que o mercado, mesmo com a pretensão descabida de ser um dos paradigmas da liberdade, produz desigualdade e não ajuda a configurar o exercício responsável da liberdade, ao proporcionar modelos de discussão privados em lugar de públicos e, portanto, impedindo as pessoas de falarem como cidadãs sobre as conseqüências de nossas ações em comum. [41]

            O conceito de "bem comum" passou para a história. Hoje prevalecem os interesses particulares, parciais. Isto tem muito a ver com a progressiva tendência de se estruturar o sistema de representação de interesses através de organizações especializadas ou competências estruturadas em torno de critérios setoriais, ou transnacionais. Isto, junto à própria complexidade intrínseca da máquina estatal, vem ajudando a debilitar a capacidade de resposta do Estado Constitucional Moderno ante a cidadania. [42]

            Alguns recentes e importantes debates, que estão acontecendo principalmente no plano acadêmico, do qual estão participando teóricos do pós-liberalismo até autores como Robert Dahl, que em seu livro La democracia y sus críticos, reclama uma "terceira transformação" na Democracia, ou seja, o desenvolvimento de uma "Democracia avançada", capaz de levar os métodos e procedimentos da Democracia à esfera econômica. [43]

            Caso isso não seja providenciado, a magnitude das dificuldades econômicas que afetam, na atualidade, tantos países, terá inevitáveis conseqüências políticas. Haverá um agudizamento dos antagonismos sociais de todo tipo, intensificando a luta pelo bem estar econômico e fazendo mais insuportável o custo da derrota. Estimulará a migração econômica que por sua vez suscita, nos países mais desenvolvidos, a hostilidades contra os imigrantes e a exigência que o Estado se converta numa fortaleza. A depressão econômica torna muito mais difícil a consecução do ideal de igualdade cidadã e provoca uma perda de confiança na capacidade dos governos democráticos para solucionar problemas sociais. Os sistemas democráticos mais robustos podem, talvez, resistir a estes choques, enquanto que as democracias mais recentes, que necessitem de panorama mais favorável para consolidar-se, podem sofrer danos irreparáveis. [44]

            Não deverá ser surpresa, portanto, se num futuro não muito distante houver uma diminuição da atual volatilidade dos mercados. [45] Em tal sentido, a criação de novas instituições internacionais ou mundiais democráticas capazes de regular e controlar com efetividade a atividade econômica e financeira dos mercados deverá ajudar a ajustar a padrões humanitários esse grande cassino em que se converteu o atual mercado financeiro.


1.5 – A DEMOCRACIA COMO PARADIGMA PARA SUPERAÇÃO DEMOCRÁTICA DO ESTADO CONSTITUCIONAL.

            O Estado que substituiria o Estado Constitucional Moderno, como Poder Público, deveria assegurar não só a igualdade de oportunidades entre os diferentes projetos de institucionalização democrática, mas também pautas mínimas de inclusão que tornem possível uma cidadania ativa e capaz de acompanhar, controlar e avaliar a importância e adequação de cada projeto. Estas pautas são necessárias para fazer da instabilidade institucional um âmbito de deliberação democrática.

            Atualmente a instabilidade institucional é tratada como um fator de desequilíbrio do sistema político e, deste modo, produzindo freqüentes crises. O no Estado deverá poder transformar a instabilidade em espaços deliberativos democráticos. [46]

            Uma teoria da Democracia para depois do Estado Constitucional Moderno não deve ser, pois, uma Pura Teoria da Democracia, mas sim um esforço por uma teoria livre e isenta de partidarismos.

            Uma teoria democrática com essa característica será a mais entrosada com seu objetivo, pois a Democracia é procedimento, uma forma para enfrentar e resolver as diferenças de opiniões ou doutrinas na política. Não poderá ser acusada, portanto, com relação aos seus efeitos práticos, de ser uma teoria vazia. Estaria comprometida com a maioria da Sociedade de tal forma que os pouco ou nada democratas não irão gostar.

            Mas justamente o recordar as altas exigências da Democracia como método, liberada da roupagem de classe ou confissão de nacionalidade, é o que deveria levar às políticas de todos tempos e lugares a adentrar no miolo democrático e assumir isso que é "forma" em sua integridade e com o mais substancial e renovado "conteúdo".

            Hoje é mais conveniente para muitos identificar, no fundo, a Democracia com alguns valores e feitos determinados – com uma ideologia – para condenar como "não democrático" tudo que se afasta deles. Há motivo, portanto, para apontar a existência de uma Teoria Pós-Moderna da Democracia, vinculada à superação do combalido Estado Constitucional Democrático. [47]

            No âmbito mundial está surgindo uma nova ordem política. E isto está provocando a necessidade de se re-fundar as bases que sustentam a atual ordem política mundial, com um apelo mais universalista e menos excludente.

