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Delinquência empresarial e prescrição das sanções penais cominadas aos crimes ambientais previstos na Lei nº 9.605/98.

Proteção ou (des)proteção do ambiente?

Delinquência empresarial e prescrição das sanções penais cominadas aos crimes ambientais previstos na Lei nº 9.605/98. Proteção ou (des)proteção do ambiente?

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A Lei de Crimes Ambientais não disciplina a questão relacionada ao prazo prescricional dos crimes ambientais.

Resumo: A Lei 9.605/98 - Lei de Crimes Ambientais ou LCA - não disciplina a questão relacionada ao prazo prescricional dos crimes ambientais. Em consequência, as regras previstas nos arts.109 a 119, do Código Penal, suprem essa lacuna, por força do art. 12, do Código, do art. 79, da LCA e, também, da denominada teoria da convivência das esferas autônomas. As normas codificadas destinam-se aos crimes praticados por pessoa física, punidas com pena privativa de liberdade. No entanto, este tipo de sanção não se aplica aos crimes cometidos por pessoa jurídica. Daí a dificuldade para se aplicar as regras codificadas sobre prescrição aos casos de crimes ambientais praticados por empresas. Duas correntes jurisprudenciais surgiram para suprir a omissão. A primeira adotou o entendimento de que a pena criminal aplicável à pessoa jurídica, multa, restritiva de direitos ou serviços à comunidade, prescreve em dois anos, conforme o art. 114, I. Outra, aplica à pessoa jurídica o mesmo prazo prescricional da pena privativa de liberdade cominada ao crime ambiental praticado pela pessoa física, na forma do parágrafo único, do art. 109 do Código Penal. A adoção de cada uma dessas correntes jurisprudenciais implica em maior ou menor eficácia da regra que introduziu a responsabilidade da pessoa jurídica no Brasil, prevista na Lei 9.605/98. Eis a síntese do que vamos aqui analisar. 

Palavras-chave: Proteção Ambiental. Crime Ambiental. Prescrição Penal. Pessoa Jurídica. Responsabilidade Criminal da Pessoa Jurídica.


“Os Estados irão cooperar, em espírito de parceria global, para a conservação, proteção e restauração da saúde e da integridade do ecossistema terrestre. (...) Os países desenvolvidos reconhecem a responsabilidade que lhes cabe na busca internacional do desenvolvimento sustentável, tendo em vista as pressões exercidas por suas sociedades sobre o meio ambiente global e as tecnologias e recursos financeiros que controlam”.

Princípio 7. Declaração do Rio sobre Ambiente e Desenvolvimento – ECO 92.


1. Introdução - Ambiente Ecologicamente Equilibrado e Sobrevivência da Sociedade Humana   

Antes de examinarmos o objeto deste estudo sobre a prescrição da pena de multa aplicada aos casos de crimes ambientais, praticados por pessoa jurídica, é preciso uma análise introdutória sobre a questão da preservação do ambiente ecologicamente equilibrado, condição indispensável de sobrevivência da própria humanidade. Hoje, considerado bem jurídico constitucional de elevado valor, esse expresso engajamento constitucional legitima, ainda mais, a intervenção do Estado a fim de estabelecer o efetivo controle das ações praticadas contra o ambiente.

Em seguida, veremos algumas questões gerais sobre o instituto da extinção da punibilidade penal pela via prescricional, cuja matéria, diante da omissão da Lei 9.605/98, referida como Lei dos Crimes Ambientais ou, simplesmente, LCA, é disciplinada pelas normas do Código Penal. Depois, ainda de forma introdutória, examinaremos algumas noções conceituais sobre o fundamento políticojurídico da prescrição penal. Só, então, estudaremos a questão da prescrição das penas cominadas aos crimes ambientais praticados por uma empresa.

1.1 Compromisso da Constituição de 1988 com a Defesa do Ambiente e Responsabilidade Criminal da Pessoa Jurídica

Em sintonia com o pensamento ambientalista que se consolidou durante a segunda metade do século 20 e com as diretivas aprovadas em congressos e conferências mundiais promovidos pela ONU, a Constituição da República Federativa do Brasil - CRFB/88 - abriu importante espaço normativo para firmar o compromisso fundamental com o controle e a preservação do ambiente saudável e equilibrado. Para tanto, destinou capítulo de grande relevância a fim de consagrar princípios e normas fundamentais formadores do arcabouço jurídicoconstitucional de proteção ao ambiente.

A doutrina brasileira tem se manifestado francamente favorável a esse explícito e total engajamento pró-ambiente, considerando o capítulo de nossa Carta Magna, que trata do ambiente ecologicamente equilibrado, como um dos mais importantes e avançados do texto constitucional.[2]

Como consequência desse compromisso histórico do Estado brasileiro com a preservação ambiental e a sobrevivência das futuras gerações, foi insculpido, no artigo 225, caput, da CRFB, o princípio fundamental de que:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Tratando-se de princípio reitor, de eficácia plena e não apenas programática, portanto, de cumprimento obrigatório, cujos destinatários são a Administração Pública e os particulares, o comando contido na cabeça do artigo vem escoltado por uma série de parágrafos e incisos, que formam um verdadeiro leque normativo da principiologia constitucional ambiental. Assim, o artigo 225, § 3º, da Constituição, estabelece a responsabilidade penal da pessoa jurídica:

As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Este dispositivo foi entendido pela doutrina como um sinal da importância que a atual CRFB atribuiu à proteção, não só civil e administrativa, mas também penal do ambiente. Neste sentido, Luiz Regis Prado afirma que esta norma constitucional “[...] afastou, acertadamente, qualquer eventual dúvida quanto à indispensabilidade de uma proteção penal do ambiente”.[3]

Portanto, com a promulgação da Constituição de 1988 e, de modo especial, do seu § 3º do artigo 225, o sistema jurídico brasileiro foi dotado de um sólido alicerce para sustentar a positivação, em nível infraconstitucional, da responsabilidade criminal da pessoa jurídica. Este mandamento constitucional veio a ser concretizado dez anos mais tarde, com a promulgação da Lei de Crime Ambientais que, em seu artigo 3º, prescreve expressamente a responsabilidade penal da pessoa jurídica.

1.2 Apesar do Controle Penal, Acidentes Continuam a Causar Terríveis Tragédias contra o Ambiente: Mero Simbolismo e Ineficácia da Lei dos Crimes Ambientais?

A experiência tem demonstrado que a atividade empresarial se desenvolve poluindo a atmosfera, as águas, devastando florestas e causando, com frequência, danos ambientais, não raro de dimensões catastróficas e irreparáveis. Se ações efetivas e rigorosas não forem realizadas para estancar o devastador processo de agressão à natureza, a Humanidade terá de conviver com grandes e terríveis problemas ambientais, já na primeira metade deste século XXI. E a nossa espécie que, durante milhares de anos, resistiu às mais diversas crises políticas e tragédias humanitárias, estará pagando o elevado preço da imprevidência, ganância e da destruição do ambiente, que é o grande responsável pelas condições essenciais da própria vida humana.

Afinal, a vida humana precisa continuar de forma permanente. Não podemos e não devemos ser a geração ponto-final de uma trajetória humana sobre a Mãe-Terra. Temos um compromisso inadiável com a preservação do ambiente. Nossos descendentes – isto é, as próximas e futuras gerações - têm direito a uma vida humana integrada à natureza e de bem-estar social.