            Deve-se recordar que, para que a Democracia se esparja e possa se aprofundar, necessárias são pessoas que vivam os valores democráticos, que se tenham socializado e interiorizado na Democracia. [48] A Democracia não se limita ao voto, nem a alguns procedimentos para solucionar conflitos. É, principalmente, um talento cívico. E só pode nascer e consolidar-se desde um interior comprometido com a coletividade e a felicidade dos demais.

            A Democracia, amparada por estes alicerces pós-modernos seria o principal procedimento para enfrentar e resolver as diferenças que surgirão com a nova realidade globalizada.


1.6 – RECORTES TEÓRICOS SOBRE A SUPERAÇÃO DEMOCRÁTICA DO ESTADO CONSTITUCIONAL.

            Caso não se comece, imediatamente, a teorizar a superação do obsoleto e insuficiente Estado Constitucional Moderno, corre-se o risco de se ver sua progressiva substituição por um "Estado de Direito Privado", reduzido a um código de regras que se legitimam por seu bom funcionamento, mas que estão desprovidas de qualquer conotação humanitária. Impõem-se, assim, a racionalidade instrumental e a política como elemento gerencial. O político e o movimento político não serão valorados por suas capacidades de gerarem ideais ou de atuarem em conseqüência, mas sim por sua efetividade e rapidez para resolver problemas – ou aparentar resolvê-los de forma convincente – passando a ser um gerente da coisa pública e não um servidor da mesma.

            A globalização implica, portanto, um certo nível, mesmo que mínimo, de governabilidade mundial. A ausência dessa estrutura política só acentuaria a decadência do político diante da cada vez mais crescente influência dos poderes econômicos. As empresas multinacionais ou transnacionais tendem a converter-se, deste modo, no eixo em torno do qual gira o destino dos seres humanos. Um destino no qual suas aspirações e necessidades ficam reféns dos interesses dos grandes grupos financeiros. Falar de globalização sem estas condições é não só prematuro, mas inclusive sarcástico. [49]

            Para isso é preciso, em primeiro lugar, como aponta o cientista basco Gurutz Jáuregui, reformar e superar o atual sistema político espacial-territorial, a fim de que todos aqueles assuntos, cada vez mais numerosos e importantes, que escapam ao controle do Estado Constitucional Moderno, possam ser submetidos a controles democráticos efetivos. Em segundo lugar, é necessário repensar sobre o papel e a função reguladora das diversas agências globais e regionais que já existem, assim como a criação de novas estruturas e organizações. Por fim, é imprescindíveis reconsiderar a articulação e conexão das instituições políticas com os diferentes grupos, organizações, associações e agências de caráter internacional, a fim de gerar um sistema global compatível com os valores e as tradições democráticas. [50]

            A era pós Estado Constitucional Moderno na que se está entrando poderia também ser qualificada como neo-imperial, na medida em que, como o Império Romano, sua "fronteira" já não é uma linha que divide um espaço e separa alguns homens – os que exercem a soberania e os que não exercem – mas sim uma margem indefinida. A plenitude de uma soberania não se choca, como no tempo do Estado Constitucional Moderno, com a plenitude de outra soberania do outro lado do rio. O mesmo movimento que tende a relativizar as fronteiras do mundo desenvolvido. Nenhuma fronteira será absoluta. [51]

            Uma das questões fundamentais da orientação teórica e política do presente reside em ver se seria possível tolerar a idéia de uma sociedade carente de centro e se, caso positivo, se poderia perceber as condições para uma política democrática efetiva. Ou se, tendo-se em conta a situação geral do sistema de Sociedade Global, se acreditaria, ou se deveria, atribuir à política uma vez mais uma responsabilidade global que possivelmente poderia destruir seus limites atuais e os laboriosos procedimentos da formação da opinião democrática. [52]

            É importante repetir o que António Manuel Espanha escreve sobre a nova estrutura estatal. A resposta ao padrão organizativo caracterizado pela generalidade, abstração e centralismo – de que o Estado Constitucional Moderno e o direito legalista ou conceitualista são um bom exemplo – estaria numa nova estrutura organizativa caracterizada: a) por uma arquitetura em rede, em que cada pólo fosse gerido autonomamente, tendo em conta todas as particularidades das situações; b) em que a flexibilidade e a adaptabilidade do conjunto fosse garantida pela inexistência de um pólo central; e c) e em que a comunicação fosse de um tipo novo, não baseada em modelos gerais e abstratos de informação, mas em discrições personalizadas, exaustivas e atentas às dimensões não puramente racionais das situações. É a isto que Toffler chama flex-organizations. [53]

            Em contrapartida, um direito para o novo tipo de organização teria que prescindir da generalidade e da abstração. Teria que ser produzido "localmente", nas periferias que estão mais em contato com as situações a regular. Mas teria ainda que prescindir de características porventura mais profundas do nosso mundo jurídico, como o modelo de justiça adjudicatória (garantida por um terceiro, independente e neutro), fomentando formas de composição pactuada. Na verdade, a justiça "neutra" não considera uma parte muito importante das situações, o plano da emoção e da afetividade. Com isto, perde muita informação que seria indispensável para uma composição "amigável", que se desenvolve em contato com todos esses elementos não racionais, manteria uma informação suficientemente rica para garantir soluções adequadas ao caso concreto (e não, apenas, ao seu esqueleto conceitual, genérico, abstrato). [54]