Em 05 novembro de 2015, ocorreu o rompimento da Barragem do Fundão, no município de Mariana, Minas Gerais, pertencente à mineradora Samarco, controlada pelas empresas Vale e BHP Billiton. O gravíssimo acidente provocou uma enxurrada de lama que devastou o distrito de Bento Rodrigues, deixando um rastro de destruição, que avançou em direção ao Rio Doce e, posteriormente, até o Rio São Francisco, causando grave poluição das águas desses e de outros rios daquela região de Minas Gerais.

O trágico desastre ambiental atingiu mais de 300 mil pessoas, em 40 cidades da região. Causou a morte de 19 pessoas e deixou 300 famílias desabrigadas. Até então, tinha sido a maior tragédia ambiental causada pela omissão, para se dizer o mínimo, de uma grande empresa multinacional sediada em nosso país.[4]

Em dezembro de 2018, três anos depois da tragédia, o processo criminal contra supostos responsáveis ainda corria na Justiça Federal, contra 21 pessoas, acusadas de provocar inundação, desabamento, lesão corporal e homicídio com dolo eventual. Por outro lado, uma ação civil coletiva, havia sido promovida pelo Ministério Público Federal, no valor de R$ 155 bilhões, contra a Samarco, a fim de garantir o pagamento de indenizações pelos danos ambientais, sociais e econômicos.[5]

Em 25 de janeiro de 2019, passados pouco mais de três anos, ocorreu o rompimento a Barragem do Feijão, em Brumadinho, MG, também pertencente à Companhia Vale do Rio Doce. A nova tragédia ambiental lançou um mar de lama para destruir, em sua devastadora passagem, prédios da mineradora, casas, milhares de hectares em florestas, estradas e pontes. O Rio Paraopeba, foi atingido e suas águas contaminadas pela lama contendo rejeitos de metais pesados.

De consequências imensamente maiores do que a de Mariana, a catástrofe ambiental de Brumadinho causou a morte de 200 pessoas e deixou 108 pessoas desaparecidas (até 11.03.2019), colocando-a no fatídico patamar de a maior tragédia humana ocorrida neste país.[6]

Citamos essas duas tragédias como exemplos paradigmáticos da dimensão incalculável do dano ambiental e, especialmente, do elevado grau de lesividade e agressão à vida humana que pode ser praticado pela ação criminosa de uma empresa. Esse trágico e fatídico quadro da realidade brasileira, com toda a evidência, demonstra o quanto é importante o controle da atividade empresarial em nosso país, por meio de normas penais de efetiva aplicação contra os responsáveis, pessoa física ou jurídica.

1.3 A Lei dos Crimes Ambientais Cumpre Mandamento Constitucional de Proteção Penal do Ambiente

Com suas normas de aplicação geral e de definição dos crimes ambientais, a Lei 9.605/1998 unificou, praticamente, todo o Direito Penal Ambiental brasileiro. A norma contida no art. 3º, que inseriu em nosso sistema de controle punitivo a responsabilidade penal da pessoa jurídica é, sem dúvida, a que causou maior divergência na doutrina e na jurisprudência. O dispositivo tem a seguinte redação:

As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade. Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato.

A entrada em vigor da LCA - mesmo com suas inevitáveis deficiências - representou um avanço significativo no processo históricojurídico brasileiro relativo ao controle penal ambiental. O texto legal sistematizou um importante ramo do Direito Penal e Ambiental e estabeleceu um modelo jurídico-organizacional que, seguramente, aperfeiçoou o subsistema de controle penal das condutas típicas contra o ambiente.

Assim, pode-se dizer que a LCA foi promulgada para atender ao mandamento constitucional acima mencionado e cumprir a relevante função de proteção penal do ambiente, este, há muito reconhecido como bem jurídico de inestimável valor.

No entanto, a LCA é completamente omissa na questão relacionada aos prazos prescricionais das penas aplicáveis aos autores, pessoa física ou jurídica, de crimes ambientais. No caso de pessoa física, a lacuna é suprida, sem maior problema, pelo recurso às regras gerais sobre a matéria, previstas no Código Penal. Mas, quando se trata de pessoa jurídica, a omissão tem gerado desencontros doutrinários e divergências na área da jurisprudência, como veremos mais adiante. Antes, entendemos necessária uma rápida abordagem sobre o instituto da prescrição.

1.4 O Instituto da Prescrição e o Brocardo de que o Tempo Tudo Apaga

A morosidade do processo penal parece inerente às ações, ao ritmo ritualizado e filigranas do próprio sistema penal. De forma indesejável, tem sido uma sombra prejudicial a acompanhar a história da justiça criminal. Uma condenação tardiamente decretada, sempre parece descolada do sentimento de justiça que emerge em face das consequências intoleráveis causadas pela ação criminosa.

Por isso, o instituto da prescrição, aqui definido como a perda do poder punitivo do Estado, pelo seu não exercício no prazo previsto em lei, tem sido historicamente adotado como instrumento legal de extinção da pretensão punitiva e de execução da pena, para evitar que o indivíduo venha a permanecer na condição de eterno acusado ou perseguido da justiça criminal. O instituto, assim, tem seu fundamento na ideia de que o decurso do tempo apaga da memória individual e coletiva fatos acontecidos na vida social, aí incluídas as consequências causadas pelo crime.

Franz Lizst discrepa desse entendimento doutrinário generalizado. No final do século 19, escreveu que a justificativa para a existência do instituto da prescrição não reside "numa força misteriosa do tempo, productora ou anniquiladora do direito, mas na mesma ordem jurídica que toma em consideração o poder dos factos”.[7] Não deixa, no entanto, de se referir à “força misteriosa do tempo” sobre a produção do direito.

Diferentemente, Giuseppe Bettiol assinala que, se “o alarma social determina a intervenção do Estado na repressão dos crimes”, o passar do tempo “enfraquece pouco a pouco e se apaga, de tal modo que provoca a ausência do interesse na pretensão punitiva” estatal.[8] 

No Brasil, Aloysio de Carvalho Filho também entende que a prescrição criminal corresponde à necessidade social de "assegurar o olvido sobre crimes cuja punição, pelo largo decurso de tempo, perdeu sua utilidade”.[9] Do mesmo modo, Edgar Magalhães Noronha escreve que o tempo que “tudo apaga”, tem influência “no terreno punitivo”. Por isso, concorda que o decurso de longo tempo "sem punição do culpado, gera a convicção da sua desnecessidade”.[10]

Ao traçar as linhas gerais do instituto da prescrição João José Leal destaca que, com o passar do tempo, mesmo os fatos mais graves vão caindo no esquecimento e suas consequências nocivas, bem como o clamor repressivo vão gradativamente arrefecendo. Para o autor, o decurso do tempo cicatriza chagas, alivia dores e sofrimentos, faz desaparecer o sentimento de vingança. "O próprio sentimento de justiça retributiva, fundado na premissa políticofilosófica de que é justo castigar o autor de um mal rotulado de crime, vai aos poucos se apagando da memória social e acaba por se dissipar completamente”.[11]

Afirma João José Leal que há um outro fundamento políticojurídico a justificar o instituto da prescrição penal. É a ideia de segurança jurídica para o cidadão. No âmbito do Estado Democrático, o indivíduo não deve permanecer, de forma indeterminada, a mercê de uma possível ação penal e consequente sanção criminal. Assinala o autor que, “uma situação de incerteza jurídica desta natureza, revela-se incompatível com o espaço de liberdade de controle normatizado próprio do Estado Democrático”.[12]

Refletindo essas razões de natureza éticopolítica e histórica, o Código Penal brasileiro arrola a prescrição no art. 107, inciso IV, 1ª hipótese, como uma das causas de extinção da punibilidade da pretensão punitiva.[13]  

A partir dessas notas introdutórias, examinaremos a questão relativa aos prazos prescricionais, no caso de aplicação da pena de multa aos crimes ambientais praticados por uma pessoa jurídica.