            A suposta inevitabilidade dos imperativos neoliberais afetaram de forma irreversível o âmbito e a forma do poder de regulação do Estado Constitucional Moderno. [55] Estas mudanças não supõem, sem dúvidas, uma volta ao passado, já que só um Estado pós-liberal pode desestabilizar a regulação pós-liberal. Esta desestabilização cria o anti-Estado dentro do próprio Estado. Estas transformações são tão profundas que, sob a mesma denominação de Estado, está surgindo uma nova forma de organização política, mais vasta que o Estado Constitucional Moderno. Uma organização integrada por um conjunto híbrido de fluxos, redes e organizações na qual se combinariam e interpenetrariam elementos estatais e não estatais, tanto nacionais, como locais e globais. Esta nova organização não teria centro e a coordenação do Poder Público funcionaria como imaginação de centro. A regulação social que surgiria desta nova forma política seria muito mais ampla e férrea que a regulação protagonizada pelo Estado Constitucional Moderno no período anterior, mas como também seria mais fragmentada e heterogênea tanto por suas fontes como por sua lógica, se confundiria facilmente com a desregulamentação social.

            Como escreve Boaventura de Souza Santos, grande parte da nova regulação social seria produzida através da sub-contratação política, diferentes grupos e agentes que competem e que representam distintas concepções dos bens públicos e do interesse geral. [56]

            Atualmente muitos autores já não se conformam com a mera exposição de temas voltados à superação democrática do Estado Constitucional Moderno. Começam a efetivamente propor novas teses, como é a defendida por Pierre Lévy, em favor de um Poder Público apoiado na ciberdemocracia, com alcance local, regional e mundial, transparente e a serviço da consciência coletiva e, em conseqüência, a favor da separação da cultura da esfera pública.

            Uma nova forma de Poder Público estaria emergindo progressivamente, articulado com as novas condições de governabilidade (globalização, liberalização, informatização). Articulado também em nível global garantiria a diversidade cultural e transmitiria essa dinâmica coletiva da Sociedade às demais esferas. [57]

            Desde logo é preciso dizer que uma utopia do Século XXI não poderá ser senão a descrição de uma Sociedade aberta e livre, mais aberta e livre que a Sociedade Moderna.

            Como já assinalado, é muito provável a intensificação das discussões em torno de um Contrato Social Global para a satisfação das necessidades básicas, dirigido a suprimir as ilegítimas desigualdades sócio-econômicas entre classes, gêneros, etnias, regiões e nações. [58]

            António Del Cabo e Gerardo Pisarello sugerem que deveria ser proposto um novo Contrato Social fundado na constatação de que a socialização da economia, produzida com o desenvolvimento da modernidade e sob os auspícios do Estado Constitucional Moderno, só foi conseguido às custas da "dessocialização" da natureza, o que conduziu os atores sociais mais relevantes – incluídas as organizações sindicais – a não perceberem, em alguns casos, os graves delitos ecológicos levados a efeito na esfera do trabalho e da produção. Mas, sobretudo, na evidência de que os sistemas sócio-econômicos humanos cresceram irracionalmente em relação à biosfera que os mantém, desencadeando a crise ecológica global e pondo em risco todos os habitantes do planeta. [59]

            Os dois autores defendem que o contrato anterior deveria ser substituído pela efetiva adoção de um Contrato Social Global democrático, voltado para um novo regime político internacional.

            Este processo deveria, evidentemente, culminar numa impostergável democratização da Organização das Nações Unidas, junto com uma reforma profunda de todos os objetivos da instituição e de seu Conselho de Segurança. Seria fundamental também a criação de um verdadeiro Parlamento Mundial, de uma Corte de Justiça independente e vinculante, assim como a mudança do Tribunal Penal Internacional para uma corte capaz de prevenir os genocídios e os crimes contra a humanidade, num sentido que permita superar os duplos critérios (internacional e nacional) e as limitações impostas pelas grandes potências, como atualmente existe. [60]

            Por sorte ou por azar, está-se testemunhando uma série de mudanças no rumo da história, de notável envergadura. Assiste-se, por um lado, como conseqüência da revolução tecnológica e da mundialização da economia, a um processo de cosmopolitização inevitável da vida política, cultural e social. Querendo-se ou não, na época das comunicações via satélite, todos são forçados a se converterem em cidadãos do mundo. Os mesmos livros podem ser lidos em quase todos os lugares, se assiste aos mesmos espetáculos, se participa e se sofre por idênticos acontecimentos. As ações financeiras e econômicas de Tóquio repercutem imediatamente nas bolsas da América Latina e Europa. Os conflitos bélicos se projetam em Nova Iorque com a mesma intensidade que em Paris, Berlin ou Londres.