2. Delinquência contra o Ambiente e Prescrição das Penas Cominadas à Pessoa Jurídica por Crimes Definidos na LCA

A LCA prescreve que as penas aplicáveis, isolada, cumulativa ou alternativamente, à pessoa jurídica são a multa, as restritivas de direitos e prestação de serviços à comunidade (art. 21, incisos I a III). Tratando-se de sanção específica para o controle penal das ações criminosas cometidas por uma empresa, é evidente que as penas restritivas adotadas pela LCA não poderiam ser as mesmas do Código Penal, destinadas a reprimir a pessoa física.[14] Por sua vez, a prestação de serviços à comunidade, também, se desdobra em formas distintas daquelas definidas na legislação codificada.[15]

Fica evidenciado que a LCA disciplinou, de forma própria, as penas alternativas. Diferentemente, do que ocorre no âmbito do Código Penal, aqui, essas penas não são substitutivas nem estão vinculadas ao limite máximo de quatro anos da pena privativa de liberdade aplicada na sentença, como prevê a lei codificada. É preciso assinalar, no entanto, que essas sanções alternativas não se encontram prescritas na parte sancionatória de cada tipo penal ambiental, como ocorre no caso da pena pecuniária.

Da mesma forma, a pena de multa, quantia paga pelo condenado ao Estado,[16] poderá ser aplicada, isolada, cumulativa ou alternativamente a uma empresa, com uma ou mais das penas alternativas à prisão. Além disso, a sanção pecuniária vem cominada, expressamente, em cada dispositivo incriminador dos crimes ambientais ali descritos, ao lado da pena privativa de liberdade.[17] Mas, é evidente que esse acúmulo ou alternatividade da resposta punitiva só se destina aos crimes cometidos pela pessoa física, pois só esta pode ser sancionada com uma pena reclusiva, que não pode ser aplicada ao ente coletivo.[18]

No entanto, a opção pela sanção pecuniária para sancionar condutas criminosas praticadas pela pessoa jurídica somente terá sentido se, efetivamente, a pena de multa for aplicada com celeridade e em valores que correspondam à intensidade do dano causado ao ambiente. Infelizmente, estudos indicam que a realidade está muito distante de se alcançar essa desejável efetividade da LCA, na sua relevante função de defesa do ambiente, por meio do controle judicial-penal.[19]

Assim, com base no art. 21, o juiz dispõe do poder discricionário para examinar as circunstâncias em que o crime foi praticado, a maior ou menor intensidade do dano ambiental para, então, aplicar qualquer uma das penas ali descritas - multa, restritiva de direitos e prestação de serviços à comunidade. Essa disposição geral indica que, para sancionar o ente jurídico infrator, o juiz pode aplicar só a pena de multa, só uma das penas restritivas de direitos ou só a prestação de serviços, de forma isolada. Sempre que entender conveniente e de forma justificada, pode aplicá-las cumulativamente. Essa alternativa sancionatória vale para qualquer um dos crimes descritos na LCA praticado por uma pessoa jurídica.[20]

2.1 Crimes Ambientais Cometidos por Pessoa Jurídica  e Lacuna da LCA em Matéria de Prazo Prescricional

Já mencionamos que a LCA deixou de prescrever regras próprias sobre a prescrição das penas cominadas aos crimes ambientais imputados à pessoa jurídica. Na ausência de previsão em lei penal especial, a doutrina se socorre do princípio da convivência das esferas autônomas, para dirimir o conflito ou suprir o vazio normativo. Segundo este princípio, as regras gerais do Código Penal convivem em sintonia com as regras previstas na legislação especial.[21]

No entanto, melhor teria sido evitar essa lacuna que, como veremos a seguir, tem causado desnecessária divergência jurisprudencial. Para tanto, bastaria a lei dispor que a prescrição das penas cominadas ao crime ambiental praticado por pessoa jurídica, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada no respectivo tipo penal, mesmo que a empresa não tenha sido processada ou, ao final, não tenha sido condenada.[22]

A nosso ver, outra opção seria a de a LCA prescrever prazos próprios para a prescrição das penas dos crimes ambientais cometidos por pessoa jurídica, deixando a pessoa física sujeita às regras do Código Penal.

Da mesma forma, a LCA optou por remeter ao Código Penal brasileiro o critério do cálculo para aplicação da pena de multa por crime ambiental cometido pela pessoa jurídica. Também aqui, a Lei não foi feliz, porque os valores da pena pecuniária previstos no CP foram concebidos para punir a pessoa física e não pessoas jurídicas proprietárias de imensos patrimônios, capazes de causar danos ambientais incalculáveis. Essa afirmação vale mesmo diante do dispositivo da LCA, que autoriza triplicar o valor máximo da pena pecuniária cominada na lei codificada.[23]

De qualquer forma, no caso de condenação de empresa infratora da lei ambiental, o princípio da convivência das esferas autônomas determina que a aplicação e o cálculo da pena de multa obedecerão às regras e valores prescritos no Código Penal. Essa operação judicial, que pode parecer de fácil observância, tem gerado divergência e desencontros na doutrina e na jurisprudência, no momento em que o magistrado é chamado a examinar a questão da extinção da punibilidade pela prescrição das penas aplicadas à pessoa jurídica.

A partir dessas considerações gerais e introdutórias, examinaremos as hipóteses concretas em que o juiz enfrenta a questão da prescrição da pena de multa cominada ao crime ambiental praticado por pessoa jurídica.


3. Prazo de Dois Anos para as Penas Cominadas aos Crimes Ambientais Praticados por Pessoa Jurídica (Art. 114, inciso I, do Código Penal)

Diante da lacuna verificada no texto da LCA, surgiram duas alternativas interpretativas para enfrentar a questão da extinção da punibilidade pela prescrição das penas ali cominadas, com o fim de estabelecer o controle penal da delinquência empresarial. Recorrendo à analogia, uma primeira corrente optou por eleger o prazo prescricional de dois anos, estabelecido no art. 114, inciso I, do CP. Dessa forma, o entendimento é de que, transcorrido esse exíguo prazo, prescrita estaria a pretensão punitiva estatal para sancionar o ente jurídico causador de agressão ao ambiente.

O dispositivo se refere à hipótese em que a pena de multa for “a única cominada ou aplicada”.[24] Porém, no âmbito da LCA, as penas cominadas à pessoa jurídica - multa, restritivas ou prestação de serviços - são autônomas, de caráter geral e podem ser aplicadas, isoladamente ou em conjunto entre elas. Por isso, em face da lacuna da lei, a corrente hermenêutica aqui comentada considera que, em se tratando de uma ou mais penas cominadas ou aplicadas à pessoa jurídica, a questão relativa a eventual prazo prescricional deve ser resolvida, com base no inciso I, do art. 114, do Código Penal.[25]

Nessa linha de pensamento, o TJRS, reconheceu, por analogia, como prazo de prescrição das penas restritivas de direitos aplicáveis à pessoa jurídica, o mesmo prazo da pena de multa, prevista no art. 114, I do Código Penal. Com a denúncia apenas recebida, sem sentença condenatória de primeiro grau, com aplicação de pena de multa ou restritiva de direitos, decorreram mais de dois anos, na data de julgamento pelo referido tribunal. Segundo o Relator, a demora em proferir sentença penal condenatória, justificava o decreto de prescrição.