            Está-se contemplando, como lógica e compreensível reação a esse processo, movimentos de descentralização a todos o níveis, que permitem a alguns teóricos mais afoitos falar de uma espécie de volta ao sistema feudal.

            Por conta disso, proliferam nacionalismos beligerantes e aparecem extravagantes construções ideológicas de um municipalismo e de um localismo que, se no mundo feudal tiveram alguma justificativa, agora não passa de anacrônicos fenômenos de um tempo definitivamente convulsionado.

            Pode-se dizer que todos estão condenados a desenvolver uma existência esquizofrênica em duas utopias antagônicas (a utopia da cosmopolitização e a utopia do localismo), que terminam gerando duas realidades contraditórias e excludentes: a realidade do uniformismo e da homogeneidade, própria do universalismo, e a realidade da diferenciação e da diversidade, própria do localismo o do neo-feudalismo.

            Paralelamente presencia-se, na condição de expectadores privilegiados, o singular cataclismo das grandes concepções de mundo, que até poucos anos serviram para organizar política e ideologicamente a convivência de milhões de homens. A crise irremediável e definitiva dos paises do chamado socialismo real veio acompanhada da crise do Terceiro Mundo. O que significa que, se a utopia socialista fracassou, a velha utopia liberal, mesmo com o empenho contemporâneo de Friedman, Hayek, Kristal ou Fukuyama, também não prosperou.

            Nestas circunstâncias, que se acaba de expor, vale falar de uma situação generalizada de crise. Nesses momentos, o mais importante é tomar conhecimento do que realmente está acontecendo e propor uma orientação intelectualmente conseqüente.

            Não se deve incorrer na exposição banal de oferecer diagnósticos definitivos e soluções de urgência para um problema tão complexo. No vasto campo das discussões sobre este tema, é comum notar-se o fenômeno da simplificação arbitrária do que é complexo. Isto não passa de falsificar e mascarar a realidade, oferecer remédios e soluções falaciosas aos males oriundos da moribunda modernidade. Como sugere Feliz Tezanos, por todas as partes surgem vozes com vocação de redentores que, por ignorar a magnitude e o alcance de muitas das questões e problemas que discutem, encontram infantil e facilmente receitas milagrosas e fórmulas salvadora. [61]

            Mesmo assim, não se deve incorrer no erro de complicar, de maneira improcedente, o problema, levando a análise para o outro extremo.

            O que se trata não é de simplificar o complexo ou complicar arbitrariamente o simples. O que se deve, neste momento, é esclarecer que os problemas apontados determinam inúmeras inadequações nos clássicos conceitos de representação e legitimidade democrática, sendo a pretensão desse artigo apenas a de esclarecer, com os riscos que os conhecimentos dos autores permitam, as causas, o sentido e o alcance da crise presente das idéias de Estado Constitucional Moderno e de Democracia Representativa.

            Um bom exemplo de abordagem equilibrada é a que faz Norbert Bilbeny, que em sua obra Política sin Estado [62] ensaia um ordenamento internacional democrático criticando a "razão de Estado". Segundo ele, num hipotético ordenamento mundial mudaria de escala, mas não de ordem estatal. Ou, em termos análogos, se continuaria recorrendo à "razão de Estado". Para Bilbeny, onde há "razão de Estado" prevalece a autocracia sobre a Democracia e o perigo de guerras sobre a garantia da paz. Mesmo Kant imaginou uma civitas gentium, ou união de povos da terra numa perspectiva de uma "federação da paz" e não de um auto-contraditório "Estado de povos". Por conseguinte, um ordenamento internacional de paz não é um Estado mundial, mas sim uma ordem política na qual, a exemplo do Estado Constitucional Moderno, se invocam normas e se recorre à coação, com a diferença de que não se justifica nenhuma ação com o falso argumento da "razão de Estado", o maior fato consumado da política que se tem notícia.

            Com tudo e com isto, não se está aqui defendendo a súbita abolição de qualquer tipo Estado, ou sua gradual extinção, como propuseram anarquistas e marxistas, respectivamente, mas sim sua lógica e previsível superação desde que se cumpra, basicamente, a condição de desenvolvimento democrático. [63] Só depois disso é que o Estado Constitucional Moderno poderia ser superado tanto por escala, quanto por ordem e forma específica. Do ponto de vista democrático, o Estado Constitucional Moderno é uma forma incompleta e transitória do ordenamento político em geral, que adotou, nos últimos dois séculos, outros modelos de organização, mas que foram espécies do mesmo gênero, como o de Bem Estar, Providência, Social, Liberal e Neo-Liberal.