Consta do acórdão que a pena restritiva de direito aplicável à pessoa jurídica, tem caráter autônomo e não substitutivo da pena privativa de liberdade. Além disso, diz o julgado que a LCA  “não traça qualquer parâmetro que possa servir de base ao cálculo da prescrição razão pela qual não incidem sobre essas sanções alternativas cominadas à pessoa jurídica as mesmas regras do Código Penal!”. Concluiu o acórdão que, “[...] ante o vácuo legislativo, a solução mais razoável consiste em equiparar, para efeito de prescrição, as penas restritivas de direito e prestação de serviços à comunidade à multa. Por este motivo, observado o prazo prescricional de 2 (dois) anos, os fatos, bem ou mal, estão prescritos”.[26]

A linha jurisprudencial acima mencionada, acabou respaldada pelo STJ, que aplicou o prazo prescricional do art. 114, I, do Código Penal, para decretar a extinção da punibilidade de uma empresa, única denunciada pela prática do crime ambiental definido no art. 38, da Lei 9.605/98 e condenada à pena de serviços à comunidade, no valor de R$ 30.000,00, em favor de entidade ambiental legalmente credenciada.[27] Segundo a Ministra Laurita Vaz, como não houve condenação de pessoa física à pena privativa de liberdade, não haveria como balizar o prazo prescricional da pena de prestação de serviços à comunidade, na forma prevista no  parágrafo único, do art. 109 do CP.[28] Assim, ficava justificado o decreto extintivo da punibilidade.[29]

Na esteira desse entendimento, o TJSP igualmente decidiu que, no caso de a pessoa jurídica ser a única denunciada na ação penal, as penas previstas para sanção da pessoa jurídica, são autônomas, não havendo como vincular o prazo prescricional ao tempo da pena privativa de liberdade, concebida para punir pessoa física. Decidiu o Tribunal que as penas previstas para os entes morais devem gozar de prazos prescricionais próprios. Diante da omissão da LCA, não é admissível aplicar-lhes os prazos previstos na Parte Geral do Código Penal, destinados às pessoas físicas.

No acórdão, a corte reconheceu que existe previsão na lei codificada quanto ao lapso temporal da pena de multa e que, desse modo, seria “mais adequada a equiparação do prazo prescricional da pena restritiva ao da pena de multa, seja por inexistência de previsão legal a autorizar a utilização do prazo da pena privativa de liberdade, seja pela própria natureza da pena, seja pela vedação da utilização da analogia in malam partem”. E assim o TJSP adotou, por analogia, o prazo benéfico de apenas dois anos, estabelecido no art. 114, I do CP.[30]

3.1 Doutrina

Não é só a jurisprudência. Também, a doutrina advoga a aplicação do prazo de dois anos, estabelecido no art. 114, I, do CP, como solução para enfrentar a lacuna deixada pela LCA, que é completamente omissa no tocante à prescrição das  penas cominadas aos crimes praticados pela pessoa jurídica. Sejam elas a pena pecuniária ou restritivas de direitos. É o que ponderou Rodrigo Muniz dos Santos, ao escrever que “as penas cominadas abstratamente para as pessoas jurídicas, independentemente daquelas estabelecidas, nas mesmas hipóteses, para as pessoas físicas, têm seus prazos prescricionais fixados em 02 (dois) anos, por aplicação analógica, in bonam partem, do art. 114, I, do Código Penal”.[31] 

Nessa mesma linha interpretativa, Rodrigo Iennaco sustentou que o único referencial para prescrição de crime ambiental imputado à pessoa jurídica é o do art. 114, I, do Código Penal, porque é a única disposição expressa a respeito da prescrição. “Entendimento diverso remeteria o prazo prescricional, sem respaldo legal explícito, ao arbítrio do juiz, que elevaria livremente o prazo prescricional ao prever sanções por período demasiadamente elástico, unicamente para fugir do prazo de prescrição exíguo da multa”.[32] 

Discorrendo sobre o tema, Juliano Breda entende que a LCA “deveria ter expressamente mencionado, em cada tipo penal, a sanção aplicável à pessoa jurídica, como ocorre em relação às pessoas físicas”. Conclui que, diante da omissão legal, não é possível “o recurso à analogia, dada a vedação de seu uso no domínio das sanções penais”.[33]

3.2 Tribunal de Justiça de Santa Catarina e Prescrição dos Crimes Cometidos Pela Pessoa Jurídica

Diante do exíguo prazo prescricional de dois anos, a jurisprudência não poderia mostrar outro resultado que não o alto índice de prescrições de crimes ambientais cometidos pelas pessoas jurídicas. É o que ficou evidenciado das decisões e da doutrina que acabamos de examinar, e, principalmente, da pesquisa efetuada em julgados na jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina - TJSC, durante um  período, iniciado pouco tempo depois da vigência da Lei n. 9.605/98, até recentemente.[34]

A pesquisa identificou um total de 124 recursos sobre crimes ambientais praticados por empresas. No período pesquisado (1998-2018), o tribunal catarinense proferiu ou manteve apenas 25 decisões condenatórias - 19 à pena de multa e 06 à pena restritiva de direitos e pena de serviços à comunidade.

Por outro lado, foram prolatados 28 acórdãos reconhecendo a extinção da punibilidade pela incidência da prescrição, em razão da aplicação do art. 114, I, do Código Penal e de seu exíguo prazo de dois anos previsto à aplicação isolada da pena de multa.[35] As demais 71 decisões, envolveram questões processuais penais em geral e absolvição da pessoa jurídica.

Como se vê, a cada condenação proferida pelo TJSC, ocorreu mais de um caso de prescrição penal em favor da pessoa jurídica e em desfavor da proteção penal ambiental eficiente, mitigando ou tornando inócua a regra da responsabilidade penal da pessoa jurídica no Brasil. Os números demonstram, que a grande incidência de casos de prescrição penal deve-se à aplicação isolada da pena de multa à pessoa jurídica e à opção preferencial do judiciário catarinense pela pena da multa criminal para punir a pessoa jurídica, no enfrentamento da criminalidade empresarial ambiental.

Parece-nos que, diante da omissão da LCA, o aplicador da lei acabou por utilizar a solução de maior simplicidade para resolver a questão da prescrição, em face dos crimes ambientais imputados ao ente jurídico, tornando ineficaz a função de controle penal das ações contra o ambiente.

No entanto, há uma outra alternativa hermenêutica para suprir essa lacuna da LCA, que os adeptos da corrente doutrinária e jurisprudencial acima examinada não admitiram, num primeiro momento, aplicar, na solução do prazo prescricional dos crimes ambientais praticados por um ente jurídico.


4. Prescrição pelo Máximo da Pena Privativa de Liberdade Cominada aos Crimes Ambientais Praticados por uma Pessoa Jurídica (Arts. 114, inciso II e 109, Parágrafo Único, do Código Penal)

4.1. Um Outro Olhar Interpretativo sobre a Matéria

Não obstante a omissão da LCA, o princípio da convivência das esferas autônomas, conforme vimos acima,[36] autoriza a buscar, nas regras do Código Penal, uma outra alternativa para resolver a questão do prazo prescricional aplicável aos crimes e penas descritos no texto da lei repressiva especial.

No caso da pena de multa, a solução encontra-se expressamente estabelecida, na dicção do art. 114, inciso II: no mesmo prazo estabelecido para prescrição da pena privativa de liberdade, quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada. 