            Mesmo a despeito do que foi trazido à colação sobre um ordenamento internacional de paz e apesar do estatalismo mostrar sérios sinais de exaustão, essa proposta se aloja no longínquo país abstração. Assim acontece com quase tudo que tem relação com a razão prática, que não obstante, seria o único mensageiro de paz possível, tanto na ética como na política.

            Um ordenamento internacional de paz não forma parte, em princípio, do gênero de utopias de predição. Mas também não pertence às utopias de intenção. Ambos gêneros de utopia representam, de um modo ou de outro, um conteúdo positivo, propiciado, no primeiro caso, por um suposto saber teórico ou especulativo e no segundo por um decidido interesse prático ou moral. São utopias, assim, substantivas.

            Um ordenamento internacional de paz não é uma utopia nos moldes das figuras míticas da "Nova Atlântida" ou da "Cidade do Sol". Trata-se de um conceito extraído do conceito de Democracia, como já ressaltado, que é um conceito formal: a existência de uma condição política tal que permita a paz por acordos e por maioria. A utopia dela derivada – uma ordem mundial que ultrapasse o Estado Constitucional Moderno – é, igualmente, formal.

            A utopia de um ordenamento internacional que indicaria o "não lugar" e o "ainda não" de uma política que detém os meios necessários para a discussão política. Estes meios seria a negação à guerra, e a negação ao argumento da "razão de Estado", próprios de um ordenamento democrático desenvolvido. E esta idéia que a razão permitiu pensar, a mesma razão não impede que seja tomada ao mesmo tempo como um ideal e que sua realização chegue a constituir o objetivo de um interesse prático. [64]

            Um ordenamento internacional de paz representaria o último passo em direção ao desenvolvimento racional de ordenamento político democrático. As condições atuais, tanto políticas quanto econômicas, sociais e culturais, assim o impõem.

            Vê-se assim que o nascimento de uma Sociedade política mundial resultaria de processo vital de crescimento em que o trabalho das instituições oficiais e privadas, interessadas em qualquer modalidade de aproximação e colaboração internacional, acharia seu lugar, mas o papel essencial seria desempenhado pela vontade das pessoas de cada nação de viverem juntas no mundo, ou seja, por uma vontade bastante poderosa para varrer os obstáculos criados pelo mito dos estados soberanos ou pelos prejuízos dos governos ou pelos obstáculos criados pelo próprio povo, originados pela infelicidade, pela lentidão da razão e pelo egoísmo natural.

            Ao mesmo tempo pode-se compreender que a independência das nações não correria perigo, muito pelo contrário, seria melhor garantida pela criação de uma Sociedade política mundial. Os estados renunciariam à corroída Soberania Moderna, o que na verdade nunca tiveram. Renunciariam à sua plena independência, ou seja, a algo que já perderam. Teriam que abandonar algo que ainda possuem, mas cujo uso se mostrou mais prejudicial do que proveitoso às nações, ao mundo e a eles mesmos, ou seja, a capacidade que cada um deles tem de gozar de uma independência que nenhuma autoridade superior controla.

            Como já escrevera Jacques Maritain, sem dúvidas, em sua interdependência mútua, as nações poderiam chegar a um grau de independência real, ainda que imperfeita, mais elevado do que o que possuem atualmente, pelo fato de que sua vida política interior, liberada da ameaça da guerra e da interferência das nações rivais, poderia, na realidade, chegar a ser mais autônoma do que jamais foi. [65]

            Como isto poderia ser feito é tarefa para os pensadores atais. A situação de hoje é ainda mais dramática, pois a globalização, que não estava na pauta mais imediata de Maritain e seus contemporâneos, insere discussões que vão desde a economia até o meio ambiente, passando por temas de interesse regionais e locais.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Esta transformação colocará, pouco a pouco, num mesmo plano as regras surgidas dos processos políticos patrocinados pelo Estado Constitucional Moderno e as resultantes da ação articulada das empresas privadas. Pouco importa que uma norma seja imposta por uma empresa privada ou por um comitê de funcionários. Já não é expressão de uma soberania, senão, simplesmente, um redutor de incertezas, um meio de diminuir o custo das transações e aumentando sua transparência.

            Até pouco tempo, os parlamentos que se pretendiam soberanos votavam uma tarifa aduaneira aplicável às mercadorias que atravessavam as fronteiras. Hoje, os "serviços" – esses produtos imateriais da era pós-moderna – obtêm o crescimento pelos intercâmbios. Precisamente por ser imaterial, o desenvolvimento de seus intercâmbios já não está vinculado à diminuição de uma tarifa aduaneira – nunca passam fisicamente uma fronteira – mas sim à harmonização das regras internas, para que um banco ou uma companhia de seguros possa instalar-se no país que escolha e desenvolver nele as conexões a partir das quais cria riqueza. Os debates dos parlamentos soberanos foram sucedidos por negociações entre funcionários, que não respondem perante parlamento algum, porque nenhum parlamento pode modificar um detalhe sem destruir o conjunto. Está-se bem longe de uma República Mundial. O que se criaria não seria um corpo político mundial, mas sim um tecido sem costuras aparentes, uma aglomeração indefinida de elementos interdependentes.