É preciso assinalar que este dispositivo refere-se ao "mesmo prazo da pena privativa de liberdade", que deve ser entendido como um dos prazos previstos no art. 109 e seus incisos, do Código Penal. Devemos lembrar, conforme assinalamos acima,[37] que a pena pecuniária é cominada, ao lado da pena privativa de liberdade, na parte sancionatória de quase todos os crimes ambientais. Isso, seria suficiente para se afirmar que, no âmbito na delinquência empresarial contra o ambiente, a pena pecuniária é sempre cominada de forma cumulativa. A nosso ver, no entanto, esse acúmulo destina-se à pessoa física porque, para a pessoa jurídica, já existe a regra geral que manda aplicar as penas de multa, restritivas e de prestação de serviços à comunidade, seja de forma isolada, alternativa ou cumulativamente. Portanto, as sanções aplicáveis à pessoa jurídica são completamente autônomas e suas existências não estão vinculadas à pena privativa de liberdade.

Dessa forma, o prazo prescricional de dois anos, quando a pena de multa for a única aplicada na sentença, estabelecido pelo inciso I, do citado art. 114, a nosso ver, não se aplica à pena pecuniária imposta à empresa infratora do ambiente. Neste caso, a sanção pecuniária é cominada de forma geral e cumulativa. É evidente que o acúmulo depende de decisão discricionária do magistrado, mas a condição de regra geral se mantém, conforme prescreve o art. 21, e seus incisos I a III, da LCA.[38] Assim, entendemos ser possível vincular o prazo de prescrição das penas cominadas aos crimes ambientais praticados por uma empresa, aos mesmos prazos estabelecidos no art. 109 e seus incisos do CP.

No caso das penas alternativas, essa possibilidade se torna ainda mais evidente, pois o parágrafo único, do art. 109, do Código Penal brasileiro dispõe, expressamente, que “Aplicam-se às penas restritivas de direito os mesmos prazos previstos para as privativas de liberdade". A dicção do dispositivo é clara e não deixa dúvida. As penas alternativas (restritivas de direitos e a prestação de serviço (esta última, no Código, também tratada como restritiva de direitos), cominadas à pessoa jurídica por crime ambiental, prescrevem nos prazos estabelecidos para as sanções reclusivas destinadas à repressão da pessoa física.

4.2 Jurisprudência por um Prazo Prescricional mais Rigoroso

Já, em 2002, o TRF da 4ª Região considerou como prazo prescricional da pena restritiva de direitos e da pena de multa, o tempo da pena privativa de liberdade cominada ou aplicada ao crime ambiental violado pela pessoa jurídica. A denúncia havia imputado, genericamente, a prática do crime de poluição descrito no caput, do art. 54, da Lei 9.605/98, a uma empresa, sem ter indicado, com a necessária precisão, qual o dispositivo efetivamente violado.[39]

No caso, ficou decidido que a incidência da prescrição só pode ocorrer com base na regra estabelecida no parágrafo único, do art. 109, do Código Penal, que manda aplicar "às penas restritivas de direito os mesmos prazos previstos para as privativas de liberdade”.[40] Não há dúvida de que essa interpretação judicial é mais gravosa, pois considera como prazo de prescrição da pena de multa e da pena restritiva de direitos, aplicáveis à pessoa jurídica, o mesmo prazo da pena privativa de liberdade prevista no Código Penal para repressão da pessoa física.

4.3 O Entendimento do STF sobre o Prazo Prescricional das Penas Aplicáveis à Pessoa Jurídica

Mais recentemente, essa linha jurisprudencial, mutatis mutandis, foi respaldada pelo STF, em único julgado que encontramos sobre o tema. A Corte decidiu, em 2016,  que a prescrição das penas restritivas de direitos e de multa, aplicáveis à pessoa jurídica, ocorrerá no prazo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, exceto se a pena de multa for a única pena aplicada ou cominada, quando o prazo prescricional será o previsto no já citado art. 114, inc. I, do CP.[41] No caso, a pessoa jurídica tinha sido acusada como a única autora do crime ambiental de poluição, descrito no art. 54, § 1º, da Lei 9.605/1998, cuja pena é de detenção, de seis meses a um ano, e multa.

A empresa pleiteava o reconhecimento da prescrição, no prazo de dois anos, com base na jurisprudência então vigente, conforme examinamos acima.[42] A Corte, no entanto, negou provimento ao recurso para firmar o entendimento de que a prescrição, das penas restritivas de direitos e de multa aplicáveis à pessoa jurídica, ocorrerá no prazo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, na forma do citado art. 109, Parágrafo Único, do CP. Para o STF, a exceção fica por conta da pena de multa como  única pena aplicada ou cominada, casos em que o prazo prescricional será de dois anos, nos termos do art. 114, inc. I, do CP.

Essa decisão do STF levou o STJ[43] e, também, o TJRS,[44] a modificarem suas posições sobre o tema aqui estudado. Assim, pode-se dizer que esta é a tendência atual da jurisprudência brasileira.

Com a decisão, o STF admite dois prazos para disciplinar os casos de prescrição das penas aplicáveis à pessoa jurídica. Um, para as penas alternativas em geral e, também, para a pena de multa, quando aplicada cumulativamente, com base no art. 109, § único e art. 114, inciso II, do CP. O outro prazo, seria o da prescrição em dois anos, quando a pena de multa for a única "aplicada ou cominada", nos termos do art. 114, inciso I, do CP.

Assim, pela decisão do STF, o prazo prescricional de dois anos, só ocorrerá quando a pena de multa for a única aplicada à pessoa jurídica, já que não há casos de ser a única cominada isoladamente. Isso, simplesmente porque, no âmbito da LCA, não há cominação na forma isolada para qualquer das penas destinadas à repressão da empresa infratora da lei ambiental. Ao contrário, nos termos do art. 21, da LCA,[45] todas as penas são cominadas de forma geral para serem aplicadas isoladamente, mas, também, de forma alternativa ou cumulativamente. 

Conforme vimos acima, o prazo prescricional de dois anos é demasiadamente exíguo, principalmente, para processar e julgar em tempo tão reduzido, crimes de alta complexidade e de consequências tão danosas.[46] Daí, a necessidade de se estabelecer um prazo mais adequado à natureza dos crimes ambientais e do perfil jurídico e econômico da empresa que, a partir da LCA, passou a ser considerada como sujeito ativo de uma infração penal.


Considerações Finais

A LCA é completamente omissa na questão relacionada aos prazos prescricionais das penas aplicáveis aos autores, pessoa física ou jurídica, de crimes ambientais. Por força do princípio da convivência das esferas autônomas, esse vazio normativo deve ser preenchido pelas regras gerais do Código Penal, previstas nos arts. 109 a 119, do Código Penal brasileiro.

No caso de pessoa física, sancionada com pena privativa de liberdade, a lacuna pode ser suprida, sem maior problema, pelo recurso às regras gerais sobre a matéria, previstas no Código Penal. Mas, quando se trata de pessoa jurídica, a omissão tem gerado desencontros doutrinários e divergências na área da jurisprudência.

Diante da omissão, uma primeira corrente jurisprudencial, aplicou o prazo prescricional de dois anos, estipulado no art. 114, I, do Código Penal, para qualquer das penas aplicadas à pessoa jurídica, multa, restritivas de direitos e serviços à comunidade. No entanto, esse entendimento judicial se mostrou demasiadamente liberal, além de desconsiderar outros dispositivos do CP e da própria LCA aplicáveis à matéria.

A complexidade das ações penais contra as pessoas coletivas e a morosidade da justiça criminal deixa evidente que o curto prazo de dois anos contribuiu, de forma significativa para a prescrição da maior parte dos crimes e das ações penais instauradas contra as empresas infratoras do ambiente. 