            Esta seria a lógica do mundo pós-moderno, mas ainda não é sua realidade. O espaço das redes não é, efetivamente, nem neutro nem homogêneo. É um campo de forças, de desequilíbrios, no qual a vontade de incrementar o número de suas conexões está compensada pelo temor de perder o controle das redes já constituídas. Esta tensão está no coração de nossas sociedades: o mundo se transforma numa gigantesca bolsa de informações, que nunca termina e, quanto mais informações, mais desequilíbrios há. Como um grande sistema meteorológico, o vento que vem preencher uma depressão aqui, produz outra lá.

            Nossas instituições públicas, por estarem ainda inspiradas por uma lógica institucional moderna, não sabem administrar esta tensão entre a abertura que conquista e o âmbito interno que protege. [66] A definição das fronteiras, a constituição do Poder Público, se entende ainda como dados prévios, como as bases estáveis sobre as quais se pode, seguidamente, edificar-se uma Sociedade. A lógica pós-moderna iria inverter completamente esta perspectiva: a fronteira já não é um começo, mas sim a chegada, sempre precária e fluída por natureza, pois a fluidez torna-se condição indispensável da competição e do dinamismo da Sociedade global. Nenhum espaço do Direito estará definitivamente estabelecido. [67]

            Já seria possível ver isto agora, no funcionamento das empresas transnacionais, símbolos deste mundo novo. Nem fechada nos costumes de uma pátria, nem abstratamente apátrida, a empresa multinacional constrói seu êxito a partir da quantidade de relações estruturais e valorativas que pode estabelecer.

            Desde o momento em que a fronteira torna-se um elemento secundário – trate-se de uma empresa ou de um Estado – muda a função de direção e, por conseqüência, a natureza do poder.

            No campo ainda chamado de Estado Constitucional Moderno, este fato terá conseqüências decisivas. Já não se trata de concentrar cada vez mais poder em entidades estatais cada vez maiores, mas sim de organizar a compatibilidade, de preparar a convergência, estabelecendo processos de produção das regras, muito mais do que construindo soberanias. [68]

            Sem dúvidas, a idéia de soberania estatal normalmente estaria ligada a esta obscura e contraditória concepção do que é ter supremacia na ordem política. Além disso, se acrescentada a paulatina limitação do poder dos estados – cedem soberania para fora e para dentro e provocam a rarefação da idéia de Estado Constitucional Moderno – ficam reunidas razões suficientes para se rechaçar a tradicional identificação da Soberania com o Poder Público atual e, particularmente, com o Estado Constitucional Moderno. Este último se encontra agonizante pela globalização e é insuficiente para fazer frente aos grandes problemas, com a conseqüente perda e eficácia e legitimidade. Por outro lado, frente aos conflitos relacionados com a identidade cultura, o Estado Constitucional Moderno mostra-se grande demais para solucionar o problema. Assim, sua eficácia está duplamente reduzida. [69]

            A aceitação ou não de uma soberania da comunidade política internacional constitui uma verdadeira prova de fogo para a consolidação de uma concepção pós-moderna de Democracia. [70]

            Assim, os líderes de amanhã podem muito bem ter de lidar com uma Sociedade muito mais descentralizada e participante. Uma Sociedade muito mais variada do que a de hoje. Eles podem não ser nunca todas as coisas para todo mundo. Com efeito, é impossível que um ser humano algum dia encarne todos os traços requeridos. A liderança pode muito bem se revelar mais temporária, colegial e consensual. [71] É como o "solidarismo" ou Democracia solidária, como pregado por Gabriel Real Ferrer aponta, de maneira consistente, para uma das alternativas de Democracia após o Estado Constitucional Moderno.

            Necessita-se, portanto, um pensamento alternativo sobre as alternativas. Boaventura de Souza Santos propõe, em sua obra denominada Towards a New Common Sense: law, science and politics in the Paradigmatic Transition, editada em 1995, pela Routledge, uma epistemologia que, diferente da moderna, cuja trajetória parte de um ponto de ignorância, que denomina caos, para chegar a outro de saber, que denomina ordem de conhecimento como regulação. O ponto de chegada, como proposto por Real Ferrer, seria a solidariedade. [72]

            O Estado deveria converter-se em um terreno de experimentação institucional no qual coexistam e compitam, por um determinado tempo, diferentes soluções institucionais como experiências piloto submetidas ao acompanhamento da sociedade como passo prévio à avaliação comparada das prestações de cada uma delas. As prestações de serviços públicos, principalmente no âmbito social, poderiam, assim, realizar-se sob distintas formas e a opção entre elas só poderia ser alcançada uma vez analizada pelos cidadãos a eficiência e a qualidade democrática de cada alternativa. [73]

            O Estado que sucederá o Estado Constitucional Moderno seria verdadeiramente democrático na medida que dê iguais oportunidades às diferentes propostas de institucionalização democrática. Só assim pode a luta democrática converter-se numa luta entre alternativas democrática. Só assim se pode lutar democraticamente contra o dogmatismo democrático. [74]

            Os destinos da Democracia e do Estado estão intimamente ligados, porque ambos implicam o que de essencial tem a humanidade: a aspiração por liberdade, por justiça e o poder criativo da consciência coletiva.