Essa evidente ineficácia da lei penal ambiental é demonstrada pelos números levantados por pesquisa realizada durante a elaboração desse trabalho acadêmico[47], mostrando que apenas 25 empresas foram efetivamente condenadas por crime ambiental, entre os 124 casos julgados pelo TJSC, durante o período de 1998 a 2018.

O grande número de casos de extinção da punibilidade por prescrição revela a ausência do controle judicial sobre a delinquência praticada por “empresas criminosas", que acabaram beneficiadas pela impunidade.

Mais tarde, decisão do STF mandou aplicar os prazos prescricionais destinados às penas privativas de liberdade das pessoas físicas, na forma do parágrafo único, do art. 109, do Código Penal, para qualquer das penas cominadas à pessoa jurídica na Lei 9.605/98, exceto quando a pena de multa for a única cominada ou a única aplicada, casos em que a prescrição será no prazo de dois anos. Esse entendimento do STF passou a ser observado pelo STJ e demais tribunais estaduais.

Diante destas constatações, defendemos a adoção de regras próprias para disciplinar, de forma autônoma e no texto da própria LCA, as hipóteses de extinção da punibilidade pela prescrição dos crimes ambientais cometidos pela pessoa jurídica.

Para tanto, bastaria acrescentar, ao texto da lei especial, dispositivo com a seguinte dicção: “A prescrição das penas definidas no art. 21, incisos I a III, desta Lei,  antes e depois de transitado em julgado a sentença condenatória, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime ambiental imputado à pessoa jurídica, verificando-se nos mesmos prazos dos incisos I a VI, do art. 109, do Código Penal”.

Esta proposta leva em consideração o fato de que a pena de multa, as penas restritivas de direitos e a de prestação de serviços à comunidade, previstas na Lei dos Crimes Ambientais, foram ali cominadas para serem aplicadas de forma isolada e autônoma, em relação à pena privativa de liberdade. Estão, portanto, sujeitas a um regime sancionatório diferente daquele estabelecido no Código Penal brasileiro, para aplicação aos crimes em geral.

Da mesma forma, em se tratando de pena não privativa de liberdade, cominada por crime ambiental praticado por uma empresa, entendemos desnecessário estabelecer qualquer diferença de prazo entre as formas de prescrição da pretensão punitiva ou executória.

A nosso ver, esta proposta de lege ferenda insere-se no contexto das medidas indispensáveis de reforma para adequar o sistema penal vigente ao novo paradigma da capacidade penal das associações e sociedades criminosas, na área ambiental.


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Notas

[2] Para José Afonso da Silva, trata-se de um dos capítulos de maior relevância consagrados na Constituição de 1988. “A Constituição define o meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito de todos e lhe dá a natureza de bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. In: SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 22ª. ed., rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 819. Édis Milaré, por sua vez, chama a atual Constituição brasileira de “Carta Verde”. In: MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 4ª. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2005, p. 182-4. Alexandre de Moraes assinala que, em relação à agenda éticopolítica e jurídica, a Constituição de 1988 perfilhou os princípios da Declaração sobre o Ambiente Humano, de Estocolmo. In: MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 23ª. ed., 2ª. reimpr. São Paulo: Atlas, 2008, p. 825-6.

[3] PRADO, Luiz Regis. Direito penal ambiental: problemas fundamentais. São Paulo: RT, 1992, p. 32. No mesmo sentido: FERREIRA, Ivete Senise. Tutela penal do patrimônio cultural. São Paulo: RT, 1995, p. 66.

[4] De acordo com a Fundação Renova, criada por uma decisão da Justiça para gerir as reparações e o atendimento aos atingidos, das 53.200 solicitações de indenização feitas, 8.417 foram pagas. O número diz respeito a todas as cidades atingidas, menos Mariana, onde os atingidos estão sob regras específicas. In: UOL Notícias. Indenizações sem pagar e ninguém preso: 3 anos após a tragédia de Mariana. Matéria publicada em 06.02.2019. Disponível em: <https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2019/02/06/indenizacoes-pendentes-e-ninguem-preso-3-anos-apos-a-tragedia-de-mariana.htm?cmpid=copiaecola.>. Acesso em 03.03.2019.

[5] G1. Tragédia de Mariana: sem indenização, vítimas pescam em área contaminada e já acumulam R$ 833 mil em multas. Matéria publicada em 11.12.2018. Disponível em: <https://g1.globo.com/es/espirito-santo/noticia/2018/12/11/tragedia-de-mariana-sem-indenizacao-vitimas-pescam-em-area-contaminada-e-ja-acumulam-r-833-mil-em-multas.ghtml>. Acesso em 03.03.2019.

[6] In: G1. Chega a 200 o número de mortos identificados no desastre da Vale em Brumadinho. Matéria publicada em 11.03.2019. Disponível em: <https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2019/03/11/chega-a-200-o-numero-de-mortos-identificados-no-desastre-da-vale-em-brumadinho.ghtml.>. Acesso em 13.03.2019.

[7] LISZT, Franz Von. Tratado de direito penal allemão. Tomo I. Trad. por José Higino Duarte Pereira. Rio de Janeiro: F. Briguiet & C Editores, 1899, p. 476.

[8] BETTIOL, Giuseppe. Direito penal. Vol. III. Trad. Paulo José da Costa Júnior. São Paulo: RT, 1976, p. 199.

[9] Carvalho Filho, Aloysio de. Comentários ao código penal. Vol. IV - Arts. 102 a 120. Rio de Janeiro: Forense, 1944, p. 177-8.

[10] NORONHA, Edgar Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. Vol. 1. Atual. por Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha. 37ª. ed.  São Paulo: Saraiva, 2003, p. 360.

[11] LEAL, João José. Direito penal geral. 3ª. ed. rev. e atual. Florianópolis: OAB/SC, 2004, p. 592-3. Para o autor, a ideia de que o tempo tudo apaga, levou o Estado a estabelecer prazos para exercitar o Jus Puniendi, sendo compreensível que, "passado o prazo previamente estatuído em lei, o poder estatal de punir o infrator deve desaparecer”.

[12] LEAL, João José. Direito penal geral. 3ª. ed. rev. e atual. Florianópolis: OAB/SC, 2004, p. 592-3. Ver, ainda: GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte geral. Vol. I. 18ª. ed. rev., ampl. e atual. até 1º. de janeiro de 2016. Rio de Janeiro: Impetus, 2016, p. 853; ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 9ª. ed. rev. e atual. São Paulo: RT, 2011, p. 646-58.

[13] Nos arts. 109 a 119 do CP, os casos de incidência da prescrição são previstos de forma detalhada. In: BRASIL. Decreto-Lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 16.01.2019. 

[14] Por sua vez, o art. 22, da LCA indica as espécies de pena restritiva de direitos: “suspensão parcial ou total das atividades: interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade, e proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações”. Corrigindo equívoco conceitual cometido pela lei codificada, a Lei dos Crimes Ambientais classifica a prestação de serviços à comunidade como alternativa penal de natureza não restritiva. In: BRASIL. Lei 9.605 de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L9605.htm>. Acesso em: 17.01.2019.

[15] Art. 23. A prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica consistirá em: I - custeio de programas e de projetos ambientais; II - execução de obras de recuperação de áreas degradadas; III - manutenção de espaços públicos; IV - contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas.

[16] Para o Código Penal brasileiro, “A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa (art. 49). O valor de cada dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário. O valor da multa será atualizado, quando da execução, pelos índices de correção monetária”.