REFERÊNCIAS:

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NOTAS

            01 OLLER I SALA, M. DOLORS. Un futuro para la democracia: uma democracia para la governabilidad mundial. p.03.

            02 REAL FERRER, Gabriel. La solidariedad en el derecho administrativo. p.17.

            03 TOFLER, Alvin. A terceira onda. p.410.

            04 BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo – hacia uma nueva modernidad. p.54 e seguintes.

            05 ARDANZA, José Antônio et alii. La crises del estado y Europa. Ponencia de Pablo LUCAS VERDU. Crisis del estado social de derecho e imaginación constitucional. p.154.

            06 DALLARI, Dalmo de Abreu. O futuro do estado. p.94.

            07 DALLARI, Dalmo de Abreu. O futuro do estado. p.95.

            08 "Anarquia, Estado e Utopia" é um trabalho sobre filosofia política escrito por Robert Nozick em 1974. Esse livro libertador altamente aclamado foi o ganhador do "National Book Award" de 1975. Em oposição ao "Uma Teoria da Justiça", de John Rawls, Nozick argumenta em favor de um Estado mínimo, "limitado às estreitas funções da proteção contra a força, o roubo, fraudes, o reforço dos contratos, e assim por diante". Quando um Estado assume mais responsabilidades do que isso, Nozick argumenta, direitos serão violados. Para sustentar a idéia do Estado mínimo, Nozick sugere a idealização de um Estado ultra mínimo como experimento e tenta mostrar como ele irá, pelo trabalho de uma "mão invisível", resultar em um Estado mínimo.

            09 ROSANVALLON, Pierre. A crise do estado providência. p.136.

            10 SANTOS, Boaventura de Souza. Reiventar la democracia, reiventar el estado. p.29.

            11 LUHMANN, Niklas. Teoria política en el estado de bienestar. p.150.

            12 PEÑA, Francisco Garrido. La ecologia política como política del tiempo. p.336 e 341.

            13 GUÉHENNO, Jean-Marie. El fin de la democracia: la crisis política y las nuevas reglas del juego. p.39.

            14 ARDANZA, José Antônio et alii. La crises del estado y europa. Ponencia de Pablo LUCAS VERDU. Crisis del estado social de derecho e imaginación constitucional. p.164.

            15 JÁUREGUI, Gurutz. La democracia planetária. p.59.

            16 JÁUREGUI, Gurutz. La democracia planetária. p.83.

            17 SANTOS, Boaventura de Souza. Reiventar la democracia, reiventar el estado. p.16.

            18 KNOERR, Fernado Gustavo, in Representação Política e Globalização, na obra denominada Repensando a Teoria do Estado, organizada por Ricardo Marcelo Fonseca, p. 176.

            19 SANTOS, Boaventura de Souza. Reiventar la democracia, reiventar el estado. p.29.

            20 SANTOS, Boaventura de Souza. Reiventar la democracia, reiventar el estado. p.31.

            21 DAHRENDORF, Ralf, FURET, Françoise & GEREMEK, Bronislaw. La democracia en europa. Org. de Lucio Caracciolo, p.22.

            22 MAYOR ZARAGOZA, Federico & BINDÉ, Gerome. Un mundo nuevo. Barcelona: Centro UNESCO de Cataluña, 2000, p.27 e seguintes, citado por OLLER I SALA, M. DOLORS. in Un futuro para la democracia: una democracia para la governabilidad mundial. p.4.

            23 TILLY, Charles. Coerção, capital e estados europeus. p.117.

            24 MÜLLER, Bruno. Notas sobre o fórum social mundial e a crítica ao estado. http://biano.com.br/democracias/notas.asp?id=3. 2005.

            25 SANTOS, Boaventura de Souza. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. p.277.

            26 NUTI, Domenico Mario. Democrazia econômica: mercato, política econômica e participazione. p.123.

            27 CARRIERI, Mimno. No hay democracia sin democracia econômica. p.21.

            28 CARRIERI, Mimno. No hay democracia sem democracia econômica. p.32.

            29 LÉVY, Pierre. Ciberdemocracia: ensayo sobre filosofia política. p.24.

            30 A palavra Zeitgeist significa "espírito da época" no sentido de pensamento predominante num momento histórico. Para Goethe era atribuída ao Zeitgeist uma concepção que implicava em compreendê-la como as opiniões fortemente predominantes num determinado momento histórico com tal impacto no inconsciente coletivo que as pessoas o reproduziam sem assim o perceber.