[17] Poucos crimes, como de pesca com uso de explosivos (art. 35 e seus incisos), de dano praticado contra Unidade de Conservação e Áreas de Preservação Permanente (art. 40), de poluição previsto no (art. 54, § 2º.) e de elaborar licenciamento ambiental de forma culposa (art. 69-A, § 1º.) deixam de prescrever a pena de multa para o infrator dos tipos penais ali descritos. Todos os demais crimes previstos na LCA são punidos com pena de multa, expressamente, indicada na parte sancionatória de cada tipo ambiental penal. Os dispositivos também indicam que a aplicação da pena pode ocorrer de forma isolada, alternativa ou cumulativa. Vale ressaltar que legislador recorreu intensamente à pena de multa para sancionar o infrator da lei penal ambiental, numa demonstração clara da crença oficial no poder persuasivo da pena pecuniária.

[18] Para a pessoa física, se assim entender necessário, o magistrado poderá acrescer a pena de multa ou outra sanção alternativa, à sanção privativa de liberdade, de acordo com o disposto na parte sancionatória de cada tipo penal ambiental.

[19] Basta examinar o estudo sobre ações criminais contra infratores da LCA, no Estado do Pará, para constatar a enorme dificuldade de se alcançar a sua efetiva aplicação. Em 2003, Brenda Brito e Paulo Barreto pesquisaram que, dos cinco processos com denúncias oferecidas, dois aguardavam a citação do acusado, outros dois enfrentavam conflito de competência entre Justiça Federal e Estadual para seu julgamento e um deles aguardava a suspensão do processo. In: BRITO, Brenda; BARRETO, Paulo. Aplicação da lei de crimes ambientais pela justiça federal no setor florestal do Pará. Revista de Direito Ambiental – Publicação oficial do Instituto “O Direito por um Planeta Verde”, ano 10, n. 37, p. 218-243, São Paulo, RT, jan.-mar. 2005, p. 227. Em 2011, comprovamos o demonstrado pelos autores anteriormente referidos, quanto ao controle penal da pessoa jurídica por crimes ambientais. In: LEAL, Rodrigo José. Princípio constitucional do ambiente ecologicamente equilibrado e a responsabilidade penal da pessoa jurídica prevista na lei 9.605/98: controle penal efetivo x controle penal simbólico do processo de degradação ambiental no Brasil. 2011, 543 f. Tese (Doutorado em Direito). Universidad de Alicante, 2011, caps. 9 e 10 e anexos 1 a 3, especialmente. Em 2018, não foi diferente. Demonstramos, em outro estudo, as dificuldades da punição criminal à pena de multa de pessoas jurídicas por crimes ambientais. In: LEAL, Rodrigo José. Atividade empresarial criminosa contra o ambiente e resposta punitiva pecuniária: um estudo das penas de multa aplicados na jurisprudência do Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC. Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal, ano XIV, n. 84, p. 05-23, Porto Alegre, Lex Magister, jun-jul 2018. ISSN 1807-3395. Isso demonstra que a proteção penal ambiental no Brasil precisa de maiores avanços, tanto no campo legislativo, quanto no campo político.

[20] Marchesan, Ana Maria Moreira; Steigleder, Annelise Monteiro; Cappelli, Sílvia. Direito ambiental. 5ª. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2008,  p. 188.

[21] Art. 12: As regras gerais deste Código aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso. Na Lei 9.605/98, também encontramos o princípio da convivência das esferas autônomas, disposto no art. 79: Aplicam-se subsidiariamente a esta Lei as disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal". Todavia, quando a lei especial conter preceito geral, também disciplinado pelo Código Penal, "prevalece a orientação da legislação penal especial, em face do seu específico campo de atuação", conforme Cleber MASSON. In: MASSON, Cleber. Direito penal: parte geral. Vol. 1. 8ª. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014, p.198. Esse é o entendimento corrente na doutrina brasileira.

[22] A teoria da dupla imputação que não admitia a pessoa jurídica como único sujeito passivo da ação penal ambiental e exigia que a pessoa física fosse, necessariamente, também processada, acabou superada por decisão do STF. RE 548.181, do Paraná, 2013, Rel. Rosa Weber. Vale anotar que, no RE 628582/RS-AgR, j. em 06.09.2011, o Ministro Dias Toffoli já se manifestara no sentido de que a responsabilidade penal isolada da pessoa jurídica, não violava o § 3º do artigo 225 da CRFB/88.  Ver: LEAL, Rodrigo José. Ambiente Ecologicamente Equilibrado, Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica e a Regra da Dupla Imputação Material: Jurisprudência do STJ em Descompasso com a nova Hermenêutica do STF. Revista do Direito da UNISC, Santa Cruz do Sul, v.1, n. 45, p. 61-88, jan. – abri. 2015.

[23] "A pena de multa será calculada segundo os critérios do Código Penal, podendo ser aumentada em até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica. (Art. 18, da LCA). O valor da pena de multa pode alcançar o valor de 16.200 salários mínimos, caso o autor do fato criminoso ambiental tenha auferido elevada vantagem econômica. Ver: LEAL, Rodrigo José. Atividade empresarial criminosa contra o ambiente e resposta punitiva pecuniária: um estudo das penas de multa aplicados na jurisprudência do Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC. Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal, ano XIV, n. 84, p. 05-23, Porto Alegre, Lex Magister, jun-jul 2018. ISSN 1807-3395.

[24] Art. 114 - A prescrição da pena de multa ocorrerá: I - em 2 (dois) anos, quando a multa for a única cominada ou aplicada; II - no mesmo prazo estabelecido para prescrição da pena privativa de liberdade, quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada (Código Penal).

[25] Cabe destacar que que as hipóteses que aqui serão examinadas e comentadas valem para a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da ação penal (art. 109, caput, do CP), para a prescrição da pretensão punitiva retroativa (art. 117, I e IV do CP) e, também para a prescrição da pretensão punitiva intercorrente, que se verifica entre a publicação da sentença condenatória recorrível e seu trânsito em julgado para a defesa. Há, ainda, uma hipótese de prescrição da pretensão punitiva, denominada de virtual, mas que tem sido vedada pela jurisprudência (Súmula 438, do STJ).

[26] Nesse sentido: BRASIL. TJRS. Recurso em Sentido Estrito n. 70026956300, da Comarca de Cruz Alta, em que é Recorrente o MPRS e Recorrida All-América Latina Logística do Brasil S/A. Local e data do julgamento: Porto Alegre, 25 de junho de 2009. Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/site/>. Acesso em: 17.01.2019.

[27] BRASIL. STJ. EDcl no Ag. Rg. no RE n 1.230.099 - AM (2010/0219705-4) (f). Embargante: Centro Educacional Lato Sensu. Embargado: MP/AM. Relatora: Min. Laurita Vaz. DJ. 20.08.2013. Disponível em: http://www.stj.jus.br>. Acesso em: 23.01.2019.

[28] Reza o dispositivo que “Aplicam-se às penas restritivas de direito os mesmos prazos previstos para as privativas de liberdade”.

[29] Esse entendimento do STJ, fundamentou decisão, no mesmo sentido, do TJSC, de decreto prescricional de ação penal contra pessoa jurídica, em 2014. Ap. Criminal n. 2013.064131-8, de Criciúma. D.J. 26.09.2014.

[30] No acórdão, ficou estabelecido que “a aplicação das Regras Gerais do Código Penal benéficas à empresa acusada, equiparando, para efeito da prescrição, as penas restritivas de direitos e a prestação de serviços à comunidade à de multa, e, consequentemente, submetendo-as ao prazo prescricional de 2 (dois) anos, consoante disposto no artigo 114, inciso I, do Código Penal é a solução mais adequada”. Recurso em Sentido Estrito n.0003993-50.2014.8.26.0361, D.J: 20.10.2016.

[31] SANTOS, Rodrigo Muniz. Responsabilidade penal das pessoas jurídicas e prescrição. p.309-329. In: PRADO, Luiz Regis; DOTTI, René Ariel. (Coords.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica: em defesa do princípio da imputação penal subjetiva. 4ª. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2013, p. 324.

[32] MORAES, Rodrigo Iennaco de. Prescrição penal bienal da pretensão punitiva da pretensão de punir pessoas jurídicas em virtude de imputação de crime ambiental. In: IX Congresso Estadual do Ministério Público de Minas Gerais. 27.05.2010. Disponível em: <http://www.ammp.org.br/inst/artigo/Artigo-34.doc>. Acesso em: 22.01.2019.

[33] BREDA, Juliano. Inconstitucionalidade das sanções penais da pessoa jurídica. p. 283-297. In: PRADO, Luiz Regis; DOTTI, René Ariel. (Coords.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica: em defesa do princípio da imputação penal subjetiva. 2ª. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2010, 287.

[34] Foram identificados cerca de cento e vinte e sete (124) recursos de apelação, que são fontes de reflexão para a estrutura deste artigo. A pesquisa utilizou as palavras-chave “crime ambiental e pessoa jurídica”; “responsabilidade penal da pessoa jurídica” e “crime ambiental”, com o objetivo de identificar todos os julgados envolvendo a responsabilidade penal da pessoa jurídica por crimes ambientais previstos na Lei n. 9.605/98, no sítio eletrônico do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina - TJSC. Esta pesquisa abrangeu o período de 30.03.1998 a 15.01.2019. Uma parte, referente ao período de 30.03.1998 a 31.07.2010, pode ser examinada de forma mais detalhada, nos capítulos 9, 10 e no anexo 1, da seguinte referência bibliográfica: LEAL, Rodrigo José. Princípio constitucional do ambiente ecologicamente equilibrado e a responsabilidade penal da pessoa jurídica prevista na lei 9.605/98: controle penal efetivo x controle penal simbólico do processo de degradação ambiental no Brasil. 2011, 543 f. Tese (Doutorado em Direito). Universidad de Alicante, 2011, p. 340 e ss.

[35] Recursos em Apelação Criminal n 2009.059190-0, de Chapecó; n. 2009.045642-4, de São Domingos; n. 2009.012469-9, de Mafra; n. 2009.002732-6, de Garuva; n. 2008.035284-8, de São Miguel do Oeste; n. 2008.005942-3, de Bom Retiro; n. 2008.009352-8, de Bom Retiro; n. 2007.001757-0, de Lages; n. 2008.028210-1, de Criciúma; n. 2008.033076-3, de Chapecó; n. 2008.008711-6, de Lages; n. 2008.000442-8, de Ipumirim; n. 2005.006085-0, de Trombudo Central; n. 02.002622-0, de São Miguel do Oeste; n. 2006.037408-2, de Chapecó; n. 2009.066332-8, de Ipumirim; n. 2009.071074-4, de Rio do Sul; n. 2010.053376-8, de Porto União; n. 2013.018748-1, de Joaçaba; n. 2011.062789-3, de Porto União; n. 2013.054360-3, de Concórdia; n. 2013.064131-8, de Criciúma; n. 2014.058640-0, de Lages; n. 2015.032199-3, de Criciúma; n. 0000516-37.2011.8.24.0019, de Concórdia; n. 0000118-95.2014.8.24.0242, de Impumirim.

[36] Ver acima, Item 2.1 e nota de rodapé 21.

[37] Ver acima, Item 2.

[38] As penas aplicáveis, isolada, cumulativa ou alternativamente, à pessoa jurídica são a multa, as restritivas de direitos e prestação de serviços à comunidade (art. 21, da LCA).

[39] Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora. O parágrafo 1° descreve a forma culposa e outros dois parágrafos as modalidades qualificadas do tipo penal.

[40] No voto, o Relator reconhece a enorme dificuldade de se encontrar uma regra segura a solução dos casos de prescrição das penas alternativas adotadas pela Lei 9.605/98. In: BRASIL. TRF da 4ª. Região. MS n. 2002.04.01.013843-0, do Paraná. Impetrante: Petrobrás. Rel.: Des. Fábio Bittencourt da Rosa. DJ.: 10.12.2002. Disponível em: <https://www.trf4.jus.br/trf4/>. Acesso em: 17.01.2019.

[41] BRASIL. STF. Agr. Reg. no RE 944.034 do Paraná. Agravante: Battistella Adm. e Participações S/A. Agravado: MP do Estado do Paraná. DJ: Brasília, 23 e 29.09.2016. Disponível em: <http://www.stf.jus.br> . Acesso em: 17.01.2019.

[42] Ver acima, Item 3.

[43] Para citar algumas decisões do STJ: RMS 56073/ES, DJ. 25/09/2018; AgRg no RMS 48851 / PA, DJ. 20/02/2018.

[44] Para citar algumas decisões do TJRS: MS n. 70076142371,DJ:08.03.2018; Ap. Crime n. 70074098518, DJ:10/08/2017; HC n. 70075492470, DJ: 09/11/2017. RSE n. 70072687791, citado no corpo do Acórdão MS n. 70076142371.

[45] Ver nota de página n. 24.

[46] Ver acima Item 3.

[47] Ver, acima, Item 3, especialmente Item 3.2.


Abstract: Law 9,605 / 98 - Law on Environmental Crimes or LCA - does not discipline the issue related to the prescriptive term of environmental crimes. Consequently, the rules provided for in articles 109 to 119 of the Criminal Code, fill this gap, pursuant to art. 12 of the Code, art. 79, of the LCA and, also, of the denominated theory of the coexistence of the autonomous spheres. The codified standards are intended for crimes committed by individuals, punishable by deprivation of liberty. However, this type of penalty does not apply to crimes committed by a legal entity. Hence the difficulty of applying the codified rules on prescription to cases of environmental crimes practiced by companies. Two jurisprudential currents arose to suppress the omission. The first one adopted the understanding that the criminal penalty applicable to the legal entity, fine, restrictive of rights or services to the community, prescribes in two years, of art. 114, I. Another, applies to the legal entity the same prescriptive period of the custodial sentence for the environmental crime committed by the individual, in the form of the sole paragraph of art. 109 of the Penal Code. The adoption of each of these jurisprudential currents implies to a greater or lesser extent effectiveness of the rule that introduced the responsibility of the legal person in Brazil, provided for in Law 9.605 / 98. Here is the synthesis of what we are going to analyze here.

Keywords: Environmental Protection. Environmental crime. Criminal prescription Legal person. Criminal Responsibility of the Legal Entity.


Autor

  • Rodrigo José Leal

    Professor de Direito Penal da Universidade Regional de Blumenau - FURB e na Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Doutor em Direito pela Universidade de Alicante/Espanha. Mestre em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Fundação Universidade Regional de Blumenau - FURB. Graduado pela Furb.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEAL, Rodrigo José. Delinquência empresarial e prescrição das sanções penais cominadas aos crimes ambientais previstos na Lei nº 9.605/98. Proteção ou (des)proteção do ambiente? . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6330, 30 out. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/86322. Acesso em: 26 abr. 2024.