            31 SARTORI, Giovanni. A democracia depois do comunismo. p.25-26.

            32 MANZINI, Ezio & BIGUES, Jordi. Ecologia y democracia. p.07.

            33 Francis Fukuiama escreveu a obra denominada O fim da história e o último homem, na qual defende ser a construção capitalista liberal da modernidade o ápice da história da humanidade.

            34 HUNTIGTON, Samuel P. Choque de civilizaciones? p.67.

            35 MANZINI, Ezio & BIGUES, Jordi. Ecologia y democracia. p.13.

            36 MANZINI, Ezio & BIGUES, Jordi. Ecologia y democracia. p.27.

            37 GUÉHENNO, Jean-Marie. El fin de la democracia: la crisis política y las nuevas reglas del juego. p.114.

            38 VILLASANTE, Tomás R. Las democracias participativas. p.139.

            39 JÁUREGUI, Gurutz. La democracia planetária. p.161.

            40 SARTORI, Giovanni. A democracia depois do comunismo. p.98.

            41 SARTORI, Giovanni. A democracia depois do comunismo. p.25.

            42 OLLER I SALA, M. Dolors. Un futuro para la democracia: una democracia para la gobernabilidad mundial. p.18.

            43 OLLER I SALA, M. Dolors. Un futuro para la democracia: una democracia para la gobernabilidad mundial. p.18.

            44 FELIZ TEZANOS, José et alii. La democracia post-liberal. p.13.

            45 BEETHAN, David & BOYLE, Kevin. Cuestiones sobre la democracia. p.115.

            46 JÁUREGUI, Gurutz. La democracia planetária. p.38.

            47 SANTOS, Boaventura de Souza. Reiventar la democracia, reiventar el estado. p.45.

            48 BILBENY, Norbert. Política sin estado. p.13.

            49 OLLER I SALA, M. Dolors. Un futuro para la democracia: una democracia para la gobernabilidad mundial. p.05.

            50 JÁUREGUI, Gurutz. La democracia planetária. p.43.

            51 JÁUREGUI, Gurutz. La democracia planetária. p.44.

            52 GUÉHENNO, Jean-Marie. El fin de la democracia: la crisis política y las nuevas reglas del juego. p.71.

            53 LUHMANN, Niklas. Teoria política en el estado de bienestar. p.44.

            54 HESPANHA, António Manuel. Culura juridical européia: síntese de um milênio. p.500-501.

            55 HESPANHA, António Manuel. Culura juridical européia: síntese de um milênio. p.501.

            56 CRUZ, Paulo Márcio. Política, poder, ideologia e estado contemporâneo. p.189.

            57 SANTOS, Boaventura de Souza. Reiventar la democracia, reiventar el estado. p.79.

            58 LÉVY, Pierre. Ciberdemocracia: ensayo sobre filosofia política. p.11.

            59 DEL CABO, Antonio. Constitucionalismo, mundialização e crise del concepto de soberania: alguns efectos em América Latina y e Europa. p.38.

            60 DEL CABO, Antonio. Constitucionalismo, mundialização e crise del concepto de soberania: alguns efectos em América Latina y e Europa. p.42.

            61 DEL CABO, Antonio. Constitucionalismo, mundialização e crise del concepto de soberania: alguns efectos em América Latina y e Europa. p.44.

            62 FELIZ TEZANOS, José et alii. La democracia post-liberal. Texto de Pedro Veja García, denominado La crisis de la democracia representativa. p.78.

            63 BILBENY, Norbert. Política sin estado. p.206.

            64 BILBENY, Norbert. Política sin estado. p.207.

            65 BILBENY, Norbert. Política sin estado. p.208.

            66 MARITAIN, Jacques. El hombre y el estado. p.231.

            67 CRUZ, Paulo Márcio. Fundamentos do direito constitucional. p.78.

            68 BECK, Ulrich. Que és la globalización. P.113.

            69 GUÉHENNO, Jean-Marie. El fin de la democracia: la crisis política y las nuevas reglas del juego. p.75 e seguintes.

            70 CHOMSKY, Noam. El nuevo orden mundial (y el viejo). p.229 e seguintes.

            71 BILBENY, Norbert. Política sin estado. p.84-85.

            72 TOFLER, Alvin. A terceira onda. p. 397.

            73 SANTOS, Boaventura de Souza. Reiventar la democracia, reiventar el estado. p.29.

            74 SANTOS, Boaventura de Souza. Reiventar la democracia, reiventar el estado. p.44.

            75 SANTOS, Boaventura de Souza. Reiventar la democracia, reiventar el estado. p.44.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CRUZ, Paulo Márcio da; SIRVENT, José Francisco Chofre. Ensaio sobre a necessidade de uma teoria para a superação democrática do Estado constitucional moderno. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1026, 23 abr. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8276. Acesso em: 29 mar. 2024.